ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves...

129
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS CURSO DE DIREITO ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE EMBRIÕES CONGELADOS NA PRÁTICA DA CLONAGEM HUMANA: UMA ANÁLISE À LUZ DA ATUAL LEI DE BIOSSEGURANÇA BRASILEIRA ANNA KLEINE NEVES PEREIRA Itajaí, 30 de outubro de 2007.

Transcript of ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves...

Page 1: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS CURSO DE DIREITO

ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE EMBRIÕES CONGELADOS NA PRÁTICA DA CLONAGEM HUMANA: UMA

ANÁLISE À LUZ DA ATUAL LEI DE BIOSSEGURANÇA BRASILEIRA

ANNA KLEINE NEVES PEREIRA

Itajaí, 30 de outubro de 2007.

Page 2: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE EMBRIÕES CONGELADOS NA PRÁTICA DA CLONAGEM HUMANA: UMA

ANÁLISE À LUZ DA ATUAL LEI DE BIOSSEGURANÇA BRASILEIRA

ANNA KLEINE NEVES PEREIRA

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como

requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientadora: Professora MSc. Maria da Graça Mello Ferracioli

Itajaí, 30 de outubro de 2007.

Page 3: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

2

“A experiência tem mostrado que quanto mais

o homem caminha para a artificialidade, foge

ele das regras naturais e da essência de sua

própria vida.”

(Álvaro Villaça Azevedo)

Page 4: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

3

AGRADECIMENTOS

Sempre a Deus, essência da minha vida.

Ao meu marido Edson Vicente Minicoski Pereira,

que me ensina a viver com alegria, pelo seu amor

e compreensão dedicados nos momentos

subtraídos da convivência familiar, motivados pela

dedicação aos estudos.

Aos familiares, meu pai Carlos Augusto Paim

Neves, minha mãe Arlene Kleine Neves, minha

irmã Gisele Kleine Neves e minha avó Jandyra

Cruz Kleine, pelo amor, incentivos e apoio

fundamental na minha caminhada profissional.

A Profª. MSc. Maria da Graça Mello Ferracioli,

pelas orientações e pelas contribuições oferecidas

nos anos da graduação.

Aos amigos, colegas e professores do Curso de

Direito, em agradecimento pelas lições que

aprendi e aprendo a cada dia com todos.

Page 5: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

4

DEDICATÓRIA

Ao meu marido Edson Vicente Minicoski Pereira,

pela perseverança e pelo entusiasmo que dedica

aos nossos objetivos, e aos familiares por me

proporcionarem uma vida feliz e me

impulsionarem à busca de muitas outras

realizações.

Page 6: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

5

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e a

Orientadora de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí, 30 de outubro de 2007.

Anna Kleine Neves Pereira Graduanda

Page 7: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

6

PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale

do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Anna Kleine Neves Pereira, sob o

título “Aspectos ético-jurídicos da utilização de embriões congelados na prática da

clonagem humana: uma análise à luz da nova lei de biossegurança brasileira”, foi

submetida em 30 de outubro de 2007 à banca examinadora composta pelos

seguintes professores: Profª. MSc. Maria da Graça Mello Ferracioli (orientadora),

Profª. MSc. Andrietta Kretz (membro) e Profº. Josemar Sidinei Soares (membro),

e aprovada com a nota 10 (dez).

Itajaí (SC), 30 de outubro de 2007.

Professora MSc. Maria da Graça Mello Ferracioli Orientadora e Presidente da Banca

Professor MSc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

Page 8: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

7

ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ACT Advanced Cell Technology

ADIN Ação Direta de Inconstitucionalidade

AMA Associação Médica Americana

ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária

ART. Artigo

ATT Alfa-I-antitripsina

BBC British Broadcasting Corporation

CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002

CFM Conselho Federal de Medicina

CFRB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

CJF Conselho de Justiça Federal

CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente

CNBS Conselho Nacional de Biossegurança

CT Células-Tronco

CTNBIO Comissão Técnica Nacional de Biossegurança

DNA / ADN Ácido Desoxirribonucléico

Page 9: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

8

EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias

EUA Estados Unidos da América

INTA Instituto Nacional de Tecnologia Animal

OAB Ordem dos Advogados do Brasil

OGMS Organismos Geneticamente Modificados

OMS Organização Mundial da Saúde

ONU Organização das Nações Unidas

PPL THERAPEUTICS

Pharmaceutical Technology Lothian

RNA / ARN Ácido Ribonucléico

SBRA Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida

SNU Universidade Nacional de Seul

STJ Superior Tribunal de Justiça

STF Supremo Tribunal Federal

UNESCO Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a Cultura.

UNIFESP Universidade Federal de São Paulo

UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí

Page 10: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Bioética

”É o estudo sistemático da conduta humana no âmbito das ciências da vida e da

saúde considerada à luz de valores e princípios morais”. 1

Ética

“Ética é uma tentativa para se determinar os valores fundamentais pelos quais

vivemos. Quando vista num contexto social, é uma tentativa de avaliar as ações

pessoais e as ações dos outros de acordo com uma determinada metodologia ou

certos valores básicos”. 2

Moral

A palavra “moral” tem sua origem no latim (mos, moris) e designa: “os costumes,

a conduta da vida, as regras do comportamento. Etimologicamente há, então, um

sentido muito amplo. Ela se refere ao agir humano, aos comportamentos

cotidianos, às opções existenciais. Ela faz pensar de maneira espontânea em

normas, regras do comportamento, princípios, valores”. 3

A moral se relaciona diretamente aos atos humanos, ao seu agir. De forma ampla,

refere-se ao “bem” a ao “mal”, “ao que é necessário fazer”, por oposição a “o que

se faz”. Assim, a moral estabelece princípios, normas de conduta interna de cada

indivíduo, capaz de ser exteriorizada. 4

1 SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética. São Paulo: Loyola, 1996. p. 43. 2 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. 2.ed. atual. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira, 2003. p. 16.

3 DURANT, Guy. A Bioética: natureza, princípios, objetivos. São Paulo: Paulus, 1995. p. 09. 4 DURANT, Guy. A Bioética: natureza, princípios, objetivos. p. 09.

Page 11: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

x

Biodireito

”Biodireito é a produção doutrinária, legislativa e judicial acerca das questões que

envolvem a bioética. Vai desde o direito a um meio-ambiente sadio, passando

pelas tecnologias reprodutivas, envolvendo a autorização ou negação de

clonagens e transplantes, até questões mais corriqueiras e ainda mais

inquietantes como a dicotomia entre a garantia constitucional do direito á saúde, a

falta de leitos hospitalares e a equânime distribuição de saúde à população” 5

Direito

“O direito não é uma simples idéia, é uma força viva. (...). O direito no sentido

objetivo compreende os princípios jurídicos manipulados pelo Estado, ou seja, o

ordenamento legal da vida. O direito, no sentido subjetivo, representa a atuação

concreta da norma da norma abstrata, de que resulta uma faculdade específica

de determinada pessoa”. 6

Clonagem

“Processo de reprodução assexuada, produzida artificialmente, baseada em um

único patrimônio genético, com ou sem utilização de técnicas de engenharia

genética”. 7

Vida

“A vida é o bem fundamental, base de todos os direitos do homem, tendo o

Estado o dever de garantir, por todos os meios e formas, o respeito a ela desde o

seu início, principalmente porque o nascituro, cujo nascimento se espera, é um

ser ainda fraco e indefeso que necessita de proteção para o seu completo

desenvolvimento, vindo a realizar seus interesses nas relações sociais”. 8

5 FERNANDES, Thyco Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do biodireito: aspectos do direito de família e do direito das sucessões. Florianópolis: Diploma Legal, 2000. p. 42.

6 IHERING, Rudolf von. A Luta pelo Direito. São Paulo: Martin Claret Editora, 2002. p. 28. 7 BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005. 8 CHAVES, Benetida Inês Lopes. A Tutela Jurídica do Nascituro. São Paulo: LTr, 2000. p. 14.

Page 12: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

xi

Nascituro

“De acordo com a etimologia do vocábulo “nascituro” (de “nasciturus-a-um) é

aquele que há de ou deve nascer”. 9

Embrião

“Célula germinal humana: célula-mãe responsável pela formação de gametas

presentes nas glândulas sexuais femininas e masculinas e suas descendentes

diretas em qualquer grau de ploidia”.10

9 CHAVES, Benetida Inês Lopes. A Tutela Jurídica do Nascituro. p. 18. 10 BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005.

Page 13: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

xii

SUMÁRIO

RESUMO.........................................................................................XIV

INTRODUÇÃO ................................................................................... 1

CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 3

BIOÉTICA E BIODIREITO.................................................................. 3 1.1 BIOÉTICA.........................................................................................................3 1.1.1 CONCEITO E DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO ......................................................3 1.1.2 ÉTICA E MORAL NO CAMPO DA BIOÉTICA ...........................................................7 1.1.3 PRINCÍPIOS DA BIOÉTICA...................................................................................9 1.1.3.1 Princípio da Autonomia ..........................................................................11 1.1.3.2 Princípio da Beneficência.......................................................................13 1.1.3.3 Princípio da Não-Maleficência ...............................................................16 1.1.3.4 Princípio da Justiça ................................................................................17 1.1.4 PROBLEMAS BIOÉTICOS DA ATUALIDADE: CONSTRUÇÃO DE UM NOVO PARADIGMA..............................................................................................................................20 1.2 BIODIREITO ...................................................................................................21 1.2.1 CONCEITO E ASPECTOS RELEVANTES ..............................................................22 1.2.2 BIOÉTICA, BIODIREITO E HUMANISMO JURÍDICO ................................................24

CAPÍTULO 2 .................................................................................... 28

CLONAGEM..................................................................................... 28 2.1 ASPECTOS GERAIS......................................................................................28 2.2 DEFINIÇÃO ....................................................................................................29 2.3 HISTÓRICO ....................................................................................................30 2.4 CLONAGEM HUMANA E SUAS FORMAS....................................................50 2.4.1 CLONAGEM REPRODUTIVA ..............................................................................50 2.4.1.1 Justificativas para a prática da clonagem reprodutiva........................52 2.4.2 CLONAGEM TERAPÊUTICA...............................................................................55 2.4.2.1 Justificativas para a prática da clonagem terapêutica ........................58

Page 14: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

xiii

CAPÍTULO 3 .................................................................................... 61

EMBRIÕES CONGELADOS, CLONAGEM HUMANA E A NOVA LEI DE BIOSSEGURANÇA BRASILEIRA.............................................. 61 3.1 EMBRIÕES.....................................................................................................61 3.1.1 CONCEITO......................................................................................................61 3.1.2 EMBRIÕES CONGELADOS ................................................................................63 3.1.2.1 Criopreservação de Embriões ...............................................................66 3.2 UTILIZAÇÃO DE EMBRIÕES CONGELADOS EM PRÁTICAS REPRODUTIVAS..................................................................................................67 3.3 CLONAGEM HUMANA E O DIREITO BRASILEIRO.....................................72 3.3.1 A VIDA EMBRIONÁRIA E SUA PROTEÇÃO JURÍDICA............................................74 3.3.1.1 Embrião e Nascituro ...............................................................................74 3.3.1.2 Proteção Jurídica dos Embriões frente ao Princípio da Dignidade Humana................................................................................................................83 3.3.2 CLONAGEM HUMANA, DIREITO E A NOVA LEI DE BIOSSEGURANÇA.....................88

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................ 102

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ........................................ 105

ANEXOS......................................................................................... 114

Page 15: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

RESUMO

A atualidade tem vivenciado momentos de adaptações às

novas descobertas biotecnocientíficas, gerando a necessidade do Direito

adequar-se a esta realidade, sob pena de desconfigurar o real significado da

Justiça. Neste sentido, enquanto a Bioética orienta as condutas humanas sob o

ponto de vista ético e moral nas práticas científicas, o Biodireito desempenha o

papel jurídico, criando, desenvolvendo e aplicando as normatizações legais. A

clonagem humana, forma de reprodução, tem suscitado diversas discordâncias no

enfoque mundial, seja esta na forma de clonagem reprodutiva ou terapêutica,

quando busca utilizar embriões congelados em sua prática. Se por um lado o feito

representa uma promessa da ciência na busca da cura de doenças degenerativas

e até para restaurar órgãos e tecidos avariados, por outro lado, suscita profundos

questionamentos éticos e jurídicos, envolvendo a bioética e o biodireito, uma vez

que muitos visualizam nos embriões congelados, uma forma de vida. Diante

desses posicionamentos, foi criada a atual Lei de Biossegurança (Lei nº. 11.105

de 24/03/2005), proibindo as duas formas de clonagem humana, reprodutiva e

terapêutica, porém, abrindo caminho para pesquisas com células-tronco

embrionárias extraídas de embriões excedentes. Contudo, lidar com a questão de

embriões congelados na prática da clonagem humana, é ter consciência de que

se trata de uma discussão que vai muito além desta nova lei, é uma realidade

muito discutida, porém, pouco normatizada pelo Direito Moderno, que encontra

muitas dificuldades em dar suporte jurídico a esta questão. Diversas iniciativas já

foram realizadas, no entanto, verifica-se que o esforço de legislar e regulamentar

este assunto é complexo, uma vez que envolve diretamente a vida, o homem e os

seus valores.

Page 16: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto estudar os aspectos

ético-jurídicos da utilização de embriões congelados na prática da clonagem

humana, realizando uma análise à luz da atual Lei de Biossegurança brasileira.

O seu objetivo institucional é verificar a importância da

Bioética e do Biodireito, analisando os tipos de clonagem, a utilização de

embriões congelados em práticas reprodutivas, bem como a sua proteção

jurídica, sob o olhar jurídico da Lei de Biossegurança - Lei 11.105/2005.

Para tanto, principiar–se-á, no Capítulo 1, tratando de

Bioética e Biodireito. O objetivo deste capítulo é conceituar a categoria bioética;

analisar-se-á a ética e a moral, bem como os seus princípios norteadores, para

que então entenda-se os problemas bioéticos da atualidade e a construção de um

novo paradigma jurídica no trato destas questões.

No Capítulo 2, trata-se-á sobre clonagem, verificar-se-á seus

aspectos gerais, sua conceituação, o desenvolvimento do assunto ao longo da

história; as duas formas de clonagem, reprodutiva e terapêutica, apresentando as

justificativas positivas e negativas relativas a esta prática.

No Capítulo 3, o foco será os embriões congelados, a

clonagem humana e o direito brasileiro. Diante da complexidade do assunto, este

capítulo começa conceituando embrião, passa a explicar a criopreservação e a

utilização deles em práticas reprodutivas. Em seguida, segue-se à normatização

do tema, falando-se sobre a vida embrionária e a sua proteção jurídica; a

diferenciação entre embrião e nascituro; analisando este tema frente ao Princípio

da Dignidade Humana. Para finalizar este trabalho, realiza-se uma análise geral

do tema clonagem, da polêmica na utilização de embriões sob um aspecto

jurídico, direcionando basicamente a atual Lei de Biossegurança (Lei 11.105/05).

Esta monografia se encerra com as Considerações Finais,

nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da

Page 17: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

2

estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a utilização de

embriões congelados na prática da clonagem humana e sua proteção jurídica.

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes

hipóteses:

� A Bioética e o Biodireito são instrumentos importantes para o

controle das atividades relacionadas aos avanços

biotecnológicos.

� A clonagem humana não é permitida no sistema normativo

brasileiro.

� Existe no Brasil legislação que regulamente a utilização de

embriões humanos nas atividades biotecnocientíficas.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase

de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados

o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente

Monografia é composto na base lógica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as

Técnicas, do Referente11, da Categoria12, do Conceito Operacional13 e da

Pesquisa Bibliográfica14.

11 “Referente é a explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para uma atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica e Metodologia da Pesquisa Jurídica. 10.ed. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2007. p. 62.

12 Categoria é “a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica e Metodologia da Pesquisa Jurídica. p. 31.

13 É quando se estabelece ou se propõe uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que se expõe. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica e Metodologia da Pesquisa Jurídica. p. 45.

14 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica e Metodologia da Pesquisa Jurídica. p. 239.

Page 18: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

CAPÍTULO 1

BIOÉTICA E BIODIREITO

1.1 BIOÉTICA

A bioética é uma disciplina nova, em contínuo crescimento e

de grande discussão. Envolta em uma série de situações médicas, genéticas,

sociais, culturais, éticas, epistemológicas, religiosas, metodológicas e científicas,

apresenta-se como um campo norteador muito amplo, porém, pouco

sistematizado.

Sendo assim, antes de se adentrar nas questões relativas à

clonagem humana, é primordial realizar-se uma análise pormenorizada acerca da

bioética.

1.1.1 Conceito e desenvolvimento histórico

A aceleração do progresso científico e tecnológico nesses

últimos anos tem direcionado as pessoas a examinar de maneira nova antigos

assuntos.

Com objetivo de dirimir estes questionamentos nasceu a

bioética e com ela uma disciplina nova se desenvolveu de maneira extremamente

rápida. Todavia, a “palavra” não é analisada como ciência específica, haja vista

estar relacionada com diversas ciências e ser percebida de maneira diferente

pelos estudiosos. 15

15 DURANT, Guy. A Bioética: natureza, princípios, objetivos. São Paulo: Paulus, 1995. p. 06 e 07.

Page 19: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

4

A palavra bioética apareceu pela primeira vez em 1971 no

título da obra de Van Rens Selaer Potter 16 (Bioetchics: bridge to the future,

Prenctice Hall, Englewood Clifs, New York). Para o autor, sua finalidade era de

auxiliar a humanidade no sentido de participação racional, porém, cautelosa no

processo de evolução biológica e cultural. Seria, portanto, o compromisso com o

equilíbrio e a preservação dos seres humanos com o ecossistema e a própria vida

do planeta. 17

Acerca do entendimento deste autor, descreve Maria Helena

Diniz que:

a bioética seria então uma nova disciplina que recorreria às

ciências biológicas para melhorar a qualidade de vida do ser

humana, permitindo a participação do homem na evolução

biológica e preservando a harmonia universal. Seria a ciência que

garantiria a sobrevivência na Terra, que está em perigo, em

virtude de um descontrolado desconhecimento da tecnologia

industrial, do uso indiscriminado de agrotóxicos, de animais em

pesquisas ou experiências biológicas e da sempre crescente

poluição aquática, atmosférica e sonora. 18

Com posicionamento diverso, foi André Hellegers quem

usou pela primeira o termo bioética para aplicá-lo nas ciências biológicas e à ética

na medicina, ao fundar em julho de 1971, o Joseph and Rose Kennedy Institute

for the Study on Human Reproduction of Bioethics.19

Assim, se para Potter a bioética possuía um sentido amplo,

com fonte conotativamente ecológica e holística, na visão de Hellegers ela dizia

respeito ao ser humano e às biociências humanas. 20

16 Médico oncologista, biólogo e professor americano da Universidade de Wisconsin, Madison-EUA.

17 POTTER, Van Rensselaer. Palestra apresentada em vídeo, no IV Congresso Mundial de Bioética. Tóquio/Japão: 4 a 7 de novembro de 1998. O mundo da saúde, 22 (6) p. 370-347.

18 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2.ed. aum. e atual. de acordo com o novo Código Civil (Lei n. 10.406, de 10-01-2002). São Paulo: Saraiva, 2002. p. 09.

19 OLIVEIRA, Fátima. Bioética – uma face da cidadania. São Paulo: Moderna, 1997. p. 48. 20 OLIVEIRA, Fátima. Bioética – uma face da cidadania. p. 48.

Page 20: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

5

Logo, percebe-se que o livro de Potter não tem muita

relação com o contexto atual, pois, para Vieira, “bioética é a combinação de

conhecimentos biológicos e valores humanos”. 21

Ainda, no entendimento desta autora, o vocábulo bioética

indica, “um conjunto de pesquisas e práticas pluridisciplinares, objetivando

elucidar e solucionar questões éticas provocadas pelo avanço das tecnociências

biomédicas”. 22

Com a decifração do código genético humano e os novos

recursos de manipulação científica da natureza, o interesse pelo estudo deste

tema acelerou bastante, isto porque o homem se viu diante de problemas

imprevistos. 23

Para Pessini e Barchifontaine, citados por Vieira, a palavra

“bio”,

“exige que levemos seriamente em conta as disciplinas e as

implicações do conhecimento científico, de modo que possamos

entender as questões, perceber o que está em jogo e aprender a

avaliar possíveis conseqüências das descobertas e suas

aplicações”. 24

A palavra “ética”, por sua vez,

“é uma tentativa para se determinar os valores fundamentais

pelos quais vivemos. Quando vista num contexto social, é uma

tentativa de avaliar as ações pessoais e as ações dos outros de

acordo com uma determinada metodologia ou certos valores

básicos”. 25

21 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. 2.ed. atual. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira, 2003. p. 15.

22 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 15. 23 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 15. 24 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 16. 25 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 16.

Page 21: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

6

Em 1978, a palavra bioética foi definida pela Encyclopedia of

Bioethics como sendo, “o estudo sistemático da conduta humana no âmbito das

ciências da vida e da saúde considerada à luz de valores e princípios morais” 26

Na segunda edição, em 1995, passou a considerá-la não

mais como valores e princípios morais, mas como: “(...) o estudo sistemático das

dimensões morais das ciências da vida e do cuidado com a saúde, utilizando uma

variedade de metodologias éticas num contexto multidisciplinar”. 27

Segundo DIAFÉRIA, bioética é:

“(...) um neologismo derivado das palavras gregas mos (vida) e

ethike (ética). Pode-se defini-Ia como sendo o estudo

sistematizado das dimensões morais - incluindo visão, decisão,

conduta e normas morais - das ciências da vida e da saúde,

utilizando uma variedade de metodologias éticas num contexto

interdisciplinar." 28

Ou ainda, nos dizeres de Fabriz, a bioética representa um

estudo acerca da conduta humana no campo da vida e da saúde humana e do

perigo da interferência nesse campo pelos avanços das pesquisas biomédicas e

tecnocientíficas. 29

Desta forma, “bioética está relacionada com todas as

ciências que envolvam seres vivos”. É certo que, desde sua criação, foi

desenvolvida principalmente por profissionais da área da saúde, os quais

analisavam os temas polêmicos da época. Porém, a ciência tecnológica

desenvolveu-se de forma mais rápida que o direito pudesse alcançar. 30

26 SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética. São Paulo: Loyola, 1996. p. 43. 27 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 10. 28 DIAFÉRRIA, Adriana. Clonagem, aspectos jurídicos e bioéticos. São Paulo: Edipro, 1999. p.84.

29 FABRIZ, Daury César. Bioética e direitos fundamentais. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003. p. 75.

30 VARELLA, Marcelo Dias; FONTES, Eliana e ROCHA, Fernando Galvão da. Biossegurança e Biodiversidade – Contexto Científico e Regulamentar. Belo Horizonte: Del Rey, 1999.

Page 22: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

7

1.1.2 Ética e Moral no campo da Bioética

Conforme já analisado anteriormente, a Bioética representa

“um estudo acerca da conduta humana no campo da ciência da vida e saúde

humana e do perigo da interferência nesse campo pelos avanços das pesquisas

biomédicas e tecnocientíficas”. 31

Todavia, existem doutrinadores que preferem utilizar outra

terminologia, ou seja, Jean Pierre Marc-Vergnes prefere falar em ética da

biomédica por acreditar que os problemas situam-se preferencialmente na área

médica. 32

Outros, como o filósofo Paul Ricoeur, fazem distinção entre

ética e moral, estabelecendo a primazia da ética sobre a moral.33 Sendo assim,

ressente-se de um estudo mais aprofundado no que tange as definições e

conceitos dos vocábulos ética e moral, para que se possa compreender a

contextualização da palavra Bioética.

A palavra “moral” tem sua origem no latim (mos, moris) e

designa:

“os costumes, a conduta da vida, as regras do comportamento.

Etimologicamente há, então, um sentido muito amplo. Ela se

refere ao agir humano, aos comportamentos cotidianos, às opções

existenciais. Ela faz pensar de maneira espontânea em normas,

regras do comportamento, princípios, valores”. 34

Segundo FABRIZ, a palavra costume, vocábulo de origem

latina (consuetudine), liga-se à idéia de comportamento, regras que regulam

comportamentos aceitos por determinada comunidade. Nessa perspectiva, moral

se traduzirá como:

31 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003. p. 75.

32 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 16. 33 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 17. 34 DURANT, Guy. A Bioética: natureza, princípios, objetivos. p. 09.

Page 23: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

8

“aquilo que se refere aos usos e costumes (fatos vividos),

indicando, guiando a ação desenvolvida. “A moral explica e é

explicada pelos costumes. A moral pretende enunciar as regras,

normas e leis que regem, causam e determinam os costumes,

inclusive, muitas vezes, enunciando-lhes as conseqüências”. A

moral é prescritiva”. 35

A moral se relaciona diretamente aos atos humanos, ao seu

agir. De forma ampla, refere-se ao “bem” a ao “mal”, “ao que é necessário fazer”,

por oposição a “o que se faz”. Assim, a moral estabelece princípios, normas de

conduta interna de cada indivíduo, capaz de ser exteriorizada. 36

Dessa exteriorização da moral nasce a ética, as quais,

indubitavelmente encontram-se ligadas num imbricado jogo de mútuas relações.

Assim como a palavra moral tem sua origem no latim, a

palavra ética vem do grego (éthos) e “se refere aos costumes, à conduta da vida,

às regras do comportamento”. 37

Convém destacar o posicionamento de Fabriz:

A ética não está acima da moral, mas pode ser concebida em um

determinado plano como a esfera que se propõe refletir sobre as

posturas que devam ser compreendidas entre as dimensões da

moral e da imoralidade. 38

Logo, ética designa um conjunto de preceitos informadores

da maneira de se proceder, de agir, em relação ao outro e ao conjunto da

sociedade. 39

A ética do ponto de vista da razão tem suas origens nos

princípios dos Direitos do Homem, pois, a noção de igualdade e liberdade impõe o

35 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 79, apud KORTE, Gustavo. Iniciação à ética. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999. p. 114 e 115.

