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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS CURSO DE DIREITO
ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE EMBRIÕES CONGELADOS NA PRÁTICA DA CLONAGEM HUMANA: UMA
ANÁLISE À LUZ DA ATUAL LEI DE BIOSSEGURANÇA BRASILEIRA
ANNA KLEINE NEVES PEREIRA
Itajaí, 30 de outubro de 2007.
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
ASPECTOS ÉTICO-JURÍDICOS DA UTILIZAÇÃO DE EMBRIÕES CONGELADOS NA PRÁTICA DA CLONAGEM HUMANA: UMA
ANÁLISE À LUZ DA ATUAL LEI DE BIOSSEGURANÇA BRASILEIRA
ANNA KLEINE NEVES PEREIRA
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientadora: Professora MSc. Maria da Graça Mello Ferracioli
Itajaí, 30 de outubro de 2007.
2
“A experiência tem mostrado que quanto mais
o homem caminha para a artificialidade, foge
ele das regras naturais e da essência de sua
própria vida.”
(Álvaro Villaça Azevedo)
3
AGRADECIMENTOS
Sempre a Deus, essência da minha vida.
Ao meu marido Edson Vicente Minicoski Pereira,
que me ensina a viver com alegria, pelo seu amor
e compreensão dedicados nos momentos
subtraídos da convivência familiar, motivados pela
dedicação aos estudos.
Aos familiares, meu pai Carlos Augusto Paim
Neves, minha mãe Arlene Kleine Neves, minha
irmã Gisele Kleine Neves e minha avó Jandyra
Cruz Kleine, pelo amor, incentivos e apoio
fundamental na minha caminhada profissional.
A Profª. MSc. Maria da Graça Mello Ferracioli,
pelas orientações e pelas contribuições oferecidas
nos anos da graduação.
Aos amigos, colegas e professores do Curso de
Direito, em agradecimento pelas lições que
aprendi e aprendo a cada dia com todos.
4
DEDICATÓRIA
Ao meu marido Edson Vicente Minicoski Pereira,
pela perseverança e pelo entusiasmo que dedica
aos nossos objetivos, e aos familiares por me
proporcionarem uma vida feliz e me
impulsionarem à busca de muitas outras
realizações.
5
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e a
Orientadora de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí, 30 de outubro de 2007.
Anna Kleine Neves Pereira Graduanda
6
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Anna Kleine Neves Pereira, sob o
título “Aspectos ético-jurídicos da utilização de embriões congelados na prática da
clonagem humana: uma análise à luz da nova lei de biossegurança brasileira”, foi
submetida em 30 de outubro de 2007 à banca examinadora composta pelos
seguintes professores: Profª. MSc. Maria da Graça Mello Ferracioli (orientadora),
Profª. MSc. Andrietta Kretz (membro) e Profº. Josemar Sidinei Soares (membro),
e aprovada com a nota 10 (dez).
Itajaí (SC), 30 de outubro de 2007.
Professora MSc. Maria da Graça Mello Ferracioli Orientadora e Presidente da Banca
Professor MSc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia
7
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ACT Advanced Cell Technology
ADIN Ação Direta de Inconstitucionalidade
AMA Associação Médica Americana
ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária
ART. Artigo
ATT Alfa-I-antitripsina
BBC British Broadcasting Corporation
CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002
CFM Conselho Federal de Medicina
CFRB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
CJF Conselho de Justiça Federal
CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente
CNBS Conselho Nacional de Biossegurança
CT Células-Tronco
CTNBIO Comissão Técnica Nacional de Biossegurança
DNA / ADN Ácido Desoxirribonucléico
8
EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias
EUA Estados Unidos da América
INTA Instituto Nacional de Tecnologia Animal
OAB Ordem dos Advogados do Brasil
OGMS Organismos Geneticamente Modificados
OMS Organização Mundial da Saúde
ONU Organização das Nações Unidas
PPL THERAPEUTICS
Pharmaceutical Technology Lothian
RNA / ARN Ácido Ribonucléico
SBRA Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida
SNU Universidade Nacional de Seul
STJ Superior Tribunal de Justiça
STF Supremo Tribunal Federal
UNESCO Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a Cultura.
UNIFESP Universidade Federal de São Paulo
UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Bioética
”É o estudo sistemático da conduta humana no âmbito das ciências da vida e da
saúde considerada à luz de valores e princípios morais”. 1
Ética
“Ética é uma tentativa para se determinar os valores fundamentais pelos quais
vivemos. Quando vista num contexto social, é uma tentativa de avaliar as ações
pessoais e as ações dos outros de acordo com uma determinada metodologia ou
certos valores básicos”. 2
Moral
A palavra “moral” tem sua origem no latim (mos, moris) e designa: “os costumes,
a conduta da vida, as regras do comportamento. Etimologicamente há, então, um
sentido muito amplo. Ela se refere ao agir humano, aos comportamentos
cotidianos, às opções existenciais. Ela faz pensar de maneira espontânea em
normas, regras do comportamento, princípios, valores”. 3
A moral se relaciona diretamente aos atos humanos, ao seu agir. De forma ampla,
refere-se ao “bem” a ao “mal”, “ao que é necessário fazer”, por oposição a “o que
se faz”. Assim, a moral estabelece princípios, normas de conduta interna de cada
indivíduo, capaz de ser exteriorizada. 4
1 SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética. São Paulo: Loyola, 1996. p. 43. 2 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. 2.ed. atual. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira, 2003. p. 16.
3 DURANT, Guy. A Bioética: natureza, princípios, objetivos. São Paulo: Paulus, 1995. p. 09. 4 DURANT, Guy. A Bioética: natureza, princípios, objetivos. p. 09.
x
Biodireito
”Biodireito é a produção doutrinária, legislativa e judicial acerca das questões que
envolvem a bioética. Vai desde o direito a um meio-ambiente sadio, passando
pelas tecnologias reprodutivas, envolvendo a autorização ou negação de
clonagens e transplantes, até questões mais corriqueiras e ainda mais
inquietantes como a dicotomia entre a garantia constitucional do direito á saúde, a
falta de leitos hospitalares e a equânime distribuição de saúde à população” 5
Direito
“O direito não é uma simples idéia, é uma força viva. (...). O direito no sentido
objetivo compreende os princípios jurídicos manipulados pelo Estado, ou seja, o
ordenamento legal da vida. O direito, no sentido subjetivo, representa a atuação
concreta da norma da norma abstrata, de que resulta uma faculdade específica
de determinada pessoa”. 6
Clonagem
“Processo de reprodução assexuada, produzida artificialmente, baseada em um
único patrimônio genético, com ou sem utilização de técnicas de engenharia
genética”. 7
Vida
“A vida é o bem fundamental, base de todos os direitos do homem, tendo o
Estado o dever de garantir, por todos os meios e formas, o respeito a ela desde o
seu início, principalmente porque o nascituro, cujo nascimento se espera, é um
ser ainda fraco e indefeso que necessita de proteção para o seu completo
desenvolvimento, vindo a realizar seus interesses nas relações sociais”. 8
5 FERNANDES, Thyco Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do biodireito: aspectos do direito de família e do direito das sucessões. Florianópolis: Diploma Legal, 2000. p. 42.
6 IHERING, Rudolf von. A Luta pelo Direito. São Paulo: Martin Claret Editora, 2002. p. 28. 7 BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005. 8 CHAVES, Benetida Inês Lopes. A Tutela Jurídica do Nascituro. São Paulo: LTr, 2000. p. 14.
xi
Nascituro
“De acordo com a etimologia do vocábulo “nascituro” (de “nasciturus-a-um) é
aquele que há de ou deve nascer”. 9
Embrião
“Célula germinal humana: célula-mãe responsável pela formação de gametas
presentes nas glândulas sexuais femininas e masculinas e suas descendentes
diretas em qualquer grau de ploidia”.10
9 CHAVES, Benetida Inês Lopes. A Tutela Jurídica do Nascituro. p. 18. 10 BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005.
xii
SUMÁRIO
RESUMO.........................................................................................XIV
INTRODUÇÃO ................................................................................... 1
CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 3
BIOÉTICA E BIODIREITO.................................................................. 3 1.1 BIOÉTICA.........................................................................................................3 1.1.1 CONCEITO E DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO ......................................................3 1.1.2 ÉTICA E MORAL NO CAMPO DA BIOÉTICA ...........................................................7 1.1.3 PRINCÍPIOS DA BIOÉTICA...................................................................................9 1.1.3.1 Princípio da Autonomia ..........................................................................11 1.1.3.2 Princípio da Beneficência.......................................................................13 1.1.3.3 Princípio da Não-Maleficência ...............................................................16 1.1.3.4 Princípio da Justiça ................................................................................17 1.1.4 PROBLEMAS BIOÉTICOS DA ATUALIDADE: CONSTRUÇÃO DE UM NOVO PARADIGMA..............................................................................................................................20 1.2 BIODIREITO ...................................................................................................21 1.2.1 CONCEITO E ASPECTOS RELEVANTES ..............................................................22 1.2.2 BIOÉTICA, BIODIREITO E HUMANISMO JURÍDICO ................................................24
CAPÍTULO 2 .................................................................................... 28
CLONAGEM..................................................................................... 28 2.1 ASPECTOS GERAIS......................................................................................28 2.2 DEFINIÇÃO ....................................................................................................29 2.3 HISTÓRICO ....................................................................................................30 2.4 CLONAGEM HUMANA E SUAS FORMAS....................................................50 2.4.1 CLONAGEM REPRODUTIVA ..............................................................................50 2.4.1.1 Justificativas para a prática da clonagem reprodutiva........................52 2.4.2 CLONAGEM TERAPÊUTICA...............................................................................55 2.4.2.1 Justificativas para a prática da clonagem terapêutica ........................58
xiii
CAPÍTULO 3 .................................................................................... 61
EMBRIÕES CONGELADOS, CLONAGEM HUMANA E A NOVA LEI DE BIOSSEGURANÇA BRASILEIRA.............................................. 61 3.1 EMBRIÕES.....................................................................................................61 3.1.1 CONCEITO......................................................................................................61 3.1.2 EMBRIÕES CONGELADOS ................................................................................63 3.1.2.1 Criopreservação de Embriões ...............................................................66 3.2 UTILIZAÇÃO DE EMBRIÕES CONGELADOS EM PRÁTICAS REPRODUTIVAS..................................................................................................67 3.3 CLONAGEM HUMANA E O DIREITO BRASILEIRO.....................................72 3.3.1 A VIDA EMBRIONÁRIA E SUA PROTEÇÃO JURÍDICA............................................74 3.3.1.1 Embrião e Nascituro ...............................................................................74 3.3.1.2 Proteção Jurídica dos Embriões frente ao Princípio da Dignidade Humana................................................................................................................83 3.3.2 CLONAGEM HUMANA, DIREITO E A NOVA LEI DE BIOSSEGURANÇA.....................88
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................ 102
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ........................................ 105
ANEXOS......................................................................................... 114
RESUMO
A atualidade tem vivenciado momentos de adaptações às
novas descobertas biotecnocientíficas, gerando a necessidade do Direito
adequar-se a esta realidade, sob pena de desconfigurar o real significado da
Justiça. Neste sentido, enquanto a Bioética orienta as condutas humanas sob o
ponto de vista ético e moral nas práticas científicas, o Biodireito desempenha o
papel jurídico, criando, desenvolvendo e aplicando as normatizações legais. A
clonagem humana, forma de reprodução, tem suscitado diversas discordâncias no
enfoque mundial, seja esta na forma de clonagem reprodutiva ou terapêutica,
quando busca utilizar embriões congelados em sua prática. Se por um lado o feito
representa uma promessa da ciência na busca da cura de doenças degenerativas
e até para restaurar órgãos e tecidos avariados, por outro lado, suscita profundos
questionamentos éticos e jurídicos, envolvendo a bioética e o biodireito, uma vez
que muitos visualizam nos embriões congelados, uma forma de vida. Diante
desses posicionamentos, foi criada a atual Lei de Biossegurança (Lei nº. 11.105
de 24/03/2005), proibindo as duas formas de clonagem humana, reprodutiva e
terapêutica, porém, abrindo caminho para pesquisas com células-tronco
embrionárias extraídas de embriões excedentes. Contudo, lidar com a questão de
embriões congelados na prática da clonagem humana, é ter consciência de que
se trata de uma discussão que vai muito além desta nova lei, é uma realidade
muito discutida, porém, pouco normatizada pelo Direito Moderno, que encontra
muitas dificuldades em dar suporte jurídico a esta questão. Diversas iniciativas já
foram realizadas, no entanto, verifica-se que o esforço de legislar e regulamentar
este assunto é complexo, uma vez que envolve diretamente a vida, o homem e os
seus valores.
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto estudar os aspectos
ético-jurídicos da utilização de embriões congelados na prática da clonagem
humana, realizando uma análise à luz da atual Lei de Biossegurança brasileira.
O seu objetivo institucional é verificar a importância da
Bioética e do Biodireito, analisando os tipos de clonagem, a utilização de
embriões congelados em práticas reprodutivas, bem como a sua proteção
jurídica, sob o olhar jurídico da Lei de Biossegurança - Lei 11.105/2005.
Para tanto, principiar–se-á, no Capítulo 1, tratando de
Bioética e Biodireito. O objetivo deste capítulo é conceituar a categoria bioética;
analisar-se-á a ética e a moral, bem como os seus princípios norteadores, para
que então entenda-se os problemas bioéticos da atualidade e a construção de um
novo paradigma jurídica no trato destas questões.
No Capítulo 2, trata-se-á sobre clonagem, verificar-se-á seus
aspectos gerais, sua conceituação, o desenvolvimento do assunto ao longo da
história; as duas formas de clonagem, reprodutiva e terapêutica, apresentando as
justificativas positivas e negativas relativas a esta prática.
No Capítulo 3, o foco será os embriões congelados, a
clonagem humana e o direito brasileiro. Diante da complexidade do assunto, este
capítulo começa conceituando embrião, passa a explicar a criopreservação e a
utilização deles em práticas reprodutivas. Em seguida, segue-se à normatização
do tema, falando-se sobre a vida embrionária e a sua proteção jurídica; a
diferenciação entre embrião e nascituro; analisando este tema frente ao Princípio
da Dignidade Humana. Para finalizar este trabalho, realiza-se uma análise geral
do tema clonagem, da polêmica na utilização de embriões sob um aspecto
jurídico, direcionando basicamente a atual Lei de Biossegurança (Lei 11.105/05).
Esta monografia se encerra com as Considerações Finais,
nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da
2
estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a utilização de
embriões congelados na prática da clonagem humana e sua proteção jurídica.
Para a presente monografia foram levantadas as seguintes
hipóteses:
� A Bioética e o Biodireito são instrumentos importantes para o
controle das atividades relacionadas aos avanços
biotecnológicos.
� A clonagem humana não é permitida no sistema normativo
brasileiro.
� Existe no Brasil legislação que regulamente a utilização de
embriões humanos nas atividades biotecnocientíficas.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase
de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados
o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente
Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as
Técnicas, do Referente11, da Categoria12, do Conceito Operacional13 e da
Pesquisa Bibliográfica14.
11 “Referente é a explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para uma atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica e Metodologia da Pesquisa Jurídica. 10.ed. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2007. p. 62.
12 Categoria é “a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica e Metodologia da Pesquisa Jurídica. p. 31.
13 É quando se estabelece ou se propõe uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que se expõe. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica e Metodologia da Pesquisa Jurídica. p. 45.
14 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica e Metodologia da Pesquisa Jurídica. p. 239.
CAPÍTULO 1
BIOÉTICA E BIODIREITO
1.1 BIOÉTICA
A bioética é uma disciplina nova, em contínuo crescimento e
de grande discussão. Envolta em uma série de situações médicas, genéticas,
sociais, culturais, éticas, epistemológicas, religiosas, metodológicas e científicas,
apresenta-se como um campo norteador muito amplo, porém, pouco
sistematizado.
Sendo assim, antes de se adentrar nas questões relativas à
clonagem humana, é primordial realizar-se uma análise pormenorizada acerca da
bioética.
1.1.1 Conceito e desenvolvimento histórico
A aceleração do progresso científico e tecnológico nesses
últimos anos tem direcionado as pessoas a examinar de maneira nova antigos
assuntos.
Com objetivo de dirimir estes questionamentos nasceu a
bioética e com ela uma disciplina nova se desenvolveu de maneira extremamente
rápida. Todavia, a “palavra” não é analisada como ciência específica, haja vista
estar relacionada com diversas ciências e ser percebida de maneira diferente
pelos estudiosos. 15
15 DURANT, Guy. A Bioética: natureza, princípios, objetivos. São Paulo: Paulus, 1995. p. 06 e 07.
4
A palavra bioética apareceu pela primeira vez em 1971 no
título da obra de Van Rens Selaer Potter 16 (Bioetchics: bridge to the future,
Prenctice Hall, Englewood Clifs, New York). Para o autor, sua finalidade era de
auxiliar a humanidade no sentido de participação racional, porém, cautelosa no
processo de evolução biológica e cultural. Seria, portanto, o compromisso com o
equilíbrio e a preservação dos seres humanos com o ecossistema e a própria vida
do planeta. 17
Acerca do entendimento deste autor, descreve Maria Helena
Diniz que:
a bioética seria então uma nova disciplina que recorreria às
ciências biológicas para melhorar a qualidade de vida do ser
humana, permitindo a participação do homem na evolução
biológica e preservando a harmonia universal. Seria a ciência que
garantiria a sobrevivência na Terra, que está em perigo, em
virtude de um descontrolado desconhecimento da tecnologia
industrial, do uso indiscriminado de agrotóxicos, de animais em
pesquisas ou experiências biológicas e da sempre crescente
poluição aquática, atmosférica e sonora. 18
Com posicionamento diverso, foi André Hellegers quem
usou pela primeira o termo bioética para aplicá-lo nas ciências biológicas e à ética
na medicina, ao fundar em julho de 1971, o Joseph and Rose Kennedy Institute
for the Study on Human Reproduction of Bioethics.19
Assim, se para Potter a bioética possuía um sentido amplo,
com fonte conotativamente ecológica e holística, na visão de Hellegers ela dizia
respeito ao ser humano e às biociências humanas. 20
16 Médico oncologista, biólogo e professor americano da Universidade de Wisconsin, Madison-EUA.
17 POTTER, Van Rensselaer. Palestra apresentada em vídeo, no IV Congresso Mundial de Bioética. Tóquio/Japão: 4 a 7 de novembro de 1998. O mundo da saúde, 22 (6) p. 370-347.
18 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2.ed. aum. e atual. de acordo com o novo Código Civil (Lei n. 10.406, de 10-01-2002). São Paulo: Saraiva, 2002. p. 09.
19 OLIVEIRA, Fátima. Bioética – uma face da cidadania. São Paulo: Moderna, 1997. p. 48. 20 OLIVEIRA, Fátima. Bioética – uma face da cidadania. p. 48.
5
Logo, percebe-se que o livro de Potter não tem muita
relação com o contexto atual, pois, para Vieira, “bioética é a combinação de
conhecimentos biológicos e valores humanos”. 21
Ainda, no entendimento desta autora, o vocábulo bioética
indica, “um conjunto de pesquisas e práticas pluridisciplinares, objetivando
elucidar e solucionar questões éticas provocadas pelo avanço das tecnociências
biomédicas”. 22
Com a decifração do código genético humano e os novos
recursos de manipulação científica da natureza, o interesse pelo estudo deste
tema acelerou bastante, isto porque o homem se viu diante de problemas
imprevistos. 23
Para Pessini e Barchifontaine, citados por Vieira, a palavra
“bio”,
“exige que levemos seriamente em conta as disciplinas e as
implicações do conhecimento científico, de modo que possamos
entender as questões, perceber o que está em jogo e aprender a
avaliar possíveis conseqüências das descobertas e suas
aplicações”. 24
A palavra “ética”, por sua vez,
“é uma tentativa para se determinar os valores fundamentais
pelos quais vivemos. Quando vista num contexto social, é uma
tentativa de avaliar as ações pessoais e as ações dos outros de
acordo com uma determinada metodologia ou certos valores
básicos”. 25
21 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. 2.ed. atual. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira, 2003. p. 15.
22 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 15. 23 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 15. 24 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 16. 25 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 16.
6
Em 1978, a palavra bioética foi definida pela Encyclopedia of
Bioethics como sendo, “o estudo sistemático da conduta humana no âmbito das
ciências da vida e da saúde considerada à luz de valores e princípios morais” 26
Na segunda edição, em 1995, passou a considerá-la não
mais como valores e princípios morais, mas como: “(...) o estudo sistemático das
dimensões morais das ciências da vida e do cuidado com a saúde, utilizando uma
variedade de metodologias éticas num contexto multidisciplinar”. 27
Segundo DIAFÉRIA, bioética é:
“(...) um neologismo derivado das palavras gregas mos (vida) e
ethike (ética). Pode-se defini-Ia como sendo o estudo
sistematizado das dimensões morais - incluindo visão, decisão,
conduta e normas morais - das ciências da vida e da saúde,
utilizando uma variedade de metodologias éticas num contexto
interdisciplinar." 28
Ou ainda, nos dizeres de Fabriz, a bioética representa um
estudo acerca da conduta humana no campo da vida e da saúde humana e do
perigo da interferência nesse campo pelos avanços das pesquisas biomédicas e
tecnocientíficas. 29
Desta forma, “bioética está relacionada com todas as
ciências que envolvam seres vivos”. É certo que, desde sua criação, foi
desenvolvida principalmente por profissionais da área da saúde, os quais
analisavam os temas polêmicos da época. Porém, a ciência tecnológica
desenvolveu-se de forma mais rápida que o direito pudesse alcançar. 30
26 SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética. São Paulo: Loyola, 1996. p. 43. 27 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 10. 28 DIAFÉRRIA, Adriana. Clonagem, aspectos jurídicos e bioéticos. São Paulo: Edipro, 1999. p.84.
29 FABRIZ, Daury César. Bioética e direitos fundamentais. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003. p. 75.
30 VARELLA, Marcelo Dias; FONTES, Eliana e ROCHA, Fernando Galvão da. Biossegurança e Biodiversidade – Contexto Científico e Regulamentar. Belo Horizonte: Del Rey, 1999.
7
1.1.2 Ética e Moral no campo da Bioética
Conforme já analisado anteriormente, a Bioética representa
“um estudo acerca da conduta humana no campo da ciência da vida e saúde
humana e do perigo da interferência nesse campo pelos avanços das pesquisas
biomédicas e tecnocientíficas”. 31
Todavia, existem doutrinadores que preferem utilizar outra
terminologia, ou seja, Jean Pierre Marc-Vergnes prefere falar em ética da
biomédica por acreditar que os problemas situam-se preferencialmente na área
médica. 32
Outros, como o filósofo Paul Ricoeur, fazem distinção entre
ética e moral, estabelecendo a primazia da ética sobre a moral.33 Sendo assim,
ressente-se de um estudo mais aprofundado no que tange as definições e
conceitos dos vocábulos ética e moral, para que se possa compreender a
contextualização da palavra Bioética.
A palavra “moral” tem sua origem no latim (mos, moris) e
designa:
“os costumes, a conduta da vida, as regras do comportamento.
Etimologicamente há, então, um sentido muito amplo. Ela se
refere ao agir humano, aos comportamentos cotidianos, às opções
existenciais. Ela faz pensar de maneira espontânea em normas,
regras do comportamento, princípios, valores”. 34
Segundo FABRIZ, a palavra costume, vocábulo de origem
latina (consuetudine), liga-se à idéia de comportamento, regras que regulam
comportamentos aceitos por determinada comunidade. Nessa perspectiva, moral
se traduzirá como:
31 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003. p. 75.
32 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 16. 33 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 17. 34 DURANT, Guy. A Bioética: natureza, princípios, objetivos. p. 09.
8
“aquilo que se refere aos usos e costumes (fatos vividos),
indicando, guiando a ação desenvolvida. “A moral explica e é
explicada pelos costumes. A moral pretende enunciar as regras,
normas e leis que regem, causam e determinam os costumes,
inclusive, muitas vezes, enunciando-lhes as conseqüências”. A
moral é prescritiva”. 35
A moral se relaciona diretamente aos atos humanos, ao seu
agir. De forma ampla, refere-se ao “bem” a ao “mal”, “ao que é necessário fazer”,
por oposição a “o que se faz”. Assim, a moral estabelece princípios, normas de
conduta interna de cada indivíduo, capaz de ser exteriorizada. 36
Dessa exteriorização da moral nasce a ética, as quais,
indubitavelmente encontram-se ligadas num imbricado jogo de mútuas relações.
