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Atualidades As questões de Atualidades/Conhecimentos Gerais foram baseadas em temas nacionais e internacionais importantes para a compreensão da realidade atual, uma vez que requer do concursando um vasto conhecimento do processo histórico que a originou. É importante frisar que, para o concursando ter um bom rendimento nas questões de Atualidades/Conhecimentos Gerais, não basta que o mesmo leia revistas e jornais da atualidade, visto que as bancas estão cobrando questões envolvendo a compreensão do processo histórico que originou o momento atual. Sendo assim, é necessário que o candidato domine os grandes acontecimentos políticos, históricos e sociais ocorridos no Brasil e no mundo, correlacionando-os entre si e ainda reconhecendo suas implicações na conjuntura atual. Desta forma aconselho aos concursandos que enfrentarão provas de Atualidades que procurem uma preparação sólida a partir do entendimento da Atualidade, e não a partir de uma leitura desordenada e muitas vezes descontextualizada com as orientações programáticas das principais bancas. Essa orientação poderá ser conseguida com o apoio de cursos e principalmente de professores especializados na preparação para concursos públicos. As células-tronco, também conhecidas como células-mãe ou células estaminais, são células que possuem a capacidade de se dividir dando origem a células semelhantes às progenitoras e de se transformar (num processo também conhecido por diferenciação celular) em outros tecidos do corpo, como ossos, nervos, músculos e sangue. Devido a essa característica, as células-tronco são importantes, principalmente na aplicação terapêutica, sendo potencialmente úteis em terapias de combate a doenças cardiovasculares, neurodegenerativas, diabetes tipo-1, acidentes vasculares cerebrais, doenças hematológicas, traumas na medula espinhal e nefropatias. O principal objetivo das pesquisas com células-tronco é usá-las para recuperar tecidos danificados por essas doenças e traumas. São encontradas em células embrionárias e em vários locais do corpo, como no cordão umbilical, na medula óssea, no sangue, no fígado e na placenta. Tipos As células-tronco podem ser de dois tipos: adultas e embrionárias. As células- tronco adultas podem ser encontradas nos mais variados tecidos do corpo, sendo as da medula óssea, da placenta e do cordão umbilical as mais utilizadas. São de grande aplicação na medicina, já estando em estágio de ampla utilização. Além disso, como as células-tronco adultas são geralmente retiradas do próprio paciente, o risco de rejeição em sua utilização é muito baixo.

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Atualidades

As questões de Atualidades/Conhecimentos Gerais foram baseadas em temas nacionais e

internacionais importantes para a compreensão da realidade atual, uma vez que requer do concursando

um vasto conhecimento do processo histórico que a originou. É importante frisar que, para o concursando

ter um bom rendimento nas questões de Atualidades/Conhecimentos Gerais, não basta que o mesmo leia

revistas e jornais da atualidade, visto que as bancas estão cobrando questões envolvendo a

compreensão do processo histórico que originou o momento atual. Sendo assim, é necessário que o

candidato domine os grandes acontecimentos políticos, históricos e sociais ocorridos no Brasil e no

mundo, correlacionando-os entre si e ainda reconhecendo suas implicações na conjuntura atual. Desta

forma aconselho aos concursandos que enfrentarão provas de Atualidades que procurem uma

preparação sólida a partir do entendimento da Atualidade, e não a partir de uma leitura desordenada e

muitas vezes descontextualizada com as orientações programáticas das principais bancas. Essa

orientação poderá ser conseguida com o apoio de cursos e principalmente de professores especializados

na preparação para concursos públicos.

As células-tronco, também conhecidas como células-mãe ou células estaminais, são células que possuem a capacidade de se dividir dando origem a células semelhantes às progenitoras e de se transformar (num processo também conhecido por diferenciação celular) em outros tecidos do corpo, como ossos, nervos, músculos e sangue. Devido a essa característica, as células-tronco são importantes, principalmente na aplicação terapêutica, sendo potencialmente úteis em terapias de combate a doenças cardiovasculares, neurodegenerativas, diabetes tipo-1, acidentes vasculares cerebrais, doenças hematológicas, traumas na medula espinhal e nefropatias. O principal objetivo das pesquisas com células-tronco é usá-las para recuperar tecidos danificados por essas doenças e traumas. São encontradas em células embrionárias e em vários locais do corpo, como no cordão umbilical, na medula óssea, no sangue, no fígado e na placenta.TiposAs células-tronco podem ser de dois tipos: adultas e embrionárias. As células-tronco adultas podem ser encontradas nos mais variados tecidos do corpo, sendo as da medula óssea, da placenta e do cordão umbilical as mais utilizadas. São de grande aplicação na medicina, já estando em estágio de ampla utilização. Além disso, como as células-tronco adultas são geralmente retiradas do próprio paciente, o risco de rejeição em sua utilização é muito baixo.As células-tronco embrionárias são extraídas dos embriões e acredita-se que elas podem se transformar em qualquer outra célula. As células-tronco adultas são mais limitadas, podendo apenas gerar tecidos específicos. Devido a essa limitação acredita-se que as células-tronco embrionárias sejam mais eficientes. Contudo, as pesquisas com esse tipo de células ainda é incipiente e elas têm uma chance muito maior de causar rejeição ou até tumores em relação às células-tronco adultas.As células-tronco ainda se classificam de acordo com o tipo de células que podem gerar:

Totipotentes: podem produzir todas as células embrionárias e extra embrionárias; Pluripotentes: podem produzir todos os tipos celulares do embrião; Multipotentes: podem produzir células de várias linhagens; Oligopotentes: podem produzir células dentro de uma única linhagem; Unipotentes: produzem somente um único tipo celular maduro.

O que são células-tronco? São células encontradas em embriões, no cordão umbilical e em tecidos adultos, como o sangue, a medula óssea e o trato intestinal, por exemplo. Ao contrário das demais células do organismo, as células-tronco possuem grande capacidade de transformação celular, e por isso podem dar origem a diferentes tecidos no organismo. Além disso, as células-tronco têm a capacidade de auto-replicação, ou seja, de gerar cópias idênticas de si mesmas.

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Que avanços as pesquisas científicas com células-tronco podem trazer para a medicina? As células-tronco podem ser utilizadas para substituir células que o organismo deixa de produzir por alguma deficiência, ou em tecidos lesionados ou doentes. As pesquisas com células-tronco sustentam a esperança humana de encontrar tratamento, e talvez até mesmo cura, para doenças que até pouco tempo eram consideradas incontornáveis, como diabetes, esclerose, infarto, distrofia muscular, Alzheimer e Parkinson. O princípio é o mesmo, por exemplo, do transplante de medula óssea em pacientes com leucemia, método comprovadamente eficiente. As células-tronco da medula óssea do doador dão origem a novas células sangüíneas sadias.

Por que permitir a pesquisa com embriões, se as células-tronco são também encontradas em tecidos adultos? Porque as células embrionárias seriam as únicas que têm a capacidade de se diferenciar em todos os 216 tecidos que constituem o corpo humano. As células retiradas de tecidos adultos têm capacidade de dar origem a um número restrito de tecidos. As da medula óssea, por exemplo, formam apenas as células que formam o sangue, como glóbulos vermelhos e linfócitos.

O que a Lei da Biossegurança aprovada na Câmara permite? Ela autoriza as pesquisas científicas com células-tronco embrionárias, mas impõe uma barreira. Poderão ser pesquisados apenas os embriões estocados em clínicas de fertilização considerados excedentes, por não serem colocados em útero, ou inviáveis, por não apresentarem condições de desenvolver um feto. O comércio, produção e manipulação de embriões, assim como a clonagem de embriões, seja para fins terapêuticos ou reprodutivos, continuam vetados.

Os cientistas podem adquirir os embriões diretamente nas clínicas de fertilização assistida? Sim. O cientista precisa da autorização do conselho de ética do instituto onde trabalha, como em qualquer projeto que envolva a manipulação de material humano. Uma vez autorizado, o pesquisador poderá adquirir os embriões diretamente nas clínicas. Eles deverão estar estocados há mais de três anos e só poderão ser utilizados com o consentimento dos pais, mediante doação. Atualmente, estima-se que o país tenha 30.000 embriões congelados.

Qual o motivo da polêmica em torno da lei? Para explorar as células-tronco usando as técnicas conhecidas hoje, é necessário retirar o chamado "botão embrionário", provocando a destruição do embrião. Esse processo é condenado por algumas religiões – como a católica - que consideram que a vida tem início a partir do momento da concepção. Há perspectivas de que no futuro se encontrem técnicas capazes de preservar o embrião, o que eliminaria as resistências religiosas.

É possível desenvolver uma técnica para obter células-tronco sem precisar dos embriões? Sim. No início de 2007, cientistas americanos anunciaram a descoberta de uma nova fonte de células "coringa", extraídas do líquido amniótico, que preenche o útero durante a gravidez. Extraídas e cultivadas em laboratório, as células deram origem a vários tipos de células diferentes - ou seja, funcionam como células-tronco. Conforme os cientistas, as células-tronco extraídas do líquido amniótico não são idênticas às células-tronco embrionárias. Em alguns casos, porém, elas funcionam até melhor, dizem eles. Mas a gama de aplicações para esse novo tipo de célula-tronco pode ser menor do que no caso das embrionárias.

Qual é o tamanho do embrião quando as células são extraídas para pesquisas? Até o momento, os cientistas conseguiram obter células-tronco de blastocistos, um estágio inicial do embrião com apenas 100 células. Um grupo de pesquisadores americanos conseguiu extrair células-tronco de mórulas, que têm entre 12 e 17 células. Em qualquer caso o embrião é microscópico. As células retiradas são cultivadas em laboratório, e podem render material para diversos anos de trabalho.

Em que estágio se encontram as pesquisas de tratamentos com células-tronco? Apenas no caso de leucemia e certas doenças do sangue se pode falar efetivamente em tratamento. As perspectivas ainda são a longo prazo, pois praticamente todas as terapias se encontram em fase de testes, embora alguns resultados preliminares sejam promissores. Os cientistas ainda têm várias questões a resolver, como a possibilidade de desenvolvimento de tumores, verificada em testes com camundongos.

E no Brasil, o que existe em termos de pesquisas? Na Bahia, pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz estão tratando com sucesso cardiopatias causadas pela doença de Chagas. No Hospital Pró-Cardíaco do Rio de Janeiro e no Instituto do Coração de São Paulo, células-tronco são usadas em pacientes que sofreram infarto. Também há estudos em vítimas de lesões medulares, diabetes do tipo 1, esclerose múltipla e artrite.

Como é a legislação sobre células-tronco em outros países? Nos Estados Unidos, o tema esteve no centro dos debates das eleições presidenciais de 2004. Em 2001, o presidente George W. Bush cortou o

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financiamento público para as pesquisas, permitidas durante o governo Clinton, mas depois decidiu permitir o financiamento limitado. A lei brasileira é considerada equilibrada, e está bem próxima da legislação aprovada há poucos anos em plebiscito na Suíça. Em alguns países, como a Coréia do Sul e a Inglaterra, a legislação também permite a clonagem terapêutica.

O que o uso de células-tronco tem a ver com a clonagem? A "clonagem terapêutica" consiste na transferência de núcleos de uma célula para um óvulo sem núcleo. Este óvulo dará origem a um embrião, do qual se retiram as células-tronco. A vantagem seria evitar a possibilidade de rejeição, caso o doador seja o próprio paciente. Em caso de portadores de doenças genéticas, há ainda a possibilidade de um doador compatível. Este tipo de clonagem é diferente da clonagem reprodutiva, que é quando um embrião clonado é implantado em um útero, com o objetivo de reprodução de pessoas.

Novo apagão energéticoNo final de outubro de 2007, para acionar as usinas térmicas devido ao baixo nível dos reservatórios de água que alimentam as hidrelétricas, a Petrobras cortou o fornecimento de gás em 17%, em São Paulo e no Rio de Janeiro - onde se concentram os dois maiores parques industriais do país. A medida pegou de surpresa grandes empresas, que se viram obrigadas a interromper sua produção, movida a gás. Além disso, houve filas de carro nos postos de GNV (gás natural veicular). O episódio despertou o receio de um novo apagão energético, a exemplo do que ocorreu em 2001. Mas, afinal, esse medo é real? Confira essas e outras questões abaixo:

1. O Brasil corre o risco de sofrer um novo apagão?Sim. A oferta de eletricidade no país, por exemplo, vem crescendo num ritmo inferior ao do consumo. Segundo os números disponíveis, as duas taxas se equilibram atualmente - ou seja, estamos no limite. Por isso, é provável que o fantasma do apagão volte em 2010, considerando-se um crescimento do PIB de 4,5% ao ano até lá.

2. O que pode ser feito a curto prazo?Segundo especialistas do setor, é possível adotar medidas positivas em várias áreas, tais como:- simplificar os procedimentos para a instalação de novas usinas hidrelétricas, principal fonte de energia do país;- estimular a concorrência no fornecimento de gás natural, atualmente sob monopólio da Petrobras;- tornar atrativo o preço da energia gerada pelas usinas de bagaço de cana.

3. Qual a responsabilidade do governo no tema?Estudos mostram que o governo Lula não iniciou nenhuma grande obra de geração de energia. Mais de 90% das usinas inauguradas pelo petista foram licitadas nos anos de Fernando Henrique Cardoso. Desde 2003, 17.500 megawatts foram acrescentados à matriz energética. Desses, apenas 1.700 megawatts foram contratados durante a atual administração, energia suficiente para abastecer não mais do que 5 milhões de residências.

4. Qual o peso do gás na matriz energética brasileira?Desde o apagão de 2001, os governos procuram convencer os brasileiros de que o gás natural é um ótimo substituto para a energia hidrelétrica e a gasolina. Seu consumo foi largamente estimulado. Deu certo. Desde 2000, sua utilização cresceu 120%; em 2006, o produto já respondia por cerca de 10% de toda a matriz energética nacional. Seu uso é atualmente imprescindível não apenas no 1,5 milhão de veículos e nas dezenas de fábricas que o utilizam, mas também, de forma emergencial, na geração de energia elétrica. Durante os períodos de estiagem, quando cai o nível dos reservatórios, são acionadas as cerca de vinte usinas termelétricas movidas a gás inauguradas depois do apagão.

5. De onde vem o gás que o Brasil utiliza?Todo o gás natural no Brasil é fornecido pela Petrobras. Metade dele vem da Bolívia, e o restante, de poços brasileiros. O fornecimento aos consumidores finais, como indústrias, é feito por meio de distribuidoras privadas.

6. O que ocasionou o corte no fornecimento de gás?O racionamento de outubro de 2007 decorre pura e simplesmente da falta de planejamento de longo prazo e do baixo nível de investimento em infra-estrutura no país. Ninguém se importaria com a escassez de gás se os projetos de novas usinas hidrelétricas tivessem saído do papel. Como questões ambientais e regulatórias travam esses investimentos, ampliou-se a necessidade do gás de origem termelétrica. Já o baixo nível dos reservatórios não seria tão dramático em tempos de seca se houvesse mais fontes de gás no país. Mas não há uma coisa nem outra.

7. O setor do gás enfrenta outros problemas?

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O gasoduto Brasil-Bolívia, que representa metade do consumo nacional, está no seu limite. O projeto de ampliá-lo não foi adiante nem será agora com o risco político representado pelo fanfarrão presidente boliviano Evo Morales. A Petrobras preferiu dedicar-se de corpo e alma à meta de atingir a auto-suficiência em petróleo. Outro ponto a ser considerado é a falta de concorrência no fornecimento do combustível. Em tese, qualquer empresa privada poderia competir com a Petrobras na produção de gás. O problema é que os gasodutos existentes estão nas mãos da Petrobras. Haveria a possibilidade de importar gás liquefeito, mas a infra-estrutura portuária necessária para isso ainda não existe. Na prática, o fornecimento de gás no país depende apenas do planejamento de uma única empresa.

8. A megajazida de petróleo e gás de Tupi, na Bacia de Santos, pode resolver o problema do gás no Brasil?Ainda é cedo para saber. Por enquanto, a certeza é de que as reservas de petróleo são realmente gigantes - cerca de 8 bilhões de barris, o que eleva em mais de 50% o estoque brasileiro, atualmente nos 14 bilhões. Mas a Petrobras, responsável pelas pesquisas, ainda não precisou o tamanho das reservas de gás. De qualquer forma, mesmo no caso do petróleo, os benefícios econômicos da descoberta só virão literalmente à superfície por volta de 2013, quando deve começar a exploração em escala comercial da megajazida de Tupi.

9. Um eventual apagão energético pode colocar em risco o crescimento do país?Sim. Nos últimos quinze anos, o país vem se integrando cada vez mais à economia mundial, e nunca antes o acesso a bens foi tão disseminado. O consumo avançou tão rapidamente que o Brasil começa a trombar cada vez mais em seus limites. As reformas foram feitas pela metade, ainda falta muito a privatizar e inexiste planejamento de longo prazo. Enquanto não houver investimentos em hidrelétricas e em novas fontes de gás, esse mesmo roteiro virá sempre à tona. Até lá, a sorte do país estará nas mãos das chuvas de São Pedro e do gás de Evo Morales.

10. A escassez de energia pode provocar um aumento de tarifas?Sim. Logo após o corte de fornecimento de gás no Rio e em São Paulo, em outubro de 2007, a Petrobras avisou que estimava um aumento de 25% no produto no ano seguinte. Mas o quadro já é ruim. Comparando-se o preço da eletricidade para novos projetos industriais no Brasil às tarifas do resto do mundo, chega-se a uma conclusão surpreendente. Embora consumam sobretudo energia de fonte hídrica, 25% mais barata do que a nuclear, os brasileiros pagam tarifas mais caras do que na França, onde a energia nuclear reina absoluta. Isso ocorre por causa de uma série de fatores, todos desastrosos. O maior deles é a carga tributária. Ela representa metade do valor da conta de luz dos brasileiros.

Conceito de Desenvolvimento Sustentável

O desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem a suas próprias necessidades. Ele contém dois conceitos-chave: 1- o conceito de “necessidades”, sobretudo as necessidades essenciais dos pobres no mundo, que devem receber a máxima prioridade; 2- a noção das limitações que o estágio da tecnologia e da organização social impõe ao meio ambiente, impedindo-o de atender às necessidades presentes e futuras (...). Em seu sentido mais amplo, a estratégia de desenvolvimento sustentável visa a promover a harmonia entre os seres humanos e entre a humanidade e a natureza.

Pode-se perceber que tal conceito não diz respeito apenas ao impacto da atividade econômica no meio ambiente. Desenvolvimento sustentável se refere principalmente às consequências dessa relação na qualidade de vida e no bem-estar da sociedade, tanto presente quanto futura. Atividade econômica, meio ambiente e bem-estar da sociedade formam o tripé básico no qual se apóia a idéia de desenvolvimento sustentável.

Medidas : a) limitação do crescimento populacional; b) garantia de alimentação a longo prazo; c) preservação da biodiversidade e dos ecossistemas; d) diminuição do consumo de energia e desenvolvimento de tecnologias que admitem o uso de

fontes energéticas renováveis; e) aumento da produção industrial nos países não-industrializados à base de tecnologias

ecologicamente adaptadas; f) controle da urbanização selvagem e integração entre campo e cidades menores; g) as necessidades básicas devem ser satisfeitas.

No nível internacional, as metas propostas são as seguintes: a) as organizações do desenvolvimento devem adotar a estratégia de desenvolvimento sustentável;

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b) a comunidade internacional deve proteger os ecossistemas supranacionais como a Antártica, os oceanos, o espaço;

c) guerras devem ser banidas; d) a ONU deve implantar um programa de desenvolvimento sustentável.

O termo desenvolvimento sustentável foi primeiramente utilizado por Robert Allen, no artigo "How to Save the World". Allen o define como sendo "o desenvolvimento requerido para obter a satisfação duradoura das necessidades humanas e o crescimento (melhoria) da qualidade de vida" [Allen apud Bellia, 1996, p.23].

Os elementos que compõem o conceito de desenvolvimento sustentável já foram colocados, (a preservação da qualidade do sistemas ecológicos, a necessidade de um crescimento econômico para satisfazer as necessidades sociais e a equidade - todos possam compartilhar - entre geração presente e futuras). Desta forma, percebe-se que os ideais do desenvolvimento sustentável são bem maiores do que as preocupações específicas (a racionalização do uso da energia, ou o desenvolvimento de técnicas substitutivas do uso de bens não-renováveis ou, ainda, o adequado manejo de resíduos). Principalmente, é o reconhecimento de que a pobreza, a deterioração do meio ambiente e o crescimento populacional estão indiscutivelmente interligados. Nenhum destes problemas fundamentais pode ser resolvido de forma isolada, na busca de parâmetros ditos como aceitáveis, visando a convivência do ser humano numa base mais justa e equilibrada.

Conseqüências do Aquecimento do Planeta:

Derretimento das calotas polares, isso acarretara um aumento no nível dos oceanos, o que

causara inundações em cidades litorâneas.

Mudança nos regimes de chuvas, poderá chover menos em determinadas regiões e mais em

outras.

Doenças que hoje são tipicamente de regiões tropicais como a malária e a febre amarela

poderão atingir regiões que hoje não são encontradas.

A agricultura será seriamente afetada, isto porque a agricultura depende muito do clima, com a

mudança deste regiões que hoje são propicia para a pratica da agricultura poderão se tornar

áridas.

Aquecimento das Grandes Cidades, as cidades geralmente apresentam temperaturas mais

altas do que as áreas menos habitadas, com o aumento do efeito estufa essas temperaturas

vão subir mais do que são hoje, o que poderá afetar a saúde da população.

Falta de Energias, países como o Brasil que tem na energia hidrelétrica sua maior fonte de

energia poderão sofre com a falta de chuvas, o que acarretará menos águas nos reservatórios.

Extinção de espécies animais e vegetais, que hoje são restritos a determinados ecossistemas

que poderão desaparecer com o aquecimento.

Desertificação, terras que hoje são campos ou florestas poderão virar desertos.

Essas são apenas algumas previsões dos cientista, elas podem parecer pessimistas mas são muito prováveis e algumas já estão acontecendo. Para evita-las é preciso que a humanidade respeite os limites do planeta e reduza a liberação de gases na atmosfera. Isso não quer dizer que será preciso abandonar os automóveis e o conforto proporcionado pelo progresso tecnológico. É totalmente viável a construção de automóveis que utilizam combustíveis menos poluentes, instalação de filtros nas industrias que reduzam a liberação de gases, os governos dos países mais ricos que hoje são os que mais poluem o planeta devem investir e incentivar a pesquisa de tecnologia ecológicas. Cabe as industrias reduzir a poluição, ao governantes fiscalizar e punir os que desrespeitam as leis e população cobrar dos governante ações que protejam o planeta, só assim estaremos assegurando o futuro de nosso filhos e das demais espécies que habitam a Terra.

O Brasil tem mais peso nessa mesa

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Como o dinheiro fala mais alto, o Brasil amplia seu poder nas decisões econômicas dos países ricos, pois agora ele é credor do FMI

Durante dez dias, a cidade de Istambul, na Turquia, ficou conhecida como "Resistambul". O apelido foi dado pelos manifestantes que aproveitaram a reunião anual do Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial na Turquia para protestar contra o capitalismo e o FMI, como sempre fazem nessas ocasiões. Na quarta-feira 7, último dia do encontro, a polícia turca reprimiu violentamente os jovens com jatos d'água e bombas de gás lacrimogêneo.

Um homem de 55 anos, que passava pela praça Taksim na hora da confusão, morreu de infarto. Não muito longe dali, protegidos do barulho e da violência num luxuoso centro de convenções, milhares de representantes de 186 países discutiram os rumos da economia internacional. Pela primeira vez na história, eles participaram de uma verdadeira mudança de poder no FMI, com os países ricos dando mais voz aos emergentes como Brasil, China e Índia. E o Brasil, fato inédito, oficializou a intenção de emprestar US$ 10 bilhões ao FMI.

Como o dinheiro sempre fala mais alto, o País consagrou maior relevância na complexa mesa de negociações das finanças globais. Um importante sinal dessa transformação histórica foi o esvaziamento do Grupo dos Sete (G-7), que reúne os ministros das finanças e presidentes dos bancos centrais dos sete países mais ricos: Estados Unidos, Japão, Alemanha, Itália, França, Grã-Bretanha e Canadá. Nos últimos 33 anos, o G-7 foi o centro das decisões monetárias e cambiais que norteavam as políticas do FMI.

Não é mais. Em Istambul, o clube dos desenvolvidos assinou uma espécie de atestado de óbito ao submeter- se totalmente, em seu comunicado oficial, ao Grupo dos Vinte (G-20), que além do G-7 inclui países emergentes como o Brasil, a China, a África do Sul, a Coreia do Sul e o México (leia no quadro ao lado). "Nós prometemos dar o exemplo aderindo aos compromissos assumidos pelos líderes do G-20 nas reuniões de Washington, Londres e Pittsburgh", escreveram os representantes dos ricos.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, comemorou os novos tempos. "Antigamente, os Estados Unidos e o G-7 manipulavam o FMI, era um cabode- guerra com as nossas economias, s imp l e sme n t e mandavam fazer. Agora, isso mudou completamente", afirmou à ISTOÉ, numa brecha das reuniões em Istambul. O G-7 ainda tentou manter alguma relevância ao dizer que continuará a monitorar os movimentos das taxas de câmbio e agir conjuntamente, quando necessário. Mas, na prática, é página virada. Após a crise econômica global de 2008, nenhuma decisão importante deixará de ser tomada em conjunto com os países emergentes. "Os países desenvolvidos não têm mais a empáfia de antes, estão humildes. Eles sabem que quem vai puxar o crescimento daqui para a frente é a China, o Brasil, a Rússia, a Ásia, a América Latina. A geopolítica internacional mudou muito", diz Mantega.

Tanto é verdade que as coisas mudaram que o G-20 determinou uma redistribuição das cotas do FMI de pelo menos 5%, em benefício das economias dinâmicas emergentes. No conjunto, esses países terão 45% das cotas do FMI, que definem os votos de cada um e o direito de saques de recursos na organização. Um detalhe: nas contas de Mantega, o grupo formado por Brasil, Rússia, Índia e China (os BRICs) passará a ter um poder adicional quando a mudança for efetivada, em janeiro de 2011.

"Ninguém percebeu, mas com a reforma (do FMI) os BRICs chegam a 15% e têm poder de veto. As decisões mais importantes têm que ser tomadas por 85% dos

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votos." A resistência histórica à voz dos emergentes, que sempre foram obrigados a seguir políticas econômicas ditadas pelos países ricos ao tomarem dinheiro do FMI, caiu em Istambul. Isso significa que, nos próximos anos, a economia mundial também será dirigida conforme o que acontece em Pequim, Brasília, Nova Délhi e Moscou, e não apenas em Nova York, Londres, Berlim e Tóquio. Depois da crise atual, as políticas neoliberais, que davam mais voz aos mercados financeiros e tolhiam a atuação dos Estados na economia, deram lugar ao intervencionismo dos governos e a uma tendência de regulamentação e supervisão mais rígida dos bancos. O economista britânico John Maynard Keynes, que defendia uma ação mais forte do Estado e foi um dos fundadores do FMI, está mais vivo do que nunca.

O FMI, de seu lado, busca manter seu lugar ao sol na nova ordem econômica mundial. Quer se capitalizar e se transformar numa espécie de banco central global, um emprestador de última instância, o que ampliaria seu poder de fogo nas crises cambiais. A proposta foi defendida pelo diretor- geral do FMI, Dominique Strauss- Kahn, e prontamente criticada por nomes influentes como Henrique Meirelles, presidente do Banco Central brasileiro, Joseph Stiglitz, Prêmio Nobel de Economia, e Guillermo Ortiz, presidente do banco central mexicano.

"É um equívoco achar que, se o FMI tiver os recursos suficientes para ser o emprestador de última instância, os países deixarão de acumular reservas", afirmou Meirelles à ISTOÉ. Decidir quanto acumular, quando e como usar o dinheiro é uma questão de soberania nacional, que não deve ser ameaçada pelas pretensões megalomaníacas do FMI. Se não tivesse mais de US$ 200 bilhões em caixa, o Brasil não teria sobrevivido tão bem à crise de 2008 e não estaria dando algumas das principais cartas no intrincado jogo das finanças internacionais.

"Vou blindar a economia"

em Istambul, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, oficializou a proposta de emprestar US$ 10 bilhões ao FMI. Antes, concedeu uma entrevista exclusiva à ISTOÉ:

ISTOÉ - Pode haver desequilíbrio fiscal no Brasil?

MANTEGA - Não. A situação fiscal do Brasil é a melhor do G-20. Fizemos poupança fiscal e aplicamos mais de 0,5% do PIB no fundo soberano. E diminuímos a nossa dívida. Devemos fechar 2009 com uma relação dívida/PIB de 42%. Na época do Fernando Henrique Cardoso, passava de 60%. Ninguém questiona a política fiscal, tanto que recebemos o selo de grau de investimento da Moody's. Em 2010, teremos um crescimento maior, de 4% a 5% do PIB. A arrecadação vai se normalizar e vamos equilibrar receita e despesa.

ISTOÉ - As eleições em 2010 podem conturbar o cenário econômico?

MANTEGA - Isso acontecia no passado, quando a economia era muito mais frágil. Hoje, quem tem dinheiro no Brasil está mais tranquilo do que quem tem nos Estados Unidos, na União Europeia.

ISTOÉ - Não há riscos?

