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Revista Expressão, Mossoró-RN, v. 41, n. 1, p. 15-27, jan./jul. 2010 A COMUNIDADE NO CENTRO DAS DECISÕES ESCOLARES: POLÍTICAS EDUCACIONAIS PARA PARTICIPAÇÃO NOS CONSELHOS GESTORES E NO CONSELHO ESCOLAR NO BRASIL Pauleany Simões de Morais * Vivianne Souza de Oliveira ** RESUMO: O texto discute a importância da participação dos segmentos representativos da comunidade escolar no acompanhamento das decisões educativas, desencadeadas nas reformas educativas da década de 1990, tendo como referência os Conselhos Gestores e o Conselho Escolar. Os pressupostos da participação que permeiam as práticas do Conselho gestor e Conselhos Escolares nos mostram que considerar os aspectos normativos e legislativos que impõem seu funcionamento e sua organização configura uma nova forma de envolver a sociedade civil nos rumos da vida social (coletividade). Entendemos que, por meio do Conselho como espaço de coletividade, fica explícito como os representantes da comunidade escolar têm construído e reconstruído suas concepções, atitudes, valores e saberes referentes à sua ação no cotidiano escolar, assim como nos permite perceber, a partir desse coletivo, as relações que explicitam os significados que os segmentos da comunidade escolar atribuem ao que seja sua própria forma de participar. Ao procurarmos perceber a importância da participação dos representantes da comunidade escolar no Conselho Escolar, tentamos compreender, com maior veemência, como essa participação pode contribuir para um melhor desenvolvimento enquanto cidadão ativo, e, consequentemente, para o êxito das ações pedagógicas e melhoria da estrutura organizacional da escola. Finalmente, compreendemos que os incentivos à participação colegiada no cotidiano escolar estendem-se nas questões político- educativas do Brasil, pois envolve temas como descentralização do Estado e reivindicações por participação popular no espaço público. Palavras chaves: Participação, Conselhos Escolares, Conselhos Gestores. * Doutoranda em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Professora Assistente do Instituto Federal do Rio Grande do Norte. E-mail: [email protected] ** Doutoranda em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Professora Assistente da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. E-mail: [email protected]

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Revista Expressão, Mossoró-RN, v. 41, n. 1, p. 15-27, jan./jul. 2010

A COMUNIDADE NO CENTRO DAS DECISÕES ESCOLARES: POLÍTICAS EDUCACIONAIS PARA PARTICIPAÇÃO NOS CONSELHOS GESTORES E

NO CONSELHO ESCOLAR NO BRASIL

Pauleany Simões de Morais* Vivianne Souza de Oliveira**

RESUMO: O texto discute a importância da participação dos segmentos representativos da comunidade escolar no acompanhamento das decisões educativas, desencadeadas nas reformas educativas da década de 1990, tendo como referência os Conselhos Gestores e o Conselho Escolar. Os pressupostos da participação que permeiam as práticas do Conselho gestor e Conselhos Escolares nos mostram que considerar os aspectos normativos e legislativos que impõem seu funcionamento e sua organização configura uma nova forma de envolver a sociedade civil nos rumos da vida social (coletividade). Entendemos que, por meio do Conselho como espaço de coletividade, fica explícito como os representantes da comunidade escolar têm construído e reconstruído suas concepções, atitudes, valores e saberes referentes à sua ação no cotidiano escolar, assim como nos permite perceber, a partir desse coletivo, as relações que explicitam os significados que os segmentos da comunidade escolar atribuem ao que seja sua própria forma de participar. Ao procurarmos perceber a importância da participação dos representantes da comunidade escolar no Conselho Escolar, tentamos compreender, com maior veemência, como essa participação pode contribuir para um melhor desenvolvimento enquanto cidadão ativo, e, consequentemente, para o êxito das ações pedagógicas e melhoria da estrutura organizacional da escola. Finalmente, compreendemos que os incentivos à participação colegiada no cotidiano escolar estendem-se nas questões político-educativas do Brasil, pois envolve temas como descentralização do Estado e reivindicações por participação popular no espaço público. Palavras chaves: Participação, Conselhos Escolares, Conselhos Gestores.

