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ARTIGO

ARTICLE

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1 Departamento de Ensino,Instituto FernandesFigueira, Fundação OswaldoCruz. Av. Rui Barbosa, 716/2º andar. Flamengo22250-020 Rio de JaneiroRJ. [email protected] Centro Latino-Americanode Estudos sobre Violênciae Saúde Jorge Careli, EscolaNacional de Saúde PúblicaSergio Arouca, FundaçãoOswaldo Cruz.

Atendimento pré-hospitalar ao idoso vítima de violênciaem cinco capitais brasileiras

Pre-hospital attendance to elders victims of violencein five Brazilian capitals

Resumo Este artigo analisa as características e aoperacionalização no cotidiano da atenção pré-hospitalar aos idosos vítimas de violências e aci-dentes de cinco capitais (Manaus, Recife, Brasília,Rio de Janeiro e Curitiba), abordando ainda suascapacidades, seus obstáculos e potencialidades. Pau-tou-se na triangulação de métodos quantitativos equalitativos. Analisaram-se dados de oitenta ser-viços da atenção pré-hospitalar móvel e fixa: 32em Manaus; 18 em Recife; dez em Brasília; 12 noRio de Janeiro e oito em Curitiba. Entre os acha-dos estão as diferenças (de tamanho e diversidadede categorias profissionais) e dificuldades das equi-pes para identificar, atender e notificar os casospor falta de capacitação; pouca atuação preventi-va; quase nenhum envolvimento com a família eorientação a ela; praticamente nenhum atendi-mento ao autor da agressão; incipiente articula-ção e parcerias da rede, sobretudo dos serviços pré-hospitalares com os hospitalares.Palavras-chave Pré-hospitalar, Idosos, Violên-cia, Acidentes de trânsito, Prevenção

Abstract This article reviews the characteristicsand operation in the daily routine of a pre-hos-pital care to the elderly victims of violence andaccidents in five capitals (Manaus, Recife, Brasí-lia, Rio de Janeiro and Curitiba). Besides that, itanalyses their abilities, and potential obstacles. Itwas based on the triangulation of quantitative andqualitative methods analyzing data from 80 de-partments of mobile and fixed pre-hospitals: 32 inManaus, 18 in Recife, 10 in Brasilia, 12 in Rio deJaneiro and eight in Curitiba. Among the findingsare the differences in size and diversity of occupa-tional categories and difficulties of the teams toidentify, serve and report cases for lack of training,limited preventive action, almost no involvementand guidance to the family, practically no atten-tion to the perpetrator; incipient articulation andpartnership network, especially regarding on pre-hospital services and the hospital.Key words Pre-hospital care, Elderly victims ofviolence and accidents, Preventive action

Suely Ferreira Deslandes 1Edinilsa Ramos de Souza 2

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Introdução

O atendimento pré-hospitalar no Brasil é com-posto pelas instâncias fixa e móvel e apresentaenorme diversidade de serviços com distintospapéis e formas organizacionais.

O “pré-hospitalar móvel” objetiva atenderprecocemente aos problemas de natureza clínica,cirúrgica, psiquiátrica e traumática, prestandoatendimento ou transporte a um serviço de saú-de hierarquizado e integrado ao Sistema Únicode Saúde (SUS). Deve estar ligado a uma centralde regulação, com equipe e frota de veículos ade-quados às necessidades de saúde do municípioou da região1.

Em alguns municípios, o Corpo de Bombei-ros é o responsável pelo atendimento móvel àspessoas envolvidas em acidentes e violências. Emoutros, duas modalidades de socorro são coad-juvantes na atenção prestada às vítimas: Serviçode Atendimento Móvel de Urgência (Samu) eBombeiros. Existem ainda modelos de resgatediferenciados, ligados às municipalidades, taiscomo serviços privados relacionados às conces-sionárias que administram rodovias.

No Brasil vigora o Samu-192, oficializadopela Portaria no 1.864/GM2, que institui o com-ponente pré-hospitalar móvel da Política Nacio-nal de Atenção às Urgências, por intermédio dasua implantação no território brasileiro. Nessaportaria, a regulação médica das urgências deveser regionalizada, hierarquizada, descentraliza-da, pactuada, ter a participação da comunidadee atender aos princípios da integralidade, da uni-versalidade e da equidade.

A central deve dispor de telefone gratuito. Onúmero 192 foi nacionalmente adotado para ur-gências médicas. Um médico regulador monito-ra o atendimento local via rádio, estabelecendo-se uma rede de comunicação entre a central, asambulâncias e os serviços que recebem os pacien-tes. Os serviços de segurança e salvamento tam-bém devem ser orientados por esse médico.

O “pré-hospitalar fixo” atende aos quadrosagudos, de natureza clínica, traumática ou psiqui-átrica, com baixa gravidade/complexidade, da áreade cobertura dos serviços que são heterogêneos,como: Unidades Básicas de Saúde (UBS), unida-des do Programa/Estratégia Saúde da Família e deAgentes Comunitários de Saúde (Pacs), ambula-tórios especializados, serviços de diagnóstico e te-rapia, pronto atendimento (PA) de 24 horas, tam-bém denominado pronto-socorro (OS).

O atendimento pré-hospitalar móvel ou fixoparte da premissa de que lesões e traumas provo-cados por acidentes e violências podem ser reverti-

dos, dependendo do suporte oferecido à vítima. Aqualidade e a presteza do atendimento às vítimasde trauma são fundamentais para o prognóstico3.

Este artigo analisa as capacidades, os obstá-culos e as potencialidades da atenção dispensadaaos idosos vítimas de violências e acidentes pelosistema pré-hospitalar de cinco capitais. Retomaas diretrizes de um estudo anterior4 que realizouanálise crítica da institucionalização da PolíticaNacional de Redução da Morbimortalidade porAcidentes e Violências (PNRMAV) nessas mes-mas capitais.

Metodologia

Tomou-se como base a pesquisa multicêntri-ca realizada em Manaus, Recife, Brasília, Rio deJaneiro e Curitiba, desenvolvida em 2007/2008,que usou abordagem quantitativa e qualitativaobjetivando uma análise diagnóstica dos sistemaslocais de saúde, para atender aos agravos provo-cados por acidentes e violências contra idosos.