MANTEGA - Vou blindar a economia. Essa é minha função. Não farei nenhuma concessão ao político. Se tiver que fazer corte de gastos, nós o faremos para alcançar a meta de superávit, de 3,3% do PIB. Poderíamos estabelecer uma meta frouxa, como 1%, e dizer: "Vamos torrar o dinheiro." Não é isso que vamos fazer.

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ISTOÉ - A oposição vai ter de fazer uma nova Carta aos Brasileiros?

MANTEGA - É, agora são os outros que vão ter que fazer. Em 2001, tivemos de dizer que apoiávamos o empréstimo do FMI. Agora, os que assinarem vão ter de dizer que apoiam o empréstimo do Brasil ao Fundo. Mudou radicalmente.

Tesouro vai bancar obra do trem-bala

O governo vai reformular o modelo de financiamento público oferecido às empresas que disputarão a concorrência para a construção do trem-bala --linha férrea de 511 quilômetros que ligará São Paulo ao Rio de Janeiro.

• Trem de alta velocidade começa a operar em 2015

• Governo não se entende sobre aeroporto Campo de Marte

• Passagem do trem-bala deverá custar até R$ 325

• BNDES financiará 60% do trem-bala SP-Rio

O BNDES, originalmente incumbido de conceder um empréstimo no valor de R$ 20 bilhões, será, pelo novo modelo, um mero repassador de recursos. O governo, por meio do Tesouro, assumirá o financiamento. A mudança ocorre porque o BNDES, apesar de recente aporte de verba federal, não pode fazer empréstimo único nesse valor. A operação fragilizaria o banco, de acordo com as regras globais para prevenir a insolvência. Com a alteração, haverá um novo atraso na licitação. O objetivo inicial era lançar o edital em agosto para dar início às obras em 2010. Agora, é certo que a inauguração não virá antes da Copa do Mundo de 2014.

BNDES

Originalmente, estava previsto que o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) financiaria 60% dos R$ 34,6 bilhões previstos pelo governo federal na construção do TAV (Trem de Alta Velocidade). O resto do dinheiro deveria vir de financiamento privado e de um capital próprio inicial, dos quais R$ 3,3 bilhões seriam investidos pelo governo --cerca de R$ 2,2 bi para desapropriações e outro R$ 1,1 bi através de uma empresa pública operadora-- e os outros R$ 7 bilhões do consórcio que vencesse a licitação para construir e operar o trem.

Brasil

Retrospectiva 2009

A criação de Dilma

Foi um ano de duras batalhas para a ex-guerrilheira Dilma Rousseff. A maior de todas, um câncer no sistema linfático, foi enfrentada com dignidade e vencida com

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bravura. Em setembro, depois de cinco meses de tratamento, a ministra veio a público anunciar que estava curada. Menos definitivo foi o resultado de seu embate com a ex-secretária da Receita Lina Vieira em torno de um encontro de desdobramentos suspeitos cuja existência ela nega e a ex-secretária reitera. Palavra contra palavra, ficou por isso mesmo, e Dilma encerrou 2009 inteira e sacudindo a poeira. Como o Adão de Michelangelo, sua candidatura à Presidência veio do nada e materializou-se por obra e graça de um dedo (que, nesse caso, não era divino, mas quase). A natureza do processo suscitou a dúvida: a mágica do criador incluiria a capacidade de transferir votos para a criatura? Dois anos e muitas viagens, inaugurações e palanques conjuntos depois, Dilma patina nas pesquisas. Assim, a dúvida que atormenta os petistas passou a ser outra: com a tonitruante popularidade presidencial, a ministra – praticamente uma reencarnação de Lula, segundo a propaganda do PT – não deveria estar em situação bem mais confortável? Dilma já se mostrou boa de batalhas. 2010 será o ano da guerra.

 

Mais vale um tucano à mão...

Risinho aqui, alfinetadinha acolá e muito jogo de cena depois, sobrou só um tucano para alçar o voo mais alto. Aécio Neves, que começou o ano arrastando caminhões de apoio às suas pretensões de candidato à Presidência da República, foi, devagarinho, colocando o nome em cima do telhado. Primeiro pressionou pelas prévias até outubro, depois aceitou postergar a data e mais tarde desistiu da consulta. Por fim, anunciou a retirada da pré-candidatura, deixando o caminho livre para Serra, hoje o mais que virtual candidato do PSDB. A pergunta que agora ecoa nas hostes tucanas é: aceitará Aécio ser vice de Serra, carregando consigo um dos mais altos índices de aprovação registrados por um governador e uma miríade de votos do segundo maior colégio eleitoral do país? Para convencer o colega de Minas Gerais a formar o que analistas consideram ser a chapa de oposição imbatível, o governador de São Paulo terá de gastar mais do que o seu latim – terá de oferecer um caminho para Aécio ganhar musculatura nacional e, assim, viabilizar-se para se candidatar finalmente à Presidência. De preferência, em 2014...

 

Bem-vindo, terrorista!

Certamente não foi por acaso que o terrorista italiano Cesare Battisti escolheu o Brasil para morar. Mas nem nas suas mais delirantes fantasias ele poderia imaginar que receberia aqui tão calorosa acolhida. O Brasil tem sido uma mãe para Battisti (na foto, em alegre convescote com um grupo de parlamentares do PT, PCdoB e PSOL). Afinal, que outro país dedicaria paparicos de popstar a um criminoso condenado à prisão perpétua por quatro assassinatos? Em que outro país o ministro da Justiça, ignorando o parecer de um órgão técnico favorável à sua extradição, concederia a ele status de "refugiado político"? E, por fim, que país continuaria considerando a possibilidade de oferecer-lhe abrigo mesmo depois de a mais alta corte de Justiça concluir ser o italiano um criminoso comum? Graças a essa sucessão de bondades, está nas mãos do presidente Lula decidir onde o terrorista Battisti passará 2010, se pagando por seus crimes na Itália ou espreguiçando-se sob o sol do Brasil.

 

Verdade submersa

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Seis meses depois da queda do voo 447 da Air France, as respostas para as causas da tragédia que matou 228 pessoas, incluindo 58 brasileiros, permanecem no fundo do mar. O segundo relatório da agência francesa de investigação e análise de acidentes frustrou quem esperava explicações para os eventos que levaram o Airbus 330 a cair no Oceano Atlântico quatro horas depois de decolar do Rio em direção a Paris, partindo-se em centenas de pedaços sem deixar sobreviventes. Além de recomendar a mudança dos métodos de avaliação do funcionamento dos sensores de velocidade do Airbus (os "pitots", que entraram para o vocabulário nacional desde o acidente), o documento nada esclareceu. Por que a aeronave mergulhou no inferno de um aglomerado de cúmulos-nimbos, as terríveis nuvens carregadas de eletricidade e cortadas por ventos de até 200 quilômetros por hora? Como se deu a pane elétrica que fez os pilotos perder o comando do aparelho? O que provocou a avaria na fuselagem que antecedeu a queda do AF-447? E, mais importante que tudo: como evitar que isso se repita? Pressionada pela associação de familiares das vítimas brasileiras do acidente, a agência francesa de investigação decidiu retomar em fevereiro as buscas pelas caixas-pretas do Airbus – a esta altura, a única esperança que resta de decifrar a tragédia.

 

A meia é a nova cueca

Foi patrocinada pelo DEM e protagonizada por um de seus parlamentares a mais explícita cena de cafajestice política já vista no Brasil desde que as denúncias de malfeitorias perpetradas pela categoria passaram a vir com áudio e vídeo. Presidente da Câmara Legislativa do Distrito Federal, Leonardo Prudente provou que um sobrenome pode ser também um oximoro. Flagrado estufando com dinheiro não contabilizado (como os mensaleiros do PT convencionaram chamar a propina) os bolsos do paletó e da calça, quando mais buracos não achou, socou o restante dentro da meia, entrando assim para a infame galeria inaugurada pelo "homem do dólar na cueca", seu antepassado petista. Numa comparação com o mensalão do PT, o do DEM primou por duas diferenças: a celeridade com que o partido resolveu expulsar os envolvidos, incluindo o governador do DF, José Roberto Arruda (doravante conhecido como "o homem do dinheiro que era para comprar panetone"), que caiu fora antes de ser defenestrado, e a indignada reação de membros do governo diante de cenas tão "estarrecedoras" e episódio tão "deplorável" – adjetivos jamais pronunciados quando o escândalo era no quintal petista. Mensalão nos olhos dos outros...

 

E fizeram-se as trevas inexplicáveis...

Em 10 de novembro, o maior apagão da história do país deixou à luz de velas dezoito estados e 88 milhões de pessoas (ao lado, a cidade de São Paulo às escuras). Mais de um mês depois, 193 milhões de brasileiros continuam na escuridão, já que as causas do blecaute permanecem um mistério insondável. Falou-se em raios, em falha estrutural do sistema e, mais recentemente, em comprometimento no funcionamento de certas peças que deveriam proteger os feixes condutores de eletricidade. Ao fim e ao cabo, a única coisa que ficou clara, com o perdão do trocadilho, foi que o sistema elétrico brasileiro padece de um desequilíbrio sério que, a cada seis anos, em média, faz o país mergulhar na mais medieval das escuridões. Alguém disse seis anos, em média? Bem, levando-se em conta a proximidade da Copa do Mundo de 2014 e da Olimpíada de 2016, talvez seja uma boa ideia as autoridades brasileiras começarem a se preocupar, se quiserem evitar um vexame agora de repercussão global.

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Internacional

Retrospectiva 2009

O ano em que Obama caiu na real

Ser um homem de inteligência superior submeter suas ideias ao teste supremo da realidade – e existe outro maior do que a Presidência dos Estados Unidos? – foi o espetáculo mais hipnotizante de 2009. O júri ainda vai ficar acompanhando o desempenho de Barack Obama por um bom tempo, mas já deu para ter uma visão da mistura de pragmatismo e idealismo que parece guiá-lo. Em geral, o pragmatismo funcionou melhor. A começar pelos dois eixos mais vitais, a economia e a defesa, em que Obama manteve praticamente as equipes e as políticas em vigor. A argumentação que fez sobre a inevitabilidade das "guerras necessárias", mesmo entre aqueles que como ele não têm ânimo beligerante, foi talvez o ponto alto, em termos intelectuais, de seu primeiro ano de governo. No campo do idealismo, brilhou no discurso do Cairo em que estendeu a mão ao mundo muçulmano e tentou, metaforicamente, quebrar a narrativa massacrante da vitimização. Não se deu tão bem ao sair pelo mundo pedindo desculpas por políticas americanas do passado recente (os públicos ou não acreditam na beleza moral da autocrítica ou a desprezam) e se curvar excessivamente diante de monarcas estrangeiros. E continua parecendo totalmente inexplicável que tenha mandado transferir para Nova York o julgamento do, digamos, diretor executivo dos atentados de 11 de setembro, Khalid Sheikh Mohammed. Depois de pragmáticas adaptações, deve conseguir a aprovação da reforma mais importante no plano interno, a do sistema de saúde – que, numa reação só possível nos Estados Unidos, causou mais desaprovação do que o contrário na opinião pública. Em política externa, apesar da imagem fenomenalmente positiva, teve resultado zero até agora. É duro o teste da realidade, mas Obama leva jeito para enfrentá-lo.

 

Os dólares furados

O governo baixa pacotes econômicos a toda hora, o presidente dá bronca em banqueiros porque não estão soltando financiamentos, o desemprego chega a 10% e a moeda anda fraquinha, fraquinha. Cidadãos comuns alarmam-se com a dívida pública, um mastodonte que bateu em 12 trilhões de dólares, e cidadãos incomuns começam a sair às ruas em protesto. O pior da crise já passou - aliás, tão depressa que os peixinhos vorazes que nadavam em volta do grande Moby Dick americano, loucos para fazer a dança de morte do capitalismo, nem tiveram tempo de aproveitar direito. Dá para acreditar que foi no ano da pouca graça de 2009 que o governo Obama assumiu a General Motors? Ou que o pagamento contratual de bônus a altos executivos das instituições financeiras resgatadas com dinheiro público provocou uma proposta de que todos fossem enforcados em praça pública com cordas de piano? Mas a insegurança econômica, e seus terceiro-mundistas acompanhamentos, ainda cala fundo na alma americana. "Os Estados Unidos estariam errados se dessem como garantido o lugar do dólar como reserva monetária predominante", avisou em setembro o presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick - é, o mesmo chamado pelo presidente Lula de "sub do sub do sub" na época das negociações comerciais, e que continua adepto do estranho hábito de falar a verdade.

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Pintura de guerra

Azadi, azadi, azadi. O rugido que subiu das ruas de Teerã veio em farsi, mas seu significado é o mesmo em todos os lugares do mundo onde existe um grito sufocado no peito: liberdade. A intensidade, a energia e a extraordinária coragem dos jovens manifestantes mostraram que existe vida independente no Irã. O elemento catalisador foi a candidatura presidencial de Mir Hossein Mousavi, um ex-primeiro-ministro que se transformou em ícone do reformismo. Sob a bandeira verde, a cor apropriadamente islâmica de sua campanha, as belas maquiaram-se para a guerra das ruas e empurraram o lenço da cabeça, de uso obrigatório, até limites antigravitacionais. A campanha e os protestos subsequentes, diante da reeleição fraudada do sinistro Mahmoud Ahmadinejad, expuseram várias camadas de descontentamento, desde os jovens que anseiam por uma vida mais normal até dissidências no interior dos quadros do regime. Ahmadinejad e sua turma não negaram o sangue: engrossaram, reprimiram e continuaram celeremente no caminho da produção secreta de bombas atômicas, o assunto que vai tumultuar o mundo em 2010. Mas agora a trilha sonora iraniana incorporou a palavra mágica. Liberdade, liberdade, liberdade.

 

Uma siesta muito, muito longa

Tudo teve ares de pastelão, mas pelo menos uma coisa deve ser considerada: a potestade das forças que se ergueram contra Manuel Zelaya não foi brincadeira. O infeliz do chapelão foi destituído da Presidência de Honduras com ordem assinada pela Suprema Corte e sem nenhuma cerimônia por parte do Exército. No seu lugar ficou um sujeitinho bravo, Roberto Micheletti, que assumiu interinamente com um objetivo - no pasará - e o cumpriu. Ainda por cima, Zelaya contou com o apoio incondicional dos megalonanicos da diplomacia petista, sempre uma garantia de que a coisa vai dar errado. Por ordem de Hugo Chávez, voltou à sorrelfa e se instalou na Embaixada do Brasil com planos inversamente proporcionais à capacidade de executá-los. As simpatias dos que, mesmo desconfiando das patranhas da figura, repudiavam os métodos de sua deposição sofreram um cruel golpe quando ele disse que estava sendo torturado por mercenários israelenses com emissões de alta frequência e gases tóxicos. Folhas de papel-alumínio passaram a recobrir as paredes da embaixada, dando a impressão de que a qualquer momento sairiam dali miolos ao forno. Zelaya não foi o único a passar atestado de maluquice: o governo brasileiro repudiou até o fim a realização de eleições presidenciais e, depois, seu resultado. Em outras circunstâncias, o mau conselheiro Marco Aurélio Garcia e o chanceler Celso Amorim ensaiaram dar uma de good cop e bad cop, aquela jogadinha de policial mau e policial bonzinho. Da história de Honduras, saíram parecendo os Keystone Cops.

 

Salto em crescimento

As jovens recepcionistas chinesas são escolhidas por critérios universais: beleza, altura e sorriso - quanto mais bonitas, mais importantes são os figurões a quem servem chá. Na foto, elas pularam para demonstrar disposição amável durante um evento legislativo na China. Todo mundo deveria pular junto: o crescimento econômico de 8% segurou praticamente metade do planeta à tona ou um pouquinho acima, o Brasil inclusive. Dos países que contam, nenhum atravessou a crise com tanto ímpeto.

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Os feitos portentosos e as construções espetaculares deram um tempo, inclusive por fadiga de atenção do resto do mundo depois da Olimpíada de 2008. Mas em 2010 a China reocupará o palco com a Exposição Mundial de Xangai. Entre as extravagâncias arquitetônicas, o pavilhão de Macau será em formato de coelho futurista. E as coelhinhas então...

 

Pecado original

Militantes muçulmanos podem matar muçulmanos inocentes? A pergunta soa absurda, mas é objeto de intenso debate no mundo islâmico. Ainda mais com o recrudescimento, a partir do segundo semestre de 2009, dos ataques com carros-bomba nas três grandes frentes de atuação dos fundamentalistas armados – Iraque, Afeganistão e Paquistão –, com horríveis carnificinas entre a população civil. Os jihadistas, ou partidários da guerra santa, acham que a luta pela imposição de um regime islamicamente puro justifica que inocentes sejam  feitos em pedacinhos. No pós-morte, Alá separa os justos dos culpados e compensa o sacrifício dos primeiros. No Paquistão, os atentados se multiplicaram a partir de agosto, em resposta a uma operação militar contra áreas dominadas pelos militantes fundamentalistas. Mais de 500 pessoas morreram explodidas por carros-bomba desde então. O menino morto, na chocante foto ao lado, foi vítima do ataque contra um mercado cheio de mulheres e crianças em Peshawar. O governo paquistanês conseguiu do alto clero uma fatwa dizendo que os atentados terroristas são haram, o equivalente a pecaminosos, e os líderes religiosos que os insuflam incorrem na mesma categoria. Um avanço no campo moral que terá, infelizmente, resultado nulo no campo prático.

 

Chanchada à italiana

O paradoxo italiano salta aos olhos: o país vai bem, mas seu chefe de governo está tão mal que começou o ano gritando na frente da rainha Elizabeth para chamar a atenção de Barack Obama e terminou levando na cara uma miniatura da Catedral de Milão. Entre uma coisa e outra, uma erupção vesuviana de mulheres de boa figura e má reputação, um processo de divórcio anunciado pela esposa ofendida no principal  jornal da oposição e uma decisão da Suprema Corte que o priva da imunidade do cargo. Para tudo Silvio Berlusconi deu a explicação clássica dos políticos erráticos ("intriga da oposição"). Tudo, sobretudo as cenas das festinhas de arromba na casa de praia, teve um ar de pornochanchada dos anos 70. O que não pode, evidentemente, ser debitado na sua conta é o ataque de Milão. Mas é quase impossível resistir aos paralelos entre o estilo kitsch do milionário populista e o objeto usado, uma lembrancinha de turista de arrepiar até cabelos implantados.

 

Menos foi mais

Numa era de populistas exibidos, Angela Merkel é um alívio. Não joga para a plateia, não conta piadas, não se considera uma enviada dos céus. É de direita, mas com flexibilidade suficiente para ver a necessidade de dar umas estimuladas na hora do aperto e, depois, voltar às apertadas no déficit. Não fala uma palavra que não seja criteriosamente pensada – e, portanto, não diz besteiras. Suporta-as com estoicismo, como já se comprovou com Silvio Berlusconi falando ao celular, Nicolas Sarkozy tendo

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surto napoleônico e Lula elogiando o programa nuclear do Irã, tudo sob seus pouco complacentes olhinhos azuis. A maior mudança de imagem que fez para enfrentar a campanha eleitoral deste ano, no meio da crise, foi levantar o penteado uns 2 centímetros. Filha de pastor luterano, criada na antiga Alemanha Oriental e formada em física, ela gosta de tudo em perfeita ordem, disciplina e discrição. Sem nenhuma surpresa, os alemães também gostam do estilo minimalista. "Algumas pessoas disseram que ela era tediosa e provinciana. Mas os eleitores não são burros, não querem uma Britney Spears como chefe do governo", disse o diretor de um instituto político, Detmar Doering, a propósito da reeleição dela, em setembro. "Querem uma pessoa séria, em quem possam confiar." Bingo.

 

Surto de medo – e máscaras

O nome oficial é influenza A (H1N1), mas no popular o que pegou mesmo foi gripe suína. As sucessivas ondas de medo demonstraram que o mundo está sempre esperando o pior. Talvez sob influência das previsões apocalípticas e dos filmes-catástrofe, a ideia de que sobrevirá a mãe de todas as epidemias foi abraçada até com excessiva credulidade. A gripe que fez todo mundo usar máscara hospitalar, ou pensar em fazê-lo (na foto, estudantes japoneses em visita ao Parlamento), foi menos mortífera do que o antecipado. Apesar da propagação global, provocou cerca de 10 000 mortes, das quais cerca de 1 600 no Brasil. Mas assustou tanto pelo potencial letal quanto pela faixa atingida. Quando a gripe comum mata, 80% das vítimas são pessoas acima dos 60 anos, em geral debilitadas por outras doenças. Na suína, a proporção é inversa. A reação mais insensata à pandemia aconteceu no Egito, onde o governo mandou matar todos os porcos. Além da conexão errada entre os animais e a gripe – uma vez disseminado entre humanos, o vírus tem autonomia –, pesou o fator religioso: o islamismo proíbe os porcos por considerá-los impuros. No Egito, eram criados com restos de comida e consumidos pelos coptas, adeptos de uma igreja que remonta aos primórdios do cristianismo. Sem eles, o lixo orgânico aumentou ainda mais, e as cidades egípcias ficaram naquela situação na qual o presidente Lula disse que o povo brasileiro vive. Em suma, uma porcaria.

 

Eterno enquanto dure

Hugo Chávez começou o ano cumprindo o que havia prometido. Tanto fez, manipulou, distorceu e ameaçou que conseguiu reverter o resultado do plebiscito de 2007. Em fevereiro, ganhou a possibilidade de reeleições até o fim dos tempos. O populismo autoritário e caudilhesco que comanda fincou mais fundo suas raízes malignas. O sistema de ensino está sob novo e perverso estatuto, as poucas vozes independentes que restam sofrem intimidações crescentes, comitês armados defendem a ideologia oficial. Chávez passou o ano ameaçando ir à guerra contra a Colômbia. Fez um acordo de armamentos com a Rússia, mas comandou uma grita contra o uso de bases colombianas por forças americanas para combater os traficantes de cocaína. Entre uma ameaça presente e imediata como o narcotráfico e um futuro e hipotético uso indevido das bases, adivinhem de que lado os seus dúcteis aliados ficaram...

 

Está frio ou quente?

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Quente, definitivamente. Pelo menos em termos de discussão das mudanças climáticas. Em alguns casos, até fervendo: a ideologização do assunto  provocou extremismos inúteis a ponto de os absolutistas da influência humana no aumento da temperatura global (ou aquecimentonistas) terem transformado a questão em artigo de fé e os céticos (ou brucutus direitistas que querem incinerar o planeta) usarem qualquer nevasca como prova de que o clima está até mais fresquinho. A ciência climática é complexa: a geleira, como a da foto na Groenlândia, que parece derreter uma hora, em outra retorna ao estado glacial; em vez de subir, em alguns lugares o nível do mar parece baixar; tempestades, secas e até tornados, que de repente se tornaram recorrentes no sul do Brasil, são tão impressionantes quanto desconectados das mudanças globais. Mas no fundo, no fundo, todos sabemos que a devastação ambiental que a espécie humana provoca não ficará sem consequências. E nenhuma solução mágica baixará dos céus no último instante. Só nós podemos nos salvar.

A reunião do G20 terá como pauta - como não poderia deixar de ser - a crise econômica que abala mercados ao redor do mundo. A expectativa em torno dela é alta. O presidente americano, Barack Obama, já pediu, em artigo publicado em mais de 30 jornais internacionais, que os líderes do grupo tomem "medidas audaciosas e coordenadas" contra o mal-estar financeiro. O crescente reconhecimento dado à participação dos países emergentes, membros do grupo, também garante importância à reunião. Há ainda quem espere anúncios de ações contra o aquecimento global na Inglaterra. Entenda como funciona o G20 e a relevância do próximo encontro.

1. Quando e por que foi criado o G20?O G20 foi criado em 1999, ao final de uma década marcada por turbulências na economia (na Ásia, no México e na Rússia). Além de resposta a essas crises, a formação do grupo foi uma forma de os países ricos reconhecerem o peso dos emergentes, que se mostraram capazes de ameaçar os mercados com suas instabilidades. O G7 - bloco de nações mais desenvolvidas do planeta, que agrega agora a Rússia - já se reunia para falar de economia desde 1975. Mas, com os distúrbios da década de 1990, passou a abrir a discussão a países em desenvolvimento. Em 1998, reuniões mais amplas que as do G8, com até 33 países, deram início à inserção dos emergentes na conversa. O movimento resultaria na formação do G20.

2. Quais nações compõem o grupo?Ministros da área econômica e presidentes dos bancos centrais de 19 países: os que formam o G8 e ainda 11 emergentes. No G8, estão Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão, Reino Unido e Rússia. Os componentes do G20 são: Brasil, Argentina, México, China, Índia, Austrália, Indonésia, Arábia Saudita, África do Sul, Coréia do Sul e Turquia. A União Européia, em bloco, é o membro de número 20, representado pelo Banco Central Europeu e pela presidência rotativa do Conselho Europeu. O Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, assim como os Comitês Monetário e Financeiro Internacional e de Desenvolvimento, por meio de seus representantes, também tomam assento nas reuniões do G20.

3. Quais os critérios para adesão ao grupo?Apesar de não haver critérios formais de adesão ao G20, existe uma intenção declarada de unir num mesmo grupo grandes potências e nações em desenvolvimento e também de manter inalterado o tamanho da organização. "Em um fórum como o G20, é particularmente importante que o número de países envolvidos seja restrito e fixado para assegurar a eficácia e a continuidade de suas atividades", diz texto do site

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da instituição. A composição é a mesma desde a sua fundação, em 1999. Aspectos como o equilíbrio geográfico e a representação populacional dos países-membros também foram levados em conta à época da criação do grupo.

4. A que fração da economia mundial corresponde o G20?Os países que compõem o grupo respondem juntos por 90% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial. Se computadas as transações internas da União Européia, o grupo responsável por cerca de 80% do comércio internacional. Além disso, dois terços da população global estão distribuídos entre os países que formam o G20. Em declaração feita no final de 2008, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou que os emergentes do G20 respondem hoje por "75% do crescimento mundial".

5. Como funciona o G20?Ao contrário de organismos transnacionais como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional (FMI) ou a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o G20 não conta com equipe permanente. Neste sentido, seu modelo de operação é semelhante ao do G8. Rotativa, a presidência do grupo muda a cada ano. Em 2008, o Brasil foi escolhido para presidir o G20; em 2009, o Reino Unido. Para garantir a continuidade dos trabalhos, a presidência opera em um esquema tripartite, chamado de Troica: uma diretoria formada por três peças fundamentais concentra ao mesmo tempo uma pessoa ligada à presidência anterior, uma relacionada à atual e outra à futura gestão. Assim, neste ano o Brasil segue na Troica, onde está desde 2007. O terceiro membro é a Coreia do Sul. A cada presidência, é definido um secretariado provisório, que coordena os trabalhos e organiza as reuniões do grupo.

6. Quando acontecem as reuniões e o que se discute nelas?Os ministros da área econômica e os presidentes de bancos centrais do G20 costumam se reunir uma vez por ano. Em 2008, o encontro aconteceu em São Paulo, nos dias 8 e 9 de novembro - poucos dias depois, chefes de estado do G20 se reuniriam em Washington, a convite do presidente americano, George W. Bush. Nessas oportunidades, os dirigentes debatem tópicos orçamentários e monetários, comerciais, energéticos, saídas para o crescimento e formas de combater o financiamento ao terrorismo. Na presidência rotativa da organização, o Brasil propôs três temas para 2008: competição nos mercados financeiros, energia limpa e desenvolvimento econômico e elementos fiscais de crescimento e desenvolvimento. Os assuntos foram abordados em seminários realizados em fevereiro, na Indonésia, em maio, em Londres, e em junho, em Buenos Aires.

7. Que decisões já foram tomadas nessas reuniões?Em 2004, os membros do G20 se comprometeram com padrões da transparência e de governança fiscal para conter abusos no sistema financeiro, lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo. No mesmo ano, os países do grupo também discutiram formas de aumentar a transparência do sistema financeiro internacional, tema que ainda está em pauta, e assinaram um Acordo para o Crescimento Sustentável. Uma agenda indicaria os passos e prazos de cada país na implantação desse acordo, mas as nações já combinaram de rever a implementação, o que torna o compromisso mais frouxo. Vale lembrar que o G20 é um fórum informal, não um bloco econômico como a União Europeia.

8. Do que tratará a reunião de 2 de abril?O foco principal do encontro de Londres será a crise financeira. Contra ela, Barack Obama, presidente americano, já pediu medidas "audaciosas e coordenadas". Há quem diga que esta é a última chance de o mundo dar uma resposta coordenada à depressão econômica global. Isso significa emitir um sinal inequívoco de que os países do G20 estão preparados para estabilizar o sistema financeiro e lançar as

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bases de uma economia sustentável, em que os princípios do livre mercado sejam preservados e o recrudescimento do protecionismo, evitado. Mas há outras expectativas em torno da reunião, especialmente por parte dos anfitriões. Para o chanceler britânico David Miliband, ela marcará o fim de uma era em que reinou o unilateralismo dos Estados Unidos. "Estou seguro de algo: Obama não virá a Londres para impor as ideias e os programas de uma superpotência", declarou. Para o premiê britânico, Gordon Brown, o encontro será uma oportunidade de coordenar investimentos para uma resposta global à mudança climática. Vale lembrar que a crescente importância adquirida pelo G20 reflete o também crescente peso atribuído aos países emergentes, que integram o grupo juntamente com os ricos.

9. Instituições privadas são convidadas a participar?Sim. Como forma de promover diálogo e sinergia entre estado e mercado, podem tomar lugar nas reuniões especialistas de instituições privadas que sejam convidados a participar. Já a presença do Banco Mundial, do FMI e dos coordenadores do Comitê Financeiro e Monetário Internacional e do Comitê de Desenvolvimento tem a função de assegurar a integração do grupo com as instituições do sistema financeiro internacional criado em Bretton Woods, em 1944, quando se estabeleceram regras para atuação financeira internacional e se tomou o dólar como parâmetro para as outras moedas.