Assim como a palavra moral tem sua origem no latim, a
palavra ética vem do grego (éthos) e “se refere aos costumes, à conduta da vida,
às regras do comportamento”. 37
Convém destacar o posicionamento de Fabriz:
A ética não está acima da moral, mas pode ser concebida em um
determinado plano como a esfera que se propõe refletir sobre as
posturas que devam ser compreendidas entre as dimensões da
moral e da imoralidade. 38
Logo, ética designa um conjunto de preceitos informadores
da maneira de se proceder, de agir, em relação ao outro e ao conjunto da
sociedade. 39
A ética do ponto de vista da razão tem suas origens nos
princípios dos Direitos do Homem, pois, a noção de igualdade e liberdade impõe o
35 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 79, apud KORTE, Gustavo. Iniciação à ética. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999. p. 114 e 115.
36 DURANT, Guy. A Bioética: natureza, princípios, objetivos. p. 09. 37 DURANT, Guy. A Bioética: natureza, princípios, objetivos. p. 13. 38 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 79. 39 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 78.
9
respeito ao próximo, inclusive no que concerne às suas crenças. Exclui o
dogmatismo. 40
Desta forma, se a ética envolve relações recíprocas entre
indivíduo e coletividade, a bioética tornou-se um campo vasto para a sua
aplicação, uma vez que a ciência está caminhando mais rápido que a reflexão
ética por parte da sociedade. Ainda não foram encontradas respostas para
diversos questionamentos e se espera para que sejam elaboradas normas sobre
a bioética, a fim de legitimar a sua prática ou para proibir experiências julgadas
abusivas. 41
Desta forma, no contexto contemporâneo, a bioética pode
ser vista como uma possibilidade configuradora de um paradigma com finalidade
de criar um novo discurso sobre a vida, estabelecendo uma nova ética, em
resposta à dogmática do discurso científico moderno. 42
Essa nova perspectiva de ética não tem a pretensão de se
colocar como detentora da verdade, mas, tem objetivo de levar em consideração
os vários aspectos que se relacionam com essa complexidade gerada pela
tecnologia e ciência no campo da biomedicina, entendendo-se que a variedade de
idéias possa gerar saídas criativas e humanamente adequadas. 43
1.1.3 Princípios da Bioética
Com objetivo de garantir e defender a dignidade da pessoa
humana, a bioética atua num campo com referenciais práticos, princípios
orientadores do que se considera uma conduta ética em relação à vida. 44
40 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 17. 41 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 17. 42 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 86. 43 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 86. 44 OLIVEIRA, Fátima. Bioética – uma face da cidadania. p. 55.
10
Há muita divergência entre doutrinadores, não se podendo
afirmar com precisão o número exato de princípios que devem ser aplicados. São
várias as orientações no campo da biociência, as quais, podem ser enquadradas
em modelos de análise diferentes, quais sejam: principalista, libertário das
virtudes, casuístico, fenomenológico hermenêutico, narrativo, do cuidado, do
direito natural, contratualista, antropológico personalista.45
Há, ainda, quem afirma que os princípios bioéticos são
classificados em laico e religiosos, estabelecidos durante o processo de formação
dos grupos e centros de estudos de bioética. 46
Todas essas correntes são importantes, pois, não se pode
estabelecer padrões morais com apenas uma perspectiva orientadora.
Entretanto, apesar de todos esses princípios apontarem para uma mesma
direção, sendo esta a consagração e preservação da dignidade humana, ater-se-
a para a visão principialista. 47
Concernente à corrente principialista, teve início com a obra
clássica “Principles of biomedical ethics”, de Beauchamp e James Childress.
Estes dois autores acrescentam que foram criados quatro princípios como
orientadores da ação, sendo: beneficência, não-maleficência, justiça e
autonomia.48 Na visão dos autores, não há hierarquia entre eles, devendo ser
aplicados em conformidade a cada caso concreto. 49
45 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 104. 46 OLIVEIRA, Fátima. Bioética – uma face da cidadania. p. 55. 47 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 105. 48 Convém destacar que outras obras bioéticas descrevem que tais princípios tiveram sua aparição em 1978, no Belmont Report, quando foram publicados pela National Commission for the Protection of Human Subjects of Biomedical and Behavioral Research (Comissão Nacional para a Proteção dos Seres Humanos em Pesquisa Biomédica e Comportamental), que foi constituído pela governo norte-americano com objetivo de realizar um estudo completo, o qual identificasse os princípios éticos básicos que deveriam nortear a experimentação de seres humanos nas ciências do comportamento e na biomedicina. DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 11 e 12.
49 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 105.
11
É comum também, aparecer a expressão “trindade bioética”
para conceituar os princípios elencados, absorvendo o princípio da beneficência o
princípio da não-maleficência, como foi criado com o informe de Belmont. 50
Sendo assim, passa-se a uma análise detalhada de cada um
dos princípios bioéticos.
1.1.3.1 Princípio da Autonomia
Identificado como respeito à pessoa, o princípio da
autonomia, tem por definição “autos”, eu e “nomos”, lei. 51 Diz respeito à
capacidade racional do ser humano de criar leis para si mesmo.52 Significa “a
capacidade de a pessoa governar-se a si mesma, ou a capacidade de se
autogovernar, escolher, dividir, avaliar, sem restrições internas ou externas”. 53
Trazendo para o contexto científico, o princípio da autonomia
requer que o profissional da saúde, tendo consciência dos valores morais e
religiosos de cada pessoa, respeite a vontade do paciente, ou de seu
representante. 54
Segundo Maria Helena Diniz, este princípio,
“Reconhece o domínio do paciente sobre a própria vida (corpo e
mente) e o respeito à sua intimidade, restringindo, com isso, a
intromissão alheia no mundo daquele que está sendo submetido a
um tratamento. Considera o paciente capaz de autogovernar-se,
ou seja, de fazer opções e agir sob a orientação dessas
50 OLIVEIRA, Fátima. Bioética – uma face da cidadania. p. 55. 51 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 109. 52 Significa dizer que cada pessoa é responsável por suas escolhas e deve estar consciente de suas conseqüências.
53 PESSINI, Léo; BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de. Problemas atuais de Bioética. 3.ed. São Paulo: Edições Loyola, 1991. p. 44.
54 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 15.
12
deliberações tomadas, devendo, por tal razão, ser tratado com
autonomia”. 55
É considerado o principal princípio da Bioética, estando os
demais vinculados a ele, pois,
“está diretamente ligado ao livre consentimento do paciente na
medida em que este deve ser sempre informado; em outras
palavras, o indivíduo tem a liberdade de fazer o que quiser, mas
para que esta liberdade seja plena, é necessário oferecer a
completa informação para que o consentimento seja realmente
livre e consciente”. 56
Guy Durant oportunamente descreve que “o direito moderno
dá considerável importância ao atributo pessoa, dando-lhe diversos nomes, como:
autonomia, autodeterminação, inviolabilidade da pessoa”. 57
No entendimento de Fabriz,
“o princípio da autonomia justifica-se como princípio democrático,
no qual a vontade e o consentimento livres do indivíduo devem
constar como fatores preponderantes, visto que tais elementos
ligam-se diretamente ao princípio da dignidade humana”. 58
Quando se trata do princípio da autonomia, o bem jurídico
que se encontra subtendido em seu conceito é “a liberdade de realizar qualquer
conduta que não prejudique a terceiros”.59 Essa liberdade esta consagrada nos
artigos 4º e 5º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789.
Deste modo, é possível e coerente que ocorra a redução da autonomia individual,
em razão de se estar expondo a perigo a saúde de uma dada coletividade. 60
55 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 15. 56 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Juris, 200. p. 07.
57 DURANT, Guy. A Bioética: natureza, princípios, objetivos. p. 33. 58 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 109. 59 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro. Morte encefálica: a Lei de Transplantes de Órgãos. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998. p. 111.
60 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 110.
13
Destarte, este princípio deve ser observado no âmbito das
pesquisas ou aplicação de novas tecnologias que envolvam diretamente
populações, pois, conforme Fabriz:
“quando uma comunidade contribui com suas opiniões, ou mesmo
deixa-se submeter a determinados procedimentos, para que se
realize um estudo, essa comunidade deve ser informada de todos
os riscos. Não cabe a justificativa, para a sonegação de tais
informações, por questões ligadas ao método ou rigor científico.
Realizada a pesquisa, seus resultados sempre devem ser
divulgados, pelo menos na comunidade em que se processou a
verificação”. 61
Logo, qualquer imposição é considerada como agressão à
inviolabilidade da intimidade da pessoa.62 Todavia, por mais que seja um princípio
não tem seu fim em si mesmo, pois jamais poderá prevalecer a vontade individual
sobre a coletiva, quando suas conseqüências forem diversas e exporem a vida
dos demais ao risco.
1.1.3.2 Princípio da Beneficência
Beneficência vem de “bomun facere” que no latim significa
fazer o bem. É o critério mais antigo da ética médica, tendo suas raízes na
medicina.63 No juramento de Hipócrates é dito:
“Aplicarei os regimes para o bem dos doentes, segundo o meu
saber e a minha razão, e nunca para prejudicar ou fazer o mal a
quem quer que seja”. A ninguém darei, para agradar, remédio
mortal nem conselho que o induza à destruição. Também não
fornecerei a uma senhora pessário abortivo (...) Na casa aonde eu
for, entrarei apenas pelo bem do doente, abstendo-me de
qualquer mal voluntário de toda sedução”. 64
61 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 110. 62 OLIVEIRA, Fátima. Bioética – uma face da cidadania. p. 56. 63 PESSINI, Léo; BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de. Problemas atuais de Bioética. p. 44. 64 RAMOS, Sérgio dos Passos. Juramento de Hipócrates. Disponível em: http://www.gineco.com.br/jura.htm. Acesso: 02 maio de 2007.
14
O princípio da beneficência “indica a obrigatoriedade do
profissional de saúde e do investigador de promover primeiramente o bem do
paciente”.65 Tem seu fundamento na regra da confiabilidade. As máximas desse
princípio, enquadrando-se no contexto da citação anterior, que são: “fazer o bem;
não causar dano; cuidar da saúde; favorecer a qualidade de vida; manter o sigilo
médico”. Constitui-se no mais antigo critério da ética médica.66
Este ditame aborda a questão da avaliação do risco e
benefício na utilização de determinado procedimento médico, em cada caso
particular. O médico deve realizar uma avaliação do procedimento a ser utilizado
pelo paciente, para que este não sofra desnecessariamente sem obter resultados,
ou seja, em outras palavras, na sua avaliação os benefícios devem superar os
riscos, assim como os sofrimentos, para valerem a pena. O médico deve informar
o paciente acerca dos riscos e benefícios, além de dar a sua opinião sobre o
caso, mas a decisão final caberá ao paciente, principal interessado, configurando
a ligação deste princípio ao anterior. 67
Sugere, que seria bom beneficiar as pessoas que têm
necessidade, por exemplo, que os médicos proporcionassem assistência à saúde
de pacientes indigentes. Contudo, essas questões não são de simples aplicação,
visto que a medicina, em sentido estrito, constitui-se em uma profissão, e, como
tal, deve-se levar em conta as várias implicações que daí advêm. 68
Cumpre dizer que o médico não está obrigado a realizar o
que o paciente deseja, como citado no juramento de Hipócrates, há valores e
normas legais e serem cumpridos, assim, se a opinião do paciente for adversa as
convicções e valores pessoais do médico, este poderá rejeitar o tratamento,
devendo o paciente procurar outro profissional. 69
Em assim sendo,
65 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 107 e 108. 66 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 108. 67 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. p. 07. 68 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 108. 69 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. p. 08.
15
“o princípio da beneficência deve servir como horizonte para uma
normatização jurídica, a fim de que possa ser compreendido
situações específicas, preceituando e assegurando os direitos e
deveres que dizem respeito à comunidade científica, aos sujeitos
da pesquisa, aos médicos e pacientes, bem como ao Estado”.70
Conceitua-se, também, como:
“A ponderação entre riscos e benefícios, tanto atuais como
potenciais, individuais ou coletivos, comprometendo-se com o
máximo de benefícios e o mínimo de danos e riscos, este é o
princípio da beneficência”. 71
Pondera-se que a beneficência “é uma ação feita em
benefício do alheio, por estabelecer o dever moral de agir em benefício dos
outros”. 72
Este princípio acarreta ao médico uma carga de
responsabilidade muito grande, pois quando se trabalha com questões como
transplantes de órgãos, eutanásia, clonagem, experimentações com seres
humanos, o profissional deve estar apto a reconhecer quando o paciente esta, ou
não, dando consentimento realmente consciente ou quando é fruto somente do
estado emocional em que se encontra.73
Uma normatização jurídica, neste sentido, deve conter
disposições que indiquem as ações a serem estabelecidas como procedimentos
adequados a serem seguidos pelos prestadores de serviços, instituições e
profissionais, voltados para a melhoria da saúde e o bem estar da clientela. 74
70 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 108. 71 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. p. 08. 72 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 15; apud BEAUCHAMP & CHILDRESS. The principles of biomedical ethics. New York, Oxford University Press, 1989. p. 270
73 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. p. 08. 74 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 108.
16
Conforme salienta Fátima de Oliveira, “no caso das
experimentações em humanos, “o bem” da pessoa, sujeito da pesquisa, é
prioritário, em relação aos interesses da sociedade e da ciência”. 75
1.1.3.3 Princípio da Não-Maleficência
Este princípio é um desdobramento do da beneficência, haja
vista conter a obrigação de não causar dano intencional e por decorrer da máxima
da ética médica, “primum non nocere,” 76 o de não impingir a alguém qualquer
dano. 77
O princípio da não-maleficência tem suas origens no
Juramento Hipocrático seguido por todos os médicos. Dessa forma, apresenta-se
como um princípio de relevância na prática moral, já que serve como orientação
efetiva aos profissionais da saúde. Esse princípio exige que não se cause dano
ou mal às pessoas. 78
‘Dano’ é entendido como:
“dano físico, como a dor, morte ou incapacidade, porém, não nega
a importância de outros danos possíveis, como os mentais e
aqueles que impedem a realização dos interesses dos pacientes.
Desse princípio pode-se inferir regras como “não matar”, “não
causar dor”, “não ofender”, que, assim como os princípios,
possuem validade prima facie.79
Significa que jamais se deve praticar algum mal ao paciente.
É a segurança de que danos previsíveis serão evitados. Este princípio, muitas
vezes, entra em choque com o princípio da autonomia, porque nem sempre o que
é melhor na visão do médico o será na do paciente. 80
75 OLIVEIRA, Fátima. Bioética – uma face da cidadania. p. 56. 76 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. p. 08. 77 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 107. 78 BEAUCHAMP, T.L. & CHILDRESS, J.F. Princípios de Ética Biomédica. 4.ed. São Paulo: Edições Loyola, 2002. p. 367.
79 BEAUCHAMP, T.L. & CHILDRESS, J.F. Princípios de Ética Biomédica. p. 367. 80 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. p. 08.
17
Nesta situações, consoante ao descrito no item anterior,
caberá ao profissional tentar persuadir o paciente do contrário e, mesmo que a
cura para a doença seja certa, o médico não pode aplicar o tratamento contra a
vontade do paciente; trata-se de uma questão de livre arbítrio, somente poderá
compeli-lo a aceitar o tratamento caso a doença seja contagiosa, colocando em
risco a saúde da população. 81
Em último caso, se o tratamento for apenas uma tentativa
com alguma probabilidade de dar certo, ou um tratamento para prolongar a vida, o
paciente poderá vir a se recusar. O médico particular, por outro lado, poderá
recusá-lo como paciente, conforme dispõe o art. 7º do Código de Ética Médica82,
no caso de tal recusa, para se eximir de qualquer responsabilidade. Já nos
hospitais públicos, os médicos são contratados pela entidade pública, portanto
são funcionários públicos, não são autônomos, não podendo recusar o paciente.83
Nota-se que, até o momento todos os princípios relatados
estão diretamente ligados entre si, cabendo finalizá-los com o princípio da justiça.
1.1.3.4 Princípio da Justiça
Antes de enfocar este princípio da Bioética, convém discutir-
se sobre uma questão altamente complexa e essencial para o Direito, ou seja, o
que é justiça?
São vários os conceitos existentes para a palavra justiça. 84
Segundo Celeste Cordeiro:
81 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. p. 08. 82 “Art. 7° - O médico deve exercer a profissão com ampla autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços profissionais a quem ele não deseje, salvo na ausência de outro médico, em casos de urgência, ou quando sua negativa possa trazer danos irreversíveis ao paciente”. RAMOS, Sérgio dos Passos. Código de Ética Médica. Disponível em: http://www.gineco.com.br/código.htm. Acesso: 02 maio de 2007.
83 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. p. 08. 84 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 111.
18
“A justiça, sob diversos nomes, governa o mundo, natureza
humanidade, ciência e consciência lógica e moral, política, história
e arte. A justiça é o que há de mais primitivo na alma humana, de
mais fundamental na sociedade”. 85
Os critérios de justiça são vários, e há muito tempo que já se
discute sobre o assunto. Cada pessoa defende seu ponto de vista sobre o que é
ou não justo. Alguns dirão que justo é o que se realiza em conformidade a lei;
outros, a lei deve sempre se adequar ao sentimento de justiça. “Neste sentido,
Direito e justiça sempre se apresentaram como conceitos afins”. 86
Na filosofia Aristotélica a Justiça é elencada como a principal
das virtudes, um bem maior. Para Aristóteles, todas as coisas visam um bem,
sendo o bem maior a justiça. Desdobra a justiça particular em dois tipos: a
distributiva e a corretiva. 87
A justiça distributiva é exercida pelo legislador, ou seja, na
distribuição da honra, riqueza e demais bens da comunidade. Essa justiça, parte
da premissa de que deve-se tratar os desiguais de forma desigual.88 Neste
sentido,
“(...) se as pessoas não forem iguais, elas não terão uma
participação igual nas coisas. (...) Além do mais, isto se torna
evidente porque aquilo que é distribuído às pessoas deve sê-lo de
acordo com o mérito de cada uma. (...) O justo, então, é uma das
espécies do gênero proporcional”. 89
A justiça corretiva é desempenhada pelo juiz ao aplicar
sanções aos delinqüentes após a solução de litígios. O desenvolvimento de seu
85 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro. Morte encefálica: a Lei de Transplantes de Órgãos. p. 45. 86 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 112. 87 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 113. 88 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 113. 89 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Nova Cultura, 1996. p. 198.
19
pensamento filosófico encontra fundamento na idéia de igualdade proporcional,
uma vez que não existe igualdade nem na natureza e nem entre os homens.90
No pensamento Kelsiano, não existe e não pode existir um
critério objetivo de justiça porque a afirmação de que algo é justo ou injusto é um
juízo de valor que se refere a um fim absoluto. Esses juízos são de caráter
subjetivo essencialmente porque são baseados em elementos emocionais da
mente, sentimentos e desejos humanos. Eles não podem ser verificados por
fatos. Ele crê que o juízo sobre valores como liberdade e segurança, por exemplo,
na busca da justiça, baseiam-se em sentimentos, e isto não é objetivo, e não
pode ser levado em consideração.91
Com efeito, Platão, seguindo Sócrates, ofereceu uma
concepção de justiça muito diferente das concepções aristocráticas. A categoria
justiça surge na filosofia platônica como um problema central, do qual, o filósofo
dedicou muitas de suas obras ao estudo. Sócrates concebia a justiça como uma
virtude e não como um conjunto de convenções sociais articuladas e impostas
pela sociedade. 92
Nesse mesmo sentido é oportuno citar ainda JAEGER:
“O conceito platônico do justo está acima de todas as normas
humanas e remonta a sua origem na alma mesma. É na natureza
mais íntima desta onde deve ter seu fundamento o que o filósofo
chama o justo” 93.
Ao tratar de justiça, Platão desenvolve suas idéias como
sendo valores absolutos subordinados ao “bem absoluto”. Em resumo, a justiça
90 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. p. 198. 91 KELSEN, Hans. O que é justiça? Trad. Luis Carlos Borges e Vera Barkow. São Paulo: Martin Fontes, 1998. p. 44.
92 JAEGER, Werner. Paidéia – A Formação do Homem Grego. 3.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1995. p. 755.
93 JAEGER, Werner. Paidéia – A Formação do Homem Grego. p. 756.
20
platônica reside, antes de tudo, na alma humana, em um mistério divino, como
sua qualidade precípua e critério do melhor e mais feliz tipo de vida ao homem. 94
John Rawls apresenta uma Teoria da Justiça, na qual
defende uma idéia de justiça baseada no indivíduo, estando este acima dos
interesses sociais. É uma forma de teoria contratualista de Justiça. No entanto, a
idéia de contrato de Rawls, diferencia-se da idéia dos demais contratualistas
consagrados, como Hobbes, Locke e Rousseau. Isto porque, apesar de Rawls
também partir de um estado de natureza, ou de uma posição original, o contrato
social não é o elemento desencadeador do Estado ou do Governo, mas sim, a
forma pela qual os indivíduos vão eleger entre si os princípios de Justiça. 95
“Trata-se de uma sociedade na qual todos aceitam e sabem que os outros
aceitam os mesmos princípios de justiça”. 96
Diante da exposição de princípios que devem ser aplicados
no campo das ciências da vida, este destaca-se como sendo o mais elevado, pois
surge para garantir uma distribuição justa, eqüitativa e universal dos bens e
serviços da saúde, implicando uma atitude positiva, de fazer do Estado frente aos
cidadãos no que tange ao direito à saúde, e, ainda, por envolver valores que
devem ser respeitados pela sociedade. 97
1.1.4 Problemas bioéticos da atualidade: construção de um novo paradigma
A Bioética está relacionada com todas as ciências que
envolvam seres vivos. É certo que, desde sua criação, foi desenvolvida
principalmente por profissionais da área médica, na qual foram discutidos
diversos temas polêmicos, tais como aborto, eutanásia, controle de
financiamentos em pesquisas, entre outros. Mas, hoje em dia, a bioética começa
a ter por objeto, também, outras áreas do conhecimento humano, em destaque
94 PLATÃO. A República. São Paulo: Martin Claret, 2000. 95 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 117. 96 RAWLS, John. Uma teoria da justiça. São Paulo: Martins Fontes, 1997. p. 3 – 5. 97 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 119.
21
com o desenvolvimento de novas técnicas de engenharia genética, que
constantemente colocam em voga os limites éticos das pesquisas científicas.
Com as novas possibilidades do controle dos genes
humanos, percebe-se que os paradigmas vigentes já não conseguem resolver os
problemas sociais, sendo necessário repensar o próprio modo de entender a
sociedade. 98
As preocupações se voltam para as várias conseqüências e
incertezas que o desenvolvimento científico pode ocasionar no plano da Ética e
do Direito. 99
A ciência juntamente com a biomédica vem demonstrando
ser capaz de mudar a natureza humana, recriar o homem. Temas como
reprodução assistida, eugenia, fertilização in vitro, transferência de embriões,
experimentações com animais, fertilização interespécies, formas anômalas de
procriação (fusão celular, partenogênese e clonagem), interrupção de gravidez,
anencéfalos, embriões excedentes, entre outros também polêmicos e atuais da
Bioética, geram grandes dúvidas para a sociedade, necessitando-se de novos
elementos para delimitar a ação de médicos, pesquisadores, do homem, enfim,
em suas práticas cotidianas. 100
1.2 BIODIREITO
Face às inovações científicas, o ser humano deixou de ser
somente sujeito de direito e tornou-se objeto de manipulações. Restaram
98 VARELLA, Marcelo Dias; FONTES, Eliana e ROCHA, Fernando Galvão da. Biossegurança e Biodiversidade – Contexto Científico e Regulamentar. Belo Horizonte: Del Rey, 1999. p. 140.
99 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 122. 100 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 124.
