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    UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

    DEPARTAMENTO DE ARQUITETUTA E URBANISMO

    DISCIPLINA: TECNOLOGIA DA EDIFICAO

    PROFESSOR: ANDERSON CLARO

    ACADMICOS: GUILHERME BARRETO PEGORARA ANTONIOKAROLINE BENATTI

    ROVY PINHEIRO PESSOA FERREIRA

    VIVIAN CRISTINA BOLSON

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    SUMRIO

    Apresentao............................................................................................................02

    1. ALDEIAS................................................................................................................02

    2. AS CASAS.............................................................................................................082.1. Casas com planta baixa circular......................................................................08

    2.2. Casa J: Xavante...............................................................................................10

    2.3. Casas com planta baixa elptica......................................................................13

    2.4. A casa antropomorfa.........................................................................................15

    2.5. A grande maloca Tukno..................................................................................17

    2.6. Casas com planta baixa retangular.................................................................19

    2.6.1. A casa Karaj.................................................................................................192.6.2. A casa Tupi: Tapirap....................................................................................24

    2.7. Casas com planta baixa poligonal...................................................................26

    2.7.1. A Shabonodos Yanomamis..........................................................................26

    2.7.2 A casa-aldeia dos Marbo..............................................................................29

    3. TECNOLOGIA INDGENA...........................................................................................34

    3.1. A construo da casa xinguana.......................................................................34

    3.2. A amarrao.......................................................................................................37

    3.3. Tecnologias indgenas e as adaptaes ao clima..........................................42

    3.3.1. Af Clima Tropical mido.............................................................................42

    3.3.2. Transio de Af a AM (Equatorial a Clima de Mono)...............................43

    3.3.3. Transio de Af a Aw

    (Equatorial a Tropical com estao seca de inverno) ..........................................43

    3.3.4. Transio de Af a Cf (Equatorial a Clima Temperado mido)....................44

    4. INFLUNCIAS DA ARQUITETURA INDGENA HOJE.........................................45

    Referencias Bibliogrficas......................................................................................50

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    Apresentao

    Frente grande diversidade das culturas indgenas no Brasil, seria impossvel

    estudar cada uma em particular, devido tambm (e principalmente) precariedade dos

    dados disponveis. Alm do mais, a existncia de uma tradio construtiva no significanecessariamente que se possa apresentar uma nica soluo arquitetnica. Com o

    passar do tempo, as formas arqutipas deram origem a uma srie de variantes, o que faz

    com que o nmero das solues se potencialize. Por isso nos limitaremos a algumas das

    tipologias j estudadas e que podero servir de ilustrao da grande variedade de

    tipologias existentes ou extintas. Abordaremos itens que se relacionam e juntos formam o

    universo da habitao indgena, pesquisa essa que seria impossvel, sem um estudo

    antropolgico, pois a habitao indgena a entidade fsica onde a cultura e todas asexpresses que a envolvem so praticadas.

    1. ALDEIAS

    A forma mais simples de organizao da aldeia da casa unitria, em que toda a

    tribo vive num s teto. o caso dos tucanos, que habitam a fronteira entre Brasil e

    Colmbia. Essa casa tem um formato retangular, com um dos lados menores fechado por

    uma semicircunferncia. A cobertura de duas guas, que chegam quase at o solo,

    permitindo a presena de paredes da altura de uma pessoa. A casa tem duas portas, uma

    na fachada principal, que da para o rio, e a outra nos fundos, dando para as plantaes. O

    interior dividido por biombos de folhas de palmeira tranadas, formando nichos. Cada

    nicho ocupado por uma famlia nuclear, e distribudo segundo o status que a famlia

    ocupa na comunidade. A parte central da construo dividida em duas partes

    fundamentais: a da frente, pintada de amarela, reservada para os homens, e a de trs,

    pintada de vermelho, prpria das mulheres.

    Outro exemplo de casa unitria a dos ndios pano, habitantes do Alto Solimes. A

    casa implantada no alto de uma colina, e ao seu redor, em crculos concntricos,

    situam-se o ptio externo, as roas e os limites da floresta. Junto entrada principal

    existem dois longos bancos paralelos que servem para os homens e meninos fazerem

    suas refeies, assim como para as assemblias cerimnias de xamanismo. Depois dos

    bancos h um corredor espaoso onde as mulheres fazem sua refeio. Tambm oloval onde ocorrem os ritos cerimoniais. Em ambos os lados desse corredor/ sala h

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    nichos onde so encontrados os pertences de cada famlia nuclear, como redes, fogo,

    cermicas e apetrechos de cozinha.

