ARTES E TECNOLOGIAS DIGITAIS NA ESCOLA...
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ARTES E TECNOLOGIAS DIGITAIS NA ESCOLA: PERCEPÇÃO DOS
ALUNOS EM SITUAÇÃO DE POBREZA
Elvis Mar de Souza1
Daiani Damm Tonetto Riedner2
Resumo: o presente artigo é resultado de uma pesquisa realizada no Curso de Especialização em Educação, Pobreza e Desigualdade Social, cujo foco foi investigar a importância da arte e das tecnologias digitais em uma escola pública de Campo Grande, a partir da percepção de professores e alunos. Do ponto de vista metodológico realizamos entrevistas semiestruturadas com os quatro professores de artes da escola e aplicamos um questionário aos alunos dos 4º e 5º anos do Ensino Fundamental I. A pesquisa nos permitiu compreender que os professores de artes usam tecnologias na escola, mas o uso ainda é limitado. Pelo desconhecimento dos professores sobre o Programa Bolsa Família e dos seus alunos beneficiários, não foi possível perceber se a arte aliada à tecnologia poderia ter um impacto pedagógico maior nos alunos beneficiários.
Palavras-chave: Educação. Tecnologias. Artes. Escola. Pobreza.
1 Introdução
Este artigo é resultado do Trabalho de Conclusão de Curso realizado no Curso de
Especialização em Educação, Pobreza e Desigualdade Social. A finalidade desse curso foi
provocar o debate e a reflexão no que diz respeito aos processos de educação que envolve a
pobreza e extrema pobreza. O objeto desse estudo é o trabalho desenvolvido pelos professores
de artes de uma escola pública da cidade de Campo Grande, em turmas com grande número de
beneficiários do Programa Bolsa Família.
O objetivo geral do estudo foi identificar e analisar se o trabalho do professor de artes
do ensino fundamental tem apresentado estratégias tecnológicas diferenciadas aos alunos em
situação de pobreza, de modo que tenham contato com os bens culturais e artísticos produzidos
e sistematizados pela humanidade.
1 Aluno do Curso de Especialização em Educação, Pobreza e Desigualdade Social. 2 Professora do Curso de Pedagogia do CPAN/UFMS e orientadora do trabalho.
Trabalho de Conclusão de Curso 2
Como desdobramento do objetivo geral, os objetivos específicos tinham como
propósito conhecer a analisar as práticas com uso de tecnologias no ensino de arte; conhecer a
analisar a percepção dos alunos em situação de pobreza sobre o ensino de arte e o uso de
tecnologias; e conhecer a analisar as características institucionais, pedagógicas e tecnológicas
que favorecem o atendimento aos alunos em situação de pobreza.
O campo da pesquisa foi a Escola Municipal José de Souza (Zezão) especificamente
o Ensino Fundamental I. Os dados foram obtidos através de entrevistas com quarto professores
e questionários aplicados em duas turmas do 4º ano e duas turmas do 5º ano, totalizando 93
questionários respondidos.
O trabalho foi dividido no primeiro momento na contextualização Histórica do Ensino
da Arte, um breve resumo sobre a evolução das artes inserida na educação básica brasileira em
sua importância e peculiaridades. No segundo momento as tecnologias inseridas em conjunto
com as aulas de arte, a arte/tecnologia como uma nova visão na educação. No terceiro momento
apresentamos a percepção dos docentes sobre o Programa Bolsa Família e o seu papel quanto
mediador. No último tópico apresentamos os dados dos questionários com os alunos e suas
percepções sobre as artes e as tecnologias inseridas na sala de aula.
2 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DO ENSINO DE ARTES
“A alegria não chega apenas no encontro do achado, mas faz parte do processo da busca. E ensinar e aprender não pode dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria”.