A pesquisa original usou como parâmetrosanalíticos o que é preconizado pelas principaispolíticas de atenção à saúde e proteção dos direi-tos da pessoa idosa: Política Nacional do Idoso,Política Nacional de Saúde do Idoso e o Estatutodo Idoso; as Políticas de Atenção à Saúde Mental,a de Atenção às Emergências, o Pacto pela Saúde,a Política de Reabilitação e a Política Nacional deRedução da Morbimortalidade por Acidentes eViolências.

O estudo pautou-se na triangulação de méto-dos. Usaram-se dois questionários semiestrutura-dos: um para caracterizar os serviços e outro paraqualificar seu atendimento. Foram feitas entre-vistas individuais com profissionais e gestores desaúde das unidades pesquisadas aprofundando areflexão sobre obstáculos e potencialidades daatenção dispensada aos idosos vítimas de violên-cias e acidentes. Este artigo considera os dados deoitenta serviços relativos à atenção pré-hospita-lar móvel e fixo: 32 em Manaus; 18 em Recife; dezem Brasília; 12 no Rio de Janeiro e oito em Curi-tiba. Envolveu 15 unidades do Programa/Estra-tégia Saúde da Família (PSF), 22 de Atenção Bási-ca Ampliada (ABA), 22 prontos-socorros (PS)/pronto atendimento (PA) 24 horas; 15 ambula-tórios especializados e seis unidades pré-hospita-lares móveis (PH móvel). O acervo analisadoconstitui-se de oitenta questionários e 27 entre-vistas com gestores, médicos, socorristas e coor-denadores de unidades de referência para idoso.

Os dados dos questionários foram digitadosem um banco no programa CSPro versão 3.2 e

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convertidos para o SPSS versão 13.0, no qual fo-ram analisados em termos absolutos e relativos.Às entrevistas aplicou-se a análise de conteúdo,segundo a modalidade temática adaptada deBardin5, sendo procedidas leitura flutuante, aná-lise dos temas, categorização teórica e êmica, des-taques dos núcleos de sentido, descrição dos con-teúdos e síntese interpretativa.

Para verificar se a atenção prestada pelos ser-viços de saúde cumpria as diretrizes preconiza-das, foram construídos e validados indicadoresde avaliação, segundo a técnica Grupo Nomi-nal6,7, que visa à geração de consenso e caracteri-za-se pela presença de sujeitos num encontrocoletivo, quando os participantes relatam porescrito suas opiniões e propostas, que são discu-tidas com o grupo. Foram reunidos especialistasligados ao atendimento pré-hospitalar em todasas capitais envolvidas no estudo.

Resultados

Caracterizaçãodo serviço pré-hospitalar móvel

Nas capitais estudadas antes da chegada doSamu, exceto Rio de Janeiro e Curitiba, o resgatenão se caracterizava como socorro médico; erarealizado por ambulâncias do Corpo de Bom-beiros com o apoio de um socorrista profissio-nal de saúde de nível técnico e um motorista.

Em Manaus, o resgate dos Bombeiros eracomplementado pelo serviço municipal SOSManaus, assistido por técnicos de enfermagem.Possuía considerável número de viaturas (segun-do um gestor, a frota chegava a quarenta ambu-lâncias). Atualmente este serviço desempenha opapel de SOS Social, realizando o transporte depacientes crônicos para tratamento na rede hos-pitalar, inclusive idosos.

O Samu cobria sete bases em Manaus. Con-tava em 2006 com equipe mais multiprofissionalque as demais cidades: 41 enfermeiros, quatroodontólogos, um farmacêutico, 141 técnico/au-xiliares de enfermagem e dois psicólogos. Esseserviço não informou com quantos médicos con-tava. Havia uma divisão de tarefas diferenciadasde “resgate” e “socorro”. Os Bombeiros atuavamno resgate de vítimas em situações que deman-dam ações de busca e salvamento ou específicas(afogamento, indivíduo preso em ferragens etc.)e o Samu só era acionado em seguida.

Em Recife, o gestor considerou a implantaçãodo Samu incompleta, pois o Corpo de Bombei-ros atuava com legislação própria, sem ser regu-

lado pelo Serviço de Atendimento Móvel de Ur-gência. Contudo, atualmente os dois serviços sãoparcerias, utilizando um sistema conectado dechamadas e dividindo as tarefas segundo a de-manda: o socorro às situações de trauma em lo-cais e condições de difícil acesso à vítima cabe aosBombeiros, e as situações clínicas e de trauma sãoatendidas pelo Samu (nas residências ou vias pú-blicas). O Serviço de Atendimento Móvel de Ur-gência contava com 56 médicos, 21 enfermeiros eoitenta técnicos/auxiliares de enfermagem.

Em Brasília, as atribuições dos dois serviçoseram as mesmas das demais capitais. O Samudesta cidade possuía a maior equipe: 105 médi-cos, 88 enfermeiros e 320 técnicos/auxiliares deenfermagem.

Curitiba trabalha desde 1990 de maneira in-tegrada por meio do Serviço de Atendimento aoTrauma em Emergência (Siate), numa parceriaentre as Secretarias Municipal e Estadual de Saú-de e a Secretaria Estadual de Segurança Pública.Esse serviço atua com regulação médica, aten-dendo às vítimas de traumas. Trabalha com alinha 192 para as causas clínicas (Samu) e a 193para as causas externas (Corpo de Bombeiros-Siate). O Samu incorporou o Siate, respeitando aautonomia de cada instituição. Assim, apoiadospela regulação médica do Samu, os Bombeirosatendem a maior parte dos traumas. Os dois ser-viços contavam com a menor equipe dentre ascidades estudadas: 95 médicos, 36 enfermeiros e50 técnicos/auxiliares de enfermagem.

O Rio de Janeiro apresentava situação sui ge-neris. Desde 1986, o Corpo de Bombeiros atuacom equipes médicas e é responsável pelo socorroe resgate. Com o Samu, cindiram-se as atribui-ções4. Posteriormente, o Governo do Estado uni-ficou os serviços, sob coordenação do Corpo deBombeiros na Secretaria de Saúde e Defesa Civil,unificada em 2007. O gestor do GSE (Bombeiros)assumiu a Superintendência de Urgências e Emer-gências, e atualmente as ambulâncias do Samusão tripuladas por militares da corporação. O Ser-viço de Atendimento Móvel de Urgência atende àschamadas domiciliares, e os Bombeiros às de viapública; porém, beneficiadas pela articulação, asduas equipes são capacitadas para todos os tiposde atendimento. Prevalece o critério de presteza,atuando a equipe que estiver mais próxima dolocal de ocorrência. A equipe do Samu do Rio eracomposta por 73 médicos, 151 enfermeiros e 278técnicos/auxiliares de enfermagem.