10. Existe mais de um G20?Sim, e isso é uma grande fonte de confusão. Existe o G20 que está sendo explicado aqui, que une países desenvolvidos e outros em desenvolvimento para falar de economia. Ele é chamado de G20 financeiro. Um outro grupo, formado apenas por nações emergentes (mais de 20, na realidade), também se denomina G20. Ele foi batizado pela imprensa de G20 comercial, já que seu foco são as relações comerciais entre países ricos e emergentes. O G20 comercial nasceu em 2003, numa reunião ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC) realizada em Cancún, no México. Liderado pelo Brasil, o grupo procura defender os interesses agrícolas dos países em desenvolvimento diante das nações ricas, que fazem uso de subsídios para sustentar a sua produção. Exceto pela Austrália, Arábia Saudita, Coreia do Sul e Turquia, todas as nações emergentes do G20 financeiro estão no G20 comercial. Também fazem parte deste grupo Bolívia, Chile, Cuba, Egito, Filipinas, Guatemala, Nigéria, Paquistão, Paraguai, Tanzânia, Tailândia, Uruguai, Venezuela e Zimbábue.

11. Há outros grupos internacionais semelhantes?Já surgiram muitos "Gs" no cenário internacional, como G4, G5, G8, G10, G8+5 e os dois G20 citados. Vale lembrar que antes da entrada da Rússia o G8 era G7 e que, por isso, há quem o chame de G7/8 ou G7+1. G8+5 é o nome que se dá aos encontros esporádicos entre o G8 e o G5, mais um grupo informal de países em desenvolvimento: Brasil, China, Índia, México e África do Sul. O G5 vem sendo chamado a se sentar à mesa das grandes potências pela relativa importância econômica que vem conquistando no cenário mundial. Já foram criados vários G4, mas o principal deles foi uma associação entre EUA, Brasil, União Européia e Índia. O principal objetivo do grupo era o de tratar de questões comerciais, quando preciso envolvendo a Organização Mundial do Comércio (OMC). Mas alguns fracassos, como nas negociações feitas em Postdam (Alemanha) sobre a liberalização do comércio mundial, em junho de 2007, levaram à saída do Brasil e da Índia e, consequentemente, ao fim do grupo. No episódio de Postdam, Bush culpou os dois países pelo malogro nas negociações. Fundado em 1964, o G10 reunia as dez maiores economias capitalistas da época. Hoje, são 11: Alemanha, Canadá, Bélgica, Estados Unidos, França, Itália, Japão, Holanda, Reino Unido, Suécia e Suíça. Os países do chamado Grupo dos Dez participam do General Arrengements to Borrow (GAB), um acordo para a obtenção de empréstimos suplementares, para o caso dos

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recursos estimados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) estarem aquém das necessidades de um dos países-membros. O G10 concentra 85% da economia mundial.

Entenda os ataques de piratas na Somália

As recentes capturas de navios de grande porte por piratas da Somália chamaram a atenção para o problema que atinge a região conhecida como Chifre da África. Desde o sequestro de um petroleiro saudita em novembro do ano passado, que durou dois meses, as Marinhas de vários países estão deslocando forças para o local. Trata-se de uma das mais importantes vias de navegação do mundo e também a mais perigosa, com 30% de todos os ataques de piratas do planeta.

Como os piratas capturam os navios?

Os piratas são muito eficientes no que fazem. Eles administram operações sofisticadas, usando os mais modernos equipamentos de alta tecnologia, como telefones por satélite e aparelhos de GPS. Eles também possuem armamentos como lança-granadas e rifles AK-47, e contam com a ajuda de contatos posicionados em portos do Golfo de Áden (entre a Somália e o Iêmen), que os avisam sobre a movimentação dos navios.

Os piratas usam lanchas com motores potentes para se aproximarem de seu alvo. Às vezes, essas lanchas são lançadas de embarcações maiores posicionadas em alto mar. Para se apoderarem dos navios, os piratas primeiro usam ganchos e barras de ferro --alguns também disparados por armas-- e sobem até o convés usando cordas e escadas. Em algumas ocasiões, eles disparam contra os navios para forçá-los a parar, o que facilita sua tomada. Os piratas então conduzem a embarcação capturada até o porto de Eyl, na Somália, o centro das operações da pirataria. Ali, eles geralmente desembarcam os reféns, que são mantidos até o pagamento de um resgate.

Por que não se consegue conter os piratas?

Navios de guerra de pelo menos nove países estão atualmente operando no Golfo de Áden e nas águas fora da costa da Somália, mas isso pode ter apenas deslocado o problema. O navio Sirius Star, capturado em novembro, estava a uma boa distância ao sul da costa somali quando foi pego. A área na mira dos piratas agora inclui quase 25% da superfície do Oceano Índico, tornando o patrulhamento virtualmente impossível. O Bureau Marítimo Internacional está aconselhando os donos das embarcações a adotar medidas como ter vigias e navegar a uma velocidade que os permita deixar os piratas para trás.

Entretanto, os piratas se deslocam extremamente rápido e, em geral, à noite. Portanto, muitas vezes é tarde demais para a tripulação se dar conta do que está ocorrendo. Uma vez que os piratas tenham assumido o controle de um navio, a intervenção militar fica difícil por causa dos reféns a bordo. Não existe uma legislação internacional para os acusados de pirataria, apensar de muitos terem sido julgados no Quênia, enquanto outros presos por militares franceses estão respondendo a julgamento na França.

Alguns diplomatas argumentam que é necessária uma corte internacional para esse tipo de crime, que tenha o apoio da ONU (Organização das Nações Unidas) e, além de uma prisão internacional para os condenados. Em meados de dezembro passado,

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o Conselho de Segurança da ONU aprovou uma resolução autorizando os países a perseguir os piratas somalis também em terra --uma extensão para a permissão que os países já têm para entrar em águas territoriais somalis para perseguir os piratas. Mas enquanto a Somália não tiver um governo efetivo, muitos acreditam que a "vida sem lei" que impera no país e em suas águas só tende a crescer.

Por que os piratas cometem esses crimes?

Por dinheiro. Os piratas tratam os navios, sua carga e seus tripulantes como reféns e exigem o pagamento de um resgate. O dinheiro que recebem é muito em um país onde não há emprego e onde quase metade da população precisa de alimentos, depois de 17 anos de vários conflitos civis. O Ministério das Relações Exteriores do Quênia estima que os piratas tenham faturado US$ 150 milhões no ano passado com o pagamento de resgates. Eles usam parte do dinheiro para custear novos sequestros, comprando mais armas e lanchas.

Como a pirataria afeta as pessoas fora da Somália?

Além dos prejuízos diretos para os envolvidos na indústria da navegação, o principal resultado é o encarecimento do frete com consequente aumento do preço das mercadorias transportadas. As empresas de transporte de carga passam adiante os custos de segurança, seguro, recompensa e combustível extra. Por fim, esse aumento chega ao consumidor comum. Estima-se que a pirataria tenha custado entre US$ 60 milhões e US$ 70 milhões em 2008.

No Brasil, Lugo ameniza tom sobre Itaipu e diz que diálogo é a melhor ferramenta

O presidente do Paraguai, Fernando Lugo, acenou com o diálogo para resolver as questões pendentes entre seu país e o Brasil a respeito da usina hidrelétrica de Itaipu, na fronteira dos dois países. Ele está no Brasil e deve se reunir ainda hoje com o colega brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva. O Paraguai reivindica uma reestruturação do acordo para uso de Itaipu, mas enfrenta resistências junto ao governo brasileiro. "O diálogo é a melhor ferramenta que temos para superar as grandes e pequenas dificuldades entre nosso povo. E com esse espírito que viemos ao Brasil", disse Lugo, após reunião com o presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer (PMDB-SP). O Paraguai detém 50% da produção da usina, mas usa apenas 5%. O restante, por força do Tratado de Itaipu, de 1973, é vendido compulsoriamente ao Brasil, por meio da Eletrobrás. Com os repasses, o Brasil abate a dívida contraída pelo Paraguai na construção de Itaipu, estimada em US$ 19,6 bilhões. O país quer vender o restante de sua parcela livremente no mercado e questiona o valor de sua dívida com o Brasil.

A declaração de Lugo dada hoje é um pouco mais amena que o tom habitual utilizado pelo presidente paraguaio em seu país. "Lutamos por um preço justo, o do mercado. O Paraguai é um país pobre que, de alguma maneira, está subsidiando a energia do Brasil", afirmou ele, em uma entrevista ao jornal espanhol "El Mundo", na primeira quinzena de março. Nessa entrevista, ele "concedeu" o prazo de um ano para chegar a um acordo com o Brasil. "Se neste tempo não tivermos resposta...", disse ele, sem completar a frase. Em Brasília, Lugo destacou ainda que seria importante para o Brasil não ter "um vizinho pobre". "A ninguém convém ter um vizinho pobre. A todos convêm crescerem juntos. Nós precisamos assumir um compromisso com uma integração

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mais sólida", disse, durante encontro com o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP).

Entenda as discussões entre Brasil e Paraguai sobre Itaipu

A usina hidrelétrica de Itaipu será o principal assunto da reunião entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu colega paraguaio, Fernando Lugo, nesta quinta-feira, em Brasília. O governo paraguaio quer mudanças no acordo sobre a usina, que pertence aos dois países. Uma das reivindicações é de que o Brasil pague mais pela energia que compra do país vizinho. Além disso, o Paraguai também quer o direito de vender livremente, a preço de mercado, a energia a que tem direito.

Nos últimos dois meses, o governo brasileiro vem discutindo, informalmente, algumas contrapropostas com o lado paraguaio. Uma delas prevê linhas de financiamento, via BNDES, no valor de US$ 1,5 bilhão, que seriam usadas em obras de infraestrutura no país vizinho. O governo paraguaio considerou "insuficientes" as propostas apresentadas até o momento pelo governo brasileiro. Caberá agora ao presidente Lula conversar pessoalmente com Lugo sobre o futuro da parceria na usina hidrelétrica. Criada em 1973, a usina é considerada a maior do mundo em termos de energia gerada e abastece 20% do território brasileiro. No Paraguai, Itaipu gera 90% do que é consumido.

O que é a Usina de Itaipu?

Localizada no Rio Paraná, na fronteira entre Brasil e Paraguai, a usina hidrelétrica de Itaipu foi criada em 1973, mas apenas em 1984 começou efetivamente a gerar energia. É considerada a maior hidrelétrica do mundo, em termos de energia gerada. Os governos do Paraguai e do Brasil são os dois sócios da empresa, com participações iguais. Quando o tratado foi assinado, ficou acertado que cada país ficaria responsável por 50% do capital inicial (US$ 50 milhões para cada). O Paraguai, no entanto, não tinha recursos financeiros para isso. A saída foi pegar o dinheiro emprestado com o Brasil, não só para o capital inicial, mas também para outros investimentos, na medida em que o empreendimento era executado. O resultado é uma dívida de US$ 18 bilhões, a ser paga até 2023.

Isso faz do Brasil dono da empresa?

Não. A usina pertence aos dois países. Brasil e Paraguai têm direito, cada um, a 50% da energia gerada. A empresa tem também duas diretorias, uma de cada lado da fronteira. No entanto, como o Brasil foi o país que efetivamente pagou pelo projeto, os dois governos concordaram, na época, que o Brasil teria certas preferências. Uma delas diz respeito à energia excedente. O Paraguai tem direito a 50% da energia gerada, mas como não precisa de todo esse montante, acaba usando apenas 5%. O tratado diz que o restante (no caso, 45%) deve ser vendido obrigatoriamente à Eletrobrás, a preço de custo.

Por que o Paraguai se sente prejudicado?

O governo paraguaio questiona uma série de pontos do acordo sobre Itaipu. O país vizinho quer o direito de vender sua parte para quem quiser, da forma como quiser. O argumento é de que o Brasil "paga pouco" pela energia, e que outros compradores estariam dispostos a pagar o preço de mercado. O Brasil paga ao Paraguai US$ 45,31 por megawatt-hora (MWh). No entanto, desse valor, o Paraguai recebe efetivamente

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US$ 2,81. A diferença (de US$ 42,5) é retida pelo governo brasileiro, como abatimento da dívida.

O que diz o governo brasileiro?

O governo brasileiro tem se mostrado contrário à possibilidade de o Paraguai vender livremente a energia a que tem direito. Um dos argumentos é de que a regra faz parte do tratado e que, para mudar o documento, seria preciso a aprovação do Congresso Nacional. Além disso, o Brasil precisaria dessa energia para consumo geral. Sobre o valor pago ao Paraguai, o governo brasileiro discorda de que seja "pouco". Para isso, compara o valor da energia de Itaipu com o de outros projetos. As usinas do Rio Madeira, quando estiverem prontas, vão oferecer energia a R$ 71 (cerca de US$ 33) - valor "ainda menor" do que o de Itaipu.

O governo brasileiro está disposto a fazer alguma concessão?

Durante as conversas extraoficiais, o governo brasileiro sinalizou com algumas ofertas. A ideia central é de permitir que o Paraguai use mais a energia a que tem direito. Para isso, o governo propôs novas linhas de financiamento ao país vizinho, no valor de US$ 1,5 bilhão. O capital seria empregado em obras de infraestrutura, ampliando a necessidade de uso energético. O governo brasileiro estaria também aberto a um reajuste no valor pago pela cota paraguaia, passando dos atuais US$ 45 para algo em torno de US$ 47. Apesar das intensas negociações nos últimos meses, a palavra final sobre a proposta será dada pelo presidente Lula.

Por que as discussões sobre Itaipu ganharam força agora?

A usina hidrelétrica de Itaipu é extremamente importante nas discussões econômicas e políticas no Paraguai. A usina responde por 90% de toda a energia usada pelo país. Quando a dívida for quitada, em 2023, Itaipu estará valendo, de acordo com estimativas, cerca de US$ 60 bilhões --quase três vezes o PIB paraguaio. O assunto foi a principal bandeira da campanha de Lugo à Presidência do Paraguai, quando prometeu brigar por um acordo "mais justo" com o Brasil. A avaliação do governo brasileiro é de que Lugo precisa "entregar o que prometeu". A questão ganhou ainda maior importância diante do momento delicado pelo qual passa o presidente paraguaio, envolvido em escândalos de paternidade.

Brasil

Na idade das trevas

Desde 1985, o Brasil sofre, em média, um blecaute de proporções nacionais a cada seis anos. A confiabilidade do nosso sistema, portanto, é baixa. O governo não consegue jogar luz sobre as causas do problema. Sua única preocupação é tentar provar que "o apagão de Lula" é bem menor que "o de FHC". É irracional

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Durante o apagãoAvenida paulista, em São Paulo, no dia 10 de novembro de 2009, às 22h43

Após o apagãoAvenida paulista, em São Paulo, no ia 12 de novembro de 2009, às 22h17

Na terça-feira passada, 10 de novembro 2009, às 22h13, o Brasil acendeu as velas para enfrentar mais um blecaute de dimensões nacionais. Sim, mais um. A frequência com que o nosso sistema de energia elétrica entra em pane é inquietante. Desde 1985 temos, em média, um mega-apagão a cada seis anos. Desta vez, a falta de luz afetou, em maior ou menor grau, dezoito estados, deixando às escuras 88 milhões de brasileiros. Nosso sócio na geração elétrica em Itaipu, o Paraguai, também foi tirado da tomada. São Paulo e Rio de Janeiro foram os estados mais amplamente atingidos, mas a anormalidade se fez sentir até no Acre, no Rio Grande do Sul e no Rio Grande do Norte. Foi o maior apagão da história brasileira em extensão. No total, 28 000 megawatts, ou 45% de toda a energia que estava sendo consumida no Brasil naquele momento, sumiram dos fios. A situação só foi normalizada cinco horas e 47 minutos depois. Raiava a manhã quando a última subestação derrubada pelo blecaute se recuperou. O Brasil voltou à normal.

Sim, mas até quando? Pelo seu desenho estrutural, qualidade de manutenção das redes e base de geração de energia, o sistema elétrico brasileiro tem uma eficiência de 95%. Isso significa que o sistema convive com uma janela de incertezas de 5% (1/20), o que, estatisticamente, aponta para uma grande falha a cada vinte anos. Como os blecautes têm ocorrido com frequência bem maior (1985, 1999, 2002 e 2009, para citar os mais recentes), é inevitável concluir que o sistema funciona aquém de sua eficiência projetada. Isso decorre de diversos fatores. Primeiro, do acentuado descontrole do regime de chuvas, que torna o nível dos reservatórios uma loteria. Segundo, da inadequada manutenção de certos trechos das linhas de transmissão. E, terceiro, da própria operação do sistema. Esse último ponto se refere à complexa administração entre produção e consumo de eletricidade por um vasto sistema integrado que cobre quase todo o território nacional em uma grade única. Se há demanda demais e oferta de menos, o sistema pode cair e produzir um blecaute. A

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situação contrária também é potencialmente perigosa. Ela ocorre quando as usinas injetam muito mais energia nos cabos de transmissão do que o necessário. Em ambos os casos, o desequilíbrio pode atingir limites máximos de segurança, fazendo com que os equipamentos do sistema, por precaução, se desarmem em cascata a ponto de derrubar toda a rede. Não se sabe o que exatamente provocou o blecaute da semana passada, mas, como das outras vezes, ele ocorreu pelo conhecido efeito dominó que desliga equipamentos ao longo da linha de transmissão em virtude de um desequilíbrio sério que põe em risco a rede e os equipamentos dos usuários nas casas.

O que se sabe até agora é que o apagão teve início no principal ramal de transmissão elétrica do país, que leva toda a eletricidade de Itaipu, a hidrelétrica que mais produz energia no mundo, até São Paulo. De lá, boa parte da energia é redirecionada para o resto do país. Por esse ramal, operado por Furnas, trafegam 20% de toda a energia brasileira. O trabalho de transmissão é feito por cinco linhas. Três delas, as principais, vão de Foz do Iguaçu até a subestação de Tijuco Preto, perto de São Paulo. Elas passam por duas subestações, localizadas nas cidades de Ivaiporã (PR) e Itaberá (SP). As duas linhas restantes, de menor capacidade, levam energia de Itaipu até a subestação de Ibiúna, também próxima à capital paulista.

O apagão começou nas três linhas principais, de potência mais alta. "Houve um curto-circuito na primeira linha, às 22h13. Depois de 70 milésimos de segundo, a segunda linha foi atingida por outro curto. Mais 50 milésimos, e a terceira linha sofreu o mesmo problema. Foi uma falha tripla, praticamente simultânea, antes de Itaberá", disse a VEJA Hermes Chipp, diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), autarquia federal que monitora todas as usinas e linhas de transmissão do país e goza de excelente reputação técnica não apenas no Brasil mas em suas congêneres do mundo. Um curto-circuito se dá quando dois fios desencapados se tocam liberando instantaneamente uma energia descomunal que, de outra forma, teria se dissipado ao longo de todo o circuito. Daí o nome curto-circuito. É um fenômeno comum no velho e enferrujado ferro de passar da casa da vovó ou chuveiro elétrico da casa de praia. É raríssimo em uma rede de transmissão de energia. A ocorrência de três curtos-circuitos de uma só vez numa rede de transmissão de eletricidade é, desde já, um evento a ser estudado no campo das probabilidades infinitas. O triplo curto-circuito desencadeou o efeito dominó que escureceu o Brasil na semana passada. As subestações das três linhas principais caíram, interrompendo a passagem da energia de Itaipu. As duas linhas de menor capacidade não conseguiram suprir, sozinhas, toda a demanda do sistema, e também caíram. Com as cinco linhas cortadas, o inevitável ocorreu. Itaipu passou a regurgitar toda a eletricidade que produzia, uma situação grave que, se não é aliviada rapidamente, provoca explosões nos transformadores e conversores da usina, inutilizando-a por meses e até anos. Para evitar o desastre, todas as turbinas de Itaipu foram desligadas.

Nesse instante, São Paulo e Rio de Janeiro já estavam às escuras. Para tentar evitar uma crise sistêmica de abrangência nacional, os computadores do ONS enviaram comandos eletrônicos às demais usinas do país instruindo-as a liberar toda a carga potencial, de modo a suprir em parte o sumiço instantâneo dos 14 000 megawatts de Itaipu. Esses processos são automáticos. Levam menos de dez segundos. Mas de nada adiantou a rapidez da reação. Em um sistema integrado, como na circulação do corpo humano, o que ocorre em um ponto qualquer do percurso da eletricidade ou do sangue tem efeito sobre toda a rede. Quando as usinas paulistas de Ilha Solteira, Jupiá, Água Vermelha, Taquaruçu e Capivara atenderam aos comandos do ONS, o sistema já estava em pane. Os técnicos definem esses momentos cruciais como "colapso de tensão". Em um movimento de autodefesa, as subestações se desplugam uma depois da outra em cascata. Diz Hermes Chipp: "Quando há um colapso de

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tensão, você perde o controle do sistema e torna-se impossível isolar o problema original".

Retomada a normalidade na manhã seguinte, permaneceu aguda a necessidade de saber o que exatamente provocou a cadeia de eventos que levou ao blecaute. A versão do governo, mais preocupado com as reações em cascata do blecaute na saúde eleitoral da candidata da situação, girou em torno do pensamento mágico, pondo a culpa em forças além do controle do homem – não só do "cara". Para acreditar na versão oficial, é preciso aceitar que três raios poderosos possam ter caído quase ao mesmo tempo sobre três linhas de transmissão – sendo que uma delas dista 20 quilômetros das outras duas. O órgão que monitora tempestades e raios no Brasil em tempo real é o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Seus técnicos informam que não detectaram nenhuma descarga atmosférica significativa na região cortada pelas linhas de transmissão de Itaipu. Para serem exatos, os técnicos do Inpe destacam que no momento do blecaute caiu um raio a pouco mais de 30 quilômetros da subestação de Itaberá. Poderia esse raio ser culpado? "A probabilidade de um raio ser a causa do desligamento é igual a zero", afirma Osmar Pinto Júnior, do Grupo de Eletricidade Atmosférica. De onde vem tanta certeza? Afinal, raios são fenômenos enigmáticos e de duração efêmera. O único raio registrado naquele instante era muito fraco para causar problemas. Ele tinha 12 000 ampères. Para desligar uma única subestação, seria preciso uma descarga oito vezes maior – ou seja, um raio com corrente de pelo menos 100 000 ampères.

A versão oficial não se sustenta no universo da física. E é ainda mais frágil no campo da lógica. Simplesmente, o sistema de energia brasileiro não pode ser vulnerável à queda de raios. Primeiro porque o Brasil é o país sobre cujo território mais caem raios no mundo. São 60 milhões de descargas atmosféricas por ano. Pelo menos vinte delas atingem, a cada dia, uma linha de transmissão – sem que isso produza megablecautes. Na última quinta-feira, a reportagem de VEJA estava em Itaipu e presenciou a passagem de uma tempestade de raios ao lado da usina. O que aconteceu? Os raios fizeram apenas cócegas em Itaipu. Na hora da tempestade, a usina fornecia 800 megawatts ao Paraguai. Os raios começaram e houve redução da carga para 720 megawatts. Em quinze minutos, tudo havia voltado ao normal. Isso acontece em média uma vez por mês. É rotineiro. O que não é rotina é raio provocar blecaute. Não deveria também ser rotina de governo dar como "caso encerrado" um blecaute que infernizou a vida de 88 milhões de brasileiros e cuja causa permanece um mistério.

Convenção do Clima de Copenhague

Há mais de uma década a ONU promove encontros para discutir o aquecimento global e estabelecer regras para combatê-lo. De todos, o mais frutífero foi aquele que elaborou, em 1997, o Protocolo de Kyoto. Na época, porém, o documento determinou apenas metas válidas até 2012. Com intuito de traçar os objetivos a serem cumpridos depois desta data, líderes de todo o mundo se reunirão na Dinamarca em dezembro. Entenda em que pé estão as negociações e que tipo de acordo poderá ser estabelecido.

1. O que é a COP15?

A COP15, como o nome já sugere, é o décimo quinto encontro realizado pelos países signatários da Convenção Marco sobre Mudança Climática, acordo firmado durante a

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ECO-92, no Rio de Janeiro, que estabeleceu diretrizes para uma coordenação internacional contra o aquecimento global. A Convenção acontecerá em Copenhague, na Dinamarca, entre os dias 7 e 18 de dezembro de 2009.

2. Qual é o seu objetivo?

Negociar, redigir e aprovar os termos da segunda parte do Protocolo de Kyoto – a primeira foi elaborada e definida em 1997, entrou em vigor em 2005 e expira em 2012. Essa continuidade do Protocolo estabeleceria novas metas de redução da emissão de gases de efeito estufa a serem cumpridas a partir de 2013 ou 2014.

3. Quem vai participar do encontro?

Ministros do meio ambiente e representantes dos 192 países signatários da Convenção Marco sobre Mudança Climática (UNFCCC, na sigla em inglês). São aguardadas em Copenhague mais de 15.000 pessoas, entre autoridades da ONU, presidentes, diplomatas e jornalistas.

4. Qual será a principal discussão?

O debate central deve ser sobre a diminuição das emissões de gases causadores do efeito estufa, sobretudo o dióxido de carbono (CO2) – as propostas prevêem reduções de 25% a 40% até 2020, com base em valores obtidos em 1990. O objetivo é bem mais ousado do que o estipulado pela primeira parte do Protocolo, que era de reduzir em 5% as emissões entre 2008 e 2012. Naquela época, o cumprimento desta meta coube apenas aos países desenvolvidos – o Brasil e a Índia, por exemplo, não foram enquadrados na regra. Esta determinação, no entanto, deve ser revista em Copenhague e deve ser outro tema de importância nas discussões.

5. Qual é a chance de sucesso?

O sucesso do acordo depende em grande parte da adesão dos Estados Unidos. Segundo maior poluidor do mundo, o país não ratificou a primeira parte do Protocolo de Kyoto – na época, o então presidente George W. Bush alegou que reduzir as emissões prejudicaria a economia americana. Com a eleição de Barack Obama, o cenário se tornou mais positivo – logo após a posse, ele sugeriu que seu país diminuísse em 80% as emissões de gases de efeito até 2050 –, o que não significa, no entanto, que os EUA aderirão às cegas a qualquer proposta. Em recente entrevista ao New York Times, Yvo de Boer, secretário-executivo da COP15, declarou que pode não haver mais tempo para um acordo ser firmado em Copenhague. Ainda, segundo ele, a tendência é que os países anunciem medidas interinas e prossigam a discussão no próximo ano.

6. Quais são os países de maior destaque na negociação?

Os países em desenvolvimento, como o Brasil, a China e a Índia, cuja participação na poluição mundial vem aumentando significativamente. Também se destacam nações desenvolvidas como as da Europa, os EUA e o Canadá, que tradicionalmente são as que mais emitem poluentes.

7. O que o Brasil deve defender?

O Brasil deverá ser a favor de que os países em desenvolvimento também reduzam suas emissões. Esse posicionamento está alinhado com o Plano Nacional de

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Mudança Climática, que previu, por exemplo, a redução do desmatamento na Amazônia em 70% até 2017 – a atividade é a principal fonte de emissões de dióxido de carbono no país.

8. Quando começaram as convenções da ONU sobre o clima?

A primeira Convenção sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas aconteceu em Berlim, na Alemanha, em 1995. Foi então que o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) publicou seu segundo relatório sobre o impacto do aquecimento global no planeta.

9. Que importantes negociações antecederam a COP15?

A primeira delas foi a ECO-92, no Rio de Janeiro, quando mais de 160 governos assinaram a Convenção Marco sobre Mudança Climática, dando início ao combate ao aquecimento global. Cinco anos depois, em Kyoto, no Japão, outro encontro negociou um acordo para reduzir a emissão de gases de efeito estufa – 84 países aderiram. O Protocolo de Kyoto, como ficou conhecido o tratado, entrou em vigor em 2005 com 150 nações signatárias. No final de 2007, durante a 13ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, na Indonésia, os participantes concordaram em iniciar negociações para formular a segunda parte de Kyoto.

10. Quais são as nações mais poluidoras do mundo?

Os maiores emissores de dióxido de carbono são, em ordem decrescente: China, EUA, Rússia, Índia, Japão, Alemanha, Canadá, Grã-Bretanha, Coreia do Sul e Irã. O Brasil ocupa a 17ª posição no ranking.

 

Tratado de Lisboa

Em outubro de 2009, os presidentes da Irlanda, Mary McAleese, e da Polônia, Lech Kaczynski, sancionaram o Tratado de Lisboa, um documento que pretende unificar a legislação na Europa. É mais um passo no processo de ratificação do texto de reforma da União Europeia. Para entrar em vigor, ainda falta a assinatura do presidente checo, Vaclav Klaus, que decidiu impor algumas condições para a aprovação. Entenda o que significa o tratado para o bloco europeu e para o mundo.

1.O que é o Tratado de Lisboa?

É um documento assinado em dezembro de 2007 pelos 27 estados-membros da União Europeia (UE), depois de seis anos de debates. É o mais recente de uma série de tratados que atualizam e consolidam a base jurídica do bloco.

2. Por que a Europa precisa de um novo tratado?

Atualmente, a Comunidade Europeia e a União Europeia possuem estatutos diferentes e não funcionam de acordo com as mesmas regras de decisão. O Tratado de Lisboa pretende fornecer ao bloco uma personalidade jurídica única, além de modernizar e reformar seu modo de funcionamento, cujas regras em vigor foram concebidas quando a UE tinha apenas 15 países-membros (hoje são 27).