(Paulo Freire)
Ao longo dos séculos foi construída uma visão do conjunto de ideias pedagógicas que
resultam na atual situação educacional brasileira. Do ensino jesuítico às teorias pedagógicas
atuais, muito se desenvolveu e no âmbito do ensino de arte não foi diferente. Tanto a chegada
da missão Francesa em 1816 quanto a Lei 12.287, de 13 de julho de 2010 – que torna a arte
como componente curricular obrigatório nos diversos níveis da Educação Básica - foram etapas
cruciais na evolução da arte-educação e aproximaram a arte ao ensino público que é conhecido
hoje.
Trabalho de Conclusão de Curso 3
Hoje, nosso conhecimento como ensino está diretamente vinculado às escolas públicas
brasileiras. O ensino dirigido nas escolas também sofreu inúmeras mudanças espaciais,
pedagógicas e tecnológicas e se consolida recentemente quando é estabelecida a
obrigatoriedade do ensino a partir dos quatro anos de idade (LDB 12.796/2013) salientando a
ideia de educação para todos.
Sabemos que o ensino público está dividido em três etapas que se subdividem em ciclos
quanto ao nível seriado de aprendizagem: O ensino Infantil que precede os seis anos de idade;
O ensino fundamental, subdividido entre ensino fundamental I - que deve ser iniciado aos seis
anos e está seriado entre 1º ao 5º ano - e ensino fundamental II - de 6º à 9º anos; e Ensino Médio
de 1º ao 3º ano. Observando estes pontos, podemos considerar que o ensino de arte nos anos
iniciais ou mesmo na Educação Infantil pode ser um alicerce para que essa criança em sua
permanência escolar contemple assim sua maior fase de aprendizagem, pois é nesse período
que o desenvolvimento cognitivo da criança começa ser aguçado em termos de processamento
de informações, recursos conceituais, habilidade perceptiva, a aprendizagem de línguas, e
outros aspectos do desenvolvimento do cérebro em relação ao ponto de vista no campo de
estudo da neurociência e psicologia.
O ensino fundamental II contempla alguns anseios por parte do estado, que de acordo
com o Referencial Curricular de 2012 de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, demanda a
disciplina de artes, em suma: [...] contribuir para o acesso aos conhecimentos sobre arte, tendo em vista a busca do conhecimento e o desenvolvimento integral da criança. É no ensino de Artes que se desenvolve e se aprimora o conhecimento sensível, que se faz a educação estética, isto é, que se tem o contato com os bens culturais e artísticos produzidos e sistematizados pela humanidade, mas de maneira a não fazer uma reprodução, mas uma recriação e criação a partir destes conhecimentos (CAMPO GRANDE, 2012, p.154).
O grande desafio do professor está na luta para que o ensino de arte seja interpretado
como conhecimento essencial ao ser humano e não apenas um componente curricular aos olhos
do educando. A arte configura-se como um conhecimento específico, uma parte da ciência
ligada ao pensamento e poder reflexivo, visando um apontamento estético, e uma sobreposição
da percepção refletida na expressão do indivíduo. Vigotski fala (1999, p. 57) que: “A arte é
trabalho do pensamento, mas de um pensamento emocional inteiramente específico”. E, ainda
mais, especificamente, sobre a arte como conhecimento:
Verifica-se, pois, que a poesia ou a arte são um modo específico de pensamento, que acaba acarretando o mesmo que o conhecimento científico
Trabalho de Conclusão de Curso 4
acarreta, só que o faz por outras vias. A arte difere das ciências apenas pelos seus métodos, ou seja, pelo modo de vivenciar, vale dizer, psicologicamente (VIGOTSKI, 1999, p. 34).
Expandir os olhos do aluno para enxergar a verdadeira função da arte na vida deles é o
dever de qualquer professor de artes, já transmitir além do conteúdo é uma característica
marcante de um profissional que supera sua competência na busca de novos caminhos para a
aprendizagem. Cabe ao professor reexaminar comumente seus aspectos metodológicos, para
não recair no ensino tradicionalista já decaído. Sobre isso, Vicent Lanier (2011, p. 55) conclui: Temos de nos apoiar no aluno como orientação para aquilo que constitui o conteúdo mais eficiente para as aulas. Temos de suprimir ou reexaminar nosso impulso virtualmente incontrolável de mexer com produção de ateliê, alimentado pelo peso de décadas de prática e pela antiga e quase permanente preocupação com a criação artística do indivíduo. Temos de assumir uma intelectualidade impopular tanto entre estudantes e professores quanto entres os praticantes das artes, e atacar os interesses obscuros e bolorentos do filósofo.