* Doutoranda em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Professora Assistente do Instituto Federal do Rio Grande do Norte. E-mail: [email protected] ** Doutoranda em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Professora Assistente da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. E-mail: [email protected]

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Propomo-nos, neste texto, discutir questões referentes à participação de segmentos representativos da comunidade escolar no acompanhamento das decisões educativas. Em face da política de descentralização, desencadeada na década de 1990, analisamos a formação dos conselhos gestores no Brasil, particularmente no que concerne à criação de órgãos colegiados na área educacional, especialmente os conselhos gestores e os conselhos escolares.

Evidenciamos as prováveis contribuições do Conselho de Controle Social do FUNDEF (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério) 1 e do Conselho escolar no que se refere aos seus papeis enquanto órgãos mobilizadores, fiscalizadores, acompanhadores e deliberativos das decisões educativas. Por isso, entendemos que a participação dos membros da comunidade escolar nesses colegiados torna-se um mecanismo que conduz à forma mais elevada de intervir nas decisões que dizem respeito ao coletivo. Os Conselhos Gestores

A implantação dos conselhos gestores , na década de 1990, aparece incorporada às estruturas dos governos, tendo apenas o objetivo de possibilitar a descentralização político-administrativa e a participação na elaboração e no controle das políticas sociais setoriais. Assim, podemos ressaltar a estreita relação entre a descentralização e a participação, compreendendo-a como um mecanismo que deveria

1O FUNDEF foi criado por meio da Emenda Constitucional nº 14 (ADCT, art. 60 parágrafos 1º e 2º), de 26 de setembro de 1996 (BRASIL, 1996a), sendo regulamentado pela Lei 9.424/96 (BRASIL, 1996b) e implantado nacionalmente, em 01 de janeiro de 1998. É um fundo de natureza contábil em que os recursos são provenientes das seguintes fontes: Fundo de Participação dos Municípios (FPM); Fundo de Participação dos Estados (FPE); Impostos sobre Circulação de Mercadorias Serviços (ICMS); Impostos sobre Produtos Industrializados, proporcionais às Exportações (IPIexp) e Desoneração de Exportações, de que trata a lei complementar nº 87/96 (Lei Kandir). Os recursos do FUNDEF, ao financiarem exclusivamente o Ensino Fundamental, são destinados à remuneração do Magistério, mínimo de 60%, e a outras despesas de manutenção e desenvolvimento do Ensino Fundamental, máximo de 40% (BRASIL, 2003). São automaticamente transferidos aos Governos Estaduais e Municipais, tendo como base o número de alunos matriculados no Ensino Fundamental nas respectivas redes de ensino.

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promover o envolvimento da sociedade civil na formulação de políticas públicas direcionadas à área educacional, contemplando as necessidades locais. Mas, para isso, é indispensável a elaboração de estratégias que promovam, efetivamente, a participação popular. Dentro dessa perspectiva, Jacobi (1990, p. 141) analisa que:

Descentralizar significa ceder poder a uma unidade inferior, o que representa basicamente dotar de competência e meios os organismos intermediários para que possam desenvolver sua gestão de maneira mais eficaz e próxima aos cidadãos. Isto implica definir objetivamente o método de gestão a ser implementado e as condições nas quais se dará a participação dos cidadãos.

A descentralização é um mecanismo que tem seus limites; no

entanto, pode tornar-se um excelente mecanismo para que se avancem determinados objetivos. Isso significa que a descentralização pode servir para aproximar a sociedade civil do Estado, diminuindo, assim, a histórica distância que os afasta. Ao transferir a prestação de serviços para um nível de governo mais próximo da população, ou impulsionar a articulação com essa população, é provável que a prestação de serviços gere cada vez mais a equidade. Acerca dessa questão, Lobo (1990, p. 8) ressalta que:

[...] descentralização deve visar ao aprimoramento das relações intergovernamentais, capacitar melhor os governos subnacionais para a função de agentes interventores em suas realidades e possibilitar o controle social da população organizada sobre a ação do poder público.