36 DURANT, Guy. A Bioética: natureza, princípios, objetivos. p. 09. 37 DURANT, Guy. A Bioética: natureza, princípios, objetivos. p. 13. 38 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 79. 39 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 78.

Page 24: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

9

respeito ao próximo, inclusive no que concerne às suas crenças. Exclui o

dogmatismo. 40

Desta forma, se a ética envolve relações recíprocas entre

indivíduo e coletividade, a bioética tornou-se um campo vasto para a sua

aplicação, uma vez que a ciência está caminhando mais rápido que a reflexão

ética por parte da sociedade. Ainda não foram encontradas respostas para

diversos questionamentos e se espera para que sejam elaboradas normas sobre

a bioética, a fim de legitimar a sua prática ou para proibir experiências julgadas

abusivas. 41

Desta forma, no contexto contemporâneo, a bioética pode

ser vista como uma possibilidade configuradora de um paradigma com finalidade

de criar um novo discurso sobre a vida, estabelecendo uma nova ética, em

resposta à dogmática do discurso científico moderno. 42

Essa nova perspectiva de ética não tem a pretensão de se

colocar como detentora da verdade, mas, tem objetivo de levar em consideração

os vários aspectos que se relacionam com essa complexidade gerada pela

tecnologia e ciência no campo da biomedicina, entendendo-se que a variedade de

idéias possa gerar saídas criativas e humanamente adequadas. 43

1.1.3 Princípios da Bioética

Com objetivo de garantir e defender a dignidade da pessoa

humana, a bioética atua num campo com referenciais práticos, princípios

orientadores do que se considera uma conduta ética em relação à vida. 44

40 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 17. 41 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 17. 42 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 86. 43 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 86. 44 OLIVEIRA, Fátima. Bioética – uma face da cidadania. p. 55.

Page 25: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

10

Há muita divergência entre doutrinadores, não se podendo

afirmar com precisão o número exato de princípios que devem ser aplicados. São

várias as orientações no campo da biociência, as quais, podem ser enquadradas

em modelos de análise diferentes, quais sejam: principalista, libertário das

virtudes, casuístico, fenomenológico hermenêutico, narrativo, do cuidado, do

direito natural, contratualista, antropológico personalista.45

Há, ainda, quem afirma que os princípios bioéticos são

classificados em laico e religiosos, estabelecidos durante o processo de formação

dos grupos e centros de estudos de bioética. 46

Todas essas correntes são importantes, pois, não se pode

estabelecer padrões morais com apenas uma perspectiva orientadora.

Entretanto, apesar de todos esses princípios apontarem para uma mesma

direção, sendo esta a consagração e preservação da dignidade humana, ater-se-

a para a visão principialista. 47

Concernente à corrente principialista, teve início com a obra

clássica “Principles of biomedical ethics”, de Beauchamp e James Childress.

Estes dois autores acrescentam que foram criados quatro princípios como

orientadores da ação, sendo: beneficência, não-maleficência, justiça e

autonomia.48 Na visão dos autores, não há hierarquia entre eles, devendo ser

aplicados em conformidade a cada caso concreto. 49

45 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 104. 46 OLIVEIRA, Fátima. Bioética – uma face da cidadania. p. 55. 47 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 105. 48 Convém destacar que outras obras bioéticas descrevem que tais princípios tiveram sua aparição em 1978, no Belmont Report, quando foram publicados pela National Commission for the Protection of Human Subjects of Biomedical and Behavioral Research (Comissão Nacional para a Proteção dos Seres Humanos em Pesquisa Biomédica e Comportamental), que foi constituído pela governo norte-americano com objetivo de realizar um estudo completo, o qual identificasse os princípios éticos básicos que deveriam nortear a experimentação de seres humanos nas ciências do comportamento e na biomedicina. DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 11 e 12.

49 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 105.

Page 26: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

11

É comum também, aparecer a expressão “trindade bioética”

para conceituar os princípios elencados, absorvendo o princípio da beneficência o

princípio da não-maleficência, como foi criado com o informe de Belmont. 50

Sendo assim, passa-se a uma análise detalhada de cada um

dos princípios bioéticos.

1.1.3.1 Princípio da Autonomia

Identificado como respeito à pessoa, o princípio da

autonomia, tem por definição “autos”, eu e “nomos”, lei. 51 Diz respeito à

capacidade racional do ser humano de criar leis para si mesmo.52 Significa “a

capacidade de a pessoa governar-se a si mesma, ou a capacidade de se

autogovernar, escolher, dividir, avaliar, sem restrições internas ou externas”. 53

Trazendo para o contexto científico, o princípio da autonomia

requer que o profissional da saúde, tendo consciência dos valores morais e

religiosos de cada pessoa, respeite a vontade do paciente, ou de seu

representante. 54

Segundo Maria Helena Diniz, este princípio,

“Reconhece o domínio do paciente sobre a própria vida (corpo e

mente) e o respeito à sua intimidade, restringindo, com isso, a

intromissão alheia no mundo daquele que está sendo submetido a

um tratamento. Considera o paciente capaz de autogovernar-se,

ou seja, de fazer opções e agir sob a orientação dessas

50 OLIVEIRA, Fátima. Bioética – uma face da cidadania. p. 55. 51 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 109. 52 Significa dizer que cada pessoa é responsável por suas escolhas e deve estar consciente de suas conseqüências.

53 PESSINI, Léo; BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de. Problemas atuais de Bioética. 3.ed. São Paulo: Edições Loyola, 1991. p. 44.

54 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 15.

Page 27: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

12

deliberações tomadas, devendo, por tal razão, ser tratado com

autonomia”. 55

É considerado o principal princípio da Bioética, estando os

demais vinculados a ele, pois,

“está diretamente ligado ao livre consentimento do paciente na

medida em que este deve ser sempre informado; em outras

palavras, o indivíduo tem a liberdade de fazer o que quiser, mas

para que esta liberdade seja plena, é necessário oferecer a

completa informação para que o consentimento seja realmente

livre e consciente”. 56

Guy Durant oportunamente descreve que “o direito moderno

dá considerável importância ao atributo pessoa, dando-lhe diversos nomes, como:

autonomia, autodeterminação, inviolabilidade da pessoa”. 57

No entendimento de Fabriz,

“o princípio da autonomia justifica-se como princípio democrático,

no qual a vontade e o consentimento livres do indivíduo devem

constar como fatores preponderantes, visto que tais elementos

ligam-se diretamente ao princípio da dignidade humana”. 58

Quando se trata do princípio da autonomia, o bem jurídico

que se encontra subtendido em seu conceito é “a liberdade de realizar qualquer

conduta que não prejudique a terceiros”.59 Essa liberdade esta consagrada nos

artigos 4º e 5º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789.

Deste modo, é possível e coerente que ocorra a redução da autonomia individual,

em razão de se estar expondo a perigo a saúde de uma dada coletividade. 60

55 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 15. 56 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Juris, 200. p. 07.

57 DURANT, Guy. A Bioética: natureza, princípios, objetivos. p. 33. 58 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 109. 59 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro. Morte encefálica: a Lei de Transplantes de Órgãos. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998. p. 111.

60 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 110.

Page 28: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

13

Destarte, este princípio deve ser observado no âmbito das

pesquisas ou aplicação de novas tecnologias que envolvam diretamente

populações, pois, conforme Fabriz:

“quando uma comunidade contribui com suas opiniões, ou mesmo

deixa-se submeter a determinados procedimentos, para que se

realize um estudo, essa comunidade deve ser informada de todos

os riscos. Não cabe a justificativa, para a sonegação de tais

informações, por questões ligadas ao método ou rigor científico.

Realizada a pesquisa, seus resultados sempre devem ser

divulgados, pelo menos na comunidade em que se processou a

verificação”. 61

Logo, qualquer imposição é considerada como agressão à

inviolabilidade da intimidade da pessoa.62 Todavia, por mais que seja um princípio

não tem seu fim em si mesmo, pois jamais poderá prevalecer a vontade individual

sobre a coletiva, quando suas conseqüências forem diversas e exporem a vida

dos demais ao risco.

1.1.3.2 Princípio da Beneficência

Beneficência vem de “bomun facere” que no latim significa

fazer o bem. É o critério mais antigo da ética médica, tendo suas raízes na

medicina.63 No juramento de Hipócrates é dito:

“Aplicarei os regimes para o bem dos doentes, segundo o meu

saber e a minha razão, e nunca para prejudicar ou fazer o mal a

quem quer que seja”. A ninguém darei, para agradar, remédio

mortal nem conselho que o induza à destruição. Também não

fornecerei a uma senhora pessário abortivo (...) Na casa aonde eu

for, entrarei apenas pelo bem do doente, abstendo-me de

qualquer mal voluntário de toda sedução”. 64

61 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 110. 62 OLIVEIRA, Fátima. Bioética – uma face da cidadania. p. 56. 63 PESSINI, Léo; BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de. Problemas atuais de Bioética. p. 44. 64 RAMOS, Sérgio dos Passos. Juramento de Hipócrates. Disponível em: http://www.gineco.com.br/jura.htm. Acesso: 02 maio de 2007.

Page 29: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

14

O princípio da beneficência “indica a obrigatoriedade do

profissional de saúde e do investigador de promover primeiramente o bem do

paciente”.65 Tem seu fundamento na regra da confiabilidade. As máximas desse

princípio, enquadrando-se no contexto da citação anterior, que são: “fazer o bem;

não causar dano; cuidar da saúde; favorecer a qualidade de vida; manter o sigilo

médico”. Constitui-se no mais antigo critério da ética médica.66

Este ditame aborda a questão da avaliação do risco e

benefício na utilização de determinado procedimento médico, em cada caso

particular. O médico deve realizar uma avaliação do procedimento a ser utilizado

pelo paciente, para que este não sofra desnecessariamente sem obter resultados,

ou seja, em outras palavras, na sua avaliação os benefícios devem superar os

riscos, assim como os sofrimentos, para valerem a pena. O médico deve informar

o paciente acerca dos riscos e benefícios, além de dar a sua opinião sobre o

caso, mas a decisão final caberá ao paciente, principal interessado, configurando

a ligação deste princípio ao anterior. 67

Sugere, que seria bom beneficiar as pessoas que têm

necessidade, por exemplo, que os médicos proporcionassem assistência à saúde

de pacientes indigentes. Contudo, essas questões não são de simples aplicação,

visto que a medicina, em sentido estrito, constitui-se em uma profissão, e, como

tal, deve-se levar em conta as várias implicações que daí advêm. 68

Cumpre dizer que o médico não está obrigado a realizar o

que o paciente deseja, como citado no juramento de Hipócrates, há valores e

normas legais e serem cumpridos, assim, se a opinião do paciente for adversa as

convicções e valores pessoais do médico, este poderá rejeitar o tratamento,

devendo o paciente procurar outro profissional. 69

Em assim sendo,

65 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 107 e 108. 66 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 108. 67 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. p. 07. 68 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 108. 69 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. p. 08.

Page 30: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

15

“o princípio da beneficência deve servir como horizonte para uma

normatização jurídica, a fim de que possa ser compreendido

situações específicas, preceituando e assegurando os direitos e

deveres que dizem respeito à comunidade científica, aos sujeitos

da pesquisa, aos médicos e pacientes, bem como ao Estado”.70

Conceitua-se, também, como:

“A ponderação entre riscos e benefícios, tanto atuais como

potenciais, individuais ou coletivos, comprometendo-se com o

máximo de benefícios e o mínimo de danos e riscos, este é o

princípio da beneficência”. 71

Pondera-se que a beneficência “é uma ação feita em

benefício do alheio, por estabelecer o dever moral de agir em benefício dos

outros”. 72

Este princípio acarreta ao médico uma carga de

responsabilidade muito grande, pois quando se trabalha com questões como

transplantes de órgãos, eutanásia, clonagem, experimentações com seres

humanos, o profissional deve estar apto a reconhecer quando o paciente esta, ou

não, dando consentimento realmente consciente ou quando é fruto somente do

estado emocional em que se encontra.73

Uma normatização jurídica, neste sentido, deve conter

disposições que indiquem as ações a serem estabelecidas como procedimentos

adequados a serem seguidos pelos prestadores de serviços, instituições e

profissionais, voltados para a melhoria da saúde e o bem estar da clientela. 74

70 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 108. 71 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. p. 08. 72 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 15; apud BEAUCHAMP & CHILDRESS. The principles of biomedical ethics. New York, Oxford University Press, 1989. p. 270

73 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. p. 08. 74 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 108.

Page 31: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

16

Conforme salienta Fátima de Oliveira, “no caso das

experimentações em humanos, “o bem” da pessoa, sujeito da pesquisa, é

prioritário, em relação aos interesses da sociedade e da ciência”. 75

1.1.3.3 Princípio da Não-Maleficência

Este princípio é um desdobramento do da beneficência, haja

vista conter a obrigação de não causar dano intencional e por decorrer da máxima

da ética médica, “primum non nocere,” 76 o de não impingir a alguém qualquer

dano. 77

O princípio da não-maleficência tem suas origens no

Juramento Hipocrático seguido por todos os médicos. Dessa forma, apresenta-se

como um princípio de relevância na prática moral, já que serve como orientação

efetiva aos profissionais da saúde. Esse princípio exige que não se cause dano

ou mal às pessoas. 78

‘Dano’ é entendido como:

“dano físico, como a dor, morte ou incapacidade, porém, não nega

a importância de outros danos possíveis, como os mentais e

aqueles que impedem a realização dos interesses dos pacientes.

Desse princípio pode-se inferir regras como “não matar”, “não

causar dor”, “não ofender”, que, assim como os princípios,

possuem validade prima facie.79

Significa que jamais se deve praticar algum mal ao paciente.

É a segurança de que danos previsíveis serão evitados. Este princípio, muitas

vezes, entra em choque com o princípio da autonomia, porque nem sempre o que

é melhor na visão do médico o será na do paciente. 80

75 OLIVEIRA, Fátima. Bioética – uma face da cidadania. p. 56. 76 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. p. 08. 77 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 107. 78 BEAUCHAMP, T.L. & CHILDRESS, J.F. Princípios de Ética Biomédica. 4.ed. São Paulo: Edições Loyola, 2002. p. 367.

79 BEAUCHAMP, T.L. & CHILDRESS, J.F. Princípios de Ética Biomédica. p. 367. 80 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. p. 08.

Page 32: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

17

Nesta situações, consoante ao descrito no item anterior,

caberá ao profissional tentar persuadir o paciente do contrário e, mesmo que a

cura para a doença seja certa, o médico não pode aplicar o tratamento contra a

vontade do paciente; trata-se de uma questão de livre arbítrio, somente poderá

compeli-lo a aceitar o tratamento caso a doença seja contagiosa, colocando em

risco a saúde da população. 81

Em último caso, se o tratamento for apenas uma tentativa

com alguma probabilidade de dar certo, ou um tratamento para prolongar a vida, o

paciente poderá vir a se recusar. O médico particular, por outro lado, poderá

recusá-lo como paciente, conforme dispõe o art. 7º do Código de Ética Médica82,

no caso de tal recusa, para se eximir de qualquer responsabilidade. Já nos

hospitais públicos, os médicos são contratados pela entidade pública, portanto

são funcionários públicos, não são autônomos, não podendo recusar o paciente.83

Nota-se que, até o momento todos os princípios relatados

estão diretamente ligados entre si, cabendo finalizá-los com o princípio da justiça.

1.1.3.4 Princípio da Justiça

Antes de enfocar este princípio da Bioética, convém discutir-

se sobre uma questão altamente complexa e essencial para o Direito, ou seja, o

que é justiça?

São vários os conceitos existentes para a palavra justiça. 84

Segundo Celeste Cordeiro:

81 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. p. 08. 82 “Art. 7° - O médico deve exercer a profissão com ampla autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços profissionais a quem ele não deseje, salvo na ausência de outro médico, em casos de urgência, ou quando sua negativa possa trazer danos irreversíveis ao paciente”. RAMOS, Sérgio dos Passos. Código de Ética Médica. Disponível em: http://www.gineco.com.br/código.htm. Acesso: 02 maio de 2007.

83 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. p. 08. 84 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 111.

Page 33: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

18

“A justiça, sob diversos nomes, governa o mundo, natureza

humanidade, ciência e consciência lógica e moral, política, história

e arte. A justiça é o que há de mais primitivo na alma humana, de

mais fundamental na sociedade”. 85

Os critérios de justiça são vários, e há muito tempo que já se

discute sobre o assunto. Cada pessoa defende seu ponto de vista sobre o que é

ou não justo. Alguns dirão que justo é o que se realiza em conformidade a lei;

outros, a lei deve sempre se adequar ao sentimento de justiça. “Neste sentido,

Direito e justiça sempre se apresentaram como conceitos afins”. 86

Na filosofia Aristotélica a Justiça é elencada como a principal

das virtudes, um bem maior. Para Aristóteles, todas as coisas visam um bem,

sendo o bem maior a justiça. Desdobra a justiça particular em dois tipos: a

distributiva e a corretiva. 87

A justiça distributiva é exercida pelo legislador, ou seja, na

distribuição da honra, riqueza e demais bens da comunidade. Essa justiça, parte

da premissa de que deve-se tratar os desiguais de forma desigual.88 Neste

sentido,

“(...) se as pessoas não forem iguais, elas não terão uma

participação igual nas coisas. (...) Além do mais, isto se torna

evidente porque aquilo que é distribuído às pessoas deve sê-lo de

acordo com o mérito de cada uma. (...) O justo, então, é uma das

espécies do gênero proporcional”. 89

A justiça corretiva é desempenhada pelo juiz ao aplicar

sanções aos delinqüentes após a solução de litígios. O desenvolvimento de seu

85 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro. Morte encefálica: a Lei de Transplantes de Órgãos. p. 45. 86 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 112. 87 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 113. 88 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 113. 89 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Nova Cultura, 1996. p. 198.

Page 34: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

19

pensamento filosófico encontra fundamento na idéia de igualdade proporcional,

uma vez que não existe igualdade nem na natureza e nem entre os homens.90

No pensamento Kelsiano, não existe e não pode existir um

critério objetivo de justiça porque a afirmação de que algo é justo ou injusto é um

juízo de valor que se refere a um fim absoluto. Esses juízos são de caráter

subjetivo essencialmente porque são baseados em elementos emocionais da

mente, sentimentos e desejos humanos. Eles não podem ser verificados por

fatos. Ele crê que o juízo sobre valores como liberdade e segurança, por exemplo,

na busca da justiça, baseiam-se em sentimentos, e isto não é objetivo, e não

pode ser levado em consideração.91

Com efeito, Platão, seguindo Sócrates, ofereceu uma

concepção de justiça muito diferente das concepções aristocráticas. A categoria

justiça surge na filosofia platônica como um problema central, do qual, o filósofo

dedicou muitas de suas obras ao estudo. Sócrates concebia a justiça como uma

virtude e não como um conjunto de convenções sociais articuladas e impostas

pela sociedade. 92

Nesse mesmo sentido é oportuno citar ainda JAEGER:

“O conceito platônico do justo está acima de todas as normas

humanas e remonta a sua origem na alma mesma. É na natureza

mais íntima desta onde deve ter seu fundamento o que o filósofo

chama o justo” 93.

Ao tratar de justiça, Platão desenvolve suas idéias como

sendo valores absolutos subordinados ao “bem absoluto”. Em resumo, a justiça

90 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. p. 198. 91 KELSEN, Hans. O que é justiça? Trad. Luis Carlos Borges e Vera Barkow. São Paulo: Martin Fontes, 1998. p. 44.

92 JAEGER, Werner. Paidéia – A Formação do Homem Grego. 3.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1995. p. 755.

93 JAEGER, Werner. Paidéia – A Formação do Homem Grego. p. 756.

Page 35: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

20

platônica reside, antes de tudo, na alma humana, em um mistério divino, como

sua qualidade precípua e critério do melhor e mais feliz tipo de vida ao homem. 94

John Rawls apresenta uma Teoria da Justiça, na qual

defende uma idéia de justiça baseada no indivíduo, estando este acima dos

interesses sociais. É uma forma de teoria contratualista de Justiça. No entanto, a

idéia de contrato de Rawls, diferencia-se da idéia dos demais contratualistas

consagrados, como Hobbes, Locke e Rousseau. Isto porque, apesar de Rawls

também partir de um estado de natureza, ou de uma posição original, o contrato

social não é o elemento desencadeador do Estado ou do Governo, mas sim, a

forma pela qual os indivíduos vão eleger entre si os princípios de Justiça. 95

“Trata-se de uma sociedade na qual todos aceitam e sabem que os outros

aceitam os mesmos princípios de justiça”. 96

Diante da exposição de princípios que devem ser aplicados

no campo das ciências da vida, este destaca-se como sendo o mais elevado, pois

surge para garantir uma distribuição justa, eqüitativa e universal dos bens e

serviços da saúde, implicando uma atitude positiva, de fazer do Estado frente aos

cidadãos no que tange ao direito à saúde, e, ainda, por envolver valores que

devem ser respeitados pela sociedade. 97

1.1.4 Problemas bioéticos da atualidade: construção de um novo paradigma

A Bioética está relacionada com todas as ciências que

envolvam seres vivos. É certo que, desde sua criação, foi desenvolvida

principalmente por profissionais da área médica, na qual foram discutidos

diversos temas polêmicos, tais como aborto, eutanásia, controle de

financiamentos em pesquisas, entre outros. Mas, hoje em dia, a bioética começa

a ter por objeto, também, outras áreas do conhecimento humano, em destaque

94 PLATÃO. A República. São Paulo: Martin Claret, 2000. 95 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 117. 96 RAWLS, John. Uma teoria da justiça. São Paulo: Martins Fontes, 1997. p. 3 – 5. 97 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 119.

Page 36: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

21

com o desenvolvimento de novas técnicas de engenharia genética, que

constantemente colocam em voga os limites éticos das pesquisas científicas.

Com as novas possibilidades do controle dos genes

humanos, percebe-se que os paradigmas vigentes já não conseguem resolver os

problemas sociais, sendo necessário repensar o próprio modo de entender a

sociedade. 98

As preocupações se voltam para as várias conseqüências e

incertezas que o desenvolvimento científico pode ocasionar no plano da Ética e

do Direito. 99

A ciência juntamente com a biomédica vem demonstrando

ser capaz de mudar a natureza humana, recriar o homem. Temas como

reprodução assistida, eugenia, fertilização in vitro, transferência de embriões,

experimentações com animais, fertilização interespécies, formas anômalas de

procriação (fusão celular, partenogênese e clonagem), interrupção de gravidez,

anencéfalos, embriões excedentes, entre outros também polêmicos e atuais da

Bioética, geram grandes dúvidas para a sociedade, necessitando-se de novos

elementos para delimitar a ação de médicos, pesquisadores, do homem, enfim,

em suas práticas cotidianas. 100

1.2 BIODIREITO

Face às inovações científicas, o ser humano deixou de ser

somente sujeito de direito e tornou-se objeto de manipulações. Restaram

98 VARELLA, Marcelo Dias; FONTES, Eliana e ROCHA, Fernando Galvão da. Biossegurança e Biodiversidade – Contexto Científico e Regulamentar. Belo Horizonte: Del Rey, 1999. p. 140.

99 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 122. 100 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 124.

Page 37: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

22

fragilizadas as antropologias que sempre serviram de parâmetro às preliminares

da ética e do Direito. 101

Desta forma, “todos esses aspectos nos remetem para as

relações que devem ser reavaliadas entre ciências, Estado e sociedade”,102 pois

as questões relativas à Bioética vêm eivadas de complexidade, haja vista

tratarem-se de questões científicas, filosóficas, econômicas e jurídicas, da qual a

interdisciplinaridade é notória.103

1.2.1 Conceito e aspectos relevantes

Em decorrência desse desenvolvimento biotecnológico

nasceu o Biodireito como o ramo do Direito que estuda, analisa e cria parâmetros

legais, acerca dos assuntos relacionados a Bioética, caracterizando-se como

sendo o elo de ligação entre esta e o Direito. 104

Partindo de uma conceituação didática, biodireito é:

“O ramo do Direito que trata, especificamente, das relações

jurídicas referentes à natureza jurídica do embrião, eutanásia,

aborto, transplante de órgãos e tecidos entre seres vivos ou

mortos, eugenia, genoma humano, manipulação e controle

genético, com o fundamento constitucional da dignidade da

pessoa humana (art.1°, III, da Constituição Federal)”. 105

Utilizando-se dos ensinamentos de Fernandes, pode-se

dizer:

101 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Biodireito. Ciência da vida, os novos desafios. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001. p. 104.

102 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 127. 103 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Biodireito. Ciência da vida, os novos desafios. p. 116.

104 SILVA, Reinaldo Pereira. Introdução ao Biodireito: investigações político-jurídicas sobre o estatuto da concepção humana. São Paulo: LTr, 2002. p. 12.

105 DireitoNet. Biodireito. Disponível em: http://www.direitonet.com.br/dicionario_juridico. Acessado: 03 de maio de 2007.

Page 38: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

23

“Na verdade, o biodireito nada mais é do que a produção

doutrinária, legislativa e judicial acerca das questões que

envolvem a bioética. Vai desde o direito a um meio-ambiente

sadio, passando pelas tecnologias reprodutivas, envolvendo a

autorização ou negação de clonagens e transplantes, até

questões mais corriqueiras e ainda mais inquietantes como a

dicotomia entre a garantia constitucional do direito á saúde, a falta

de leitos hospitalares e a equânime distribuição de saúde à

população”.106

Permanecendo num contexto jurídico, pode afirmar-se que:

“O Biodireito surge na esteira dos direitos fundamentais e, nesse

sentido, inseparável deles. O Biodireito contém os direitos morais

relacionados à vida, à dignidade e à privacidade dos indivíduos,

representando a passagem do discurso ético para a ordem

jurídica, não podendo, no entanto, representar “uma simples

formalização jurídica de princípios estabelecidos por um grupo de

sábios, ou mesmo proclamado por um legislador religioso ou

moral. O Biodireito pressupõe a elaboração de uma categoria

intermediária, que se materializa nos direitos humanos,

assegurando os seus fundamentos racionais e legitimadores”. 107

O Direito deve, intervir no campo das técnicas biomédicas,

quer seja para legitimá-las, quer seja para regulamentar ou proibir outras. Por isso

a lei é sempre invocada;

“não só porque as leis servem como “meios” perante as

finalidades que são os valores, mas e sobretudo porque sua

ocorrência é expressão inquestionável de segurança, de limites,

dos valores comuns da comunidade que sente necessidade de

sua determinação via normativa, como parâmetro de conduta

observável por todos. Porque o Direito procura organizar a

106 FERNANDES, Thyco Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do biodireito: aspectos do direito de família e do direito das sucessões. Florianópolis: Diploma Legal, 2000. p. 42.