Nesse sentido, esse trabalho tem como foco investigar de que forma o professor tem
conduzido o trabalho na disciplina de arte de modo a oferecer aos alunos em situação de
pobreza o contato com os bens culturais e artísticos produzidos e sistematizados pela
humanidade.
De acordo com Lalande (1999) a palavra método estaria associada às ideias de
demanda, empenho por um objetivo, investigação e estudo. Partindo para um conceito mais
moderno, está ligado ao caminho, a passagem. Assim mesmo estão ligadas os métodos em sala
de aula que aborde as linguagens da arte mais próxima da realidade desses estudantes.
Essas articulações no ensino das artes precisam ser discutidas e sanadas, uma vez que
a realidade educacional clama por uma interferência maior do professor de arte, pois só o
conteúdo não é suficiente para que este aluno contemple sua aprendizagem. A relevância deste
estudo se justifica na possibilidade de identificar as necessidades dos alunos em situação de
pobreza no que diz respeito ao ensino de artes.
3 ENSINO DE ARTES E TECNOLOGIAS DIGITAIS: UMA POSSÍVEL
ARTICULAÇÃO
Através das vivências em sala de aula podemos concluir em uma passagem rápida a
necessidade de inovação nas metodologias no ensino das artes para uma maior abordagem e
aprendizagem dos alunos. Visão estabelecida também pela abundância de informação recebida
Trabalho de Conclusão de Curso 5
pelos alunos diante as novas mídias e tecnologias. A rapidez e acessibilidade faz com que cada
vez mais o aluno veja a sala de aula e principalmente o professor como algo extenuante.
Vemos que não existem programas, projetos que auxiliem especificamente nesse
campo, pois as formações continuadas cedidas, tanto pela Secretaria de Estado de Educação
quanto a Secretaria Municipal, se limitam a palestras e discussões, sem apontar estratégias
metodológicas para os professores. Apesar de ser realmente difícil encontrar caminhos
metodológicos para aulas de arte, devemos construí-los juntamente com os profissionais da
área, de tal modo que seja democrática sua investigação.
Os principais problemas que observamos em sala é resultado de um processo histórico
longo do retrato da educação e da arte construídas no Brasil. Ana Mae Barbosa em Tópicos
Utópicos (1998) integra a lista que sustenta esta fundamentação, visto que prioritariamente
relata o caminho histórico brasileiro da arte-educação, apontando nosso processo de
consciência como exaustivamente confuso, e acrescenta esta realidade como uma “conturbada
personalidade colonizada”.
Este peso histórico no ensino de artes vem sendo negligenciado por vários aspectos,
entre eles as alternâncias pedagógicas nos últimos anos. Do conceito tecnicista o ensino de arte
passa a ligar-se a auto expressão. Já a última tendência foi só incorporada no século passado,
onde passam de auto expressão para um conceito ligado a livre-expressão: Até o início dos anos 80 o compromisso da Arte na Escola era apenas com o desenvolvimento da expressão pessoal do aluno. Hoje, à livre-expressão, a Arte-Educação acrescenta a livre-interpretação da obra de arte como objetivo de ensino. O slogan modernista de que todos somos artistas era utópico e foi substituído pela ideia de que todos podemos compreender e usufruir da arte (BARBOSA, 2005, p.17).
Esta realidade marcada de mudanças faz com que a figura do professor seja essencial
para a aprendizagem do aluno. Ele é a ponte, o mediador, o fio condutor entre a informação e
o aluno, por isso o papel dele é de grande importância. Muito se explana nas pesquisas e estudos
sobre a tecnologia e os novos recursos midiáticos, porém pouco se discute sobre as
metodologias as quais o professor precisa se adequar para torná-las não só possíveis, mas
comuns nas aulas de arte. Metodologias estas que interfiram na compreensão da arte em sua
essência e que ajude na capacidade cognitiva do aluno.