    Os Marubos tambm apresentam uma habitao unitria, porm algumas funes

    complementares so transferidas para construes menores que circundam a casa-

    grande.Uma forma um pouco mais complexa apresentada pela casa dos Yanommis,

    habitantes da fronteira entre o Brasil e a Venezuela. Tambm constroem uma casa

    unitria (Shabono), que abriga de 50 at quase 200 habitantes. A casa queimada aps

    dois anos de uso, por causa do apodrecimento das folhas ou o acumulo de insetos, assim

    como por motivos de ordem social, como os constantes reagrupamentos das

    comunidades que esto sujeitas a constantes agregaes e separaes de unidades

    familiares.A forma mais comum de assentamentos indgenas so as aldeias formadas

    por varias construes. A cultura mais estudada que adotou esse tipo de soluo a tupi-

    guarani. Originria do mdio Amazonas, essa cultura tem representantes desde o Alto-

    Solimes at as bacias do Paraguai e do Uruguai (onde so conhecidos como guaranis).

    O que tornou essa cultura a mais conhecida foi a crena no Mir, paraso terrestre tido

    como situado nas terras do sol nascente. Em conseqncia de vrios movimentos

    messinicos que surgiam naturalmente quando a tribo se tornava muito grande, uma

    parte da populao iniciava peregrinao ruma ao leste que terminava com a chegada ao

    oceano. No podendo mais continuar com a caminhada, acabavam por ocupar toda a

    costa, do Oiapoque ao Chu, o que levou os europeus a acreditar que era a nica cultura

    existente no pas na poca da chegada.

    Aldeias semelhantes com as tupi-garani podem hoje ser encontradas na Amaznia

    e em pouco divergem de uma forma comum que a existncia de quatro construes,

    ortogonais entre si e ordenadas de modo que formem uma grande praa quadrada. Cada

    uma dessas casas chamada de oguassu, maiocaou maloca(casa grande) e dividida

    internamente pela estrutura do telhado em espaos quadrados de 6 metros por 6, onde

    mora em cada uma delas uma famlia celular. Esse espao denominado oca(tupi) ou

    oga(guarani). O tamanho de cada casa depende do tamanho da tribo, podendo chegar a

    mais de 200 metros de comprimento. O mais comum, no entanto, que no passem de

    150 metros de comprimento por cerca de 12 de largura. A forma de vida desses indgenas

    era dominantemente sedentria. Se uma casa ficava velha, era queimada e outra de igual

    formato era construda em seu lugar. Em razo disso, a forma de habitar era muito

    controlada, respeitando-se ainda a vivncia dos demais habitantes da casa.

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    A casa era o espao preferencial das mulheres. Ali elas exerciam suas atividades

    domsticas e no corredor central, junto aos pilares que sustentam a cumeeira,

    preparavam a comida. Ao fim desse corredor havia uma porta em cada extremidade da

    maloca, e no meio da casa, no lado que dava para o ptio, havia uma terceira. Essas

    portas eram baixas, obrigando cada indivduo a se abaixar em sinal de respeito.A praa central, delimitada por quatro casas-grandes, representava a unidade

    indissolvel da tribo, e l eram realizadas as cerimnias tribais. Em seu centro se reuniam

    os homens para decidir as atividades que seriam realizadas no dia, como a pesca e a

    caa, e por vezes abrir uma clareira, que servia para a prtica da agricultura (de exclusiva

    competncia feminina). As atividades exercidas pelos integrantes de cada sexo eram

    tabus, o que fazia com que uma parte jamais interferisse na outra.

    Outras tribos lanavam mo de um nmero ainda maior de construes. Como onumero de integrantes de uma tribo era mais ou menos constante (entre 300 e 700

    indivduos, em condies normais), o nmero de casa era inversamente proporcional ao

    seu tamanho.