22
fragilizadas as antropologias que sempre serviram de parâmetro às preliminares
da ética e do Direito. 101
Desta forma, “todos esses aspectos nos remetem para as
relações que devem ser reavaliadas entre ciências, Estado e sociedade”,102 pois
as questões relativas à Bioética vêm eivadas de complexidade, haja vista
tratarem-se de questões científicas, filosóficas, econômicas e jurídicas, da qual a
interdisciplinaridade é notória.103
1.2.1 Conceito e aspectos relevantes
Em decorrência desse desenvolvimento biotecnológico
nasceu o Biodireito como o ramo do Direito que estuda, analisa e cria parâmetros
legais, acerca dos assuntos relacionados a Bioética, caracterizando-se como
sendo o elo de ligação entre esta e o Direito. 104
Partindo de uma conceituação didática, biodireito é:
“O ramo do Direito que trata, especificamente, das relações
jurídicas referentes à natureza jurídica do embrião, eutanásia,
aborto, transplante de órgãos e tecidos entre seres vivos ou
mortos, eugenia, genoma humano, manipulação e controle
genético, com o fundamento constitucional da dignidade da
pessoa humana (art.1°, III, da Constituição Federal)”. 105
Utilizando-se dos ensinamentos de Fernandes, pode-se
dizer:
101 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Biodireito. Ciência da vida, os novos desafios. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001. p. 104.
102 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 127. 103 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Biodireito. Ciência da vida, os novos desafios. p. 116.
104 SILVA, Reinaldo Pereira. Introdução ao Biodireito: investigações político-jurídicas sobre o estatuto da concepção humana. São Paulo: LTr, 2002. p. 12.
105 DireitoNet. Biodireito. Disponível em: http://www.direitonet.com.br/dicionario_juridico. Acessado: 03 de maio de 2007.
23
“Na verdade, o biodireito nada mais é do que a produção
doutrinária, legislativa e judicial acerca das questões que
envolvem a bioética. Vai desde o direito a um meio-ambiente
sadio, passando pelas tecnologias reprodutivas, envolvendo a
autorização ou negação de clonagens e transplantes, até
questões mais corriqueiras e ainda mais inquietantes como a
dicotomia entre a garantia constitucional do direito á saúde, a falta
de leitos hospitalares e a equânime distribuição de saúde à
população”.106
Permanecendo num contexto jurídico, pode afirmar-se que:
“O Biodireito surge na esteira dos direitos fundamentais e, nesse
sentido, inseparável deles. O Biodireito contém os direitos morais
relacionados à vida, à dignidade e à privacidade dos indivíduos,
representando a passagem do discurso ético para a ordem
jurídica, não podendo, no entanto, representar “uma simples
formalização jurídica de princípios estabelecidos por um grupo de
sábios, ou mesmo proclamado por um legislador religioso ou
moral. O Biodireito pressupõe a elaboração de uma categoria
intermediária, que se materializa nos direitos humanos,
assegurando os seus fundamentos racionais e legitimadores”. 107
O Direito deve, intervir no campo das técnicas biomédicas,
quer seja para legitimá-las, quer seja para regulamentar ou proibir outras. Por isso
a lei é sempre invocada;
“não só porque as leis servem como “meios” perante as
finalidades que são os valores, mas e sobretudo porque sua
ocorrência é expressão inquestionável de segurança, de limites,
dos valores comuns da comunidade que sente necessidade de
sua determinação via normativa, como parâmetro de conduta
observável por todos. Porque o Direito procura organizar a
106 FERNANDES, Thyco Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do biodireito: aspectos do direito de família e do direito das sucessões. Florianópolis: Diploma Legal, 2000. p. 42.
107 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 288, apud, BARRETO, Vicente de Paulo. Bioética, biodireito e direitos humanos. In: MELLO, Celso de Albuquerque et al. Teoria dos direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 410.
24
conduta de cada um no respeito e promoção dos valores que
servem de base à civilização”. 108
Convém ressaltar que o Direito, por si só, não desempenha
um papel totalmente viável, é necessário a legitimidade jurídica mediatizada pelo
debate com os cientistas. “O direito se constrói em relação as suas descobertas,
mas também a partir dos riscos que as novas técnicas criam para a condição
humana”. É da junção e cooperação destes dois mundos que se determinam
condutas, posturas e sanções a serem aplicadas por toda comunidade humana. 109
Cabe, então, ao Biodireito, estabelecer um liame entre
Direito e Bioética na observação dos princípios orientadores para preservação da
vida e o respeito do homem como pessoa. 110
1.2.2 Bioética, Biodireito e Humanismo Jurídico
No contexto atual, a lei se revela um instrumento maleável
para regular as questões relativas à Bioética. Conforme anteriormente já visto,
que ambas as disciplinas, Bioética e Biodireito, devem caminhar juntas. Isto, na
concepção de Santos pode-se auferir:
“É para que a lei possa interferir rapidamente, se ajustar às novas
conquistas tecnológicas e, sendo objeto de largo debate
parlamentar (...), vem imantada da legitimidade capaz de garantir
a validade de sua inserção no meio social concretizando o escopo
último de qualquer empreendimento do sujeito de Direito: o
resgate da dignidade humana”. 111 (grifou-se)
108 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Biodireito. Ciência da vida, os novos desafios. p. 104.
109 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Biodireito. Ciência da vida, os novos desafios. p. 118.
110 FABRIZ, Daury Cesar. Bioética e Direitos Fundamentais. p. 137 e 138. 111 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Biodireito. Ciência da vida, os novos desafios. p. 119.
25
Outro aspecto de suma importância se relaciona com a
dignidade da pessoa humana, esta a qual, tem fundamento normativo na
Constituição da República Federativa do Brasil / 1988, conforme o seu art. 1º,
inciso III:
“Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal,
constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como
fundamentos:
(...)
III - a dignidade da pessoa humana;”112
Para Ingo Wolfgang Sarlet, a dignidade da pessoa humana
é:
“a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz
merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do
Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo
de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto
contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano,
como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas
para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua
participação ativa e co-responsável nos destinos da própria
existência e da vida em comunhão com os demais seres
humanos”. 113
Com o reconhecimento da importância à dignidade humana,
a bioética e o biodireito passam a ter um sentido humanista, estabelecendo um
liame com a justiça. Os direitos humanos, decorrentes da condição humana e das
necessidades fundamentais de toda pessoa, dizem respeito à preservação da
112 Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil (1988), Senado Federal, Brasília, 2007. A partir desse momento utilizar-se-á a sigla CRFB/88.
113 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Cosntituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 60.
115 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 19
26
integridade e da dignidade dos seres humanos e à plena realização de sua
personalidade. 115
A bioética e o biodireito andam necessariamente juntos com os
direitos humanos, não podendo, por isso, obstinar-se em não ver
as tentativas da biologia molecular ou da biotecnociência de
manterem injustiças contra a pessoa humana sob a máscara
modernizante de que buscam o progresso científico em prol a
humanidade. Se em algum lugar houver qualquer ato que não
assegure a dignidade humana, ele deverá ser repudiado por
contrariar as exigências ético-jurídicas dos direitos humanos. 116
Assim sendo, “intervenções científicas sobre a pessoa
humana que possam atingir sua vida e a integridade físico-mental deverão
subordinar-se a preceitos éticos e não poderão contrariar os direitos humanos”.
As práticas médicas e científicas, que prometem trazer grandes benefícios à
humanidade, contêm riscos potenciais muito perigosos e imprevisíveis, e, por tal
razão, estes profissionais devem estar atentos para que não ultrapassem os
limites éticos impostos pelo respeito à pessoa humana e à sua vida, integridade e
dignidade. 117
Proteger a dignidade do homem é proteger a vida e o direito,
porquanto, “o direito à vida é o fundamento de todos os direitos. A ética da vida se
insere por essa via na universalidade dos valores. Quem diz dignidade humana
diz justiça”. 118
Todos os seres humanos, os aplicadores do direito e em
especial os biólogos, os médicos, os geneticistas e os bioeticistas devem manter
uma luta constante em favor do respeito à dignidade humana, sem acomodações
e com coragem, para que haja efetividade dos direitos humanos. “A consciência
destes é a maior conquista da humanidade, por ser o único caminho para uma era
de justiça, solidariedade e respeito pela liberdade e dignidade de todos”.
116 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 20. 117 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 19 e 20. 118 SILVA, Reinaldo Pereira. Introdução ao Biodireito: investigações político-jurídicas sobre o estatuto da concepção humana. p. 12.
27
Assim, a bioética e o biodireito fazem parte desta conquista,
por serem instrumentos valiosos para a recuperação dos valores humanos. 119
Diante dos argumentos e explicações anteriores, seguir-se-á
ao segundo capítulo, o qual tem por objetivo estar fazendo reflexões acerca da
clonagem humana.
119 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 20; apud DALLARI, Dalmo de Abreu. Humanismo Jurídico, Juízes para a Democracia, 1998; Bioética e direitos humanos, in Iniciação à bioética, cit., p. 236-41.
28
CAPÍTULO 2
CLONAGEM
2.1 ASPECTOS GERAIS
Tópico específico do Biodireito, a clonagem humana é um
dos temas que tem gerado diversas discussões e posicionamentos divergentes
em vários países.
Há quem diga, que a clonagem humana é um dos
instrumentos de ficção científica, meio de manipulação mental por parte dos
governos mundiais em uma população quase que totalmente leiga neste assunto,
condicionando comportamentos e atingindo objetivos contrários aos que a
clonagem pode oferecer.120
Outros, dizem que este além de ser o mais importante
avanço tecnológico e científico da atualidade, é resultado da própria evolução do
homem e de seu conhecimento, abrindo, desta forma, novos horizontes de
exploração, estudo e desenvolvimento; diriam outros que aproxima-se o final dos
tempos, quando o homem a “brincar de fazer pessoas” e ocupar o lugar de Deus,
desrespeitando todos os princípios religiosos, almejando criar uma humanidade
voltada ao consumo e as exigências de mercado, vendendo, comercializando e
criando pessoas como se fossem meros instrumentos inanimados.121
Sendo assim, convém iniciar-se um estudo referente a
clonagem, analisando seu conceito, questões históricas, formas, para que então,
havendo pleno entendimento sob estes aspectos, possa-se evoluir ao estudo da
utilização de embriões congelados na prática da clonagem humana, realizando,
por fim, sua análise ética e jurídica.
120 DIAFÉRIA, Adriana. Clonagem, aspectos jurídicos e bioéticos. p.139. 121 DIAFÉRIA, Adriana. Clonagem, aspectos jurídicos e bioéticos. p.139 e 140.
29
2.2 DEFINIÇÃO
A palavra clone foi criada em 1903 pelo botânico Herbert J.
Webber enquanto pesquisava plantas no Departamento de Agricultura dos
Estados Unidos. Segundo Webber, o termo vem da palavra grega “Klón”, que
significa broto vegetal. É basicamente um conjunto de células, moléculas ou
organismos descendentes de uma célula e que são geneticamente idênticas a
célula original.122
Desta forma, a clonagem é um processo de reprodução
assexuada, na qual são obtidos indivíduos geneticamente iguais (microorganismo,
vegetal ou animal) a partir de célula-mãe.123 É um mecanismo comum de
propagação de espécies e plantas, bactérias e protozoários.
Quanto a definição de clonagem humana, pelo fato de
diversos grupos e organizações a conceituarem de forma diferente, a Associação
Médica Americana (AMA) criou uma definição específica, sendo, “(...) a produção
de organismos geneticamente idênticos através da transferência nuclear de
células somáticas”. 124
Pode ser definida, também, “como uma forma de reprodução
assexuada, na qual o objetivo principal é produzir seres idênticos, perpetuando
características genéticas desejáveis”. 125
Na visão brasileira, a Lei de Biossegurança126 conceitua
clonagem em seu artigo 3º, inciso VIII, como:
“Art. 3º. Para os efeitos desta Lei, considera-se:
122 LEITE, Leonardo. Clonagem. Rio de Janeiro, 2005. Disponível em: <http://www.ghente.org /temas/clonagem>. Acessado em 10 de abril de 2006.
123 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 442. 124 AMA. Cloning and Embryo Research. 1997. Disponível em: http://www.ama-assn.org/ama/pub/category/13564.html. Acessado em 02 de abril de 2006.
125 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. Rio de Janeiro: Editora Interciência, 2005. p. 21.
126 BRASIL. Lei nº. 11.105 de 24 de março de 2005. Brasília, 2005.
30
(...)
VIII – clonagem: processo de reprodução assexuada, produzida
artificialmente, baseada em um único patrimônio genético, com ou
sem utilização de técnicas de engenharia genética”.
Sendo base deste estudo a atual lei de biossegurança,
utilizar-se-á este conceito em diante.
2.3 HISTÓRICO
Ao contrário do que possa parecer, as técnicas de clonagem
são utilizadas há muitos séculos pelos seres humanos. Sendo que as plantas
foram os primeiros seres clonados. Aliás, até hoje, utiliza-se muito a reprodução
assexuada para multiplicar plantas. 127
Em 1894, o zoólogo alemão Hans Dreisch trabalhando com
ouriços-do-mar pegou um embrião de duas células e sacudindo dentro de um
béquer cheio de água do mar fez com que as células se separassem, dando
origem a dois ouriços adultos.128
O embriologista Hans Spemman, em 1902, usou um fio de
cabelo de seu filho como uma faca para separar um embrião de salamandra,
também dando origem a dois indivíduos.129
Para a maioria dos doutrinadores, os primeiros resultados
positivos da clonagem em animais foram obtidos com sapos, em 1952. 130 Robert
Briggs e Thomas King, através da técnica de transferência nuclear de células
127 PEREIRA, Lygia V. O Admirável Mundo Novo da Clonagem - Bioética e Biorrisco: Abordagem Transdicisplinar / Silvio Valle, José Luiz Telles (organizadores). Rio de Janeiro: Interciência, 2003. p. 32.
128 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
129 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
130 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. 2005. p. 01.
31
embrionárias, geraram sapos adultos, a partir de células de girinos, embriões de
sapo. 131
Segundo BONFIM, em 1962, J.B. Gurdon do Reino Unido,
utilizando de raios ultravioletas destruiu o núcleo de um óvulo de um tipo de sapo
originário da África do Sul, após, inseriu o núcleo de uma célula do intestino de
girinos e obteve girinos aparentemente normais, embora não tenham chegado à
fase adulta, o que, segundo o Prof. Dr. Francisco Jerônimo Salles Lara,
“talvez tenha ocorrido porque os raios ultravioleta podem ter
interferido na reserva de ácidos ribonucléicos maternos, que só há
poucos anos sabemos serem importantes. Pode ser também que
os núcleos usados para serem inseridos no óvulo desnucleado
não estivessem na fase certa do ciclo celular“.132
Por sua vez, em 1970 foram realizadas pesquisas em
embriões de ratos e, nove anos depois, com ovelhas. 133
Na década de 80, Peter Hoope (biólogo americano) e Karl
Illmensee (micro cirurgião suíço)134, desenvolveram um método para criar clones
diverso à transferência nuclear utilizada em sapos, a bipartição de embriões.
“Com este método, a partir de um embrião bovino ou de ovelha mecanicamente
dividido ao meio, são gerados de dois a quatro animais geneticamente
idênticos”.135
Entre os anos de 1981 a 1984, os embriologistas norte
americanos Davor Solter e McGrath após realizarem pesquisas e experiências
131 PEREIRA, Lygia V. O Admirável Mundo Novo da Clonagem - Bioética e Biorrisco: Abordagem Transdicisplinar / Silvio Valle, José Luiz Telles (organizadores). p. 32.
132 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 21. 133 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
134 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 21. 135 PEREIRA, Lygia V. O Admirável Mundo Novo da Clonagem - Bioética e Biorrisco: Abordagem Transdicisplinar / Silvio Valle, José Luiz Telles (organizadores). p. 33.
32
visando clonar embriões de ratos, chegaram a conclusão que “a clonagem de
mamíferos via transferência de genes era “biologicamente impossível””. 136
No ano de 1990, ocorreu o primeiro grande sucesso de
Roslin Institute (Edimburgo, Escócia), a ovelha Tracy, transgênica de humanos.
“Tracy produz grande quantidade de ATT (alfa-I-antitripsina), substância usada
para o tratamento de enfisema e fibrose cística, porque recebeu um gene humano
que produz ATT”. 137
A expressão "clonagem humana" começou a ser divulgada
com maior intensidade em 1993, sendo que em 18 de outubro deste mesmo ano,
foi anunciada a clonagem de embriões humanos pelos cientistas e pesquisadores
norte-americanos, Jerry Hall e Robert Stillman (Universidade Católica de George
Washington, EUA).138 Segundo eles, a clonagem foi conseqüência da tentativa de
aumentar as possibilidades de fertilização in vitro.139
No ano de 1995, ocorreu a clonagem de duas ovelhas a
partir de células embrionárias de nove dias chamadas de "Megan" e "Morag", da
raça Welsh Moutain, obtidas por clonagem tradicional.140 Em seguida, 1996, a
equipe do cientista Ian Wilmut (Roslin Institute, Edimburgo, Escócia), anunciaram
o nascimento com êxito das ovelhas.141
O grande salto científico ocorreu em 23 de fevereiro de
1997, quando o Instituto Roslin, revelou ao mundo o primeiro clone de um
mamífero adulto. A ovelha Dolly tinha sete meses.142 Dolly, foi clone da raça Finn-
136 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 21. 137 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 21. 138 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 21. 139 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 28. 140 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
141 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 22. 142 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
33
Dorset e sua clonagem foi de ultima geração, ou seja, utilizou-se óvulo
desnucleado de uma ovelha e núcleo de célula somática de outra ovelha. 143
A ovelha Dolly foi fruto de anos de intensa pesquisa,
buscando-se a diferenciação de uma célula, a qual fosse capaz de acessar todos
os seus genes, o seu genoma e ainda, chegar no resultado principal, produzir um
ser completo. 144
“Ela foi gerada pelo método de transferência nuclear com
pequenas modificações que fizeram o experimento funcionar m
mamíferos. Uma célula da mama de uma ovelha de seis anos foi
fundida a um óvulo vazio de outra ovelha – ou seja, um óvulo sem
material genético nenhum. O óvulo resultante dessa fusão
continha como única receita a ser seguida o genoma da célula da
mama, ou seja, o genoma da ovelha de seis anos. Cinco meses
depois, a ovelha “barriga de aluguel” para onde o embrião foi
transferido deu a luz à ovelha Dolly, um clone daquela ovelha
doadora da célula da mama”. 145
Ainda, em 24 de maio de 1997, os mesmos pesquisadores e
cientistas que apresentaram a ovelha Dolly, anunciam um novo clone de ovelha
que demonstra mais claramente como a técnica pode ser usada para beneficiar a
saúde humana.146 Polly tinha um gene humano, o que a fazia produzir uma
proteína usada no combate da fibrose cística, a proteína alfa-1-antitripsina. Polly
possui irmãs também programadas para fabricar fibrinogênio e proteína C
ativada.147
143 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 22. 144 PEREIRA, Lygia V. O Admirável Mundo Novo da Clonagem - Bioética e Biorrisco: Abordagem Transdicisplinar / Silvio Valle, José Luiz Telles (organizadores). p. 34.
145 PEREIRA, Lygia V. O Admirável Mundo Novo da Clonagem - Bioética e Biorrisco: Abordagem Transdicisplinar / Silvio Valle, José Luiz Telles (organizadores). p. 34.
146 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
147 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 22. “A finalidade da clonagem de ovelhas como Polly, portadora de material genético humano, é obter produtos de interesse terapêutico, tais como proteínas humanas do sangue e do leite. Polly recebeu um gene humano para produzir uma proteína que atua na coagulação do sangue. Ela deverá produzir leite contendo a proteína chamada fator 9, utilizada no transplante da hemofilia tipo B”. VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 31.
34
O Comitê de Ética do governo dos Estados Unidos, em
junho de 1997,
“recomendou ao Congresso a adoção de leis que permitam que
alguns pesquisadores criem embriões que poderiam gerar clones
humanos, porém esses embriões não poderão ser implantados
em mulheres para se desenvolver”.148
O ano de 1998 foi de grandes mudanças e inovações para o
mundo científico bem como para a sociedade mundial. No primeiro semestre
pesquisadores japoneses apresentaram os primeiros clones de vacas adultas no
Japão e de Marguerite, a bezerra clonada dos franceses.149 Eles nasceram no
Instituto de Pesquisa do Gado de Ishikawa e comprovaram “que pelo caminho
teórico que originou Dolly consegue-se “fabricar”, inclusive, humanos”. 150
No início de janeiro, pesquisadores da Reprogenesis
(Boston – EUA) “anunciaram uma técnica para produzir próteses naturais de seios
a partir da multiplicação em laboratório de células extraídas do próprio corpo da
mulher”. O desígnio era eliminar a rejeição, fazendo com que as células
colocadas sobre um molde de plástico em formato de seio multiplicassem até
cobri-lo.151
Neste mesmo ano, no dia 22 de julho, foi anunciada a
realização da clonagem em série pela Universidade do Havaí, na qual,
experimentou-se clonar clones de clones de camundongos, originando três
gerações idênticas. 152
Um dia depois, as duas empresas que colaboraram na
criação de Dolly e dos ratos clonados no Havaí, a ProBio América e a PPL
148 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 30. 149 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
150 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 22. 151 VIEIRA, Teresa Rodrigues. Bioética e Direito. p. 31. 152 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
35
Therapeutics, se juntaram para a criação de clones de porcos geneticamente
alterados, objetivando empregar seus órgãos em transplantes.153
Ainda, em novembro de 1998, a empresa americana
Advanced Cell Technology deixa em alerta a comunidade científica ao anunciar
que há dois anos já havia introduzido DNA humano em um óvulo de vaca sem
núcleo. 154
Contudo, além dos fatos mencionados, dois que ocorreram
em 1998 que de extrema relevância. Primeiro, quando os cientistas sul-coreanos
“anunciaram a clonagem de um embrião humano a partir de células adultas de
uma mulher. O embrião foi destruído”. Outro ocorreu quando James Thomson e
John Gearhart, cientistas norte-americanos, “isolaram as primeiras células-tronco
de um embrião humano em estágio bem inicial de desenvolvimento e assim
colocam na ordem do dia a clonagem terapêutica”.155
No ano seguinte, precisamente em 26 de abril de 1999,
americanos anunciaram o nascimento dos primeiros clones de cabras adultas
contendo um “gene humano para produção de uma proteína específica no
leite”.156
Em 1999, “cientistas norte-americanos anunciaram que
obtiveram um embrião humano via clonagem tipo Dolly”.157
Todavia, ao mesmo tempo que as inúmeras descobertas
começaram a apresentar seus resultados, os quais acionaram debates e geraram
preocupações à comunidade científica.
153 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 31. 154 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
155 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 22. 156 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
157 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 22.
36
Na França, por exemplo, houve grandes discussões sobre
os efeitos da clonagem a curto e a médio prazo. Segundo eles “a longo prazo
ninguém se arrisca a fazer previsões”. 158
“Cientistas do Instituto Nacional de Pesquisa Agronômica da
França, tornaram público que uma vaca obtida por eles, via
clonagem tipo Dolly, aparentemente normal ao nascer, morreu de
anemia com apenas sete semanas de vida. A autópsia revelou
que o baço e os nódulos linfáticos não se desenvolveram
normalmente”. 159
Nesta mesma problemática, em 26 de maio de 1999, foi
publicada mundialmente a notícia sobre os sinais de envelhecimento precoce da
ovelha Dolly. 160
Mesmo com os resultados frustrantes em 1999,
pesquisadores persistiram nas pesquisas e, em 14 de março de 2000, americanos
apresentaram o nascimento de cinco porquinhos (Millie, Christa, Alexis, Carrel e
Dotccom) clones de porcas adultas. O principal objetivo focava-se na criação de
suínos capazes de fornecer órgãos para transplantes. 161
Além dos porcos, outros animais também foram foco de
pesquisas, entre eles está a Tetra, clone de um macaco Rhesus162 e a bezerra
Vitória163, um clone tradicional divulgado pelos pesquisadores da Empresa
Brasileira de Pesquisas Agropecuárias (Embrapa).164
158 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23. 159 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23. 160 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
161 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
162 O nascimento de Tetra foi divulgado por pesquisadores do Centro de Primatas de Bearveton, nos Estados Unidos da América.
163 “A bezerra Vitória coloca o Brasil na linha de frente da pesquisa de clonagem. Clone de um embrião, a vaca nasceu em um laboratório da Embrapa. Nenhum outro país em desenvolvimento havia feito tal avanço desde então”. LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/indexhistórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
164 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23.