No fundo, o que os alunos precisam é de um conteúdo atualizado que mostre a eles,
desde sempre, as multifaces da arte e sua relevante contribuição. Sobre isso Martins (2011, p.
59) aponta:
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Hoje, carregados pelos limites e dificuldades da escola pública e particular, vejo educadores que lutam pela presença da arte na escola. Professores que não têm parceiros para estudar, refletir, discutir, aprofundar suas inquietações. Professores solitários que pouco são instigados em suas reuniões pedagógicas e que se emocionam quando falam de si num espaço que lhe é negado.
O professor não só luta por sua aula, mas também por inúmeros aspectos vivenciados
dia a dia. Porém, o educador não pode esmorecer e despejar suas aulas naqueles que estão
construindo percepções, ideias e conceitos. É neles que este profissional deve centrar suas
ações, reunir forças para garantir um bom aprendizado.
Tendo em vista estas questões, qual o caminho a ser percorrido e direcionado para que
o ensino de artes esteja cada dia mais engajado e seus alunos cada vez mais interessados? Como
essa nova visão de arte mais atual e tecnológica pode ajudar no desenvolvimento pessoal e
social dos alunos em situação de pobreza?
Baseado nestas premissas, as articulações metodológicas devem estar direcionadas e
principalmente por estar englobando uma parte mediana e final desta grande etapa de ensino.
Acredita-se que este aluno situado entre os anos iniciais consigam adquirir os conhecimentos
prévios que circunda um amadurecimento maior quanto ao conhecimento.
Ferraz e Fusari (2001, p. 98) apresentam uma concepção de metodologia que
denominam de encaminhamentos metodológicos: Em outras palavras, esses encaminhamentos metodológicos constituem em opções e atos que são concretizados em projetos ou no próprio ser em um conjunto de ideias e teorias educativas em arte transformadas em opções e atos que são concretizados em projetos ou no próprio desenvolvimento das aulas de Arte. São ideias e teorias (ou seja, posições a respeito de “como devem” ou “como deveriam ser” as práticas educativas em arte) baseadas ao mesmo tempo em propostas de estudiosos da área e em nossas práticas escolares em arte e que se cristalizam nas propostas e aulas.
Todos estes tópicos levantados anteriormente são, digamos assim, os desafios nesta
contemporaneidade educacional. Já os obstáculos continuam os mesmos de antes: recursos
escassos ou inoperantes, dificuldades sociais e de relacionamento entre escola e comunidade,
as mudanças sociais na família dos alunos, materiais didáticos inacessíveis, a gestão escolar
dependente de meios burocráticos e políticos, enfim, são inúmeros os entraves que o ensino da
arte enfrenta diariamente, mas que não podemos deixá-los de lado pelo fato de serem
corriqueiros.
Trabalho de Conclusão de Curso 7
4 ARTES E TECNOLOGIAS NO ENSINO FUNDAMENTAL: PERCEPÇÃO DOS
PROFESSORES
Sendo a tecnologia uma constante na história da arte, sabemos que a mesma não se
faz efêmera ao ponto de vista educacional. A arte em si já faz com que crianças possam sonhar
sobre um mundo de cores e possibilidades que muitas vezes lhe é negado. Quando isso é
agregado à situação de pobreza e extrema pobreza, as tecnologias aliadas às artes podem se
tornar o ensino de artes ainda mais interessante e eficaz.
Nesse tópico vamos apresentar e analisar os dados obtidos através das entrevistas com
os professores e dos questionários aplicados aos alunos. Os 4 (quatro) professores entrevistados
são profissionais com formação em Artes Visuais (Licenciatura plena). O quadro abaixo
apresenta a caracterização dos professores entrevistados.