107 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 288, apud, BARRETO, Vicente de Paulo. Bioética, biodireito e direitos humanos. In: MELLO, Celso de Albuquerque et al. Teoria dos direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 410.

Page 39: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

24

conduta de cada um no respeito e promoção dos valores que

servem de base à civilização”. 108

Convém ressaltar que o Direito, por si só, não desempenha

um papel totalmente viável, é necessário a legitimidade jurídica mediatizada pelo

debate com os cientistas. “O direito se constrói em relação as suas descobertas,

mas também a partir dos riscos que as novas técnicas criam para a condição

humana”. É da junção e cooperação destes dois mundos que se determinam

condutas, posturas e sanções a serem aplicadas por toda comunidade humana. 109

Cabe, então, ao Biodireito, estabelecer um liame entre

Direito e Bioética na observação dos princípios orientadores para preservação da

vida e o respeito do homem como pessoa. 110

1.2.2 Bioética, Biodireito e Humanismo Jurídico

No contexto atual, a lei se revela um instrumento maleável

para regular as questões relativas à Bioética. Conforme anteriormente já visto,

que ambas as disciplinas, Bioética e Biodireito, devem caminhar juntas. Isto, na

concepção de Santos pode-se auferir:

“É para que a lei possa interferir rapidamente, se ajustar às novas

conquistas tecnológicas e, sendo objeto de largo debate

parlamentar (...), vem imantada da legitimidade capaz de garantir

a validade de sua inserção no meio social concretizando o escopo

último de qualquer empreendimento do sujeito de Direito: o

resgate da dignidade humana”. 111 (grifou-se)

108 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Biodireito. Ciência da vida, os novos desafios. p. 104.

109 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Biodireito. Ciência da vida, os novos desafios. p. 118.

110 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 137 e 138. 111 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Biodireito. Ciência da vida, os novos desafios. p. 119.

Page 40: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

25

Outro aspecto de suma importância se relaciona com a

dignidade da pessoa humana, esta a qual, tem fundamento normativo na

Constituição da República Federativa do Brasil / 1988, conforme o seu art. 1º,

inciso III:

“Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união

indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal,

constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como

fundamentos:

(...)

III - a dignidade da pessoa humana;”112

Para Ingo Wolfgang Sarlet, a dignidade da pessoa humana

é:

“a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz

merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do

Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo

de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto

contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano,

como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas

para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua

participação ativa e co-responsável nos destinos da própria

existência e da vida em comunhão com os demais seres

humanos”. 113

Com o reconhecimento da importância à dignidade humana,

a bioética e o biodireito passam a ter um sentido humanista, estabelecendo um

liame com a justiça. Os direitos humanos, decorrentes da condição humana e das

necessidades fundamentais de toda pessoa, dizem respeito à preservação da

112 Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil (1988), Senado Federal, Brasília, 2007. A partir desse momento utilizar-se-á a sigla CRFB/88.

113 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Cosntituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 60.

115 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 19

Page 41: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

26

integridade e da dignidade dos seres humanos e à plena realização de sua

personalidade. 115

A bioética e o biodireito andam necessariamente juntos com os

direitos humanos, não podendo, por isso, obstinar-se em não ver

as tentativas da biologia molecular ou da biotecnociência de

manterem injustiças contra a pessoa humana sob a máscara

modernizante de que buscam o progresso científico em prol a

humanidade. Se em algum lugar houver qualquer ato que não

assegure a dignidade humana, ele deverá ser repudiado por

contrariar as exigências ético-jurídicas dos direitos humanos. 116

Assim sendo, “intervenções científicas sobre a pessoa

humana que possam atingir sua vida e a integridade físico-mental deverão

subordinar-se a preceitos éticos e não poderão contrariar os direitos humanos”.

As práticas médicas e científicas, que prometem trazer grandes benefícios à

humanidade, contêm riscos potenciais muito perigosos e imprevisíveis, e, por tal

razão, estes profissionais devem estar atentos para que não ultrapassem os

limites éticos impostos pelo respeito à pessoa humana e à sua vida, integridade e

dignidade. 117

Proteger a dignidade do homem é proteger a vida e o direito,

porquanto, “o direito à vida é o fundamento de todos os direitos. A ética da vida se

insere por essa via na universalidade dos valores. Quem diz dignidade humana

diz justiça”. 118

Todos os seres humanos, os aplicadores do direito e em

especial os biólogos, os médicos, os geneticistas e os bioeticistas devem manter

uma luta constante em favor do respeito à dignidade humana, sem acomodações

e com coragem, para que haja efetividade dos direitos humanos. “A consciência

destes é a maior conquista da humanidade, por ser o único caminho para uma era

de justiça, solidariedade e respeito pela liberdade e dignidade de todos”.

116 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 20. 117 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 19 e 20. 118 SILVA, Reinaldo Pereira. Introdução ao Biodireito: investigações político-jurídicas sobre o estatuto da concepção humana. p. 12.

Page 42: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

27

Assim, a bioética e o biodireito fazem parte desta conquista,

por serem instrumentos valiosos para a recuperação dos valores humanos. 119

Diante dos argumentos e explicações anteriores, seguir-se-á

ao segundo capítulo, o qual tem por objetivo estar fazendo reflexões acerca da

clonagem humana.

119 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 20; apud DALLARI, Dalmo de Abreu. Humanismo Jurídico, Juízes para a Democracia, 1998; Bioética e direitos humanos, in Iniciação à bioética, cit., p. 236-41.

Page 43: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

28

CAPÍTULO 2

CLONAGEM

2.1 ASPECTOS GERAIS

Tópico específico do Biodireito, a clonagem humana é um

dos temas que tem gerado diversas discussões e posicionamentos divergentes

em vários países.

Há quem diga, que a clonagem humana é um dos

instrumentos de ficção científica, meio de manipulação mental por parte dos

governos mundiais em uma população quase que totalmente leiga neste assunto,

condicionando comportamentos e atingindo objetivos contrários aos que a

clonagem pode oferecer.120

Outros, dizem que este além de ser o mais importante

avanço tecnológico e científico da atualidade, é resultado da própria evolução do

homem e de seu conhecimento, abrindo, desta forma, novos horizontes de

exploração, estudo e desenvolvimento; diriam outros que aproxima-se o final dos

tempos, quando o homem a “brincar de fazer pessoas” e ocupar o lugar de Deus,

desrespeitando todos os princípios religiosos, almejando criar uma humanidade

voltada ao consumo e as exigências de mercado, vendendo, comercializando e

criando pessoas como se fossem meros instrumentos inanimados.121

Sendo assim, convém iniciar-se um estudo referente a

clonagem, analisando seu conceito, questões históricas, formas, para que então,

havendo pleno entendimento sob estes aspectos, possa-se evoluir ao estudo da

utilização de embriões congelados na prática da clonagem humana, realizando,

por fim, sua análise ética e jurídica.

120 DIAFÉRIA, Adriana. Clonagem, aspectos jurídicos e bioéticos. p.139. 121 DIAFÉRIA, Adriana. Clonagem, aspectos jurídicos e bioéticos. p.139 e 140.

Page 44: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

29

2.2 DEFINIÇÃO

A palavra clone foi criada em 1903 pelo botânico Herbert J.

Webber enquanto pesquisava plantas no Departamento de Agricultura dos

Estados Unidos. Segundo Webber, o termo vem da palavra grega “Klón”, que

significa broto vegetal. É basicamente um conjunto de células, moléculas ou

organismos descendentes de uma célula e que são geneticamente idênticas a

célula original.122

Desta forma, a clonagem é um processo de reprodução

assexuada, na qual são obtidos indivíduos geneticamente iguais (microorganismo,

vegetal ou animal) a partir de célula-mãe.123 É um mecanismo comum de

propagação de espécies e plantas, bactérias e protozoários.

Quanto a definição de clonagem humana, pelo fato de

diversos grupos e organizações a conceituarem de forma diferente, a Associação

Médica Americana (AMA) criou uma definição específica, sendo, “(...) a produção

de organismos geneticamente idênticos através da transferência nuclear de

células somáticas”. 124

Pode ser definida, também, “como uma forma de reprodução

assexuada, na qual o objetivo principal é produzir seres idênticos, perpetuando

características genéticas desejáveis”. 125

Na visão brasileira, a Lei de Biossegurança126 conceitua

clonagem em seu artigo 3º, inciso VIII, como:

“Art. 3º. Para os efeitos desta Lei, considera-se:

122 LEITE, Leonardo. Clonagem. Rio de Janeiro, 2005. Disponível em: <http://www.ghente.org /temas/clonagem>. Acessado em 10 de abril de 2006.

123 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 442. 124 AMA. Cloning and Embryo Research. 1997. Disponível em: http://www.ama-assn.org/ama/pub/category/13564.html. Acessado em 02 de abril de 2006.

125 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. Rio de Janeiro: Editora Interciência, 2005. p. 21.

126 BRASIL. Lei nº. 11.105 de 24 de março de 2005. Brasília, 2005.

Page 45: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

30

(...)

VIII – clonagem: processo de reprodução assexuada, produzida

artificialmente, baseada em um único patrimônio genético, com ou

sem utilização de técnicas de engenharia genética”.

Sendo base deste estudo a atual lei de biossegurança,

utilizar-se-á este conceito em diante.

2.3 HISTÓRICO

Ao contrário do que possa parecer, as técnicas de clonagem

são utilizadas há muitos séculos pelos seres humanos. Sendo que as plantas

foram os primeiros seres clonados. Aliás, até hoje, utiliza-se muito a reprodução

assexuada para multiplicar plantas. 127

Em 1894, o zoólogo alemão Hans Dreisch trabalhando com

ouriços-do-mar pegou um embrião de duas células e sacudindo dentro de um

béquer cheio de água do mar fez com que as células se separassem, dando

origem a dois ouriços adultos.128

O embriologista Hans Spemman, em 1902, usou um fio de

cabelo de seu filho como uma faca para separar um embrião de salamandra,

também dando origem a dois indivíduos.129

Para a maioria dos doutrinadores, os primeiros resultados

positivos da clonagem em animais foram obtidos com sapos, em 1952. 130 Robert

Briggs e Thomas King, através da técnica de transferência nuclear de células

127 PEREIRA, Lygia V. O Admirável Mundo Novo da Clonagem - Bioética e Biorrisco: Abordagem Transdicisplinar / Silvio Valle, José Luiz Telles (organizadores). Rio de Janeiro: Interciência, 2003. p. 32.

128 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

129 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

130 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. 2005. p. 01.

Page 46: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

31

embrionárias, geraram sapos adultos, a partir de células de girinos, embriões de

sapo. 131

Segundo BONFIM, em 1962, J.B. Gurdon do Reino Unido,

utilizando de raios ultravioletas destruiu o núcleo de um óvulo de um tipo de sapo

originário da África do Sul, após, inseriu o núcleo de uma célula do intestino de

girinos e obteve girinos aparentemente normais, embora não tenham chegado à

fase adulta, o que, segundo o Prof. Dr. Francisco Jerônimo Salles Lara,

“talvez tenha ocorrido porque os raios ultravioleta podem ter

interferido na reserva de ácidos ribonucléicos maternos, que só há

poucos anos sabemos serem importantes. Pode ser também que

os núcleos usados para serem inseridos no óvulo desnucleado

não estivessem na fase certa do ciclo celular“.132

Por sua vez, em 1970 foram realizadas pesquisas em

embriões de ratos e, nove anos depois, com ovelhas. 133

Na década de 80, Peter Hoope (biólogo americano) e Karl

Illmensee (micro cirurgião suíço)134, desenvolveram um método para criar clones

diverso à transferência nuclear utilizada em sapos, a bipartição de embriões.

“Com este método, a partir de um embrião bovino ou de ovelha mecanicamente

dividido ao meio, são gerados de dois a quatro animais geneticamente

idênticos”.135

Entre os anos de 1981 a 1984, os embriologistas norte

americanos Davor Solter e McGrath após realizarem pesquisas e experiências

131 PEREIRA, Lygia V. O Admirável Mundo Novo da Clonagem - Bioética e Biorrisco: Abordagem Transdicisplinar / Silvio Valle, José Luiz Telles (organizadores). p. 32.

132 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 21. 133 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

134 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 21. 135 PEREIRA, Lygia V. O Admirável Mundo Novo da Clonagem - Bioética e Biorrisco: Abordagem Transdicisplinar / Silvio Valle, José Luiz Telles (organizadores). p. 33.

Page 47: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

32

visando clonar embriões de ratos, chegaram a conclusão que “a clonagem de

mamíferos via transferência de genes era “biologicamente impossível””. 136

No ano de 1990, ocorreu o primeiro grande sucesso de

Roslin Institute (Edimburgo, Escócia), a ovelha Tracy, transgênica de humanos.

“Tracy produz grande quantidade de ATT (alfa-I-antitripsina), substância usada

para o tratamento de enfisema e fibrose cística, porque recebeu um gene humano

que produz ATT”. 137

A expressão "clonagem humana" começou a ser divulgada

com maior intensidade em 1993, sendo que em 18 de outubro deste mesmo ano,

foi anunciada a clonagem de embriões humanos pelos cientistas e pesquisadores

norte-americanos, Jerry Hall e Robert Stillman (Universidade Católica de George

Washington, EUA).138 Segundo eles, a clonagem foi conseqüência da tentativa de

aumentar as possibilidades de fertilização in vitro.139

No ano de 1995, ocorreu a clonagem de duas ovelhas a

partir de células embrionárias de nove dias chamadas de "Megan" e "Morag", da

raça Welsh Moutain, obtidas por clonagem tradicional.140 Em seguida, 1996, a

equipe do cientista Ian Wilmut (Roslin Institute, Edimburgo, Escócia), anunciaram

o nascimento com êxito das ovelhas.141

O grande salto científico ocorreu em 23 de fevereiro de

1997, quando o Instituto Roslin, revelou ao mundo o primeiro clone de um

mamífero adulto. A ovelha Dolly tinha sete meses.142 Dolly, foi clone da raça Finn-

136 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 21. 137 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 21. 138 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 21. 139 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 28. 140 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

141 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 22. 142 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

Page 48: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

33

Dorset e sua clonagem foi de ultima geração, ou seja, utilizou-se óvulo

desnucleado de uma ovelha e núcleo de célula somática de outra ovelha. 143

A ovelha Dolly foi fruto de anos de intensa pesquisa,

buscando-se a diferenciação de uma célula, a qual fosse capaz de acessar todos

os seus genes, o seu genoma e ainda, chegar no resultado principal, produzir um

ser completo. 144

“Ela foi gerada pelo método de transferência nuclear com

pequenas modificações que fizeram o experimento funcionar m

mamíferos. Uma célula da mama de uma ovelha de seis anos foi

fundida a um óvulo vazio de outra ovelha – ou seja, um óvulo sem

material genético nenhum. O óvulo resultante dessa fusão

continha como única receita a ser seguida o genoma da célula da

mama, ou seja, o genoma da ovelha de seis anos. Cinco meses

depois, a ovelha “barriga de aluguel” para onde o embrião foi

transferido deu a luz à ovelha Dolly, um clone daquela ovelha

doadora da célula da mama”. 145

Ainda, em 24 de maio de 1997, os mesmos pesquisadores e

cientistas que apresentaram a ovelha Dolly, anunciam um novo clone de ovelha

que demonstra mais claramente como a técnica pode ser usada para beneficiar a

saúde humana.146 Polly tinha um gene humano, o que a fazia produzir uma

proteína usada no combate da fibrose cística, a proteína alfa-1-antitripsina. Polly

possui irmãs também programadas para fabricar fibrinogênio e proteína C

ativada.147

143 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 22. 144 PEREIRA, Lygia V. O Admirável Mundo Novo da Clonagem - Bioética e Biorrisco: Abordagem Transdicisplinar / Silvio Valle, José Luiz Telles (organizadores). p. 34.

145 PEREIRA, Lygia V. O Admirável Mundo Novo da Clonagem - Bioética e Biorrisco: Abordagem Transdicisplinar / Silvio Valle, José Luiz Telles (organizadores). p. 34.

146 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

147 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 22. “A finalidade da clonagem de ovelhas como Polly, portadora de material genético humano, é obter produtos de interesse terapêutico, tais como proteínas humanas do sangue e do leite. Polly recebeu um gene humano para produzir uma proteína que atua na coagulação do sangue. Ela deverá produzir leite contendo a proteína chamada fator 9, utilizada no transplante da hemofilia tipo B”. VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 31.

Page 49: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

34

O Comitê de Ética do governo dos Estados Unidos, em

junho de 1997,

“recomendou ao Congresso a adoção de leis que permitam que

alguns pesquisadores criem embriões que poderiam gerar clones

humanos, porém esses embriões não poderão ser implantados

em mulheres para se desenvolver”.148

O ano de 1998 foi de grandes mudanças e inovações para o

mundo científico bem como para a sociedade mundial. No primeiro semestre

pesquisadores japoneses apresentaram os primeiros clones de vacas adultas no

Japão e de Marguerite, a bezerra clonada dos franceses.149 Eles nasceram no

Instituto de Pesquisa do Gado de Ishikawa e comprovaram “que pelo caminho

teórico que originou Dolly consegue-se “fabricar”, inclusive, humanos”. 150

No início de janeiro, pesquisadores da Reprogenesis

(Boston – EUA) “anunciaram uma técnica para produzir próteses naturais de seios

a partir da multiplicação em laboratório de células extraídas do próprio corpo da

mulher”. O desígnio era eliminar a rejeição, fazendo com que as células

colocadas sobre um molde de plástico em formato de seio multiplicassem até

cobri-lo.151

Neste mesmo ano, no dia 22 de julho, foi anunciada a

realização da clonagem em série pela Universidade do Havaí, na qual,

experimentou-se clonar clones de clones de camundongos, originando três

gerações idênticas. 152

Um dia depois, as duas empresas que colaboraram na

criação de Dolly e dos ratos clonados no Havaí, a ProBio América e a PPL

148 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 30. 149 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

150 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 22. 151 VIEIRA, Teresa Rodrigues. Bioética e Direito. p. 31. 152 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

Page 50: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

35

Therapeutics, se juntaram para a criação de clones de porcos geneticamente

alterados, objetivando empregar seus órgãos em transplantes.153

Ainda, em novembro de 1998, a empresa americana

Advanced Cell Technology deixa em alerta a comunidade científica ao anunciar

que há dois anos já havia introduzido DNA humano em um óvulo de vaca sem

núcleo. 154

Contudo, além dos fatos mencionados, dois que ocorreram

em 1998 que de extrema relevância. Primeiro, quando os cientistas sul-coreanos

“anunciaram a clonagem de um embrião humano a partir de células adultas de

uma mulher. O embrião foi destruído”. Outro ocorreu quando James Thomson e

John Gearhart, cientistas norte-americanos, “isolaram as primeiras células-tronco

de um embrião humano em estágio bem inicial de desenvolvimento e assim

colocam na ordem do dia a clonagem terapêutica”.155

No ano seguinte, precisamente em 26 de abril de 1999,

americanos anunciaram o nascimento dos primeiros clones de cabras adultas

contendo um “gene humano para produção de uma proteína específica no

leite”.156

Em 1999, “cientistas norte-americanos anunciaram que

obtiveram um embrião humano via clonagem tipo Dolly”.157

Todavia, ao mesmo tempo que as inúmeras descobertas

começaram a apresentar seus resultados, os quais acionaram debates e geraram

preocupações à comunidade científica.

153 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 31. 154 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

155 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 22. 156 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

157 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 22.

Page 51: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

36

Na França, por exemplo, houve grandes discussões sobre

os efeitos da clonagem a curto e a médio prazo. Segundo eles “a longo prazo

ninguém se arrisca a fazer previsões”. 158

“Cientistas do Instituto Nacional de Pesquisa Agronômica da

França, tornaram público que uma vaca obtida por eles, via

clonagem tipo Dolly, aparentemente normal ao nascer, morreu de

anemia com apenas sete semanas de vida. A autópsia revelou

que o baço e os nódulos linfáticos não se desenvolveram

normalmente”. 159

Nesta mesma problemática, em 26 de maio de 1999, foi

publicada mundialmente a notícia sobre os sinais de envelhecimento precoce da

ovelha Dolly. 160

Mesmo com os resultados frustrantes em 1999,

pesquisadores persistiram nas pesquisas e, em 14 de março de 2000, americanos

apresentaram o nascimento de cinco porquinhos (Millie, Christa, Alexis, Carrel e

Dotccom) clones de porcas adultas. O principal objetivo focava-se na criação de

suínos capazes de fornecer órgãos para transplantes. 161

Além dos porcos, outros animais também foram foco de

pesquisas, entre eles está a Tetra, clone de um macaco Rhesus162 e a bezerra

Vitória163, um clone tradicional divulgado pelos pesquisadores da Empresa

Brasileira de Pesquisas Agropecuárias (Embrapa).164

158 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23. 159 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23. 160 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

161 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

162 O nascimento de Tetra foi divulgado por pesquisadores do Centro de Primatas de Bearveton, nos Estados Unidos da América.

163 “A bezerra Vitória coloca o Brasil na linha de frente da pesquisa de clonagem. Clone de um embrião, a vaca nasceu em um laboratório da Embrapa. Nenhum outro país em desenvolvimento havia feito tal avanço desde então”. LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/indexhistórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

164 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23.

Page 52: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

37

Com o deslumbre da possibilidade de clonar outros animais

e diante dos resultados que estavam ocorrendo, no ano de 2001 deu-se

prosseguimento a clonagem em macacos, vacas, ovelhas, cabras, porcos,

coelhos, ratos e outros animais. 165

Logo, estenderam-se as pesquisas para os animais em

extinção, nascendo em 08 de janeiro de 2001, um gauru (tipo de gado asiático),

porém, morreu dias depois. 166

No mês de agosto de 2001, a Academia Nacional de

Ciências dos EUA promoveu uma audiência com os três mais notórios defensores

da clonagem humana para fins reprodutivos, os médicos Panos Zavos, Severino

Antinori e a química Brigitte Boisselier, diretora da Clonaid. Neste mesmo dia,

afirmaram que o primeiro clone humano não demoraria muito a nascer. 167

Em setembro na Itália, ocorreu a primeira clonagem bem

sucedida de um animal em extinção, a ovelha mouflon (animal ameaçado de

extinção).168

A fim de comprovar a eficácia nas pesquisas realizadas, em

23 de novembro de 2001 foi anunciado em jornais de todo o mundo que clones

levavam uma vida normal.169 Cita-se:

“A revista Science publicou dados de uma pesquisa, anunciada

como a mais completa já realizada sobre saúde e comportamento

dos clones, que informa que 80% deles levam uma vida saudável

e se reproduzem normalmente. A pesquisa, realizada pela

Advanced Cell Tecnology (ACT) e coordenada por Robert Lanza,

analisou dados de 30 vacas clonadas, das quais 24 estão vivas e

saudáveis. A ACT produziu cerca de 500 embriões clonados, que

165 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23. 166 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

167 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

168 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

169 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23.

Page 53: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

38

foram implantados em 250 vacas, mas apenas 110 engravidaram.

Destas, 80 abortaram e 30 pariram 30 clones, dos quais 6

morreram logo após o nascimento”. 170

Esta mesma pesquisa foi apresentada em um simpósio

sobre o consumo de carne e leite de clones. Durante as discussões a empresa

Infligen informou que seus cento e dezessete clones de vacas estavam

aparentemente saudáveis.171 Todavia, deixou claro seu posicionamento sobre o

assunto ao dizer:

“os dados são interessantes, mas a tecnologia ainda é arriscada.

Verificando que 73% das gestações terminaram em aborto e 20%

dos clones morreram, vimos que a clonagem é improdutiva. Mais

importante, fica evidente que é criminoso clonar uma pessoa”. 172

Em contrapartida a citação anterior, em 25 de novembro de

2001, a empresa Advanced Cell Technology informou que produziria embriões

humanos a partir de clonagem. “A empresa diz que não tem intenção de usar a

técnica para fins reprodutivos e, sim, para cura de doenças”. Esta informação

desencadeou uma enorme polêmica no contexto mundial.173

O ano de 2002 trouxe muitos questionamentos e

preocupações científicas. Já no início do ano, em 04 de janeiro, foi anunciado o

envelhecimento precoce da ovelha Dolly pelo Instituto Roslin.174

Em fevereiro, a PPL Therapeutics (empresa fundada nos

EUA pelos criadores de Dolly) apresentou novos clones de porcos. Desta vez,

preocuparam-se em retirar um gene responsável pela rejeição de órgãos suínos

170 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23. 171 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23. 172 Revista O Globo. O Mundo / Ciência e vida. Clone leva uma vida normal, diz estudo. 23 de novembro de 2001, p. 33.

173 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

174 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

Page 54: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

39

quando transplantados para pessoas. “Um dia depois, a Universidade do

Missouri, diz ter obtido o mesmo avanço”.175

No dia 11 de fevereiro de 2002, estudo publicado na revista

“Nature Genetics” da Grã-Bretanha, afirma que animais clonados morrem mais

cedo que os concebidos naturalmente. Depois da informação que a ovelha Dolly

sofria de artrite (inflamação nas articulações) precoce, cientistas japoneses

clonaram doze ratos afim de analisar o seu ciclo de vida. Dez deles morreram

precocemente. De acordo com os pesquisadores os animais clonados

apresentaram as seguintes características: pneumonia severa, falência do fígado

e tumores, obesidade, disfunções imunológicas e problemas genéticos. Segundo

o cientista Atsuo Ogura, responsável pela pesquisa,

“o estudo ressalta as controvérsias da técnica de clonagem.