    A construo de aldeias com um grande nmero de casas uma das

    caractersticas do grupo Jque pode ser exemplificada com a dos Xavantes. Esses ndios

    habitavam aldeias formadas por duas a trs dezenas de casas que se dispunham de

    forma semicircular, em torno de um ptio cerimonial denominado war. A distncia entre

    duas casas era de alguns metros, salvo a h, a casa dos jovens em fase de iniciao,

    localizada numa das extremidades da ferradura, que mantinha uma distncia dupla ou

    tripla das demais casas. As casas eram implantadas em terreno de cho batido, que

    tambm era o acabamento do war. Entre essas duas faixas havia um gramado, cortado

    por trilhas que ligavam cada casa ao ptio cerimonial. Deste saa o caminho principal,

    para o rio, que ficava a certa distncia. Esse caminho era muito utilizado tanto pelos

    homens quanto pelas mulheres, dada a importncia do rio na vida da tribo. Pelo lado

    externo da ferradura havia grande nmero de caminhos que levavam as roas.

    A casa xavante de planta circular, com um dimetro de cerca de 5 a 6 metros, e

    sua forma de uma cpula levemente apontada. Dada a complexidade de suas relaes

    socioculturais, a vida dessas tribos exigia um alto grau de mobilidade, o que acarretava

    constantes deslocamentos. Por conseqncia, as casas tinham uma utilizao curta,

    edificadas por meio de uma tcnica muito simples, quase descuidada. Nesses

    deslocamentos, que podiam envolver toda ou apenas parte da tribo, instalavam-se

    acampamentos temporrios que, por seu uso ainda mais breve, eram de uma feitura

    extremamente simples, embora conservassem a forma da aldeia-base para a qual toda a

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    tribo retornava aps as peregrinaes. Esses procedimentos demonstram que a base de

    sustentao do grupo era a recoleta, cargo das mulheres, o que no permitia um grande

    desenvolvimento da agricultura. A caa (realizada pelos homens) era altamente

    valorizada, ao contrrio da pesca, praticada esporadicamente.

    Os ndios Karajs, do mesmo grupo lingstico e ocupantes das margens do rioAraguaia, desenvolveram uma forma de aldeia ainda mais complexa. Como o rio esta

    sujeito a uma poca de cheias e outra de estiagem, no perodo das chuvas construam

    casas de uma slida estrutura, constitudas por 3 arcos paralelos, cada um formado por

    um par de varas fincadas no cho e vergadas para que possam ser amarradas, em suas

    extremidades, na cumeeira.

    Essa casa era construda em duas filas, paralelas ao rio, e a uma distncia mnima

    de 30 metros das barrancas do rio. Os primeiros 10 metros junto ao rio eram sombreadospor grandes mangueiras, e o restante era usado para descanso e convvio no fim da

    tarde. As casas, cujo nmero podia exceder a meia centena, eram separadas por uma

    praa central de cerca de 5 metros de largura; o comprimento, que correspondia ao da

    aldeia, podia ultrapassar a distncia de 600 metros. Apesar dessa centralizao, cada

    casa tinha sua abertura voltada para o rio, que permanecia como centro referencial da

    vida da aldeia. Isso significa que, apesar da semelhana formal, essa praa no

    assumia funo semelhante de nossas ruas urbanas. A construo de casas era uma

    funo exclusivamente masculina, muito embora a propriedade das casas fosse

    feminina e a ordenao delas na aldeia obedecida. semelhana dos Xavantes, cada

    casa era habitada por uma famlia extensa, formada por algumas poucas famlias

    nucleares.

    Por suas dimenses continentais, o Brasil contm uma grande diversidade de

    ecossistemas, o que resultou no aparecimento de uma grande variedade de solues

    arquitetnicas para a moradia. Uma das mais interessantes foi a das casas subterrneas

    e semi-subterrneas, espalhadas por toda a Amrica. No Brasil foram construdas nas

    regies elevadas da Mata Atlntica, entre o Sul de Minas Gerais e a regio serrana do Rio

    Grande do Sul.

    No extremo sul do pas, nas campinas pampeanas, os ndios gaicurus

    desenvolveram uma tcnica de surpreendente atualidade para a construo de suas

    casas, chamadas de toldos.

    Em se tratando de uma cultura caadora, os constantes deslocamentos se

    impunham como forma de sobrevivncia. Temperaturas muito variadas entre o vero e o

    inverno levaram-nos a inventar uma forma de moradia composta de painis

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    desmontveis. Eram trs paredes e um telhado que sobressaa na face que ficava aberta.