Quadro 1 – Caracterização dos professores
Professor Formação Tempo de atuação na docência
Tempo de atuação na escola
Número de turmas em que leciona
Professor 1 Educação Artística –
Licenciatura Plena.
17 anos. 2 anos 5 turmas
Professor 2 Artes Visuais com Habilitação em Artes Plásticas.
12 anos 8 anos 6 turmas
Professor 3 Artes Visuais –
Licenciatura Plena.
2 anos 1 ano 6 turmas
Professor 4 Educação Artística –
Licenciatura Plena.
12 anos 3 anos 7 turmas
Organização: Dos autores.
A entrevista abordou pontos peculiares de suas experiências com Arte e tecnologia e
suas vivências com as mesmas em sala de aula, além da percepção dos docentes sobre o
Programa do Bolsa Família, sobre os alunos beneficiários do Programa e suas possibilidades
de contribuir para a formação dessas crianças.
Quando perguntado aos professores se conheciam alunos que são beneficiários do
Programa Bolsa Família nas turmas que lecionam apenas um tem esse conhecimento, os demais
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não souberam identificar se existem beneficiários em suas turmas, segundo os mesmos por
muitas vezes existir certo tipo de receio em assumir que faz parte do programa.
Perguntamos aos professores sobre a opinião deles sobre o recebimento do benefício
pelas famílias que são pobres e extremamente pobres. Dos quatro professores, três acham
importante o recebimento do benefício. E nos chamou atenção a fala dessa professora abaixo:
Minha opinião... (risos)... Sou professora, vendo docinhos e salada de frutas para cumprir com meus compromissos. O governo desconta 27% de imposto de renda para sustentar quem não quer trabalhar e na maior parte das pessoas ou famílias ainda são fumantes, dependentes químicos ou alcoólatras. (Professora 1).
É o que Oliveira (2015, p. 13780) aponta como “[...] efeito-preguiça do Programa que
ao invés de garantir condições de trabalho, acabava levando as famílias a se acomodarem com
o recebimento do benefício”. Como se as famílias beneficiárias fossem todas pessoas
preguiçosas, que não tem vontade de ter uma renda superior ao benefício que o PBF oferece.
A tentação da mentalidade preconceituosa e muito grande na operação ideológica de imputar aos que considera desiguais, e, frequentemente, inferiores a ela, atributos negativos gerais tendentes à homogeneização das condutas perante determinados fatos. No caso, em especial, quando se trata de pessoas pobres, lidando com dinheiro, ainda mais provenientes de uma transferência estatal de renda, imediatamente são acionados mecanismos mentais ideológicos desqualificadores dos pobres. Atribui-se impunemente a “eles” identidades negativas como se fossem dados da natureza: os pobres são assim, fazem isso ou aquilo, sentem as coisas de tal maneira. A diferença situacional para a mentalidade preconceituosa constitui razão suficiente e para a fala estandardizada sobre o outro. (REGO; PINZANI, 2014, p. 198).
Muitos desses profissionais possuem um contato próximo com as tecnologias ou
recursos midiáticos, porém todo esse conhecimento esbarra em um problema que é conhecido
em nossa educação, a falta de recursos e laboratórios apropriados para o desenvolvimento das
aulas. Escola sem infraestrutura mínima para as aulas de artes, sem laboratórios de informática,
onde cabe ao docente improvisar para que consiga ministrar sua aula de uma forma coesa e
interessante para com esses alunos. Quando perguntamos o que eles entendiam por arte-
tecnologia, eles indicaram que:
É usar tecnologia para fazer, pesquisar e aprender arte. (Professor 1, 2016). Toda produção artística se utiliza de alguma tecnologia, mas os mais evoluídos poderiam ser vídeos, fotografias, edição de imagens e interferência. (Professor 2, 2016). Que a partir da tecnologia os alunos aprenderão as atividades de arte, ou seja, utilizando à tecnologia eles possuirão o conhecimento. (Professor 3, 2016). Computador, filmes, som, jogos. (Professor 4, 2016).