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3. Quais os principais objetivos do tratado?

Em linhas gerais, o Tratado de Lisboa pretende aumentar a coesão do bloco europeu, tornando-o mais democrático, eficiente e transparente. Para isso, são levados em conta novos desafios globais como segurança energética, sustentabilidade e alterações climáticas, entre outros temas.

4. Quais as principais modificações implementadas?

• Criação do cargo de presidente europeu;• Criação do cargo de alto-representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, que desempenhará também a função de vice-presidente da Comissão Europeia;

• Aumento dos poderes dos parlamentos nacionais;

• Aumento da capacidade de intervenção dos cidadãos;

• Simplificação do processo de decisão a nível europeu;

• Reforço do papel da UE na busca pela sustentabilidade e no combate às alterações climáticas;

• Proteção dos direitos de cidadão, através da Carta dos Direitos Fundamentais.

5. Quem irá eleger o presidente europeu?

O presidente europeu será eleito pelos membros do Conselho Europeu, por um período máximo de cinco anos.

6. Como aumentará a participação dos cidadãos nas decisões legislativas da UE?

Os cidadãos poderão se dirigir diretamente à Comissão Europeia através da apresentação de petições com no mínimo 1 milhão de assinaturas (numa população de 500 milhões de habitantes da UE)

7. Como será a participação dos parlamentos nacionais?

Todas as propostas legislativas da UE deverão ser transmitidas aos parlamentos nacionais, que terão oito semanas para defender a sua posição. Se um número suficiente de parlamentos nacionais apresentar objeções, a proposta pode ser alterada ou retirada.

8. Como serão adotadas as decisões do Conselho?

Elas irão se basear no sistema de votação por maioria qualificada, ou seja, precisarão ser aprovadas por 55% dos estados-membros, representando pelo menos 65% da população europeia. Para que um pequeno número de países mais populosos não impeça a adoção de uma decisão, serão necessárias pelo menos quatro nações para formar uma minoria de bloqueio. As questões tributária, de defesa, política externa e segurança social continuarão a exigir aprovação unânime dos 27 estados-membros.

9. Como fica a questão da segurança?

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As forças militares continuam a depender dos estados-membros, mas o tratado autoriza os países a disponibilizar recursos civis e militares com vista à realização de operações de segurança e defesa comuns. Qualquer país do bloco poderá se opor a essas operações e a participação nesse tipo de intervenções será sempre numa base voluntária.

10. Por que o presidente checo se opõe à assinatura?

Vaclav Klaus condiciona a assinatura do Tratado sobretudo a uma garantia de que os alemães expulsos das fronteiras da atual República Checa após a Segunda Guerra Mundial não poderão reclamar os bens confiscados na ocasião.

Conheça o Tratado de Lisboa, que reformou as instituições europeias

Após um longo processo, o Tratado de Lisboa, que reforma, centraliza e simplifica os processos de decisão da União Europeia, foi desbloqueado no início deste mês, com a assinatura do presidente da República Tcheca, o "eurocético" Vaclav Klaus. A República Tcheca foi a 27ª nação do bloco a aprovar o documento que pretende ainda fortalecer o papel da UE no mundo. Criado na capital portuguesa em 13 de dezembro de 2007, o Tratado estabelece diversos mecanismos para facilitar a tomada de decisões entre os membros e para reforçar o Europarlamento. O conjunto de regras do Tratado de Lisboa foi formulado depois que uma proposta de Constituição Europeia foi abandonada após a rejeição em consulta popular na Holanda e na França. O atual projeto retoma, com menos força, alguns dos itens da Carta. Além da República Tcheca, a principal resistência ao texto apareceu na Irlanda, que rejeitou o tratado em referendo, mas acabou aprovando-o em uma segunda votação neste ano, após receber a garantia reiterada de que o tratado não afetaria a sua neutralidade, a tributação e leis sobre o aborto.

Presidente em tempo integral

O tratado instaura o cargo de presidente do Conselho Europeu, o órgão de dirigentes da UE, que terá mandato de dois anos e meio, renovável por mais um período. O presidente coordenará os trabalhos do Conselho Europeu e poderá representar a UE no exterior. O sistema de rotação semestral entre os atuais líderes dos países membros continuará valendo para a Presidência dos conselhos de ministros, com exceção do Conselho de Ministros de Relações Exteriores. A limitação do cargo, contudo, não está clara quanto ao atual cargo de Alto Representante da UE para Política Externa e Segurança, cujos poderes são reforçados e que contará com um serviço diplomático. O alto representante acumulará ainda as funções de vice-presidente da Comissão Europeia.

Decisões mais fáceis

O principal objetivo do novo tratado é facilitar a tomada de decisões no bloco. O documento veta os votos nacionais e introduz a maioria qualificada em cerca de 40 temas, principalmente no que diz respeito à cooperação judicial e policial. Os britânicos e irlandeses obtiveram a possibilidade de aplicar às decisões no que diz respeito a estes temas de sua própria matéria. A unanimidade continua sendo a regra para política exterior, a fiscalização, a política social e a revisão dos tratados.

Novo sistema de votos

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O novo sistema de tomada de decisões por voto dos Estados é considerado mais claro e igualitário. A decisão por maioria qualificada será tomada se a mesma obtiver ao menos 55% do apoio dos Estados --15 dos 27-- e se estes representarem ao menos 65% da população da UE. Esta mudança dará mais peso aos países mais populosos. A aplicação deste sistema, contudo, foi postergada até 2014, depois de pedido da Polônia.

Parlamento fortalecido

O tratado outorga ao Parlamento Europeu, a única instituição da UE eleita por cidadãos, poder de decisão em áreas como agricultura, pesca e assuntos policiais e judiciais. Sua influência na eleição do futuro presidente da Comissão será maior.

Direitos dos cidadãos

O texto prevê um mecanismo de iniciativa popular, como a possibilidade de "convidar" a comissão Europeia a apresentar uma proposta legislativa através de uma petição assinada por um milhão de cidadãos.

Saída

O Tratado de Lisboa determina ainda a possibilidade de que um país abandone a UE diante de negociação com seus países-membros.

Com France Presse

Entenda as alterações climáticas causadas pelo aquecimento global

Boa parte da Europa irá esfriar e regiões quentes -- como o oeste da China e o Oriente Médio -- sofrerão elevações de 7ºC nas temperaturas médias até o ano 2100. Na floresta Amazônica, as temperaturas serão mais altas e as estações de secas serão mais longas a cada ano.

Essas previsões inquietantes sobre possíveis alterações do clima causadas pelo aquecimento global podem ser lidas abaixo em trecho do livro "O Aquecimento Global", da "Série Mais Ciência".

O livro analisa os problemas do aumento da temperatura da Terra, fala sobre as conseqüências do efeito estufa, dos danos à camada de ozônio e de fenômenos como o El Niño.

Mudança do clima

O clima na maioria dos lugares se tornará mais quente; em alguns, no entanto, a temperatura será mais fria. No Canadá, na Rússia e na Escandinávia, por exemplo, devem ocorrer processos mais rápidos de aquecimento. Isso se deve, em parte, ao feedback positivo causado pelo degelo, que será mais intenso. A boa notícia é que plantações e árvores crescerão melhor. A má é que grande parte das áreas da superfície, da mais quente à mais fria, devem se aquecer mais do que a média. O

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aquecimento será mais intenso no interior dos continentes, porque a circulação dos oceanos terá influência moderadora sobre as áreas costeiras.

Costa fria

Os oceanos vão retirar o calor da superfície nas áreas costeiras ou, pelo menos, daquelas que restarem depois que o nível dos mares subir

O quente fica mais quente

Algumas das regiões mais quentes devem sofrer algumas das maiores elevações de temperatura. Grande parte da Ásia do oeste da China até a Arábia Saudita, que regularmente enfrenta temperaturas acima de 40ºC, deve sofrer elevações de 7ºC até o ano 2100. O norte da África e o sul da Europa também devem passar por grande aquecimento. Países com forte influência do mar e clima equilibrado hoje como Irlanda, Nova Zelândia e Chile sofrerão menores mudanças. Outras tendências no planeta, muitas já evidentes, apontam aquecimento maior à noite durante o inverno. Isso sugere menos neve e mais chuva, além de estações de cultivo sem geadas prolongadas nas latitudes medianas.

Europa resfriada

A Corrente do Golfo, parte de um sistema de circulação do oceano no Atlântico Norte, é movida pela formação de gelo no Ártico. Banha o oeste da Europa com águas quentes, especialmente no inverno, e mantém as temperaturas mais altas do que em outros pontos da mesma latitude. Cientistas do Instituto para Pesquisa do Impacto Climático em Potsdam, na Alemanha, prevêem o possível colapso da Corrente do Golfo por causa do aquecimento global. Como resultado, boa parte da Europa irá esfriar.

Fluxo de água quente

A imagem do oceano mostra que a água congelada deixa para trás água salina densa, que desce até o fundo e abre espaço para um fluxo de água quente dos trópicos

Mudanças de rota

Estudos científicos revelam que menos gelo irá se formar por causa do aquecimento do mundo. Essa previsão, associada ao maior fluxo de água doce no Ártico, poderia encerrar o mecanismo de formação de água profunda, que cria a Corrente do Golfo. No início de 2001, pesquisas norueguesas forneceram evidências de que as correntes da região na direção norte diminuíram em 20% desde 1950.

Diferenças na hidrologia

A temperatura não será a única mudança no próximo século. Em muitos lugares, haverá alterações no ciclo hidrológico a circulação de água entre o mar, a atmosfera e a superfície da Terra e, portanto, nos padrões de chuva, enchentes e seca, no fluxo dos rios e na vegetação.

A água irá desaparecer de lugares onde é esperada e necessária e reaparecerá onde é inesperada, ou simplesmente se tornar imprevisível. Como o aquecimento torna a atmosfera mais energética, as taxas de evaporação e formação de nuvens e

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tempestades deverão aumentar, embora os efeitos dessas mudanças possam variar conforme a localização.

Nem uma gota

A falta de chuva está esvaziando as torneiras e os canais de irrigação do norte da África e Ásia Central até o sul da Europa

Mais seca

A maior evaporação poderá secar o interior dos continentes durante o próximo século. Desertos irão aumentar; oásis, morrer; e fluxo de rios, diminuir, algumas vezes com resultados catastróficos. Ninguém pode prever com precisão o futuro dos rios, mas um estudo sugere declínio de 40% no fluxo do rio Indo, a única fonte de água do Paquistão e um dos maiores sistemas de irrigação do mundo. A mesma pesquisa estima perda de 30% no fluxo do rio Niger, que banha cinco países áridos no oeste da África, e queda de 10% no Nilo, a água vital do Egito e do Sudão.

A Ásia Central pode esperar declínio ainda mais drástico nos rios que escoam no mar de Aral, que já está virtualmente secando por causa da irrigação. Outros mares em risco incluem o Cáspio, o Grande Lago Salgado, nos Estados Unidos, e os lagos Chade, Tanganica e Malauí, na África. Modelos climáticos indicam também a probabilidade de ocorrer mais secas na Europa, na América do Norte, no centro e no oeste da Austrália. Alguns rios australianos poderiam perder metade de seu fluxo, enquanto o outback (sertão australiano) se tornaria mais seco.

Atualmente, 1,7 bilhão de pessoas vive em países que os hidrologistas descrevem como sob estresse hídrico, porque usam mais de 1/5 de toda a água teoricamente disponível. Estima-se que esse número irá subir para 5 bilhões em 2025. Esse cenário aumenta o espectro da guerra pela obtenção de água. Os países lutariam para controlar o mais precioso de todos os recursos.

A areia se espalha

Com a diminuição da chuva na maior parte do oeste da África, o deserto do Saara está se expandindo

O deserto que era verde

Pinturas em rochas mostram que, no passado, o Saara foi uma região de criação de gado. Pólen fossilizado também revela que existiam florestas, rios e lagos. O Saara se transformou em deserto em poucas décadas, há cerca de 5.500 anos, e poderia voltar ao seu estado original rapidamente, segundo alguns pesquisadores. A região está em uma situação-limite, porque sua vegetação depende dos feedbacks de reforço entre a atmosfera e a vegetação. O estado atual, com pouca vegetação, produz chuvas escassas. Pequeno aumento na quantidade delas (causado pelo aquecimento global) e até na vegetação seria suficiente para fazer o Saara voltar a ser uma selva.

Como o Saara é hoje

A paisagem atual é árida e contém pouca umidade. Há, portanto, pouca evaporação e nenhuma chuva. A maior parte dos modelos climáticos sugere que o Saara ficará ainda mais seco e acarretará a desertificação de áreas próximas.

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Como seria amanhã

Caso o Saara fosse coberto pela vegetação, a terra iria absorver mais umidade. Resultado: mais chuvas e maior evaporação.

Aumento das enchentes

Evaporação mais rápida proporciona aumento da umidade no ar. O calor extra e a umidade irão gerar tempestades tropicais mais intensas. Haverá mais chuva nas regiões costeiras, particularmente, e ao longo das rotas das tempestades. A média anual de chuvas aumentou em 10% durante o século 20. Alguns modelos presumem que tempestades inesperadas na várzea do Mississippi, por exemplo, tendem a deixar esse rio ainda mais propenso a enchentes.

O Caribe, o sudeste da Ásia e outras regiões já suscetíveis a furacões e ciclones passam a ter ventos ainda mais fortes, chuvas mais pesadas e enchentes relâmpagos. Partes do sistema de monções da Ásia podem ser ainda mais intensas. Mas a monção também será menos previsível e até mais freqüente. Com maior quantidade de calor na atmosfera tropical e no oceano, o El Niño (ver à direita) tem condições de se tornar um evento quase permanente.

O mar encolheu

O mar de Aral já foi o quarto maior mar interno do mundo. Mas sistemas de irrigação acabaram reduzindo-o imensamente. A salinidade triplicou, a pesca acabou. E o aquecimento global pode fazer esse cenário ficar ainda pior.

Doenças

Um mundo mais quente permitirá que mosquitos levem doenças, como malária e dengue, a países fora dos trópicos.

O que é o El Niño?

Fenômeno natural cuja existência foi rastreada durante milhares de anos, é a reversão periódica dos ventos e das correntes oceânicas na área tropical do oceano Pacífico, que dura entre nove meses e um ano. Esse processo drena os sistemas pluviais da Ásia e provoca secas em áreas úmidas, como Indonésia e Austrália. Enquanto isso, as ilhas dos Mares do Sul, normalmente plácidas, e a costa do Pacífico nas Américas, muito seca, sofrem com tempestades.

Entenda a crise política em Honduras

Horas após confrontos violentos entre a polícia e manifestantes em apoio ao presidente deposto, Manuel Zelaya, o presidente interino de Honduras, Roberto Micheletti, afirmou à Rádio Nacional que "não houve golpe de Estado e nem nada parecido" no país. Micheletti tenta convencer a comunidade internacional, unânime na condenação da deposição de Zelaya, que sua chegada ao poder está conforme a Constituição.

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Quem deu o golpe em Honduras? Militares, com apoio da Corte Suprema, que disse ter ordenado a prisão de Zelaya, e o Congresso, que leu uma suposta carta de renúncia dele. Presidente negou ter deixado o cargo. Qual é o motivo da crise política? Zelaya decretou a realização de uma consulta nacional sobre a possibilidade de convocar uma Assembleia Constituinte. A pesquisa, que aconteceria ontem, foi considerada ilegal pela Justiça, pelo Congresso e pelo Ministério Público.

O que diz o presidente? O neoaliado do venezuelano Hugo Chávez diz que a consulta não tem força de lei e que ele desejava abrir caminho para uma Constituição que desse voz aos pobres, 70% do país. O que diz a oposição a Zelaya? O presidente descumpriu uma ordem judicial, e por isso foi preso. A intenção de Zelaya com a consulta é impor uma nova Carta que permita a reeleição. Qual a situação agora? Todos os países das Américas condenaram o golpe e exigem o retorno de Zelaya. Congresso e Justiça hondurenha dizem que haverá governo interino até eleições gerais de novembro.

  Presidente deposto de Honduras chega aos EUA para discursar na ONU

 O presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, chegou a Nova York para discursar na Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas). Ele irá pedir o apoio da comunidade internacional para voltar ao poder.

Zelaya irá expor, diante dos 192 países-membros da organização, a situação em que se encontra seu país após o golpe militar que o tirou do cargo de presidente. Ele também terá uma reunião com o presidente da Assembleia Geral, o nicaraguense Miguel D'Escoto, que tem intenção de acompanhá-lo na próxima quinta-feira, quando o presidente deposto planeja retornar a Tegucigalpa. Zelaya aceitou a oferta do secretário da OEA (Organização dos Estados Americanos), José Miguel Insulza, de acompanhá-lo na viagem. A presidente da Argentina, Cristina Kirchner, também formará parte da comitiva, segundo fontes do governo de Buenos Aires. Nesta segunda-feira, ele afirmou que voltará ao país como "presidente eleito, para terminar meu mandato de quatro anos". No entanto, o presidente interino de Honduras, Roberto Micheletti, advertiu que os tribunais "têm uma ordem de captura" pronta caso ele decida retornar ao país. Micheletti, que era presidente do Congresso até ser rapidamente empossado para substituir Zelaya, disse que a ordem é consequência dos "crimes" que cometeu por causa de seu "interesse em continuar no governo ou pela atitude prepotente que ele tinha assumido nos últimos meses de governo".

Golpe

Zelaya foi derrubado do poder em um golpe orquestrado pela Justiça e o Congresso e executado por um grupo de militares que o expulsaram para a Costa Rica. O golpe foi realizado horas antes de o país iniciar uma consulta pública sobre um referendo para reformar a Constituição. O presidente deposto queria incluir o referendo sobre a convocação da Assembleia Constituinte --que, segundo críticos, era uma forma de Zelaya instaurar a reeleição presidencial no país-- nas eleições gerais de 29 de novembro. A proposta, contudo, foi rejeitada pelo Congresso. Os parlamentares afirmaram que a deposição de Zelaya foi aprovada por suas "repetidas violações da Constituição e da lei e desrespeito a ordens e decisões das instituições". O presidente deposto defendeu-se dizendo ser vítima de "um complô de uma elite voraz, uma elite que só quer manter o país isolado, em um nível extremo de pobreza".

Manifestações

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As manifestações a favor e contra o presidente deposto de Honduras continuam nesta terça-feira, mesmo com o reforço da segurança feita pela polícia e pelo Exército. Após os confrontos registrados na segunda-feira, organizações populares partidárias de Zelaya mantiveram os protestos para exigir seu retorno ao poder, ao mesmo tempo em que entidades defensoras da Constituição convocaram uma marcha pela paz em Tegucigalpa. Enquanto isso, o sistema educacional está praticamente paralisado porque a maioria dos professores do setor público está em greve para exigir que o presidente deposto volte ao poder. Outros protestos acontecem em San Pedro Sula, na região norte do país, onde cerca de 500 manifestantes se reuniram no centro da cidade.

Com Efe e Associated Press

No Mercosul, Lula pede restituição de Zelaya "o quanto antes"

da Ansa, em Assunção

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a defender o presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, na abertura da 37ª Cúpula de chefes de Estado do Mercosul, que acontece na capital paraguaia, Assunção. Lula disse que Zelaya deve voltar "o quanto antes" ao poder de seu país e elogiou os esforços da comunidade internacional em buscar a retomada da democracia em Honduras. Na noite desta quinta-feira, Zelaya chegou à cidade de Estelí, na Nicarágua, primeira escala de seu trajeto de volta a Honduras. O presidente Lula disse ainda que os chefes de Estado reunidos em Assunção "não podem tolerar" o golpe realizado no dia 28 de junho que derrubou Zelaya do poder e não devem abrir mão da exigência de que o governo interino de Roberto Micheletti o restitua. Na mesma linha, a presidente argentina, Cristina Kirchner, pediu nesta sexta-feira "decisão e precisão" do Mercosul para rejeitar o golpe de Estado e exigir a restituição do poder a Zelaya. Em seu discurso na Cúpula do Mercosul, a argentina disse que o bloco precisa se esforçar para impedir que golpes "cívico-militares" se consolidem na América Latina. Segundo ela, caso contrário, seria o mesmo que "legitimar o golpe" em Honduras, que representaria "a certidão de óbito da Carta Democrática da OEA [Organização dos Estados Americanos] e da cláusula democrática do Mercosul". Já o presidente paraguaio, Fernando Lugo, afirmou que "Honduras é uma ferida que sangra na democracia regional".

Comércio

O comércio no interior do bloco também foi tema do discurso de Lula, que propôs a adoção das moedas locais nas transações comerciais entre os países-membros do Mercosul, como já fazem Brasil e Argentina. Atualmente, o dólar é adotado como moeda oficial no comércio interno da região. Lula também propôs aprofundar a integração e diversificar os mercados. Além disso, o presidente defendeu acordos sobre temas de políticas sociais, o que está em sintonia com o pedido do presidente paraguaio de criar uma Secretaria de Saúde do Mercosul. De acordo com Lula, o Brasil aumentará voluntariamente as contribuições ao Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul (Focem), para financiar obras no Paraguai e Uruguai, países do bloco com economias menores.

 

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Brasil não tem interesse em participar da Opep, diz Lula

da Reuters, em Paris

O Brasil não tem interesse em se tornar um membro da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Não, o Brasil não tem a intenção de exportar petróleo cru. O país quer exportar derivados, a fim de criar uma indústria petroquímica no Brasil", afirmou, em uma entrevista transmitida pela TV5 Monde e Radio Francesa Internacional. "Nós não temos interesse em participar da Opep", afirmou. O governo brasileiro apresentou na última segunda-feira os quatro projetos enviados ao Congresso para tratar do novo marco regulatório das reservas de petróleo pré-sal, que podem chegar a 50 bilhões de barris, segundo estimativas.

1. O primeiro projeto muda o sistema de exploração para o regime de partilha, onde o óleo extraído é dividido entre o governo e a empresa privada responsável pela exploração. Atualmente, o governo adota o sistema de concessão, pelo qual a empresa privada paga royalties sobre o petróleo extraído. De acordo com o material distribuído pela Casa Civil, o objetivo é "assegurar para a Nação a maior parcela do óleo e do gás, apropriando para o povo brasileiro parcela significativa da valorização do petróleo". Pelas regras, a União poderá contratar diretamente a Petrobrás para produzir no pré-sal. Em todos os casos, a estatal será a operadora, ou seja, responsável pela condução das atividades de exploração e produção, com participação mínima de 30%. O vencedor nas licitações será a empresa que atribuir maior percentual de participação à União. O risco da exploração ficará por conta da empresa contratada que, em caso de sucesso, será reembolsada em óleo pelos investimentos que "estarão sujeitos a limites preestabelecidos por período".

2. O segundo projeto de lei trata da criação de uma empresa estatal, a Petro-Sal para administrar a exploração no pré-sal. Segundo o governo, será uma empresa enxuta, com funcionários contratados pela CLT (Consolidações das Leis Trabalhistas). A empresa representará o governo nos consórcios formados para a exploração do petróleo.

3. O terceiro projeto trata da criação de um fundo social para onde serão destinados os recursos do governo obtidos no pré-sal. Apenas os rendimentos do fundo deverão ser utilizados e serão destinados para a área social, ciência e tecnologia, educação, cultura e ambiente.

4. O quarto projeto trata da capitalização da Petrobras. A União transferirá direitos de exploração de uma quantidade fixa de barris de petróleo para a Petrobras em troca de pagamento em dinheiro ou títulos públicos. A operação terá um limite de 5 bilhões de barris.

Outros muros que precisam cair

O mundo lembra e festeja a reunificação de Berlim, mas ainda existem 7.500

quilômetros de barreiras separando fronteiras

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A última grande fronteira da Guerra Fria tem quatro mil metros de largura, 245

quilômetros de extensão e separa a capitalista República da Coreia da comunista

República Popular da Coreia, no leste da Ásia. Enquanto o mundo comemorava os 20

anos da queda do Muro de Berlim na semana passada, a cerca de arame farpado

estabelecida sob cessar-fogo em 1953 ficou repleta de pedidos de reunificação das

duas Coreias. Dos dois lados da barreira, porém, mais de um milhão de soldados

mantiveram-se impassíveis na defesa dos territórios. Manifestações similares

ocorreram ao mesmo tempo em pelo menos dois outros pontos: na fronteira dos

Estados Unidos com o México e na de Israel com a Palestina. Sejam construídos com

concreto, delimitados por arame ou por equipamentos virtuais, muros continuam a

separar países e povos em todo o mundo. São, ao todo, 7.500 quilômetros de

barreiras intransponíveis, que representam 3% das fronteiras terrestres, e podem

chegar a 18 mil quilômetros quando todas as obras forem concluídas, segundo

levantamento do geógrafo e diplomata

francês Michel Foucher, autor de

"L'Obsession de Frontières" (A

Obsessão das Fronteiras, em tradução

livre).

Foucher costuma repetir que, enquanto

a fronteira simboliza a existência do

outro, o muro representa sua negação.

"O Muro de Berlim impedia de sair, as

cercas americanas impedem de entrar

e o muro israelense interdita a ação",

compara o geógrafo. "Mas, por trás

destas funções, há sempre a negação

do outro." No caso das Coreias, existe

a tensão adicional entre dois países

que interromperam uma guerra

fratricida sem assinar nenhum tratado

de paz. Mais de 50 anos após o fim do

conflito, o clima de beligerância

continua. Na quinta-feira 12, a Coreia

do Norte, como é conhecido o país comandado pelo regime comunista de Kim Jong-il,

culpou sua vizinha capitalista por um tiroteio entre embarcações ocorrido em alto-mar

dois dias antes. Em terra, a chamada Zona Desmilitarizada da Coreia é, na verdade,

uma das regiões do mundo com maior concentração de armamento. A inviolabilidade

Fronteira das duas Coreias , 9/11/2009

Apelos pela reunificação na barreira que

separa os dois países

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da fronteira, porém, pode ser aparente. "Assim como a queda do Muro de Berlim

pegou os alemães com a guarda baixa, a queda da fronteira pode surpreender os sul-

coreanos", alertou em editorial o "Korean Herald", fazendo referência à fragilidade da

saúde de Jong-il, há quase 25 anos no poder.

As previsões de derrubada de barreiras na Ásia, no entanto, não afetam a disposição

de países empenhados em levantar muros como alternativa de proteção. No Oriente

Médio, Israel constrói desde 2002 um muro com até oito metros de altura para separar

o país da Cisjordânia, sob o argumento de bloquear a entrada no país de terroristas

palestinos. Mais da metade da barreira de cerca de 700 quilômetros - chamada por

Israel de "Parede de Segurança" - está concluída. Batizada no lado oposto como

"Muro de Apartheid", a construção tem um problema extra: avança sobre território

palestino. Pelo traçado do projeto, apenas 20% da obra, quando concluída, terá

seguido a demarcação reconhecida internacionalmente como fronteira entre Israel e

Cisjordânia, que foi estabelecida no armistício de 1948.

Com 3,2 mil quilômetros de extensão, a fronteira entre os Estados Unidos e o México

também virou cenário para uma construção que, em alguns pontos, atinge cinco

metros de altura e é reforçada por cercas de arame. Em outros lugares, está equipada

com uma série de equipamentos tecnológicos, como detectores infravermelhos e

sensores de terra. Nessa parte do mundo, não há hostilidades entre os países

fronteiriços. Levantar o muro foi uma decisão americana no começo dos anos 1990,

para impedir a entrada de imigrantes ilegais no país. Em tempos de crise econômica,

os Estados Unidos já não representam tanto a terra das oportunidades, mas milhares

de famílias continuam separadas pela barreira. De tempos em tempos, elas se

reencontram, conversando através de frestas. E persistem as tentativas de burlar o

esquema de segurança. Pelos registros da Comissão Nacional de Direitos Humanos

do México, nos últimos 15 anos cerca de 5,6 pessoas morreram tentando cruzar a

fronteira, a maioria delas por causa das altas temperaturas do deserto.

FUTURO CERCADO

Quando todas as obras

terminarem, os muros somarão 18

mil quilômetros

Cisjordânia , 9/11/2009

Palestinos reivindicam a

derrubada da parede de oito

metros de altura erguida por Israel

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Outra região inóspita - a fronteira da Índia com o Paquistão - é separada por

fortificações e cercas de arame por mais da metade de seus 2,9 mil quilômetros de

extensão. Considerada uma das fronteiras mais tensas do mundo, tem a segurança

reforçada por campos minados nas proximidades da região da Caxemira, que é

disputada pela Índia e o Paquistão desde o fim da colonização britânica, em 1947.

Parte da Caxemira, aliás, foi anexada em 1962 pela China, a precursora na

iniciativa de se defender por meio de barreira física, ainda no século III a.C. À

época, para impedir a invasão de guerreiros tártaros e mongóis, o país ergueu em

pedra, areia e tijolos, por seis mil quilômetros, a célebre Muralha da China.

Com argumentos similares - proteção

contra adversários e bloqueio da

imigração ilegal -, pelo menos outros

sete países convivem com muros em

suas fronteiras (leia quadro), embora

não haja concreto suficiente para

alterar o curso da história, como bem

demonstrou a queda do Muro de

Berlim. Construído por determinação do

então líder da União Soviética (URSS),

Josef Stálin, o muro dividiu por 28 anos

a Alemanha em dois blocos: a República Democrática da Alemanha, que girava em

torno do regime socialista da URSS, e a República Federal da Alemanha, alinhada

com o mundo capitalista. Com 155 quilômetros de extensão, 302 torres de

observação, barreiras de concreto e cercas metálicas eletrificadas, o muro transformou

Berlim Ocidental em um enclave capitalista em território socialista. Começou a ser

erguido sem aviso prévio, na madrugada de 13 de agosto de 1961, ano em que

registravam- se diariamente cerca de duas mil fugas do bloco socialista.