Como se vê, arranjos diversificados demar-cam a relação entre essas duas instituições. Pon-tuou-se em depoimentos o sentido de aprendera conviver, a superar divergências e a agregar

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esforços para se realizar um atendimento me-lhor à população.

Muitas vezes a gente entra em conflito com osBombeiros; eles não aceitam perder esta função.Eles chegam nos acidentes, não pedem apoio daambulância USA, que teria um médico que pode-ria fazer um atendimento mais especializado. En-tão aos poucos está melhorando, mas ainda existeconflito com o Corpo de Bombeiros, que vai para oatendimento e não solicita apoio (profissional dopré-hospitalar móvel/Manaus).

O atendimento pré-hospitalar fixo

As equipes do PSF (posteriormente denomi-nado Estratégia Saúde da Família) das cidadespesquisadas possuem equipes mínimas: agentede saúde, clínico geral e técnico/auxiliar de enfer-magem. Também há esforços no Rio e em Recifepara incluir novas categorias como odontólogo,nutricionista, assistente social e fonoaudiólogo.

Nas unidades de ABA, observou-se uma di-versidade maior de profissionais. Das 22 unida-des estudadas, os profissionais mais presenteseram o técnico ou o auxiliar de enfermagem, agen-tes de saúde, auxiliar de serviços administrativose de serviços gerais, técnico/auxiliar de laborató-rio, enfermeiro, médicos (destacava-se o clínicogeral emergencista) e odontólogo. Manaus apre-sentava, na totalidade das 14 unidades, 71 médi-cos, 41 enfermeiros, 213 técnicos/auxiliares deenfermagem, 31 assistentes sociais e apenas cin-co psicólogos, um fonoaudiólogo, um terapeutaocupacional (TO). Destacava-se por dispor de38 odontólogos e 35 bioquímicos. Brasília, emsuas cinco unidades, e Rio de Janeiro, nas suastrês, possuíam, respectivamente, 52 e 12 médi-cos, 29 e dois enfermeiros, 11 e dois odontólo-gos, nove e seis assistentes sociais, zero e seis psi-cólogos, zero e dois fonoaudiólogos, dois e zeroTO, 36 e zero técnicos/auxiliares de enfermagem.Nenhuma das duas cidades possuía, nestes ser-viços, técnicos de radiologia. Chama a atenção aausência ou o pequeno número de profissionaisnos serviços do Rio.

Em todos os PS 24 horas pesquisados, a equi-pe básica era composta por técnico ou auxiliarde enfermagem, médico clínico geral emergen-cista, auxiliar de serviços administrativos e deserviços gerais, técnico ou auxiliar de laborató-rio, enfermeiro, odontólogo e técnico de radio-logia. Destacam-se duas unidades de Brasília queregistraram equipe profissional composta ape-nas de técnico ou auxiliar de enfermagem e delaboratório, auxiliar de serviços administrativose enfermeiro. Nas outras cidades, esses serviços

apresentaram maior diversidade. Novamentedestaca-se o elevado número de odontólogos,bioquímicos e auxiliares de serviços gerais, ad-ministrativos e de enfermagem de Manaus.

São raros os serviços de referência para aten-der idosos no PH fixo. Recife é a capital com omaior número deles, sete ambulatórios especi-alizados, talvez pela expressiva participação dosidosos na sua população. O Rio de Janeiro tinhaum desses ambulatórios, com a retaguarda daUniversidade Aberta da Terceira Idade (Unati),da Universidade do Estado do Rio de Janeiro(Uerj). Contudo, esse serviço padecia da poucaoferta de vagas na rede para atender aos idosos,gerando uma procura muito além da sua capaci-dade de absorção.

Entrevistados de Manaus percebem conside-rável avanço na disponibilidade de serviços paraatender ao idoso. Citam os Centros de AtençãoIntegral à Melhor Idade (Caimi), um posto desaúde especializado, o Parque Municipal do Ido-so, além de 150 grupos de idosos cadastradosque realizam atividades de apoio psicossocial.

O atendimentoaos idosos vítimas de violências

Quase metade dos serviços pré-hospitalaresprestava suporte ou acompanhamento aos ido-sos vítimas de acidentes e violência. Entretanto,apenas 32,5% deles ofereciam atendimento à fa-mília das vítimas (Tabela 1).

Atender ao agressor é tarefa difícil, mas ne-cessária, principalmente nos casos de violênciaintrafamiliar, tão frequente entre pessoas idosas.Apenas 13,7% dos serviços pré-hospitalares aquiestudados faziam acompanhamento aos auto-res de violência, com destaque para o PSF, queestá mais próximo das dinâmicas familiares pe-las características do atendimento prestado.

Quase 28% das unidades pesquisadas apoia-vam as equipes que trabalham no atendimentodas situações de violência contra os idosos, masapenas 12,5% dos profissionais desses serviçosconsideraram que esse suporte é adequado e so-mente 10% disseram que ele é suficiente.

Chama a atenção o elevado número de todasas modalidades de serviços que não informaramacerca da adequação e da suficiência das ações deatendimento. Essa omissão pode ser pelo fato deos respondentes desconhecerem a realidade dosseus serviços ou pela avaliação negativa que po-dem ter, preferindo se calar.

Para tais questões elaborou-se o indicador“Proporção de unidades/serviços, exceto móveis,que oferecem de forma adequada e suficiente

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suporte e/ou acompanhamento aos idosos víti-mas de acidentes e violências, às famílias/cuida-dores de idosos vítimas de acidentes e violências,aos autores de violências contra idoso e às equi-pes que realizam o atendimento”. Apenas um ser-viço de Manaus e outro do Rio afirmaram reali-zar pelo menos duas dessas ações, revelando bai-xo desempenho das unidades pesquisadas.