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Os profissionais entrevistados se utilizam do Referencial Curricular, 1º ao 9º ano do
Ensino Fundamental. (MS, 2012). No entanto, no que diz respeito ao uso de tecnologia, eles se
limitam a aparelho de som, computador, multimídia, Datashow. Tais recursos, na maioria das
vezes, pertencem aos próprios professores ou até mesmo aos alunos.
Quando falamos do celular com acesso à internet, um dos professores destaca que “Os
alunos de hoje, principalmente os adolescentes ou jovens, não “desgrudam” de celular... Então,
apesar das “proibições”, sempre peço que utilizem a internet (pesquisa), mas coloco no
planejamento”. (Professor 1, 2016).
E quanto a acreditar que a arte aliada à tecnologia pode ajudar no desempenho das
crianças em situação de pobreza e extrema pobreza “Para qualquer criança, talvez para a
criança pobre traga novidade maior atenção” (Professor 2, 2016). Para outro docente, “Pode.
Todo conhecimento é válido. Mesmo que seja reduzido. O importante é descobrir o meio.”
(Professor 1, 2016). Seja no campo das artes ou nas demais disciplinas curriculares levar o
conhecimento a essas crianças é de suma importância tanto para o seu desenvolvimento
educacional quanto a sua inserção social. “Acredito que a tecnologia pode despertar o interesse
na criança ampliando o conhecimento no individual” (Professor 3, 2016).
E quando pensamos de que forma o ensino de artes pode garantir aos alunos em
situação de pobreza e extrema pobreza o contato com os bens culturais socialmente
reconhecidos, imagina-se qual é o papel do professor de artes para garantir esse acesso. E de
que forma se acredita que a tecnologia pode potencializar esse aprendizado um dos professores
possui uma visão bem peculiar:
Utilizando- se de toda a tecnologia possível o professor possibilita, se de forma bem orientada, que o aluno perceba a riqueza e importância da arte. O professor é mediador e motivador desse conhecimento. A tecnologia facilita o acesso e de forma criativa e inteligente pode desenvolver a criatividade do aluno. Não adianta usar a tecnologia de forma pobre e tradicionalista. (Professor 2, 2016).
Outro professor destaca que:
O ensino de arte trás esse contato através dos artistas e teóricos da área e o papel do professor é fundamental, apresentando imagens entre outros recursos conforme o referencial; acredito que a tecnologia consegue ampliar em diversos aspectos na criança. Professor 3, 2016).
De uma maneira geral, os professores entrevistados acreditam que a tecnologia motiva
os alunos a estudar e estimula a criatividade. Como já vimos, a escola atende uma grande
demanda de alunos beneficiários do Programa Bolsa Família e nesse contexto o papel do
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professor se torna fundamental, pois é papel do professor atuar como “filtro” da enormidade
de informações que as crianças têm acesso diariamente.
As crianças em situação de pobreza também tem acesso às mídias e tecnologias,
principalmente nos smartphones. E o trabalho com as tecnologias na escola pode auxiliar no
entendimento desse uso e das possibilidades de aprendizado que podem oferecer.
5 A PERCEPÇÃO DOS ALUNOS SOBRE A ARTE E TECNOLOGIA NO ENSINO
FUNDAMENTAL
Nesse tópico vamos apresentar e analisar o material levantado com os questionários
aplicados aos alunos de 4o e 5o anos entrevistas com alunos da Escola Municipal José de Souza,
pertencente à rede pública de ensino de Campo Grande – Mato Grosso do Sul.
Os alunos que participaram da pesquisa têm idade média entre 9 a 14 anos conforme
mostra o gráfico abaixo.
Gráfico 1 – Idade dos alunos participantes da pesquisa
Organização: Elvis Mar de Souza.
A maioria dos alunos já estuda na instituição há mais de dois anos e por isso conhecem
apenas uma realidade no que diz respeito à educação escolar. O gráfico abaixo mostra a
variação do tempo de estudos na escola entre os alunos participantes da pesquisa.