CAMPO MINADO

Cerca que separa a Índia do Paquistão tem

explosivos na região da Caxemira

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Quase três décadas depois, Erich Honecker, então líder da Alemanha Oriental,

começou 1989 assegurando que a estrutura não seria abalada pelos movimentos a

favor da democracia que sacudiam o Leste Europeu desde a criação do sindicato

independente Solidariedade, na Polônia, em 1980. "O muro ainda existirá em 50 ou

100 anos, enquanto não forem superados os motivos que levaram à sua construção",

garantiu Honecker. Em 9 de novembro do mesmo ano, o muro foi abaixo, também sem

aviso prévio nem nota oficial. Na semana passada, coube ao antigo líder do

Solidariedade, Lech Walesa, mais tarde presidente da Polônia, derrubar a primeira

peça do dominó gigante que caiu em sequência, refazendo o antigo traçado do Muro

de Berlim.

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Internacional

Sob o ódio dos vizinhos

Atrocidades da guerra na Faixa de Gaza atrapalham o entendimento de Israel como uma ilha de democracia cercada de ditaduras no Oriente Médio

Jaime Klintowitz

MORTE EM COMBATENo cemitério militar de Beersheba, soldados israelenses choram a perda de colega em Gaza

Se a contagem do tempo começar pelo ano em que o primeiro grupo armado foi organizado pelos judeus para proteger suas povoações de salteadores árabes, em 1909, judeus e árabes engalfinham-se pela posse da Palestina há pelo menos 100 anos. Nesse século de atrocidades mútuas, cada lado tem sua parcela de culpa no fato de se passar tanto tempo procurando um caminho para a paz quando a paz deveria ser o caminho. Por que a paz não encontra quem a patrocine naquela região? As causas da guerra no Oriente Médio são de natureza diversa – étnica, religiosa, geopolítica e ideológica. Elas se interpenetram de tal modo que a solução de uma acaba agravando a outra. O resultado é que todas as chances de paz foram abortadas por um lado ou outro – mais recentemente sempre pelos palestinos e pelos países árabes que lhes dão apoio. Há duas semanas, Israel está de novo oficialmente em guerra com um de seus vizinhos. Já esteve em 1948, ano de sua criação como estado independente, em 1956, 1967, 1973, 1982 e 2006. Israel venceu todas essas guerras, mas as vitórias militares acabaram produzindo novas complicações e adiando ainda mais a solução definitiva para o conflito.

As duas semanas de ofensiva militar israelense na Faixa de Gaza, com todos os seus horrores, podem facilmente ser vistas como mais uma erupção de violência dessa rixa crônica. Afinal, esta é a quarta vez que tropas israelenses invadem a Faixa de Gaza,

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uma nesga de solo arenoso, superpovoada e muito pobre, desde 1948. Da penúltima vez, a ocupação se prolongou por 38 anos, só terminando em 2005. O conflito será mais bem compreendido, no entanto, se for examinado pelo que tem de diferente dos anteriores. "Essa não é mais uma guerra árabe-israelense. Nem sequer se pode falar em conflito israelo-palestino, já que metade da Palestina não está com o Hamas", disse a VEJA o paquistanês Kamran Bokhari, diretor de pesquisas sobre o Oriente Médio da Stratfor, uma consultoria de geopolítica com sede nos Estados Unidos. "Muitos palestinos na Cisjordânia entendem que o Hamas é parte do problema." O Hamas é uma organização radical islâmica, dominada pelo fanatismo e que usa métodos terroristas. Seus líderes são proponentes do jihadismo, o movimento cujo objetivo mais geral é a guerra santa em nome do Islã e cujo objetivo mais específico é a destruição do Estado de Israel. O Hamas domina corações e mentes em Gaza. Tem, portanto, legitimidade política. Essa é a tragédia. O Hamas não pode ser derrotado militarmente.

A diversidade na Palestina é maior do que aparenta ser. Vivem ali várias confissões religiosas – cristãos, drusos e, naturalmente, judeus –, mas o Hamas sustenta que o território deve ser um pedaço exclusivamente muçulmano de um futuro império islâmico. Isso sinaliza a ascensão de um novo complicador no conflito centenário. Apesar de contrapor judeus a muçulmanos, a disputa até agora tinha sido basicamente laica, de cunho nacionalista, sobre quem era ou não um povo e qual deles tinha ou não direito a um estado próprio. O Hamas é um fiel escudeiro do Irã, que lhe fornece armas (aí a origem dos mísseis lançados da Faixa de Gaza contra cidades israelenses), treinamento militar e dinheiro. Ainda que em microdimensões e por meio de intermediários, o ataque ao Hamas pode ser visto como uma espécie de "guerra por procuração" – na definição do historiador israelense Benny Morris, da Universidade Ben-Gurion, em Beersheba – entre Israel e os aiatolás de Teerã.

Os iranianos podem muito bem ter incentivado o Hamas a rejeitar a renovação do cessar-fogo – e a iniciar o insano foguetório que atraiu a devastadora reação militar – para desviar a atenção dos israelenses, que pareciam estar se preparando para um ataque preventivo às instalações nucleares do Irã. Há estimativas de que os iranianos estejam a dois ou três anos de obter sua primeira bomba nuclear. Israel sabe que os jihadistas não são totalmente racionais. Ou, pelo menos, não da forma como se vê em governos responsáveis, cuja preocupação primordial são a segurança e a prosperidade de seu povo. A ameaça de aniquilação mútua garantiu o equilíbrio entre o Kremlin e a Casa Branca durante a Guerra Fria. Devido à fixação mental no autossacrifício e no martírio, sanções e represálias não funcionam tão bem com os aiatolás iranianos ou com os xeques do Hamas. Se Teerã tiver a bomba nuclear, é provável que decida usá-la, seja por motivos ideológicos, seja por medo de que Israel, que tem um formidável estoque de armas nucleares, possa atacar primeiro. Meses de bloqueio israelense e sanções estabelecidas pelos Estados Unidos, União Europeia e Egito não conseguiram fazer com que o Hamas moderasse sua demagogia religiosa e seu discurso racista – razões, por sinal, da imposição de sanções.

Depois de uma trégua tensa que durou seis meses, o movimento islâmico se pôs a disparar foguetes sobre as cidades israelenses para demonstrar que a jihad está viva e em boa forma. Por certo não tinha ilusões de que a represália era inevitável e seria, como de hábito, devastadora. Fiel ao culto do martírio, o Hamas agiu diligentemente para atrair a formidável máquina de guerra israelense para as vielas apinhadas das cidades e favelas de Gaza, onde acreditava que seria mais fácil combatê-la. As mortes e a destruição causadas pela ofensiva israelense são dolorosas de observar. Na última sexta-feira, as estimativas eram de 750 palestinos mortos, entre os quais uma quantidade enorme de crianças. Só no ataque a uma escola da ONU repleta de refugiados foram mortas quarenta pessoas. Famílias inteiras acabaram dizimadas por

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bombardeios aéreos. Uma proposta de cessar-fogo apresentada pelo Conselho de Segurança da ONU foi rejeitada por ambas as partes na sexta-feira passada.

O LONGO BRAÇO DO HAMASMãe e filhos se protegem em kibutz de foguetes palestinos lançados de Gaza

O conflito em Gaza aprofundou o cisma regional entre a facção da "resistência" – que inclui o Irã, a Síria e suas milícias aliadas, o Hezbollah no Líbano e o Hamas na Palestina – e os chamados moderados, favoráveis à paz negociada com Israel. Esse grupo é formado pela maioria dos países, encabeçados por Egito, Jordânia, Arábia Saudita e pela Autoridade Palestina na Cisjordânia. Alguns deles, como o Egito, com o qual Gaza faz fronteira, criticaram abertamente o Hamas por provocar o conflito. O governo egípcio não tolera a conexão entre o Hamas e a Irmandade Muçulmana, o principal movimento de oposição no país. A Arábia Saudita apoia quase abertamente qualquer coisa que os israelenses façam para conter a influência dos xiitas do Irã no Oriente Médio. O primeiro pelotão, o da rejeição, tem a esperança de que o Hamas sobreviva ao ataque em condições de demonstrar que Israel não é capaz de esmagar todos os seus inimigos. O segundo grupo torce descaradamente pela derrota do extremismo islâmico em Gaza. O mesmo debate está aceso entre os palestinos, a ponto de o presidente Mahmoud Abbas ter a ousadia de responsabilizar o Hamas pelo início da guerra.

Quando Israel se retirou unilateralmente da Faixa de Gaza, em 2005, deu aos palestinos a oportunidade de demonstrar sua capacidade de gerir o próprio estado. Três anos e meio depois, está claro que os palestinos falharam em seu objetivo. "Eles preferiram investir na construção de túneis e no contrabando de armas a financiar um bom governo para a população palestina", diz o historiador Benny Morris. As condições de vida na Faixa de Gaza continuaram miseráveis. Metade dos trabalhadores está sem emprego e sete em cada dez dependem de doações internacionais para se alimentar. A ajuda minguou depois da vitória do Hamas nas eleições de 2006. Os Estados Unidos e a União Europeia, que têm o grupo em sua lista de organizações terroristas, cortaram linhas de financiamento à região. As chances de criar um estado palestino se tornaram mais remotas depois do golpe militar que expulsou o Fatah de Gaza. Desde 2006, cerca de 750 palestinos morreram em lutas fratricidas – número semelhante ao das mortes causadas pelos ataques israelenses.

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SOFRIMENTOMilhares de palestinos rezam pelas vítimas do ataque israelense que atingiu uma escola da ONU (no alto, à dir.). À esquerda, pai reconhece o corpo do filho na Cidade de Gaza. À direita, robô israelense checa o corpo de um palestino morto ao tentar explodir um posto de gasolina em assentamento judeu na Cisjordânia

Curiosamente, essa realidade multifacetada tornou-se preto-e-branco na reação da imprensa, dos diplomatas e da maioria dos governantes. Israel é basicamente considerado um estado truculento, que – esta é a opinião expressa pelo governo do presidente Lula – reagiu de forma desproporcional aos foguetes do Hamas. O argumento baseia-se bastante na discrepância de baixas (catorze israelenses mortos até a sexta-feira passada). Essa é uma conta difícil de ser feita por quem considera que cada vida é preciosa. Na verdade, o estado judeu não está respondendo aos projéteis lançados nas últimas duas ou três semanas, mas a anos de ataques indiscriminados contra os 750 000 israelenses que vivem próximos à fronteira com a Faixa de Gaza. A ofensiva contra o Hamas está sendo realizada com força poderosa e agressividade tática, estratégia militar cujo objetivo é reduzir as próprias perdas e esmagar o inimigo. Não é assim que se ganham as guerras? "Trata-se de um estado soberano defendendo sua integridade e seus habitantes", disse a VEJA Paul Scham, que ensina história israelense na Universidade de Maryland, nos Estados Unidos.

É paradoxal, mas não inesperado, que Israel, a única democracia do Oriente Médio, esteja perdendo gradualmente a simpatia da opinião pública no exterior. A malhação, antes confinada à extrema esquerda, tornou-se parte integrante do populismo antiocidental. Muitos partidos de esquerda agora consideram o antissionismo como um pré-requisito para seus afiliados e não se acanham em denunciar a "conspiração judaica", na melhor tradição antissemita. "Por que a esquerda europeia, e globalmente toda a esquerda, está obcecada em lutar contra as democracias mais sólidas do planeta, Estados Unidos e Israel, e não contra as piores ditaduras?", questionou em uma palestra a jornalista catalã Pilar Rahola, que já foi deputada de esquerda na Espanha. O conflito entre árabes e judeus na Palestina é um nó difícil de desatar. Oportunidades de paz foram perdidas por ambos os lados e nada indica que se esteja mais perto de uma solução – ainda que todo mundo concorde que, quando dois povos

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disputam o mesmo pedaço de terra, a melhor solução é dividi-la em dois países. O que é fora de dúvida é que Israel não pode (e não vai) perder a guerra contra as forças da intolerância religiosa no Oriente Médio, representada agora pelos terroristas do Hamas. Israel é uma sentinela avançada da democracia e da civilização judaico-cristã cercada por nações e grupos políticos armados que formal e claramente lutam pela destruição do estado judeu e pela morte de todos os seus habitantes não-árabes. Também é fora de dúvida que não haverá paz enquanto os vizinhos hostis não aceitarem que a existência de Israel é legítima, que o país tem o direito de se defender e que o terrorismo destrói o que pretende construir.

Quem é quem

A ofensiva de Israel contra o grupo terrorista Hamas na Faixa de Gaza é o novo capítulo de uma velha história. Ao longo do tempo, alguns personagens se repetem e tornam-se lendários, como Ariel Sharon, líder israelense que está em coma desde 2006, e Yasser Arafat, palestino que fundou o Fatah, hoje rival do Hamas. Também figuram nessa trama os líderes que tomam parte nas negociações de paz. A seguir, os principais personagens do atual conflito na região.

 • Atacou a Faixa de Gaza no fim de dezembro para esmagar os militantes do Hamas

 • Só aceita discutir um cessar-fogo quando os ataques com foguetes terminarem

 • Descarta negociar com os líderes da facção radical, mas falaria com ANP e Fatah

 • Acusa Israel de cometer um genocídio, dizendo ser alvo de um ataque injustificado

 • Apesar de apresentar-se como parte agredida, mantém a retórica inflamada contra Israel

 • Militantes são responsáveis por milhares de ataques com foguetes contra israelenses

ONU diz que 30 mil civis são vítimas da violência em Darfur da Efe, em Cartum

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A delegação da ONU em Cartum denunciou hoje que cerca de 30 mil civis foram alvos de diferentes tipos de violência durante os enfrentamentos na quinta-feira passada entre dois grupos rebeldes no sul de Darfur. O representante do Programa Mundial de Alimentos da ONU, Kenro Oshidari, expressou sua profunda preocupação com a situação humanitária na localidade de Muhairiya. A localidade foi palco na quinta-feira de combates de militantes do Movimento de Justiça e Igualdade (MJI), de Khalil Ibrahim, e da facção Movimento de Libertação do Sudão (MLS), liderada por Meni Arkau Minawi. "Os últimos enfrentamentos ameaçaram cerca de 30 mil civis, entre moradores e deslocados, que foram alvo de diferentes tipos de violência, algo que não tinha acontecido antes nesta região", afirmou Oshidari.

Embora não tenha fornecido mais informações sobre estas agressões, Oshidari destacou que há civis que morreram e outros que ficaram feridos como consequência dos choques. Os choques da quinta-feira passada em Muhairiya deixaram 22 mortos, entre eles quatro civis, e 27 feridos, segundo fontes oficiais. O conflito de Darfur, no oeste do Sudão, explodiu em fevereiro de 2003, quando MJI e MLS se rebelaram contra o regime de Cartum em protesto contra a precária situação desta província. A facção dirigida por Minawi foi a única a assinar um acordo de paz com o Governo sudanês em Abuja, em maio de 2006. Desde a explosão da violência, cerca de 300 mil pessoas morreram e 2,5 milhões foram forçadas a abandonar seus lares, segundo cálculos da ONU.

O Tremor Que Matou Um País

Com um terço de sua miserável população atingido por um terremoto, o Haiti virou um dos mais graves casos de emergência humanitária da história e corre o risco de mergulhar, de novo, na selvageria

Claudio Dantas Sequeira e Luiza Villaméa

TERRA ARRASADA

 A capital Porto Príncipe, onde imperam a destruição e o caos

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Sete mil corpos já foram enterrados em valas comuns. Milhares de outros estão sob escombros ou empilhados pelas ruas da capital Porto Príncipe. Feridos e desabrigados caminham a esmo em busca de socorro. A água se tornou o bem mais precioso no Haiti arrasado por um terremoto com capacidade destrutiva equivalente à de 25 bombas atômicas. Com epicentro a apenas 15 quilômetros de Porto Príncipe, o fenômeno registrado às 16h53 locais da terça-feira 12 multiplicou uma miséria secular. No dia seguinte à catástrofe “inimaginável”, como definiu o presidente René Préval, ele mesmo foi encontrado na rua por uma equipe da rede americana CNN em aparente estado de choque. Préval sintetizou então o sentimento de uma nação: “Não tenho onde dormir.” No dia seguinte, Préval ajudou a enterrar os primeiros corpos resgatados dos escombros. Com um terço da população de nove milhões de habitantes atingido pela catástrofe, o Haiti virou um dos mais graves episódios de emergência humanitária da história.

Tragédia sem fim O cenário é de absoluto terror. No país sem infraestrutura, os já precários sistemas de energia, de comunicação e de abastecimento de água entraram em colapso. Como o Haiti não tem Defesa Civil, os esforços iniciais de resgate foram feitos por funcionários da ONU, militares e cidadãos comuns, a maioria desesperada em busca de familiares desaparecidos. À medida que o tempo passa, aumentam os riscos de que epidemias se alastrem. Quando todos os mortos forem enterrados e os feridos tratados é que se começará a dimensionar o legado dessa tragédia sem fim. “A situação vai piorar. Muitas outras pessoas vão acabar morrendo”, afirma o radialista haitiano Carel Pedre. Algumas, no momento, querem apenas resgatar aqueles que amam. É o caso do vendedor ambulante Lionnel Dervil, pai de quatro filhos: “Eu só quero o corpo da minha mulher. Sei que estão ocupados tratando dos sobreviventes, mas há uma divisão cheia de corpos onde não consigo chegar”.

 

VALA COMUM

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 Corpos amontoados, busca heroica e saques aumentam o desespero e a dor da população

 

Os principais símbolos do Haiti – o palácio do governo e a catedral – viraram pó, apagando os últimos resquícios da colonização francesa. Também vieram ao chão o Parlamento, o Palácio da Justiça, os ministérios das Finanças, Comunicação, Trabalho e Cultura, os três hospitais da capital, o principal hotel e o prédio da Minustah, a missão de paz da ONU instalada no país desde 2004. Institucionalmente, o Haiti desapareceu. Parte de seu investimento no futuro ruiu quando os cinco andares da universidade desabaram sobre estudantes e professores. Segundo a Cruz Vermelha, 70% dos edifícios de Porto Príncipe foram destruídos.

O Brasil, por sua vez, nunca esteve tão envolvido em uma tragédia natural no Exterior. Como comandante militar das forças de paz da ONU, o Brasil mantém no país caribenho mais de 1,2 mil militares, que se voltaram desde o primeiro momento ao resgate e atendimento às vítimas do terremoto. A contagem do Ministério da Defesa até a sexta-feira 15 somava 15 brasileiros mortos em decorrência da catástrofe, entre eles a pediatra e sanitarista Zilda Arns, fundadora da Pastoral da Criança (leia reportagem à pág. 40). Os outros 14 são militares, sete deles vindos do 5º Batalhão de Infantaria Leve, sediado em Lorena (SP), que, pelo sistema de rodízio da Minustah, deveriam voltar para casa neste final de semana. Moradora da cidade vizinha de Cachoeira Paulista, a dona de casa Dalila Anaya Henrique se preparava para receber o filho mais velho, o soldado Tiago, 23 anos: “Eu soube do terremoto, mas nem pensei que meu filho estaria morto.”

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SOBREVIVÊNCIA

No país onde 80% são miseráveis, a pobreza piorou e a água virou o bem mais precioso

 

Há ainda 25 militares brasileiros feridos e quatro desaparecidos. Para o ministro da Defesa, Nelson Jobim, há poucas chances de encontrá-los com vida. “Falar em

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sobreviventes é eufemismo”, disse. Além deles, também está desaparecido o diplomata Luiz Carlos da Costa, número dois da Minustah. Aos 60 anos, casado e com duas filhas, Costa é o brasileiro de maior hierarquia na ONU. Com toda a carreira dedicada a missões de paz, ele pediu há poucas semanas que o secretário-geral Ban Ki-moon estendesse seu mandato no Haiti por mais um ano. O diplomata estava animado com a nomeação do ex-presidente Bill Clinton como enviado especial da ONU para o Haiti. A amigos, disse que havia um novo sopro de esperança para impulsionar projetos econômicos que pudessem gerar emprego e renda para a população. Além de Costa, 188 funcionários da Minustah estão desaparecidos e 36 mortos. O corpo do chefe da missão da ONU, o tunisiano Hedi Annabi, foi encontrado morto entre os escombros. No vácuo de autoridade, o comandante militar, o general brasileiro Floriano Peixoto, que estava na sede da ONU em Nova York, viajou a Porto Príncipe para assumir a missão até a chegada de Edmond Mulet, antecessor de Annabi, indicado como responsável interino.

Sem classe média “Está tudo acabado. Teremos que recomeçar do zero”, disse o brasileiro Ricardo Seitenfus, representante da Organização dos Estados Americanos (OEA) para o Haiti. Com 80% dos habitantes vivendo abaixo da linha de pobreza, o Haiti era um país agonizante que levou um golpe sem precedentes. A Cruz Vermelha estima em até 50 mil as mortes provocadas pelo terremoto, mas esse número pode aumentar à medida que avançar o trabalho das equipes de resgate enviadas das mais diversas partes do mundo. Um dos maiores entraves para os trabalhos de socorro e para a reconstrução do país está na própria composição da sociedade haitiana. Na prática, não há ligação entre a elite formada na França ou no Canadá e a massa de miseráveis. “Tem um ministro da Educação muito bem formado, com cursos no exterior, mas não há um grupo intermediário que faça funcionar o projeto escolar”, exemplifica o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, que chefiou a missão de paz da ONU entre janeiro de 2007 e abril de 2009.

A inexistência de uma classe média com profissionais capacitados a fazer escoar a ajuda humanitária internacional que começa a chegar agrava ainda mais a desgraça que se abateu sobre o país. Com as ruas bloqueadas por destroços de todos os gêneros, as equipes que desembarcam no Haiti têm dificuldade até de locomoção. “Acreditamos que há três milhões de pessoas afetadas no país, feridas ou desabrigadas”, afirmou Victor Jackson, coordenador-assistente da Cruz Vermelha no Haiti. Sem abrigo, água ou comida, muitos haitianos circulam a esmo pelas ruas e dormem ao relento, aglomerando-se principalmente no centro de Porto Príncipe e no estádio que abrigou o Jogo da Paz em 2005, entre as seleções de futebol do Brasil e do Haiti.

Antiga colônia francesa, o Haiti chegou a ser conhecido no final do século XVIII como a “pérola das Antilhas”, por conta de sua exuberante cultura do açúcar, o petróleo da época. Inspirado na Revolução Francesa e com base em uma revolução de escravos, foi o primeiro país da América Latina a conquistar a independência, em 1804. Foi também o primeiro a acabar com o regime escravocrata. De lá para cá, porém, as tragédias que assolam o país são tamanhas que existe entre os organismos de ajuda humanitária o temor de que a comunidade internacional tenha se cansado do país.

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Resgate pedra por pedra “Não desistam do Haiti como se fosse uma causa perdida”, apelou Bill Clinton em um comovente pedido de ajuda ao país, tentando sensibilizar governos e também as pessoas comuns. Aos primeiros, pediu de imediato a cessão de helicópteros para o socorro aos feridos. “Precisamos também de água, comida, abrigos e primeiros-socorros. O mais imediato que podem fazer é enviar dinheiro, mesmo um ou dois dólares”, completou, em parte de discurso na Assembleia-Geral da ONU, dirigindo-se aos cidadãos. Cerca de 30 países, entre eles Estados Unidos, Brasil, França, Canadá, Cuba, China, Argentina, Venezuela e Israel, se mobilizaram de imediato. O presidente americano, Barack Obama, foi o mais generoso. Na quinta-feira 14, Obama anunciou a liberação de US$ 100 milhões para a recuperação do país caribenho, além do envio de dez mil soldados e fuzileiros, 300 médicos, um porta-aviões e um navio-hospital. No Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva determinou a liberação de US$ 15 milhões e a criação de um gabinete de crise coordenado pelo ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Jorge Félix.

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No país que faz resgates à mão, pedra por pedra, devido à ausência de equipamentos adequados, as perspectivas para o futuro são dramáticas. Além das colossais – e imediatas – perdas, há o risco de o Haiti voltar a um estado selvagem, submergindo numa crise político-institucional similar à que protagonizou no começo da década de 1990. Com as forças internacionais de paz concentradas nas buscas aos sobreviventes e uma polícia precária, a segurança pública está ameaçada. O principal presídio do Haiti desabou com o tremor, deixando escapar um número ainda não conhecido de detentos. Na quinta-feira 14, um caminhão que tentava vender água na periferia de Porto Príncipe foi atacado por moradores sedentos. Na madrugada do mesmo dia, o porta-voz da ONG Viva Rio, Valmir Fachini, informou por e-mail que as ruas de Porto Príncipe viraram palco de saques. “Ouvimos vários disparos de armas de fogo sem poder dizer de onde vêm. Os saques começaram nos supermercados,

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que desabaram parcialmente”, contou Fachini, usando a internet, o único meio de comunicação que sobreviveu ao terremoto por usar no país o sistema de transmissão via satélite.

Antes de o tremor jogar o Haiti no chão, 2010 representava um importante passo para a normalização do país que, em 200 anos de história, sofreu 32 golpes militares. Desde o fim da ditadura de Jean-Claude Duvalier, o Baby Doc, em 1986, os haitianos sonham com uma democracia que abra caminho para instituições democráticas sólidas. As eleições legislativas estavam marcadas para o mês que vem e as presidenciais para novembro. Antes de o desastre natural lembrar ao mundo que o Haiti existe, o país já era uma miséria só. O simples cruzar de sua fronteira com a República Dominicana – país com o qual ocupa a ilha de Hispaniola, no Mar do Caribe – é uma experiência chocante. Assim que passa a divisa, o verde das florestas dominicanas cede lugar ao cinza de um deserto tropical. A porção oeste da ilha, ocupada pelo Haiti, tem aparência de terra arrasada – reflexo do desmatamento para produzir o carvão que gera a energia usada pelo mais pobre país do continente. O que parecia não poder ficar pior, ficou.

A Presença Brasileira

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A presença das tropas brasileiras no Haiti é resultado de compromisso assumido pelo governo em 2004, quando a ONU estabeleceu a Minustah, a missão multinacional convocada depois que uma crise política apeou do poder o presidente Jean-Bertrand Aristide e mergulhou o país no caos institucional.

O mosaico de barbárie formado por ex-militares, membros da polícia nacional e milícias governistas fez reféns civis inocentes, submetidos a toques de recolher e atos de violência extrema. No cálculo do Itamaraty, o protagonismo numa operação de paz é a chance para credenciar o Brasil na campanha por um assento no Conselho de Segurança da ONU. O primeiro brasileiro a pisar em Porto Príncipe foi o general Augusto Heleno, que se deparou com o caos e a falta de recursos. Por meses, ele se viu premido por um contingente reduzido, bem aquém do previsto pela ONU. O problema só foi resolvido no ano seguinte, mas a situação de instabilidade perdurou por quase um ano e meio. Pacificadas as favelas do Haiti, as tropas brasileiras intensificaram as ações de apoio social e de infraestrutura, mudando o perfil da missão. Dos 1.246 militares, 230 são engenheiros, que trabalham na pavimentação de rodovias, construção de pontes e perfuração de poços artesianos. Segundo a ONU, a missão hoje tem o apoio de 78% da população. Até agora, o Brasil já desembolsou R$ 704,5 milhões com ações no Haiti, doou 500 mil doses de vacina contra a raiva e desenvolve com a França o projeto do banco de leite materno.A Agência Brasileira de Cooperação investe ainda US$ 16 milhões em projetos na área de agricultura familiar, coleta de lixo e formação de militares.

Colaboraram: Adriana Prado, André Julião e Fabiana Guedes

"STJ Anula a Condenação de Daniel Dantas"

Bruna Cavalcanti

O juiz federal Fausto De Sanctis sofreu novo revés – isso, apenas 72 horas depois de ter sido afastado da presidência do processo envolvendo o MSI/Corinthians por “suspeição”. Dessa vez, a decisão veio do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que suspendeu a condenação de dez anos dada por De Sanctis ao banqueiro Daniel Dantas (Grupo Opportunity) sob a acusação de evasão de divisas e lavagem de dinheiro. O STJ anulou a Operação Satiagraha que investigou Dantas numa medida de “alcance ilimitado”.

 

"Congelamento Global"

Bruna Cavalcanti

Clima polar no Hemisfério Norte com temperaturas inferiores a 20 graus negativos. Nos EUA, em Washington, tempestades de neve cobriram milhares de casas e o Capitólio, exigindo esforço de quem passou pelo National Mall. Na Filadélfia, registrou-se a segunda maior nevasca desde 1884. Também na Europa o rigor do frio se fez sentir: mais de 100 mortos, com vítimas fatais sobretudo na Polônia. O gelo causou colapso no sistema de transporte, com aeroportos e linhas de trem interditados. O Eurostar, ligação férrea entre Londres e Paris, teve seu funcionamento suspenso.

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"STF Determina Que Garoto Volte Aos EUA Com Pai Biológico"

Bruna Cavalcanti

O presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, decidiu que o garoto Sean Goldman, 9 anos, pode ser levado de volta aos EUA por seu pai biológico – ele está no Brasil desde 2004 e com a morte de sua mãe ficara sob os cuidados do padrasto brasileiro. A avó do menino, Silvana Bianchi, encaminhou carta a Lula pedindo que ele impeça a partida do neto.