A Política Nacional de Redução da Morbi-mortalidade por Acidentes e Violências8 preconi-za a organização dos serviços para o diagnósticodos acidentes e violências com atendimento re-solutivo desde os primeiros níveis da atenção.Entretanto, a prevenção e a identificação dos ca-sos de pessoas idosas vítimas de acidentes e vio-lências são pouco realizadas (Tabela 2). Obser-va-se exceção nas equipes do PSF de Manaus,que em sua totalidade afirmam realizar tais ações.No outro extremo estão os quatro PS e o PHmóvel de Recife, que não fazem identificação nemprevenção dos acidentes e violências.

A prevenção constitui uma das diretrizes daPNRMAV. Por isso elaborou-se o “Índice de açõesde prevenção de acidentes e violências”, formadopela “proporção de unidades/serviços que reali-

zam ações de prevenção de violências e ações vol-tadas para prevenção de acidentes no domicílio enas vias públicas”. Considerando-se a realizaçãode ações de prevenção tanto das violências comodos acidentes, verificou-se que apenas 45,5% dosserviços do Rio de Janeiro, 37,5% dos de Ma-naus, 12,5% dos instalados em Curitiba e 11,1%dos de Recife responderam positivamente. Ne-nhuma das unidades pesquisadas de Brasília de-senvolve simultaneamente as duas ações, e ape-nas 33,3% realiza uma delas.

As unidades que responderam sobre açõespara identificação dos casos de pessoas idosas ví-timas de violências e acidentes informaram terinstrumento de identificação e notificação doscasos, estar integradas com o serviço social e psi-cologia (Brasília); capacitar profissionais queprestam o atendimento (Curitiba); fazer consul-ta, visita domiciliar, avaliação na comunidade,entrevistas com ação social, orientações, encami-nhamentos e identificação dos casos pelo ACS queos encaminha para a UBS (Manaus). Essas açõestambém são efetuadas durante as visitas domici-liares (Recife) e realizadas com apoio de instru-mentos de avaliação funcional (Rio de Janeiro).

Tabela 1. Distribuição das unidades/serviços das cinco capitais segundo suporte e/ou acompanhamento por modalidade deatendimento pré-hospitalar.

Suporte e/ou acompanhamento

OfereceAos idosos vítimas de acidentes e violênciaÀs famílias de idosos vítimas de acidentese violênciaAos autores de violência contra idososÀs equipes que realizam o atendimento

AdequadoAos idosos vítimas de acidentes e violênciaÀs famílias de idosos vítimas de acidentese violênciaAos autores de violência contra idososÀs equipes que realizam o atendimento

SuficienteAos idosos vítimas de acidentes e violênciaÀs famílias de idosos vítimas de acidentese violênciaAos autores de violência contra idososÀs equipes que realizam o atendimento

Pré-hospitalar

móvelN=6

52

16

3 (1)1 (3)

1 (3)5

5 (1)1 (3)

1 (3)5

Unidade daEstratégiaSaúde daFamíliaN=15

129

76

3 (5)3 (5)

4 (5)2 (6)

1 (5)2 (5)

2 (5)1 (6)

Unidadede atenção

básicaampliada

N=22

10 (1)5 (1)

2 (1)4 (2)

5 (14)2 (18)

1 (19)1 (17)

1 (15)0 (16)

0 (19)0 (17)

PS/Atendimento

24 hN=22

116

15

8 (8)4 (9)

1 (14)2 (13

4 (9)1 (10)

1 (14)2 (13)

Ambulatórioespecializado

N=15

54

01

0 (5)0 (4)

0 (7)0 (7)

0 (5)0 (5)

0 (7)0 (7)

TotalN=80

4326

1122

1910

710

114

48

* Os números entre parênteses representam os missings de cada modalidade de unidade/serviço; 0: informado pela unidade/serviço que não oferece oatendimento.

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As ações para identificação de casos de ido-sos vítimas de violência citadas são: avaliação docaso e capacitação dos profissionais que pres-tam o atendimento (Curitiba); denúncia, visitadomiciliar, consulta com o serviço social (Ma-naus); visitas domiciliares, palestras e, no casode denúncia de maus-tratos, a orientação sobredireitos, além do estímulo ao diálogo com a fa-

mília e, se possível, com o agressor (Recife); eutilização de instrumentos de avaliação de riscodurante a anamnese (Rio de Janeiro).

Segundo os entrevistados que trabalham noPH móvel, a chamada para atender a um idosovítima de violência geralmente parte de algumvizinho que, compadecido da situação, aciona opedido.

Tabela 2. Distribuição das unidades/serviços segundo ações de identificação e prevenção de acidentes e violência contra idosospor modalidade de atendimento pré-hospitalar.

Ações

Identificação de casos de idososvítimas de acidentesIdentificação de casos de idososvítimas de violênciaPrevenção de acidentes no domicílioe em vias públicasPrevenção de violência contra idosos

Identificação de casos de idososvítimas de acidentesIdentificação de casos de idososvítimas de violênciaPrevenção de acidentes no domicílioe em vias públicasPrevenção de violência contra idosos

Identificação de casos de idososvítimas de acidentesIdentificação de casos de idososvítimas de violênciaPrevenção de acidentes no domicílioe em vias públicasPrevenção de violência contra idosos

Identificação de casos de idososvítimas de acidentesIdentificação de casos de idososvítimas de violênciaPrevenção de acidentes no domicílioe em vias públicasPrevenção de violência contra idosos

Identificação de casos de idososvítimas de acidentesIdentificação de casos de idososvítimas de violênciaPrevenção de acidentes no domicílioe em vias públicasPrevenção de violência contra idosos

Unidade daEstratégia Saúde

da Família

4

4

4

4

3

4

3

2

-

-

-

-

3

4

2 (1)

4

-

-

-

-

Unidade deatenção básica

ampliada

2

2

9

7

-

-

-

-

3

3

1

1 (1)

1 (1)

1 (1)

1

1

-

-

-

-

PS/Atendimento

24 h

2 (1)

0 (1)

2

1

0

0

0

0

3

3

0

1

0 (1)

0

1

1

1

2

0

1

Ambulatórioespecializado

0

2

3

3

1

3

1

2

1

1

0

0

(1)

(1)

1

1

0

0

1

0

Pré-hospitalar

móvel

0

0

1

0

0

0

0

0

1

(1)

1

0

1

0

0

0

0

0 (1)

1

1

Obs.:Os números entre parênteses representam os missings de cada modalidade de unidade/serviço; -: sem registro para o item; 0: informado pela unidade/serviço que não realiza a ação.