Oguro afirma que a técnica ainda não é dominada pela ciência e

não poderia ser aplicada em seres humanos. “Os possíveis efeitos

a longo prazo da clonagem, assim como a alta incidência de

abortos e nascimentos de animais clonados defeituosos, só

aumentam nossos receios em relação à clonagem humana para

fins reprodutivos”. 176

Em conformidade ao pensamento de Ogura, o bioeticista

Donald Bruce, do Projeto de tecnologia e Religião da Church of Scotland´s

175 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

176 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23; apud, OLIVEIRA, Fátima. Clonagem e manipulação da genética humana: mitos, realidade, perspectivas e delírios. O “estado da arte” da reprodução humana assistida em 2002. – Brasília: Ministério da Justiça, Secretaria de Estado dos Direitos da Mulher, 2002, p. 56.

Page 55: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

40

Society, “disse à BBC177 que o estudo japonês é um ótimo exemplo de como a

clonagem pode ser perigosa, caso aplicada em seres humanos”. 178

Ainda, em 14 de fevereiro de 2002, foi apresentado à mídia

o primeiro clone de animal de estimação, a gatinha Cc, pela Universidade A & M

do Texas. Ela nascera em dezembro de 2001, após 188 tentativas. 179. Em, 06 de

março de 2002, foi publicado no "Wall Street Journal" a reportagem em que a

pesquisadora chinesa Lu Guangxiu da Escola de Medicina de Xiangya, diz ter

produzido dezenas de embriões humanos por clonagem desde 1999. 180

Em conferência médica em Dubai, abril de 2002, Severino

Antinori diz, nos Emirados Árabes, que uma mulher estava na oitava semana de

gestação de um clone. Ante o anúncio, a empresa Clonaid diz já ter implantado no

útero de várias mulheres embriões produzidos a partir de clonagem. 181

No Brasil, em 11 de julho de 2002, foi realizado o primeiro

clone de um animal adulto, a bezerra Penta, sobrevivendo apenas cinco semanas

em decorrência de uma infecção generalizada.182

No mês de novembro de 2002, Severino Antinori anunciou

para janeiro de 2003 o nascimento de um clone humano.

177 “A BBC (British Broadcasting Corporation), é uma emissora pública de rádio e televisão do Reino Unido fundada em 1927. Possui excelente reputação nacional e internacional, sendo frequentemente considerada a mais respeitada estação de televisão do mundo. Por vezes é chamada afetuosamente pelos ingleses como Beeb, The Corporation ou Auntie. Durante muitos anos foi o único fornecedor de rádio e depois de televisão do Reino Unido. O seu lema é "Nation Shall Speak Peace Unto Nation". Antes era chamada de British Broadcasting Company Ltd., nome que permaneceu até 1927”. WIKIPÉDIA, Enciclopédia Livre. Embrião. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Embri%C3%A3o>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

178 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23; apud, OLIVEIRA, Fátima. Clonagem e manipulação da genética humana: mitos, realidade, perspectivas e delírios. O “estado da arte” da reprodução humana assistida em 2002. p. 56.

179 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

180 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

181 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.

182 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

Page 56: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

41

Por sua vez, fechando o ano de 2002, ocorreu no mês de

dezembro inúmeras divulgações. De forma sintetizada, foram destaque as

notícias: “EUA não sabem como agir em relação ao suposto bebê clonado”;

“Laboratório para clonagem humana no país seria barrado, afirma CTNBio”;

“Unesco pede proibição da clonagem humana reprodutiva”; “Coréia do Sul

investiga possível caso de clonagem humana”; “Conselho europeu pede

ratificação de acordo contra clones humanos”; “Governo sérvio proibe clonagem

humana como método de fertilização”; “Lista de espera para clonagem tem 2.000

pessoas, dizem raelianos”; “Primeiro clone humano "vai para casa" hoje, afirma

seita”; “Suposto clone humano gera discussão sobre ética médica”; “Suposta

clonagem humana recebe duras críticas”; “Casal brasileiro será submetido à

"clonagem" em 2003, diz seita”; “Estados Unidos investigam suposta clonagem

humana”; “Lei que proibirá clonagem irá ao Senado francês no início de 2003”;

“Site de laboratório aceita encomenda de "clone" por R$ 700 mil”; “Vaticano

chama nascimento de clone de "mentalidade brutal"”.183

Também foram notícias:“Mundo espera por provas de

nascimento do clone "Eva"”; “França pede apoio internacional contra clonagem

humana”; “Criança clonada será uma velha aos 30 anos, diz cientista russo”;

“Nasce o primeiro clone humano, diz movimento raeliano”; “Bush quer proibir

qualquer tipo de clonagem humana nos EUA”; “Anúncio de nascimento de clone

causa ceticismo entre cientistas”; “Raelianos esperam abrir laboratório de

clonagem no Brasil”; Geneticista francês acha improvável o nascimento do clone

humano”; “Cientistas alemães também duvidam do nascimento de bebê clonado”;

“Antinori duvida de nascimento de clone humano”; “Movimento raeliano anuncia

nascimento de outros bebês clonados”; “Para ONU, anúncio do nascimento de

clone não será aceito como fato”; “Clonagem reprodutiva divide comunidade

internacional”; “Unifesp inicia a elaboração do código de ética de manipulações

genéticas”; “Antinori: clone humano nascerá em um mês na Sérvia”; “Cientistas

usam clonagem para criar dente”; “Universidade de Stanford entra na era da

clonagem terapêutica”; “Senado belga vota lei autorizando a clonagem

terapêutica”; “Cientistas descobrem causa da pouca eficácia de óvulos 183 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.

Page 57: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

42

congelados”; “Rato e homem: genoma do roedor mostra grandes semelhanças”. 184

Dentre os citados, convém ressaltar o ocorrido em 27 de

dezembro, quando a empresa Clonaid, ligada à seita Movimento Raeliano,

anunciou o nascimento do primeiro clone humano, uma menina chamada Eva.

Outros clones dos raelianos teriam nascido depois disso, segundo a empresa.185

Morreu no dia 14 de fevereiro de 2003, a ovelha Dolly.

Veterinários deram à ovelha uma injeção letal, depois de descobrir sinais de uma

doença pulmonar progressiva. A necropsia revelou que Dolly teve câncer. 186

Em maio do mesmo ano, nasceu o primeiro clone de um

clone no Brasil, porém a experiência resultou sem êxito, a bezerra Vitória morreu

trinta e seis horas depois de seu nascimento, em uma fazenda da Embrapa, em

Brasília. Segundo veterinários, ela aspirou líquido na hora do parto e acabou

tendo pneumonia. 187

No dia 06 agosto de 2003, divulga-se a noticia da criação do

primeiro clone de um cavalo adulto. Segundo os cientistas italianos, Prometea,

nasceu com 36 quilos e muita saúde no dia 28 de maio, após uma gestação

normal. 188

Um mês depois, nasceu a bezerra Lenda, da Embrapa,

clone de uma vaca valiosa, que morrera meses antes. 189

184 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.

185 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

186 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

187 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

188 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.

189 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

Page 58: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

43

Com o intuito de regularizar as pesquisas científicas, no dia

11 de dezembro de 2003, a Câmara Baixa do Parlamento francês aprovou um

projeto de lei que tornou a clonagem reprodutiva humana um crime contra a

humanidade, suscetível de punição com trinta anos de prisão e multa de 7,5

milhões de euros. 190

Três dias depois, cientistas da Advanced Cell Technology

anunciam que conseguiram repetir a produção de embriões humanos por

clonagem alcançando o estágio de 16 células. 191

O ano de 2004, por sua vez não foi diferente. Em janeiro, o

especialista em fertilização Panos Zavos implantou um embrião humano

produzido por clonagem no útero de uma mulher, contudo, a experiência não

resultou em gravidez.192

Ainda em janeiro, após a morte da vaca Vitória, primeiro

clone do Brasil, nasceu, a bezerra Vitoriosa, sua cópia. Contudo, em 30 de maio

de 2004 faleceu de um ataque do coração.193

Em 12 de fevereiro de 2004, cientistas sul-coreanos

anunciaram a produção de uma “linhagem de células-tronco pluripotentes a partir

de dezenas de embriões produzidos a partir de clonagem”. 194

Seis dias depois, diante dos acontecimentos, Dom Elio

Sgreccia, afirmou que, "A clonagem tem um procedimento que vai contra a

natureza". Em declarações à imprensa, repetiu sua opinião ao dizer:

190 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

191 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.

192 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

193 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.

194 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

Page 59: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

44

"com relação à doutrina ética, a clonagem é um ilícito dos mais

graves no que se refere à reprodução humana, e consideramos a

clonagem chamada terapêutica igualmente ilícita". "É mais,

agregou, em alguns aspectos é pior, porque pressupõe a

reprodução de um embrião, em estado de blastócito avançado, e

em segundo lugar está a morte das células tronco". 195

Como de praxe, o mês de dezembro gerou grandes

discussões, haja vista a americana Genetic Savings & Clone apresentar o

primeiro clone de estimação feito por encomenda, o gato Little Nick, que custou

US$ 50 mil dólares. 196

Face aos acontecimentos no ano anterior, 2005 foi um ano

de relevância em dois aspectos: uma ciência voltada ao bem estar humano, e

uma ciência voltada ao ego humano, ou seja, de um lado houveram grandes

pesquisas e descobertas acerca das células-tronco e de outro lado vê-se o

superego humano ao clonar animais campões, de porte e estirpe.197

Prova disto, ocorreu em 26 de fevereiro de 2005 com o

nascimento de Pieraz-Cryozootech-Stallion, primeiro clone de um cavalo

campeão castrado. 198

Em maio de 2005, “cientistas da Universidade Nacional de

Seul anunciam a obtenção de várias linhagens de células-tronco, a partir de

195 NOTÍCIAS ECLECIASTES. “Dom Sgreccia: A clonagem tem um procedimento que vai contra a natureza”. Roma. 18 de fevereiro de 2004. Disponível em: <http://www.eclesiales.org/portugues/ arquivo/0402-3.htm>. Acessado em 10 de outubro de 2007.

196 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

197 JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO ONLINE. Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/ clippings/do _mes.php. Acessado em 09 de fevereiro de 2007.

198 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

Page 60: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

45

clonagem”; sendo apresentado o primeiro clone de um cão, em 03 de agosto de

2005, pelo grupo da Universidade Nacional de Seul.200

Enfim, também em dezembro de 2005, grandes foram as

repercussões de notícias voltadas às experiências de clonagem: “Pioneiro na

clonagem acusado de fraude está sob investigação”; “Fraude leva à demissão de

pioneiro da clonagem” e “Seul restringe entrada em laboratório de clonagem de

embriões”. 201

Aos doze dias do mês de janeiro de 2006, ocorreu o fato

mais excêntrico em comparação aos anos anteriores, ou seja, cientistas de

Taiwan criaram o primeiro porco totalmente fosforescente. Segundo os cientistas:

"Os nossos são os únicos no mundo verdes de dentro para fora.

Até o coração e os órgãos internos deles são verdes", afirmou Wu

Shinn-Chih, do Instituto e Departamento de Ciência e Tecnologia

Animal. (...) Os cientistas dizem ter injetado o DNA de águas-vivas

em cerca de 250 embriões de porcos, que foram implantados em

oito porcas. Quatro delas emprenharam”.202

A idéia objetiva estudar o combate a doenças humanas.

“Como o material dos porcos é verde, ele pode ser facilmente visto sem a

necessidade de operações invasivas”.203

Ante a incessante corrida cientifica, no mês de maio, no

Brasil, pesquisadores discutiram em Belo Horizonte sobre o código mundial de

200 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

201 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.

202 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.

203 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.

Page 61: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

46

conduta para cientistas. Além disso, a Unesco apresentou uma versão traduzida

da Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos. 204

Outro grande passo neste sentido, ocorreu em Genebra,

quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou uma nova série de

padrões para o registro de testes clínicos, visando buscar maior transparência em

testes com humanos. Para o diretor-geral-assistente da OMS, Timothy Evans,

"o objetivo principal de identificar padrões é aumentar a

transparência. Registro de todos os testes clínicos e a liberação

total da informação essencial, no momento do registro, são

fundamentais para garantir transparência na pesquisa médica e

cumprir as responsabilidades éticas para com pacientes e

participantes dos estudos".205

Em agosto de 2006, o Irã reporta a primeira clonagem

animal no país, um carneiro, que morreu minutos depois do nascimento. As

pesquisas realizadas fazem parte de um programa do Irã de se tornar um centro

regional para tecnologia médica, espacial e nuclear. Disse Morteza Hosseini,

membro da equipe de clonagem no Instituto Isfahan, "nós aprendemos muito

sobre clonagem durante o experimento. Isto nos deu mais esperanças para os

próximos casos". 206

Não obstante, o maior destaque ocorreu no dia 24 de agosto

de 2006, quando cientistas americanos conseguiram produzir duas linhagens de

células-tronco embrionárias sem causar a morte dos embriões utilizados.207

As notícias que se espalhavam mundialmente em dezembro

de 2006 demonstravam a concorrência, bem como, o avanço acelerado de alguns

países na corrida pela “grande descoberta”. Deste mês, destacaram-se quatro

204 JORNAL DA CIÊNCIA apud Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/ clippings/ do_mes.php. Acessado em 09 de fevereiro de 2007.

205 GLOBO ONLINE. Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/clippings/do_mes.php. Acessado em 09 de fevereiro de 2007; apud, Estadao.com.br.

206 GLOBO ONLINE. Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/clippings/do_mes.php. Acessado em 09 de fevereiro de 2007; apud, Estadao.com.br.

207 GLOBO ON LINE. Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/clippings/do_mes.php. Acessado em 09 de fevereiro de 2007; apud, Folha Online.

Page 62: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

47

reportagens: “EUA declaram que consumo de produtos de animais clonados "é

seguro"; “Grupo de cientista condenado faz primeiro clone de cadela”; “Primeira

gata clonada do mundo tem filhotes”; “Parlamento australiano aprova clonagem

terapêutica”. 208

O ano de 2007, logo em janeiro, demonstra uma certa

maturidade por parte dos governantes em discutir e legislar sobre os assuntos

bioéticos e a persistência dos cientistas em dar continuidade aos avanços já

realizados. Neste mês, o jornal Korea Times informou a clonagem de um poodle,

pela equipe do professor Lee Byung-Chun do Instituto de Medicina Veterinária da

Universidade Nacional de Seul (SNU). Segundo o jornal, "o poodle é o quinto cão

clonado, mas se trata do primeiro desta raça, o que marca um novo avanço na

clonagem animal”. 209

Em fevereiro foram notícias: “Há 10 anos, Dolly, a ovelha

clonada, chegava às manchetes”; “Reino Unido vai autorizar doação de óvulos

para clonagem”; “Camundongos são clonados a partir de células da pele”;

“Comitê deve resistir a lobby de empresas, defende Sociedade de Bioética”;

“Brasil ganha política de desenvolvimento da biotecnologia”; e “Mulheres chinesas

procuram congelamento de óvulos”. 210

Prosseguindo, março de 2007 ficou caracterizado pela

ousadia dos sul-coreanos em voltarem a realizar pesquisas. Após, alguns anos de

fraudes descobertas, processos e asilos políticos, sul-coreanos poderão utilizar

novamente células-tronco embrionárias em seus estudos, para tentar recuperar o

prestígio perdido após o escândalo mundial gerado pela fraude de clonagem

cometida por um importante cientista do país.211

208 GLOBO ONLINE. Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/clippings/do_mes.php. Acessado em 09 de fevereiro de 2007; apud, Folha Online.

209 GLOBO ONLINE. Clippings. Disponível em: <http://www.ghente.org/clippings/do_mes.php> Acessado em 09 de fevereiro de 2007; apud, Ultimo Segundo.

210 FOLHA ONLINE apud Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/clippings/do_mes.php> Acessado em 05 de março de 2007.

211 FOLHA ONLINE apud Clippings. Disponível em: <http://www.ghente.org/clippings/do_ mes.php> Acessado em 05 de março de 2007.

Page 63: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

48

Ainda em março, a equipe da Universidade Nacional de

Seul, que já havia obtido o primeiro cão clonado, um afghan hound chamado

Snuppy, em 2005, apresentou dois lobos de uma espécie nativa e em extinção,

denominados de Snuwolf e Snuwolffy. Para a realização foram transferidos

duzentos e cinqüenta e um embriões reconstruídos para o útero de doze lobas,

que conseguiram gerar dois filhotes vivos.212

Contudo, a alegria dos sul-coreanos não perdurou por muito

tempo. Cerca de duas semanas após o anúncio dos clones lobos, a Universidade

Nacional de Seul afim de apurar as possíveis irregularidades na atuação dos

cientistas, abriu uma investigação. O comitê investigador da universidade,

acredita que houve uma possível manipulação de dados, assim como outras

atividades irregulares da equipe de Lee. Foi a manchete:

“(...) Lee fez parte da equipe do controverso Hwang Woo-souk,

que assegurou ter realizado a primeira clonagem de células-tronco

de embrião humano em 2004 --o que posteriormente se

demonstrou falso. O escândalo em nível mundial de Hwang foi o

motivo da proibição na Coréia do Sul da pesquisa com células-

tronco, embora, recentemente, o governo tenha permitido sua

retomada. (...) A Universidade Nacional de Seul informou que o

laboratório continuará aberto, porque já foram colhidas as

amostras de sangue dos lobos clonados e não existe risco de a

equipe de Lee ocultar provas”. 213

Além do vexame ocorrido, tiveram evidência em abril as

manchetes: “Príncipes conservarão células-tronco do cordão umbilical de sua filha

Sofia”; “Equipe sul-coreana errou mas não manipulou clonagem, diz painel”;

“Cerca de 50% dos casais aceitam doar embriões para pesquisa”; “Arcebispo de

São Paulo e músico "duelam" no debate sobre células-tronco”; “Ministério da

Saúde financia pesquisas com células-tronco”; “Supremo Tribunal Federal tenta

definir o início da vida”; “Reunido com católicos, Bush ataca pesquisa de células-

212 ESTADAO.COM.BR apud Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/clippings/ do_mes. php. Acessado em 05 de março de 2007; apud, Fonte: Estadao.com.br.

213 FOLHA ONLINE apud Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/clippings/do_mes.php> Acessado em 05 de março de 2007.

Page 64: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

49

tronco”; “Senado dos EUA aprova fundos para pesquisa com células-tronco”;

“Inglaterra restringirá fertilizações com mais de um embrião”. 214

Os meses de maio e junho de 2007 não revelam grandes

descobertas. Nesse período, cientistas e profissionais da saúde decidiram se

dedicar ao estudo das células-tronco, evolução dos cromossomos e genes ligados

as doenças.215

Enfim, há mais de cem anos o tema clonagem tem gerado

polêmicos debates, tanto de ordem científica como ética. Sobre a relevância do

assunto, escreve BONFIM:

“Toda a polêmica relacionada à clonagem humana deve-se ao

fato desta não ser compreendida apenas como uma nova

tecnologia, pois envolve questões relacionadas à nossa própria

humanidade, como conceitos de identidade, individualidade, o

significado da procriação e a moralidade da manipulação de vidas

humanas”.216

Neste sentido, seguem as sábias palavras de DIAFÉRIA:

“(...) se a ciência hoje é uma manifestação sociocultural, que

influencia nossa vida social, que modifica nossos sistemas de

valores, não é somente por causa das novas representações que

nos propõe à realidade, como a clonagem seus reflexos, mas,

principalmente porque gerou muitas práticas, técnicas e máquinas

que transformaram nossa maneira de viver. E se toda mudança

acarreta muitas conseqüências, em todos os níveis do

conhecimento e da existência humana, toda humanidade precisa

estar participando conscientemente desta nova etapa de sua

própria evolução”.217

Diante de tantos avanços científicos e tecnológicos, não se

pode permitir que a sociedade em si permaneça apenas como sujeito observador. 214 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

215 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.

216 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 20. 217 DIAFÉRRIA, Adriana. Clonagem, aspectos jurídicos e bioéticos. p.141.

Page 65: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

50

Ainda que se queira ou não participar de forma ativa nas pesquisas, é

extremamente importante que cada cidadão tenha pleno conhecimento destas

descobertas218.

2.4 CLONAGEM HUMANA E SUAS FORMAS

O nascimento da ovelha Dolly levou cientistas de várias

partes do mundo a refletir sobre a possibilidade de realizar a mesma técnica em

seres humanos. Especialistas em reprodução humana acreditaram que a

clonagem seria um método alternativo de reprodução assistida e desde então

divulgaram suas intenções em clonar embriões humanos. 219

Assim, “o que, antigamente, só víamos em filme de ficção

científica, da noite para o dia virou uma realidade mais próxima do que jamais

pudemos imaginar”. 220

Desde então, são considerados dois tipos de clonagem

humana, a clonagem reprodutiva e a clonagem terapêutica. Ambas utilizam

embriões humanos, mas apresentam técnicas e resultados diferenciados,

carecendo, portanto de análises diferentes, tanto do ponto de vista científico como

de benefícios e riscos. 221

2.4.1 Clonagem Reprodutiva

A clonagem para fins reprodutivos é pretendida para

produzir uma duplicidade de indivíduos preexistentes.222

218 DIAFÉRRIA, Adriana. Clonagem, aspectos jurídicos e bioéticos. p.141. 219 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 18. 220 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. 2000. p. 55. 221 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 20 222 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 25.

Page 66: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

51

Baseia-se na remoção do núcleo de um óvulo e substituição

por um outro núcleo de outra célula somática. Após a fusão, vai havendo a

diferenciação das células Após cinco dias de fecundação, o embrião agora com

200 a 250 células, forma um cisto chamado blastocisto. É nesta fase que ocorre a

implantação do embrião na cavidade uterina. O blastocisto apresenta as células

divididas em dois grupos: camada externa (trofoectoderma), que vai formar a

placenta e o saco amniótico; e camada interna que dará origem aos tecidos do

feto. Após o período de gestação surge um indivíduo com patrimônio genético

idêntico ao do doador da célula somática.223 O ser obtido através desta técnica

possui as mesmas características genéticas do doador da célula clonada, sendo,

portanto, um clone, uma cópia do ser original.224 (Vide figura em anexo)

Acerca do procedimento, BONFIM descreve em sua obra o

seguinte exemplo:

“Para entendermos como tudo funcionaria, imagine que queiramos

recriar, clonar, um dos grandes gênios da ciência, o físico alemão

Albert Einstein (1789 – 1955). Primeiramente, seria necessário

obter uma célula de Einstein, contendo o material genético, ou

seja, o DNA. Então, o núcleo dessa célula seria retirado e

transplantado para um óvulo cujo núcleo tinha sido retirado

previamente. Em seguida, essa célula-ovo seria implantada no

útero de uma mulher para o prosseguimento da gestação. Ao

nascer, esse bebê seria um clone, isto é, possuiria o mesmo DNA,

as mesmas características genéticas do Albert Einstein”. 225

Todavia, é importante que se saiba que um clone não é uma

cópia literal do seu original. Além das diferenças físicas que podem aparecer,

dificilmente terão as mesmas características psicológicas. Isto, porque as

características não são determinadas por fatores genéticos, mas estão

223 ZATZ, Mayana. Clonagem e células tronco, 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br>. Acessado em 11 de abril de 2006.

224 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 07. 225 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 25.

Page 67: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

52

diretamente relacionadas ao momento histórico e as questões ambientais em que

o individuo encontra-se situado. 226

2.4.1.1 Justificativas para a prática da clonagem reprodutiva

Com o intuito de promover as pesquisas e realizar a

clonagem reprodutiva, são basicamente oito as justificativas e razões

apresentadas.

Primeiramente, pode-se citar o “desejo de uma pessoa em

perpetuar-se a si mesma por transferência de núcleo de célula somática ou

diferenciada, pois o clone seria uma cópia idêntica do adulto que cedeu o

DNA”.227 Ou, ainda, utilizar a clonagem para promover cópia de alguns indivíduos

e raças em detrimento de outras.228

A segunda justificativa, segunda Maria Helena Diniz, é “a

vontade de reproduzir um ser querido já falecido, ou em vias de falecer”. Todavia,

conforme a própria autora escreve, transferir o núcleo de uma de suas células,

“recuperando-o”, não traria de volta o filho ao pai, pois o clone não vai herdar os

caracteres culturais e a personalidade de sua matriz. 229

Outra justificativa é a

226 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 25. Pessini e Barchifontaine “sustentam que pode ser teoricamente possível reproduzir um indivíduo geneticamente idêntico ao doador, sendo certo que este indivíduo não terá as mesmas características. Embora geneticamente idênticas duas pessoas jamais seriam inteiramente idênticas física e psicologicamente, pois as características observáveis de um indivíduo dependem da inteiração de seus genes com o ambiente. Genótipo não é o mesmo que fenótipo (carga genética herdada) e o ambiente em que vive). O ambiente pode auxiliar na determinação de algumas características físicas. Assim, um gêmeo ou um clone podem ter genes alterados por mutações produzidas pelo ambiente”. VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Biodireito. p. 29, apud Leo Pessini e Christian de Paul de Barchifontaine. Fundamentos da Bioética. P. 126.

227 Permitir a clonagem por meio desta justificativa, significa incentivar egos vaidosos e permitir devaneios de perpetuação. Exemplo prático ocorreu quando Saddam Hussein resolveu criar um sócia de si próprio. Segundo cientistas, o ditador ficou frustrado ao saber que o clone seria apenas uma cópia física sua, mas não emocional ou intelectual. DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 446, apud MARTHA, Marco Antonio Bandeira. Clonar é legal? Bioética, p. 280.

228 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 30. 229 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 448.

Page 68: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

53

“pretensão de repetir o genótipo de pessoas valorizadas ou que

alcançaram sucesso em qualquer área, como o de um artista, de

um esportista, de um religioso, de um filósofo, de um estadista, de

um cientista ou de um jurista”.230

Nesse ponto, surgem dois questionamentos, um referente a

subordinação do clone ao estilo de vida, a personalidade que construirá ao longo

de sua vida, sua interação com o meio ambiente e com as pessoas; e o outro diz

respeito a criação de um banco de células de celebridades.231

O quarto motivo para a prática da clonagem reprodutiva é “a

obtenção de um clone humano descerebrado como repositório de tecidos ou

órgãos a serem utilizados em transplantes para seu modelo ou para outrem”. 232

Em quinto, está a justificativa:

“A transferência de núcleo para evitar uma moléstia hereditária

transmitida por via materna, fazendo-se um clone do marido ou de

outra pessoa, por exemplo, usando o óvulo desnucleado da

mulher, que, então, teria seu próprio filho, sem a informação

citoplasmática e, conseqüentemente, sem problemas congênitos.