Por conseqüência, Lobo (1990) defende o controle social como

sendo uma prerrogativa essencial para promover o exercício da democracia no país. Por meio dela, a população organizada pode participar ativamente da ação do poder público, interferir no destino das políticas públicas, responsabilizando o Estado quando este não proporciona um atendimento adequado às suas necessidades, e redirecionando as ações para os interesses, dependendo da correlação de forças e das condições históricas.

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Na atual conjuntura, o discurso que apóia a aproximação entre sociedade civil e Estado não tem o objetivo de promover uma verdadeira participação social dos indivíduos, mas busca apenas jogar responsabilidades para a sociedade civil por força da lei, ao se estabelecer modelos que devem ser seguidos, buscando essencialmente cortes de gastos na área social.

No campo educacional, os princípios neoliberais também impõem a articulação entre a sociedade civil e o Estado. Contudo, os conselhos, nessa área, têm uma institucionalidade diferenciada, sendo reestruturados por legislação específica, como exemplo a criação do Conselho Nacional de Educação (CNE), por meio da Lei 9.131/95. Por sua vez os Conselhos Estaduais de Educação (CEE) e os Conselhos Municipais de Educação (CME) reorganizam-se e estabelecem as diretrizes pedagógicas e normativas da educação na sua jurisdição, não tendo, portanto, um papel de estabelecer diretrizes de gestão de recursos.

Os conselhos foram instituídos para democratizar as relações, envolvendo diversos setores da sociedade no processo de decisão no interior da esfera pública. Tais órgãos colegiados integram a estrutura organizativa da educação – pais de alunos, professores, diretores, integrantes de sindicatos e de outras entidades representativas – por meio do Conselho Municipal de Educação, Conselho de Escola, Conselho do FUNDEF, dentre outros. De acordo com Gohn (2001, p. 100) é preciso ressaltar a importância dos conselhos na área da educação, pois:

Na educação, o princípio da democracia participativa tem orientado, [...] a criação de uma série de estruturas participativas, em que se destacam diferentes tipos de conselhos (nacionais, estaduais e municipais). Esses órgãos têm ganho, crescentemente, grande importância, porque a transferência e o recebimento dos recursos financeiros pelos municípios, estão vinculados, por lei federal, à existência desses conselhos.

Nessa perspectiva, tem-se a pretensão de construir uma gestão

escolar participativa no intuito de formar espaços eminentemente coletivos em que os sujeitos envolvidos participem, efetivamente, nas

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decisões. Ao considerar tal concepção, Machado et al. (2004, p. 327) nos dizem que:

O paradigma da gestão escolar participativa preconiza como indicadores fundamentais à autonomia escolar, a descentralização de poder, a representatividade social nos conselhos e colegiados, o controle social da gestão educacional, a escolha dos dirigentes escolares por processo de eleição e a inclusão de todos os segmentos da comunidade escolar no processo decisório mais amplo.

Ao reverenciarmos a participação como categoria primordial para

a análise do papel e funcionamento dos conselhos, torna-se necessário investigar qual é a participação popular nessas instituições, tendo como perspectiva a participação política. Assim, considerando essa perspectiva, devemos reconhecer o poder dos conselhos, principalmente na área de educação. Sobre tal questão, Cury (2002, p. 177) afirma que:

Eles são instrumentos de cidadania, de democracia e de controle do Estado. Implicam o cidadão com os destinos da escola, ampliam os espaços públicos de decisão, têm a função de democratizar a informação para todos e podem controlar desmandos do poder. São uma promessa de participação que se vê realizada em experiências exitosas em vários municípios do país.

Nesse sentido, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

(LDB) – Lei 9.394/96 (BRASIL, 1996c) também procurou imprimir à escola o princípio da participação, ao prescrever a constituição de conselhos escolares que envolvam a comunidade escolar e local, para viabilizar as ações administrativas, financeira e pedagógica no interior das instituições educativas. Em conseqüência, o conselho caracteriza-se por ser um órgão máximo de decisão. De acordo com essa lei:

Art. 14. Os Sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: I - participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola;

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II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares equivalentes (BRASIL, 1996c).