37
Com o deslumbre da possibilidade de clonar outros animais
e diante dos resultados que estavam ocorrendo, no ano de 2001 deu-se
prosseguimento a clonagem em macacos, vacas, ovelhas, cabras, porcos,
coelhos, ratos e outros animais. 165
Logo, estenderam-se as pesquisas para os animais em
extinção, nascendo em 08 de janeiro de 2001, um gauru (tipo de gado asiático),
porém, morreu dias depois. 166
No mês de agosto de 2001, a Academia Nacional de
Ciências dos EUA promoveu uma audiência com os três mais notórios defensores
da clonagem humana para fins reprodutivos, os médicos Panos Zavos, Severino
Antinori e a química Brigitte Boisselier, diretora da Clonaid. Neste mesmo dia,
afirmaram que o primeiro clone humano não demoraria muito a nascer. 167
Em setembro na Itália, ocorreu a primeira clonagem bem
sucedida de um animal em extinção, a ovelha mouflon (animal ameaçado de
extinção).168
A fim de comprovar a eficácia nas pesquisas realizadas, em
23 de novembro de 2001 foi anunciado em jornais de todo o mundo que clones
levavam uma vida normal.169 Cita-se:
“A revista Science publicou dados de uma pesquisa, anunciada
como a mais completa já realizada sobre saúde e comportamento
dos clones, que informa que 80% deles levam uma vida saudável
e se reproduzem normalmente. A pesquisa, realizada pela
Advanced Cell Tecnology (ACT) e coordenada por Robert Lanza,
analisou dados de 30 vacas clonadas, das quais 24 estão vivas e
saudáveis. A ACT produziu cerca de 500 embriões clonados, que
165 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23. 166 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
167 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
168 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
169 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23.
38
foram implantados em 250 vacas, mas apenas 110 engravidaram.
Destas, 80 abortaram e 30 pariram 30 clones, dos quais 6
morreram logo após o nascimento”. 170
Esta mesma pesquisa foi apresentada em um simpósio
sobre o consumo de carne e leite de clones. Durante as discussões a empresa
Infligen informou que seus cento e dezessete clones de vacas estavam
aparentemente saudáveis.171 Todavia, deixou claro seu posicionamento sobre o
assunto ao dizer:
“os dados são interessantes, mas a tecnologia ainda é arriscada.
Verificando que 73% das gestações terminaram em aborto e 20%
dos clones morreram, vimos que a clonagem é improdutiva. Mais
importante, fica evidente que é criminoso clonar uma pessoa”. 172
Em contrapartida a citação anterior, em 25 de novembro de
2001, a empresa Advanced Cell Technology informou que produziria embriões
humanos a partir de clonagem. “A empresa diz que não tem intenção de usar a
técnica para fins reprodutivos e, sim, para cura de doenças”. Esta informação
desencadeou uma enorme polêmica no contexto mundial.173
O ano de 2002 trouxe muitos questionamentos e
preocupações científicas. Já no início do ano, em 04 de janeiro, foi anunciado o
envelhecimento precoce da ovelha Dolly pelo Instituto Roslin.174
Em fevereiro, a PPL Therapeutics (empresa fundada nos
EUA pelos criadores de Dolly) apresentou novos clones de porcos. Desta vez,
preocuparam-se em retirar um gene responsável pela rejeição de órgãos suínos
170 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23. 171 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23. 172 Revista O Globo. O Mundo / Ciência e vida. Clone leva uma vida normal, diz estudo. 23 de novembro de 2001, p. 33.
173 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
174 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
39
quando transplantados para pessoas. “Um dia depois, a Universidade do
Missouri, diz ter obtido o mesmo avanço”.175
No dia 11 de fevereiro de 2002, estudo publicado na revista
“Nature Genetics” da Grã-Bretanha, afirma que animais clonados morrem mais
cedo que os concebidos naturalmente. Depois da informação que a ovelha Dolly
sofria de artrite (inflamação nas articulações) precoce, cientistas japoneses
clonaram doze ratos afim de analisar o seu ciclo de vida. Dez deles morreram
precocemente. De acordo com os pesquisadores os animais clonados
apresentaram as seguintes características: pneumonia severa, falência do fígado
e tumores, obesidade, disfunções imunológicas e problemas genéticos. Segundo
o cientista Atsuo Ogura, responsável pela pesquisa,
“o estudo ressalta as controvérsias da técnica de clonagem.
Oguro afirma que a técnica ainda não é dominada pela ciência e
não poderia ser aplicada em seres humanos. “Os possíveis efeitos
a longo prazo da clonagem, assim como a alta incidência de
abortos e nascimentos de animais clonados defeituosos, só
aumentam nossos receios em relação à clonagem humana para
fins reprodutivos”. 176
Em conformidade ao pensamento de Ogura, o bioeticista
Donald Bruce, do Projeto de tecnologia e Religião da Church of Scotland´s
175 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
176 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23; apud, OLIVEIRA, Fátima. Clonagem e manipulação da genética humana: mitos, realidade, perspectivas e delírios. O “estado da arte” da reprodução humana assistida em 2002. – Brasília: Ministério da Justiça, Secretaria de Estado dos Direitos da Mulher, 2002, p. 56.
40
Society, “disse à BBC177 que o estudo japonês é um ótimo exemplo de como a
clonagem pode ser perigosa, caso aplicada em seres humanos”. 178
Ainda, em 14 de fevereiro de 2002, foi apresentado à mídia
o primeiro clone de animal de estimação, a gatinha Cc, pela Universidade A & M
do Texas. Ela nascera em dezembro de 2001, após 188 tentativas. 179. Em, 06 de
março de 2002, foi publicado no "Wall Street Journal" a reportagem em que a
pesquisadora chinesa Lu Guangxiu da Escola de Medicina de Xiangya, diz ter
produzido dezenas de embriões humanos por clonagem desde 1999. 180
Em conferência médica em Dubai, abril de 2002, Severino
Antinori diz, nos Emirados Árabes, que uma mulher estava na oitava semana de
gestação de um clone. Ante o anúncio, a empresa Clonaid diz já ter implantado no
útero de várias mulheres embriões produzidos a partir de clonagem. 181
No Brasil, em 11 de julho de 2002, foi realizado o primeiro
clone de um animal adulto, a bezerra Penta, sobrevivendo apenas cinco semanas
em decorrência de uma infecção generalizada.182
No mês de novembro de 2002, Severino Antinori anunciou
para janeiro de 2003 o nascimento de um clone humano.
177 “A BBC (British Broadcasting Corporation), é uma emissora pública de rádio e televisão do Reino Unido fundada em 1927. Possui excelente reputação nacional e internacional, sendo frequentemente considerada a mais respeitada estação de televisão do mundo. Por vezes é chamada afetuosamente pelos ingleses como Beeb, The Corporation ou Auntie. Durante muitos anos foi o único fornecedor de rádio e depois de televisão do Reino Unido. O seu lema é "Nation Shall Speak Peace Unto Nation". Antes era chamada de British Broadcasting Company Ltd., nome que permaneceu até 1927”. WIKIPÉDIA, Enciclopédia Livre. Embrião. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Embri%C3%A3o>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
178 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 23; apud, OLIVEIRA, Fátima. Clonagem e manipulação da genética humana: mitos, realidade, perspectivas e delírios. O “estado da arte” da reprodução humana assistida em 2002. p. 56.
179 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
180 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
181 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.
182 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
41
Por sua vez, fechando o ano de 2002, ocorreu no mês de
dezembro inúmeras divulgações. De forma sintetizada, foram destaque as
notícias: “EUA não sabem como agir em relação ao suposto bebê clonado”;
“Laboratório para clonagem humana no país seria barrado, afirma CTNBio”;
“Unesco pede proibição da clonagem humana reprodutiva”; “Coréia do Sul
investiga possível caso de clonagem humana”; “Conselho europeu pede
ratificação de acordo contra clones humanos”; “Governo sérvio proibe clonagem
humana como método de fertilização”; “Lista de espera para clonagem tem 2.000
pessoas, dizem raelianos”; “Primeiro clone humano "vai para casa" hoje, afirma
seita”; “Suposto clone humano gera discussão sobre ética médica”; “Suposta
clonagem humana recebe duras críticas”; “Casal brasileiro será submetido à
"clonagem" em 2003, diz seita”; “Estados Unidos investigam suposta clonagem
humana”; “Lei que proibirá clonagem irá ao Senado francês no início de 2003”;
“Site de laboratório aceita encomenda de "clone" por R$ 700 mil”; “Vaticano
chama nascimento de clone de "mentalidade brutal"”.183
Também foram notícias:“Mundo espera por provas de
nascimento do clone "Eva"”; “França pede apoio internacional contra clonagem
humana”; “Criança clonada será uma velha aos 30 anos, diz cientista russo”;
“Nasce o primeiro clone humano, diz movimento raeliano”; “Bush quer proibir
qualquer tipo de clonagem humana nos EUA”; “Anúncio de nascimento de clone
causa ceticismo entre cientistas”; “Raelianos esperam abrir laboratório de
clonagem no Brasil”; Geneticista francês acha improvável o nascimento do clone
humano”; “Cientistas alemães também duvidam do nascimento de bebê clonado”;
“Antinori duvida de nascimento de clone humano”; “Movimento raeliano anuncia
nascimento de outros bebês clonados”; “Para ONU, anúncio do nascimento de
clone não será aceito como fato”; “Clonagem reprodutiva divide comunidade
internacional”; “Unifesp inicia a elaboração do código de ética de manipulações
genéticas”; “Antinori: clone humano nascerá em um mês na Sérvia”; “Cientistas
usam clonagem para criar dente”; “Universidade de Stanford entra na era da
clonagem terapêutica”; “Senado belga vota lei autorizando a clonagem
terapêutica”; “Cientistas descobrem causa da pouca eficácia de óvulos 183 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.
42
congelados”; “Rato e homem: genoma do roedor mostra grandes semelhanças”. 184
Dentre os citados, convém ressaltar o ocorrido em 27 de
dezembro, quando a empresa Clonaid, ligada à seita Movimento Raeliano,
anunciou o nascimento do primeiro clone humano, uma menina chamada Eva.
Outros clones dos raelianos teriam nascido depois disso, segundo a empresa.185
Morreu no dia 14 de fevereiro de 2003, a ovelha Dolly.
Veterinários deram à ovelha uma injeção letal, depois de descobrir sinais de uma
doença pulmonar progressiva. A necropsia revelou que Dolly teve câncer. 186
Em maio do mesmo ano, nasceu o primeiro clone de um
clone no Brasil, porém a experiência resultou sem êxito, a bezerra Vitória morreu
trinta e seis horas depois de seu nascimento, em uma fazenda da Embrapa, em
Brasília. Segundo veterinários, ela aspirou líquido na hora do parto e acabou
tendo pneumonia. 187
No dia 06 agosto de 2003, divulga-se a noticia da criação do
primeiro clone de um cavalo adulto. Segundo os cientistas italianos, Prometea,
nasceu com 36 quilos e muita saúde no dia 28 de maio, após uma gestação
normal. 188
Um mês depois, nasceu a bezerra Lenda, da Embrapa,
clone de uma vaca valiosa, que morrera meses antes. 189
184 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.
185 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
186 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
187 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
188 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.
189 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
43
Com o intuito de regularizar as pesquisas científicas, no dia
11 de dezembro de 2003, a Câmara Baixa do Parlamento francês aprovou um
projeto de lei que tornou a clonagem reprodutiva humana um crime contra a
humanidade, suscetível de punição com trinta anos de prisão e multa de 7,5
milhões de euros. 190
Três dias depois, cientistas da Advanced Cell Technology
anunciam que conseguiram repetir a produção de embriões humanos por
clonagem alcançando o estágio de 16 células. 191
O ano de 2004, por sua vez não foi diferente. Em janeiro, o
especialista em fertilização Panos Zavos implantou um embrião humano
produzido por clonagem no útero de uma mulher, contudo, a experiência não
resultou em gravidez.192
Ainda em janeiro, após a morte da vaca Vitória, primeiro
clone do Brasil, nasceu, a bezerra Vitoriosa, sua cópia. Contudo, em 30 de maio
de 2004 faleceu de um ataque do coração.193
Em 12 de fevereiro de 2004, cientistas sul-coreanos
anunciaram a produção de uma “linhagem de células-tronco pluripotentes a partir
de dezenas de embriões produzidos a partir de clonagem”. 194
Seis dias depois, diante dos acontecimentos, Dom Elio
Sgreccia, afirmou que, "A clonagem tem um procedimento que vai contra a
natureza". Em declarações à imprensa, repetiu sua opinião ao dizer:
190 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
191 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.
192 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
193 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.
194 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
44
"com relação à doutrina ética, a clonagem é um ilícito dos mais
graves no que se refere à reprodução humana, e consideramos a
clonagem chamada terapêutica igualmente ilícita". "É mais,
agregou, em alguns aspectos é pior, porque pressupõe a
reprodução de um embrião, em estado de blastócito avançado, e
em segundo lugar está a morte das células tronco". 195
Como de praxe, o mês de dezembro gerou grandes
discussões, haja vista a americana Genetic Savings & Clone apresentar o
primeiro clone de estimação feito por encomenda, o gato Little Nick, que custou
US$ 50 mil dólares. 196
Face aos acontecimentos no ano anterior, 2005 foi um ano
de relevância em dois aspectos: uma ciência voltada ao bem estar humano, e
uma ciência voltada ao ego humano, ou seja, de um lado houveram grandes
pesquisas e descobertas acerca das células-tronco e de outro lado vê-se o
superego humano ao clonar animais campões, de porte e estirpe.197
Prova disto, ocorreu em 26 de fevereiro de 2005 com o
nascimento de Pieraz-Cryozootech-Stallion, primeiro clone de um cavalo
campeão castrado. 198
Em maio de 2005, “cientistas da Universidade Nacional de
Seul anunciam a obtenção de várias linhagens de células-tronco, a partir de
195 NOTÍCIAS ECLECIASTES. “Dom Sgreccia: A clonagem tem um procedimento que vai contra a natureza”. Roma. 18 de fevereiro de 2004. Disponível em: <http://www.eclesiales.org/portugues/ arquivo/0402-3.htm>. Acessado em 10 de outubro de 2007.
196 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
197 JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO ONLINE. Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/ clippings/do _mes.php. Acessado em 09 de fevereiro de 2007.
198 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
45
clonagem”; sendo apresentado o primeiro clone de um cão, em 03 de agosto de
2005, pelo grupo da Universidade Nacional de Seul.200
Enfim, também em dezembro de 2005, grandes foram as
repercussões de notícias voltadas às experiências de clonagem: “Pioneiro na
clonagem acusado de fraude está sob investigação”; “Fraude leva à demissão de
pioneiro da clonagem” e “Seul restringe entrada em laboratório de clonagem de
embriões”. 201
Aos doze dias do mês de janeiro de 2006, ocorreu o fato
mais excêntrico em comparação aos anos anteriores, ou seja, cientistas de
Taiwan criaram o primeiro porco totalmente fosforescente. Segundo os cientistas:
"Os nossos são os únicos no mundo verdes de dentro para fora.
Até o coração e os órgãos internos deles são verdes", afirmou Wu
Shinn-Chih, do Instituto e Departamento de Ciência e Tecnologia
Animal. (...) Os cientistas dizem ter injetado o DNA de águas-vivas
em cerca de 250 embriões de porcos, que foram implantados em
oito porcas. Quatro delas emprenharam”.202
A idéia objetiva estudar o combate a doenças humanas.
“Como o material dos porcos é verde, ele pode ser facilmente visto sem a
necessidade de operações invasivas”.203
Ante a incessante corrida cientifica, no mês de maio, no
Brasil, pesquisadores discutiram em Belo Horizonte sobre o código mundial de
200 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
201 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.
202 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.
203 GLOBO ONLINE. Clippings. Clonagem. 2004. Disponível em: <http://www.ghente.org/temas/ clonagem/index histórico.htm>. Acessado em 17 de novembro de 2006.
46
conduta para cientistas. Além disso, a Unesco apresentou uma versão traduzida
da Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos. 204
Outro grande passo neste sentido, ocorreu em Genebra,
quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou uma nova série de
padrões para o registro de testes clínicos, visando buscar maior transparência em
testes com humanos. Para o diretor-geral-assistente da OMS, Timothy Evans,
"o objetivo principal de identificar padrões é aumentar a
transparência. Registro de todos os testes clínicos e a liberação
total da informação essencial, no momento do registro, são
fundamentais para garantir transparência na pesquisa médica e
cumprir as responsabilidades éticas para com pacientes e
participantes dos estudos".205
Em agosto de 2006, o Irã reporta a primeira clonagem
animal no país, um carneiro, que morreu minutos depois do nascimento. As
pesquisas realizadas fazem parte de um programa do Irã de se tornar um centro
regional para tecnologia médica, espacial e nuclear. Disse Morteza Hosseini,
membro da equipe de clonagem no Instituto Isfahan, "nós aprendemos muito
sobre clonagem durante o experimento. Isto nos deu mais esperanças para os
próximos casos". 206
Não obstante, o maior destaque ocorreu no dia 24 de agosto
de 2006, quando cientistas americanos conseguiram produzir duas linhagens de
células-tronco embrionárias sem causar a morte dos embriões utilizados.207
As notícias que se espalhavam mundialmente em dezembro
de 2006 demonstravam a concorrência, bem como, o avanço acelerado de alguns
países na corrida pela “grande descoberta”. Deste mês, destacaram-se quatro
204 JORNAL DA CIÊNCIA apud Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/ clippings/ do_mes.php. Acessado em 09 de fevereiro de 2007.
205 GLOBO ONLINE. Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/clippings/do_mes.php. Acessado em 09 de fevereiro de 2007; apud, Estadao.com.br.
206 GLOBO ONLINE. Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/clippings/do_mes.php. Acessado em 09 de fevereiro de 2007; apud, Estadao.com.br.
207 GLOBO ON LINE. Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/clippings/do_mes.php. Acessado em 09 de fevereiro de 2007; apud, Folha Online.
47
reportagens: “EUA declaram que consumo de produtos de animais clonados "é
seguro"; “Grupo de cientista condenado faz primeiro clone de cadela”; “Primeira
gata clonada do mundo tem filhotes”; “Parlamento australiano aprova clonagem
terapêutica”. 208
O ano de 2007, logo em janeiro, demonstra uma certa
maturidade por parte dos governantes em discutir e legislar sobre os assuntos
bioéticos e a persistência dos cientistas em dar continuidade aos avanços já
realizados. Neste mês, o jornal Korea Times informou a clonagem de um poodle,
pela equipe do professor Lee Byung-Chun do Instituto de Medicina Veterinária da
Universidade Nacional de Seul (SNU). Segundo o jornal, "o poodle é o quinto cão
clonado, mas se trata do primeiro desta raça, o que marca um novo avanço na
clonagem animal”. 209
Em fevereiro foram notícias: “Há 10 anos, Dolly, a ovelha
clonada, chegava às manchetes”; “Reino Unido vai autorizar doação de óvulos
para clonagem”; “Camundongos são clonados a partir de células da pele”;
“Comitê deve resistir a lobby de empresas, defende Sociedade de Bioética”;
“Brasil ganha política de desenvolvimento da biotecnologia”; e “Mulheres chinesas
procuram congelamento de óvulos”. 210
Prosseguindo, março de 2007 ficou caracterizado pela
ousadia dos sul-coreanos em voltarem a realizar pesquisas. Após, alguns anos de
fraudes descobertas, processos e asilos políticos, sul-coreanos poderão utilizar
novamente células-tronco embrionárias em seus estudos, para tentar recuperar o
prestígio perdido após o escândalo mundial gerado pela fraude de clonagem
cometida por um importante cientista do país.211
208 GLOBO ONLINE. Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/clippings/do_mes.php. Acessado em 09 de fevereiro de 2007; apud, Folha Online.
209 GLOBO ONLINE. Clippings. Disponível em: <http://www.ghente.org/clippings/do_mes.php> Acessado em 09 de fevereiro de 2007; apud, Ultimo Segundo.
210 FOLHA ONLINE apud Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/clippings/do_mes.php> Acessado em 05 de março de 2007.
211 FOLHA ONLINE apud Clippings. Disponível em: <http://www.ghente.org/clippings/do_ mes.php> Acessado em 05 de março de 2007.
48
Ainda em março, a equipe da Universidade Nacional de
Seul, que já havia obtido o primeiro cão clonado, um afghan hound chamado
Snuppy, em 2005, apresentou dois lobos de uma espécie nativa e em extinção,
denominados de Snuwolf e Snuwolffy. Para a realização foram transferidos
duzentos e cinqüenta e um embriões reconstruídos para o útero de doze lobas,
que conseguiram gerar dois filhotes vivos.212
Contudo, a alegria dos sul-coreanos não perdurou por muito
tempo. Cerca de duas semanas após o anúncio dos clones lobos, a Universidade
Nacional de Seul afim de apurar as possíveis irregularidades na atuação dos
cientistas, abriu uma investigação. O comitê investigador da universidade,
acredita que houve uma possível manipulação de dados, assim como outras
atividades irregulares da equipe de Lee. Foi a manchete:
“(...) Lee fez parte da equipe do controverso Hwang Woo-souk,
que assegurou ter realizado a primeira clonagem de células-tronco
de embrião humano em 2004 --o que posteriormente se
demonstrou falso. O escândalo em nível mundial de Hwang foi o
motivo da proibição na Coréia do Sul da pesquisa com células-
tronco, embora, recentemente, o governo tenha permitido sua
retomada. (...) A Universidade Nacional de Seul informou que o
laboratório continuará aberto, porque já foram colhidas as
amostras de sangue dos lobos clonados e não existe risco de a
equipe de Lee ocultar provas”. 213
Além do vexame ocorrido, tiveram evidência em abril as
manchetes: “Príncipes conservarão células-tronco do cordão umbilical de sua filha
Sofia”; “Equipe sul-coreana errou mas não manipulou clonagem, diz painel”;
“Cerca de 50% dos casais aceitam doar embriões para pesquisa”; “Arcebispo de
São Paulo e músico "duelam" no debate sobre células-tronco”; “Ministério da
Saúde financia pesquisas com células-tronco”; “Supremo Tribunal Federal tenta
definir o início da vida”; “Reunido com católicos, Bush ataca pesquisa de células-
212 ESTADAO.COM.BR apud Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/clippings/ do_mes. php. Acessado em 05 de março de 2007; apud, Fonte: Estadao.com.br.
213 FOLHA ONLINE apud Clippings. Disponível em: http://www.ghente.org/clippings/do_mes.php> Acessado em 05 de março de 2007.
49
tronco”; “Senado dos EUA aprova fundos para pesquisa com células-tronco”;
“Inglaterra restringirá fertilizações com mais de um embrião”. 214
Os meses de maio e junho de 2007 não revelam grandes
descobertas. Nesse período, cientistas e profissionais da saúde decidiram se
dedicar ao estudo das células-tronco, evolução dos cromossomos e genes ligados
as doenças.215
Enfim, há mais de cem anos o tema clonagem tem gerado
polêmicos debates, tanto de ordem científica como ética. Sobre a relevância do
assunto, escreve BONFIM:
“Toda a polêmica relacionada à clonagem humana deve-se ao
fato desta não ser compreendida apenas como uma nova
tecnologia, pois envolve questões relacionadas à nossa própria
humanidade, como conceitos de identidade, individualidade, o
significado da procriação e a moralidade da manipulação de vidas
humanas”.216
Neste sentido, seguem as sábias palavras de DIAFÉRIA:
“(...) se a ciência hoje é uma manifestação sociocultural, que
influencia nossa vida social, que modifica nossos sistemas de
valores, não é somente por causa das novas representações que
nos propõe à realidade, como a clonagem seus reflexos, mas,
principalmente porque gerou muitas práticas, técnicas e máquinas
que transformaram nossa maneira de viver. E se toda mudança
acarreta muitas conseqüências, em todos os níveis do
conhecimento e da existência humana, toda humanidade precisa
estar participando conscientemente desta nova etapa de sua
própria evolução”.217
Diante de tantos avanços científicos e tecnológicos, não se
pode permitir que a sociedade em si permaneça apenas como sujeito observador. 214 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
215 LEITE, Leonardo. Clonagem. Disponível em: http://www.ghente.org/temas/clonagem/index histórico.htm. Acessado em 17 de novembro de 2006.
216 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 20. 217 DIAFÉRRIA, Adriana. Clonagem, aspectos jurídicos e bioéticos. p.141.
50
Ainda que se queira ou não participar de forma ativa nas pesquisas, é
extremamente importante que cada cidadão tenha pleno conhecimento destas
descobertas218.