Com isso a reprodução com clones poderia pôr fim às doenças

degenerativas ou genéticas”. 233

Ainda, há quem afirme que a clonagem humana será um

meio para garantir a gravidez. Segundo Maria Helena Diniz,

230 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 448. Vide nota de rodapé 205. 231 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 449. 232 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 449. Sobre o assunto, entende VIEIRA que “a clonagem humana com intuito de montar banco de células utilizáveis na medicina vai contra o principio ético da dignidade humana, elaborado pelo filósofo alemão Emmanuel Kant. Segundo tal princípio, um indivíduo nunca deve ser pensado como um meio, sempre como um fim, o que não ocorreria quando se criasse a vida humana apenas para armazenar material terapêutico”. VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 31.

233 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 449. Segundo BONFIM, a justificativa de evitar a ocorrência de doenças genéticas, ocorreria “em casos em que casais, por serem portadores de um mesmo gene causador de uma doença específica, e que, por isso, correm o risco de gerar crianças afetadas por doenças genéticas, também poderia-se utilizar a clonagem como um método de reprodução alternativo. Como na clonagem utiliza-se uma célula adulta como receita de formação de um novo ser, seria possível conhecer, através de testes genéticos preditivos, as características genéticas do indivíduo a ser clonado, o que evitaria e/ou reduziria o risco de geração de crianças afetadas por doenças de caráter genéticos”. BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 28.

Page 69: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

54

“(...), diante da dificuldade encontrada para obter, na reprodução

assistida, um embrião proveniente do casal, seria tentar cloná-lo

por meio de fissão gemelar, separando as células embrionárias

iniciais para transferir ao útero materno três ou quatro embriões

obtidos por clonação. Com isso haveria maior probabilidade de a

gestação vingar, dando lugar a um bebê ou a gêmeos univitelinos,

produzidos artificialmente”. 234

Em entrevista ao Jornal O Estado de São Paulo, o médico

Miltom Nakamura, apesar de declarar que não realizaria a clonagem por razões

éticas, afirmou que a técnica “pode ser proveitosa no processo de fertilização in

vitro quando a mulher fabrica apenas um ou dois óvulos, quantidade que reduz as

chances de engravidar”. Com a divisão dos embriões ter-se-ia o dobro de óvulos

produzidos por ela.235

A sétima justificativa consiste na realização da “produção

independente”. Aqui, a atuação sexual masculina estaria dispensada na

clonagem, haja vista a desnecessidade da participação do gameta masculino.

“Por outro lado, a obtenção de um ser humano sem conexão com a sexualidade

não seria uma afronta à dignidade humana?”. 236

Por fim, a oitava justificativa, segundo entende Maria Helena

Diniz, é a cura de algumas moléstias. Contudo, seria ético e jurídico usar o

embrião humano como meio de salvar outrem, “desrespeitando o princípio de que

o homem é um fim e não um meio e de que a vida e a dignidade humanas

constituem o limite para a experimentação científica?”. 237

Em 1994 a Comissão Nacional de Ética em Reprodução,

dos Estados Unidos, coletou várias justificativas para a clonagem de seres

234 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 449. Aplicar-se-ia a clonagem reprodutiva para casos de infertilidade. Assim, “a clonagem seria utilizada como um método alternativo, para permitir que casais que não tenham obtido sucesso através de outros métodos de reprodução assistida tenham filhos. Como exemplo, em casos em que o pai sofre de azoospermia, ou seja, não produz número suficiente de espermatozóides, este contribuiria com a doação da célula a ser clonada e a mãe participaria com os óvulos e com a gestação”. BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 28.

235 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 28. 236 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 449. 237 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 449.

Page 70: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

55

humanos, como a reprodução em casais inférteis, produção de embriões para

venda e para pesquisas de terapias gênicas. Alguns cientistas declaram que não

existe nada que impeça esta prática ou possa deter a curiosidade e o ímpeto

científico. 238

Todavia, estas justificativas suscitaram e ainda hoje

suscitam polêmicos e controversos debates acerca da utilização da clonagem

com tais finalidades.239

Conforme preceitua Louis-Marie Houdebine (diretor de

pesquisa agronômica no Instituto Nacional da França), “para dada experiência,

consiste em saber quais as precauções convém tomar antes de definir práticas

totalmente novas”, ou seja, deve-se realizar uma avaliação dos riscos.240

2.4.2 Clonagem Terapêutica

Diante das justificativas supra citadas, a clonagem para fins

reprodutivos é reprovada pela maioria dos cientistas e pela sociedade. Todavia,

existe uma grande preocupação no âmbito da comunidade científica com relação

à proibição do desenvolvimento das pesquisas em clonagem humana de forma

extrema, ou seja, proibir qualquer forma de clonagem. 241

Segundo Bonfim,

“Tal preocupação se justifica pelo fato de que proibir a clonagem

humana em geral significa proibir não somente a clonagem

reprodutiva, mas também as aplicações da técnica para o uso

238 DIAS, Edna Cardozo. Clonagem e Direito. 2007. Disponível em: <http://www.sosanimalmg.com.br>. Acessado em 21 de setembro de 2007. Doutora em Direito, profª. de Direito Ambiental, conselheira da ABMCJ/MG, membro do CONAMA (O Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA é o órgão consultivo e deliberativo do Sistema Nacional do Meio Ambiente-SISNAMA, foi instituído pela Lei 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, regulamentada pelo Decreto 99.274/90), membro da comissão de Meio Ambiente da OAB/MG.

239 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 28. 240 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 28. 241 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 39.

Page 71: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

56

terapêutico, para o entendimento dos processos de

desenvolvimento celular, entre outros”. 242

No o art. 3º, inciso IX, da Lei 11.105 de 24 de março de

2005, clonagem terapêutica é “clonagem com a finalidade de produção de

células-tronco embrionárias para a utilização de qualquer tecido de um

organismo”.243

Em outras palavras,

“A clonagem terapêutica é um procedimento cujos estágios iniciais

são idênticos a clonagem para fins reprodutivos, difere somente

no fato do embrião não ser introduzido em um útero. Ele é

utilizado em laboratório para a produção de células-tronco a fim de

produzirem tecidos ou órgãos para transplante. Esta técnica tem

como objetivo produzir uma cópia saudável do tecido ou do órgão

de uma pessoa doente para transplante”. 247

Para compreensão do procedimento, vide figura em anexo.

Por sua vez, as células-tronco são:

“(...) componentes do embrião em seu estágio inicial de

desenvolvimento, são células que possuem a capacidade de se

diferenciar em vários outros tipos celulares especializados. Além

disso, as células-tronco também se multiplicam por longos

períodos, mantendo suas características indiferenciadas. Isto

significa que as células-tronco somente se diferenciam em um tipo

242 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 39. 243 BRASIL. Lei nº. 11.105 de 24 de março de 2005. Brasília, 2005. 247 LEITE, Leonardo. Clonagem. Rio de Janeiro, 2005. Disponível em: <http://www.ghente.org /temas/clonagem>. Acessado em 10 de abril de 2006.

Page 72: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

57

celular se receberem uma “ordem” para tal. Caso contrário

mantêm-se indiferenciadas”. 248

As células-tronco são classificadas em dois tipos: células-

tronco embrionárias e células-tronco adultas. A classificação se dá de acordo com

a sua origem e pelo tempo de desenvolvimento das células.

De acordo com a classificação pelo origem, segue a citação:

“As células-tronco embrionárias são particularmente importantes

porque são multifuncionais, isto é, podem ser diferenciadas em

diferentes tipos de células. Podem ser utilizadas no intuito de

restaurar a função de um órgão ou tecido, transplantando novas

células para substituir as células perdidas pela doença, ou

substituir células que não funcionam adequadamente devido a um

defeito genético (ex.: doenças neurológicas, diabetes, problemas

cardíacos, derrames, lesões da coluna cervical e doenças

sangüíneas). As células-tronco adultas não possuem essa

capacidade de se transformar em qualquer tecido. As células

musculares vão originar células musculares, as células de fígado

vão originar células de fígado, e assim por diante”. (grifo ausente

no original).249

Analisando o tempo de desenvolvimento, classificam-se em

totipotentes e pluripotentes.

Células-tronco totipotentes são,

“(...) as células que compõem o embrião durante os primeiros

quatro dias após a fertilização, quando este divide-se em células

idênticas. Cada uma dessas células, se separadas, possuem a

capacidade de gerar um novo embrião individualmente, processo

que caracteriza a formação dos gêmeos univitelinos (...). Podem

originar qualquer tipo de tecido do organismo.250

Já as células-tronco pluripotentes,

248 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 39. 249 LEITE, Leonardo. Clonagem. Rio de Janeiro, 2005. Disponível em: <http://www.ghente.org /temas/clonagem>. Acessado em 10 de abril de 2006.

250 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 40.

Page 73: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

58

“(...) são as células dos embriões com mais de quatro dias, que

podem formar uma vasta gama de tecidos. Contudo, estas células

já não possuem a capacidade de, individualmente, gerar novos

embriões. Portanto, se forem separadas, não darão origem a

gêmeos univitelinos”.251

Assim, o grande objetivo a clonagem para fins terapêuticos

tem como principal objetivo a “regeneração de tecidos e órgãos lesionados em

decorrência de certas doenças, (...) através da utilização do potencial de células

especiais, primitivas, denominadas células-tronco”.252

2.4.2.1 Justificativas para a prática da clonagem terapêutica

As justificativas para a prática da clonagem terapêutica são

várias e diferentemente da clonagem reprodutiva que apresenta quase um

posicionamento majoritário, apresenta posições bem equilibradas.

O lado positivo desta técnica está no sentido de encontrar

cura para certas doenças, como, por exemplo, o mal de Alzheimer, Parkinson253,

diabetes, lesões medulares, problemas cardíacos, entre outras.254

Segundo VIEIRA, “os benefícios podem suplantar os riscos”.

Descreve a autora que,

“a técnica da clonagem poderá prestar bons serviços para a

humanidade, ampliando, por exemplo, a produtividade de animais

e oferecendo cura para várias moléstias. (...) Em se copiando

251 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 40. 252 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 39. 253 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 39. 254 A clonagem de embriões humanos com fins terapêuticos foi “admitida na Grã-Bretanha, operando-se mediante a remoção, por exemplo, de uma célula do corpo do paciente diabético para inserir o seu DNA no interior de uma célula-ovo desnucleada, que,então, se dividirá em células geneticamente idênticas às do doador, que, por sua vez, serão introduzidas naquele doente, sem qualquer risco de rejeição, restaurando sua saúde, por se transformarem em células do pâncreas produtoras de insulina”. DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 449 e 450.

Page 74: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

59

parte da medula espinhal, órgão responsável pela fabricação do

sangue, a réplica da medula introduzida no paciente poderá

purificar a circulação, exterminando o câncer. (...) A cópia de

células sadias da pele poderá auxiliar aqueles que sofreram

queimaduras. A clonagem de neurônios novos poderá colaborar

na recuperação da capacidade mental dos portadores do mal de

Alzheimer”. 255

Todavia, na mesma obra a autora apresenta uma colocação

negativa ao discordar da “realização de pesquisas que desvirtuem as

características essenciais dos animais”. Como o caso dos cientistas do Instituto

de Neurociências em La Jolla (Califórnia) que conseguiram fazer com que um

filhote de galo cantasse como uma codorna, transplantando o tronco cerebral e o

mesencéfalo da codorna para um embrião de galo de dois dias.256

Ainda, para os que enxergam esta clonagem como algo

negativo,

“afirmam ser inadmissível ética e juridicamente por usar embrião

humano como um meio para salvar outrem, desrespeitando o

princípio de que o homem é um fim e não um meio e de que a

vida e a dignidade humanas constituem o limite para a

experimentação científica”.257

Utilizar da clonagem com intuito terapêutico é revolucionário,

porém, está técnica esbarra em delicadas questões, como: “até que ponto se

pode dispor de embriões com objetivos terapêuticos? Afinal, os fins justificam os

meios?”258. “Após a coleta das células, o embrião seria descartado. Seria lícito

matar uma vida para salvar outra? Mas, afinal, quando começa mesmo a

vida?”.259

255 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 31. 256 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 32. 257 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 450. 258 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. 2005. p. 59. 259 LEITE, Leonardo. Clonagem. Rio de Janeiro, 2005. Disponível em: <http://www.ghente.org /temas/clonagem>. Acessado em 10 de abril de 2006.

Page 75: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

60

Dentro desta perspectiva de estudo, no intuito de melhor

compreender estas questões, é trabalhado no terceiro capítulo o sistema

normativo brasileiro, com especial destaque para a Lei de Biossegurança.

Page 76: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

61

CAPÍTULO 3

EMBRIÕES CONGELADOS, CLONAGEM HUMANA E A

NOVA LEI DE BIOSSEGURANÇA BRASILEIRA

3.1 EMBRIÕES

Os progressos e as inovações na medicina bem como na

ciência, particularmente na biotecnologia, contribuíram à transformação da família

tradicional e atingiram uma nova possibilidade de concepção humana.260

Essas novas tecnologias de intervenção sobre o processo

da procriação humana “gera graves problemas morais relativos ao respeito devido

ao ser humano desde sua concepção, à dignidade da pessoa e à transmissão da

vida”261

Desta forma, antes de adentrar-se propriamente nos

aspectos jurídicos é relevante ter conhecimento do que são embriões e suas

práticas de utilização.

3.1.1 Conceito

A palavra embrião de modo geral, é “o produto das primeiras

modificações do ovo262 que resultou da fecundação. Tanto nos animais como nas

plantas, que vai dar origem a um novo indivíduo”.263

260 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações Artificiais e o Direito. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1995. p. 11.

261 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações Artificiais e o Direito. p. 11. 262 “Do ponto de vista da biologia, Ovo é o mesmo que Zigoto. É uma célula que se forma após a fusão do núcleo do óvulo (pronúcleo feminino, haplóide) com o núcleo do espermatozóide (pronúcleo masculino, haplóide) por cariogamia, o que dá origem à célula diplóide denominada ovo ou zigoto”. WIKIPÉDIA, Enciclopédia Livre. Embrião. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Embri%C3%A3o>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

Page 77: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

62

Por sua vez, embrião humano é,

“o concepto quando está em sua fase de diferenciação orgânica,

da segunda à sétima semana depois da fecundação, etapa

conhecida como período embrionário. Origina-se do embrioblasto,

estrutura multicelular que, em conjunto com o trofoblasto e a

blastocele, constitui o blastocisto recém-implantado no

endométrio. O período embrionário termina na 8ª semana depois

da fecundação, quando o concepto passa a ser denominado de

feto”.264

Sob outra ótica, denomina-se “pré-embrião”,

“o produto resultante da união do óvulo e do espermatozóide, em

fertilização in vitro, até o momento em que se opera a fusão dos

dois pró-núcelos, ou seja, quando se evidencia a troca do material

genético. Ao produto celular resultante desse denominado

intercâmbio chama-se embrião”.265

Portanto, o termo embrião é usado para definir,

“(...) a fase de desenvolvimento embrionário que, seguindo a

anterior, assinala a origem e o incremento da organogênese266,

cuja duração corresponde a dois meses e meio. Outra expressão

que define esse estádio de desenvolvimento é “embrião pós-

implantatório”.267

263 WIKIPÉDIA, Enciclopédia Livre. Embrião. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Embri% C3%A3o>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

264 WIKIPÉDIA, Enciclopédia Livre. Embrião. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Embri% C3%A3o>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

265 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 125, apud BUERES, Alberto J. La voluntad jurídica y la fecundación extracorporal. In: Responsabilidad civil de los médicos. 2.ed., Tomo I, Buenos Aires: Hammurabi, 1994, p. 285.

266 “Após o estabelecimento das três camadas germinativas (ectoderme, mesoderme e endoderme), inicia-se o processo de subdivisão do embrião, em pequenos grupos celulares destinados a produzir órgãos ou parte deles. Qualquer órgão inicia seu desenvolvimento como um grupo celular segregado de outras células embrionárias. A esse processo dá-se o nome de organogênese”. MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 125, apud GARCIA, Sônia Maria Lauer; JECKEL NETO, Emílio; FERNÁNDEZ, Casimiro Garcia. Embriologia. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991. p, 125.

267 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 125.

Page 78: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

63

Todavia, BARBOSA aponta um problema terminológico na

utilização indiscriminada do vocábulo “embrião”. Para a autora, de acordo com a

Biologia, “antes da implantação, o óvulo fecundado chama-se “zigoto””. Ainda,

“O embrião é a entidade em desenvolvimento a partir da

implantação no útero, até oito semanas após a fecundação; a

partir da nona semana começa a ser denominado feto, tendo essa

designação até nascer. Portanto, a rigor até os primeiros quatorze

dias após a fertilização, temos o zigoto, denominado na legislação

espanhola “pré-embrião”, expressão que causa controvérsia por

induzir uma diminuição da condição humana da entidade em

desenvolvimento”. 268

Pode-se dizer, que o termo refere-se também,

“ao ser humano em seus primeiros estágios de desenvolvimento.

Não costuma ser usado senão a partir da metade da segunda

semana. O período embrionário estende-se até o fim da oitava

semana, quando os primórdios da maioria das principais

estruturas já se encontram presentes”.269

Nota-se que não há uma definição única, ou um consenso

sobre o mesmo, uma vez que cada autor conceitua embrião analisando o período

embrionário.

3.1.2 Embriões Congelados

Com a descoberta de novas possibilidades científicas e

médicas, tal como a inseminação artificial, o número de embrião congelados em

clínicas tem aumentado gradativamente.

O Jornal Nacional em umas de suas reportagens mostrou o

censo realizado pela Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida, a qual revela

268 BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.

269 MOORE, Keith L; PERSAUD, T.V.N. traduzido por VUGMAN, Fernando Simão. Embriologia Clínica. 5.ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A., 1997. p. 06.

Page 79: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

64

a existência de 9.914 embriões congelados nas quinze maiores clínicas de

reprodução brasileiras. Desses, 3.219 estão congelados há mais de três anos,

critério essencial para a utilização em pesquisas com células-tronco (CTs)

embrionárias aprovadas pela Lei de Biossegurança.270

Segundo Collucci,

“o número representa, no máximo, um décimo do estimado pelos

cientistas durante a tramitação da lei no Senado, em 2004. No ano

passado, eles previram contar com 30 mil embriões nessas

condições. Hoje, eles próprios admitem que o número foi

"chutado" por pesquisadores envolvidos nas pressões para que as

pesquisas fossem aprovadas no Congresso”.

[...]

"Não acho que era essa [30 mil] a expectativa real de toda a

comunidade científica. Sem dúvida, 3.000 é muito menos [do que

se imaginava], mas é um excelente começo", afirma a geneticista

Lygia da Veiga Pereira, do Centro de Estudos do Genoma

Humano, da USP de São Paulo”.271

No entendimento da ginecologista Maria do Carmo Borges,

presidente da Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida (SBRA), “ainda não

se sabe quantos dos embriões congelados há mais de três anos estariam

disponíveis para a pesquisa. Ainda é preciso que os progenitores desses

embriões formalizem a doação”.272

270 COLLUCCI, Cláudia. Total de embriões congelados no Brasil é um décimo do previsto, 2007. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u13158.shtml>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

271 COLLUCCI, Cláudia. Total de embriões congelados no Brasil é um décimo do previsto, 2007. Disponível em: < http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u13158.shtml>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

272 “Para fazer o levantamento, foram enviados questionários para 45 clínicas de reprodução filiadas à Rede Latino-Americana de Reprodução Assistida. Dessas, 15 responderam à solicitação.Apesar de a amostragem representar apenas 33% das centros de reprodução, a médica considera o número "bem próximo do real" porque, em geral, só as maiores clínicas congelam embriões. "É o único número oficial que existe. E [os dados] foram passados pelas maiores clínicas brasileiras."”. COLLUCCI, Cláudia. Total de embriões congelados no Brasil é um décimo do previsto, 2007. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/ ciencia/ult306u13158.shtml>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

Page 80: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

65

Juntas, as clínicas responsáveis por 90% dos procedimentos

realizados no Brasil informaram ter hoje 9.914 embriões guardados em

laboratório. 273

Acredita a geneticista Mayana Zatz que,

"Se realmente o número é tão pequeno, isso sugere que houve

muito mais descarte do que a gente imaginava. O que mostra a

importância da nossa briga quando a gente dizia que é muito

melhor destinar estes embriões para pesquisa do que descartá-

los".274

Os dados já foram informados à Anvisa, a Agência Nacional

de Vigilância Sanitária. Quase 90% dos embriões estão guardados no centro de

reprodução humana de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo. 275

"Nós seguimos as normas do Conselho Federal de Medicina

desde 1992. Os embriões excedentes aqui, ou seja, os não

utilizados para a medicina reprodutiva, como excessos, são

sempre crio preservados", explica Franco Júnior, presidente da

Rede Latino-americana de Reprodução Assistida.276

De acordo com as normas do Conselho Federal de

Medicina, para um embrião sair do laboratório onde foi produzido é necessária

uma autorização assinada pelo casal e registrada em cartório. Isto vale inclusive

para os embriões congelados que forem doados para a pesquisa. 277

273 Jornal Nacional. Embriões Congelados. 25.04.2005. Disponível em: <http://jornalnacional.globo. com/Jornalismo/JN/0,AA952090-3586,00.html>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

274 COLLUCCI, Cláudia. Total de embriões congelados no Brasil é um décimo do previsto, 2007. Disponível em: < http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u13158.shtml>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

275 Jornal Nacional. Embriões Congelados. 25.04.2005. Disponível em: <http://jornalnacional.globo. com/Jornalismo/JN/0,,AA952090-3586,00.html>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

276 Jornal Nacional. Embriões Congelados. 25.04.2005. Disponível em: <http://jornalnacional.globo. com/Jornalismo/JN/0,,AA952090-3586,00.html>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

277 COLLUCCI, Cláudia. Total de embriões congelados no Brasil é um décimo do previsto, 2007. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u13158.shtml>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

Page 81: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

66

3.1.2.1 Criopreservação de Embriões

A Criobiologia “é um ramo da criogenia, que estuda os

efeitos de baixas temperaturas em células, tecidos e organismos vivos”.278

Por sua vez, a criogenia,

“é um ramo da físico-química que estuda tecnologias para a

produção de temperatura as muito baixas (abaixo de −150°BC, de

−238°a ou de 123), principalmente até a temperatura de ebulição

do nitrogênio líquido ou ainda mais baixas, e o comportamento

dos elementos e materiais nessas temperaturas sendo que a

tecnologia usada explora os efeitos de transferência térmica entre

um agente e o meio. Esse ramo da ciência que é constantemente

associado com seu principal ramo, a crio biologia, que é o estudo

de baixas temperaturas em organismos”.279

No entendimento de outros doutrinadores, a criobiologia é “o

estudo dos processos de congelação de células e tecidos”. A criobiologia tem

permitido a preservação de células por tempo prolongado e mantém as

propriedades biológicas destas depois de descongeladas. A tecnologia

desenvolveu protocolos de congelação/descongelação eficientes que permitem

preservar células e tecidos a temperaturas até -196ºC usualmente sem afetar ou

com muito pouco efeito na sua estrutura e funcionalidade.280

Desta forma, uma vez apresentados os conceitos de

criobiologia e criogenia, tem-se que a criopreservação é “a estocagem de

qualquer material em temperaturas ultra baixas (freezer –80ºC ou nitrogênio

líquido –196ºC),”281 sendo que os laboratórios utilizam desta técnica quando há

278 WIKIPÉDIA, Enciclopédia Livre. Embrião. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/ wiki/criogenia>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

279 WIKIPÉDIA, Enciclopédia Livre. Embrião. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/ wiki/criogenia>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

280 CONCEPTUS. Criopreservação. Disponível em: <http://www.clinicaconceptus.com.br/ laboratorio/criopreservacao.html#embrioes>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

281 CRIOPRAXIS. Criopreservação de embriões. Disponível em: <http://www.cryopraxis.com.br /index.php>. Acessado em 15 de março de 2006 e em 04 de outubro de 2007. A preservação pelo congelamento se dá em nitrogênio líquido, e é o glicerol (substância crioprotetora) o responsável pelo não estilhaçamento do embrião. Além disto, a criopreservação tem como escopo possibilitar que os embriões sejam submetidos ao exame de biopsia, para que seja verificado se eles estão ou não vivos; além da já mencionada facilidade para novas tentativas.

Page 82: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

67

produção de mais embriões do que o necessário para a transferência. Apenas

aqueles de boa qualidade têm maior chance de sobrevivência.282

“Os embriões excedentes são colocados em uma solução especial

com uma substância chamada crioprotetor, que evita que os

embriões sejam danificados com o frio excessivo; são então

estocados em botijões de nitrogênio líquido, onde a temperatura

chega a 196º C negativos e podem permanecer por tempo

indeterminado”.283 (fotos em anexo)

Apesar dos embriões excedentes apresentarem uma

probabilidade de sobrevivência menor do que os embriões mantidos a fresco, esta

técnica oferece a vantagem de uma nova chance com menor custo. Os embriões

são descongelados vinte e quatro horas antes da transferência, cultivados e então

verificados quanto a sua viabilidade. 284

3.2 UTILIZAÇÃO DE EMBRIÕES CONGELADOS EM PRÁTICAS

REPRODUTIVAS

Ávidos por terem um filho "biológico", “os casais não têm

mais pensado na adoção como primeira possibilidade contra a sentença da

infertilidade”. 285

Entretanto, é importante que se saiba que,

“(...) as técnicas de fertilização in vitro são delicadas e com uma

margem de ineficácia considerável, a estimulação hormonal para

a hiperovulação é uma porta para a obtenção de vários embriões,

LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

282 CONCEPTUS. Criopreservação. Disponível em: <http://www.clinicaconceptus.com.br/ laboratorio/criopreservacao.html#embrioes>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

283 CRIOPRAXIS. Criopreservação de embriões. Disponível em: < http://www.cryopraxis.com. Br /index.php>. Acessado em 15 de março de 2006 e em 04 de outubro de 2007.