Comissão do Senado aprova convite para Jobim falar sobre compra de caças

A Comissão de Relações Exteriores do Senado aprovou convite para o ministro Nelson Jobim (Defesa) explicar detalhes sobre a compra de 36 aviões caça para a FAB (Força Aérea Brasileira) pelo governo federal. O presidente da comissão, senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), quer saber os motivos que levaram o governo a optar pelos caça franceses, e não os suecos --considerados pela área técnica da FAB como o mais viável para o país.

"Segundo noticiado na imprensa, o relatório técnico da Força Aérea Brasileira sobre a aquisição de aviões caça concluiu pelo modelo Gripen NG, da empresa sueca Saab, a partir de critérios técnicos militares, preço e forma de financiamento. Entretanto, o mesmo noticiário informa que a opção do governo brasileiro continua a ser pela compra dos aviões caça Rafale, da empresa Dassault, da França", disse Azeredo.

Segundo o senador, a preferência do governo brasileiro pelos caças franceses "tem causado constrangimentos" frente ao relatório da área técnica da FAB. O tucano também quer saber detalhes sobre o preço dos caças que, de acordo com Azeredo, "não estão sendo divulgados".

"Da mesma forma que a escolha da melhor opção seja prerrogativa do Poder Executivo, permitindo-lhe contrariar o relatório e ficar com o concorrente que ficou em terceiro lugar, é prerrogativa regimental da Comissão de Relações Exteriores o papel de acompanhar e tornar mais transparente as negociações", afirmou Azeredo. A comissão ainda não marcou data para a audiência de Jobim. Como o requerimento prevê convite ao ministro, ele tem a prerrogativa de negá-lo caso não esteja disposto a prestar esclarecimentos no Senado. Hoje, Jobim afirmou que a compra dos caças ainda não está definida. "Não está definida a compra dos caças. O processo ainda está no âmbito do Ministério da Defesa. A notícia não tem fundamento", disse.

Reportagem publicada pela Folha afirma que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Jobim bateram o martelo a favor do caça francês Rafale. A decisão foi tomada depois que a fabricante, Dassault, reduziu de US$ 8,2 bilhões (R$ 15,1 bilhões) para US$ 6,2 bilhões (R$ 11,4 bilhões) o preço final do pacote de 36 aviões para a Força Aérea Brasileira. Mesmo com a redução, os caças franceses têm preço muito superior ao dos concorrentes. Conforme a Folha apurou, a proposta do modelo Gripen NG, da sueca

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Saab, foi de US$ 4,5 bilhões, e a dos F-18 Super Hornet, da norte-americana Boeing, de US$ 5,7 bilhões.

Manutenção

Além do custo do pacote, que inclui avião, armas, logística e custo de transferência tecnológica, a Dassault estimou que a manutenção dos aviões por 30 anos custará US$ 4 bilhões. Os valores foram revistos após o presidente Lula anunciar antecipadamente a vitória do Rafale, em setembro. O preço unitário, sempre uma estimativa, era então menor para todos os concorrentes porque o pacote não previa vantagens incluídas na renegociação --como o custo de a Embraer fabricar o caça futuramente.

Polícia Federal pede mais prazo para concluir investigações sobre esquema no DF

O delegado da Polícia Federal, Alfredo Junqueira, entregou ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) o inquérito da Operação Caixa de Pandora, que investiga o suposto esquema de pagamento de propina que envolve o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda (sem partido). No relatório, o delegado pediu um novo prazo para concluir as investigações.

Junqueira argumentou que a prorrogação é necessária para dar continuidade aos depoimentos dos envolvidos no esquema de corrupção. Ao analisar o material da Polícia Federal, o ministro do STJ, Fernando Gonçalves, responsável pelo inquérito, terá que dizer se aceita ou não a extensão das investigações e fixar o novo prazo. A expectativa é que a PF receba pelo menos mais 30 dias para trabalhar no caso.

Ex-secretários e ex-colaboradores do governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda (sem partido), resistem em revelar detalhes à Polícia Federal sobre o suposto esquema de arrecadação e pagamento de propina. Das 12 pessoas convocadas, apenas duas aceitaram colaborar com as investigações da operação. A maioria dos depoentes, no entanto, tem permanecido em silêncio, como o ex-assessor de imprensa de Arruda, Omezio Pontes, apontado por Durval Barbosa --delator do esquema e ex-secretário de Relações Institucionais-- como um dos distribuidores da propina. Outros investigados na operação que são ligados ao governador também evitam dar explicações. O ex-chefe da Casa Civil José Geraldo Maciel se reservou ao direito de permanecer calado.

A estratégia também foi adotada pelo policial aposentado Marcelo Toledo, acusado de ser arrecadador do esquema. Ele conseguiu um habeas corpus no STF (Supremo Tribunal Federal) e permaneceu calado durante depoimento. Em um dos vídeos que fazem parte do inquérito, o policial aparece entregando dinheiro a Durval Barbosa e faz referência ao vice-governador Paulo Octávio. Outra tática é adiar os depoimentos, como fizeram o empresário Helio de Oliveira, dono de uma empresa de informática investigada, e o ex-chefe de gabinete de Arruda, Fabio Simão.

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A Polícia Federal só conseguiu ouvir a diretora comercial da Uni Repro, Nerci Soares, e outro depoente que não teve a identidade revelada. Nerci falou por mais de três horas, mas o delegado responsável não autorizou a divulgação do conteúdo. A principal testemunha de Barbosa, o jornalista Edmilson Edson dos Santos, conhecido como Edson Sombra, chegou a conversar com o delegado, mas solicitou o adiamento de seu depoimento. Amigo de Durval Barbosa, Sombra argumentou que não estava "preparado" e que precisaria de mais 15 dias para dar explicações. "Eles [policiais] querem me ouvir profundamente. Eu disse que não estava preparado", afirmou.

Em conversa de quase uma hora com o delegado Alfredo Junqueira, Sombra alegou que ainda não teve conhecido profundo sobre o inquérito do STJ que investiga as denúncias de corrupção que envolvem o governador. Segundo o jornalista, o inquérito representa uma peça delicada porque revive todo o sofrimento que Barbosa passou. Questionado sobre a situação do delator, ele afirmou que Barbosa está "tranquilo". Depoimento do delator ao Ministério Público indica que o jornalista foi um dos principais incentivadores para que o esquema fosse denunciado. Sombra, ainda de acordo com o depoimento, recebeu cópia dos vídeos que mostram Arruda, secretários de governo, assessores, deputados distritais e empresários negociando suposta propina.

Ao todo, o inquérito do STJ envolve 36 pessoas, entre autoridades do governo local, deputados distritais e empresários. Segundo o inquérito, há indícios da prática dos crimes de formação de quadrilha, peculato, corrupção ativa e passiva, fraude de licitação e crime eleitoral.

Guerra À EconomiaNa Venezuela e na Argentina a interferência política afasta dos governos os melhores economistas. E quando precisarem deles?

MÃO ARMADA

Em Caracas, baixar preços é função de soldados

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Nenhum país conseguiu sucesso no longo prazo sem que os seus líderes tenham garantido autonomia para os gestores da política econômica. Quando confundem política com economia, os governos podem registrar vitórias efêmeras. Mas os fundamentos econômicos logo voltam a lembrar que fórmulas mágicas ou efeitos especiais só funcionam no cinema. Nas últimas semanas, porém, os presidentes Hugo Chávez, da Venezuela, e Cristina Kirchner, da Argentina, declararam guerra à economia e adotaram medidas que apostam mais na ficção do que na realidade. A consequência desta intromissão política é que esses países têm cada vez menos economistas qualificados no governo e dispostos a lutar ao lado de seus governantes. Há a desconfiança de que, quando a hora da verdade chegar, existirão poucos técnicos capazes de lidar com os desafios. Esse risco já está sendo contabilizado, inclusive, pelo governo brasileiro. Em Brasília, uma alta autoridade do Ministério da Fazenda reclama da ausência de quadros de peso na equipe econômica argentina que possam sustentar um diálogo técnico consistente com os assuntos em pauta entre os dois países.

Depois das decisões anunciadas por Chávez e Cristina há o receio de uma nova debandada de economistas dos governos dos países vizinhos e ameaça de prejudicar ainda mais os entendimentos em temas que interessam ao Brasil. As medidas que deram mais combustível aos que fazem essas ressalvas foram a demissão por decreto do presidente do Banco Central argentino, Martín Redrado, por Cristina, e a criação de duas taxas de câmbio por Chávez – o bolívar passou a custar 2,60 por dólar para alimentos e artigos essenciais e 4,30 por dólar para vender petróleo e negociar supérfluos. O primeiro sinal de que há algo de errado com a medida cambial foi uma súbita troca de papéis: reduzir preços na Venezuela não é mais função de economistas, mas de soldados armados enviados aos supermercados. Ou seja, Chávez não acredita na “mão invisível” do mercado para equilibrar preços, mas põe toda a fé na mão armada. É de assustar qualquer economista. “Não sobrou mais ninguém na economia, porque ninguém vai ficar vendo o Chávez fazer todas as loucuras possíveis e imagináveis”, diz o ex-ministro João Paulo dos Reis Velloso. “Há um século, a Argentina era a quinta maior economia do mundo. Hoje, seu PIB é um pouco maior do que a metade do PIB de São Paulo”, lembra. Desse período para cá, o país viu desaparecer do setor público economistas como Domingo Cavallo, Roberto Lavagna, Guillermo Calvo, Aldo Ferrer, José Luis Machinea e, sobretudo, uma lista de acadêmicos e colaboradores. “Vemos a progressiva decadência da economia argentina porque falta respeito pelas instituições”, explica Enrique Saraiva, argentino naturalizado brasileiro, professor de administração pública da FGV.

PÉS PELAS MÃOS

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Chávez e Cristina: medidas políticas derrubaram o PIB dos dois países A decisão tomada por Cristina criou uma crise institucional, pois lá o BC é independente, o presidente tem mandato concedido pelo Congresso Nacional. Quando for divulgado o PIB de 2009, espera-se uma queda de 2,9%, com agravamento do déficit público e aumento do desemprego e da inflação (entre 15% e 25%). Cristina decidiu demitir Redrado porque ele se recusou a usar as reservas para pagar a dívida pública. Redrado, por sua vez, acusa Cristina de querer aumentar o gasto público, indiretamente, à custa das reservas. Ele se mantém no cargo por força judicial e a decisão definitiva sobre a demissão cabe ao Parlamento, no qual ela não tem maioria. Apesar de ressaltar que Cristina tem o direito de ter um aliado à frente do BC argentino, o cientista político Luiz Alberto Moniz Bandeira, autor de “Brasil, Argentina e Estados Unidos – da Tríplice Aliança ao Mercosul”, avalia que tanto na Argentina quanto na Venezuela o problema é o predomínio da política sobre as questões técnicas. Na Venezuela, Chávez conseguiu, com a maxidesvalorização de até 100%, reduzir o poder aquisitivo da população e provocar inflação. Além de colocar o Exército como guardião dos preços, Chávez anunciou racionamento de energia e redução na exportação para o Brasil.

A Venezuela fornece 20% da energia consumida em Roraima, o que obrigou o governo brasileiro a ligar as termoelétricas a diesel para garantir o suprimento de energia no Estado. “O problema é que Chávez só está empenhado em estender a sua influência bolivariana”, diz Norman Gall, do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial. “Ele não se interessa pelas taxas de homicídio que estão aumentando, menos ainda pela teoria econômica. Por isso, essas extravagâncias.” Para o povo venezuelano, o preço já é alto, independentemente do Exército. O PIB deve cair 2,9% em 2009, a inflação deve alcançar 25,1%, a maior da América Latina, e o déficit fiscal bate em 6% do PIB. E quem é o ministro da Economia e Finanças na Venezuela? Um advogado: Ali Rodríguez Araque. Por quê? Chávez diz que não precisa de economistas.

DiplomaciaPresidente russo anuncia avanço para tratado de desarmamento nuclear

A Rússia e os Estados Unidos aproximaram suas posições sobre um novo tratado para redução de armas nucleares, afirmou a agência de notícias RIA, citando o presidente russo, Dmitry Medvedev. "As negociações continuam, elas não são fáceis, mas no geral nós concordamos com os norte-americanos em muitas posições", afirmou Medvedev segundo a RIA, durante um encontro de líderes partidários da Rússia. O Tratado para Redução de Armas Estratégicas (Start na sigla em inglês), de 1991, expirou em 5 de dezembro e as negociações entre Washington e Moscou para um novo acordo continuam.

O novo tratado é parte de um esforço para reiniciar as relações dos EUA-Rússia e ambos os lados prometeram cumprir os termos do tratado antigo até que uma nova versão possa ser concluída. Entre as questões que rondam o tratado estão os números de armas permitidas e procedimentos de verificação, ambas as quais precisam de discussão detalhada. "Demos um passo sério adiante e uma extensão considerável de nossas posições foram concordadas", afirmou Medvedev segundo a RIA. A agência russa Interfax também citou Medvedev afirmando que futuro tratado precisa ser ratificado simultaneamente pelos dois lados.(Com agência France-Presse)

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BrasilEles têm outros planosPor trás do polêmico Programa Nacional de Direitos Humanos está a recorrente tentativa dos radicais do governo de impor medidas autoritárias. Só que agora esse pessoal mira o futuro pós-Lula

Ed Ferreira/AE

MANDOU PARAR ATÉ CERTO PONTOLula diz que assinou o documento sem ler os itens mais sensíveis, mas só mudou um e manteve quase todos. Dilma silenciou

Existem algumas obsessões que perseguem o governo Lula desde seu início e, ao que tudo indica, continuarão a existir até o fim. Em dezembro passado, o presidente assinou um decreto lançando o terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos – um calhamaço de propostas com o nobre objetivo de pautar ações oficiais para proteger minorias e grupos em risco, como índios e quilombolas. O plano, porém, foi concebido nos moldes de um cavalo de troia. Escondida no corpo das medidas de apelo humanitário, há uma série de propostas que, de tão absurdas, provocaram desentendimentos e protestos de vários setores da sociedade, incluindo uma crise dentro do próprio governo. Os ministros militares, por exemplo, ameaçaram renunciar aos cargos diante da possibilidade de revogação da Lei da Anistia, de 1979, um pacto político e social que permitiu a transição da ditadura militar para a democracia sem maiores confrontos. Diante das pressões, Lula decidiu alterar o trecho do decreto que previa a criação de uma comissão com poderes para apurar e punir os militares envolvidos em crimes durante o regime dos generais. A decisão contornou a revolta na caserna – e apenas isso. O restante do plano continuou intacto.

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Elaborado sob os auspícios do secretário Especial dos Direitos Humanos do governo, Paulo Vannuchi, ex-militante de um grupo terrorista dos anos 70, o plano continua ameaçando a liberdade de imprensa e protegendo invasores de terras, além de proibir a exibição de símbolos religiosos em lugares públicos e legalizar o aborto. Embora seja amplo e muitas vezes vago, o PNDH não é apenas uma simples carta de intenções, sujeita a delírios de toda natureza, como alguns representantes do governo tentam fazer crer com o objetivo de minimizar as críticas. A diferença entre o PNDH e outro projeto qualquer é que ele chega ao Congresso assinado pelo presidente da República. É, portanto, uma proposta do governo, analisada pelo governo, que conta com o aval do governo. O peso, evidentemente, muda. Os parlamentares podem alterá-la ou remetê-la para o lixo, mas não é isso que normalmente ocorre. Pontos significativos dos dois programas anteriores foram implementados, como a criação da lei que tornou inafiançável o crime de tortura, a retirada do foro especial para policiais que praticam crimes comuns e o combate ao trabalho infantil – só para citar alguns exemplos. E foi contando com a simpatia natural pelo tema dos direitos humanos que o governo resolveu inserir os contrabandos ilegais no texto.

A manutenção desses planos é um compromisso dos países que participaram da Conferência Mundial da ONU sobre o tema, em Viena, em 1993. No encontro, foram traçadas as diretrizes gerais de proteção aos direitos humanos e inclusão social. O documento do governo Lula é o terceiro elaborado pelo Brasil. Os dois primeiros foram editados em 1996 e 2002, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. Em linhas gerais, os planos até se parecem nas questões pertinentes ao assunto. A diferença é que o PNDH petista decidiu enveredar por caminhos acidentados. A repercussão de várias de suas propostas foi tão ruim que o presidente Lula se viu obrigado a admitir ter assinado o decreto sem ler os pontos mais sensíveis. A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, a quem cabe analisar o conteúdo de tudo o que vai parar na mesa do presidente, também se esquivou de responsabilidade – que foi integralmente empurrada para o gabinete do secretário Paulo Vannuchi. Lula, de fato, pode não ter lido o documento. Dilma, muito envolvida com a campanha presidencial, pode ter deixado escapar os absurdos. O que o governo não pode é fazer de conta que tudo não passou de mal-entendido, de um exagero.

Desde o início do governo, o presidente Lula atua como um dique de contenção do PT e de seus esquerdistas mais furibundos. Entregou a eles núcleos periféricos de poder e, assim, os manteve distantes das decisões sobre temas vitais, como a política econômica e os programas sociais, segredos do sucesso de seu governo. "Com milhares de cargos à disposição na administração pública, em fundos de pensão e em estatais, até o mais empedernido partido socialista, se precisar, vira neoliberal", explica o cientista político Rubens Figueiredo. Foi dessa maneira que Lula acalmou o ímpeto dos radicais durante sete anos. A receita valeu até hoje, mas a aproximação do fim do governo fez com que esses grupos, até por questão de sobrevivência política, deixassem o estado de letargia. O PNDH é um exemplo. Ele propõe apurar os crimes dos militares, mas nada fala sobre as execuções perpetradas pelos terroristas de esquerda. "Uma boa parte do PT é ressentida com Lula por não ter sido protagonista do seu governo. Como não dá mais, prepara o terreno para o futuro", afirma um dos

O MENTOR DA CRISESob os auspícios de Vannuchi,lançou-se o programa que causou atrito com os militares, os produtores rurais e a Igreja Católica

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coordenadores da campanha presidencial da ministra Dilma Rousseff, preocupado com o cerco que já se avizinha. Dilma não tem a mesma liderança nem a autoridade de Lula dentro do partido. Também não terá a sua popularidade. Por fim, é dona de uma biografia mais ideológica do que a do presidente. Ela, inclusive, integrou um grupo que participou da luta armada contra o regime militar, da qual Lula manteve distância estratégica. Os radicais acreditam que, caso Dilma seja eleita, encontrarão no seu governo um porto mais seguro – e um caminho mais livre para agir.

Ao que parece, contudo, a ministra não está satisfeita com esse pessoal. Mais magra e bronzeada após uma temporada em um spa no Rio Grande do Sul, na terça-feira, durante a primeira reunião do ano do comando de sua campanha, Dilma reclamou muito da polêmica criada por Paulo Vannuchi e pediu ao futuro presidente do PT, José Eduardo Dutra, que controle os radicais do partido para evitar qualquer tipo de problema. Em público, porém, ela silenciou sobre o Programa de Direitos Humanos. Assim como Lula, a ministra tem procurado se mover de olho na bússola eleitoral. A avaliação de sua equipe é que não valeria a pena criar neste momento um fato que pudesse decepcionar o eleitorado mais à esquerda. Isso está de acordo com a estratégia política geral que vai nortear o comportamento de Dilma até sua saída do governo, que deve acontecer em abril. A principal recomendação é que ela evite justamente entrar em temas polêmicos.

Ainda assim, ela permanece ministra. A Casa Civil é responsável por analisar a legalidade e a constitucionalidade de todos os projetos do governo antes de enviá-los à Presidência. Deve também resolver divergências e conflitos de interesse entre ministérios. Apesar disso, o Programa de Direitos Humanos passou pela mesa da ministra e chegou às mãos de Lula com vários focos de atrito entre setores do governo, como os que envolveram Paulo Vannuchi e o ministro Nelson Jobim, da Defesa, no caso dos militares; e os ministros Guilherme Cassel, da Reforma Agrária, e Reinhold Stephanes, da Agricultura, no caso das invasões de terra. Independentemente das conveniências eleitorais, seria muito bom para o país saber o que Dilma pensa a respeito.

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Candidato Sebastián Piñera pode levar a direita ao poder no Chile após 52 anos

MARCIA CARMOenviada especial da BBC Brasil a Santiago

Empresário, ex-senador e candidato pela segunda vez à Presidência do Chile, Sebastián Piñera, da Coalición para el Cambio (Frente para a Mudança), chega ao segundo turno das eleições no Chile, marcado para este domingo (17), como favorito em uma votação que promete ser apertada. Se for eleito, ele será o primeiro representante da direita --ou centro-direita, como se define no país--, desde 1958, a chegar ao Palácio Presidencial La Moneda. Desde o retorno da democracia no Chile, em 1990, a frente governista Concertación, de centro-esquerda, está à frente da Presidência. "A Concertación está há 20 anos no poder. Peço uma oportunidade para governar e mudar o que se precisa para melhorar a vida dos chilenos", disse.

Piñera entrou na corrida para a sucessão da atual presidente, Michelle Bachelet, como favorito e foi o mais votado no primeiro turno, em 13 de dezembro. Ele recebeu 44% dos votos e o candidato do governo, o ex-presidente Eduardo Frei, cerca de 29%. Apesar da preferência demonstrada no resultado do primeiro turno, as duas pesquisas de opinião mais recentes indicaram que a diferença entre os dois candidatos diminuiu. De acordo com a previsão do instituto Adimark, Piñera venceria com apenas 5% de

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diferença dos votos. Outra pesquisa, da Equipos Mori, sugere que ele alcançaria empate técnico com Frei e venceria por margem inferior a 2%.

Promessas Na campanha para este segundo turno, Piñera ressaltou que pretende criar planos sociais nas áreas de saúde e educação para os mais carentes, além de permitir que universitários de famílias mais pobres tenham acesso à universidade, já que esta é cobrada no país. Piñera prometeu ainda manter as medidas implementadas por Bachelet, como a presença de creches nas áreas populares e as facilidades para mães solteiras poderem trabalhar. O candidato da oposição afirmou ainda que pretende criar "um milhão de empregos" nos quatro anos de mandato e combater a delinquência no país.

A campanha de Piñera para a segunda fase das eleições também foi marcada pelos contínuo questionamentos da imprensa a respeito de dois assuntos: os negócios pessoais do candidato e sua disposição para incluir políticos do partido que apoiou Augusto Pinochet em seu eventual governo. Entre os negócios de Piñera estão a companhia aérea LAN, a TV Chilevisión e o time de futebol Colo, Colo. "Eu já disse um milhão de vezes. Venderei meus negócios na LAN. Vamos transferir a Chilevisión para uma fundação sem fins lucrativos e, se a lei permitir, quero continuar sendo acionista e diretor do Colo, Colo", afirmou.

Piñera também insistiu que na formação de seu gabinete não estarão ex-membros do governo militar. "O governo militar terminou há vinte anos e já é história. Vamos olhar para o futuro. Além disso, os que me apóiam não integraram o governo militar", disse. Em 1988, Piñera votou 'não' no plebiscito sobre a permanência de Pinochet - uma votação que abriu caminho para a democracia no Chile. "Votei não e vocês sabem disso. Sempre fui contra e condenei crimes de direitos humanos. E após estudar em Harvard voltei para o Chile e trabalhei em projetos sociais na Cepal. A preocupação com direitos humanos e a área social não é exclusiva da esquerda", afirmou.

Analistas ouvidos pela BBCBrasil afirmam que Piñera venceu o primeiro turno e poderia chegar a ser eleito porque a Concertación enfrenta o "desgaste" de estar há duas décadas no poder. O professor de Ciências Políticas da Universidade do Chile, Guillermo Holzmann afirma que além do desgaste do partido governista, o eleitor espera uma "melhor administração" dos recursos públicos num eventual governo Piñera. "Piñera é um empresário com experiência política, que chega num momento de desgaste da Concertación, mas para um setor da sociedade seu discurso de mudanças não é suficiente", disse Holzmann.

Estudo vê risco de epidemia de HIV resistente a medicamentos O aumento da circulação de variantes do HIV resistentes ao tratamento com antirretrovirais nos EUA pode provocar uma epidemia desse tipo de "supervírus" com início nos países desenvolvidos. O alerta é de um estudo publicado na revista "Science", que analisou a dinâmica de transmissão do vírus em San Francisco, na Califórnia. Nos últimos 20 anos, a presença do vírus resistente cresceu de forma significativa na cidade, assim como na maioria dos países ricos, onde o tratamento com antirretrovirais é comum. Como os soropositivos podem transmiti-lo para mais de uma pessoa, os pesquisadores afirmam que a ameaça de epidemia nesses países é real.

Simulação

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Para mapear a evolução do HIV em São Francisco, os cientistas criaram um modelo matemático com os dados das infecções nas últimas duas décadas. A simulação considerou a transmissão dos três tipos de HIV resistentes aos principais antirretrovirais do mercado. A partir dessas informações identificaram os fatores do tratamento que levaram à resistência aos medicamentos. O modelo mostrou que muitos dos HIV resistentes, que têm evoluído nos últimos dez anos, são transmitidos de uma pessoa para outra mais facilmente do que se acreditava. Essa nova dinâmica, dizem os cientistas, tem potencial para provocar uma nova onda de resistência aos medicamentos. Embora os remédios tenham conseguido manter a taxa de transmissão do HIV resistente abaixo de 15% do que seria esperado, cerca de 60% dos vírus desse tipo têm potencial para causar epidemias autossustentáveis caso saiam do controle. "Este estudo não é só sobre San Francisco. É basicamente sobre muitas outras comunidades de países ricos e tem implicações significativas para a saúde global", afirmou Sally Blower, da Universidade da Califórnia em Los Angeles, líder da pesquisa em comunicado à imprensa. Segundo ela, o modelo matemático aplicado à cidade pode ser transposto para "qualquer outro lugar", desde que feitas adaptações necessárias.

Migração viral Uma das maiores preocupações dos cientistas agora é a disseminação do vírus resistente aos tratamentos nos países pobres. A chegada desse tipo HIV a locais onde o acesso aos medicamentos é difícil e as políticas de saúde pública são limitadas pode anular os recentes avanços conquistados em áreas mais atingidas pelo HIV, como a África do Sul. Por enquanto, não há dados sobre a presença do vírus resistente nos países mais pobres. De acordo com a OMS (Organização Mundial de Saúde), o principal empecilho é a falta de informações confiáveis sobre saúde pública nessas nações. A insistência da entidade em tratar de maneira semelhante todos os infectados pelo HIV foi alvo de críticas de Blower. "O mais inquietante é que nosso modelo mostra que a estratégia atual para a eliminação do HIV proposta pela OMS inadvertidamente pode piorar as coisas e aumentar significativamente os níveis de resistência aos medicamentos em muitos países africanos", afirmou a pesquisadora americana. De acordo com os cientistas, o modelo aplicado na pesquisa pode ser usado para o estudo da dinâmica de outras doenças resistentes a tratamentos.

Rio São Francisco pode ter duas usinas nucleares

As duas próximas usinas nucleares a serem construídas no Brasil ficarão localizadas às margens do rio São Francisco, que corta parte da região Nordeste, indicam estudos técnicos que serão levados à decisão política do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e dos ministros responsáveis pelo programa nuclear brasileiro. O programa nuclear prevê a construção de mais quatro usinas de 1.000 MW até 2030, duas no Nordeste e duas no Sudeste --onde os estudos estão mais atrasados. No Nordeste, a estatal Eletronuclear analisou a possibilidade de construção em 20 locais de quatro Estados: Bahia, Sergipe, Alagoas e Pernambuco. Mas áreas próximas ao litoral foram descartadas por causa da existência de grandes reservatórios subterrâneos de água.

Potências debatem possível sanção a programa nuclear iraniano

Os países do Grupo P5+1 concluíram hoje uma reunião em Nova York para tratar sobre a possível imposição de novas sanções ao Irã por causa de seu polêmico programa nuclear. Não foi registrado nenhum avanço nos diálogos, devido às diferenças que persistem entre essas nações --os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, China, EUA, França, Reino Unido e Rússia, mais a

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Alemanha-- sobre o tema. Na reunião de hoje, que aconteceu a portas fechadas e na sede da Comissão Europeia em Nova York, os seis países abordaram a proposta de Washington para impor possíveis novas sanções a Teerã, a quem as potências ocidentais acusam de estar utilizando o seu programa nuclear para uso militar e a quem criticam por rejeitar suas ofertas de diálogo para resolver o problema, que já dura vários anos. Fontes diplomáticas da União Europeia (UE) assinalaram que as diferenças persistem entre os países e que durante esta reunião constataram as divergências entre eles e a "decepção" de todos pela decisão iraniana de seguir em frente com seu programa nuclear. "Não houve conclusões no sentido que não se tomou decisão alguma neste momento", disse à imprensa ao término da reunião o representante do Ministério de Exteriores russo, Serguei Ryabkov. Robert Cooper, diretor político do Conselho da UE, entretanto, não descartou a hipótese de sanção. "Começamos a examinar novas medidas adequadas", disse. Os seis países se reunirão de novo, embora a data nem o local tenha sido determinado, para analisar a proposta que em outubro passado fizeram aos iranianos para que Teerã troque seu urânio enriquecido por combustível nuclear.