2.4 CLONAGEM HUMANA E SUAS FORMAS
O nascimento da ovelha Dolly levou cientistas de várias
partes do mundo a refletir sobre a possibilidade de realizar a mesma técnica em
seres humanos. Especialistas em reprodução humana acreditaram que a
clonagem seria um método alternativo de reprodução assistida e desde então
divulgaram suas intenções em clonar embriões humanos. 219
Assim, “o que, antigamente, só víamos em filme de ficção
científica, da noite para o dia virou uma realidade mais próxima do que jamais
pudemos imaginar”. 220
Desde então, são considerados dois tipos de clonagem
humana, a clonagem reprodutiva e a clonagem terapêutica. Ambas utilizam
embriões humanos, mas apresentam técnicas e resultados diferenciados,
carecendo, portanto de análises diferentes, tanto do ponto de vista científico como
de benefícios e riscos. 221
2.4.1 Clonagem Reprodutiva
A clonagem para fins reprodutivos é pretendida para
produzir uma duplicidade de indivíduos preexistentes.222
218 DIAFÉRRIA, Adriana. Clonagem, aspectos jurídicos e bioéticos. p.141. 219 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 18. 220 ALMEIDA, Aline Mignon de. Bioética e Biodireito. 2000. p. 55. 221 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 20 222 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 25.
51
Baseia-se na remoção do núcleo de um óvulo e substituição
por um outro núcleo de outra célula somática. Após a fusão, vai havendo a
diferenciação das células Após cinco dias de fecundação, o embrião agora com
200 a 250 células, forma um cisto chamado blastocisto. É nesta fase que ocorre a
implantação do embrião na cavidade uterina. O blastocisto apresenta as células
divididas em dois grupos: camada externa (trofoectoderma), que vai formar a
placenta e o saco amniótico; e camada interna que dará origem aos tecidos do
feto. Após o período de gestação surge um indivíduo com patrimônio genético
idêntico ao do doador da célula somática.223 O ser obtido através desta técnica
possui as mesmas características genéticas do doador da célula clonada, sendo,
portanto, um clone, uma cópia do ser original.224 (Vide figura em anexo)
Acerca do procedimento, BONFIM descreve em sua obra o
seguinte exemplo:
“Para entendermos como tudo funcionaria, imagine que queiramos
recriar, clonar, um dos grandes gênios da ciência, o físico alemão
Albert Einstein (1789 – 1955). Primeiramente, seria necessário
obter uma célula de Einstein, contendo o material genético, ou
seja, o DNA. Então, o núcleo dessa célula seria retirado e
transplantado para um óvulo cujo núcleo tinha sido retirado
previamente. Em seguida, essa célula-ovo seria implantada no
útero de uma mulher para o prosseguimento da gestação. Ao
nascer, esse bebê seria um clone, isto é, possuiria o mesmo DNA,
as mesmas características genéticas do Albert Einstein”. 225
Todavia, é importante que se saiba que um clone não é uma
cópia literal do seu original. Além das diferenças físicas que podem aparecer,
dificilmente terão as mesmas características psicológicas. Isto, porque as
características não são determinadas por fatores genéticos, mas estão
223 ZATZ, Mayana. Clonagem e células tronco, 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br>. Acessado em 11 de abril de 2006.
224 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 07. 225 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 25.
52
diretamente relacionadas ao momento histórico e as questões ambientais em que
o individuo encontra-se situado. 226
2.4.1.1 Justificativas para a prática da clonagem reprodutiva
Com o intuito de promover as pesquisas e realizar a
clonagem reprodutiva, são basicamente oito as justificativas e razões
apresentadas.
Primeiramente, pode-se citar o “desejo de uma pessoa em
perpetuar-se a si mesma por transferência de núcleo de célula somática ou
diferenciada, pois o clone seria uma cópia idêntica do adulto que cedeu o
DNA”.227 Ou, ainda, utilizar a clonagem para promover cópia de alguns indivíduos
e raças em detrimento de outras.228
A segunda justificativa, segunda Maria Helena Diniz, é “a
vontade de reproduzir um ser querido já falecido, ou em vias de falecer”. Todavia,
conforme a própria autora escreve, transferir o núcleo de uma de suas células,
“recuperando-o”, não traria de volta o filho ao pai, pois o clone não vai herdar os
caracteres culturais e a personalidade de sua matriz. 229
Outra justificativa é a
226 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 25. Pessini e Barchifontaine “sustentam que pode ser teoricamente possível reproduzir um indivíduo geneticamente idêntico ao doador, sendo certo que este indivíduo não terá as mesmas características. Embora geneticamente idênticas duas pessoas jamais seriam inteiramente idênticas física e psicologicamente, pois as características observáveis de um indivíduo dependem da inteiração de seus genes com o ambiente. Genótipo não é o mesmo que fenótipo (carga genética herdada) e o ambiente em que vive). O ambiente pode auxiliar na determinação de algumas características físicas. Assim, um gêmeo ou um clone podem ter genes alterados por mutações produzidas pelo ambiente”. VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Biodireito. p. 29, apud Leo Pessini e Christian de Paul de Barchifontaine. Fundamentos da Bioética. P. 126.
227 Permitir a clonagem por meio desta justificativa, significa incentivar egos vaidosos e permitir devaneios de perpetuação. Exemplo prático ocorreu quando Saddam Hussein resolveu criar um sócia de si próprio. Segundo cientistas, o ditador ficou frustrado ao saber que o clone seria apenas uma cópia física sua, mas não emocional ou intelectual. DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 446, apud MARTHA, Marco Antonio Bandeira. Clonar é legal? Bioética, p. 280.
228 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 30. 229 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 448.
53
“pretensão de repetir o genótipo de pessoas valorizadas ou que
alcançaram sucesso em qualquer área, como o de um artista, de
um esportista, de um religioso, de um filósofo, de um estadista, de
um cientista ou de um jurista”.230
Nesse ponto, surgem dois questionamentos, um referente a
subordinação do clone ao estilo de vida, a personalidade que construirá ao longo
de sua vida, sua interação com o meio ambiente e com as pessoas; e o outro diz
respeito a criação de um banco de células de celebridades.231
O quarto motivo para a prática da clonagem reprodutiva é “a
obtenção de um clone humano descerebrado como repositório de tecidos ou
órgãos a serem utilizados em transplantes para seu modelo ou para outrem”. 232
Em quinto, está a justificativa:
“A transferência de núcleo para evitar uma moléstia hereditária
transmitida por via materna, fazendo-se um clone do marido ou de
outra pessoa, por exemplo, usando o óvulo desnucleado da
mulher, que, então, teria seu próprio filho, sem a informação
citoplasmática e, conseqüentemente, sem problemas congênitos.
Com isso a reprodução com clones poderia pôr fim às doenças
degenerativas ou genéticas”. 233
Ainda, há quem afirme que a clonagem humana será um
meio para garantir a gravidez. Segundo Maria Helena Diniz,
230 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 448. Vide nota de rodapé 205. 231 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 449. 232 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 449. Sobre o assunto, entende VIEIRA que “a clonagem humana com intuito de montar banco de células utilizáveis na medicina vai contra o principio ético da dignidade humana, elaborado pelo filósofo alemão Emmanuel Kant. Segundo tal princípio, um indivíduo nunca deve ser pensado como um meio, sempre como um fim, o que não ocorreria quando se criasse a vida humana apenas para armazenar material terapêutico”. VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 31.
233 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 449. Segundo BONFIM, a justificativa de evitar a ocorrência de doenças genéticas, ocorreria “em casos em que casais, por serem portadores de um mesmo gene causador de uma doença específica, e que, por isso, correm o risco de gerar crianças afetadas por doenças genéticas, também poderia-se utilizar a clonagem como um método de reprodução alternativo. Como na clonagem utiliza-se uma célula adulta como receita de formação de um novo ser, seria possível conhecer, através de testes genéticos preditivos, as características genéticas do indivíduo a ser clonado, o que evitaria e/ou reduziria o risco de geração de crianças afetadas por doenças de caráter genéticos”. BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 28.
54
“(...), diante da dificuldade encontrada para obter, na reprodução
assistida, um embrião proveniente do casal, seria tentar cloná-lo
por meio de fissão gemelar, separando as células embrionárias
iniciais para transferir ao útero materno três ou quatro embriões
obtidos por clonação. Com isso haveria maior probabilidade de a
gestação vingar, dando lugar a um bebê ou a gêmeos univitelinos,
produzidos artificialmente”. 234
Em entrevista ao Jornal O Estado de São Paulo, o médico
Miltom Nakamura, apesar de declarar que não realizaria a clonagem por razões
éticas, afirmou que a técnica “pode ser proveitosa no processo de fertilização in
vitro quando a mulher fabrica apenas um ou dois óvulos, quantidade que reduz as
chances de engravidar”. Com a divisão dos embriões ter-se-ia o dobro de óvulos
produzidos por ela.235
A sétima justificativa consiste na realização da “produção
independente”. Aqui, a atuação sexual masculina estaria dispensada na
clonagem, haja vista a desnecessidade da participação do gameta masculino.
“Por outro lado, a obtenção de um ser humano sem conexão com a sexualidade
não seria uma afronta à dignidade humana?”. 236
Por fim, a oitava justificativa, segundo entende Maria Helena
Diniz, é a cura de algumas moléstias. Contudo, seria ético e jurídico usar o
embrião humano como meio de salvar outrem, “desrespeitando o princípio de que
o homem é um fim e não um meio e de que a vida e a dignidade humanas
constituem o limite para a experimentação científica?”. 237
Em 1994 a Comissão Nacional de Ética em Reprodução,
dos Estados Unidos, coletou várias justificativas para a clonagem de seres
234 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 449. Aplicar-se-ia a clonagem reprodutiva para casos de infertilidade. Assim, “a clonagem seria utilizada como um método alternativo, para permitir que casais que não tenham obtido sucesso através de outros métodos de reprodução assistida tenham filhos. Como exemplo, em casos em que o pai sofre de azoospermia, ou seja, não produz número suficiente de espermatozóides, este contribuiria com a doação da célula a ser clonada e a mãe participaria com os óvulos e com a gestação”. BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 28.
235 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 28. 236 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 449. 237 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 449.
55
humanos, como a reprodução em casais inférteis, produção de embriões para
venda e para pesquisas de terapias gênicas. Alguns cientistas declaram que não
existe nada que impeça esta prática ou possa deter a curiosidade e o ímpeto
científico. 238
Todavia, estas justificativas suscitaram e ainda hoje
suscitam polêmicos e controversos debates acerca da utilização da clonagem
com tais finalidades.239
Conforme preceitua Louis-Marie Houdebine (diretor de
pesquisa agronômica no Instituto Nacional da França), “para dada experiência,
consiste em saber quais as precauções convém tomar antes de definir práticas
totalmente novas”, ou seja, deve-se realizar uma avaliação dos riscos.240
2.4.2 Clonagem Terapêutica
Diante das justificativas supra citadas, a clonagem para fins
reprodutivos é reprovada pela maioria dos cientistas e pela sociedade. Todavia,
existe uma grande preocupação no âmbito da comunidade científica com relação
à proibição do desenvolvimento das pesquisas em clonagem humana de forma
extrema, ou seja, proibir qualquer forma de clonagem. 241
Segundo Bonfim,
“Tal preocupação se justifica pelo fato de que proibir a clonagem
humana em geral significa proibir não somente a clonagem
reprodutiva, mas também as aplicações da técnica para o uso
238 DIAS, Edna Cardozo. Clonagem e Direito. 2007. Disponível em: <http://www.sosanimalmg.com.br>. Acessado em 21 de setembro de 2007. Doutora em Direito, profª. de Direito Ambiental, conselheira da ABMCJ/MG, membro do CONAMA (O Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA é o órgão consultivo e deliberativo do Sistema Nacional do Meio Ambiente-SISNAMA, foi instituído pela Lei 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, regulamentada pelo Decreto 99.274/90), membro da comissão de Meio Ambiente da OAB/MG.
239 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 28. 240 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 28. 241 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 39.
56
terapêutico, para o entendimento dos processos de
desenvolvimento celular, entre outros”. 242
No o art. 3º, inciso IX, da Lei 11.105 de 24 de março de
2005, clonagem terapêutica é “clonagem com a finalidade de produção de
células-tronco embrionárias para a utilização de qualquer tecido de um
organismo”.243
Em outras palavras,
“A clonagem terapêutica é um procedimento cujos estágios iniciais
são idênticos a clonagem para fins reprodutivos, difere somente
no fato do embrião não ser introduzido em um útero. Ele é
utilizado em laboratório para a produção de células-tronco a fim de
produzirem tecidos ou órgãos para transplante. Esta técnica tem
como objetivo produzir uma cópia saudável do tecido ou do órgão
de uma pessoa doente para transplante”. 247
Para compreensão do procedimento, vide figura em anexo.
Por sua vez, as células-tronco são:
“(...) componentes do embrião em seu estágio inicial de
desenvolvimento, são células que possuem a capacidade de se
diferenciar em vários outros tipos celulares especializados. Além
disso, as células-tronco também se multiplicam por longos
períodos, mantendo suas características indiferenciadas. Isto
significa que as células-tronco somente se diferenciam em um tipo
242 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 39. 243 BRASIL. Lei nº. 11.105 de 24 de março de 2005. Brasília, 2005. 247 LEITE, Leonardo. Clonagem. Rio de Janeiro, 2005. Disponível em: <http://www.ghente.org /temas/clonagem>. Acessado em 10 de abril de 2006.
57
celular se receberem uma “ordem” para tal. Caso contrário
mantêm-se indiferenciadas”. 248
As células-tronco são classificadas em dois tipos: células-
tronco embrionárias e células-tronco adultas. A classificação se dá de acordo com
a sua origem e pelo tempo de desenvolvimento das células.
De acordo com a classificação pelo origem, segue a citação:
“As células-tronco embrionárias são particularmente importantes
porque são multifuncionais, isto é, podem ser diferenciadas em
diferentes tipos de células. Podem ser utilizadas no intuito de
restaurar a função de um órgão ou tecido, transplantando novas
células para substituir as células perdidas pela doença, ou
substituir células que não funcionam adequadamente devido a um
defeito genético (ex.: doenças neurológicas, diabetes, problemas
cardíacos, derrames, lesões da coluna cervical e doenças
sangüíneas). As células-tronco adultas não possuem essa
capacidade de se transformar em qualquer tecido. As células
musculares vão originar células musculares, as células de fígado
vão originar células de fígado, e assim por diante”. (grifo ausente
no original).249
Analisando o tempo de desenvolvimento, classificam-se em
totipotentes e pluripotentes.
Células-tronco totipotentes são,
“(...) as células que compõem o embrião durante os primeiros
quatro dias após a fertilização, quando este divide-se em células
idênticas. Cada uma dessas células, se separadas, possuem a
capacidade de gerar um novo embrião individualmente, processo
que caracteriza a formação dos gêmeos univitelinos (...). Podem
originar qualquer tipo de tecido do organismo.250
Já as células-tronco pluripotentes,
248 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 39. 249 LEITE, Leonardo. Clonagem. Rio de Janeiro, 2005. Disponível em: <http://www.ghente.org /temas/clonagem>. Acessado em 10 de abril de 2006.
250 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 40.
58
“(...) são as células dos embriões com mais de quatro dias, que
podem formar uma vasta gama de tecidos. Contudo, estas células
já não possuem a capacidade de, individualmente, gerar novos
embriões. Portanto, se forem separadas, não darão origem a
gêmeos univitelinos”.251
Assim, o grande objetivo a clonagem para fins terapêuticos
tem como principal objetivo a “regeneração de tecidos e órgãos lesionados em
decorrência de certas doenças, (...) através da utilização do potencial de células
especiais, primitivas, denominadas células-tronco”.252
2.4.2.1 Justificativas para a prática da clonagem terapêutica
As justificativas para a prática da clonagem terapêutica são
várias e diferentemente da clonagem reprodutiva que apresenta quase um
posicionamento majoritário, apresenta posições bem equilibradas.
O lado positivo desta técnica está no sentido de encontrar
cura para certas doenças, como, por exemplo, o mal de Alzheimer, Parkinson253,
diabetes, lesões medulares, problemas cardíacos, entre outras.254
Segundo VIEIRA, “os benefícios podem suplantar os riscos”.
Descreve a autora que,
“a técnica da clonagem poderá prestar bons serviços para a
humanidade, ampliando, por exemplo, a produtividade de animais
e oferecendo cura para várias moléstias. (...) Em se copiando
251 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 40. 252 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 39. 253 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 39. 254 A clonagem de embriões humanos com fins terapêuticos foi “admitida na Grã-Bretanha, operando-se mediante a remoção, por exemplo, de uma célula do corpo do paciente diabético para inserir o seu DNA no interior de uma célula-ovo desnucleada, que,então, se dividirá em células geneticamente idênticas às do doador, que, por sua vez, serão introduzidas naquele doente, sem qualquer risco de rejeição, restaurando sua saúde, por se transformarem em células do pâncreas produtoras de insulina”. DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 449 e 450.
59
parte da medula espinhal, órgão responsável pela fabricação do
sangue, a réplica da medula introduzida no paciente poderá
purificar a circulação, exterminando o câncer. (...) A cópia de
células sadias da pele poderá auxiliar aqueles que sofreram
queimaduras. A clonagem de neurônios novos poderá colaborar
na recuperação da capacidade mental dos portadores do mal de
Alzheimer”. 255
Todavia, na mesma obra a autora apresenta uma colocação
negativa ao discordar da “realização de pesquisas que desvirtuem as
características essenciais dos animais”. Como o caso dos cientistas do Instituto
de Neurociências em La Jolla (Califórnia) que conseguiram fazer com que um
filhote de galo cantasse como uma codorna, transplantando o tronco cerebral e o
mesencéfalo da codorna para um embrião de galo de dois dias.256
Ainda, para os que enxergam esta clonagem como algo
negativo,
“afirmam ser inadmissível ética e juridicamente por usar embrião
humano como um meio para salvar outrem, desrespeitando o
princípio de que o homem é um fim e não um meio e de que a
vida e a dignidade humanas constituem o limite para a
experimentação científica”.257
Utilizar da clonagem com intuito terapêutico é revolucionário,
porém, está técnica esbarra em delicadas questões, como: “até que ponto se
pode dispor de embriões com objetivos terapêuticos? Afinal, os fins justificam os
meios?”258. “Após a coleta das células, o embrião seria descartado. Seria lícito
matar uma vida para salvar outra? Mas, afinal, quando começa mesmo a
vida?”.259
255 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 31. 256 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 32. 257 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2002. p. 450. 258 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. 2005. p. 59. 259 LEITE, Leonardo. Clonagem. Rio de Janeiro, 2005. Disponível em: <http://www.ghente.org /temas/clonagem>. Acessado em 10 de abril de 2006.
60
Dentro desta perspectiva de estudo, no intuito de melhor
compreender estas questões, é trabalhado no terceiro capítulo o sistema
normativo brasileiro, com especial destaque para a Lei de Biossegurança.
61
CAPÍTULO 3
EMBRIÕES CONGELADOS, CLONAGEM HUMANA E A
NOVA LEI DE BIOSSEGURANÇA BRASILEIRA
3.1 EMBRIÕES
Os progressos e as inovações na medicina bem como na
ciência, particularmente na biotecnologia, contribuíram à transformação da família
tradicional e atingiram uma nova possibilidade de concepção humana.260
Essas novas tecnologias de intervenção sobre o processo
da procriação humana “gera graves problemas morais relativos ao respeito devido
ao ser humano desde sua concepção, à dignidade da pessoa e à transmissão da
vida”261
Desta forma, antes de adentrar-se propriamente nos
aspectos jurídicos é relevante ter conhecimento do que são embriões e suas
práticas de utilização.
3.1.1 Conceito
A palavra embrião de modo geral, é “o produto das primeiras
modificações do ovo262 que resultou da fecundação. Tanto nos animais como nas
plantas, que vai dar origem a um novo indivíduo”.263
260 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações Artificiais e o Direito. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1995. p. 11.
261 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações Artificiais e o Direito. p. 11. 262 “Do ponto de vista da biologia, Ovo é o mesmo que Zigoto. É uma célula que se forma após a fusão do núcleo do óvulo (pronúcleo feminino, haplóide) com o núcleo do espermatozóide (pronúcleo masculino, haplóide) por cariogamia, o que dá origem à célula diplóide denominada ovo ou zigoto”. WIKIPÉDIA, Enciclopédia Livre. Embrião. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Embri%C3%A3o>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
62
Por sua vez, embrião humano é,
“o concepto quando está em sua fase de diferenciação orgânica,
da segunda à sétima semana depois da fecundação, etapa
conhecida como período embrionário. Origina-se do embrioblasto,
estrutura multicelular que, em conjunto com o trofoblasto e a
blastocele, constitui o blastocisto recém-implantado no
endométrio. O período embrionário termina na 8ª semana depois
da fecundação, quando o concepto passa a ser denominado de
feto”.264
Sob outra ótica, denomina-se “pré-embrião”,
“o produto resultante da união do óvulo e do espermatozóide, em
fertilização in vitro, até o momento em que se opera a fusão dos
dois pró-núcelos, ou seja, quando se evidencia a troca do material
genético. Ao produto celular resultante desse denominado
intercâmbio chama-se embrião”.265
Portanto, o termo embrião é usado para definir,
“(...) a fase de desenvolvimento embrionário que, seguindo a
anterior, assinala a origem e o incremento da organogênese266,
cuja duração corresponde a dois meses e meio. Outra expressão
que define esse estádio de desenvolvimento é “embrião pós-
implantatório”.267
263 WIKIPÉDIA, Enciclopédia Livre. Embrião. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Embri% C3%A3o>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
264 WIKIPÉDIA, Enciclopédia Livre. Embrião. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Embri% C3%A3o>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
265 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 125, apud BUERES, Alberto J. La voluntad jurídica y la fecundación extracorporal. In: Responsabilidad civil de los médicos. 2.ed., Tomo I, Buenos Aires: Hammurabi, 1994, p. 285.
266 “Após o estabelecimento das três camadas germinativas (ectoderme, mesoderme e endoderme), inicia-se o processo de subdivisão do embrião, em pequenos grupos celulares destinados a produzir órgãos ou parte deles. Qualquer órgão inicia seu desenvolvimento como um grupo celular segregado de outras células embrionárias. A esse processo dá-se o nome de organogênese”. MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 125, apud GARCIA, Sônia Maria Lauer; JECKEL NETO, Emílio; FERNÁNDEZ, Casimiro Garcia. Embriologia. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991. p, 125.
267 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 125.
63
Todavia, BARBOSA aponta um problema terminológico na
utilização indiscriminada do vocábulo “embrião”. Para a autora, de acordo com a
Biologia, “antes da implantação, o óvulo fecundado chama-se “zigoto””. Ainda,
“O embrião é a entidade em desenvolvimento a partir da
implantação no útero, até oito semanas após a fecundação; a
partir da nona semana começa a ser denominado feto, tendo essa
designação até nascer. Portanto, a rigor até os primeiros quatorze
dias após a fertilização, temos o zigoto, denominado na legislação
espanhola “pré-embrião”, expressão que causa controvérsia por
induzir uma diminuição da condição humana da entidade em
desenvolvimento”. 268
Pode-se dizer, que o termo refere-se também,
“ao ser humano em seus primeiros estágios de desenvolvimento.
Não costuma ser usado senão a partir da metade da segunda
semana. O período embrionário estende-se até o fim da oitava
semana, quando os primórdios da maioria das principais
estruturas já se encontram presentes”.269
Nota-se que não há uma definição única, ou um consenso
sobre o mesmo, uma vez que cada autor conceitua embrião analisando o período
embrionário.
3.1.2 Embriões Congelados
Com a descoberta de novas possibilidades científicas e
médicas, tal como a inseminação artificial, o número de embrião congelados em
clínicas tem aumentado gradativamente.
O Jornal Nacional em umas de suas reportagens mostrou o
censo realizado pela Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida, a qual revela
268 BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.
269 MOORE, Keith L; PERSAUD, T.V.N. traduzido por VUGMAN, Fernando Simão. Embriologia Clínica. 5.ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A., 1997. p. 06.
64
a existência de 9.914 embriões congelados nas quinze maiores clínicas de
reprodução brasileiras. Desses, 3.219 estão congelados há mais de três anos,
critério essencial para a utilização em pesquisas com células-tronco (CTs)
embrionárias aprovadas pela Lei de Biossegurança.270
Segundo Collucci,
“o número representa, no máximo, um décimo do estimado pelos
cientistas durante a tramitação da lei no Senado, em 2004. No ano
passado, eles previram contar com 30 mil embriões nessas
condições. Hoje, eles próprios admitem que o número foi
"chutado" por pesquisadores envolvidos nas pressões para que as
pesquisas fossem aprovadas no Congresso”.
[...]