284 CONCEPTUS. Criopreservação. Disponível em: <http://www.clinicaconceptus.com.br/ laboratorio/criopreservacao.html#embrioes>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

285 LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

Page 83: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

68

que são a esperança de que, pelo menos em alguma tentativa, o

esperado filho chegará. Congelando os embriões que não foram

utilizados, o casal terá uma significativa redução de custos e a

própria mulher não terá de se expor novamente aos efeitos da

dosagem exagerada dos hormônios”. 286

Porém, conforme registra LIMA,

“Há, uma gritante necessidade de se restringir o número de

embriões fecundados em laboratório, compatibilizando o êxito da

procriação e a valorização da vida humana e impedindo a

"utilização" desses embriões "[...] como se fossem objetos de

consumo ou meros instrumentos a justificar o desejo dos casais

de terem filhos [...]."“.287

Por meio da criopreservação existem quatro alternativas

para os embriões congelados: utilização para técnicas reprodutivas (clonagem

terapêutica, reprodutiva; inseminação...), doação, utilização em pesquisas

científicas ou descarte.288

Para a sociedade patrimonialista não há problemas em se

“desperdiçar” embriões congelados, afinal, como a própria denominação a eles

dada, não passam de “embriões congelados”. 289

Outra questão que deve ser analisada é a manipulação

térmica, porquanto apenas "cerca de 75% dos embriões sobrevivem ao processo

de congelamento e descongelamento". 290

286 LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

287 LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007, apud FERREIRA, Fábio Alves. Vivendo sem respirar, morrendo sem chance de nascer. Jus Navegandi, Teresina, nov. 2002. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3544>. Acessado em: 08 mar. 2005.

288 FERREIRA, Fábio Alves. Vivendo sem respirar, morrendo sem chance de nascer. Jus Navegandi, Teresina, nov. 2002. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id= 3544>. Acessado em: 08 mar. 2005.

289 LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

290 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 22.

Page 84: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

69

Segundo LIMA,

“Como podem ser classificados os argumentos destinados a

convencer de que não há vida em um embrião até o 14º dia

(apenas um amontoado de células) e os que buscam dividir a vida

em "vida biológica" (antes da nidação) e "vida humana" (após a

mesma)? Vêm da mesma Ciência que remontou o surgimento do

Universo à explosão que deu origem às galáxias e aos seres vivos

em geral, tendo tudo começado por uma gigantesca quantidade

de energia e de matéria que, no entanto, nunca foram detectadas;

como se tivessem vindo do acaso”. 291

SILVA, no mesmo sentido escreve que,

“Não há diferença entre a vida contida em um embrião (ainda que

se trate de embrião congelado – criopreservado, excedentário,

laboratorial, supranumerário ou pré-implantatório, etc) e a que os

seres humanos adultos esbanjam, porque a vida é um processo

que se instaura com a concepção (ou germinação vegetal),

transforma-se, progride, mantendo sua identidade, até que muda

de qualidade, deixando, então, de ser vida para ser morte. Tudo

que interfere em prejuízo deste fluir espontâneo e incessante

contraria a vida."292

Entretanto, no entender de COLLUCCI,

“(...) qualquer que seja a decisão sempre haverá alguma espécie

de questionamento ou sofrimento. Caso os embriões sejam

mantidos congelados sem perspectiva breve de implantação, o

casal fica com a sensação de que um possível filho o aguarda nos

botijões de nitrogênio, a 196ºC, da clínica de reprodução. Se

autoriza a doação, fica pensando que pode ter um filho perdido

em algum lugar desse mundo e, se autoriza o descarte, fica com a

sensação de que “matou” um suposto filho. Assim, há o

sentimento de culpa por todos os lados”.293

291 LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

292 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 20.ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 196.

293 COLLUCCI, Cláudia. A clonagem terapêutica, 2005. Disponível em: <http://www1.folha.uol. com.br/folha>. Acessado em 13 de abril de 2006.

Page 85: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

70

Portanto, é fácil perceber que a questão de utilização de

embriões em técnicas científicas é totalmente complexa, uma vez que sofre

influência por aspectos legais, culturais, éticos e religiosos.294 Os que defendem a

clonagem terapêutica a partir dos embriões congelados, os enxergam apenas

como um emaranhado de centenas de células dentro de um tubo de ensaio.

Neste ponto de vista, acreditam que não faz sentido protegê-los em detrimento as

milhões de vidas que seriam salvas a partir das pesquisas com as células-

tronco.295 Vislumbram a possibilidade de grandes avanços no campo da

embriologia humana e da cura para inúmeras doenças crônicas.296

Ainda, nesta visão positiva, pesquisadores e cientistas

argumentam que,

“um embrião com cinco dias de desenvolvimento, constitui-

se apenas de um aglomerado de cerca de duzentas células

indiferenciadas que, quando concebido por meio de

reprodução natural e gerado no ventre de uma mulher,

possui somente 20% de chance de se implantar e se

desenvolver em uma criança. Advertem que a destruição de

embriões de cinco dias não pode ser entendida como a

destruição de fetos com mais de três meses, por

exemplo”.297

Todavia, a visão de embrião que tem um casal que passou

anos tentando uma gravidez, acompanhando o crescimento de cada óvulo,

esperando ansiosamente o processo de fertilização “in vitro”, vendo seus

embriões serem implantados no útero e, depois acompanhando o

desenvolvimento deles, é contraditória à anterior.298

294 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 59. 295 COLLUCCI, Cláudia. A clonagem terapêutica, 2005. Disponível em: <http://www1.folha.uol. com.br/folha>. Acessado em 13 de abril de 2006.

296 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 59. 297 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 60. 298 COLLUCCI, Cláudia. A clonagem terapêutica, 2005. Disponível em: <http://www1.folha.uol. com.br/folha>. Acessado em 13 de abril de 2006.

Page 86: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

71

Os que possuem essa opinião contrária à clonagem para

fins terapêuticos, acreditam que a vida começa no momento da fertilização, não

podendo o embrião ser entendido como um conjunto de células qualquer. Dessa

maneira, utilizar embriões significaria destruir vidas em potencial. 299

Apesar da questão não ser pacífica, a doutrina majoritária

visualiza o embrião como uma vida. Assim, Hélio Gomes “afirma ser o embrião,

humano, desde o momento da concepção até o parto”. 300

Eduardo de Oliveira Leite, utilizando-se das palavras de

Nilson Sant`Anna, descreve que:

“A vida humana irrompe e inicia sua estruturação somática no

exato momento da fecundação, antes, portanto de o ovo

implantar-se no útero. A nidificação garante, apenas, o

prosseguimento de um processo vital já em andamento,

decorrente de seu próprio poder energético, e a continuidade

evolutiva de uma complexa arquitetura citológica, cujas linhas

prévias lhe chegaram esboçadas no desenho das primeiras

divisões mitóticas”. 301

Também, Maria Dolores Vila-Coro afirma que:

“se biologicamente a fusão genética das células germinativas

masculina e feminina constitui a primeira célula do novo ser que

se forma, a proteção jurídica deve alcançar a fecundação extra-

uterina assim como se a fusão tivesse ocorrido no ventre

materno”. 302

299 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 60. 300 GOMES, Hélio. Medicina Legal. 13.ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1971. p. 439. 301 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações Artificiais e o Direito – aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos. São Paulo; Revista dos Tribunais, 1995. p. 386. apud SANT´ANNA, Nilson do Amaral. Contribuição Médico-Legal ao Estudo dos Contraceptivos. Tese apresentada à Faculdade de Direito da UFRJ. Rio de Janeiro, 1967. p. 108.

302 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 62; apud, VILA-CORO, Maria Dolores. Introducción a la biojurídica. Madrid: Servicio de publicaciones Facultad Derecho Universidad Complutense Madrid, 1995. p. 122.

Page 87: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

72

A partir do momento que considerar-se o embrião

congelado, mantido em laboratório como nascituro, nasce outro questionamento:

seria então aborto a eliminação de embriões mantidos em laboratório? Sem

pretensão de se ater a este questionamento, o que convém demonstrar a respeito

da destruição dos embriões humanos excedentes, é a inadiável revisão dos

conceitos de vida, gravidez, nascituro, técnicas laboratoriais, relacionados ao

crime de aborto. 303

3.3 CLONAGEM HUMANA E O DIREITO BRASILEIRO

As duas formas de clonagem, terapêutica e reprodutiva,

geram polêmicos e controversos debates. Os que defendem o uso da clonagem

como forma de reprodução, utilizam as seguintes razões como argumentos: casos

de infertilidade, evitar a ocorrência de doenças genéticas, “ressuscitar” filhos ou

parentes mortos e ainda, para replicar indivíduos de grande talento, inteligência

ou beleza. No que se convencionou chamar de clonagem para fins terapêuticos

se tem como principal objetivo a regeneração de tecidos e órgãos lesionados em

decorrência de doenças tais como: Parkinson, Alzheimer, Diabetes, lesões

musculares, problemas cardíacos, entre outros. 304

Todavia, diante de tantas dificuldades técnicas e de todos os

riscos existentes, a maioria dos cientistas afirmam que a manipulação genética

para fins reprodutivos não deve ser realizada, a começar pelo próprio Ian Wilmut,

criador da Dolly. Isto, em virtude de envolver complexas questões referentes a

própria humanidade, tais como, conceitos de reprodução, individualização,

relações de família e sociedade.305

303 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 62.

304 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 39. 305 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 37.

Page 88: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

73

Em 26 de fevereiro de 1997, preocupada com a extensão

atribuída ao conceito de nascituro, a Igreja Católica pediu que a prática de

clonagem em seres humanos fosse proibida, rejeitando qualquer meio de

concepção não natural. Os teólogos, em geral, da mesma forma não aceitam a

clonagem humana pelos seus métodos, finalidades e técnicas. 306

De acordo com o pensamento de Dom Lucas Moreira

Neves, expresso por VIEIRA,

“(...) nem tudo o que se torna possível cientificamente é moral e

legal. “É forte o risco de se deixar em mãos de homens o dom da

vida, que só a Deus pertence... Uma proeza cientifica deve ser

proporcional ao bem que faz à humanidade. Não deve medir-se

pelo simples capricho do cientista”.” 307

Sendo assim, afastando-se a possibilidade da realização da

clonagem reprodutiva, o que tem exaltado os ânimos da sociedade brasileira é a

possível permissão jurídica da clonagem terapêutica, realizada através de células-

tronco obtidas a partir de embriões congelados por mais de três anos em clínicas

de fertilização. Se por um lado o feito representa uma promessa da ciência para

curar doenças degenerativas e até para restaurar órgãos e tecidos avariados, por

outro, suscita profundos questionamentos éticos e religiosos nos que vêem nos

embriões uma forma primitiva de vida. 308

Conforme já explicado, as células-tronco embrionárias são

células que possuem o maior potencial de multiplicação e especialização.

Contudo, o grande dilema ético reside no fato de que para obtê-las há

necessidade de produção, utilização e destruição de embriões humanos.309

Sendo assim, o item a seguir trata especificadamente da

vida embrionária e sua proteção jurídica.

306 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 32 e 33. 307 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 33. 308 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 39. 309 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 34.

Page 89: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

74

3.3.1 A Vida Embrionária e sua Proteção Jurídica

Por se tratar de um assunto complexo, de cunho médico e

científico, convém que se faça um desdobramento de seu conteúdo, começando

pelos conceitos, posicionamento doutrinário, para que então se passe a analisá-lo

de forma jurídica.

3.3.1.1 Embrião e Nascituro

O Código Civil de 2002 em seu art. 2º dispõe que “(...) a

personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a

salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”.310

De Plácido e SILVA define o terno nascituro como, “derivado

do latim nasciturus, particípio passado de nasci, quer precisamente indicar aquele

que há de nascer”. 311

A noção de personalidade312 jurídica de acordo com o direito

privado clássico corresponde à titularidade. “Sob tal perspectiva, vinculada ao

310 BRASIL. Código Civil (2002). 5.ed. São Paulo: Editora Rideel, 2007. “O dispositivo não faz esclarecer (mesmo depois de tantos debates suscitados na vigência do Código Civil de 1916) sobre se o nascituro é sujeito de direitos ou se ali foram postos a salvo direitos sem sujeito (como defendem os natalistas), foi extremamente claro quanto a expressão desde a concepção”. LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

311 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 8.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1984.p. 150. 312 Embora haja correlação entre os termos personalidade e capacidade, estes não são iguais. A capacidade “é um conceito que se refere à dinâmica e admite graus, ausência parcial, limitações ou extensões”. A personalidade não, “já que é de existência elementar:existe ou não; se está com ela ou não. Falta sentido e razão em dizer que existe personalidade em um aspecto e não para outro. Não há termo médio. A personalidade investe o ser em si, enquanto a capacidade se tem para algo ou a respeito de algo. Se é pessoa e se tem capacidade. Esta é uma conseqüência da personalidade: a personalidade é prius e a capacidade um posterius. Se é pessoa porque se tem personalidade, logo, deve haver um mínimo de capacidade. Quando falta totalmente aquela, como tem condição de pressuposto, hão de faltar também a aptidão, os outros atributos, todos os direitos, a pessoa mesma”. BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/ reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.

Page 90: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

75

liberalismo do século XIX, entende-se como pessoa o sujeito de direitos, o titular

de direitos e obrigações, e o direito subjetivo como direito individual”.313

Segundo MEIRELLES,

“essa noção de pessoa, imposta como categoria pelo sistema

clássico de direito privado com a finalidade de estabelecer

parâmetros para a titularidade no comércio jurídico, é insuficiente

para atingir a realidade atual dos embriões humanos “excedentes”

de aplicações dos diversos métodos de reprodução humana

medicamente assistida”.314

Destaca-se que a própria palavra “pessoa” tem etimologia

incerta. No entanto, a interpretação tradicional,afirma que pessoa deriva de “per +

sonare: ressoar”.315

Para tornar possível uma prática científica de reprodução, é

necessário um número variado de embriões e, dentre esses, é imprevisível a

quantidade dos que apresentarão desenvolvimento inicial considerado suficiente

para posterior transferência ao útero.316

Portanto, conforme já foi mencionado, dentre os embriões

obtidos nem todos serão utilizados/transferidos, isto porque alguns não

apresentam sinais de desenvolvimento normal porque, muito embora em

condições normais de evolução, ultrapassam o limite máximo recomendável à

313 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 213.

314 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 213.

315Em Roma, persona era a máscara que cada ator de teatro usava durante a representação, a fim de que sua voz ou a da personagem fosse identificada. Munida de lâminas de metal, a máscara fazia com que a voz do ator ressoasse cristalinamente nos vastos anfiteatros. Com o tempo, o vocábulo persona passou a denominar o papel representado pelo ator; e como cada pessoa representa um papel nesta vida, o termo passou a designar o próprio homem. DJI – índice Fundamental do Direito. Personalidade. Disponível em: <http://www.dji.com.br/ civil/personalidade.htm>. Acessado em 04 de outubro de 2007.

316 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 213.

Page 91: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

76

transferência por ciclo, fixado para evitar gestação múltipla com risco de aborto,

parto precoce e outras complicações.317

Os embriões excedentes, ou seja, os não transferidos,

formam séria questão que assume contornos éticos, sociais e jurídicos. “Na

tentativa de evitar a sua sumária eliminação, alguns centros médicos preservam-

nos congelados para outras futuras transferências, ou para possibilitar pesquisas

e manipulação com os mais variados fins”. E todas essas atividades relacionadas

ao destino dos embriões humanos não encontram guarida no sistema clássico

estabelecido.318

“A ordem legislativa civil reconhece os seres humanos nascidos

como pessoas naturais, protegendo-lhes os direitos. Também põe

a salvo os interesses dos nascituros (concebidos no ventre

materno e em vias de se tornarem pessoas, ao nascerem com

vida). Por fim, assegura vantagens à chamada prole eventual, que

diz respeito aos seres humanos ainda não concebidos”.319

BARBOSA escreve que parece razoável, para fins do

presente,

“à semelhança do critério utilizado por pesquisador da matéria,

adotar-se o termo embrião englobando todas as fases do

desenvolvimento do zigoto, a partir da concepção, considerada

como a fertilização do óvulo pelo espermatozóide, até sua

implantação, momento que assinalará o início da gravidez.

Havendo fertilização in vitro, distingue-se, nestes termos, o

embrião do nascituro, entendendo-se esse último como o ser já

em gestação que, ao que se sabe até esta data, só pode ocorrer

no útero de uma mulher”.320

317 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 213 e 214.

318 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 214.

319 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 214.

320 BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.

Page 92: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

77

Assim, há quem defenda não serem os embriões

criopreservados ainda nascituro crendo que “somente após a implantação do

embrião, a chamada nidação no útero materno, iniciar-se-ia a gravidez ou

gestação propriamente dita e o embrião passaria a ser considerado nascituro”. 321

Ocorre que a presente realidade está afastada da tradição

que fundamentou a codificação civil brasileira, o avanço científico dos métodos de

reprodução humana artificial possibilitou a concepção extra-uterina e, por

intermédio dela, a existência de embriões in vitro, o que representa algo bem

distante da normatização atual.322

E, conforme escreve LIMA em seu artigo,

“se já não há consenso nem no âmbito jurídico nem no âmbito

científico sobre o que seria um embrião, o que se dizer do embrião

excedentário? Embora a sua fertilização tenha sido provocada

pela Ciência, a existência deste embrião já independe de qualquer

esforço humano. A Ciência só pôde facilitar a fusão do

espermatozóide e do óvulo, ela ainda não pode simular a

existência de um embrião em uma simples proveta e nem muito

menos dispensar a fusão daquelas células germinativas para a

sua obtenção.323

Para MEIRELLES,

“os embriões concebidos e mantidos em laboratório mostram-se

estranhos ao modelo clássico. Não são pessoas naturais, pois

inexistente o nascimento com vida; também não são pessoas a

nascer (nascituros), mas nem por isso é possível classificá-los

321 LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007, apud BARRETO, Wanderlei de Paula. Inovações sobre a personalidade jurídica e os direitos da personalidade no novo Código Civil brasileiro. DBJV – Mitteilungen, n. 2, fev. 2004. Disponível em: <http://www.dbjv.de/dbjv-high/mitteilungen/04-02/DBJV_Mitteilungen_02-2004.pdf>. Acessado em 08 mar. 2005.

322 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 214.

323 LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

Page 93: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

78

como prole eventual (a ser concebida), posto que concepção já

houve”.324

Todavia, uma vez considerados em si mesmos portadores

de vida, imprescindível, por conseguinte, afirmar a indubitável necessidade de sua

proteção jurídica específica, impondo-se, para tanto, distanciá-los das definições

estabelecida tradicionalmente pela legislação, bem como, sob o enfoque do

amparo, equipará-los aos demais seres humanos.325

Observa-se que alguns esforços doutrinários são feitos no

sentido de realizar uma interpretação extensiva dos dispositivos legais oriundos

do sistema clássico procurando adequar o embrião in vitro aos parâmetros

tradicionais.326

Porém, segundo MEIRELLES,

“tais tentativas mostram-se, de um lado, insuficientes para

alcançar as diversas dificuldades apresentadas no desenrolar

fático do tema; e, de outro, desnecessárias a salvaguardar a vida

e a dignidade humanas consubstanciadas nesses seres em etapa

inicial de desenvolvimento”.327

A insuficiência da interpretação extensiva é demonstrada

quando se pretende reconhecer a personalidade jurídica do embrião in vitro tal

qual o nascituro, titular de direitos.328

Contudo, dependendo do posicionamento adotado frente à

subjetividade jurídica do novo ser, “essa condição seria de eficácia suspensiva

324 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 214.

325 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 214.

326 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 215.

327 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 215.

328 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 216.

Page 94: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

79

(implantação no útero) ou resolutiva (não implantação); ou ainda, dúplice, ou seja,

suspensiva (nidação) e resolutiva (nascimento sem vida)”.329

“Desnecessário, portanto, caracterizar-se o embrião humano in

vitro como sujeito de direito, titular de direito subjetivo, com a

finalidade de protegê-lo. Aliás, tal caracterização consiste em

árdua tarefa, à medida que sua existência fática não corresponde

à realidade que informou as codificações do período clássico.

Ademais, agora sob uma perspectiva puramente biológica, é

preciso admitir-se que nem sempre o processo de

desenvolvimento pelo qual passa o zigoto resultante da união dos

gametas vem a resultar em um ser humano”.

[...]

“Também é preciso ter-se em mente que o juízo de existência e

de valor do ser humano e de sua necessária proteção não se

limita ao estatuto jurídico da pessoa”.330

O Direito confere ao nascituro a proteção jurídica, embora

não haja consenso quanto a sua natureza jurídica, alinhando-se algumas teses:

“desde as que consideram tratar-se de direitos em sujeito até as

que entendem que há no caso só meros estados de vinculação,

passando pela retroação da personalidade ao momento da

constituição do direito e, finalmente, pelas que sustentam haver

lugar entre a concepção e o nascimento a uma personalidade

parcial, reduzida, fraccionária”. 331

Ainda, segundo a MEIRELLES,

“o que informa a semelhança entre os seres nascidos e os

embriões concebidos e mantidos em laboratório é a sua natureza

comum e o que representam axiologicamente, e não a maior ou

329 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 216.

330 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 217.

331 BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.

Page 95: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

80

menor possibilidade de sua adequação à categoria abstrata da

personalidade jurídica”.332

A longa controvérsia doutrinária sobre a natureza jurídica do

embrião e do nascituro, ou seja, se há ou não personalidade, se é ou não

considerado pessoa, apresenta relevância jurídica, pois, como esclarece

ALMEIDA, “(...) a tomada da posição do jurista importa numerosas conseqüências

práticas, pois, quem afirma personalidade afirma direitos e obrigações (...)”. 333

Neste sentido, três grandes linhas de pensamento se

formaram:

“a) a que admite que a origem de toda pessoa humana e o termo

inicial do necessário amparo encontra-se na concepção; b) a que

reconhece diferenciada proteção, conforme as diversas fases de

desenvolvimento do novo ser que se forma (assim, somente a

partir do 6° dia após a concepção; ou depois da nidação do zigoto

ao útero; ou 14 dias após a concepção, quando se vislumbra o

início de formação do sistema nervoso central; ou após o 18° dia,

com a formação da placa neural; ou somente após a configuração

dos órgãos; ou confirmada a viabilidade do ser que se forma; ou

após a infusão da alma; ou se possível a re-identificação etc.) e c)

a que identifica no embrião uma pessoa humana potencial, com

autonomia a lhe assegurar um estatuto próprio”. 334

Em outra doutrina as teorias são:

“a) a natalista, que sustenta que a personalidade começa do

nascimento com vida; b) a da personalidade condicional ou

concepcionista imprópria, segundo a qual a personalidade começa

com a concepção, com a condição do nascimento com vida; c) a

332 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 217.

333 Registra a autora as diferentes teorias que no direito estrangeiro ora afirmam, ora negam, a personalidade do nascituro, demonstrando cabalmente a complexidade da matéria. ALMEIDA, Silmara J. A. Chinelato e. Tutela Civil do Nascituro. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 54.

334 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 218.

Page 96: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

81

concepcionista que considera que o início da personalidade se

verifica com a concepção”.335

Importa ressaltar que a diferenciação referente à evolução

embrionária, o grau de desenvolvimento atingido, impõe à sociedade outros

questionamentos, tais como o aborto, questões de filiação, direito sucessório,

entre outros.336

Desse modo, observa-se a importância de estabelecer o

entendimento de que o embrião tem vida337, mas só será pessoa humana em

dado momento sucessivo à concepção, ou de que o embrião representa, desde

logo, uma pessoa humana.338

“Quanto ao embrião mantido em laboratório, muito embora não

seja possível afirmar que sua eliminação caracterize abortamento,

porquanto esse vem a ser interrupção de gravidez, é preciso

admitir que, em hipótese tal, evidencia-se a ocorrência de

destruição de vida humana. E ao se eliminar um embrião in vitro,

está-se desrespeitando a vida que ali existe e que tem

possibilidade de desenvolver-se. Logo, a necessidade de se

respeitar o ser embrionário, desde o início do seu ciclo vital,

decorre, sobretudo, da extrema proximidade individual existente

entre ele e a pessoa humana que em breve poderá apresentar-se

plenamente desenvolvida”.339

A respeito da categoria vida, DINIZ descreve que, 335 BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.

336 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 218. A discussão se acirra na medida em que se multiplicam “as formas de agressão ao concebido, não limitadas ao aborto, mas estendidas ao embrionicídio não abortivo, à experimentação e manipulações genéticas com embriões e à produção de um número desnecessário de embriões para a fecundação assistida ou para finalidades estranhas à procriação: cosméticas, industriais ou de extração de tecidos para transplantes”. BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.

337 “Designa propriamente a força interna substancial, que anima, ou dá ação própria aos seres organizados, revelando o estado de atividade dos mesmos seres”. SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. p. 1.484.

338 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 218.

339 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 218.

Page 97: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

82

“os mais recentes dados da biologia têm confirmado nosso

posicionamento ao demonstrarem que, com a penetração do

óvulo pelo espermatozóide, surge uma nova vida, distinta da

daquelas que lhe deu origem, pois o embrião, a partir desse

momento, passa a ser titular de um patrimônio genético único”.340

Em outra visão, o embrião in vitro, é considerado pela

corrente genético-evolucionista como “simples material biológico humano, como

objeto digno no máximo de tratamento respeitoso, redutível a mera coisa do

mundo vegetal ou mineral”. 341

Todavia, todas estas polêmicas e discussões estarão para

chegar ao fim. Uma vez que o Supremo Tribunal Federal brasileiro está incumbido

de analisar e julgar “em que momento começa a vida de um ser humano”. em

razão de duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade que questionam

dispositivos da nova Lei de Biossegurança (Lei 11.105/05). 342

As duas ações (ADIN 3.510 e 3.526) foram propostas pelo

ex-procurador-geral da República, Claudio Fonteles. Na primeira, de maio de

2005, Fonteles questiona o Artigo 5º da Lei 11.105/05, que libera o uso de

células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por

fertilização in vitro, para fins de pesquisa e terapia, argumentando que “a vida

340 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 427. 341 “Essa confusão de designações desnatura aquilo que já foi dito por Kant: “o ser humano é digno, as coisas são úteis””. LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007, apud BARRETO, Wanderlei de Paula. Inovações sobre a personalidade jurídica e os direitos da personalidade no novo Código Civil brasileiro. DBJV – Mitteilungen, n. 2, fev. 2004. Disponível em: <http://www.dbjv.de/dbjv-high/mitteilungen/04-02/DBJV_Mitteilungen_02-2004.pdf>. Acessado em 08 mar. 2005.