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Embora reconheçam os maus-tratos comoproblema muito relevante, nem sempre os servi-ços contam com equipes de PH móvel capacita-das para identificar e atuar nesses casos. Tal abor-dagem só acontece se houver na equipe alguémsensível ao tema.

Porque violência interpessoal não é só bater, évocê ver aquele idoso dentro de um quarto escuro,fechado, sem janela e que a família vive da aposen-tadoria dele, o mau-trato, o abandono daquele queseria um incapaz, seria até um problema legal, por-que é um crime, infelizmente não há um treina-mento específico, infelizmente vai depender da sen-sibilidade de quem esteja atendendo a esse idoso.Na maioria das vezes esta nuance nunca é vista(gestor do Pré-hospitalar/Recife).

Alguns entrevistados já tiveram experiênciasde atendimento a idosos que sofreram violênciasfísicas e negligências. Um deles revela a complexaabordagem a alguém que foi agredido por ummembro da família:

Esse idoso que eu atendi fez a queixa, estava nadelegacia com todo o aparato, sofreu um traumafacial e levamos ele para o hospital, demos toda aassistência, fizemos o curativo e encaminhamosele para o hospital, mas ele sempre na retranca,não informando quem era o agressor, com temorde ter alguma reação (profissional do pré-hospi-talar/Recife).

Segundo depoimentos, na maioria desses ca-sos a violência é tratada como um trauma cujaassistência seguirá o protocolo do Advanced Trau-ma Life Support (ATLS).

Quando é trauma a gente segue o protocolo doATLS, são rotinas que são seguidas por qualquerpaciente vítima de trauma (profissional do pré-hospitalar/Manaus).

As equipes revelam ter muitas dúvidas sobrecomo proceder e a quem notificar as situações deviolências contra idosos.

Aqui em Manaus tem essa delegacia específicado idoso, talvez seja o caso de denunciar pra essadelegacia, se a gente notar que o paciente foi víti-ma de violência e encontrar o suspeito (profissio-nal do pré-hospitalar/Manaus).

Esse entrevistado considera que nos casos deviolência contra criança já existe uma rede denotificação que inclui os hospitais de emergênciae conselhos tutelares, mas isso não ocorre emrelação ao idoso.

Diante de tantas dúvidas, o profissional doPH móvel parece se ater ao registro do atendi-mento e comunicar ao hospital onde o paciente éentregue:

A gente não faz nada, a gente só relata no nossoprontuário, na nossa fichinha, passa pro médico

plantonista e chama a assistência social do hospi-tal pra ela tomar as providências (profissional dopré-hospitalar/Rio de Janeiro).

Excepcionalmente, alguns profissionais rela-tam que identificam negligências severas aos cui-dados do idoso e fazem a notificação.

A paciente estava com essas escaras na cara,tinha umas equimoses, como se tivesse sido aper-tada, pega com força, emagrecida, desnutrida, de-sidratada, acabada realmente. E relatei na época,me lembro que relatei “paciente vítima de maus-tratos”, eu coloquei isso mesmo. Bem, isso foi pararno Ministério Público [MP], não, a gente teve queresponder na Delegacia e aí o MP entrou também,foi através da Secretaria da Saúde (profissionaldo pré-hospitalar/Rio de Janeiro).

Certos profissionais, por iniciativa própria,sem nenhuma capacitação, orientam a famíliaou chamam a sua atenção quanto à negligênciapraticada.

Entrevistados dos serviços PH fixo revelamque o primeiro obstáculo na identificação demaus-tratos refere-se à dinâmica familiar. Rela-tam que é usual o idoso sentir-se envergonhadode revelar a situação ou tentar proteger o filho/filha ou outro cuidador da responsabilidade pe-las violências praticadas. O quadro se agravaquando o idoso é o cuidador de um usuário dedrogas ou portador de transtorno mental. Apóstranspor a vergonha ou negação da situação, osprofissionais tentam negociar alternativas e re-forçar a perspectiva dos direitos dos idosos. Es-sas não são tarefas fáceis, mas necessárias para oreconhecimento da autonomia dos idosos.

A delicadeza necessária para esse acolhimento eescuta qualificada torna-se inviável quando o pro-fissional de saúde dispõe de pouco tempo. Assim,as situações mais facilmente notificadas referem-seà negligência dos cuidados, especialmente quandoo idoso apresenta perda de autonomia (quadrosde transtornos, demências), pois aí o profissionalevoca a questão da perda de capacidade.

O fluxo de atendimento dos idosos e de noti-ficação dos maus-tratos ainda não foi estabele-cido na totalidade dos serviços visitados. Identi-ficadas as situações de violência, dois cenáriossão mais comuns: o encaminhamento ao Minis-tério Público (MP), com acompanhamento peloserviço (Manaus e Brasília), e a inércia, ora pelodesconhecimento sobre como agir, ora pela cons-tatação da baixa resolutividade do sistema.

Um profissional relatou que, além dos pro-cedimentos oficiais, busca-se orientar as famíliassobre a violência contra idosos. Segundo ele, hádiversas situações de maus-tratos (especialmen-te negligência) no cotidiano do serviço, e a famí-

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lia é convocada para sensibilizações e trabalhoseducativos.

Em Curitiba, o Serviço de Referência recebiachamadas do MP para atendimento e averigua-ção de maus-tratos. Todavia, por constituir oúnico serviço especializado na atenção ao idoso,não conseguia absorver toda a demanda. Diantede uma suspeita, buscava envolver a equipe (ge-riatra, médico, assistente social). A assistente so-cial realizava o histórico e tomava as medidas.Geralmente, a família era chamada para verificarse as queixas do idoso eram reais ou fantasiosasem razão de diagnósticos de transtornos men-tais. Nem esses serviços possuíam uma ficha denotificação, nem adotavam a do Ministério deSaúde. As medidas iniciavam orientando-se oidoso a buscar a procuradoria.

Muitas das vezes o idoso é orientado a procu-rar a procuradoria de defesa dos direitos da pessoaidosa, que é aqui nas proximidades. A gente argu-menta soluções direitas, argumenta sobre a exis-tência do Estatuto do Idoso, alguns dizem que vão,outros não vão, voltam com a mesma queixa (pro-fissional do pré-hospitalar/Curitiba).