"Não acho que era essa [30 mil] a expectativa real de toda a
comunidade científica. Sem dúvida, 3.000 é muito menos [do que
se imaginava], mas é um excelente começo", afirma a geneticista
Lygia da Veiga Pereira, do Centro de Estudos do Genoma
Humano, da USP de São Paulo”.271
No entendimento da ginecologista Maria do Carmo Borges,
presidente da Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida (SBRA), “ainda não
se sabe quantos dos embriões congelados há mais de três anos estariam
disponíveis para a pesquisa. Ainda é preciso que os progenitores desses
embriões formalizem a doação”.272
270 COLLUCCI, Cláudia. Total de embriões congelados no Brasil é um décimo do previsto, 2007. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u13158.shtml>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
271 COLLUCCI, Cláudia. Total de embriões congelados no Brasil é um décimo do previsto, 2007. Disponível em: < http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u13158.shtml>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
272 “Para fazer o levantamento, foram enviados questionários para 45 clínicas de reprodução filiadas à Rede Latino-Americana de Reprodução Assistida. Dessas, 15 responderam à solicitação.Apesar de a amostragem representar apenas 33% das centros de reprodução, a médica considera o número "bem próximo do real" porque, em geral, só as maiores clínicas congelam embriões. "É o único número oficial que existe. E [os dados] foram passados pelas maiores clínicas brasileiras."”. COLLUCCI, Cláudia. Total de embriões congelados no Brasil é um décimo do previsto, 2007. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/ ciencia/ult306u13158.shtml>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
65
Juntas, as clínicas responsáveis por 90% dos procedimentos
realizados no Brasil informaram ter hoje 9.914 embriões guardados em
laboratório. 273
Acredita a geneticista Mayana Zatz que,
"Se realmente o número é tão pequeno, isso sugere que houve
muito mais descarte do que a gente imaginava. O que mostra a
importância da nossa briga quando a gente dizia que é muito
melhor destinar estes embriões para pesquisa do que descartá-
los".274
Os dados já foram informados à Anvisa, a Agência Nacional
de Vigilância Sanitária. Quase 90% dos embriões estão guardados no centro de
reprodução humana de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo. 275
"Nós seguimos as normas do Conselho Federal de Medicina
desde 1992. Os embriões excedentes aqui, ou seja, os não
utilizados para a medicina reprodutiva, como excessos, são
sempre crio preservados", explica Franco Júnior, presidente da
Rede Latino-americana de Reprodução Assistida.276
De acordo com as normas do Conselho Federal de
Medicina, para um embrião sair do laboratório onde foi produzido é necessária
uma autorização assinada pelo casal e registrada em cartório. Isto vale inclusive
para os embriões congelados que forem doados para a pesquisa. 277
273 Jornal Nacional. Embriões Congelados. 25.04.2005. Disponível em: <http://jornalnacional.globo. com/Jornalismo/JN/0,AA952090-3586,00.html>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
274 COLLUCCI, Cláudia. Total de embriões congelados no Brasil é um décimo do previsto, 2007. Disponível em: < http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u13158.shtml>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
275 Jornal Nacional. Embriões Congelados. 25.04.2005. Disponível em: <http://jornalnacional.globo. com/Jornalismo/JN/0,,AA952090-3586,00.html>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
276 Jornal Nacional. Embriões Congelados. 25.04.2005. Disponível em: <http://jornalnacional.globo. com/Jornalismo/JN/0,,AA952090-3586,00.html>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
277 COLLUCCI, Cláudia. Total de embriões congelados no Brasil é um décimo do previsto, 2007. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u13158.shtml>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
66
3.1.2.1 Criopreservação de Embriões
A Criobiologia “é um ramo da criogenia, que estuda os
efeitos de baixas temperaturas em células, tecidos e organismos vivos”.278
Por sua vez, a criogenia,
“é um ramo da físico-química que estuda tecnologias para a
produção de temperatura as muito baixas (abaixo de −150°BC, de
−238°a ou de 123), principalmente até a temperatura de ebulição
do nitrogênio líquido ou ainda mais baixas, e o comportamento
dos elementos e materiais nessas temperaturas sendo que a
tecnologia usada explora os efeitos de transferência térmica entre
um agente e o meio. Esse ramo da ciência que é constantemente
associado com seu principal ramo, a crio biologia, que é o estudo
de baixas temperaturas em organismos”.279
No entendimento de outros doutrinadores, a criobiologia é “o
estudo dos processos de congelação de células e tecidos”. A criobiologia tem
permitido a preservação de células por tempo prolongado e mantém as
propriedades biológicas destas depois de descongeladas. A tecnologia
desenvolveu protocolos de congelação/descongelação eficientes que permitem
preservar células e tecidos a temperaturas até -196ºC usualmente sem afetar ou
com muito pouco efeito na sua estrutura e funcionalidade.280
Desta forma, uma vez apresentados os conceitos de
criobiologia e criogenia, tem-se que a criopreservação é “a estocagem de
qualquer material em temperaturas ultra baixas (freezer –80ºC ou nitrogênio
líquido –196ºC),”281 sendo que os laboratórios utilizam desta técnica quando há
278 WIKIPÉDIA, Enciclopédia Livre. Embrião. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/ wiki/criogenia>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
279 WIKIPÉDIA, Enciclopédia Livre. Embrião. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/ wiki/criogenia>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
280 CONCEPTUS. Criopreservação. Disponível em: <http://www.clinicaconceptus.com.br/ laboratorio/criopreservacao.html#embrioes>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
281 CRIOPRAXIS. Criopreservação de embriões. Disponível em: <http://www.cryopraxis.com.br /index.php>. Acessado em 15 de março de 2006 e em 04 de outubro de 2007. A preservação pelo congelamento se dá em nitrogênio líquido, e é o glicerol (substância crioprotetora) o responsável pelo não estilhaçamento do embrião. Além disto, a criopreservação tem como escopo possibilitar que os embriões sejam submetidos ao exame de biopsia, para que seja verificado se eles estão ou não vivos; além da já mencionada facilidade para novas tentativas.
67
produção de mais embriões do que o necessário para a transferência. Apenas
aqueles de boa qualidade têm maior chance de sobrevivência.282
“Os embriões excedentes são colocados em uma solução especial
com uma substância chamada crioprotetor, que evita que os
embriões sejam danificados com o frio excessivo; são então
estocados em botijões de nitrogênio líquido, onde a temperatura
chega a 196º C negativos e podem permanecer por tempo
indeterminado”.283 (fotos em anexo)
Apesar dos embriões excedentes apresentarem uma
probabilidade de sobrevivência menor do que os embriões mantidos a fresco, esta
técnica oferece a vantagem de uma nova chance com menor custo. Os embriões
são descongelados vinte e quatro horas antes da transferência, cultivados e então
verificados quanto a sua viabilidade. 284
3.2 UTILIZAÇÃO DE EMBRIÕES CONGELADOS EM PRÁTICAS
REPRODUTIVAS
Ávidos por terem um filho "biológico", “os casais não têm
mais pensado na adoção como primeira possibilidade contra a sentença da
infertilidade”. 285
Entretanto, é importante que se saiba que,
“(...) as técnicas de fertilização in vitro são delicadas e com uma
margem de ineficácia considerável, a estimulação hormonal para
a hiperovulação é uma porta para a obtenção de vários embriões,
LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
282 CONCEPTUS. Criopreservação. Disponível em: <http://www.clinicaconceptus.com.br/ laboratorio/criopreservacao.html#embrioes>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
283 CRIOPRAXIS. Criopreservação de embriões. Disponível em: < http://www.cryopraxis.com. Br /index.php>. Acessado em 15 de março de 2006 e em 04 de outubro de 2007.
284 CONCEPTUS. Criopreservação. Disponível em: <http://www.clinicaconceptus.com.br/ laboratorio/criopreservacao.html#embrioes>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
285 LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
68
que são a esperança de que, pelo menos em alguma tentativa, o
esperado filho chegará. Congelando os embriões que não foram
utilizados, o casal terá uma significativa redução de custos e a
própria mulher não terá de se expor novamente aos efeitos da
dosagem exagerada dos hormônios”. 286
Porém, conforme registra LIMA,
“Há, uma gritante necessidade de se restringir o número de
embriões fecundados em laboratório, compatibilizando o êxito da
procriação e a valorização da vida humana e impedindo a
"utilização" desses embriões "[...] como se fossem objetos de
consumo ou meros instrumentos a justificar o desejo dos casais
de terem filhos [...]."“.287
Por meio da criopreservação existem quatro alternativas
para os embriões congelados: utilização para técnicas reprodutivas (clonagem
terapêutica, reprodutiva; inseminação...), doação, utilização em pesquisas
científicas ou descarte.288
Para a sociedade patrimonialista não há problemas em se
“desperdiçar” embriões congelados, afinal, como a própria denominação a eles
dada, não passam de “embriões congelados”. 289
Outra questão que deve ser analisada é a manipulação
térmica, porquanto apenas "cerca de 75% dos embriões sobrevivem ao processo
de congelamento e descongelamento". 290
286 LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
287 LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007, apud FERREIRA, Fábio Alves. Vivendo sem respirar, morrendo sem chance de nascer. Jus Navegandi, Teresina, nov. 2002. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3544>. Acessado em: 08 mar. 2005.
288 FERREIRA, Fábio Alves. Vivendo sem respirar, morrendo sem chance de nascer. Jus Navegandi, Teresina, nov. 2002. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id= 3544>. Acessado em: 08 mar. 2005.
289 LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
290 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 22.
69
Segundo LIMA,
“Como podem ser classificados os argumentos destinados a
convencer de que não há vida em um embrião até o 14º dia
(apenas um amontoado de células) e os que buscam dividir a vida
em "vida biológica" (antes da nidação) e "vida humana" (após a
mesma)? Vêm da mesma Ciência que remontou o surgimento do
Universo à explosão que deu origem às galáxias e aos seres vivos
em geral, tendo tudo começado por uma gigantesca quantidade
de energia e de matéria que, no entanto, nunca foram detectadas;
como se tivessem vindo do acaso”. 291
SILVA, no mesmo sentido escreve que,
“Não há diferença entre a vida contida em um embrião (ainda que
se trate de embrião congelado – criopreservado, excedentário,
laboratorial, supranumerário ou pré-implantatório, etc) e a que os
seres humanos adultos esbanjam, porque a vida é um processo
que se instaura com a concepção (ou germinação vegetal),
transforma-se, progride, mantendo sua identidade, até que muda
de qualidade, deixando, então, de ser vida para ser morte. Tudo
que interfere em prejuízo deste fluir espontâneo e incessante
contraria a vida."292
Entretanto, no entender de COLLUCCI,
“(...) qualquer que seja a decisão sempre haverá alguma espécie
de questionamento ou sofrimento. Caso os embriões sejam
mantidos congelados sem perspectiva breve de implantação, o
casal fica com a sensação de que um possível filho o aguarda nos
botijões de nitrogênio, a 196ºC, da clínica de reprodução. Se
autoriza a doação, fica pensando que pode ter um filho perdido
em algum lugar desse mundo e, se autoriza o descarte, fica com a
sensação de que “matou” um suposto filho. Assim, há o
sentimento de culpa por todos os lados”.293
291 LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
292 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 20.ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 196.
293 COLLUCCI, Cláudia. A clonagem terapêutica, 2005. Disponível em: <http://www1.folha.uol. com.br/folha>. Acessado em 13 de abril de 2006.
70
Portanto, é fácil perceber que a questão de utilização de
embriões em técnicas científicas é totalmente complexa, uma vez que sofre
influência por aspectos legais, culturais, éticos e religiosos.294 Os que defendem a
clonagem terapêutica a partir dos embriões congelados, os enxergam apenas
como um emaranhado de centenas de células dentro de um tubo de ensaio.
Neste ponto de vista, acreditam que não faz sentido protegê-los em detrimento as
milhões de vidas que seriam salvas a partir das pesquisas com as células-
tronco.295 Vislumbram a possibilidade de grandes avanços no campo da
embriologia humana e da cura para inúmeras doenças crônicas.296
Ainda, nesta visão positiva, pesquisadores e cientistas
argumentam que,
“um embrião com cinco dias de desenvolvimento, constitui-
se apenas de um aglomerado de cerca de duzentas células
indiferenciadas que, quando concebido por meio de
reprodução natural e gerado no ventre de uma mulher,
possui somente 20% de chance de se implantar e se
desenvolver em uma criança. Advertem que a destruição de
embriões de cinco dias não pode ser entendida como a
destruição de fetos com mais de três meses, por
exemplo”.297
Todavia, a visão de embrião que tem um casal que passou
anos tentando uma gravidez, acompanhando o crescimento de cada óvulo,
esperando ansiosamente o processo de fertilização “in vitro”, vendo seus
embriões serem implantados no útero e, depois acompanhando o
desenvolvimento deles, é contraditória à anterior.298
294 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 59. 295 COLLUCCI, Cláudia. A clonagem terapêutica, 2005. Disponível em: <http://www1.folha.uol. com.br/folha>. Acessado em 13 de abril de 2006.
296 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 59. 297 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 60. 298 COLLUCCI, Cláudia. A clonagem terapêutica, 2005. Disponível em: <http://www1.folha.uol. com.br/folha>. Acessado em 13 de abril de 2006.
71
Os que possuem essa opinião contrária à clonagem para
fins terapêuticos, acreditam que a vida começa no momento da fertilização, não
podendo o embrião ser entendido como um conjunto de células qualquer. Dessa
maneira, utilizar embriões significaria destruir vidas em potencial. 299
Apesar da questão não ser pacífica, a doutrina majoritária
visualiza o embrião como uma vida. Assim, Hélio Gomes “afirma ser o embrião,
humano, desde o momento da concepção até o parto”. 300
Eduardo de Oliveira Leite, utilizando-se das palavras de
Nilson Sant`Anna, descreve que:
“A vida humana irrompe e inicia sua estruturação somática no
exato momento da fecundação, antes, portanto de o ovo
implantar-se no útero. A nidificação garante, apenas, o
prosseguimento de um processo vital já em andamento,
decorrente de seu próprio poder energético, e a continuidade
evolutiva de uma complexa arquitetura citológica, cujas linhas
prévias lhe chegaram esboçadas no desenho das primeiras
divisões mitóticas”. 301
Também, Maria Dolores Vila-Coro afirma que:
“se biologicamente a fusão genética das células germinativas
masculina e feminina constitui a primeira célula do novo ser que
se forma, a proteção jurídica deve alcançar a fecundação extra-
uterina assim como se a fusão tivesse ocorrido no ventre
materno”. 302
299 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 60. 300 GOMES, Hélio. Medicina Legal. 13.ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1971. p. 439. 301 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações Artificiais e o Direito – aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos. São Paulo; Revista dos Tribunais, 1995. p. 386. apud SANT´ANNA, Nilson do Amaral. Contribuição Médico-Legal ao Estudo dos Contraceptivos. Tese apresentada à Faculdade de Direito da UFRJ. Rio de Janeiro, 1967. p. 108.
302 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 62; apud, VILA-CORO, Maria Dolores. Introducción a la biojurídica. Madrid: Servicio de publicaciones Facultad Derecho Universidad Complutense Madrid, 1995. p. 122.
72
A partir do momento que considerar-se o embrião
congelado, mantido em laboratório como nascituro, nasce outro questionamento:
seria então aborto a eliminação de embriões mantidos em laboratório? Sem
pretensão de se ater a este questionamento, o que convém demonstrar a respeito
da destruição dos embriões humanos excedentes, é a inadiável revisão dos
conceitos de vida, gravidez, nascituro, técnicas laboratoriais, relacionados ao
crime de aborto. 303
3.3 CLONAGEM HUMANA E O DIREITO BRASILEIRO
As duas formas de clonagem, terapêutica e reprodutiva,
geram polêmicos e controversos debates. Os que defendem o uso da clonagem
como forma de reprodução, utilizam as seguintes razões como argumentos: casos
de infertilidade, evitar a ocorrência de doenças genéticas, “ressuscitar” filhos ou
parentes mortos e ainda, para replicar indivíduos de grande talento, inteligência
ou beleza. No que se convencionou chamar de clonagem para fins terapêuticos
se tem como principal objetivo a regeneração de tecidos e órgãos lesionados em
decorrência de doenças tais como: Parkinson, Alzheimer, Diabetes, lesões
musculares, problemas cardíacos, entre outros. 304
Todavia, diante de tantas dificuldades técnicas e de todos os
riscos existentes, a maioria dos cientistas afirmam que a manipulação genética
para fins reprodutivos não deve ser realizada, a começar pelo próprio Ian Wilmut,
criador da Dolly. Isto, em virtude de envolver complexas questões referentes a
própria humanidade, tais como, conceitos de reprodução, individualização,
relações de família e sociedade.305
303 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 62.
304 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 39. 305 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 37.
73
Em 26 de fevereiro de 1997, preocupada com a extensão
atribuída ao conceito de nascituro, a Igreja Católica pediu que a prática de
clonagem em seres humanos fosse proibida, rejeitando qualquer meio de
concepção não natural. Os teólogos, em geral, da mesma forma não aceitam a
clonagem humana pelos seus métodos, finalidades e técnicas. 306
De acordo com o pensamento de Dom Lucas Moreira
Neves, expresso por VIEIRA,
“(...) nem tudo o que se torna possível cientificamente é moral e
legal. “É forte o risco de se deixar em mãos de homens o dom da
vida, que só a Deus pertence... Uma proeza cientifica deve ser
proporcional ao bem que faz à humanidade. Não deve medir-se
pelo simples capricho do cientista”.” 307
Sendo assim, afastando-se a possibilidade da realização da
clonagem reprodutiva, o que tem exaltado os ânimos da sociedade brasileira é a
possível permissão jurídica da clonagem terapêutica, realizada através de células-
tronco obtidas a partir de embriões congelados por mais de três anos em clínicas
de fertilização. Se por um lado o feito representa uma promessa da ciência para
curar doenças degenerativas e até para restaurar órgãos e tecidos avariados, por
outro, suscita profundos questionamentos éticos e religiosos nos que vêem nos
embriões uma forma primitiva de vida. 308
Conforme já explicado, as células-tronco embrionárias são
células que possuem o maior potencial de multiplicação e especialização.
Contudo, o grande dilema ético reside no fato de que para obtê-las há
necessidade de produção, utilização e destruição de embriões humanos.309
Sendo assim, o item a seguir trata especificadamente da
vida embrionária e sua proteção jurídica.
306 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 32 e 33. 307 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 33. 308 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 39. 309 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 34.
74
3.3.1 A Vida Embrionária e sua Proteção Jurídica
Por se tratar de um assunto complexo, de cunho médico e
científico, convém que se faça um desdobramento de seu conteúdo, começando
pelos conceitos, posicionamento doutrinário, para que então se passe a analisá-lo
de forma jurídica.
3.3.1.1 Embrião e Nascituro
O Código Civil de 2002 em seu art. 2º dispõe que “(...) a
personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a
salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”.310
De Plácido e SILVA define o terno nascituro como, “derivado
do latim nasciturus, particípio passado de nasci, quer precisamente indicar aquele
que há de nascer”. 311
A noção de personalidade312 jurídica de acordo com o direito
privado clássico corresponde à titularidade. “Sob tal perspectiva, vinculada ao
310 BRASIL. Código Civil (2002). 5.ed. São Paulo: Editora Rideel, 2007. “O dispositivo não faz esclarecer (mesmo depois de tantos debates suscitados na vigência do Código Civil de 1916) sobre se o nascituro é sujeito de direitos ou se ali foram postos a salvo direitos sem sujeito (como defendem os natalistas), foi extremamente claro quanto a expressão desde a concepção”. LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
311 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 8.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1984.p. 150. 312 Embora haja correlação entre os termos personalidade e capacidade, estes não são iguais. A capacidade “é um conceito que se refere à dinâmica e admite graus, ausência parcial, limitações ou extensões”. A personalidade não, “já que é de existência elementar:existe ou não; se está com ela ou não. Falta sentido e razão em dizer que existe personalidade em um aspecto e não para outro. Não há termo médio. A personalidade investe o ser em si, enquanto a capacidade se tem para algo ou a respeito de algo. Se é pessoa e se tem capacidade. Esta é uma conseqüência da personalidade: a personalidade é prius e a capacidade um posterius. Se é pessoa porque se tem personalidade, logo, deve haver um mínimo de capacidade. Quando falta totalmente aquela, como tem condição de pressuposto, hão de faltar também a aptidão, os outros atributos, todos os direitos, a pessoa mesma”. BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/ reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.
75
liberalismo do século XIX, entende-se como pessoa o sujeito de direitos, o titular
de direitos e obrigações, e o direito subjetivo como direito individual”.313
Segundo MEIRELLES,
“essa noção de pessoa, imposta como categoria pelo sistema
clássico de direito privado com a finalidade de estabelecer
parâmetros para a titularidade no comércio jurídico, é insuficiente
para atingir a realidade atual dos embriões humanos “excedentes”
de aplicações dos diversos métodos de reprodução humana
medicamente assistida”.314
Destaca-se que a própria palavra “pessoa” tem etimologia
incerta. No entanto, a interpretação tradicional,afirma que pessoa deriva de “per +
sonare: ressoar”.315
Para tornar possível uma prática científica de reprodução, é
necessário um número variado de embriões e, dentre esses, é imprevisível a
quantidade dos que apresentarão desenvolvimento inicial considerado suficiente
para posterior transferência ao útero.316
Portanto, conforme já foi mencionado, dentre os embriões
obtidos nem todos serão utilizados/transferidos, isto porque alguns não
apresentam sinais de desenvolvimento normal porque, muito embora em
condições normais de evolução, ultrapassam o limite máximo recomendável à
313 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 213.
314 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 213.
315Em Roma, persona era a máscara que cada ator de teatro usava durante a representação, a fim de que sua voz ou a da personagem fosse identificada. Munida de lâminas de metal, a máscara fazia com que a voz do ator ressoasse cristalinamente nos vastos anfiteatros. Com o tempo, o vocábulo persona passou a denominar o papel representado pelo ator; e como cada pessoa representa um papel nesta vida, o termo passou a designar o próprio homem. DJI – índice Fundamental do Direito. Personalidade. Disponível em: <http://www.dji.com.br/ civil/personalidade.htm>. Acessado em 04 de outubro de 2007.
316 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 213.
76
transferência por ciclo, fixado para evitar gestação múltipla com risco de aborto,
parto precoce e outras complicações.317
Os embriões excedentes, ou seja, os não transferidos,
formam séria questão que assume contornos éticos, sociais e jurídicos. “Na
tentativa de evitar a sua sumária eliminação, alguns centros médicos preservam-
nos congelados para outras futuras transferências, ou para possibilitar pesquisas
e manipulação com os mais variados fins”. E todas essas atividades relacionadas
ao destino dos embriões humanos não encontram guarida no sistema clássico
estabelecido.318
“A ordem legislativa civil reconhece os seres humanos nascidos
como pessoas naturais, protegendo-lhes os direitos. Também põe
a salvo os interesses dos nascituros (concebidos no ventre
materno e em vias de se tornarem pessoas, ao nascerem com
vida). Por fim, assegura vantagens à chamada prole eventual, que
diz respeito aos seres humanos ainda não concebidos”.319
BARBOSA escreve que parece razoável, para fins do
presente,
“à semelhança do critério utilizado por pesquisador da matéria,
adotar-se o termo embrião englobando todas as fases do
desenvolvimento do zigoto, a partir da concepção, considerada
como a fertilização do óvulo pelo espermatozóide, até sua
implantação, momento que assinalará o início da gravidez.
Havendo fertilização in vitro, distingue-se, nestes termos, o
embrião do nascituro, entendendo-se esse último como o ser já
em gestação que, ao que se sabe até esta data, só pode ocorrer
no útero de uma mulher”.320
317 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 213 e 214.
318 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 214.
319 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 214.