9anos
10anos
11anos
12anos
13anos
14anos
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Gráfico 2 – Tempo de estudos na instituição
Organização: Elvis Mar de Souza.
Quanto ao conhecimento das tecnologias que lhe são familiares 68% dos alunos
pesquisados possuem conhecimentos amplos comparados aos mesmos produtos tecnológicos
que possuem e usam com frequência que fica em média 32%. Dentre eles estão: Computador
de mesa, Notebook, Tablet, Ipad, Iphone, Smartphone, Netbook, Datashow. A maioria desses
estudantes utilizam essas tecnologias apenas em casa, o que demonstra um uso pedagógico das
tecnologias digitais ainda bastante tímido nessa escola.
Gráfico 3 – Uso de tecnologias pelos alunos
Organização: Elvis Mar de Souza.
Segundo os alunos entrevistados o professor utiliza em sala algum tipo de tecnologia,
tais como notebook, relógio, celular por serem de fácil aquisição e acesso. E se sentem mais
05101520253035404550
Hámenosdeumano.
Háumano. Hámaisdeumano.
Hámaisdedoisanos.
Série1
Conhece,masnãopossuem68%
Possuemeusacom
prequência32%
0%0%0%0%
Trabalho de Conclusão de Curso 12
motivados quando esse professor usa algum tipo de tecnologia nas aulas, e assim aprendem
com mais facilidade quando utilizam algum tipo de tecnologia nas aulas.
Os alunos indicaram uma percepção bastante vaga do que seria o conceito de
arte/tecnologia, porém acreditam que as aulas de artes ajudam a ter contato com um tipo de
conhecimento cultural que eles não teriam oportunidade de terem contato em suas casas.
Na tabela a seguir é demostrado o grau de interesse desses estudantes quando aos
conteúdos ministrados pelos docentes em artes apresenta um conteúdo novo, se logo sentem
familiarizados com o tema ou tem dificuldade de compreender as propostas mediadas em sala.
É dividido por quantidade de alunos para cada questão.
Quadro 2 – Participação dos alunos nas atividades propostas
Nunca Algumas vezes
Na maioria das vezes
Todas as vezes
Acompanho a matéria exposta pelo professor 6 30 16 39
Copio no meu caderno a matéria apresentada 3 19 22 49
Fico à vontade para fazer perguntas 20 38 14 13 Fico perdido durante a explicação do professor 25 52 5 7
Converso com os colegas durante as aulas 14 39 16 19
Discuto o conteúdo apresentado pelo professor 25 36 16 10
Realizo as atividades que o professor propõe 6 26 13 44
Organização: Elvis Mar de Souza. A leitura foi outro grande fator para a pesquisa, no sentido não apenas das leituras em
livros didáticos, mas também em outros meios de comunicação e tipos de leituras diversas,
como: Romance, Crônica e ficção em geral, História Geral ou do Brasil, Livros de poesia,
Jornais, Revistas de informação geral, Revistas em quadrinhos. E quantos livros possuem em
casa, na maioria o bastante para encher uma prateleira em média de 1 a 20 exemplares.
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Gráfico 4 – Frequência de leitura dos alunos
Organização: Elvis Mar de Souza.
Quando perguntamos o grau de instrução dos pais também foi analisado, a maioria
dos alunos não soube responder. E entre os alunos que responderam, a maioria está na faixa de
escolarização da 5ª e 8ª série do Ensino Fundamental (antigo ginásio).
Quadro 3 – Conhecimento dos alunos sobre grau de escolaridade dos responsáveis
Mãe Pai Nunca estudou 0 0 Entre a 1ª e 4ª série do Ensino Fundamental (antigo primário) 4 3
Entre a 5ª e 8ª série do Ensino Fundamental (antigo ginásio) 12 12
Ensino Fundamental completo (antigo primário e ginásio) 6 2 Ensino Médio incompleto (antigo 2º grau) 5 3 Ensino Médio completo (antigo 2º grau) 6 4 Ensino Superior incompleto 2 1 Ensino Superior completo 6 8 Pós-graduação incompleta: 0 0 Pós-graduação completa 9 5 Não sabem 40 51
Organização: Elvis Mar de Souza. Do total pesquisado 39 alunos são beneficiários do Programa Bolsa Família, o que
totaliza 42% da nossa amostra pesquisada. Um número bastante significativo dentro da
realidade da escola.