No referido artigo, podemos perceber que o princípio

participativo deve ser seguido por meio da gestão democrática, mas esse tipo de gestão é de inteira responsabilidade das próprias instituições. As escolas devem elaborar seus próprios mecanismos, para conduzir o princípio participativo na realização de suas ações. Cabe às organizações colegiadas, que têm poder de decisão, determinar como se dará o processo de democratização da gestão, procurando envolver todos os componentes da escola em um ambiente participativo. Conforme Lück (2000, p. 27):

A criação de ambientes participativos é, pois, uma condição básica da gestão democrática. Deles fazem parte a criação de uma visão de conjunto da escola e de sua responsabilidade social; o estabelecimento de associações internas e externas; a valorização e maximização de aptidões e competências múltiplas e diversificadas dos participantes; o desenvolvimento de processo de comunicação aberta, ética e transparente.

Isso significa dizer que a participação e o processo de decisão

passam a ser elementos essenciais que conduzem o envolvimento também político dos componentes da comunidade escolar no acompanhamento da gestão. É necessário entender a participação política como um instrumento essencial para se conceber uma sociedade mais justa e humana. Seguindo essa crença, Dallari (1983, p. 91) afirma que: “[...] A participação política de que todo ser humano tem necessidade, e que por isso é direito e dever de todos, é aquela voltada para a consecução do bem comum”. Os Conselhos Escolares

O Conselho Escolar surge como um meio capaz de promover a participação de toda a comunidade escolar nas discussões, assim como pode caracterizar-se como um espaço de decisões coletivas, e de relações de trocas de experiências, capaz de contribuir para a superação da prática do individualismo e do grupismo, na medida em que agrega, de cada um

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dos setores (escola e comunidade), os seus interesses específicos, que devem ser unificados em prol do projeto da escola (ABRANCHES, 2003).

No que corresponde às suas funções, podemos destacar a de caráter deliberativo referente à tomada de decisões no que diz respeito às diretrizes e linhas de ação que devem ser desenvolvidas na escola. As funções de caráter consultivo são referentes à emissão de pareceres sobre situações diversas, sejam elas relacionadas aos aspectos pedagógicos, administrativos e financeiros, ou a levantamentos de propostas para solucionar problemas e desenvolver projetos na instituição (ABRANCHES, 2003).

Sendo assim, a participação no Conselho Escolar significa a busca pelo interesse do bem comum, em função de objetivos que conduzam à resolução dos conflitos decorrentes do cotidiano da escola. A dinâmica desse órgão colegiado adquire forma a partir das relações e das ações de seus atores em um processo de construção coletiva de saberes, de luta e conquista de um grupo.

A colegialidade, nesse sentido, pode ser percebida como uma experiência de aprendizagem mútua, onde os professores, pais, funcionários, direção e alunos, coletivamente, estão em continua relação com o saber e aprender, pois, como afirma Charlot (2003, p. 33) “Não existe saber (de aprender) senão quando está em jogo a relação com o mundo, com os outros e consigo”. Para esse mesmo autor, a educação supõe a relação com o Outro, pois ela não existe sem algo de externo, o “a quem educar”. Esse outro “é um conjunto de valores, de objetos intelectuais, de práticas, etc.; é também um outro ser humano (ou vários)” (CHARLOT, 2005, p. 77).

A importância da participação colegiada no cotidiano escolar estende-se, ainda, nas questões político-educativas, pois envolve temas como descentralização do Estado, lutas por participação popular no espaço público, e amplas reformas educacionais ocorridas no Brasil, principalmente na década de 1990. Por isso, não podemos deixar de destacar alguns pontos relevantes para que possamos compreender os discursos político-educativos sobre a necessidade de implementar esse tipo de espaço coletivo no cotidiano escolar.

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Em primeiro lugar, podemos destacar o que a Constituição Federal Brasileira de 1988 determina no Artigo 206, Inciso VI2: a participação social de forma representativa no âmbito público, ocasionando uma intensificação no debate em torno da participação da sociedade na elaboração das políticas públicas educacionais.