    Dessa forma, cada toldo formava uma espcie de nicho que era habitado por uma

    unidade familiar. A montagem desses toldos em fita permitia a economia de painis.

    Originalmente, esses painis eram compostos de um quadro de madeira vedado

    com um tranado de palha. Com a introduo de animais de grande porte pelos europeus,a palha foi substituda pelo couro. Essas casas serviam apenas para o descanso e para o

    abrigo das intempries. Conforme a temperatura, a abertura era direcionada a favor ou

    contra o vento. No rigor do inverno, os toldos eram voltados uns contra os outros, de

    modo que os painis do telhado formavam duas guas. Sob as salincias do telhado,

    formava-se um corredor que dava acesso s diferentes unidades familiares. As

    extremidades desse corredor eram vedadas por portas de couro, criando um microclima

    interno com uma temperatura mais elevada.Todas essas tipologias tm como caracterstica a evoluo autctone, ou seja, sem

    interferncia de outras culturas. Uma das poucas excees a das aldeias xinguanas,

    nas quais se verifica um cruzamento de vrias culturas e peculiaridades de diversos

    grupos lingsticos que foram adotados por tribos de origens diversas. Suas casas so

    semelhantes s dos tupis, porm as extremidades so fechadas por semicpulas

    construdas maneira dos Js. Nessas extremidades estendem suas redes e ali

    preparam suas refeies. Na parte central da casa fica um jirau, onde so armazenados

    os mantimentos e outros pertences, e o lugar de trabalho dividido segundo o sexo: os

    homens ficam com o espao junto porta que d para a praa, e as mulheres, do lado

    oposto.

    O nmero de casas varia de tribo para tribo, porm todas esto dispostas de modo

    que cerquem a praa. Em meio a ela, de forma excntrica, est implantada a casa dos

    homens, na qual so guardados os instrumentos musicais rituais e a indumentria

    cerimonial. Diante dela h um banco em que so tomadas as decises comuns,

    especialmente as que digam respeito caa, privilgio dos homens. Pelo lado inverso, a

    agricultura uma atividade exclusiva das mulheres, e da qual os homens eventualmente

    participam na abertura de clareiras necessrias para a plantao. Em razo da

    distribuio de tarefas, o ptio cerimonial reservado aos homens, que as mulheres

    apenas utilizam quando so convidadas. Inversamente, as mulheres circulam pela

    periferia das aldeias. Embora as partes das casas sejam identificadas com a anatomia

    masculina, so as mulheres que nelas passam a maior parte do tempo, j que os homens

    s se recolhem a ela para dormir e para atividades cerimoniais.

    Essa descrio sumria vlida para todas as aldeias do Alto Xingu. Isso, no

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    entanto, no quer dizer que cada aldeia no tenha mantido sua individualidade. Noutros

    termos, cada povo manteve caractersticas prprias no perfil das casas, na forma da casa

    dos homens ou na implantao do cemitrio no meio do ptio.

    Aldeia Kayamur

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    Aldeia Karaj de Hawalo

    2. AS CASAS

    2.1. Casas com planta baixa circular:

    A cobertura cnica (independente da parede) colocada sobre esteios verticais.

    Foi vista por entre os Makux, do rio Rupununi, e ainda entre os Tiriy. s vezes, a parede

    no chegava a ser revestida. Tais casas so tambm encontradas entre os Wapitxna,

    Patamona e Arekuna (Taulipng). Estes ndios, alis, tm tambm outras, de planta baixa

    elptica, apresentando cobertura em duas guas. Das duas extremidades da cumeeira

    partem seces cnicas verticais que atingem as paredes nas extremidades circulares da

    elipse.

    Os Tiriy apresentam grande variedade de tipos de casa (tomando-se a planta baixa e a

    cobertura), o que explicado como resultado do contato destes ndios com outras tribos

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    amaznicas. Existem variantes da mencionada moradia circular com cobertura cnica,

    designada como cupular: mune, tukxipane timkt. A segunda corresponde de modo

    geral ao tipo visto entre os Makux do Rupununi, embora a forma da cobertura da casa

    dos Tiriy seja menos cnica e mais prxima de um zimbrio ou cpula. A primeira forma

    mune, cupular tambm, no apresenta diferenciao entre parede e cobertura. A terceira,similar ao mencionado exemplo Makus, tem esteios verticais, laterais, no revestidos.