342 ERDELYI, Maria Fernanda. O Começo da Vida. STF decidirá destino das pesquisas com células-tronco. Consultor Jurídico. 04 de julho de 2006. Brasília. Disponível em: <http://conjur. estadao.com.br/static/text/45959>. Acessado em 10 de outubro de 2007.

344 ERDELYI, Maria Fernanda. O Começo da Vida. STF decidirá destino das pesquisas com células-tronco. Consultor Jurídico. 04 de julho de 2006. Brasília. Disponível em: <http://conjur. estadao.com.br/static/text/45959>. Acessado em 10 de outubro de 2007.

Page 98: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

83

começa na fecundação e, por isso, a destruição de um embrião humano vai

contra o artigo 5º da CRFB/88, que garante a todos o direito à vida”. 344

Já na segunda ação, o ex-procurador-geral da República

contestava mais de vinte dispositivos da lei que “estabelecem normas de

segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos

geneticamente modificados, os OGMs, e seus derivados”. A ação tramita no

Supremo Tribunal Federal desde junho de 2005.345

Desta forma, percebe-se que o assunto divide opiniões e

levanta clamores basicamente em duas correntes. Aquela, que como o ex-

procurador-geral da República acredita que a permissão da pesquisa ofende o

direito a vida e, outra, que defende que o impedimento da pesquisas seria um

retrocesso científico a favor da própria vida.346

Contudo, uma vez considerado o fato de que todas as

pessoas humanas nascidas já foram embriões, logo, toda e qualquer prática

agressiva aos seres embrionários repercuti, por via de conseqüência, no homem

considerado em sua dignidade, razão da importância da discussão em foco. 347

3.3.1.2 Proteção Jurídica dos Embriões frente ao Princípio da Dignidade

Humana

Mantido o debate quanto ao início da existência da vida

humana, “parece razoável considerar que, independentemente da corrente que se

345 ERDELYI, Maria Fernanda. O Começo da Vida. STF decidirá destino das pesquisas com células-tronco. Consultor Jurídico. 04 de julho de 2006. Brasília. Disponível em: <http://conjur. estadao.com.br/static/text/45959>. Acessado em 10 de outubro de 2007.

346 ERDELYI, Maria Fernanda. O Começo da Vida. STF decidirá destino das pesquisas com células-tronco. Consultor Jurídico. 04 de julho de 2006. Brasília. Disponível em: <http://conjur. estadao.com.br/static/text/45959>. Acessado em 10 de outubro de 2007.

347 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 219

Page 99: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

84

adote, há concordância quanto ao valor que é inerente ao indivíduo pertencente à

espécie humana: a dignidade”.348

“Fruto de larga evolução, o reconhecimento do homem como

sujeito de dignidade é elemento fundante da ordem jurídica

brasileira atual. Dentre os alicerces do Estado Democrático de

Direito brasileiro, destacam-se a cidadania e a dignidade da

pessoa humana, havidas pela Constituição de 5 de outubro de

1988 como valores fundamentais a legitimar todo o ordenamento

jurídico, dando-lhe o suporte axiológico necessário a lhe conferir

harmonia e coerência”.349

O art. 1º da CRFB/88 menciona os princípios fundamentais,

dentre ele está o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana no inciso III.

“Art. 1. A República Federativa do Brasil, formada pela união

indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal,

constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como

fundamentos:

[...]

III - a dignidade da pessoa humana;[...]”351

Observa-se, pois, que a pessoa humana é o referencial do

sistema jurídico brasileiro, estabelecendo a CRFB/88 o direito à vida, garantindo-

lhe a inviolabilidade.352

“Art. 5. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer

natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros

residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à

348 BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.

349 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 219.

351 CRFB/88. 352 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 220.

Page 100: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

85

igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]”.353

Assim, tem-se que,

“Firmando-se a Constituição Federal sobre o valor da pessoa

humana, é de se afastar o convencimento de que a personalidade

é mera subjetividade, e que o ser humano é mero sujeito, cuja

qualificação está vinculada apenas à titularidade jurídica. A

pessoa humana é valor, e o seu reconhecimento como tal implica

pôr-se em relevo o respeito a todo ente humano”.354

Conforme explica MORAES, “o direito à vida é o mais

fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito à existência

e exercício de todos os demais direitos”.355

Desta maneira, para os que equiparam os embriões como

pessoas humanas nascidas, pela via da similitude, deve-se então aplicar-lhes o

princípio fundamental da dignidade humana e a proteção ao direito à vida. 356

E para garantir-lhes a almejada proteção jurídica, é

necessário que haja adequação das normas já existentes, no sentido de

assegurar respeito à dignidade e à vida dos seres embrionários.357

No Brasil, além dos preceitos constitucionais voltados a

garantir e preservar os direitos inerentes à vida e sua dignidade, das normas do

Conselho Federal de Medicina (relativa às normas éticas para a utilização das

353 CRFB/88. 354 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 219.

355 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 16.ed. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2004. p. 66.

356 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 219.

357 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 220.

Page 101: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

86

técnicas de reprodução assistida), a atual Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005)

reserva as células germinativas direitos próprios. 358

Necessário, portanto, interpretar tais normas

infraconstitucionais de acordo com os referidos fundamentos axiológicos que, a

partir da CRFB/88, norteiam todo o ordenamento jurídico.359

Se houver uma comparação entre embriões humanos e as

pessoas já nascidas, não há como afasta-los da valorização personalista que

emerge da CRFB/88. Assim, o respeito à dignidade e à vida da pessoa humana a

eles se estenderá, fazendo-se concluir que toda atividade abusiva que venha

atingir seres embrionários conflitará com o respeito à vida e à dignidade humanas

assegurado constitucionalmente. 360

Desta forma, a exploração comercial, a atribuição de preço

para o tráfico de embriões, a eugenia, o uso de seres embrionários em

cosmetologia, a “fabricação” de órgãos de embriões para futuros transplantes, a

utilização de embriões em pesquisas de natureza diversa à proteção de sua vida

e de sua saúde, e a eliminação pura e simples dos embriões “excedentes” aos

projetos científicos, chocam-se com a legislação.361

Ao se reconhecer nos seres embrionários natureza e valor

próprios da pessoa humana, “toda e qualquer atividade prejudicial ao seu

saudável desenvolvimento atinge o bem jurídico vida assegurado à sociedade”.362

O valor da pessoa humana que informa todo o ordenamento

estende-se, pelo caminho da similitude, a todos os seres

humanos, sejam nascidos, ou desenvolvendo-se no útero, ou

358 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 220.

359 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 222.

360 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 222.

361 BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.

362 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 223.

Page 102: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

87

mantidos em laboratório, e o reconhecimento desse valor dita os

limites jurídicos para as atividades biomédicas. A maior ou menor

viabilidade em se caracterizarem uns e outros como sujeitos de

direitos não implica diversificá-los na vida que representam e na

dignidade que lhes é essencial. Reconhecer esse dado significa

respeitar o ser humano em si mesmo, durante todo o seu

desenvolvimento, e para além dele próprio, nos seus

semelhantes.363

Sendo assim,

“O início da mais preciosa garantia individual deverá ser dado pelo

biólogo, cabendo ao jurista, tão-somente, dar-lhe o

enquadramento legal, pois do ponto de vista biológico a vida se

inicia com a fecundação do óvulo pelo espermatozóide, resultando

um ovo ou um zigoto. Assim a vida viável, portanto, começa com a

nidação, quando se inicia a gravidez”.364

Conforme adverte o biólogo Botella Lluziá,

“(...) o embrião ou o feto representa um ser individualizado, com

carga genética própria, que não se confunde nem com a do pai,

nem com a da mãe, sendo inexato afirmar que a vida do embrião

ou do feto está englobada pela vida da mãe”.365

Neste sentido, observa-se por fim, que a CRFB/88 proclama

o direito à vida, “cabendo ao Estado assegurá-lo em sua dupla acepção, sendo a

primeira relacionada ao direito de continuar vivo e a segunda de se ter vida digna

quanto à subsistência”. 366

Esclarecendo esta questão, BARBOSA adverte que,

“No momento, parece que o mais razoável, à luz do princípio da

dignidade da pessoa humana, seja conferir ao embrião humano

uma “tutela particular”, desvinculada dos conceitos existentes,

363 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 223.

364 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. p. 66. 365 BITTAR, Carlos Alberto. O direito de família e a Constituição de 1988. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 41.

366 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. p. 66.

Page 103: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

88

mas que impeça, de modo eficaz, sua instrumentalização, dando-

lhe, enfim, proteção jurídica condizente, se não com a condição de

indivíduo pertencente à espécie humana, com o respeito devido a

um ser que não pode ser coisificado”. 367

Cabe agora, esperar que o Supremo Tribunal Federal

brasileiro julgue as ADINs e crie novos parâmetros para o legislador, bem como, à

ciência, a quem como visto, cabe informar o momento efetivo do começo da vida.

3.3.2 Clonagem Humana, Direito e a Nova Lei de Biossegurança

Como demosntrado, o nascimento da ovelha Dolly, em 1997,

suscitou em governos de vários países a necessidade de discutir a questão da

continuidade ou não das pesquisas e experimentos em clonagem humana.368

Em face das grandes descobertas no processo de clonagem

animal, alguns pesquisadores aproveitaram o momento para anunciar suas

intenções de clonar seres humanos e, mesmo sendo a comunidade científica

contrária à realização deste tipo de clonagem para fins reprodutivos, os

defensores dessa técnica insistiram no prosseguimento dos experimentos. Isso,

acabou por gerar medo, desconfiança e insegurança com relação à palavra

“clonagem” de modo geral, independente de sua finalidade.369

Em 1998, cientistas isolaram pela primeira vez células-

tronco, “abrindo um campo promissor no desenvolvimento de novas terapias para

as doenças crônicas, porém com peso ético da destruição de embriões humanos

viáveis”.370

367 BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.

368 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 61. 369 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 61. 370 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 61.

Page 104: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

89

Em seguida, o anúncio do primeiro embrião clonado pela

empresa norte-americana Ad vanced Cell Technology (ACT) chocou cientistas,

religiosos e líderes mundiais. 371

Segundo os pesquisadores, “a experiência não era

destinada a produzir um clone humano, mas obter células-tronco para a cura de

doenças tidas até o momento como incuráveis”.372

Por coincidência, o anúncio da experiência da empresa ACT

ocorreu dias após juristas e cientistas brasileiros e estrangeiros reunirem-se no

auditório do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para o seminário internacional

“Clonagem Humana: questões jurídicas”, evento promovido pelo Conselho de

Justiça Federal (CJF). A íntegra de todas as conferências realizadas foi enviada

pelo presidente do STJ e CJF, aos presidentes da Câmara dos Deputados e do

Senado, com o objetivo de subsidiar o Congresso de informações necessárias

para elaboração de lei que aborde a clonagem humana no Brasil. 373

A propósito, em 1995, o Brasil deu um passo significativo ao

editar sua primeira Lei de Biossegurança (Lei nº 8.974, sancionada em 5 de

371 AMARAL, Luciana. Clonagem Humana. Os Limites Éticos da Intervenção Sobre o Ser Humano - Reportagem. In: REVISTA JURÍDICA CONSULEX, Brasília – DF: Editora Consulex, ano V, nº113, 30 de setembro, 2001, p.20.

372 A pesquisa recebeu críticas até mesmo da comunidade científica. Afinal, os responsáveis, José Cibelli, Robert Lanza e Michael West, não conseguiram produzir uma célula-tronco sequer. Dos dezenove óvulos utilizados, apenas três sobreviveram, e somente um dividiu-se em até seis células, morrendo em seguida. Para que o experimento fosse bem sucedido, a ACT teria que ter produzido, ao menos, um blastócito, um aglomerado de mais de cem células que incluiriam até mesmo aquelas capazes de dar origem a tecidos no organismo. Além disso, o feito da empresa norte-americana não foi publicado no circuito normal de publicações científicas, como ocorre com as pesquisas sérias, mas na revista US News & World Report – destinada ao público em geral – no site da revista Scientific American e na desconhecida publicação online e-biomed: The Journal of Regenerative Medicine. Tendo conhecimento do fato, o cientista escocês Ian Wilmut (famoso pela experiência com a ovelha Dolly) garantiu que “mesmo que o núcleo de um óvulo não-fertilizado seja tirado e lhe sejam proporcionadas as condições adequadas, esse óvulo ainda vai se desenvolver até resultar em seis células, sem que para isso seja necessário acrescentar o núcleo de outra células adulta”. AMARAL, Luciana. Clonagem Humana. Os Limites Éticos da Intervenção Sobre o Ser Humano - Reportagem. In: REVISTA JURÍDICA CONSULEX, Brasília – DF: Editora Consulex, ano V, nº113, 30 de setembro, 2001, p.20.

373 AMARAL, Luciana. Clonagem Humana. Os Limites Éticos da Intervenção Sobre o Ser Humano - Reportagem. In: REVISTA JURÍDICA CONSULEX, Brasília – DF: Editora Consulex, ano V, nº113, 30 de setembro, 2001, p.20.

Page 105: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

90

janeiro de 1995 junto com o Decreto nº 1.752), de cujo projeto foi autor o Senador

e Vice-Presidente Marco Maciel. 374

Em um de seus discursos, MACIEL afirmou que a lei de sua

autoria já encontrava-se defasada, mas que,

“Foi o primeiro esforço brasileiro no sentido de disciplinar, sob o

ponto de vista jurídico, esta momentosa questão. Obviamente, em

face ao progresso da Ciência, sobretudo da Engenharia Genética,

é preciso adequar os instrumentos legais”.375

Falando sobre está questão, o Ministro Nilson Naves,

Presidente do Superior Tribunal de Justiça, em seu artigo “Bioética e Justiça”

escreveu:

“Concordo plenamente, pois a atual legislação brasileira cerceia,

em certa medida, as possibilidades de trabalho dos laboratórios e

pesquisadores nacionais, ao passo que a pesquisa continua, sem

entraves e com muito mais recursos financeiros, em vários países

industrializados. A meu juízo, esse é um assunto que o Brasil

deveria reexaminar, por dois motivos: o primeiro refere-se ao fato

de que os progressos de caráter benéfico realizados em outros

países não desaparecerão; ao contrário, serão incorporados ao

conhecimento humano e poderão servir de base para novos

avanços; o segundo motivo tem a ver, como assinalou Tereza

Rodrigues Vieira, com a impossibilidade de se determinarem, a

priori e com absoluta garantia de acerto, os limites que a ciência

deve observar”.376

No outro ano, 1996, fui publicada a Lei de Patentes (Lei nº

9.279 de 1996), a qual dispôs em seu art. 18, inciso III que:

374 NAVES, Nilson. Bioética e Justiça. Sexto Congresso Mundial de Bioética, Brasília, 2002. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/Discursos/0000361/Bio%C3%A9tica-30-10-2002.doc>. Acessado em 09 de outubro de 2007.

375 AMARAL, Luciana. Clonagem Humana. Os Limites Éticos da Intervenção Sobre o Ser Humano - Reportagem. In: REVISTA JURÍDICA CONSULEX, Brasília – DF: Editora Consulex, ano V, nº113, 30 de setembro, 2001, p.20.

376 NAVES, Nilson. Bioética e Justiça. Sexto Congresso Mundial de Bioética, Brasília, 2002. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/Discursos/0000361/Bio%C3%A9tica-30-10-2002.doc>. Acessado em 09 de outubro de 2007.

Page 106: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

91

“Art. 18. Não são patenteáveis:

[...]

III – o todo ou parte de seres vivos, exceto os microorganismos

transgênicos que atendam aos três requisitos de patenteabilidade

– novidade, atividade inventiva e aplicação industrial – previstos

no art. 8º e que não sejam mera descoberta”.377

A CTNBio, subordinada ao Ministério da Ciência e

Tecnologia, diante da ausência, até aquele momento, de norma explícita sobre a

clonagem, definiu em 07 de março de 1997, “que a lei brasileira proíbe a

manipulação de células germinativas humanas criadas em laboratório”.378

Em 11 de novembro desse mesmo ano, a UNESCO

(Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura), com o

intuito de fixar normas sobre assuntos ligados a biotecnologia que estavam

causando preocupação mundial, aprovou a Declaração Universal do Genoma

Humano e dos Direitos do Homem. “Essa Carta proíbe, textualmente, a clonagem

humana, classificando-a como contrária à dignidade humana”. 379

Prescreve o art. 11 do respectivo diploma:

“Art. 11. Não serão permitidas práticas contrárias à dignidade

humana, tais como a clonagem reprodutiva de seres humanos. Os

Estados e as organizações internacionais competentes são

convidados a cooperar na identificação de tais práticas e a

determinar, nos níveis nacional ou internacional, as medidas

apropriadas a serem tomadas para assegurar o respeito pelos

princípios expostos nesta Declaração”. 380

Além da UNESCO, com o intuito de complementar a

Convenção Européia dos Direitos Humanos e Biomedicina, em 12 de janeiro de

377 BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996. Brasília, 1996. 378 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 37. 379 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 37. 380 UNESCO. Declaração Universal do Genoma Humano e dos Direitos do Homem de 11 de novembro de 1997.

Page 107: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

92

1998, dezenove países europeus assinaram em Paris documento que veda a

clonagem humana em seus territórios. 381

No tocante ao Brasil, com a finalidade de atualizar,

complementar e corrigir alguns pontos controversos presentes na legislação, foi

aprovada a Lei de Biossegurança sob o nº 11.105, em 24 de março de 2005.382

Entre outros pontos, esta legislação estabelece normas de

segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam OGMs

(Organismos Geneticamente Modificados) e seus derivados, cria o Conselho

Nacional de Biossegurança (CNBS), regulamenta a CTNBio (Comissão Técnica

Nacional de Biossegurança) e dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança. 383

Descreve o art. 1º da Lei 11.105/05 que,

“(...) estabelece normas de segurança e mecanismos de

fiscalização sobre a construção, o cultivo, a produção, a

manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a

exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o

consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de

organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados,

tendo como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área de

biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde

humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da

precaução para a proteção do meio ambiente”.384

381 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 38. 382 A Lei 11.105, de 24 de março de 2005, “Regulamenta os incisos II, IV e V do § 1o do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança – PNB, revoga a Lei no 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória no 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5o, 6o, 7o, 8o, 9o, 10 e 16 da Lei no 10.814, de 15 de dezembro de 2003, e dá outras providências”.

383 SUZUKI, Jorge Brunetti. Jus Navegandi. OGM: aspectos polêmicos e a nova lei de biossegurança. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8148>. Acessado em 09 de outubro de 2007.

384 BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005.

Page 108: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

93

Com o intuito de evitar brechas na legislação, o art. 3º

estabelece os conceitos operacionais para as categorias mencionadas em seu

texto.

“Art. 3. Para os efeitos desta Lei, considera-se:

I – organismo: toda entidade biológica capaz de reproduzir ou

transferir material genético, inclusive vírus e outras classes que

venham a ser conhecidas;

II – ácido desoxirribonucléico - ADN, ácido ribonucléico -

ARN: material genético que contém informações determinantes

dos caracteres hereditários transmissíveis à descendência;

III – moléculas de ADN/ARN recombinante: as moléculas

manipuladas fora das células vivas mediante a modificação de

segmentos de ADN/ARN natural ou sintético e que possam

multiplicar-se em uma célula viva, ou ainda as moléculas de

ADN/ARN resultantes dessa multiplicação; consideram-se

também os segmentos de ADN/ARN sintéticos equivalentes aos

de ADN/ARN natural;

IV – engenharia genética: atividade de produção e

manipulação de moléculas de ADN/ARN recombinante;

V – organismo geneticamente modificado - OGM: organismo

cujo material genético – ADN/ARN tenha sido modificado por

qualquer técnica de engenharia genética;

VI – derivado de OGM: produto obtido de OGM e que não

possua capacidade autônoma de replicação ou que não contenha

forma viável de OGM;

VII – célula germinal humana: célula-mãe responsável pela

formação de gametas presentes nas glândulas sexuais femininas

e masculinas e suas descendentes diretas em qualquer grau de

ploidia;

VIII – clonagem: processo de reprodução assexuada,

produzida artificialmente, baseada em um único patrimônio

Page 109: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

94

genético, com ou sem utilização de técnicas de engenharia

genética;

IX – clonagem para fins reprodutivos: clonagem com a

finalidade de obtenção de um indivíduo;

X – clonagem terapêutica: clonagem com a finalidade de

produção de células-tronco embrionárias para utilização

terapêutica;

XI – células-tronco embrionárias: células de embrião que

apresentam a capacidade de se transformar em células de

qualquer tecido de um organismo.385

Com esta especificação das categorias, entra-se no mérito

do assunto ora em discussão, ou seja, a regulamentação trazida pela atual

legislação de biossegurança, que em seus artigos 5º e 6º normatizam as

atividades que envolvem a clonagem humana, terapêutica e reprodutiva, bem

como, a utilização de embriões e células-tronco.

Assim especifica a Lei;

“Art. 5. É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização

de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos

produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo

procedimento, atendidas as seguintes condições:

I – sejam embriões inviáveis; ou

II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na

data da publicação desta Lei, ou que, já congelados na data da

publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos,

contados a partir da data de congelamento.

§ 1º Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos

genitores.

§ 2º Instituições de pesquisa e serviços de saúde que

realizem pesquisa ou terapia com células-tronco embrionárias

385 BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005.

Page 110: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

95

humanas deverão submeter seus projetos à apreciação e

aprovação dos respectivos comitês de ética em pesquisa.

§ 3º É vedada a comercialização do material biológico a que

se refere este artigo e sua prática implica o crime tipificado no art.

15 da Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de 1997 386”.

Esse dispositivo gera bastante polêmica, afinal, como já foi

falado no item anterior, há duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI

3.510 e 3.526) tramitando no Supremo Tribunal Federal, justamente questionando

o conflito entre estes artigos e os princípios determinados na CRFB/88.

Por sua vez, o art. 6º não foge do foco das discussões, pois,

é em seu inciso III e IV que fica proibida a utilização de embriões e a prática da

clonagem humana.

“Art. 6. Fica proibido:

[...]

III – engenharia genética em célula germinal humana, zigoto

humano e embrião humano;

IV – clonagem humana; [...]”.387

A Lei 11.105/05 vai nesse sentido, vedando a clonagem

humana e o uso de células germinativas, impondo para o transgressor as

penalidades previstas nos arts. 24 ao 26.

“Art. 24. Utilizar embrião humano em desacordo com o que

dispõe o art. 5º desta Lei:

Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa”.

386 “Art. 15. Comprar ou vender tecidos, órgãos ou partes do corpo humanos: Pena- reclusão de três a oito anos, e multa, de 200 a 360 dias-multa. Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem promove, intermedeia, facilita ou aufere qualquer vantagem com a transação”. BRASIL. Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de 1997. Brasília, 1997. 387 BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005.

Page 111: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

96

“Art. 25. Praticar engenharia genética em célula germinal

humana, zigoto humano ou embrião humano:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa”.

“Art. 26. Realizar clonagem humana:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa”.388

Além da previsão de pena para os transgressores da lei, a

mesma impõe aos que furtarem o cumprimento das normas por ela estabelecido,

responsabilidade civil e administrativa, prevendo nos arts. 20 ao 23, capítulo VII

que:

“Art. 20. Sem prejuízo da aplicação das penas previstas

nesta Lei, os responsáveis pelos danos ao meio ambiente e a

terceiros responderão, solidariamente, por sua indenização ou

reparação integral, independentemente da existência de culpa”.

“Art. 21. Considera-se infração administrativa toda ação ou

omissão que viole as normas previstas nesta Lei e demais

disposições legais pertinentes.

Parágrafo único. As infrações administrativas serão punidas

na forma estabelecida no regulamento desta Lei,

independentemente das medidas cautelares de apreensão de

produtos, suspensão de venda de produto e embargos de

atividades, com as seguintes sanções:

I – advertência;

II – multa;

III – apreensão de OGM e seus derivados;

IV – suspensão da venda de OGM e seus derivados;

V – embargo da atividade;

388 BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005.

Page 112: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

97

VI – interdição parcial ou total do estabelecimento, atividade

ou empreendimento;

VII – suspensão de registro, licença ou autorização;

VIII – cancelamento de registro, licença ou autorização;

IX – perda ou restrição de incentivo e benefício fiscal

concedidos pelo governo;

X – perda ou suspensão da participação em linha de

financiamento em estabelecimento oficial de crédito;

XI – intervenção no estabelecimento;

XII – proibição de contratar com a administração pública, por

período de até 5 (cinco) anos”.

“Art. 22. Compete aos órgãos e entidades de registro e

fiscalização, referidos no art. 16 desta Lei, definir critérios, valores

e aplicar multas de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a R$ 1.500.000,00

(um milhão e quinhentos mil reais), proporcionalmente à gravidade

da infração.

§ 1o As multas poderão ser aplicadas cumulativamente com

as demais sanções previstas neste artigo.

§ 2o No caso de reincidência, a multa será aplicada em

dobro.

§ 3o No caso de infração continuada, caracterizada pela

permanência da ação ou omissão inicialmente punida, será a

respectiva penalidade aplicada diariamente até cessar sua causa,

sem prejuízo da paralisação imediata da atividade ou da interdição

do laboratório ou da instituição ou empresa responsável”.

“Art. 23. As multas previstas nesta Lei serão aplicadas pelos

órgãos e entidades de registro e fiscalização dos Ministérios da

Agricultura, Pecuária e Abastecimento, da Saúde, do Meio

Ambiente e da Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da

Presidência da República, referidos no art. 16 desta Lei, de acordo

com suas respectivas competências.