320 BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.
77
Assim, há quem defenda não serem os embriões
criopreservados ainda nascituro crendo que “somente após a implantação do
embrião, a chamada nidação no útero materno, iniciar-se-ia a gravidez ou
gestação propriamente dita e o embrião passaria a ser considerado nascituro”. 321
Ocorre que a presente realidade está afastada da tradição
que fundamentou a codificação civil brasileira, o avanço científico dos métodos de
reprodução humana artificial possibilitou a concepção extra-uterina e, por
intermédio dela, a existência de embriões in vitro, o que representa algo bem
distante da normatização atual.322
E, conforme escreve LIMA em seu artigo,
“se já não há consenso nem no âmbito jurídico nem no âmbito
científico sobre o que seria um embrião, o que se dizer do embrião
excedentário? Embora a sua fertilização tenha sido provocada
pela Ciência, a existência deste embrião já independe de qualquer
esforço humano. A Ciência só pôde facilitar a fusão do
espermatozóide e do óvulo, ela ainda não pode simular a
existência de um embrião em uma simples proveta e nem muito
menos dispensar a fusão daquelas células germinativas para a
sua obtenção.323
Para MEIRELLES,
“os embriões concebidos e mantidos em laboratório mostram-se
estranhos ao modelo clássico. Não são pessoas naturais, pois
inexistente o nascimento com vida; também não são pessoas a
nascer (nascituros), mas nem por isso é possível classificá-los
321 LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007, apud BARRETO, Wanderlei de Paula. Inovações sobre a personalidade jurídica e os direitos da personalidade no novo Código Civil brasileiro. DBJV – Mitteilungen, n. 2, fev. 2004. Disponível em: <http://www.dbjv.de/dbjv-high/mitteilungen/04-02/DBJV_Mitteilungen_02-2004.pdf>. Acessado em 08 mar. 2005.
322 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 214.
323 LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007.
78
como prole eventual (a ser concebida), posto que concepção já
houve”.324
Todavia, uma vez considerados em si mesmos portadores
de vida, imprescindível, por conseguinte, afirmar a indubitável necessidade de sua
proteção jurídica específica, impondo-se, para tanto, distanciá-los das definições
estabelecida tradicionalmente pela legislação, bem como, sob o enfoque do
amparo, equipará-los aos demais seres humanos.325
Observa-se que alguns esforços doutrinários são feitos no
sentido de realizar uma interpretação extensiva dos dispositivos legais oriundos
do sistema clássico procurando adequar o embrião in vitro aos parâmetros
tradicionais.326
Porém, segundo MEIRELLES,
“tais tentativas mostram-se, de um lado, insuficientes para
alcançar as diversas dificuldades apresentadas no desenrolar
fático do tema; e, de outro, desnecessárias a salvaguardar a vida
e a dignidade humanas consubstanciadas nesses seres em etapa
inicial de desenvolvimento”.327
A insuficiência da interpretação extensiva é demonstrada
quando se pretende reconhecer a personalidade jurídica do embrião in vitro tal
qual o nascituro, titular de direitos.328
Contudo, dependendo do posicionamento adotado frente à
subjetividade jurídica do novo ser, “essa condição seria de eficácia suspensiva
324 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 214.
325 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 214.
326 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 215.
327 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 215.
328 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 216.
79
(implantação no útero) ou resolutiva (não implantação); ou ainda, dúplice, ou seja,
suspensiva (nidação) e resolutiva (nascimento sem vida)”.329
“Desnecessário, portanto, caracterizar-se o embrião humano in
vitro como sujeito de direito, titular de direito subjetivo, com a
finalidade de protegê-lo. Aliás, tal caracterização consiste em
árdua tarefa, à medida que sua existência fática não corresponde
à realidade que informou as codificações do período clássico.
Ademais, agora sob uma perspectiva puramente biológica, é
preciso admitir-se que nem sempre o processo de
desenvolvimento pelo qual passa o zigoto resultante da união dos
gametas vem a resultar em um ser humano”.
[...]
“Também é preciso ter-se em mente que o juízo de existência e
de valor do ser humano e de sua necessária proteção não se
limita ao estatuto jurídico da pessoa”.330
O Direito confere ao nascituro a proteção jurídica, embora
não haja consenso quanto a sua natureza jurídica, alinhando-se algumas teses:
“desde as que consideram tratar-se de direitos em sujeito até as
que entendem que há no caso só meros estados de vinculação,
passando pela retroação da personalidade ao momento da
constituição do direito e, finalmente, pelas que sustentam haver
lugar entre a concepção e o nascimento a uma personalidade
parcial, reduzida, fraccionária”. 331
Ainda, segundo a MEIRELLES,
“o que informa a semelhança entre os seres nascidos e os
embriões concebidos e mantidos em laboratório é a sua natureza
comum e o que representam axiologicamente, e não a maior ou
329 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 216.
330 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 217.
331 BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.
80
menor possibilidade de sua adequação à categoria abstrata da
personalidade jurídica”.332
A longa controvérsia doutrinária sobre a natureza jurídica do
embrião e do nascituro, ou seja, se há ou não personalidade, se é ou não
considerado pessoa, apresenta relevância jurídica, pois, como esclarece
ALMEIDA, “(...) a tomada da posição do jurista importa numerosas conseqüências
práticas, pois, quem afirma personalidade afirma direitos e obrigações (...)”. 333
Neste sentido, três grandes linhas de pensamento se
formaram:
“a) a que admite que a origem de toda pessoa humana e o termo
inicial do necessário amparo encontra-se na concepção; b) a que
reconhece diferenciada proteção, conforme as diversas fases de
desenvolvimento do novo ser que se forma (assim, somente a
partir do 6° dia após a concepção; ou depois da nidação do zigoto
ao útero; ou 14 dias após a concepção, quando se vislumbra o
início de formação do sistema nervoso central; ou após o 18° dia,
com a formação da placa neural; ou somente após a configuração
dos órgãos; ou confirmada a viabilidade do ser que se forma; ou
após a infusão da alma; ou se possível a re-identificação etc.) e c)
a que identifica no embrião uma pessoa humana potencial, com
autonomia a lhe assegurar um estatuto próprio”. 334
Em outra doutrina as teorias são:
“a) a natalista, que sustenta que a personalidade começa do
nascimento com vida; b) a da personalidade condicional ou
concepcionista imprópria, segundo a qual a personalidade começa
com a concepção, com a condição do nascimento com vida; c) a
332 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 217.
333 Registra a autora as diferentes teorias que no direito estrangeiro ora afirmam, ora negam, a personalidade do nascituro, demonstrando cabalmente a complexidade da matéria. ALMEIDA, Silmara J. A. Chinelato e. Tutela Civil do Nascituro. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 54.
334 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 218.
81
concepcionista que considera que o início da personalidade se
verifica com a concepção”.335
Importa ressaltar que a diferenciação referente à evolução
embrionária, o grau de desenvolvimento atingido, impõe à sociedade outros
questionamentos, tais como o aborto, questões de filiação, direito sucessório,
entre outros.336
Desse modo, observa-se a importância de estabelecer o
entendimento de que o embrião tem vida337, mas só será pessoa humana em
dado momento sucessivo à concepção, ou de que o embrião representa, desde
logo, uma pessoa humana.338
“Quanto ao embrião mantido em laboratório, muito embora não
seja possível afirmar que sua eliminação caracterize abortamento,
porquanto esse vem a ser interrupção de gravidez, é preciso
admitir que, em hipótese tal, evidencia-se a ocorrência de
destruição de vida humana. E ao se eliminar um embrião in vitro,
está-se desrespeitando a vida que ali existe e que tem
possibilidade de desenvolver-se. Logo, a necessidade de se
respeitar o ser embrionário, desde o início do seu ciclo vital,
decorre, sobretudo, da extrema proximidade individual existente
entre ele e a pessoa humana que em breve poderá apresentar-se
plenamente desenvolvida”.339
A respeito da categoria vida, DINIZ descreve que, 335 BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.
336 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 218. A discussão se acirra na medida em que se multiplicam “as formas de agressão ao concebido, não limitadas ao aborto, mas estendidas ao embrionicídio não abortivo, à experimentação e manipulações genéticas com embriões e à produção de um número desnecessário de embriões para a fecundação assistida ou para finalidades estranhas à procriação: cosméticas, industriais ou de extração de tecidos para transplantes”. BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.
337 “Designa propriamente a força interna substancial, que anima, ou dá ação própria aos seres organizados, revelando o estado de atividade dos mesmos seres”. SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. p. 1.484.
338 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 218.
339 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 218.
82
“os mais recentes dados da biologia têm confirmado nosso
posicionamento ao demonstrarem que, com a penetração do
óvulo pelo espermatozóide, surge uma nova vida, distinta da
daquelas que lhe deu origem, pois o embrião, a partir desse
momento, passa a ser titular de um patrimônio genético único”.340
Em outra visão, o embrião in vitro, é considerado pela
corrente genético-evolucionista como “simples material biológico humano, como
objeto digno no máximo de tratamento respeitoso, redutível a mera coisa do
mundo vegetal ou mineral”. 341
Todavia, todas estas polêmicas e discussões estarão para
chegar ao fim. Uma vez que o Supremo Tribunal Federal brasileiro está incumbido
de analisar e julgar “em que momento começa a vida de um ser humano”. em
razão de duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade que questionam
dispositivos da nova Lei de Biossegurança (Lei 11.105/05). 342
As duas ações (ADIN 3.510 e 3.526) foram propostas pelo
ex-procurador-geral da República, Claudio Fonteles. Na primeira, de maio de
2005, Fonteles questiona o Artigo 5º da Lei 11.105/05, que libera o uso de
células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por
fertilização in vitro, para fins de pesquisa e terapia, argumentando que “a vida
340 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. p. 427. 341 “Essa confusão de designações desnatura aquilo que já foi dito por Kant: “o ser humano é digno, as coisas são úteis””. LIMA, Shirley Mitacoré de Souza e Souza. Tratamento Jurídico do Embrião. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=7221>. Acessado em 03 de outubro de 2007, apud BARRETO, Wanderlei de Paula. Inovações sobre a personalidade jurídica e os direitos da personalidade no novo Código Civil brasileiro. DBJV – Mitteilungen, n. 2, fev. 2004. Disponível em: <http://www.dbjv.de/dbjv-high/mitteilungen/04-02/DBJV_Mitteilungen_02-2004.pdf>. Acessado em 08 mar. 2005.
342 ERDELYI, Maria Fernanda. O Começo da Vida. STF decidirá destino das pesquisas com células-tronco. Consultor Jurídico. 04 de julho de 2006. Brasília. Disponível em: <http://conjur. estadao.com.br/static/text/45959>. Acessado em 10 de outubro de 2007.
344 ERDELYI, Maria Fernanda. O Começo da Vida. STF decidirá destino das pesquisas com células-tronco. Consultor Jurídico. 04 de julho de 2006. Brasília. Disponível em: <http://conjur. estadao.com.br/static/text/45959>. Acessado em 10 de outubro de 2007.
83
começa na fecundação e, por isso, a destruição de um embrião humano vai
contra o artigo 5º da CRFB/88, que garante a todos o direito à vida”. 344
Já na segunda ação, o ex-procurador-geral da República
contestava mais de vinte dispositivos da lei que “estabelecem normas de
segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos
geneticamente modificados, os OGMs, e seus derivados”. A ação tramita no
Supremo Tribunal Federal desde junho de 2005.345
Desta forma, percebe-se que o assunto divide opiniões e
levanta clamores basicamente em duas correntes. Aquela, que como o ex-
procurador-geral da República acredita que a permissão da pesquisa ofende o
direito a vida e, outra, que defende que o impedimento da pesquisas seria um
retrocesso científico a favor da própria vida.346
Contudo, uma vez considerado o fato de que todas as
pessoas humanas nascidas já foram embriões, logo, toda e qualquer prática
agressiva aos seres embrionários repercuti, por via de conseqüência, no homem
considerado em sua dignidade, razão da importância da discussão em foco. 347
3.3.1.2 Proteção Jurídica dos Embriões frente ao Princípio da Dignidade
Humana
Mantido o debate quanto ao início da existência da vida
humana, “parece razoável considerar que, independentemente da corrente que se
345 ERDELYI, Maria Fernanda. O Começo da Vida. STF decidirá destino das pesquisas com células-tronco. Consultor Jurídico. 04 de julho de 2006. Brasília. Disponível em: <http://conjur. estadao.com.br/static/text/45959>. Acessado em 10 de outubro de 2007.
346 ERDELYI, Maria Fernanda. O Começo da Vida. STF decidirá destino das pesquisas com células-tronco. Consultor Jurídico. 04 de julho de 2006. Brasília. Disponível em: <http://conjur. estadao.com.br/static/text/45959>. Acessado em 10 de outubro de 2007.
347 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 219
84
adote, há concordância quanto ao valor que é inerente ao indivíduo pertencente à
espécie humana: a dignidade”.348
“Fruto de larga evolução, o reconhecimento do homem como
sujeito de dignidade é elemento fundante da ordem jurídica
brasileira atual. Dentre os alicerces do Estado Democrático de
Direito brasileiro, destacam-se a cidadania e a dignidade da
pessoa humana, havidas pela Constituição de 5 de outubro de
1988 como valores fundamentais a legitimar todo o ordenamento
jurídico, dando-lhe o suporte axiológico necessário a lhe conferir
harmonia e coerência”.349
O art. 1º da CRFB/88 menciona os princípios fundamentais,
dentre ele está o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana no inciso III.
“Art. 1. A República Federativa do Brasil, formada pela união
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal,
constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como
fundamentos:
[...]
III - a dignidade da pessoa humana;[...]”351
Observa-se, pois, que a pessoa humana é o referencial do
sistema jurídico brasileiro, estabelecendo a CRFB/88 o direito à vida, garantindo-
lhe a inviolabilidade.352
“Art. 5. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
348 BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.
349 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 219.
351 CRFB/88. 352 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 220.
85
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]”.353
Assim, tem-se que,
“Firmando-se a Constituição Federal sobre o valor da pessoa
humana, é de se afastar o convencimento de que a personalidade
é mera subjetividade, e que o ser humano é mero sujeito, cuja
qualificação está vinculada apenas à titularidade jurídica. A
pessoa humana é valor, e o seu reconhecimento como tal implica
pôr-se em relevo o respeito a todo ente humano”.354
Conforme explica MORAES, “o direito à vida é o mais
fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito à existência
e exercício de todos os demais direitos”.355
Desta maneira, para os que equiparam os embriões como
pessoas humanas nascidas, pela via da similitude, deve-se então aplicar-lhes o
princípio fundamental da dignidade humana e a proteção ao direito à vida. 356
E para garantir-lhes a almejada proteção jurídica, é
necessário que haja adequação das normas já existentes, no sentido de
assegurar respeito à dignidade e à vida dos seres embrionários.357
No Brasil, além dos preceitos constitucionais voltados a
garantir e preservar os direitos inerentes à vida e sua dignidade, das normas do
Conselho Federal de Medicina (relativa às normas éticas para a utilização das
353 CRFB/88. 354 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 219.
355 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 16.ed. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2004. p. 66.
356 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 219.
357 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 220.
86
técnicas de reprodução assistida), a atual Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005)
reserva as células germinativas direitos próprios. 358
Necessário, portanto, interpretar tais normas
infraconstitucionais de acordo com os referidos fundamentos axiológicos que, a
partir da CRFB/88, norteiam todo o ordenamento jurídico.359
Se houver uma comparação entre embriões humanos e as
pessoas já nascidas, não há como afasta-los da valorização personalista que
emerge da CRFB/88. Assim, o respeito à dignidade e à vida da pessoa humana a
eles se estenderá, fazendo-se concluir que toda atividade abusiva que venha
atingir seres embrionários conflitará com o respeito à vida e à dignidade humanas
assegurado constitucionalmente. 360
Desta forma, a exploração comercial, a atribuição de preço
para o tráfico de embriões, a eugenia, o uso de seres embrionários em
cosmetologia, a “fabricação” de órgãos de embriões para futuros transplantes, a
utilização de embriões em pesquisas de natureza diversa à proteção de sua vida
e de sua saúde, e a eliminação pura e simples dos embriões “excedentes” aos
projetos científicos, chocam-se com a legislação.361
Ao se reconhecer nos seres embrionários natureza e valor
próprios da pessoa humana, “toda e qualquer atividade prejudicial ao seu
saudável desenvolvimento atinge o bem jurídico vida assegurado à sociedade”.362
O valor da pessoa humana que informa todo o ordenamento
estende-se, pelo caminho da similitude, a todos os seres
humanos, sejam nascidos, ou desenvolvendo-se no útero, ou
358 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 220.
359 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 222.
360 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 222.
361 BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.
362 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 223.
87
mantidos em laboratório, e o reconhecimento desse valor dita os
limites jurídicos para as atividades biomédicas. A maior ou menor
viabilidade em se caracterizarem uns e outros como sujeitos de
direitos não implica diversificá-los na vida que representam e na
dignidade que lhes é essencial. Reconhecer esse dado significa
respeitar o ser humano em si mesmo, durante todo o seu
desenvolvimento, e para além dele próprio, nos seus
semelhantes.363
Sendo assim,
“O início da mais preciosa garantia individual deverá ser dado pelo
biólogo, cabendo ao jurista, tão-somente, dar-lhe o
enquadramento legal, pois do ponto de vista biológico a vida se
inicia com a fecundação do óvulo pelo espermatozóide, resultando
um ovo ou um zigoto. Assim a vida viável, portanto, começa com a
nidação, quando se inicia a gravidez”.364
Conforme adverte o biólogo Botella Lluziá,
“(...) o embrião ou o feto representa um ser individualizado, com
carga genética própria, que não se confunde nem com a do pai,
nem com a da mãe, sendo inexato afirmar que a vida do embrião
ou do feto está englobada pela vida da mãe”.365
Neste sentido, observa-se por fim, que a CRFB/88 proclama
o direito à vida, “cabendo ao Estado assegurá-lo em sua dupla acepção, sendo a
primeira relacionada ao direito de continuar vivo e a segunda de se ter vida digna
quanto à subsistência”. 366
Esclarecendo esta questão, BARBOSA adverte que,
“No momento, parece que o mais razoável, à luz do princípio da
dignidade da pessoa humana, seja conferir ao embrião humano
uma “tutela particular”, desvinculada dos conceitos existentes,
363 MEIRELLES, Jussara Maria Leal. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. p. 223.
364 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. p. 66. 365 BITTAR, Carlos Alberto. O direito de família e a Constituição de 1988. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 41.
366 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. p. 66.
88
mas que impeça, de modo eficaz, sua instrumentalização, dando-
lhe, enfim, proteção jurídica condizente, se não com a condição de
indivíduo pertencente à espécie humana, com o respeito devido a
um ser que não pode ser coisificado”. 367
Cabe agora, esperar que o Supremo Tribunal Federal
brasileiro julgue as ADINs e crie novos parâmetros para o legislador, bem como, à
ciência, a quem como visto, cabe informar o momento efetivo do começo da vida.
3.3.2 Clonagem Humana, Direito e a Nova Lei de Biossegurança
Como demosntrado, o nascimento da ovelha Dolly, em 1997,
suscitou em governos de vários países a necessidade de discutir a questão da
continuidade ou não das pesquisas e experimentos em clonagem humana.368
Em face das grandes descobertas no processo de clonagem
animal, alguns pesquisadores aproveitaram o momento para anunciar suas
intenções de clonar seres humanos e, mesmo sendo a comunidade científica
contrária à realização deste tipo de clonagem para fins reprodutivos, os
defensores dessa técnica insistiram no prosseguimento dos experimentos. Isso,
acabou por gerar medo, desconfiança e insegurança com relação à palavra
“clonagem” de modo geral, independente de sua finalidade.369
Em 1998, cientistas isolaram pela primeira vez células-
tronco, “abrindo um campo promissor no desenvolvimento de novas terapias para
as doenças crônicas, porém com peso ético da destruição de embriões humanos
viáveis”.370
367 BARBOSA, Heloísa Helena. Proteção Jurídica do Embrião Humano. Disponível em <http://www.ghente.org/temas/reproducao/protecao.htm>. Acessado em 01 de outubro de 2007.
368 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 61. 369 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 61. 370 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 61.
89
Em seguida, o anúncio do primeiro embrião clonado pela
empresa norte-americana Ad vanced Cell Technology (ACT) chocou cientistas,
religiosos e líderes mundiais. 371
Segundo os pesquisadores, “a experiência não era
destinada a produzir um clone humano, mas obter células-tronco para a cura de
doenças tidas até o momento como incuráveis”.372
Por coincidência, o anúncio da experiência da empresa ACT
ocorreu dias após juristas e cientistas brasileiros e estrangeiros reunirem-se no
auditório do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para o seminário internacional
“Clonagem Humana: questões jurídicas”, evento promovido pelo Conselho de
Justiça Federal (CJF). A íntegra de todas as conferências realizadas foi enviada
pelo presidente do STJ e CJF, aos presidentes da Câmara dos Deputados e do
Senado, com o objetivo de subsidiar o Congresso de informações necessárias
para elaboração de lei que aborde a clonagem humana no Brasil. 373
A propósito, em 1995, o Brasil deu um passo significativo ao
editar sua primeira Lei de Biossegurança (Lei nº 8.974, sancionada em 5 de
371 AMARAL, Luciana. Clonagem Humana. Os Limites Éticos da Intervenção Sobre o Ser Humano - Reportagem. In: REVISTA JURÍDICA CONSULEX, Brasília – DF: Editora Consulex, ano V, nº113, 30 de setembro, 2001, p.20.
372 A pesquisa recebeu críticas até mesmo da comunidade científica. Afinal, os responsáveis, José Cibelli, Robert Lanza e Michael West, não conseguiram produzir uma célula-tronco sequer. Dos dezenove óvulos utilizados, apenas três sobreviveram, e somente um dividiu-se em até seis células, morrendo em seguida. Para que o experimento fosse bem sucedido, a ACT teria que ter produzido, ao menos, um blastócito, um aglomerado de mais de cem células que incluiriam até mesmo aquelas capazes de dar origem a tecidos no organismo. Além disso, o feito da empresa norte-americana não foi publicado no circuito normal de publicações científicas, como ocorre com as pesquisas sérias, mas na revista US News & World Report – destinada ao público em geral – no site da revista Scientific American e na desconhecida publicação online e-biomed: The Journal of Regenerative Medicine. Tendo conhecimento do fato, o cientista escocês Ian Wilmut (famoso pela experiência com a ovelha Dolly) garantiu que “mesmo que o núcleo de um óvulo não-fertilizado seja tirado e lhe sejam proporcionadas as condições adequadas, esse óvulo ainda vai se desenvolver até resultar em seis células, sem que para isso seja necessário acrescentar o núcleo de outra células adulta”. AMARAL, Luciana. Clonagem Humana. Os Limites Éticos da Intervenção Sobre o Ser Humano - Reportagem. In: REVISTA JURÍDICA CONSULEX, Brasília – DF: Editora Consulex, ano V, nº113, 30 de setembro, 2001, p.20.
373 AMARAL, Luciana. Clonagem Humana. Os Limites Éticos da Intervenção Sobre o Ser Humano - Reportagem. In: REVISTA JURÍDICA CONSULEX, Brasília – DF: Editora Consulex, ano V, nº113, 30 de setembro, 2001, p.20.
90
janeiro de 1995 junto com o Decreto nº 1.752), de cujo projeto foi autor o Senador
e Vice-Presidente Marco Maciel. 374
Em um de seus discursos, MACIEL afirmou que a lei de sua
autoria já encontrava-se defasada, mas que,
“Foi o primeiro esforço brasileiro no sentido de disciplinar, sob o
ponto de vista jurídico, esta momentosa questão. Obviamente, em
face ao progresso da Ciência, sobretudo da Engenharia Genética,
é preciso adequar os instrumentos legais”.375
Falando sobre está questão, o Ministro Nilson Naves,
Presidente do Superior Tribunal de Justiça, em seu artigo “Bioética e Justiça”
escreveu:
“Concordo plenamente, pois a atual legislação brasileira cerceia,
em certa medida, as possibilidades de trabalho dos laboratórios e
pesquisadores nacionais, ao passo que a pesquisa continua, sem
entraves e com muito mais recursos financeiros, em vários países
industrializados. A meu juízo, esse é um assunto que o Brasil
deveria reexaminar, por dois motivos: o primeiro refere-se ao fato
de que os progressos de caráter benéfico realizados em outros
países não desaparecerão; ao contrário, serão incorporados ao
conhecimento humano e poderão servir de base para novos
avanços; o segundo motivo tem a ver, como assinalou Tereza
Rodrigues Vieira, com a impossibilidade de se determinarem, a
priori e com absoluta garantia de acerto, os limites que a ciência
deve observar”.376
No outro ano, 1996, fui publicada a Lei de Patentes (Lei nº
9.279 de 1996), a qual dispôs em seu art. 18, inciso III que:
374 NAVES, Nilson. Bioética e Justiça. Sexto Congresso Mundial de Bioética, Brasília, 2002. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/Discursos/0000361/Bio%C3%A9tica-30-10-2002.doc>. Acessado em 09 de outubro de 2007.
375 AMARAL, Luciana. Clonagem Humana. Os Limites Éticos da Intervenção Sobre o Ser Humano - Reportagem. In: REVISTA JURÍDICA CONSULEX, Brasília – DF: Editora Consulex, ano V, nº113, 30 de setembro, 2001, p.20.