Em consequência das diretrizes constitucionais, a participação por meio de colegiados é assegurada ainda através da Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional nº 9.394/96, que define, como princípio, a participação dos profissionais da educação na elaboração do Projeto político pedagógico e de toda a comunidade escolar em conselhos escolares. Assim, acompanhando a Constituição Federal e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96, as constituições de vários estados, assim como a lei orgânica de muitos municípios, adotaram o princípio da gestão democrática / participativa, no que diz respeito à escola pública. A partir de então, intensificaram-se as ações visando à ampliação da participação coletiva no cotidiano escolar.

Dentre as ações, destacamos a criação do Programa de Fortalecimento dos Conselhos Escolares, cujo objetivo principal é oferecer subsídios para a implementação desses conselhos nas escolas, a fim de facilitar a compreensão da comunidade escolar acerca do significado dos mesmos na gestão da educação (BRASIL, 2004, p.13). A ênfase nessa forma de participação social nas instituições escolares tem sido colocada como um “dever do cidadão” que, responsável pela educação, pode contribuir para a melhoria da qualidade das escolas públicas brasileiras.

Dessa forma, a participação do “cidadão” nas decisões escolares garantiria o exercício da democracia no contexto escolar, de acordo com o Programa de Fortalecimento dos Conselhos Escolares. A forma de colegiado significa o “exercício do poder por um coletivo, por meio de deliberação plural, em reunião de pessoas com o mesmo grau de poder” (BRASIL, 2004, p.13). Considerando o sentido atribuído pelo programa,

2 A Constituição Federal assegura “A participação efetiva dos diferentes agentes econômicos envolvidos em cada setor da produção” (art. 198, III e art. 194, VII). E ainda, nos casos da assistência social e das políticas referentes à criança e ao adolescente, quando a participação da população se dá “por meio de organizações representativas” (art. 204, 22).

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podemos, então, entender que os profissionais da educação, assim como os pais, alunos e funcionários, independente da função que exerçam na escola, são agentes capazes de transformar a instituição escolar, aqueles que, com a força da coletividade, têm poder para lutar por melhores escolas, melhores trabalhos, enfim, por uma melhor educação.

Para Thuler (2002), as ações coletivas, denominadas por ela como cooperativas, geralmente aparecem como grandes responsáveis pela eficácia das escolas, e ainda como eixo principal de muitas reformas educativas. Por isso que, em escolas nas quais os professores, coletivamente, têm se preparado para enfrentar as incertezas e os conflitos que acompanham, inevitavelmente, toda mudança de prática, esses profissionais não apenas apresentam melhor desempenho, mas também conseguem desenvolver, progressivamente, competências coletivas, que complementam e reforçam as competências individuais das pessoas.

Ressaltamos, finalmente, que, por meio do Conselho como espaço de coletividade, podemos perceber de como os representantes da comunidade escolar têm construído e reconstruído suas concepções, atitudes, valores e saberes referentes à sua ação no cotidiano escolar, assim como nos permite perceber, a partir desse coletivo, as relações que explicitam os significados que os professores atribuem ao que seja seu próprio trabalho. Ao procurarmos perceber a importância da participação dos representantes da comunidade escolar no Conselho Escolar, tentamos compreender, com maior veemência, como essa participação pode contribuir para um melhor desenvolvimento enquanto cidadão ativo, e, consequentemente, para o êxito das ações pedagógicas e melhoria da estrutura organizacional da escola. Considerações Finais

Os pressupostos da participação que permeiam as práticas do Conselho Gestor e Conselhos Escolares nos mostram que considerar os aspectos normativos e legislativos que impõem seu funcionamento e sua organização configura uma nova forma de envolver a sociedade civil nos rumos da vida social (coletividade).