Page 113: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

98

§ 1o Os recursos arrecadados com a aplicação de multas

serão destinados aos órgãos e entidades de registro e

fiscalização, referidos no art. 16 desta Lei, que aplicarem a multa.

§ 2o Os órgãos e entidades fiscalizadores da administração

pública federal poderão celebrar convênios com os Estados,

Distrito Federal e Municípios, para a execução de serviços

relacionados à atividade de fiscalização prevista nesta Lei e

poderão repassar-lhes parcela da receita obtida com a aplicação

de multas.

§ 3o A autoridade fiscalizadora encaminhará cópia do auto de

infração à CTNBio.

§ 4o Quando a infração constituir crime ou contravenção, ou

lesão à Fazenda Pública ou ao consumidor, a autoridade

fiscalizadora representará junto ao órgão competente para

apuração das responsabilidades administrativa e penal”. 389

Contudo, apesar desta nova Lei de Biossegurança ter

nascido justamente para “tapar vazios” da lei anterior, percebe-se que sua

redação é intricada, isto porque apresenta contradição em ponto fundamental. A

lei permite a pesquisa e a terapia com células embrionárias, ao mesmo tempo em

que proíbe engenharia genética em célula germinal humana, zigoto humano e

embrião humano (artigo 6º, inciso III), contradição essa que mais se destaca se

sopesada a definição constante do artigo 3º, inciso V, atinente ao OGM.390

Apesar de apresentar algumas contradições, a verdade é

que o passo dado pela Lei 11.105 é conseqüência natural do que vem se

verificando no mundo. A biotecnologia tem progredido mundialmente e, por

conseguinte, as normas que a disciplinam, a integrarem o Biodireito. 391

389 BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005. 390SARTORI, Ivan Ricardo Garisio. Consultor Jurídico. “Célula-tronco: Direito não se submete a barreiras morais e religiosas”. Disponível em: <http://conjur.estadao.com.br/static/text/37274>. Acessado em 10 de outubro de 2007.

391 SARTORI, Ivan Ricardo Garisio. Consultor Jurídico. “Célula-tronco: Direito não se submete a barreiras morais e religiosas”. Disponível em: <http://conjur.estadao.com.br/static/ text/37274>. Acessado em 10 de outubro de 2007.

Page 114: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

99

Segundo Paulo Costa Leite, “o instrumental jurídico atual

ainda é precário para lidar com as novas relações jurídicas que se estabelecerão

entre as pessoas envolvidas num processo de clonagem”.392

Sabe-se que o tema traz consigo uma gama de

questionamentos, dúvidas e posições, porém, conforme VIERA expõe,

“Os operadores do Direito não têm se furtado a admitir a realidade

da clonagem e têm se ocupado em pensar nas soluções jurídicas

demandadas por ela. Embora o trabalho de pesquisadores e

cientistas tenha fascinante poder de afetar a vida de todos os

indivíduos, estes não podem nunca esquecer que não é possível

“brincar de Deus” sem que se pague por isso um alto preço.

Afinal, embora cada descoberta seja um “flash”, a vida humana

“não é brinquedo não”!”. 393

Assim, no tocante a conceituação do que é vida, embrião,

“Não cabe a nós, operários do direito, a avaliação da justeza

dessa disposição, mas apenas observá-la e/ou aplicá-la, ficando

para os expertos em engenharia genética ou biotecnologia o

encargo de demonstrar a incongruência da imposição”.394

Desta forma, sendo o Direito dinâmico, “não cabe impor

barreiras ou estabelecer divisas morais e religiosas instransponíveis, mas sim,

disciplinar fatos que, inevitavelmente, venham a surgir em decorrência da

evolução humana”.395

“Certo é que a rápida evolução científica trará aos tribunais feitos

em número crescente. O Judiciário não pode funcionar num vazio

392 LEITE, Paulo Costa. Clonagem humana: Costa Leite enviará íntegra das palestras ao Congresso. Superior Tribunal de Justiça, 2001. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/ publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=69223>. Acessado em 10 de outubro de 2007.

393 VIEIRA, Teresa Rodrigues; OLIVEIRA, Paulo Henrique. A novela O Clone e os aspectos jurídicos da clonagem humana. Consulex: Revista Jurídica, v. 6, n. 132, p. 64-65, jul. 2002.

394 ERDELYI, Maria Fernanda. O Começo da Vida. STF decidirá destino das pesquisas com células-tronco. Consultor Jurídico. 04 de julho de 2006. Brasília. Disponível em: <http://conjur. estadao.com.br/static/text/45959>. Acessado em 10 de outubro de 2007.

395 SARTORI, Ivan Ricardo Garisio. Consultor Jurídico. “Célula-tronco: Direito não se submete a barreiras morais e religiosas”. Disponível em: <http://conjur.estadao.com.br/ static/text/37274>. Acessado em 10 de outubro de 2007.

Page 115: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

100

jurídico, e o vácuo aumentará à medida que a ciência evoluir

aceleradamente, porque a feitura da lei é, por necessidade, fruto

de longa reflexão. O Judiciário haverá de guiar-se, sempre, por

normas legais e, não as tendo, haverá de se socorrer à analogia,

aos costumes e aos princípios gerais de direito, levando em conta,

sempre, as exigências do bem comum e o papel criador da

jurisprudência. Contudo, atuará com orientação mais firme, menos

sujeita a disputas, se dispuser formal e materialmente de normas

diretas e claras, que se nortearão pelas decisões emanadas de

um diálogo multidisciplinar e acordadas – oxalá! por todos os

interessados”.

[...]

“Importante frisar que tais decisões não podem ser deixadas a

cargo de apenas um ou de uns poucos grupos interessados;

certamente não podem ser deixadas somente aos industriais, ou

aos países ricos, ou à classe política; sobretudo, não devem ser

obra exclusiva das classes políticas desses países, que agem sob

a influência de seus interesses mercantilistas”. 396

Contudo, lidar com a questão de embriões congelados na

prática da clonagem humana, é ter consciência de que se trata de uma discussão

que vai muito além desta atual legislação de biossegurança, é uma realidade

muito discutida, porém, pouco normatizada pelo Direito Moderno, que encontra

inúmeras dificuldades em dar suporte jurídico a esta questão. Inúmeros são os

projetos de lei, no entanto, verifica-se que o esforço de legislar e regulamentar

este assunto é complexo, uma vez que envolve diretamente a vida, o homem e os

seus valores, além de que na prática da manipulação genética um erro pode

causar a perda ou deficiência de uma vida.

Neste pensamento, Carlos María Casabona descreve:

“O jurista encontra, cada vez mais freqüentemente, sérios

obstáculos que, inevitavelmente, tem que enfrentar quando

pretende analisar uma realidade social nova, sobretudo quando

396 NAVES, Nilson. Bioética e Justiça. Sexto Congresso Mundial de Bioética, Brasília, 2002. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/Discursos/0000361/Bio%C3%A9tica-30-10-2002.doc>. Acessado em 09 de outubro de 2007.

Page 116: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

101

sua instauração é condicionada de forma decisiva pelos avanços

científicos e tecnológicos. A dificuldade consiste numa

comprovação muito simples: para levar a cabo com êxito a análise

jurídica da realidade social que se propôs como objeto de estudo,

é preciso que o jurista tenha um conhecimento o mais acertado e

fiel possível de tal realidade ou, dito de outro modo, do assunto

que é objeto da apreciação jurídica (...) mas (...) quando as

inovações tecnológicas ou as descobertas científicas se

apresentam como núcleo ou fundo daquelas relações, o jurista

corre o risco de fracassar em seu intento analítico, se não tiver

realizado o esforço adicional de captar pelo menos os aspectos

mais relevantes dessas inovações ou descobertas e o modo como

verdadeiramente atuam nas relações humanas”.397

Destarte, trabalhar os aspectos jurídicos da utilização de

embriões congelados na prática da clonagem humana, com o pensamento

voltado à luz da atual Lei de Biossegurança398, é ter o dever de assumir uma

postura firme e coerente diante de um desafio imposto pela sociedade. De um

lado a vida de embriões congelados e de outro a vida de quem está à espera e a

busca da cura de uma enfermidade.399 Conforme Tereza Rodrigues Vieira, “o

tempo dirá se prevalecerá a ciência ou a consciência”. 400

397 CASABONA, Carlos Maria Romeo. Genética e Direito. In: CASABONA, Carlos Maria Romeo (org). Biotecnologia, Direito e Bioética: perspectivas em Direito Comparado. Belo Horizonte: Del Rey e PUC Minas, 2002. p.23.

398 BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005. 399 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 62. 400 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 34.

Page 117: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

102

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quando realizada a escolha do tema, “Aspectos ético-

jurídicos da utilização de embriões congelados na prática da clonagem humana:

uma análise à luz da atual Lei de Biossegurança brasileira”, a principal

preocupação estava voltada a alta complexidade deste.

Todavia, a curiosidade pelo conhecimento deste tema tão

polêmico, e o interesse de saber o posicionamento do Direito frente a proteção

jurídica da vida embrionária, impulsionaram em estudar, pesquisar e descrever o

posicionamento das pessoas, dos estudiosos do Direito, da ciência e da medicina.

Desta forma, o primeiro capítulo verificou-se a importância

atual do Biodireito, buscando adequar a Bioética ao ordenamento jurídico. Pois,

enquanto a Bioética busca estudar o comportamento humano nas atividades

científicas e médicas, o Biodireito nasce com a finalidade de cercar estas

condutas humanas através da produção doutrinária, legislativa e judicial.

Através deste entendimento, chega-se a conclusão de que a

Bioética e o Biodireito devem caminhar lado a lado, protegendo a dignidade do

ser humano, sua vida e seus direitos.

Quanto ao capítulo dois percebeu-se que a clonagem

humana é um tema polêmico, possibilitando opiniões distintas sobre a validade do

prosseguimento das pesquisas, tanto no caso da clonagem para fins reprodutivos

bem como para fins terapêuticos.

A clonagem humana não é permitida no sistema normativo

brasileiro, conforme dispõe a Lei 11.105/05. Porém, grandes são as discussões

sobre a possibilidade futura de estar-se realizando tal técnica reprodutiva. Desta

forma, é relevante que sejam avaliadas as reais intenções e finalidades de

utilização da técnica em cada caso.

Page 118: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

103

O entendimento majoritário acredita que a clonagem para

fins reprodutivos não deve ser realizada, em face de toda ineficiência que a

técnica apresenta, haja vista que para clonar um só indivíduo, vários embriões

seriam excluídos, e, se dentre todos esses embriões algum chegasse até o

nascimento, correr-se-ia o risco da criança nascer com sérios defeitos genéticos.

Ademais, a realização deste tipo de clonagem representa uma ameaça à

biodiversidade genética.

Em contrapartida, a clonagem para fins terapêuticos, que

tem por objetivo a regeneração de tecidos lesionados em decorrência de doenças

degenerativas, apresenta opiniões bastante divididas. Apesar de ser uma grande

promessa no desenvolvimento de novas terapias, o maior obstáculo para a sua

realização encontra-se na questão de utilização de embriões humanos.

Finalizando o estudo pretendido, no terceiro capítulo foram

analisadas as opiniões e laudos sobre a utilização de embriões em práticas

científicas, observou-se que a resposta para tantos questionamentos reside no

modo como o embrião de cinco dias de desenvolvimento é enxergado, ou seja, se

um embrião no estágio de blastócito pode ou não ser considerado um indivíduo,

ou seria apenas um aglomerado de células.

Umas das soluções encontradas a fim de evitar o uso

indiscriminado de embriões e outros abusos, seria a regulamentação através de

leis, estipulando penalidades civis e criminais, bem como determinando um

estágio limite para serem utilizados. Neste caso, coerente seria utilizar-se entre o

5º e 14º dia pós-fertilização, pois, posteriormente inicia-se a formação do tubo

neural.

Apesar das divergências, até os contrários à clonagem

terapêutica tem consciência dos benefícios que esta pode trazer, tanto na área da

regeneração de tecidos, como no entendimento dos processos de

desenvolvimento embrionários e no campo das doenças genéticas humanas.

Page 119: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

104

Diante das polêmicas, foi criada no Brasil a Lei de

Biossegurança (Lei nº.11.105, de 24 de março de 2005), a qual regulamenta a

utilização de embriões humanos nas atividades biotecnocientíficas.

Todavia, a própria Lei é contraditória, pois ao mesmo tempo

em que proíbe a clonagem humana e a utilização de embriões congelados; dispõe

em outro artigo sobre a possibilidade da utilização de células-tronco embrionárias

obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro em pesquisas e

terapias, desde que atendidas as condições previstas.

Desta forma, analisando o assunto de forma geral, verifica-

se que embora a nova Lei de Biossegurança brasileira vede a clonagem humana

em suas duas formas, reprodutiva e terapêutica, pode-se dizer que um passo foi

dado no que tange às terapias com células-tronco embrionárias extraídas de

embriões excedentes, abrindo-se caminhos para que, futuramente, possa-se

repensar assuntos como a clonagem terapêutica, e que sobretudo, esta técnica

possa ser realizada com segurança.

Observou-se, ainda, que a Lei de Biossegurança é tímida e

restritiva no que se refere a clonagem humana, embriões humanos e células-

tronco, e abrangente com relação a liberação comercial de biotecnologia vegetal.

Espera-se, assim, que no futuro próximo haja uma maior preocupação com a

normatização destes assuntos, para que quando colocados em prática tenha-se

plena consciência de suas finalidades e resultados.

Por fim, todas as hipóteses previstas na introdução foram

confirmadas, ou seja, a Bioética e o Biodireito são instrumentos importantes para

o controle das atividades relacionadas aos avanços biotecnológicos; a clonagem

humana não é permitida no sistema normativo brasileiro e existe no Brasil

legislação que regulamente a utilização de embriões humanos nas atividades

biotecnocientíficas, sendo a Lei nº. 11.105/2005, a atual Lei de Biossegurança.

Page 120: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

105

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS

ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. Rio de Janeiro: Editora Lúmen

Juris, 2000.

ALMEIDA, Silmara J. A. Chinelato e. Tutela Civil do Nascituro. São Paulo:

Saraiva, 2000.

AMA. Cloning and Embryo Research. 1997. Disponível em: http://www.ama-

assn.org/ama/pub/category/13564.html. Acessado em 02 de abril de 2006.

BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível

em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de

outubro de 2007.

BEAUCHAMP, T.L. & CHILDRESS, J.F. Princípios de Ética Biomédica. 4.ed.

São Paulo: Edições Loyola, 2002.

BITTAR, Carlos Alberto. O direito de família e a Constituição de 1988. São

Paulo: Saraiva, 1989. p. 41.

BRASIL. Código Civil (2002). 5.ed. São Paulo: Editora Rideel, 2007.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (1988), Senado

Federal, Brasília, 2007.

BRASIL. Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de 1997. Brasília, 1997.

BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005.

BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. Rio de Janeiro:

Editora Interciência, 2005.

Page 121: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

106

BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos; apud, OLIVEIRA,

Fátima. Clonagem e manipulação da genética humana: mitos, realidade,

perspectivas e delírios. O “estado da arte” da reprodução humana assistida

em 2002. – Brasília: Ministério da Justiça, Secretaria de Estado dos Direitos da

Mulher, 2002.

CASABONA, Carlos Maria Romeo. Genética e Direito. In: CASABONA, Carlos

Maria Romeo (org). Biotecnologia, Direito e Bioética: perspectivas em Direito

Comparado. Belo Horizonte: Del Rey e PUC Minas, 2002.

CHAVES, Benetida Inês Lopes. A Tutela Jurídica do Nascituro. São Paulo: LTr,

2000.

COLLUCCI, Cláudia. A clonagem terapêutica, 2005. Disponível em:

<http://www1.folha.uol. com.br/folha>. Acessado em 13 de abril de 2006.

COLLUCCI, Cláudia. Total de embriões congelados no Brasil é um décimo do

previsto, 2007. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult30

6u13158.shtml>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

CONCEPTUS. Criopreservação. Disponível em: <http://www.clinicaconceptus.

com.br/ laboratorio/criopreservacao.html#embrioes>. Acessado em 03 de outubro

de 2007.

CRIOPRAXIS. Criopreservação de embriões. Disponível em:

<http://www.cryopraxis.com.br/index.php>. Acessado em 15 de março de 2006 e

em 04 de outubro de 2007.

DIAFÉRRIA, Adriana. Clonagem, aspectos jurídicos e bioéticos. São Paulo:

Edipro, 1999.

DJI – índice Fundamental do Direito. Personalidade. Disponível em:

<http://www.dji.com.br/ civil/personalidade.htm>. Acessado em 04 de outubro de

2007.

Page 122: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

107

DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2.ed. aum. e atual. de acordo

com o novo Código Civil (Lei n. 10.406, de 10-01-2002). São Paulo: Saraiva,

2002.

DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito apud BEAUCHAMP &

CHILDRESS. The principles of biomedical ethics. New York, Oxford University

Press, 1989.

DIAS, Edna Cardozo. Clonagem e Direito. 2007. Disponível em:

<http://www.sosanimalmg.com.br>. Acessado em 21 de setembro de 2007.

DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. apud DALLARI, Dalmo de

Abreu. Humanismo Jurídico, Juízes para a Democracia, 1998; Bioética e

direitos humanos, in Iniciação à bioética.

DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. apud MARTHA, Marco

Antonio Bandeira. Clonar é legal? Bioética. 2004.

DIREITONET. Biodireito. Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/

dicionario_juridico>. Acessado: 03 de maio de 2007.

DURANT, Guy. A Bioética: natureza, princípios, objetivos. São Paulo: Paulus,

1995.

ERDELYI, Maria Fernanda. O Começo da Vida. STF decidirá destino das

pesquisas com células-tronco. Consultor Jurídico. 04 de julho de 2006. Brasília.

Disponível em: <http://conjur. estadao.com.br/static/text/45959>. Acessado em 10

de outubro de 2007.

FABRIZ, Daury César. Bioética e direitos fundamentais. Belo Horizonte:

Mandamentos, 2003.

FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais apud BARRETO,

Vicente de Paulo. Bioética, biodireito e direitos humanos. In: MELLO, Celso de

Page 123: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

108

Albuquerque et al. Teoria dos direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Renovar,

1999.

FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais apud PESSINI, Léo;

BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de. Problemas atuais de Bioética. 3.ed.

São Paulo: Edições Loyola, 1991.

FERNANDES, Thyco Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do

biodireito: aspectos do direito de família e do direito das sucessões.

Florianópolis: Diploma Legal, 2000.

FERREIRA, Fábio Alves. Vivendo sem respirar, morrendo sem chance de

nascer. Jus Navegandi, Teresina, nov. 2002. Disponível em:

<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id= 3544>. Acessado em: 08 mar.

2005.

GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em:

<http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17

de novembro de 2006.

GOMES, Hélio. Medicina Legal. 13.ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1971.

IHERING, Rudolf von. A Luta pelo Direito. São Paulo: Martin Claret Editora,

2002.

JORNAL DA CIÊNCIA apud GLOBO ONLINE, Clippings. Disponível em:

http://www.ghente.org/ clippings/do_mes.php. Acessado em 09 de fevereiro de

2007.

JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO ONLINE apud GLOBO ONLINE Clippings.

Disponível em: http://www.ghente.org/ clippings/do_mes.php. Acessado em 09 de

fevereiro de 2007.

Page 124: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

109

JORNAL NACIONAL. Embriões Congelados. 25.04.2005. Disponível em:

<http://jornalnacional.globocom/Jornalismo/JN/0,AA952090-3586,00.html>.

Acessado em 03 de outubro de 2007.

KELSEN, Hans. O que é justiça? Trad. Luis Carlos Borges e Vera Barkow. São

Paulo: Martin Fontes, 1998.

LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações Artificiais e o Direito. São Paulo:

Editora Revista dos Tribunais, 1995.

LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações Artificiais e o Direito – aspectos

médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos. São Paulo; Revista dos

Tribunais, 1995 apud SANT´ANNA, Nilson do Amaral. Contribuição Médico-

Legal ao Estudo dos Contraceptivos. Tese apresentada à Faculdade de Direito

da UFRJ. Rio de Janeiro, 1967.

LEITE, Leonardo. Clonagem. Rio de Janeiro, 2005. Disponível em:

<http://www.ghente.org /temas/clonagem>. Acessado em 10 de abril de 2006.

LEITE, Paulo Costa. Clonagem humana: Costa Leite enviará íntegra das

palestras ao Congresso. Superior Tribunal de Justiça, 2001. Disponível em:

<http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=

69223>. Acessado em 10 de outubro de 2007.

LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião.

Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em

03 de outubro de 2007.

LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião.

Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em

03 de outubro de 2007, apud BARRETO, Wanderlei de Paula. Inovações sobre a

personalidade jurídica e os direitos da personalidade no novo Código Civil

brasileiro. DBJV – Mitteilungen, n. 2, fev. 2004. Disponível em:

Page 125: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

110

<http://www.dbjv.de/dbjv-high/mitteilungen/04-02/DBJV_Mitteilungen_02-004.pdf>.

Acessado em 08 mar. 2005.

MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção

Jurídica apud BUERES, Alberto J. La voluntad jurídica y la fecundación

extracorporal. In: Responsabilidad civil de los médicos. 2.ed., Tomo I, Buenos

Aires: Hammurabi, 1994.

MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção

Jurídica. apud GARCIA, Sônia Maria Lauer; JECKEL NETO, Emílio;

FERNÁNDEZ, Casimiro Garcia. Embriologia. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991.

MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção

Jurídica. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. apud VILA-CORO, Maria Dolores.

Introducción a la biojurídica. Madrid: Servicio de publicaciones Facultad Derecho

Universidad Complutense Madrid, 1995.

MOORE, Keith L; PERSAUD, T.V.N. traduzido por VUGMAN, Fernando Simão.

Embriologia Clínica. 5.ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A.,

1997. p. 06.

MORAIS, Alexandre de. Direito Constitucional. 16.ed. São Paulo: Atlas, 2002.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 16.ed. São Paulo: Atlas., 2004.

NAVES, Nilson. Bioética e Justiça. Sexto Congresso Mundial de Bioética,

Brasília, 2002. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/Discursos/0000361/Bio%

C3%A9tica-30-10-2002.doc>. Acessado em 09 de outubro de 2007.

NOTÍCIAS ECLECIASTES. “Dom Sgreccia: A clonagem tem um

procedimento que vai contra a natureza”. Roma. 18 de fevereiro de 2004.

Disponível em: <http://www.eclesiales.org/portugues/ arquivo/0402-3.htm>.

Acessado em 10 de outubro de 2007.

Page 126: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

111

OLIVEIRA, Fátima. Bioética – uma face da cidadania. São Paulo: Moderna,

1997.

PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica e Metodologia da

Pesquisa Jurídica. 10.ed. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2007.

PEREIRA, Lygia V. O Admirável Mundo Novo da Clonagem - Bioética e

Biorrisco: Abordagem Transdicisplinar / Silvio Valle, José Luiz Telles

(organizadores). Rio de Janeiro: Interciência, 2003.

POTTER, Van Rensselaer. Palestra apresentada em vídeo, no IV Congresso

Mundial de Bioética. Tóquio/Japão: 4 a 7 de novembro de 1998. O mundo da

saúde.

RAMOS, Sérgio dos Passos. Juramento de Hipócrates. Disponível em:

http://www.gineco.com.br/jura.htm. Acesso: 02 maio de 2007.

RAMOS, Sérgio dos Passos. Código de Ética Médica. Disponível em:

http://www.gineco.com.br/código.htm. Acesso: 02 maio de 2007.

REVISTA O GLOBO. O Mundo / Ciência e vida. Clone leva uma vida normal,

diz estudo. 23 de novembro de 2001.

SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Biodireito. Ciência da vida, os novos

desafios. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001.

SANTOS, Maria Celeste Cordeiro. Morte encefálica: a Lei de Transplantes de

Órgãos. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos

Fundamentais na Cosntituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do

Advogado, 2001.

Page 127: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

112

SARTORI, Ivan Ricardo Garisio. Consultor Jurídico. “Célula-tronco: Direito não

se submete a barreiras morais e religiosas”. Disponível em:

<http://conjur.estadao.com.br/static/text/37274>. Acessado em 10 de outubro de

2007.

SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética. São Paulo: Loyola, 1996.

SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 22.ed. Rio de Janeiro: Editora

Forense, 2003.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 20.ed. São

Paulo: Malheiros, 2002.

SILVA, Reinaldo Pereira. Introdução ao Biodireito: investigações político-

jurídicas sobre o estatuto da concepção humana. São Paulo: LTr, 2002. p. 12.

SUZUKI, Jorge Brunetti. Jus Navegandi. OGM: aspectos polêmicos e a nova lei

de biossegurança. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.

asp?id=8148>. Acessado em 09 de outubro de 2007.

VARELLA, Marcelo Dias; FONTES, Eliana e ROCHA, Fernando Galvão da.

Biossegurança e Biodiversidade – Contexto Científico e Regulamentar. Belo

Horizonte: Del Rey, 1999.

VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. 2.ed. atual. São Paulo: Editora

Jurídica Brasileira, 2003.

VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Biodireito apud Leo Pessini e Christian de

Paul de Barchifontaine. Fundamentos da Bioética. 2005.

VIEIRA, Teresa Rodrigues; OLIVEIRA, Paulo Henrique. A novela O Clone e os

aspectos jurídicos da clonagem humana. Consulex: Revista Jurídica, v. 6, n.

132, p. 64-65, jul. 2002.

Page 128: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

113

WIKIPÉDIA, Enciclopédia Livre. Embrião. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/

wiki/Embri%C3%A3o>. Acessado em 03 de outubro de 2007.

ZATZ, Mayana. Clonagem e células tronco, 2004. Disponível em:

<http://www.scielo.br>. Acessado em 11 de abril de 2006.

Page 129: ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE …siaibib01.univali.br/pdf/Anna Kleine Neves Pereira.pdf · ACT Advanced Cell Technology ... normas, regras do comportamento, princípios,

114

ANEXOS

Ilustrações de Sirio J. B. Cançado para o suplemento especial clonagem da pesquisa fapesp nº 73, de 03/2002.