Em Manaus, poucas unidades possuíam pro-tocolos clínicos para atendimento de idosos víti-mas de acidentes e violência: uma unidade doPSF, quatro das 14 unidades de ABA, um doscinco ambulatórios especializados e o PH móvel.Em Recife, somente o serviço de resgate tem oprotocolo. Em Brasília, essa especificidade doatendimento era encontrada em uma unidade deABA e em um PA 24 horas; no Rio de Janeiro, emapenas uma unidade de ABA e no PH móvel. Por

fim, em Curitiba, esses protocolos faziam parteda rotina de dois PS e de um dos dois PH móveis.

Articulação inter e intrassetorial

A integração com outras áreas é fundamentalquando se trata de atender a situações de violên-cia. Embora seja uma recomendação de diversosautores, esse ainda é um desafio para os serviçosde PH móvel de Manaus e do Rio de Janeiro etambém para o ambulatório especializado dessaúltima cidade. A Tabela 3 mostra o número deequipes que informaram ter integração com asmais diversas áreas afins para esse tipo de aten-ção. É bom destacar que a ação social (67,5%) e ajustiça (48,7%) são as áreas mais citadas pelasunidades estudadas. Poucos trabalham conjun-tamente com o setor de turismo e lazer: 16,2% e18,7% dos serviços, respectivamente.

Aproximadamente 76,5% dos serviços pes-quisados informaram receber pacientes de ou-tras unidades de saúde, e em 68,7% deles os paci-entes vêm encaminhados pelo PSF e Pacs. As áre-as ou instituições das quais as unidades de PHmenos recebem encaminhamentos são as orga-nizações não governamentais (ONGs) e os hos-pitais psiquiátricos (Tabela 4). Noventa por cen-to das unidades encaminham os idosos paraoutros serviços de saúde, e 77,5% para hospitaisgerais. Os locais para onde há menos encami-nhamentos são as ONGs, o MP e as delegacias.

A análise qualitativa demonstrou que “a mo-bilização de serviços da rede de saúde, suportesocial e defesa dos direitos dos idosos” para o

Tabela 3. Distribuição das unidades/serviços segundo integração com outras áreas por modalidade deatendimento pré-hospitalar.

Áreas

Ação socialEducaçãoJustiçaSegurançaEsporteLazerTurismoDireitos HumanosTrabalho

Pré-hospitalar

móvelN=6

313422222

Unidade daEstratégiaSaúde daFamíliaN=15

993377353

Unidadede atenção

básicaampliada

N=22

1510

753

10476

PS/Atendimento

24 hN=22

16 (1)9

1515

3 (1)0 (1)0 (1)

103 (1)

Ambulatórioespecializado

N=15

113

11675685

TotalN=80

543239332215133219

0: informado pela unidade/serviço que não tem integração com a área.

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acompanhamento dos casos de violências apre-senta-se muito precária.

Um entrevistado, vinculado ao PH fixo doserviço de referência do Rio de Janeiro, referiu ocompleto descrédito e desânimo quanto à capa-cidade de as instituições de defesa dos idososdarem respostas efetivas e cobertura suficienteàs situações apresentadas:

A lei diz, o Estatuto diz que você tem que de-nunciar. Existem cinco instâncias pra denúncias:Delegacia do Idoso, Promotoria isso e aquilo, sãoumas cinco instâncias. Acontece que estas instân-cias não dão conta, pelo menos aqui no Rio deJaneiro, de dar suporte a isso. Eles têm uma assis-tente social, meio carro, aquela situação assim quevocê... você vai lá, você vai dizer ai, ai, não pode

fazer isso, e ele continua no mesmo lugar, com omesmo agressor, na mesma situação de risco (ges-tor do pré-hospitalar/Rio de Janeiro).

Deste depoimento e de outros se depreende afalta de serviços de suporte, como abrigo em ca-sos de risco ao idoso. Tampouco é possível atu-almente contar com uma retaguarda de serviçosde apoio à família, o que contribuiria para a pre-venção de violências.

A família é obrigada a ficar com o idoso semque o Estado e o sistema deem um suporte a eles. Étoma! Fica com paciente acamado, paciente comalta dependência, com uma despesa... um dos gran-des motivos, a meu ver, de você ter essa situação deesgarçamento da relação, de violência, de agressi-vidade para com a pessoa (gestor do pré-hospita-lar/Rio de Janeiro).

Tabela 4. Distribuição das unidades/serviços das cinco capitais segundo áreas que recebem e encaminham pacientes pormodalidade de atendimento pré-hospitalar.

Áreas

Recebe dePSF/PacsCAPSHospitais psiquiátricosHospitais geraisOutras unidades de saúdeMinistério PúblicoDelegaciasConselhos de direitosSecretaria de Desenvolvimento/Assistência/Ação SocialONGsOutros (*)

Encaminha paraPSF/PacsCAPSHospitais psiquiátricosHospitais geraisOutras unidades de saúdeMinistério PúblicoDelegaciasConselhos de direitosSecretaria de Desenvolvimento/Assistência/Ação SocialONGsOutros (*)

Pré-hospitalar

móvelN=6

234432322

11 (2)

1 (1)1 (1)

55

5 (1)1 (1)1 (1)1 (1)1 (1)

0 (1)0 (4)

Unidade daEstratégiaSaúde da

FamíliaN=15

11 (1)93495444

20 (9)

8 (1)13131515

91111

9

70 (6)

Unidade deatençãobásica

ampliadaN=22

17 (1)4 (2)3 (2)

10 (2)18 (1)

7 (2)5 (2)8 (1)8 (1)

4 (1)2 (13)

13 (1)10 (1)

915201010

12 (1)10 (1)

63 (14)

PS/Atendimento

24 hN=22

1611

81119

713

815

82 (4)

1414171820

81012

14 (1)

103 (8)

Ambulatórioespecializado

N=15

9868

1211

99

11

63 (4)

1010

99

1211

78

10

5 (1)4 (3)

TotalN=80

553524376132343140

218

464853627239394444

2810

* Manaus incluiu Fundação Dr. Thomas; Recife citou demanda espontânea, movimentos sociais, escolas, Samu, UCIS Guilherme Abath e central deemergência; Brasília não informou as outras instituições; Curitiba incluiu casas de repouso; 0: informado pela unidade/serviço que não encaminhapara essas/recebe dessas instituições.