Com Efe e France Presse

Não cabe mais ninguémGuarulhos: o maior aeroporto da América do Sul completa 25 anos obsoleto, desconfortável e cheio de problemas. Passar por ali é um inferno

Caos AéreoPassageiros esperam até duas horas para poder embarcar

O Aeroporto Internacional de São Paulo é o território mais cosmopolita do Brasil. Cerca de 140 mil pessoas – entre passageiros vindos de 144 cidades e 26 países, funcionários e visitantes – circulam diariamente pelo local. Fincado em Cumbica, bairro do município de Guarulhos a 25 quilômetros do centro da capital paulista, o aeroporto é o mais movimentado da América do Sul e o segundo no ranking da América Latina. Só perde para o da Cidade do México. Sete de cada dez viajantes vindos do Exterior ou que voam para fora do Brasil, passam por Cumbica. Os números superlativos, no entanto, revelam uma estrutura superada. Nos horários de pico, o fluxo de gente costuma exceder em mais de 50% a capacidade dos terminais e os passageiros são

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obrigados a enfrentar cerca de duas horas de fila tanto no check-in quanto no desembarque internacional – enquanto os órgãos internacionais recomendam uma espera de, no máximo, 30 minutos. Nos últimos dias, ISTOÉ esmiuçou o cotidiano da principal porta de entrada e saída do País. Ouviu especialistas, autoridades do governo, funcionários e passageiros. A equipe de reportagem passou 24 horas consecutivas no aeroporto, entre a quarta-feira e a quinta-feira da semana passada. Testemunhou todo tipo de sentimento e reação: ansiedade, emoção, cansaço, descontração, indignação.

“Os serviços prestados em Cumbica são péssimos”, avalia Anderson Correia, diretor da Sociedade Brasileira de Pesquisa em Transporte Aéreo. “O conforto e a forma de operação em alguns espaços, como as salas de embarque remotas (em que os passageiros são levados de ônibus às aeronaves) e as de restituição de bagagens, receberiam notas D ou E, segundo critérios internacionais. Estão próximas do colapso.” Viajantes como a paranaense Tatiane Souza, 30 anos, sentem na pele o que essas notas representam. “Foi um absurdo a forma como trataram a minha família”, diz. Por mais de 24 horas, ela tentou embarcar com o marido e os filhos para a Espanha. O calvário começou quando o avião que os trazia de Curitiba não aterrissou em Guarulhos no horário previsto. Quando finalmente a família conseguiu chegar, o embarque para Madri estava encerrado. Juscelino, marido de Eliane, conta que faltavam 25 minutos para o voo decolar, mas os funcionários da TAM não permitiram a entrada dos retardatários.

Juscelino relata que, depois de muita discussão, eles foram levados para um hotel. Passava de 2h e não havia mais vagas. A família só conseguiu se hospedar em outro local, às 4h da manhã. A viagem foi remarcada para a noite seguinte e os aborrecimentos não cessaram. O aeroporto continuava desconfortável, cheio de filas, mal iluminado. Na sala de embarque havia cerca de 200 pessoas, mas apenas 75 cadeiras. Alguns tentavam descansar se recostando nas paredes. Outros esticavam as pernas – ou o corpo todo – sobre os ladrilhos. Antes de deixar o Brasil, os Souza tiveram de esperar mais de três horas sentados no chão frio. Os 45 dias de férias acabaram ali, literalmente, em solo brasileiro.

Filas - Nos períodos de pico, cada funcionário da PF atende mais de 100 passageiros por hora

A sensação de impotência e descaso que os passageiros experimentam é decorrência do crescimento vertiginoso e desordenado do aeroporto. Desde a inauguração, em 1985, o número de viajantes foi multiplicado por dez e o de pousos e decolagens aumentou quase cinco vezes. Mas os investimentos em infraestrutura foram escassos. O terceiro e o quarto terminais de passageiros, previstos desde a concepção de Cumbica, não saíram do papel até agora. Apenas um deles está em fase de licitação. Se tudo der certo, deve ser inaugurado em 2014, às vésperas da Copa do Mundo. Um estudo do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias (Snea), divulgado recentemente, mostra que a situação de sete dos 12 aeroportos que servirão as cidades-sede da competição é preocupante. O de Brasília, por exemplo, fechou o ano passado com 12,2 milhões de passageiros – movimento 22% superior a sua capacidade. Mesmo que as obras planejadas sejam concluídas no prazo, é provável que sejam insuficientes. “Nosso maior desafio não é a Copa nem a Olimpíada, é atender ao aumento da demanda normal e as pessoas que já estão voando”, afirma Murilo Marques Barboza, presidente da Infraero, estatal que administra os aeroportos.

Um dos principais entraves no Brasil é que os voos estão concentrados em determinados horários, como no início e no fim do dia. Se fossem distribuídos de maneira uniforme, o desconforto seria menor. Na quarta-feira passada, entre 5h e 6h,

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1.950 pessoas chegaram do Exterior. Na primeira etapa do desembarque, a imigração, tiveram de passar pela Polícia Federal. Há 18 guichês nos dois terminais. O que significa que cada funcionário teve de atender, em média, 108 passageiros que aterrissaram naquele intervalo. Na outra etapa do desembarque, a da restituição das bagagens, há 12 esteiras. Entre cada uma delas existem 12 metros de espaço. No entorno de cada esteira ficaram amontoados, em média, 162 passageiros com seus carrinhos. Vencida essa fase, considerada por muitos a mais sofrida, ainda é necessário passar pela alfândega. Nove em cada dez passageiros vão para a ala dos que não têm “nada a declarar”. Percorrem, em fila única, com seus carrinhos pesados, um corredor de cerca de dois metros de largura antes de ser liberados. Esse desgaste, no entanto, não ocorre em certos períodos do dia. Entre 2h30 e 5h da quinta-feira, o desembarque internacional ficou vazio – às moscas.

O processo de desembarque, em geral, é ainda mais estressante porque os viajantes passam muitas horas dentro do avião. A professora Marli Roma, 50 anos, aguardava ansiosa a filha adolescente que chegaria do Canadá, depois de 15 horas de voo. “Onde você está?”, perguntava pelo celular. “Minhas malas não chegam, mãe.” Beatriz, 18 anos, levou mais de uma hora para desembarcar. Surgiu esbaforida empurrando um carrinho pesado. Teve de parar no caminho porque esbarrou numa porta estreita e derrubou a bagagem.

Cumbica foi projetado com a intenção de operar no mercado doméstico. Mas rapidamente o governo cedeu às companhias aéreas, que pressionaram para transferir os voos internacionais do Galeão, no Rio de Janeiro, para São Paulo – o centro financeiro do País. As áreas de imigração e alfândega tiveram de ser improvisadas para atender à demanda cada vez maior. A falta de planejamento é evidente. “Para dar maior celeridade, é necessário alterar a logística e o layout do desembarque”, opina Seiken Tasoko, inspetor-adjunto da Receita Federal. Para efeito de comparação: o Aeroporto Internacional Gatwick, em Londres, tem dois terminais e duas pistas de pousos e decolagens – assim como Cumbica – e atende 50% mais passageiros. “A diferença é que, em Gatwick, os terminais e o pátio das aeronaves

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são mais bem aproveitados e há mais saídas rápidas das pistas”, avalia o comandante Ronaldo Jenkins, diretor do Snea.

Futuro complicado - Os passageiros sofrerão ainda mais com a Copa do Mundo, em 2014

Mesmo nos trechos nacionais, em que não é preciso passar pelos controles da Polícia e da Receita, os passageiros penam. A empresária Gisele Ribeiro, 22 anos, levou duas horas para fazer o check-in para a capital do Amazonas na noite da quarta-feira. “Nunca peguei uma fila tão grande em toda a minha vida, que inferno”, reclama. Segundo Francisco Luiz Xavier de Lemos, presidente do Sindicato Nacional dos Aeroportuários, parte da lentidão é fruto da falta de fiscalização. “Muitas vezes, há filas enormes no check-in, e metade dos boxes das empresas aéreas não tem funcionários”, diz. “As esteiras ficam rodando vazias porque as companhias não colocam gente para levar as malas.” Para ninguém sair prejudicado, o aeroporto tem de funcionar como uma orquestra. Se alguém falha, os efeitos são imediatos. “Cumbica precisa incorporar as melhores ferramentas de gerenciamento de pistas e terminais”, acredita Respício do Espírito Santo Júnior, presidente do Instituto Brasileiro de Estudos Estratégicos e de Políticas Públicas em Transporte Aéreo. Segundo ele, um “choque tecnológico” é fundamental para melhorar a movimentação das aeronaves e o conforto dos passageiros.

Os viajantes ficam tanto tempo dentro dos aeroportos que muitos deles se transformaram em shopping centers. Em Cumbica, há 197 pontos comerciais. A receita bruta, que inclui tarifas aeroportuárias e arrecadação com o comércio, foi de R$ 680 milhões no ano passado. Tem de tudo: chaveiro, consultório dentário e até uma sala ecumênica – onde há uma rosa dos ventos pregada na parede, com o leste destacado, para orientar os muçulmanos. A professora baiana Deise Viana, 26 anos, se sentiu obrigada a experimentar uma das cabines do Fast Sleep, uma espécie de hospedaria expressa. Pagou R$ 145 para dormir entre cinco e oito horas. Deise voltava do Chile e perdeu a conexão para Salvador porque o voo em que estava foi desviado para o Rio de Janeiro. Deise esbravejou, mas não teve ajuda da companhia aérea. Tentou reclamar à Agência Nacional de Avião Civil (Anac). Passava das 22h e ela deu com a cara na porta. Ainda que Deise quisesse apelar para Deus, também não conseguiria. Até a sala ecumênica estava fechada.

Em busca de um candidatoPela primeira vez os movimentos sociais vão divididos para uma eleição e alguns até defendem voto nulo

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Hugo Marques e Sérgio Pardellas

NOVO RUMOMST já não marcha mais unânime a favor do PT

Desde 1989, era fácil para os movimentos sociais escolherem um candidato a presidente. O nome de Luiz Inácio Lula da Silva reunia todas as expectativas daqueles que defendem as bandeiras socialistas ou lutam por questões caras às minorias. Depois de dois mandatos, porém, o PT – pela primeira vez na história do País – já não forma mais o consenso justamente entre aqueles que, há 30 anos, desenharam o mapa de seu DNA. Se algum dado pode mitigar  esse desgaste da legenda, lá vai: nemo PT nem qualquer outro partido. Os movimentos sociais iniciam a campanha de 2010 divididos. Dirigentes de várias organizações ouvidos por ISTOÉ reclamam de falta de diálogo em torno de propostas para o País e do distanciamento dos candidatos ao Palácio do Planalto. “Muita gente está defendendo o voto nulo”, revela dom Tomás Balduíno, representante da Comissão Pastoral da Terra (CPT) – entidade que, desde sua origem, é quase um sinônimo de PT. Dom Tomás é avesso aos projetos do PSDB de José Serra, mas também não vê sentido em se alinhar à candidatura da ministra Dilma Rousseff. “A posição do pessoal é não votar na candidata do Lula, pois não há diferença com o governo do Fernando Henrique Cardoso”, diz. Além da decepção por assistir Lula sustentar o que consideram o mesmo programa econômico “neoliberal” de FHC, os movimentos sociais têm pouca identificação com Dilma – coisa que com Lula ocorria de forma natural. No Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), muitos que sempre estiveram abraçados a Lula não têm nenhum diálogo com Dilma.

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“Não conheço a Dilma pessoalmente”, diz Gilmar Mauro, um dos principais ideólogos do MST. “Nas reuniões com o Lula, ela nunca participava.” O coordenador nacional, João Pedro Stédile, deve participar da elaboração de uma pauta única de reivindicações dos movimentos sociais e das centrais para ser entregue aos candidatos. Entre alguns militantes do MST, há muitos que votam em Marina Silva. O descontentamento na CPT, no MST e no Movimento de Atingidos por Barragens (MAB) tem origem nas obras do PAC, principalmente nas hidrelétricas, que segundo eles expulsam ribeirinhos, índios e sem-terra. A autorização para a construção da usina de Belo Monte, no rio Xingu, por exemplo, foi comparada nos sites do MST e do MAB a “mais um presente” do governo Lula para as construtoras. O MST também reclama do pouco avanço da reforma agrária e da disseminação dos transgênicos. Nas centrais sindicais, o quadro é semelhante. No dia 27 de janeiro, Lula reuniu-se com a cúpula do PDT e ouviu reclamações. “Dilma, você não é o Lula, você tem que se aproximar dos trabalhadores, você está distante dos trabalhadores, dos movimentos sociais”, pediu o deputado Paulo Pereira da Silva, presidente da Força Sindical, que reúne 12 milhões de trabalhadores.

“Mas eu já fui à Força Sindical”, respondeu Dilma. “Pôxa, já faz mais de um ano.” A ministra fez um mea-culpa: “Eu estou longe do movimento social mesmo.” Ela prometeu que após o Carnaval vai visitar as centrais e as sedes dos movimentos sociais. Há dificuldade de unificar a Força porque o vice-presidente, Melquíades de Araújo, é ligado ao tucano Geraldo Alckmin e defende o apoio a Serra. Na União Geral dos Trabalhadores, o presidente Ricardo Patah, que no passado chegou a ser vaiado entre os pares por apoiar Lula abertamente, agora prega uma consulta a todos os candidatos. “Vamos conversar com o Serra e a Dilma, em torno de um projeto de inclusão social e uma revolução na educação”, diz Patah. “Queremos discutir política de salário mínimo, terceirização e lucro de resultados.” A única central que defende voto só em Dilma abertamente é a Central Única dos Trabalhadores (CUT), com sete milhões de filiados. “Sabemos quem não queremos de volta”, diz o presidente da CUT, Artur Henrique da Silva Santos. Com a intenção de atrair seus tradicionais aliados, o governo abriu o saco de bondades.

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O Incra fechou convênio com a Confederação de Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil, investigada por desvio de recursos públicos. O vencimento do convênio é só em 2012. O Ministério da Saúde presenteou o MST com uma participação no Grupo da Terra, para formular políticas para o campo. Detalhe: mesmo sem CNPJ, o MST está na portaria publicada em dezembro no “Diário Oficial da União”.

Guerra mornaObama enfrenta a China e sofre ameaças. Parece sério. Mas não é, pois a economia dos dois países depende de paz e parceria

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Claudio Dantas Sequeira

INTERDEPENDÊNCIA Obama e Jintao: briga tem limite

A visita do dalai-lama a Washington, prevista para ocorrer este mês, provocou tensão nas relações entre os Estados Unidos e a China. Pequim considera o líder tibetano um separatista e vê no encontro dele com o presidente Barack Obama uma afronta grave. Num encontro privado com Obama, em novembro, o presidente chinês, Hu Jintao, expressou “resoluta oposição” à presença do religioso em solo americano, o que, segundo ele, só fomentará o tumulto e a divisão. Na quarta-feira 3, o porta-voz da chancelaria chinesa fez uma ameaça velada. “Nós apelamos aos EUA que compreendam a grande sensibilidade da questão tibetana e lidem com o problema de maneira prudente e apropriada, para evitar danos adicionais às relações”, afirmou. O apelo, no entanto, não encontrou eco do lado americano. Obama fez que não ouviu e prometeu endurecer a relação, com ênfase na agenda comercial. “O enfoque que adotamos é ser muito mais firmes na aplicação das regras existentes”, disse o presidente a senadores democratas. “A relação bilateral, que com a posse de Obama prometia avançar, acabou retrocedendo e está em uma fase muito crítica. Talvez o pior momento em muito tempo”, avalia o historiador Severino Bezerra Cabral, presidente do Instituto Brasileiro de Estudos de China Ásia-Pacífico.

Ele lembra que, além da questão do dalai- lama e da censura ao Google, o diálogo entre Washington e Pequim sofreu outro recente abalo numa área sensível que é a militar. Há cerca de uma semana, os EUA anunciaram a venda de US$ 6,4 bilhões em armas para Taiwan. Cabral explica que Tibete e Taiwan são temas sensibilíssimos para a China, e no passado já levaram a crises muito sérias. David Shambaugh, especialista em China da George Washington University, acha que parte do problema está na própria diplomacia chinesa. “Eles têm se tornado muito truculentos, às vezes estridentes, às vezes arrogantes, sempre difíceis”, diz. Segundo ele, esse posicionamento tem praticamente inviabilizado a execução dos objetivos do memorando assinado por Obama e Jintao em novembro. Para Lytton Guimarães, coordenador do Núcleo de Estudos Asiáticos da UnB, a tendência é que as relações entre EUA e China continue a sofrer altos e baixos. “Mas não acho que essa dinâmica possa piorar, pois uma ruptura seria catastrófica para ambos os lados, com consequências para todo o planeta.” Ele se refere à interdependência entre  as duas nações. Se por um lado a China é a maior detentora de títulos da dívida americana,

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por outro o mercado consumidor dos EUA é o principal destino das exportações chinesas. Ou seja, China e EUA estão no mesmo barco e só lhes resta remar na mesma direção.

A esperança é o "chapéu chinês"Mesmo com os reservatórios das hidrelétricas cheios, o sistema elétrico acionou as usinas termelétricas, pois as linhas de transmissão de Itaipu estão encharcadas. Elas vão ganhar proteção extra

PROTEÇÃO AO ISOLADORChapéus chineses, semelhantes ao da foto, serão instalados na linha de transmissão que deu origem ao último apagão

As chuvas que já causaram tanta destruição neste verão têm ao menos um aspecto positivo: poucas vezes os reservatórios das usinas hidrelétricas brasileiras estiveram tão cheios. É a garantia de que será possível produzir energia elétrica barata e em abundância nos próximos meses. Os reservatórios do Sudeste e do Centro-Oeste estão com 77% de sua capacidade ocupada. No Nordeste, o índice chega a 71%; no Norte, a 91%; e, no Sul, à incrível marca de 97%. É muita água estocada, pronta para fazer girar as turbinas das hidrelétricas e iluminar o país. Apesar desse quadro generoso, surpreendeu na semana passada o anúncio do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), órgão que controla a geração de energia elétrica no Brasil, de que será preciso acionar usinas termelétricas - que produzem energia com a queima

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de combustíveis fósseis, como óleo diesel, gás e carvão - para manter a oferta de energia num nível adequado. Se há tanta água armazenada, por que apelar às térmicas? Normalmente, essas usinas só são acionadas quando o nível dos reservatórios das hidrelétricas está muito baixo. Em situações normais, as termelétricas ficam desligadas, porque sua energia é mais cara do que a de origem hídrica e seu impacto ambiental, maior, pois sua operação produz gás carbônico.

Para entender a necessidade de colocar as termelétricas para operar, é preciso analisar, em primeiro lugar, a demanda. Nunca se consumiu tanta energia elétrica no Brasil como agora. Na semana passada, o recorde histórico de consumo foi quebrado quatro vezes. Na quinta-feira 4, às 14h49, a demanda nacional por energia chegou à marca de 70 654 megawatts. O pico de consumo está diretamente atrelado ao calor: a temperatura média registrada no país em fevereiro já está 2 graus acima da marca de 2009. Isso reduz a eficácia dos sistemas de transmissão elétrica. Com o calor forte, parte da energia elétrica se dissipa enquanto está sendo transmitida. Estima-se que, atualmente, 4% de toda a energia brasileira se perca dessa forma. Além disso, os termômetros em alta fazem as pessoas aumentar a potência de seus aparelhos de ar condicionado, um dos maiores sorvedouros de eletricidade que se conhece. O consumo vai às alturas. Por fim, há o enorme impacto do que os técnicos chamam de "frio industrial": os aparelhos usados em larga escala para refrigerar produtos comestíveis em abatedouros, frigoríficos e supermercados Brasil afora. Quanto mais alta é a temperatura média registrada em um ambiente, maior será a quantidade de energia necessária para manter, por exemplo, um carregamento de carnes congelado.

Mas, além da demanda recorde, o Brasil está enfrentando outro problema: a oferta de energia para a Região Sudeste diminuiu significativamente no último mês. O principal linhão que leva energia da usina de Itaipu até São Paulo está operando com metade de sua capacidade. Em vez de entregar 6 000 megawatts à capital, o fornecimento tem ficado pouco abaixo de 3 000 megawatts. É a mesma linha que foi atingida por três curtos-circuitos em novembro passado, dando início ao maior apagão da história do país. Apesar de continuar insistindo na exótica hipótese de que a falha pode ter sido causada por três raios simultâneos, o governo, discretamente, decidiu investir em manutenção. Mais de 100 isoladores de cerâmica estão sendo trocados nas linhas de alta-tensão. Foram esses equipamentos que falharam em novembro. Como há a forte suspeita de que isso ocorreu porque eles estavam encharcados pela chuva, será colocado em cima de cada um deles um chapéu chinês, espécie de cone isolante que fará as vezes de guarda-chuva nas próximas tempestades. Essa operação de troca e a manutenção se estenderão até maio - quando deve arrefecer a onda de calor. Até lá, teremos reservatórios cheios e usinas termelétricas em ação.

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Dilúvio... 45ºdia

Há um mês e meio, os 11 milhões de habitantes de São Paulo vivem um drama que parece não ter fim – nem solução. Diariamente, a cidade é castigada por temporais intensos, que duram em torno de duas horas e instauram o caos. A chuva causa congestionamentos monstruosos no trânsito, deixa bairros inteiros alagados e sem eletricidade, derruba casas e árvores e, até a sexta-feira passada, havia provocado a morte de 14 pessoas, carregadas pela enxurrada, vítimas de desabamentos ou queda de árvores. Em janeiro, o volume de água que se abateu sobre São Paulo foi de 480,5 milímetros. Isso representa o dobro da média histórica de janeiro e o maior volume registrado desde 1947 nesse mesmo mês. São Paulo é o epicentro das chuvas torrenciais que atingiram também outras áreas do Sul e do Sudeste do país. São Luiz do Paraitinga, cidade paulista no alto da Serra do Mar, foi devastada por uma enchente que destruiu dezenas de construções do século XVII tombadas pelo patrimônio histórico. Também no interior paulista, Campinas, Sorocaba, São José do Rio Preto e Atibaia sofreram com os temporais. Em Angra dos Reis, no estado do Rio, deslizamentos de terra causados pela chuva no Ano-Novo soterraram casas e mataram 53 pessoas. Deu-se o recorde de extensão de deslizamentos em encostas de mata preservada na história da cidade.

No Rio Grande do Sul, cidades com volume de chuva médio de 100 milímetros no mês de janeiro, como Santa Maria, Santiago e São Luiz Gonzaga, foram castigadas com índices de 400 milímetros. A lavoura de arroz gaúcha sofreu perda de 1 milhão de toneladas de grãos, o suficiente para suprir a demanda do Brasil inteiro por um mês. Em Minas Gerais, nada menos que 52 cidades decretaram situação de emergência

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por causa da chuva. Em nenhuma cidade, contudo, os efeitos da chuvarada foram sentidos de forma tão constante quanto em São Paulo, a maior cidade do Hemisfério Sul e polo econômico que produz 12% do PIB do Brasil.

O brasileiro que vive no Sul ou no Sudeste está habituado às previsíveis chuvas de verão. Mas não a essa cortina de água que se repete dia após dia como se fosse uma reedição do dilúvio bíblico (que, por sinal, se prolongou por quarenta dias, tempo já ultrapassado pelo dilúvio paulistano). A pergunta que todos se fazem é por que chove tanto em um único lugar. A resposta mais curta é que existe uma conjunção excepcional de fatores meteorológicos, cada um deles contribuindo para a continuidade do aguaceiro. Já a devastação que as águas provocam, por meio de alagamentos e enxurradas, é também consequência do perfil geográfico da cidade e das características da urbanização conduzida através dos anos. No que diz respeito à meteorologia, a chuva resultou de três fenômenos. O primeiro é o fluxo de ar úmido que todo ano segue da região amazônica em direção ao Centro-Oeste, Sul e Sudeste do Brasil. Esse fluxo é intensificado pela evaporação das águas do Oceano Pacífico na região equatorial e do Oceano Atlântico no Caribe. Pois bem. Neste verão, o efeito El Niño aqueceu as águas do Pacífico equatorial em 2 graus. As águas do Caribe, por sua vez, também estão 1 grau mais quentes. A maior temperatura aumentou ainda mais a intensidade da umidade vinda do Norte, tornando-a mais propensa a provocar chuvas fortes.

O segundo fator que concorreu para a formação de temporais em São Paulo e no Sudeste foi o aquecimento do Atlântico – em 1,5 grau – na sua porção próxima à costa do Sudeste brasileiro. Isso faz com que a brisa marinha que chega ao planalto paulista, onde se localiza a capital, favoreça a ocorrência de fortes pancadas de chuva, principalmente no fim da tarde. O terceiro fator é o calor na cidade de São Paulo em janeiro. As temperaturas foram mais altas que a média do mês de janeiro nas últimas seis décadas. O calor favorece o aquecimento do solo, que por sua vez esquenta o ar. Este fica mais leve e sobe, formando nuvens carregadas. É um ciclo infernal de retroalimentação.

As chuvas fortes não causariam tantos problemas em São Paulo caso a cidade tivesse sido preparada para elas. Na virada do século XIX para o XX, impulsionada pela riqueza produzida pelo café e pelas indústrias, São Paulo deixou de ser uma vila provinciana para assumir sua vocação de metrópole. A partir daí, seus governantes optaram por canalizar boa parte de seus córregos e rios, transformando-os em galerias pluviais no subsolo da cidade. Sobre essas galerias foram construídas grandes avenidas, como 9 de Julho, 23 de Maio, Juscelino Kubitschek e Pacaembu. As galerias subterrâneas coletam a água da chuva dos bueiros e a levam para galerias maiores, que a despejam no Rio Tietê. Nesse processo, as enchentes ocorrem de duas formas. A primeira é quando o volume de água é maior do que aquele que as galerias comportam. Nesse caso, a água volta à superfície e causa alagamentos. A segunda é quando os próprios rios não comportam o volume de água despejado em seus leitos, e transbordam.

Para retardar a chegada da água aos rios há os chamados piscinões, grandes reservatórios subterrâneos que hospedam temporariamente as enxurradas. A quantidade de piscinões em São Paulo, porém, é insuficiente. O lixo jogado nas ruas também colabora para as enchentes, mas, segundo especialistas, é um fator secundário. "O problema real é o volume de chuvas em tantos dias consecutivos, que satura o solo e as galerias", diz o engenheiro Aluisio Canholi, coordenador técnico do Plano de Macrodrenagem da Bacia do Alto Tietê e especialista em drenagem urbana. A ocupação urbana das várzeas de rios, por sua vez, produz enchentes crônicas. Quando o volume do rio sobe, devido às chuvas, ele alaga as várzeas naturalmente.

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Se essa área estiver ocupada, as casas vão sempre se alagar. É o caso do Jardim Pantanal, na Zona Leste de São Paulo, construído às margens do Rio Tietê, que está há dois meses sob as águas. Para o bairro voltar ao normal é preciso que o nível do rio abaixe. Como diz a Carta ao Leitor desta edição de VEJA, tragédias como a do Jardim Pantanal despertam revoltas legítimas na população e fatalmente são exploradas politicamente. O prestígio popular do presidente americano George W. Bush entrou em queda livre devido ao modo desastroso com que ele lidou com a destruição de Nova Orleans pelo furacão Katrina. Veja na página 72 como o PT pretende usar as enchentes de São Paulo como peça de propaganda política contra o governador José Serra, provavelmente o candidato da oposição à Presidência da República.

DESASTRE POLÍTICO Em 2005, George W. Bush revelou-se um presidente de reação lenta diante do furacão Katrina (à esq). José Serra, governador de São Paulo, vistoria uma cratera aberta pela chuva na Rodovia Castelo Branco

Não há cidade que passe incólume por chuvas da intensidade das que desabaram sobre São Paulo neste início de ano. O que os governos podem fazer – e muitas vezes deixaram de fazer – é encontrar meios de minimizar os danos, evitar alagamentos prolongados e garantir que a tormenta atrapalhe o mínimo a vida de seus habitantes. Os especialistas calculam que um único dia de chuvas torrenciais em São Paulo, com alagamentos, cause um prejuízo de 95 milhões de reais só com engarrafamentos no trânsito. O engenheiro Aluisio Canholi afirma que 80% do total de perdas econômicas decorre dos congestionamentos de trânsito. Motoristas, mercadorias e bens ficam parados no trânsito, ilhados em pontos de alagamento. Nos outros 20% da conta entram fatores como perdas materiais e desvalorização dos imóveis situados em áreas sujeitas a inundações. As ações necessárias para amenizar as enchentes em São Paulo são conhecidas. O secretário municipal de Desenvolvimento Urbano de São Paulo, Miguel Luiz Bucalem, resume o que é preciso fazer:

construir mais piscinões. Na Bacia do Alto Tietê, onde fica a cidade de São Paulo e outros 35 municípios, há 45 piscinões. Número insuficiente.

aumentar a permeabilidade da cidade ampliando suas áreas verdes. A terra dos parques ao longo de córregos e rios absorve a água caso o rio transborde.

reforçar as galerias que transportam a água da chuva. Em regiões antigas da cidade, elas são muito estreitas porque foram construídas quando a cidade era menos urbanizada e havia mais solo para absorver a água.

transferir para locais seguros os moradores que vivem em áreas de risco, como o Jardim Pantanal.

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coletar o lixo na hora certa, para que ele não se espalhe pelas ruas com a chuva.

usar mais pisos com capacidade de drenagem. Estacionamentos e calçadas podem ser construídos com pisos que deixem a água da chuva ir para o lençol freático, e não para os bueiros.