A vulnerabilidade social é um fator bem marcante que é estudada e discutida não
apenas em nosso país, mas sim no mundo. Não é de hoje que a arte possui um papel importante
na vida de crianças carentes, não apenas financeiramente como principalmente Cultural e
42%
28%
12%18%
Nunca Algumasvezes Quasesempre Sempre
Trabalho de Conclusão de Curso 14
Social. O vivenciar e aprender arte estão ligados nas diversas vertentes que a mesma possibilita,
tais como: dança, teatro, música, as artes visuais e as tecnologias digitais.
Sabemos que as tecnologias estão inseridas no cotidiano dessas crianças mesmo em
condições de vulnerabilidade extrema. A arte aliada aos recursos midiáticos pode possibilitar
e trazer um conhecimento amplo para uma melhoria da vida desses estudantes.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A nuvem de palavras abaixo foi construída com o texto das entrevistas realizadas com
os professores e indicam o que foi mais frequente nas falas. A tecnologia permanece no centro
da discussão, pois a partir dela que buscamos entender como o ensino de artes, aliado ao uso
de tecnologia, poderia trazer transformações didáticas e metodológicas para a sala de aula, que
pudessem de alguma forma contribuir para o aprendizado e acesso à bens culturais pelas
crianças em situação de pobreza.
Sabemos que durante muitos anos, o ensino de Arte se resumiu a tarefas pouco
criativas e marcadamente repetitivas. Desvalorizadas na grade curricular, as aulas dificilmente
tinham continuidade ao longo do ano letivo. A mesma não tinha sua devida importância na
educação e melhoria de vida para com as das crianças de baixa renda, perante aos olhos de
muitos.
Trabalho de Conclusão de Curso 15
A criança não era considerada uma produtora e, por isso, cabia ao professor dirigir
seu trabalho e demonstrar o que deveria ser feito. Nas últimas décadas, essa situação vem
mudando nas escolas brasileiras. Hoje, a tendência que guia a área é a chamada
sociointeracionista, surgindo da ênfase no social. Como os estudos de Vigotski (1999, 2004)
que fala sobre o aprendizado decorrente da compreensão do homem como um ser que se forma
em contato com a sociedade, e muitas vezes um ser excluído dessa mesma sociedade que deve
o acolher.
Concordamos com Rego e Pinzani (2014), quando afirmam que a pobreza não deve ser
considerada a partir de uma perspectiva somente econômica, como a falta ou insuficiência de
renda. No entanto, o “[...] aspecto econômico ligado à presença de uma renda regular
permanece uma condição imprescindível para a saída da miséria.” (REGO; PINZANI, 2014, p.
152). E aqui entra a importância de um programa de transferência de renda como o Bolsa
Família.
Na escola investigada, percebemos que os professores usam tecnologias nas aulas de
artes e os alunos confirmam esse uso e apontam que se sentem motivados a aprender. No
entanto, o desconhecimento dos professores do Programa Bolsa Família e dos alunos
beneficiários não nos permitiu apreender a percepção deles sobre a importância do ensino de
artes aliado ao uso de tecnologias para o aprendizado das crianças em situação de pobreza.
Os dados dos questionários dos alunos nos permitem afirmar que há uma articulação
entre a arte e a tecnologia na escola, mas ainda de forma superficial, que não indica mudanças
metodológicas significativas. Sabemos das limitações que pairam sobre esse estudo, mas
ressaltamos a importância de continuar essas investigações, para que a pobreza e a desigualdade
social deixem de ser um tabu, para se tornarem uma bandeira pela qual a escola e os professores
lutem para manter erguida.
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Trabalho de Conclusão de Curso 16
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