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Teremos que ter lugares para encaminhar ido-sos em situação de risco para serem abrigados. En-tão, se hoje eu tenho uma cadeirante sofrendomaus-tratos, que precisa ser tirada do meio fami-liar, vai ser encaminhada pra onde? (gestor dopré-hospitalar/Curitiba).

Em Curitiba, havia expectativa da criação decentros-dia para atender aos idosos e permitirque seus cuidadores tivessem alguns dias livres.Em Brasília, o grande problema parecia ser a di-ficuldade de realizar referência e contrarreferên-cia para outros serviços da rede de saúde. Osentrevistados de Curitiba também avaliaram en-faticamente a falta de leitos para idosos ou a se-letividade negativa da rede hospitalar para casosde internação:

Na hora de um médico decidir que uma vagana UTI é de um adulto, jovem ou idoso, ele vaioptar pelo adulto ou jovem, que tem mais viabili-dade de sobrevida. Então a gente tem muita difi-culdade de internamento (gestor do pré-hospita-lar/Curitiba).

Mesmo diante desses obstáculos, alguns pro-fissionais avaliaram que hoje há mais recursosjurídicos e de apoio aos direitos dos idosos. Eembora identificando a necessidade não atendi-da de capacitação para atuar pelo novo paradig-ma, reconhecem avanços em comparação comalgumas décadas atrás:

Hoje a política do idoso tem nos ajudado bas-tante. Eu acho que já foi muito complicado, muitomais difícil da gente ter acesso na ajuda ao idoso,hoje é muito mais fácil. Hoje tem o fórum atuantetoda quinta-feira... tem políticas maravilhosas nopapel, nem tão maravilhosas na prática.. o próprioidoso hoje tem uma abertura maior. Ele tem cons-ciência, ele anda com o Estatuto na bolsa, mas ain-da os profissionais que atuam com idoso precisamser capacitados (profissional do pré-hospitalar/Manaus).

Parceriascom a rede de serviços de proteção social

A mobilização para se constituir uma rededos serviços no município para atender aos ido-sos vítimas de violência variou consideravelmen-te entre as cidades. Manaus e Curitiba avaliaramde forma muito positiva essa integração, ao con-trário dos técnicos cariocas, que foram os maiscríticos, e os de Recife e Brasília, que não avalia-ram essa questão.

Os profissionais de Manaus avaliaram que acooperação entre os serviços melhorou conside-ravelmente nos últimos anos, tornando-se refe-rência para a região. Dizem que o Fórum Perma-

nente do Idoso possibilitou grandes vitórias comoos Caimi. E as parcerias entre o MP e a Delegaciados Idosos têm se estreitado.

Então nós somos totalmente interligados comtodas as instituições que tratam da questão do ido-so. Vale ressaltar com o MP e também com a Dele-gacia do Idoso. Inclusive estamos trazendo paraparticipar dos nossos grupos de educação em saúdea delegada como forma de divulgação do trabalho.Nós estamos indo, toda a equipe, visitar a delega-cia (gestor do pré-hospitalar/Manaus).

Os entrevistados de Recife e Brasília limita-ram-se a citar os encaminhamentos dos casos deviolências ao MP pela mediação da assistentesocial. Em Brasília, foi mencionada parceria coma Secretaria de Direitos Humanos para a realiza-ção de cursos de cuidadores. Os entrevistados deCuritiba apontaram positivamente a parceriacom outras instituições para o atendimento deidosos em situação de violência. Contudo, pou-cas instituições foram citadas nos relatos. As de-núncias eram formalmente feitas ao MP por umapsicóloga do serviço, designada para essa tarefa.O SOS Idoso também foi mencionado como elode suporte para esse atendimento.

No Rio de Janeiro, os entrevistados forammais céticos ao analisar parcerias para atenderàs situações de violências. Relataram não haverarticulação, apenas procedimentos de encami-nhamento. Afirmaram ainda que tentativas paramaior aproximação já foram feitas sem êxito.

A gente já participou de simpósios, de mesas,quer dizer, procurando discutir isso com eles, masnão existe nada formal (gestor do PH/Rio de Ja-neiro).

Eles também criticaram a morosidade dasrespostas às denúncias feitas ao MP, o que au-menta consideravelmente o risco dos idosos noambiente violento. Comentaram também as di-ficuldades de acesso à Delegacia do Idoso.

Delegacia do Idoso, quando acontece, a gentelogo liga para saber, pra encaminhar alguém, nosidentificar. Esses números nunca atendem. MP, acoisa não é rápida, demora. Pra mim elas são ine-ficientes, porque quando você trata com violênciatem que ter mais preparo, tem que ser uma coisamais rápida. Deixam [na Delegacia do Idoso] mo-fando, esperando. O idoso tem que ser levado, elenão consegue caminhar rápido. O MP demorou,mas demorou muito. Nesse caso [que foi encami-nhado] esperou um ano, é muito tempo para ofilho que era superameaçador, ele podia ter mata-do essa mãe (profissional do pré-hospitalar/Riode Janeiro).

Assim, críticas à baixa resolutividade do MPe difícil acesso à Delegacia do Idoso, em termos

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tanto de localização como de disponibilidade dehorário de atendimento, além de má acolhida,foram constantes no Rio de Janeiro.

Discussão

Neste item destacam-se pontos cruciais aponta-dos na análise dos dados deste estudo empírico.Inicialmente, discutem-se questões relativas aoPH móvel, das quais sobressai a desigualdade dotamanho das equipes e a sua falta de capacitaçãopara identificar e atuar nos casos de violênciacontra os idosos. Basicamente formadas por ge-neralistas, nem sempre elas contam com a neces-sária especialidade para o atendimento dos ido-sos com quadros mais complexos de saúde. Vá-rios profissionais disseram ter muitas dúvidassobre como proceder e a quem notificar os ca-sos, embora sejam extremamente qualificadospara atender aos traumas, pois tem formaçãoem Advanced Trauma Life Support9.

Tais achados são corroborados pela literatu-ra norte-americana, a qual relata que os profissi-onais de saúde já atuam nas situações de violênciacontra crianças, adolescentes e mulheres há déca-das, mas a abordagem do abuso e negligência emrelação à pessoa idosa ainda é recente. Alegam sesentirem inseguros quanto aos procedimentos aserem adotados para identificar, tratar e encami-nhar os casos10. Quanto ao atendimento PH fixo,também existem distinções e limitações nas equi-pes das capitais, em termos de tamanho e diversi-dade de categorias profissionais.