Em 1947, quando ocorreu o recorde pluviométrico num mês de janeiro em São Paulo, a cidade tinha 2,2 milhões de habitantes e a chuva provocou problemas similares aos atuais, embora em escala menor. O principal fator pelo qual os relatos de tragédias em 1947 são menores que os registrados hoje é a forma de ocupação da cidade. Com ruas de terra, várzeas e lagoas pluviais às margens do Tietê, a água da chuva era mais facilmente escoada e drenada. Poucas horas depois da chuva, portanto, a cidade voltava ao normal. "Embora a chuva causasse danos, ela não criava pânico na população, como acontece hoje", diz o geógrafo Adler Guilherme Viadana, da Universidade Estadual Paulista. Hoje, ao contrário, é compreensível que os paulistanos encurralados pela água olhem em pânico para as nuvens de chuva no céu.

O inferno das boas intenções

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A prisão de seus captores americanos pouco significa para o bem-estar das 33 crianças haitianas que seriam ofertadas ilegalmente para adoção

ALÍVIO MOMENTÂNEOCrianças que foram resgatadas quando cruzavam a fronteira (à esq.) e americanos presos(Laura Silsby, à frente): e agora?

Quase um mês depois do terremoto, o Haiti já soma 212 000 mortos. Para os que sobreviveram, não há emprego e a comida depende da nem sempre funcional logística das organizações de ajuda humanitária. O desespero e a falta de horizonte estão levando muitos pais ou familiares a entregar crianças a estrangeiros na tentativa de dar a elas algum futuro. Não se conhecem as dimensões dessa prática nem em que bases ela se processa, embora haja indícios de que as famílias em muitos casos recebam dinheiro pelos filhos que cedem para adoção. O que se sabe com certeza é que essas trocas são feitas ao desamparo de qualquer liturgia legal. Isso ficou claro com a prisão, na sexta-feira passada, 29, de dez americanos que tentavam atravessar a fronteira do Haiti com a República Dominicana em um ônibus que dividiam com 33 crianças haitianas com idade entre 2 meses e 12 anos. Os menores não tinham documentos. A operação pareceu inaceitável mesmo em um país com as instituições em frangalhos e corrupção oficializada. Os americanos se identificaram como missionários batistas dispostos a correr riscos para aliviar o sofrimento de órfãos famintos, desidratados e sem esperança. Foram indiciados por sequestro de menores e associação criminosa e podem pegar até quinze anos de prisão.

As reais intenções dos missionários são alvo de suspeitas - entre elas a de que a operação tinha objetivo econômico. Laura Silsby é empresária no estado de Idaho, onde há dez anos administra o PersonalShopper.com, um claudicante serviço de internet destinado a orientar mulheres a fazer compras. Silsby responde a diversos processos na Justiça americana por não pagamento de suas dívidas. Ela desembarcou no Haiti e logo em seguida conseguiu apresentar a diversas famílias seu plano, batizado de Refúgio Infantil Vida Nova. Prometia levar as crianças para um orfanato na vizinha República Dominicana. Sua conversa deu resultado. Muitos pais levaram pessoalmente seus filhos ao ônibus e os assentos foram rapidamente preenchidos.

O sucesso da operação, soube-se mais tarde, se deveu aos falsos argumentos, todos muito convincentes, usados pelos americanos. Aos pais, disseram que seu trabalho estava autorizado pelo governo haitiano. Deram-lhes a garantia de que poderiam visitar as crianças na República Dominicana quando quisessem. O mais provável é que não tivessem a menor intenção de mantê-las em um orfanato, e sim oferecê-las

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para adoção como se não tivessem família. Uma evidência forte disso é o fato de os americanos terem declarado aos policiais haitianos que sua carga humana era composta apenas de órfãos. Outra mentira. Pelo menos vinte das crianças embarcadas no ônibus do Refúgio Infantil Vida Nova tinham parentes.

Nenhuma das condições exigidas em uma adoção internacional legal foi cumprida pelo grupo. Esse processo, quando feito de acordo com as normas, demora em torno de três anos. As pessoas que querem adotar uma criança são avaliadas por agentes de serviço social. Os parentes biológicos confiam nas instituições e acompanham os trâmites. O grupo flagrado na fronteira haitiana desprezava o caminho legal - demorado e complexo. "A maneira como essas pessoas se conduziram não sugere que estivessem agindo de boa-fé", diz a advogada Maristela Basso, professora da Universidade de São Paulo. As 33 crianças aguardam a decisão sobre seu destino, em Porto Príncipe, capital do Haiti, onde estão sob a guarda da organização europeia Aldeias Infantis SOS. Disse a VEJA Georg Willeit, pedagogo austríaco daquela entidade: "Se o governo autorizar, nós as devolveremos a seus pais. Mas, antes, temos de nos assegurar de que o que se passou com elas não se repetirá". Como todo inferno, o Haiti está cheio de boas intenções.

Ahmadinejad ordena começo do enriquecimento de urânio a 20% da Efe, em Teerã

O presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, anunciou neste domingo que ordenou ao Organismo da Energia Atômica que inicie o processo de enriquecimento de urânio a 20% -- percentual acima dos atuais 5%. Em discurso transmitido pela televisão estatal, o presidente afirmou que essa ordem não significa que seu país tenha renunciado à negociação sobre suas instalações nucleares.

"Iniciem o enriquecimento do urânio a 20%, enquanto nós estamos dispostos a negociar para a troca de combustível nuclear", disse o líder ao presidente do citado organismo, Ali Akbar Salehi, presente no ato. Ahamdinejad se referiu ao prazo de dois meses dado pelo Irã ao Ocidente para resolver a queda-de-braço nuclear e reiterou que seu país "está disposto a dialogar sobre a troca de combustível nuclear". "Nós começamos (o enriquecimento), embora o caminho da negociação continue aberto", destacou. Além disso, ele revelou que os cientistas iranianos conseguiram desenvolver uma tecnologia que permite enriquecer o urânio através da técnica laser.

"O laser permite separar os átomos, o que significa que pode servir para enriquecer o urânio com o grau que um queira... Mas por enquanto não pensamos utilizar este método de enriquecimento", explicou. "Para enriquecer o urânio temos centrífugas que, se Deus quiser, poderemos utilizar para enriquecer 20% e ser autossuficientes", detalhou.

Queda de braço As declarações do presidente abrem um novo capítulo na inflamada queda de braço que o Irã mantém com grande parte da comunidade internacional por causa das suspeitas levantadas por seu programa nuclear. Países como Estados Unidos, Israel, França, Alemanha e Reino Unido acusam o regime iraniano de esconder, sob seu esforço atômico civil, um projeto de natureza clandestina e aplicações bélicas cujo objetivo seria a aquisição de um arsenal nuclear, alegação que o Irã rejeita.

O conflito se agravou no final do ano passado depois que Teerã rejeitou uma proposta de Washington, Paris e Moscou para enviar seu urânio a 3,5% ao exterior e recuperá-

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lo tempo depois enriquecido a 20%, nas condições necessárias para manter operacional seu reator nuclear civil na capital. Em uma aparente mudança de postura, Ahmadinejad assegurou na terça-feira passada que seu país não tem problema algum em enviar o urânio ao exterior. A declaração conseguiu abrir de novo a brecha entre as grandes potências, e em particular entre Washington e Pequim, que mantêm posturas divergentes sobre a polêmica.

Os EUA pressionava há meses para conseguir que todos os membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas respaldem um endurecimento das sanções políticas e econômicas ao regime dos aiatolás. O Departamento de Estado americano pediu ao Irã para deixar de lado a incerteza e dar uma resposta definitiva e precisa à questão. A China assinalou que as palavras de Ahmadinejad significam que ainda existem possibilidades de conseguir uma saída diplomática à crise. No entanto, parece que o presidente iraniano aposta no discurso mais duro. "Utilizam a tecnologia para subjugar os povos. Acreditam que a ciência é monopólio seu", acrescentou.

Operadoras têm a primeira reunião com governo para tratar de banda larga

Empresas de telefonia estiveram reunidas com o governo para discutir o Plano Nacional de Banda Larga. Foi a primeira vez que as operadoras foram convidadas para discutir o plano federal de universalização da internet em alta velocidade. A secretária-executiva da Casa Civil, Erenice Guerra, e o coordenador de Inclusão Digital da Presidência da Republica, Cezar Alvarez, apresentaram o plano e ouviram perguntas e colaborações das empresas para o modelo de negócios. Os empresários saíram otimistas da reunião. "Estamos tranquilos, é bom ter a oportunidade de dialogar e criar soluções para a sociedade", afirmou Antonio Carlos Valente, presidente da Telefônica.

Não foi definida durante a reunião a reativação da Telebrás, nem foi comentado se ela atuará no mercado. O consenso entre as empresas é que haja condições iguais, tanto para o governo como para as empresas, de competição no setor. Luiz Eduardo Falco, presidente da Oi, concordou com o plano do governo de usar todos os ativos em fibra ótica que tem e se limitou a falar que "Telebrás é uma hipótese". Para Falco, o encontro foi importante para o setor dar sua colaboração. "Devemos contribuir para que o modelo funcione da melhor forma", disse. Erenice e Alvarez se reunirão com provedores de internet para tratar do mesmo assunto.

O Plano Nacional de Banda Larga demandará entre R$ 3 bilhões e R$ 14 bilhões até 2014, afirmou Cezar Alvarez, coordenador de Inclusão Digital da Presidência da República. A estimativa da Presidência é bastante inferior ao plano do Ministério das Comunicações, que prevê R$ 79 bilhões de investimento. Alvarez frisou que a reativação da Telebrás ainda não foi decidida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Volto a insistir que falar em Telebrás foi muito mais um eufemismo, um cacoete, que inclusive pode ter problemas na Comissão de Valores Mobiliários, na medida em que é uma empresa cotada com ações na Bolsa de Valores", afirmou.

Em uma reunião para discutir o plano de banda larga, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ter a intenção de reativar a Telebrás. Estava presente na reunião o coordenador do programa Software Livre Brasil, Marcelo Branco, que divulgou aspas do presidente sobre a sua decisão de reativar a empresa. Alvarez não descarta, contudo, a reativação da estatal. "É preciso uma empresa de gestão desses ativos [de fibras ópticas], com papel regulador, a partir principalmente da interconexão com as redes existentes. A reativação da Telebrás é uma das opções", afirmou.

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A Telebrás, ou qualquer outra empresa gestora da rede de fibras, poderá atuar de forma competitiva no mercado. "Não queremos ser mais uma empresa competindo no mercado. Mas se é para que o mercado seja regulado de forma melhor, nós viramos um ator do mercado", disse Alvarez. A proposta do plano de banda larga é que o governo intervenha onde o mercado está atuando de forma "imperfeita, monopolista e a preço exorbitante", nas palavras de Alvarez. "Temos um mercado imperfeito. A este mercado imperfeito, o governo vai tratar de ver os seus elementos regulatórios", disse.

Vídeo reforça suspeita de suborno no Distrito Federal

Um vídeo que está sendo periciado pela Polícia Federal reforça a suspeita de que o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda (sem partido), ofereceu R$ 1 milhão para uma testemunha depor a favor dele no inquérito do mensalão do DEM. Segundo a reportagem, na gravação, um ex-secretário do Distrito Federal, próximo ao governador, afirma ter ouvido Arruda dizer que precisava da "ajuda" da testemunha, o jornalista Edson Sombra.

Sombra gravou o vídeo e o entregou à PF afirmando ser prova da tentativa de suborno por parte do governador. O ex-secretário de Comunicação Weligton Moraes aparece no vídeo conversando com Sombra sobre o repasse de R$ 1 milhão em troca de um depoimento favorável a Arruda. No diálogo, o jornalista comenta com Moraes que temia ser alvo de "armação" de Arruda e pergunta se o ex-secretário levou a preocupação ao governador. A Folha informa que Moraes conta que Arruda afirmou não existir armadilha. "Eu é que preciso dele. Estou indo atrás dele porque preciso de ajuda", disse o governador, segundo relato de Moraes no vídeo. A assessoria de Arruda disse não ter o que comentar sobre o diálogo. Reiterou se tratar de armação e negou a participação dele na tentativa de suborno.

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Um governador na prisãoEm decisão histórica, a Justiça decreta a prisão de José Roberto Arruda e o mantém na cadeia. Agora vai decidir quem governará o DF

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Hugo Marques e Claudio Dantas Sequeira

1986 Quando assumiu o primeiro cargo no governo do Distrito Federal (à esq.)2010 Como primeiro governador a ser preso no País por corrupção (à dir.)

No ano do cinquentenário de Brasília, a cidade criada por Juscelino Kubitschek entra para a história como a primeira unidade da Federação a ter um governador preso por corrupção. Acusado de obstruir a Justiça, José Roberto Arruda (ex-DEM) foi levado para uma sala especial da Superintendência da Polícia Federal no final da tarde da quinta-feira 11. A decisão exemplar do Superior Tribunal de Justiça, que por 12 votos a 2 mandou Arruda para a cadeia, tornou-se um novo marco. Mergulhada por mais de dois meses no escândalo que abalou o governo do Distrito Federal, a população de Brasília tirou um peso de suas costas na noite da quinta-feira. Os mesmos manifestantes que antes gritavam “Fora, Arruda”, pelas ruas da cidade, passaram a exigir “Fica, Arruda”, desta vez na frente da Polícia Federal. “A força da sociedade civil e das instituições venceu a corrupção”, comemorou o presidente nacional da OAB, Ophir Cavalcante. “O País começa finalmente a respirar um ar puro e livre do gás venenoso das fraudes”, acredita ele. O destino de Arruda foi selado no segundo andar do edifício principal do STJ, em sessão da Corte Especial, que se reuniu para referendar a decisão do ministro Fernando Gonçalves, a favor do pedido de prisão apresentado pela subprocuradora da República Raquel Dodge.

Pela gravidade do fato – Arruda foi acusado por Dodge de obstruir a Justiça ao tentar subornar o jornalista Edson Sombra –, Gonçalves abriu mão da decisão monocrática e submeteu seu voto à corte do STJ integrada por 15 ministros. Seu colega Nilson Naves argumentou que o tribunal não tinha competência para decretar a prisão do governador sem o prévio respaldo da Câmara Legislativa, mas foi vencido. Os demais ministros – à exceção de Teori Zavascki e do presidente Cesar Asfor Rocha, que não votou – apoiaram Gonçalves. Confirmada a prisão de Arruda, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preocupado com a exposição pública do governador, pediu ao ministro da Justiça, Luiz Paulo Teles Barreto, que Arruda não fosse submetido aos flashes da imprensa ao chegar à PF. Destoando do sentimento da população de Brasília, Lula mostrou-se abatido com a prisão de Arruda e lamentou que o escândalo tivesse chegado a tal ponto. “Isso não é bom para o País nem para a política brasileira”, afirmou o presidente. “Não contribui em nada para o desenvolvimento da consciência política nacional.” O cerco para prender Arruda teve cenas cinematográficas. A PF colocou um helicóptero e três viaturas nas proximidades da residência oficial de Águas Claras, onde mora o governador, para evitar sua fuga. A partir dali, as equipes de

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policiais tratavam Arruda de “alvo”, como chamam as pessoas que serão presas. Foram horas de tensão e ansiedade. Arruda, que vivia uma espécie de retiro domiciliar após as denúncias, ligou para a mulher, Flávia, para avisá-la que almoçaria com um dos advogados, José Gerardo Grossi. O governador ainda foi alertado pelo seu secretário de Transportes, Alberto Fraga, sobre boatos da prisão.

“Não existe isso”, sorriu Arruda. No momento em que comia uma paleta de cordeiro com fetuccine na Trattoria da Rosário, no Lago Sul, o governador viu pela tevê a decretação de sua prisão. Não deu tempo para a sobremesa. Arruda foi para a residência oficial de Águas Claras e pensou em se esconder até que o STF julgasse seu recurso. Ligou para o advogado Nélio Machado, que lhe disse para manter a calma. Às 17h19, o diretor-geral da PF, Luiz Fernando Corrêa, recebeu um telefonema. “O governador quer se entregar”, disse do outro lado da linha o secretário de Segurança Pública do DF, Valmir Lemos, que é também delegado federal. “Tudo bem. Ele pode ir para o edifício-sede da PF ou para a Superintendência”, respondeu Corrêa. Negociada a rendição, um comboio de seis carros oficiais com vidros escuros ingressou na Superintendência, no Setor Policial Sul às 17h45. Também tiveram a prisão decretada o ex-deputado Geraldo Naves, o secretário de Comunicação do DF, Weligton Moraes, o diretor de operações das Centrais Elétricas de Brasília, Haroaldo Brasil de Carvalho, e de Rodrigo Arantes, sobrinho e secretário particular do governador. Inconformado, Nélio Machado, advogado de Arruda, afirmou que “a prisão foi ilegal e antidemocrática, pois o governador não teve direito de defesa”. Segundo ele, “trata-se de uma pena antecipada, sem processo legal”. Arruda, por sua vez, disse que foi alvo de perseguição política. “É uma grande maluquice o que está acontecendo”, comentou Arruda com um assessor, antes da prisão. Como último recurso, Machado entrou com um pedido de habeas corpus no STF. O pedido foi parar nas mãos do polêmico ministro Marco Aurélio Mello, que varou a madrugada estudando o caso. Na manhã da sexta-feira 12, Mello sinalizou à ISTOÉ que sua decisão seria dura:

PIVÔ - Sombra: reação de Arruda foi cercear as investigações

“A lei submete a todos”. Horas depois, negou o habeas corpus. Assim que foi preso, Arruda ligou para o vice-governador Paulo Octávio. “Estou me  entregando, você assume o governo.” Paulo Octávio acompanhou tudo no escritório de seu advogado, Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay. Foi ali que o vice montou a estratégia de anunciar que não será mais candidato nas próximas eleições, na tentativa de tranquilizar os adversários. Essa decisão funcionou também como um recado sobre a gravidade do momento aos seus seguidores, que ensaiavam uma cerimônia de posse. O vice, no entanto, também está envolvido no escândalo do mensalão do DEM. O delator Durval Barbosa diz que Paulo Octávio ficava com 30% da propina arrecadada pelo esquema de corrupção. A permanência de Paulo Octávio no cargo está ameaçada. Vai depender do desfecho do pedido de intervenção federal no GDF, apresentado ao STF pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Ele afirma que há no governo de Brasília uma organização criminosa, que contamina toda a linha sucessória de Arruda. “Não há dúvida de que o governador era o mandante da tentativa de corromper testemunhas”, diz Gurgel. “Se for posto em liberdade e permanecer no governo, continuaremos tendo a máquina pública do DF a serviço do crime.” O pedido de Gurgel será julgado pelo presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, logo após o Carnaval. Mesmo que recupere sua liberdade, Arruda não tem a pretensão de reassumir seu cargo. Foi o que ele revelou ao secretário Fraga, em conversa na prisão. “A intenção do Arruda é esperar a conclusão do inquérito para voltar ao governo. Inquérito tem prazo para acabar, são 30 dias quando o réu está preso”, revelou Fraga à ISTOÉ. Como a prisão de um governador é fato inédito no País, a PF teve de alojar Arruda no gabinete do diretor técnico-científico da PF, Paulo

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Roberto Fagundes, uma sala de pouco mais de 20 metros quadrados, com mesa, sofá e banheiro.

À noite, Arruda pediu um lanche do Habib’s, lanchonete especializada em quibes e minipizzas. Na sala especial transformada em cela, Arruda reclamou da celeridade da Justiça. “O ministro-relator recebeu o pedido de prisão da procuradora às 13 horas, apresentou o voto dele às 14 horas, convocou uma reunião do STJ às 15 horas e a prisão saiu às 17 horas”, disse Arruda a um auxiliar. Antes de entrar na sala-cela, Arruda redigiu uma carta, para reclamar que jamais foram vistas medidas coercitivas de tamanha gravidade, nem no mensalão do PT ou no impeachment de Fernando Collor. Mas o ex-presidente nacional da OAB, Cezar Britto, pensa muito diferente: “É importante que se perceba no Brasil que a lesão ao Erário e a obstrução à Justiça são crimes graves”, disse Britto. Se a prisão foi célere, a conclusão do inquérito do STJ ainda vai se arrastar por muito tempo. Há várias denúncias contra o mensalão do DEM que ainda exigirão diligências da PF. O Ministério Público já sabe que existem outras fontes de corrupção em Brasília para alimentar a ganância dos deputados distritais, vários deles filmados recebendo propina para votar projetos.

Falta investigar a fraude no abastecimento de milhares de veículos da frota do governo local, por onde vaza um percentual para os deputados da Assembleia Distrital. O MP também já sabe que houve fraude na mudança de destinação de terras em Brasília para valorizar milhares de hectares que a quadrilha quer lotear e vender antes do fim do governo Arruda. Só depois que a PF deflagrou a operação Caixa de Pandora é que os promotores de Brasília denunciaram o esquema no TJ local, que não se pronunciou sobre a revogação da lei do ordenamento territorial fraudada. Apesar do escândalo, ainda há deputados distritais que se preocupam em livrar a cara de Arruda. E levantam uma celeuma jurídica, ao afirmar que a prisão do governador depende da autorização da Câmara Distrital, que lhe é dócil. Ainda não entenderam que o País não está mais disposto a aceitar filigranas jurídicas para impedir a punição de políticos que perdem o rumo e a compostura.

O cerco se fechaAhmadinejad enfrenta o mundo com sua política nuclear e o Brasil fica isolado como o único defensor do iraniano

Claudio Dantas Sequeira

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SANÇÕES Ahmadinejad em usina iraniana: sem chance de acordo com potências mundiais

O Irã ainda não tem capacidade técnica para construir a bomba, mas a decisão de elevar o teor do enriquecimento de urânio de 5% para 20%, anunciada pelo presidente Mahmoud Ahmadinejad na terça-feira 9, deixou a comunidade internacional em estado de alerta. Se fosse um Estado democrático, com amplas liberdades civis e total transparência em seu programa nuclear, provavelmente seria possível evitar sanções “enérgicas” como as que estão sendo defendidas pelos Estados Unidos e pela França. Mas ocorre o contrário. Há pouco mais de quatro meses, descobriu-se que Teerã construiu em segredo uma usina de enriquecimento de urânio. Para piorar, desde que foi reeleito num pleito questionado por setores da população, Ahmadinejad tem endurecido as medidas de controle social e abusado da violência contra manifestantes. A intransigência dificulta a busca por uma saída pacífica e isola o Brasil como único defensor da tese contrária a punições a Teerã. “Não sou ingênuo a respeito das dificuldades de um acordo. Mas o outro caminho, o das sanções, foi perseguido nos casos do Iraque e do Irã sem nenhum efeito prático”, diz o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim. Para o chanceler, o povo iraniano será o mais prejudicado pelas restrições econômicas.

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“A intenção brasileira é louvável, mas as janelas de oportunidade estão se fechando por culpa do próprio presidente iraniano”, afirma Valerie Lincy, pesquisadora do Wisconsin Project sobre controle de armas nucleares. Com o gesto desafiador, Ahmadinejad praticamente sepulta o plano que vinha sendo negociado no âmbito da Agência Internacional de Energia Atômica (Aiea), ligada à ONU. Pela fórmula, aceita pelas potências negociadoras (EUA, Rússia, China, França, Reino Unido e Alemanha), o Irã enviaria 85% de seu estoque de urânio para Rússia e França, onde seria enriquecido a um nível adequado para fins medicinais. Inicialmente, Teerã pareceu concordar com a fórmula, mas depois recuou. “Temos que concordar que o acordo está morto”, diz Valerie. Como ISTOÉ revelou em novembro, a possibilidade de que o urânio fosse enriquecido no Brasil, um país neutro, chegou a ser considerada pelos iranianos. Mas o governo brasileiro declinou, basicamente por falta de capacidade técnica. A produção atual é insuficiente para abastecer as usinas de Angra 1 e 2 e o plano de expansão do setor nuclear prevê ainda a criação de mais usinas e a construção de fábricas de radioisótopos, tecnologia que movimenta bilhões num mercado dominado pelas mesmas potências que tentam punir o Irã.

Modelo falidoApós anos de farra fiscal e distribuição de benesses sem controle, a Europa agora precisa pagar a conta da irresponsabilidade

No símbolo do euro, as duas linhas paralelas representam a estabilidade do mundo europeu. Mas, na semana passada, a moeda comum europeia sofreu o maior ataque especulativo de seus 11 anos, provocado pela tempestade econômica que se instalou no Velho Continente. A tensão na Zona do Euro é tão forte que nos Estados Unidos e na Inglaterra economistas passaram a usar a sigla PIGS (porcos, em inglês) para ridicularizar Portugal, Itália, Grécia e Espanha. No início do ano, bancos italianos, entre eles o Unicredit, pediram que a Irlanda substituísse a Itália no I. Mas o efeito foi contrário e a sigla ganhou na Irlanda um novo integrante e se tornou PIIGs. O fato é que o mercado não perdoa os pecados cometidos pela União Europeia, que  aglutinou açodadamente sob seuguarda-chuva países de fundamentos econômicos frágeis. “Os países emergentes da Europa tiveram almoço grátis nos últimos 18 anos”, afirma o economista- chefe do Bradesco, Octávio de Barros. “Eles se acomodaram em torno dos benefícios extraordinários, mas sem ajustar suas economias. Nos anos dourados, de 2003 a 2007, os problemas fiscais tinham importância mínima,  agora eles são explícitos.” O governo da Grécia, por exemplo, só cumpriu as metas do Tratado de Maastricht, que regulamenta a Zona do Euro, ao ingressar no bloco em 2002. Para tranquilizar a Alemanha e a França de que eles não teriam que socorrer outros países do bloco, o tratado fixou critérios como inflação de 1,5%, déficit menor que 3% do PIB e dívida pública menor do que 60% do PIB.

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AJUDA - Papandreou, da Grécia, e Zapatero, da Espanha, discutem saídas para a crise em seus países

Acontece que a própria União Europeia passou por cima dessas regras para expandir o bloco na tentativa de torná-lo mais influente do que os Estados Unidos. Seus dirigentes esqueceram,  porém, que os EUA têm administração única, ao contrário do bloco europeu, que, apesar de ter unificado a política monetária (inflação e juros), possui variadas políticas fiscais (receita e despesa). No ano passado, a festa acabou e o déficit fiscal da Grécia foi quatro vezes maior, com a dívida pública multiplicada por dois. O país precisa de 55 bilhões de euros este ano para refinanciar sua dívida e manter a máquina pública funcionando. “Portugal, Grécia, Itália e Espanha crescem pouco e têm um gasto social muito grande. Para eles, é difícil reduzir os gastos, principalmente com a economia desacelerada”, explica o economista sênior do Santander, Cristiano Souza. Uma saída seria desvalorizar o euro para torná-los mais competitivos e, assim, acelerar o crescimento, mas os países mais ricos não estão convencidos a depreciar a cotação, hoje em torno de US$ 1,35. Na quinta-feira 11, o presidente da União Europeia, Herman Van Rompuy, após reunião com a Alemanha e a França, anunciou um acordo para evitar que a crise fiscal grega acabe em moratória, pondo em risco a estabilidade do euro. Mas garantiu que o novo pacto exigirá rigor e determinação do governo de Atenas, com um plano de “austeridade digno dos piores tempos do FMI”. “A irresponsabilidade fiscal grega nos últimos anos não pode sair grátis”, afirmou. O plano inclui cortar despesas públicas em 2 bilhões de euros, reduzir em 30% as horas extras, congelar salários, aumentar a idade de aposentadoria e os impostos. “Só haverá ajuda se o governo grego levar a cabo as reformas de grande alcance”, afirmou o ministro da Economia da  Alemanha, Michael Meister. “A Grécia é o ponto mais crítico no curto prazo. Ela precisa recorrer ou à Europa ou ao FMI”, explica o economista Paulo Nogueira Batista Jr., representante do Brasil e de mais oito países no FMI.

Os trabalhadores gregos, prevendo momentos sombrios à frente, foram às ruas e protestaram. A operação de socorro concentrouse na Grécia, porque os demais países que formam os PIIGS garantiram que não vão dar calote em ninguém. E foram convincentes. Octávio de Barros considera que é exagero incluir a Espanha no mesmo balaio que a Grécia. Segundo ele, o problema da Espanha não é fiscal, mas o país sofre com a bolha imobiliária e a crise na construção civil. Tanto é assim que a Moody’s, que sacudiu o mercado ao afirmar que todos PIGS (nesse caso sem a Itália)

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sofrem do mesmo mal que os gregos, voltou atrás. “Espanha, Portugal e Grécia podem partilhar a mesma moeda, mas não mostram o mesmo tipo de perfil de crédito”, ponderou a Moody’s. O risco comum aos PIIGS é o crescimento econômico abaixo de 1%, o déficit fiscal bem acima da meta da eurozona e o desemprego acima de dois dígitos, com exceção da Itália (8,5%). Na Espanha, o desemprego ficou em 19,5%, duas vezes maior do que a média mundial. “Há uma crise de confiança grande, tanto do mercado quanto da Alemanha e da França, porque não têm muito fôlego financeiro e a conta sempre caiu no colo deles. Os problemas são sérios, mas somente para a Europa. Não vejo o contágio que ocorreu com a quebra do Lehman Brothers”, diz o estrategista-chefe do Banco WestLB, Roberto Padovani. A crise na Europa pode não bater na porta do Brasil, mas deixa seu recado.

Em qualquer tempo, com ou sem crise, é preciso fazer o dever de casa. Agir mais como formiga do que como cigarra. Na Europa, a conta chegou rapidamente, porque se apostou no aumento do gasto público, como se a política econômica pudesse passar ao largo da responsabilidade fiscal. Agora, os PIIGS se veem obrigados a cortar gastos para provar aos credores que têm capacidade de pagamento. E as potências do Velho Continente estão pagando o preço pelo passo maior do que as pernas. Mas a lição da União Europeia vale para todo e qualquer país.