    Casas de planta baixa circular e cobertura em cpula eram igualmente encontradas entre

    os Xavante (J) do Brasil Central.

    Casa Tiriy Planta baixa circular

    Casa Tiriy - Corte

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    2.2. Casa J: Xavante

    A casa tradicional era circular, com cobertura em cpula, e abrigava uma

    famlia extensa matrilocal. No caso de casamento poligmico, quando as mulheres no

    eram irms, era a primeira que abrigava a segunda esposa em sua casa, onde passava acooperar economicamente com o novo grupo domestico.

    Uma nova casa era construda em substituio antiga quando esta se

    deteriorava ou quando o grupo domstico se fragmentava. Participavam de sua

    construo os adultos que nela iam morar -, o que ocorria durante a estao seca. Os

    maridos mais jovens cortavam a madeira, preparavam a estrutura de sustentao e as

    divisrias internas; as mulheres efetuavam a estrutura de vedao e o revestimento.

    Inicialmente, fincava-se no cho um esteio de 5 a 6m de altura, que marcava ocentro da construo. Vrios outros esteios maiores e mais finos (cerca de 15 cm de

    dimetro) eram fincados ao redor do esteio central, distanciando-se dele 3,50 ou 3,80m,

    mantendo entre si cerca de meio metro de intervalo. Esses esteios laterais deveriam ser

    flexveis, posto que eram fletidos para dentro do pequeno crculo e amarrados entre si ao

    centro, a cerca de 4,50m de altura, formando uma cpula de 7,50 m de dimetro na base.

    Aps essa amarrao, o esteio central podia ser retirado pra obterem espao interno

    desimpedido de esteios, sem que ocorressem danos na estabilidade da construo.

    A estrutura de vedao era efetuada com taquaras colocadas na horizontal

    (ripas) e amarradas aos esteios na superfcie externa da estrutura de sustentao;

    serviam tambm para a fixao do revestimento em folhas de palmeira. Estas eram

    colocadas na vertical sobre cada ripa, onde eram dobradas para dentro da construo e

    amarradas ripa imediatamente inferior.

    Uma nica entrada era aberta para o interior da aldeia. Tinha pouca altura, o

    que obrigava os moradores a se curvarem para nela penetrar. Durante a noite, ou na

    ausncia da famlia, essa entrada era fechada por uma porta de folhas de palmeira

    entrelaadas.

    Os ndios efetuavam alguns buracos no revestimento para maior penetrao de

    luz sol no interior das casas, e tambm para olhar o exterior, sem precisarem delas sair.

    exceo da aldeia Etenhorepr, ainda foram encontradas casas desse tipo

    entre os Xavantes. Nessa aldeia, a maioria das construes era de planta baixa

    retangular ou poligonal de seis a oito lados. Esta ultima forma foi sugerida pelos

    missionrios a partir de depsitos edificados em alvenaria e palha entre 1972 e 1973, e

    que foram transformadas em dormitrios para rapazes Xavante internos no colgio da

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    Misso, substituindo as tradicionais construes, anteriormente referidas. Os ndios

    adotaram a forma de planta baixa, mas preservaram a tecnologia de construo em

    madeira e folhas de palmeira, com as necessrias divises internas.

    Aldeia Xavante Ethehore pr

    Foram encontradas 53 casas em Etenhore pr, das quais duas tinham planta

    baixa retangular, e 51 eram de forma poligonal. Encontrou-se ainda 29 outras construes

    diversas, fora da aldeia: uma casa de hspedes, alguns depsitos e coberturas sem

    parede, de planta baixa retangular; uma escola de planta baixa poligonal; alm de vrios

    galinheiros construdos sob forma tradicional da antiga casa, sendo que alguns

    apresentavam cerca para manter as aves no local.

    Quase todas as moradias atuais possuem duas portas, porem a mais utilizada

    a que se comunica com o centro da aldeia. A outra usada para trabalhos domsticos, d

    acesso aos galinheiros, aos depsitos e ao lixo que se acumula na periferia.

    As casas de planta baixa poligonal so irregulares e algumas vezes so

    poligonais mistas de segmentos de retas e de curvas. O dimetro tambm varivel, em

    torno de 8m, e a altura de 5m no centro, onde o esteio central permanece para sustentar

    a cobertura efetuada em quantidade de guas igual ao numero de lados.