Nesse contexto, os membros dos conselhos precisam compreender que a escola pode ser um espaço de transformação social,

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uma vez que eles devem ser agentes desse processo, tendo poder de constituir um ambiente participativo com essa finalidade. Portanto, a sociedade civil carece e reivindica a participação, principalmente no processo de decisão dos órgãos nas estruturas administrativas do Estado e da escola, visto que essas estruturas definem e produzem os rumos da vida em coletividade. Mas, muitas vezes, não são oferecidas condições favoráveis à promoção da participação social, pois, aos representantes do órgão colegiado impõem-se aparatos legislativos, ou restringem-se as atuações nos processos decisórios, privando seus representantes da liberdade de opinar, no caso do Conselho Gestor, assim como nos Conselhos escolares. Em tal patamar os conselhos gestores, de um modo geral, devem retomar suas bases de sustentação nos movimentos sociais da década de 1980 e 1990 e retornar a ser instituições que realmente primem pelo interesse coletivo de um determinado grupo que luta por justiça social e direitos que lhes foram negados, como a participação no processo de decisão da gestão pública ou mesmo educacional. Referências ABRANCHES, Mônica. Colegiado escolar: espaço de participação da comunidade. São Paulo: Editora Cortez, 2003.

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Recebido em 02/08/09. Aprovado em 01/04/10.

ABSTRACT: THE SCHOOL COMMUNITY AT THE CENTER OF DECISIONS: NATIONAL EDUCATIONAL POLICIES TO ENCOURAGE PARTICIPATION ON MANAGEMENT AND SCHOOL COUNCILS IN BRAZIL. The text discusses the importance of participation of representative segments of the school community in accompanying educational decisions, elaborated in the educational reforms of the 1990's, having as a reference Management and School Councils. The pressupositions of participation that permeate the practice of Management and School Councils show us that to consider normative and legislative aspects that impose their functioning and organization, mold a new form of involving the civil society collectively with regard to social life. We are able to percieve, through the Council as a collective site, the manner in which the representatives of the school community have constructed and reconstructed their conceptions, atitudes, values, knowledge base with relation to their daily school activities, just as it permits us to perceive, from this collective body, the relationships that make explicit the meanings that the segments of the school community attribute to what its own form of participation signifies. In the search for understanding the importance of the participation of the representatives of the school community on School Councils, we try to understand more deeply, just how this participation can contribute to the better development of active citizenship, and consequently, the success of pedagogical actions and the improvement of the organizational structure of schools. Finally, we understand that the incentives to participate on school boards, in the daily life of the school, are extended into the realm of politico-educational questions in Brazil, involving themes such as decentralizaiton of the State and the call for popular participation in the public sphere. Keywords: Participation, School Councils, Management Councils.

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RESUMEN: LA COMUNIDAD ESCOLAR EN EL CENTRO DE LAS DECISIONES: POLÍTICAS EDUCACIONALES NACIONALES DE INCENTIVO LA PARTICIPACIÓN DE CONSEJOS GESTORES Y EN EL CONSEJO ESCOLAR EN BRASIL. El texto discute la importancia de la participación de los segmentos representativos de la comunidad escolar en el acompañamiento de las decisiones educativas de la década de los 90, teniendo como referencia los Consejos Gestores y el Consejo Escolar. Los presupuestos de la participación que permean las prácticas del Consejo Gestor y Consejos Escolares nos muestran que considerar los aspectos normativos y legislativos que imponen su funcionamiento y su organización, configura una nueva forma de envolver la sociedad civil en los rumbos de la vida social (colectividad) Entendemos que por medio del Consejo, como espacio de colectividad, queda explícito como los representantes de la comunidad escolar ha construido y reconstruido, hasta nuestros días, sus concepciones, actitudes, valores y saberes referentes a su acción en el cotidiano escolar, tal como nos permite percibir, a partir de este colectivo, las relaciones que explicitan los significados que los segmentos de la comunidad escolar atribuyen a lo que sea su forma mismo de participar. Al buscar entender la importancia de la participación de los representantes de la comunidad escolar en el Consejo Escolar, intentamos comprender con más vehemencia como esta participación puede contribuir para un mejor desarrollo como ciudadano activo, y consecuentemente, para el éxito de las acciones pedagógicas y mejoría de la estructura organizacional de la escuela. Finalmente comprendimos que los incentivos a la participación colegiada en el cotidiano escolar extendiéronse en los temas político-educativos de Brasil, pues envuelve temas como descentralización del Estado y reivindicación por participación popular en el espacio público. Palabras-llave: Participación, Consejos Escolares, Consejos Gestores.