Há carência de uma diretriz efetiva que inte-gre a Estratégia Saúde da Família com os servi-ços hospitalares, para que os idosos possam seracompanhados em suas comunidades, após ainternação. Esse problema também foi aponta-do em estudo anterior9 que analisou a implanta-ção do PH nessas mesmas cinco cidades algunsanos antes. Embora possuam uma central de re-gulação que é positivamente avaliada pelos ges-tores e profissionais, muitas vezes os serviços PHnão dispõem da retaguarda de leitos hospitala-res, o que agrava a baixa articulação entre essessetores do atendimento9.

São poucos os serviços do PH que envolvema família do idoso ou que fornecem alguma aten-ção ou orientação a ela. Menor ainda é a propor-ção daqueles que prestam qualquer atendimentoao autor da agressão. Apenas 13,7% dos serviçosaqui estudados dão suporte e acompanhamentoaos autores de violência contra idosos. Estas sãolacunas que contribuem para uma visão e abor-

dagem limitadas, tanto nas ações de atençãocomo nas de prevenção. E podem ser resultantesda percepção de que este é um problema socialou policial e não um problema relacionado aocampo da saúde10,11.

Se as ações de atenção integral à pessoa idosaem situação de violência são incipientes no aten-dimento PH, os dados aqui analisados demons-tram que menos implementadas ainda são asações de prevenção das distintas formas de vio-lência que acometem esse grupo. Nem metadedos serviços das cidades investigadas realiza açõesde prevenção da violência.

Os profissionais reclamam da falta de suportecomo formação, supervisão e apoio psicológico;demonstram carência de informações e de capaci-tação, tanto para eles como para os cuidadoresformais e informais de idosos para lidarem comos casos de violência. A capacitação tem prioriza-do o desenvolvimento de habilidade para o trata-mento das lesões e pouco enfatiza as dinâmicas daviolência responsáveis pelos agravos11. No Rio deJaneiro, é baixa a resolutividade do MP e é difícil oacesso à Delegacia do Idoso. Estudos afirmam anecessidade de amplo e continuado programa detreinamento/capacitação desses profissionais paraque reconheçam os sinais e sintomas da violênciae o nível de exposição a que eles estão submeti-dos10. Destacam como um desafio para o atendi-mento PH a educação da comunidade para queela aproveite os benefícios desses serviços12. Con-sideram crucial a conscientização e a corresponsa-bilização da população na utilização desses servi-ços, para que ela reconheça rapidamente as situa-ções que requerem a ativação deles.

A notificação, preconizada pelas políticas di-rigidas ao idoso e pelo Estatuto, só é feita excep-cionalmente; quando ocorre, o encaminhamen-to costuma ser feito para o MP. Este órgão, comorepresentante da Justiça, e os dispositivos da ação/assistência social são as áreas com as quais osserviços de saúde pesquisados mais se articulam.Entretanto, os fluxos ainda não estão estabeleci-dos e é precária a mobilização da rede de serviçosde saúde, suporte social e defesa dos direitos paraacompanhamento dos casos. Concorre para estasituação a falta de retaguarda, como abrigos, adificuldade de conseguir leito hospitalar e mes-mo a resistência à internação de idosos, relatadapor alguns profissionais.

A ação de notificar um fato violento tem gera-do controvérsias. Por um lado, as leis obrigam eos códigos de ética profissional orientam que eladeve ser feita13; por outro, os profissionais, em-bora afirmem sua importância, deixam de fazê-la

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alegando desconhecimento quanto aos procedi-mentos, dificuldades para identificar os casos,medo de prejudicar a confiança da relação médi-co-paciente e da quebra de sigilo profissional, alémde terem receio de represálias, tanto em relação asi mesmos como em relação ao paciente14.

Fica claro que se a notificação depende dasatitudes e habilidades do profissional9, ela tam-bém é função da estruturação e da organizaçãodas redes de atenção e de proteção. Nisto desem-penham papel fundamental as articulações e par-cerias firmadas. Neste estudo, observou-se que aparceria com a rede de serviços local é bastantediferenciada entre as capitais. O Rio de Janeiro,por exemplo, reclama da dificuldade de acesso àDelegacia do Idoso e da morosidade do MP.

Conclui-se lembrando os três paradoxosapontados por Rodriguez et al.15 sobre a abor-dagem e a notificação da violência contra a pes-soa idosa. Para eles, essas práticas tanto podem

melhorar como podem piorar: (1) a relação mé-dico/paciente; (2) a sua qualidade de vida; (3) ocontrole do profissional para decidir o que émelhor para o paciente. Acredita-se que essesparadoxos podem ser superados mediante o en-frentamento dos problemas aqui mencionados.

Colaboradores

SF Deslandes e ER Souza trabalharam na con-cepção, na análise dos dados e na redação doartigo.

Rinker Jr. AG. Recognition and perception of elderabuse by prehospital and hospital-based care pro-viders. Archives of Gerontology and Geriatrics 2009;48:110-115.Albuquerque VS. Violência sob o olhar e o agir dequem socorre: representações dos profissionais do aten-dimento pré-hospitalar de urgência e emergência [tesede doutorado em Saúde Pública]. Rio de Janeiro:Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca,Fundação Oswaldo Cruz; 2010.Vieira CMS, Mussi FC. A implantação do projetode atendimento móvel de urgência em Salvador/BA: panorama e desafios. Rev Esc Enferm USP 2008;42(4):793-797.Saliba O, Garbin CAS, Garbin AJI, Dossi AP. Re-ponsabilidade do profissional de saúde sobre anotificação de casos de violência doméstica. RevSaude Publica 2007; 41(3):472-477.Taylor DK, Bachuwa G, Evans J, Jackson-JohnsonV. Assessing barriers to the identification of elderabuse and neglect: a communitywide survey of pri-mary care physicians. Journal of the National Medi-cal Association 2006; 98(3):403-404.Rodríguez MA, Wallace SP, Woolf NH, MangioneCM. Mandatory reporting El Elder abuse: betweena rock and hard place. Annals of Family Medicine2006; 4:5-58.

Artigo apresentado em 07/05/2010Aprovado em 21/05/2010

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Referências

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