    A estrutura de sustentao constituda de esteio central com cerca de 6m de

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    altura, e 6 ou 8 esteios laterais de aproximadamente 3m de altura, colocados nos vrtices

    do polgono afastado cerca de 4m do esteio central. Os frechais so apoiados sobre os

    esteios laterais e, na confluncia destes, espiges se unem ao esteio central. Igual

    quantidade de mos-francesas encaixadas e pregadas no esteio central ajudam a

    sustentar os espiges. Os caibros so pregados sobre os espiges e frechais e, sobreeles, as ripas, onde sero presas, pelo processo tradicional, as folhas de palmeira.

    Casa Xavante Planta baixa circular

    As paredes recebem uma estrutura de vedao independente daquela efetuada

    na cobertura. Entre os esteios laterais so fincados no cho, esteios mais finos que,

    apoiados ou pregados nos frechais, so presos entre si por ripas horizontais, que

    recebem o revestimento em folhas de palmeira.

    Toda a construo efetuada pelos homens, e as mulheres apenas socam o

    barro para elevar o piso interno acima do nvel da aldeia. tambm tarefa feminina

    colocar a palha nas tradicionais divisrias internas cujas estruturas so executadas pelos

    homens.

    Os acessos possuem, atualmente, esquadrias com portas fixadas por

    dobradias de metal e trincos. Algumas possuem trancas de madeira e so tambm

    fechadas a cadeados. Ocorre tambm a presena de janelas fixadas maneira das

    portas, e coexistem com as pequenas aberturas efetuadas na palha, encontradas nas

    casas.

    Atualmente j no existem acampamentos, postos que as excurses se

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    tornaram cada vez mais raras. As prticas de caa e coleta, como meio de subsistncia,

    vem sendo substitudas pela agricultura e pela criao de gado e animais domsticos.

    2.3. Casas com planta baixa elptica:

    Aparece tambm entre os Tiriy, com cobertura de duas guas. Outro exemplo

    Tiriy a casa taotnt, de planta baixa em elipse (entretanto incompleta), aberta em uma

    das extremidades, tambm apresentando esteios laterais obliquamente dispostos. A forma

    em elipse incompleta era corrente no Uaups: era assim a maloca dos Tuyka no rio

    Tiqui, alto Uaups. Entretanto, no decurso de meio sculo, a planta baixa foi sendo

    gradualmente modificada, at tomar forma retangular, em virtude da substituio da

    extremidade arredondada (na fachada posterior), por um acabamento semelhante aofrontal.

    Um tipo de habitao foi encontrado em 1888, acima da embocadura dos rios

    Jacar e Tapau, constituda de estrutura prxima quela de planta baixa em elipse

    incompleta, assentada em balsas de troncos e varas. Os Paumar morariam nelas ao

    tempo das cheias, no meio das lagoas. As aldeias constituam de 8 a 12 dessas casas-

    embarcaes, podendo cada uma abrigar uma ou duas famlias.

    Alm dos casos mencionados, ocorrem habitaes de planta baixa elptica, sem

    distino entre parede e cobertura, no alto Xingu. Apresentam seo transversal em

    abbada de bero e seo longitudinal em asa de cesto. A distncia entre casas

    contguas numa aldeia do alto Xingu de cerca de 5 ou 20 metros.

    Casa Tiriy Planta baixa elptica

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    Casa Tiriy Planta baixa elptica

    Casa Tiriy Planta baixa semielptica

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    Casa Tiriy Corte e fachada

    2.4. A casa antropomorfa:

    A casa xinguana comparada ao corpo humano ou animal, de sexo masculino.

    Para que permanea em equilbrio, na posio correta, ou seja, em p, deve ter bons ps

    plantados no cho, e pernas firmes. Da, os esteios principais da casa aqueles disposto

    nos focos centrais de uma elipse serem chamados pernas da casa. A parte da

    construo correspondente ao trecho mdio superior da fachada principal relacionada

    ao peito e o setor oposto, na fachada posterior considerada como as costas da casa.