376 NAVES, Nilson. Bioética e Justiça. Sexto Congresso Mundial de Bioética, Brasília, 2002. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/Discursos/0000361/Bio%C3%A9tica-30-10-2002.doc>. Acessado em 09 de outubro de 2007.
91
“Art. 18. Não são patenteáveis:
[...]
III – o todo ou parte de seres vivos, exceto os microorganismos
transgênicos que atendam aos três requisitos de patenteabilidade
– novidade, atividade inventiva e aplicação industrial – previstos
no art. 8º e que não sejam mera descoberta”.377
A CTNBio, subordinada ao Ministério da Ciência e
Tecnologia, diante da ausência, até aquele momento, de norma explícita sobre a
clonagem, definiu em 07 de março de 1997, “que a lei brasileira proíbe a
manipulação de células germinativas humanas criadas em laboratório”.378
Em 11 de novembro desse mesmo ano, a UNESCO
(Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura), com o
intuito de fixar normas sobre assuntos ligados a biotecnologia que estavam
causando preocupação mundial, aprovou a Declaração Universal do Genoma
Humano e dos Direitos do Homem. “Essa Carta proíbe, textualmente, a clonagem
humana, classificando-a como contrária à dignidade humana”. 379
Prescreve o art. 11 do respectivo diploma:
“Art. 11. Não serão permitidas práticas contrárias à dignidade
humana, tais como a clonagem reprodutiva de seres humanos. Os
Estados e as organizações internacionais competentes são
convidados a cooperar na identificação de tais práticas e a
determinar, nos níveis nacional ou internacional, as medidas
apropriadas a serem tomadas para assegurar o respeito pelos
princípios expostos nesta Declaração”. 380
Além da UNESCO, com o intuito de complementar a
Convenção Européia dos Direitos Humanos e Biomedicina, em 12 de janeiro de
377 BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996. Brasília, 1996. 378 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 37. 379 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 37. 380 UNESCO. Declaração Universal do Genoma Humano e dos Direitos do Homem de 11 de novembro de 1997.
92
1998, dezenove países europeus assinaram em Paris documento que veda a
clonagem humana em seus territórios. 381
No tocante ao Brasil, com a finalidade de atualizar,
complementar e corrigir alguns pontos controversos presentes na legislação, foi
aprovada a Lei de Biossegurança sob o nº 11.105, em 24 de março de 2005.382
Entre outros pontos, esta legislação estabelece normas de
segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam OGMs
(Organismos Geneticamente Modificados) e seus derivados, cria o Conselho
Nacional de Biossegurança (CNBS), regulamenta a CTNBio (Comissão Técnica
Nacional de Biossegurança) e dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança. 383
Descreve o art. 1º da Lei 11.105/05 que,
“(...) estabelece normas de segurança e mecanismos de
fiscalização sobre a construção, o cultivo, a produção, a
manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a
exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o
consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de
organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados,
tendo como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área de
biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde
humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da
precaução para a proteção do meio ambiente”.384
381 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 38. 382 A Lei 11.105, de 24 de março de 2005, “Regulamenta os incisos II, IV e V do § 1o do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança – PNB, revoga a Lei no 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória no 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5o, 6o, 7o, 8o, 9o, 10 e 16 da Lei no 10.814, de 15 de dezembro de 2003, e dá outras providências”.
383 SUZUKI, Jorge Brunetti. Jus Navegandi. OGM: aspectos polêmicos e a nova lei de biossegurança. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8148>. Acessado em 09 de outubro de 2007.
384 BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005.
93
Com o intuito de evitar brechas na legislação, o art. 3º
estabelece os conceitos operacionais para as categorias mencionadas em seu
texto.
“Art. 3. Para os efeitos desta Lei, considera-se:
I – organismo: toda entidade biológica capaz de reproduzir ou
transferir material genético, inclusive vírus e outras classes que
venham a ser conhecidas;
II – ácido desoxirribonucléico - ADN, ácido ribonucléico -
ARN: material genético que contém informações determinantes
dos caracteres hereditários transmissíveis à descendência;
III – moléculas de ADN/ARN recombinante: as moléculas
manipuladas fora das células vivas mediante a modificação de
segmentos de ADN/ARN natural ou sintético e que possam
multiplicar-se em uma célula viva, ou ainda as moléculas de
ADN/ARN resultantes dessa multiplicação; consideram-se
também os segmentos de ADN/ARN sintéticos equivalentes aos
de ADN/ARN natural;
IV – engenharia genética: atividade de produção e
manipulação de moléculas de ADN/ARN recombinante;
V – organismo geneticamente modificado - OGM: organismo
cujo material genético – ADN/ARN tenha sido modificado por
qualquer técnica de engenharia genética;
VI – derivado de OGM: produto obtido de OGM e que não
possua capacidade autônoma de replicação ou que não contenha
forma viável de OGM;
VII – célula germinal humana: célula-mãe responsável pela
formação de gametas presentes nas glândulas sexuais femininas
e masculinas e suas descendentes diretas em qualquer grau de
ploidia;
VIII – clonagem: processo de reprodução assexuada,
produzida artificialmente, baseada em um único patrimônio
94
genético, com ou sem utilização de técnicas de engenharia
genética;
IX – clonagem para fins reprodutivos: clonagem com a
finalidade de obtenção de um indivíduo;
X – clonagem terapêutica: clonagem com a finalidade de
produção de células-tronco embrionárias para utilização
terapêutica;
XI – células-tronco embrionárias: células de embrião que
apresentam a capacidade de se transformar em células de
qualquer tecido de um organismo.385
Com esta especificação das categorias, entra-se no mérito
do assunto ora em discussão, ou seja, a regulamentação trazida pela atual
legislação de biossegurança, que em seus artigos 5º e 6º normatizam as
atividades que envolvem a clonagem humana, terapêutica e reprodutiva, bem
como, a utilização de embriões e células-tronco.
Assim especifica a Lei;
“Art. 5. É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização
de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos
produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo
procedimento, atendidas as seguintes condições:
I – sejam embriões inviáveis; ou
II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na
data da publicação desta Lei, ou que, já congelados na data da
publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos,
contados a partir da data de congelamento.
§ 1º Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos
genitores.
§ 2º Instituições de pesquisa e serviços de saúde que
realizem pesquisa ou terapia com células-tronco embrionárias
385 BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005.
95
humanas deverão submeter seus projetos à apreciação e
aprovação dos respectivos comitês de ética em pesquisa.
§ 3º É vedada a comercialização do material biológico a que
se refere este artigo e sua prática implica o crime tipificado no art.
15 da Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de 1997 386”.
Esse dispositivo gera bastante polêmica, afinal, como já foi
falado no item anterior, há duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI
3.510 e 3.526) tramitando no Supremo Tribunal Federal, justamente questionando
o conflito entre estes artigos e os princípios determinados na CRFB/88.
Por sua vez, o art. 6º não foge do foco das discussões, pois,
é em seu inciso III e IV que fica proibida a utilização de embriões e a prática da
clonagem humana.
“Art. 6. Fica proibido:
[...]
III – engenharia genética em célula germinal humana, zigoto
humano e embrião humano;
IV – clonagem humana; [...]”.387
A Lei 11.105/05 vai nesse sentido, vedando a clonagem
humana e o uso de células germinativas, impondo para o transgressor as
penalidades previstas nos arts. 24 ao 26.
“Art. 24. Utilizar embrião humano em desacordo com o que
dispõe o art. 5º desta Lei:
Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa”.
386 “Art. 15. Comprar ou vender tecidos, órgãos ou partes do corpo humanos: Pena- reclusão de três a oito anos, e multa, de 200 a 360 dias-multa. Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem promove, intermedeia, facilita ou aufere qualquer vantagem com a transação”. BRASIL. Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de 1997. Brasília, 1997. 387 BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005.
96
“Art. 25. Praticar engenharia genética em célula germinal
humana, zigoto humano ou embrião humano:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa”.
“Art. 26. Realizar clonagem humana:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa”.388
Além da previsão de pena para os transgressores da lei, a
mesma impõe aos que furtarem o cumprimento das normas por ela estabelecido,
responsabilidade civil e administrativa, prevendo nos arts. 20 ao 23, capítulo VII
que:
“Art. 20. Sem prejuízo da aplicação das penas previstas
nesta Lei, os responsáveis pelos danos ao meio ambiente e a
terceiros responderão, solidariamente, por sua indenização ou
reparação integral, independentemente da existência de culpa”.
“Art. 21. Considera-se infração administrativa toda ação ou
omissão que viole as normas previstas nesta Lei e demais
disposições legais pertinentes.
Parágrafo único. As infrações administrativas serão punidas
na forma estabelecida no regulamento desta Lei,
independentemente das medidas cautelares de apreensão de
produtos, suspensão de venda de produto e embargos de
atividades, com as seguintes sanções:
I – advertência;
II – multa;
III – apreensão de OGM e seus derivados;
IV – suspensão da venda de OGM e seus derivados;
V – embargo da atividade;
388 BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005.
97
VI – interdição parcial ou total do estabelecimento, atividade
ou empreendimento;
VII – suspensão de registro, licença ou autorização;
VIII – cancelamento de registro, licença ou autorização;
IX – perda ou restrição de incentivo e benefício fiscal
concedidos pelo governo;
X – perda ou suspensão da participação em linha de
financiamento em estabelecimento oficial de crédito;
XI – intervenção no estabelecimento;
XII – proibição de contratar com a administração pública, por
período de até 5 (cinco) anos”.
“Art. 22. Compete aos órgãos e entidades de registro e
fiscalização, referidos no art. 16 desta Lei, definir critérios, valores
e aplicar multas de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a R$ 1.500.000,00
(um milhão e quinhentos mil reais), proporcionalmente à gravidade
da infração.
§ 1o As multas poderão ser aplicadas cumulativamente com
as demais sanções previstas neste artigo.
§ 2o No caso de reincidência, a multa será aplicada em
dobro.
§ 3o No caso de infração continuada, caracterizada pela
permanência da ação ou omissão inicialmente punida, será a
respectiva penalidade aplicada diariamente até cessar sua causa,
sem prejuízo da paralisação imediata da atividade ou da interdição
do laboratório ou da instituição ou empresa responsável”.
“Art. 23. As multas previstas nesta Lei serão aplicadas pelos
órgãos e entidades de registro e fiscalização dos Ministérios da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento, da Saúde, do Meio
Ambiente e da Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da
Presidência da República, referidos no art. 16 desta Lei, de acordo
com suas respectivas competências.
98
§ 1o Os recursos arrecadados com a aplicação de multas
serão destinados aos órgãos e entidades de registro e
fiscalização, referidos no art. 16 desta Lei, que aplicarem a multa.
§ 2o Os órgãos e entidades fiscalizadores da administração
pública federal poderão celebrar convênios com os Estados,
Distrito Federal e Municípios, para a execução de serviços
relacionados à atividade de fiscalização prevista nesta Lei e
poderão repassar-lhes parcela da receita obtida com a aplicação
de multas.
§ 3o A autoridade fiscalizadora encaminhará cópia do auto de
infração à CTNBio.
§ 4o Quando a infração constituir crime ou contravenção, ou
lesão à Fazenda Pública ou ao consumidor, a autoridade
fiscalizadora representará junto ao órgão competente para
apuração das responsabilidades administrativa e penal”. 389
Contudo, apesar desta nova Lei de Biossegurança ter
nascido justamente para “tapar vazios” da lei anterior, percebe-se que sua
redação é intricada, isto porque apresenta contradição em ponto fundamental. A
lei permite a pesquisa e a terapia com células embrionárias, ao mesmo tempo em
que proíbe engenharia genética em célula germinal humana, zigoto humano e
embrião humano (artigo 6º, inciso III), contradição essa que mais se destaca se
sopesada a definição constante do artigo 3º, inciso V, atinente ao OGM.390
Apesar de apresentar algumas contradições, a verdade é
que o passo dado pela Lei 11.105 é conseqüência natural do que vem se
verificando no mundo. A biotecnologia tem progredido mundialmente e, por
conseguinte, as normas que a disciplinam, a integrarem o Biodireito. 391
389 BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005. 390SARTORI, Ivan Ricardo Garisio. Consultor Jurídico. “Célula-tronco: Direito não se submete a barreiras morais e religiosas”. Disponível em: <http://conjur.estadao.com.br/static/text/37274>. Acessado em 10 de outubro de 2007.
391 SARTORI, Ivan Ricardo Garisio. Consultor Jurídico. “Célula-tronco: Direito não se submete a barreiras morais e religiosas”. Disponível em: <http://conjur.estadao.com.br/static/ text/37274>. Acessado em 10 de outubro de 2007.
99
Segundo Paulo Costa Leite, “o instrumental jurídico atual
ainda é precário para lidar com as novas relações jurídicas que se estabelecerão
entre as pessoas envolvidas num processo de clonagem”.392
Sabe-se que o tema traz consigo uma gama de
questionamentos, dúvidas e posições, porém, conforme VIERA expõe,
“Os operadores do Direito não têm se furtado a admitir a realidade
da clonagem e têm se ocupado em pensar nas soluções jurídicas
demandadas por ela. Embora o trabalho de pesquisadores e
cientistas tenha fascinante poder de afetar a vida de todos os
indivíduos, estes não podem nunca esquecer que não é possível
“brincar de Deus” sem que se pague por isso um alto preço.
Afinal, embora cada descoberta seja um “flash”, a vida humana
“não é brinquedo não”!”. 393
Assim, no tocante a conceituação do que é vida, embrião,
“Não cabe a nós, operários do direito, a avaliação da justeza
dessa disposição, mas apenas observá-la e/ou aplicá-la, ficando
para os expertos em engenharia genética ou biotecnologia o
encargo de demonstrar a incongruência da imposição”.394
Desta forma, sendo o Direito dinâmico, “não cabe impor
barreiras ou estabelecer divisas morais e religiosas instransponíveis, mas sim,
disciplinar fatos que, inevitavelmente, venham a surgir em decorrência da
evolução humana”.395
“Certo é que a rápida evolução científica trará aos tribunais feitos
em número crescente. O Judiciário não pode funcionar num vazio
392 LEITE, Paulo Costa. Clonagem humana: Costa Leite enviará íntegra das palestras ao Congresso. Superior Tribunal de Justiça, 2001. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/ publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=69223>. Acessado em 10 de outubro de 2007.
393 VIEIRA, Teresa Rodrigues; OLIVEIRA, Paulo Henrique. A novela O Clone e os aspectos jurídicos da clonagem humana. Consulex: Revista Jurídica, v. 6, n. 132, p. 64-65, jul. 2002.
394 ERDELYI, Maria Fernanda. O Começo da Vida. STF decidirá destino das pesquisas com células-tronco. Consultor Jurídico. 04 de julho de 2006. Brasília. Disponível em: <http://conjur. estadao.com.br/static/text/45959>. Acessado em 10 de outubro de 2007.
395 SARTORI, Ivan Ricardo Garisio. Consultor Jurídico. “Célula-tronco: Direito não se submete a barreiras morais e religiosas”. Disponível em: <http://conjur.estadao.com.br/ static/text/37274>. Acessado em 10 de outubro de 2007.
100
jurídico, e o vácuo aumentará à medida que a ciência evoluir
aceleradamente, porque a feitura da lei é, por necessidade, fruto
de longa reflexão. O Judiciário haverá de guiar-se, sempre, por
normas legais e, não as tendo, haverá de se socorrer à analogia,
aos costumes e aos princípios gerais de direito, levando em conta,
sempre, as exigências do bem comum e o papel criador da
jurisprudência. Contudo, atuará com orientação mais firme, menos
sujeita a disputas, se dispuser formal e materialmente de normas
diretas e claras, que se nortearão pelas decisões emanadas de
um diálogo multidisciplinar e acordadas – oxalá! por todos os
interessados”.
[...]
“Importante frisar que tais decisões não podem ser deixadas a
cargo de apenas um ou de uns poucos grupos interessados;
certamente não podem ser deixadas somente aos industriais, ou
aos países ricos, ou à classe política; sobretudo, não devem ser
obra exclusiva das classes políticas desses países, que agem sob
a influência de seus interesses mercantilistas”. 396
Contudo, lidar com a questão de embriões congelados na
prática da clonagem humana, é ter consciência de que se trata de uma discussão
que vai muito além desta atual legislação de biossegurança, é uma realidade
muito discutida, porém, pouco normatizada pelo Direito Moderno, que encontra
inúmeras dificuldades em dar suporte jurídico a esta questão. Inúmeros são os
projetos de lei, no entanto, verifica-se que o esforço de legislar e regulamentar
este assunto é complexo, uma vez que envolve diretamente a vida, o homem e os
seus valores, além de que na prática da manipulação genética um erro pode
causar a perda ou deficiência de uma vida.
Neste pensamento, Carlos María Casabona descreve:
“O jurista encontra, cada vez mais freqüentemente, sérios
obstáculos que, inevitavelmente, tem que enfrentar quando
pretende analisar uma realidade social nova, sobretudo quando
396 NAVES, Nilson. Bioética e Justiça. Sexto Congresso Mundial de Bioética, Brasília, 2002. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/Discursos/0000361/Bio%C3%A9tica-30-10-2002.doc>. Acessado em 09 de outubro de 2007.
101
sua instauração é condicionada de forma decisiva pelos avanços
científicos e tecnológicos. A dificuldade consiste numa
comprovação muito simples: para levar a cabo com êxito a análise
jurídica da realidade social que se propôs como objeto de estudo,
é preciso que o jurista tenha um conhecimento o mais acertado e
fiel possível de tal realidade ou, dito de outro modo, do assunto
que é objeto da apreciação jurídica (...) mas (...) quando as
inovações tecnológicas ou as descobertas científicas se
apresentam como núcleo ou fundo daquelas relações, o jurista
corre o risco de fracassar em seu intento analítico, se não tiver
realizado o esforço adicional de captar pelo menos os aspectos
mais relevantes dessas inovações ou descobertas e o modo como
verdadeiramente atuam nas relações humanas”.397
Destarte, trabalhar os aspectos jurídicos da utilização de
embriões congelados na prática da clonagem humana, com o pensamento
voltado à luz da atual Lei de Biossegurança398, é ter o dever de assumir uma
postura firme e coerente diante de um desafio imposto pela sociedade. De um
lado a vida de embriões congelados e de outro a vida de quem está à espera e a
busca da cura de uma enfermidade.399 Conforme Tereza Rodrigues Vieira, “o
tempo dirá se prevalecerá a ciência ou a consciência”. 400
397 CASABONA, Carlos Maria Romeo. Genética e Direito. In: CASABONA, Carlos Maria Romeo (org). Biotecnologia, Direito e Bioética: perspectivas em Direito Comparado. Belo Horizonte: Del Rey e PUC Minas, 2002. p.23.
398 BRASIL. Lei nº. 11.105, de 24 de março de 2005. Brasília, 2005. 399 BONFIM, Danielle Cabral. Clonagem: benefícios e riscos. p. 62. 400 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. p. 34.
102
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Quando realizada a escolha do tema, “Aspectos ético-
jurídicos da utilização de embriões congelados na prática da clonagem humana:
uma análise à luz da atual Lei de Biossegurança brasileira”, a principal
preocupação estava voltada a alta complexidade deste.
Todavia, a curiosidade pelo conhecimento deste tema tão
polêmico, e o interesse de saber o posicionamento do Direito frente a proteção
jurídica da vida embrionária, impulsionaram em estudar, pesquisar e descrever o
posicionamento das pessoas, dos estudiosos do Direito, da ciência e da medicina.
Desta forma, o primeiro capítulo verificou-se a importância
atual do Biodireito, buscando adequar a Bioética ao ordenamento jurídico. Pois,
enquanto a Bioética busca estudar o comportamento humano nas atividades
científicas e médicas, o Biodireito nasce com a finalidade de cercar estas
condutas humanas através da produção doutrinária, legislativa e judicial.
Através deste entendimento, chega-se a conclusão de que a
Bioética e o Biodireito devem caminhar lado a lado, protegendo a dignidade do
ser humano, sua vida e seus direitos.
Quanto ao capítulo dois percebeu-se que a clonagem
humana é um tema polêmico, possibilitando opiniões distintas sobre a validade do
prosseguimento das pesquisas, tanto no caso da clonagem para fins reprodutivos
bem como para fins terapêuticos.
A clonagem humana não é permitida no sistema normativo
brasileiro, conforme dispõe a Lei 11.105/05. Porém, grandes são as discussões
sobre a possibilidade futura de estar-se realizando tal técnica reprodutiva. Desta
forma, é relevante que sejam avaliadas as reais intenções e finalidades de
utilização da técnica em cada caso.
103
O entendimento majoritário acredita que a clonagem para
fins reprodutivos não deve ser realizada, em face de toda ineficiência que a
técnica apresenta, haja vista que para clonar um só indivíduo, vários embriões
seriam excluídos, e, se dentre todos esses embriões algum chegasse até o
nascimento, correr-se-ia o risco da criança nascer com sérios defeitos genéticos.
Ademais, a realização deste tipo de clonagem representa uma ameaça à
biodiversidade genética.
Em contrapartida, a clonagem para fins terapêuticos, que
tem por objetivo a regeneração de tecidos lesionados em decorrência de doenças
degenerativas, apresenta opiniões bastante divididas. Apesar de ser uma grande
promessa no desenvolvimento de novas terapias, o maior obstáculo para a sua
realização encontra-se na questão de utilização de embriões humanos.
Finalizando o estudo pretendido, no terceiro capítulo foram
analisadas as opiniões e laudos sobre a utilização de embriões em práticas
científicas, observou-se que a resposta para tantos questionamentos reside no
modo como o embrião de cinco dias de desenvolvimento é enxergado, ou seja, se
um embrião no estágio de blastócito pode ou não ser considerado um indivíduo,
ou seria apenas um aglomerado de células.
Umas das soluções encontradas a fim de evitar o uso
indiscriminado de embriões e outros abusos, seria a regulamentação através de
leis, estipulando penalidades civis e criminais, bem como determinando um
estágio limite para serem utilizados. Neste caso, coerente seria utilizar-se entre o
5º e 14º dia pós-fertilização, pois, posteriormente inicia-se a formação do tubo
neural.
Apesar das divergências, até os contrários à clonagem
terapêutica tem consciência dos benefícios que esta pode trazer, tanto na área da
regeneração de tecidos, como no entendimento dos processos de
desenvolvimento embrionários e no campo das doenças genéticas humanas.
104
Diante das polêmicas, foi criada no Brasil a Lei de
Biossegurança (Lei nº.11.105, de 24 de março de 2005), a qual regulamenta a
utilização de embriões humanos nas atividades biotecnocientíficas.
Todavia, a própria Lei é contraditória, pois ao mesmo tempo
em que proíbe a clonagem humana e a utilização de embriões congelados; dispõe
em outro artigo sobre a possibilidade da utilização de células-tronco embrionárias
obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro em pesquisas e
terapias, desde que atendidas as condições previstas.
Desta forma, analisando o assunto de forma geral, verifica-
se que embora a nova Lei de Biossegurança brasileira vede a clonagem humana
em suas duas formas, reprodutiva e terapêutica, pode-se dizer que um passo foi
dado no que tange às terapias com células-tronco embrionárias extraídas de
embriões excedentes, abrindo-se caminhos para que, futuramente, possa-se
repensar assuntos como a clonagem terapêutica, e que sobretudo, esta técnica
possa ser realizada com segurança.
Observou-se, ainda, que a Lei de Biossegurança é tímida e
restritiva no que se refere a clonagem humana, embriões humanos e células-
tronco, e abrangente com relação a liberação comercial de biotecnologia vegetal.
Espera-se, assim, que no futuro próximo haja uma maior preocupação com a
normatização destes assuntos, para que quando colocados em prática tenha-se
plena consciência de suas finalidades e resultados.
Por fim, todas as hipóteses previstas na introdução foram
confirmadas, ou seja, a Bioética e o Biodireito são instrumentos importantes para
o controle das atividades relacionadas aos avanços biotecnológicos; a clonagem
humana não é permitida no sistema normativo brasileiro e existe no Brasil
legislação que regulamente a utilização de embriões humanos nas atividades
biotecnocientíficas, sendo a Lei nº. 11.105/2005, a atual Lei de Biossegurança.
105
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ANEXOS
Ilustrações de Sirio J. B. Cançado para o suplemento especial clonagem da pesquisa fapesp nº 73, de 03/2002.