    Os ps da casa so considerados como sendo o trecho junto do solo, formado pela

    carreira de caibros enterrados como os paus fincados em p, para fazer as paredes. Os

    semicrculos laterais, correspondentes aos setores ntimos da casa, so chamados as

    ndegas da casa. A cumeeira esta relacionada ao alto da cabea, no exatamente a

    parte mais alta, mais sim, ao trecho entre o alto da cabea e a testa. As ripas so

    consideradas como as costelas da casa e a palha ao que reveste, os cabelos ou plos.

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    Antropomorfismo da casa xinguana Planta baixa e corte

    Antropomorfismo da casa xinguana - Fachadas

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    Um elemento vertical, vazado, que parte do fechamento superior da cobertura

    destinado ao escapamento da fumaa interior produzida durante a noite pelas fogueiras

    junto s redes, bem como para a penetrao da luz diurna no interior da construo

    chamado de dentes da casa. Lateralmente, e acima deles, so dispostos os brincos. A

    regio imediatamente inferior a este conjunto de dentes e brincos da construo conhecida como o pescoo da casa. A porta principal uma boca da casa. A porta

    secundaria, que da sada para o exterior da aldeia, o lugar por onde saem os detritos, o

    lixo, por onde se sai de casa para ir ao mato satisfazer as necessidades biolgicas. Talvez

    seja o anus da casa.

    Casa dos ndios Kamayur, Parque Indgena do Xingu

    2.5. A grande maloca Tukno

    O local de implantao da maloca (casa-aldeia) sempre o rio,

    freqentemente situado junto a uma corredeira onde se formam amplos remansos e

    profundas lagoas. Esse espao dividido em trs partes: o de rio acima, designado como

    lugar dos homens; o de rio abaixo, lugar das mulheres. E, ainda, um lugar intermedirio,

    freqentado tanto por homens como por mulheres, onde podem ter lugar relaes

    sexuais. tambm nesse local que o paj realiza seu aprendizado e oficia em certos

    rituais. Como se acredita que todos os rios correm para o leste, diz-se que a maloca tem

    um lado do levante e um lado poente.

    construda atravs de trabalho comunal executado pelos membros de um ou

    mais sibs patrilineares que devero ocup-la. A construo leva cerca de trs meses com

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    a utilizao de madeira e folhas de palmeira. Em primeiro lugar, so levantados fortes

    esteios, aos quais se prendem vigas-travesses. Acima dessa estrutura, coloca-se a

    cobertura em duas guas. A planta resulta ser retangular alongada, ocorrendo tanto uma

    extenso longitudinal quanto transversal maior, toma-se como ponto de referncia a

    cumeeira, ortogonal ao rio.A maloca Tukno tem duas portas, uma na fachada principal que d para o rio,

    e outra na fachada posterior. O interior da casa dividido por tabiques de folhas de

    palmeira tranadas, ocupando as famlias nucleares os nichos prximos s paredes,

    situados na metade traseira. Aos membros do sib de status mais alto reservada a rea

    prxima ao meio da casa. A parte da frente destinada aos visitantes.

    Antiga casa-aldeia Tukno Planta baixa semielptica

    Antiga casa-aldeia Tukno Cortes e fachadas

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    2.6. Casas com planta baixa retangular:

    Com cobertura e parede contguas, e tendo forma ogival na seco reta, foi

    vista entre os grupos Karib do alto rio Barima. Casas de planta baixa retangular tambm

    eram encontradas entre os Aruak, Warrau e Karib do Demerara, bem como entre os Galib(Karib) de Caiena e ainda Makux. Algumas formas Tiriy apresentam planta retangular

    com cobertura em duas guas.

    Casa Tiriy Planta baixa retangular

    Abandonando a Amaznia, encontramos tal tipo entre vrios grupos Tupi, entre

    eles o Tapirap, na regio do Araguaia. registrado tambm entre os Omgua,

    Tupinamb, Munduruk e outros. Casas de planta retangular e poligonal tambm foram

    vistas, em 1979 e 1981 na aldeia de So Marcos.A antiga casa de famlia extensa Karaj tinha planta baixa retangular alongada,

    com a cobertura de seo reta em ogiva. Atualmente, apresentam planta baixa

    quadrangular com cobertura de quatro guas. Alis, tambm hoje a casa Xavante

    retangular apresenta cobertura com igual nmero de guas.

    2.6.1. A casa Karaj:

    Embora inseridas em alinhamentos duplos e tendo-se em vista a formao de

    terceiros alinhamentos, as casas mantm a orientao tradicional, seguindo cada fileira

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    um linha paralela ao rio Araguaia. Em relao ao solstcio de inverno, pode-se calcular

    que as residncias Karaj da ilha recebem o sol da manha em sua fachada frontal ao rio,

    e o sol da tarde em sua fachada voltada pra o interior. Todas as casas das aldeias

    situadas s respectivas margens esquerdas desse rio teriam a orientao invertida. Deste

    modo, pode-se dizer que a casa Karaj alm de se orientar pelo rio, tem o solatravessando-a longitudinalmente, no sentido frente-fundos ou vice-versa, mas sempre na

    direo da cumeeira.

    Aldeia Aruan ndios Karaj Ilha do Bananal

    A construo da casa tarefa exclusivamente masculina, embora constitua

    propriedade da mulher. Todos os homens Karaj aprendem a construir. Faziam a antiga

    casa grande em mutiro que reunia os integrantes da famlia extensa. Em se tratando de

    famlias menores, e das habitaes atuais, em homem sozinho pode constru-las. Oresultado do trabalho pode destinar-se ao prprio usurio ou inserir-se no sistema de

    trocas internas do grupo: atender ao pagamento de uma divida ou ser vendida por

    determinada soma em dinheiro.

    A construo Karaj antiga (planta baixa retangular) no mais existe, seno sob

    forma empobrecida, em habitaes provisrias. Entretanto, reproduzida sob forma

    tradicional por ocasio da festa do Hetohok, de iniciao dos rapazes de 14 anos casa-

    dos-homens. Recebem as duas casas, ento construdas, a Grande e a Pequena,orientao diferente quanto aos pontos cardeais e ao rio: as fachadas da frente no ficam

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    voltadas para o Araguaia.

    Antiga casa Karaj Planta baixa retangular

    Examinando os registros de fins do sculo XIX, pode-se confirmar a

    modificao na forma das construes residenciais antigas em relao s atuais. As

    primeiras apresentavam teto e paredes laterais sem separao, formando uma abbada

    de bero quadrangular, cobertura em quatro guas e um apoio central.

    A forma tradicional apresentava a vantagem de ter carter extensivo, podendo

    ser provavelmente aumentada segundo o crescimento da famlia sem alterao da

    morfologia. J na forma atual este crescimento no possvel, pois, ao contrrio do que

    ocorria antes, o madeiramento da cobertura independente daquele que estrutura o

    fechamento das paredes. As casas so agora unidades completas, e qualquer

    crescimento se da por multiplicao ou atravs da edificao de outra unidade maior.

    A estrutura da construo antiga compreendia um alinhamento de esteios

    centrais, dispostos de maneira a atingir um comprimento ideal. Sobre eles era amarrada a

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    cumeeira. Os esteios laterais eram fincados no solo, acompanhando o alinhamento dos

    primeiros. Estes ltimos apresentavam forquilhas na extremidade superior, destinadas a

    sustentar as teras. Um pouco mais afastada dos esteios, em cada lado da construo,

    era colocada uma fileira de varas flexveis, envergadas para dentro at encontrarem-se no

    topo. Amarradas s teras e cumeeira, estas varas funcionavam como caibros e davama curvatura ideal da abbada. Sobre elas, pela parte externa, eram fincados alguns

    sarrafos na vertical, de baixo para cima, por sobre a primeira ripa; o canho da folha

    passava sob a segunda ripa e sobre a terceira, onde, dobrado para baixo, fazia o contorno

    desta ultima ripa e, puxando para fora, era sobreposto segunda ripa, onde se fixava por

    compresso. Da por diante, seguia-se o processo at atingir a cumeeira. Traados de

    pnulas vedavam os lados estreitos da cobertura superior e inferior.

    A casa de moradia atual apresenta quatro fachadas que formam um quadradode aproximadamente seis metros de lado. De trs em trs metros, oito esteios so

    fincados no solo quatro nos cantos e quatro intermedirios -, para sustentar um frechal

    que acompanha todo o permetro da construo. Sobre ele assentado o madeirame da

    cobertura, independente das paredes. Quatro espiges e uma pequena cumeeira definem

    as quatro guas dessa cobertura, sustentada ainda por um esteio central que, com duas

    mos-francesas, mantm a cumeeira na horizontal. Caibros inclinados e ripas na

    horizontal completam o madeiramento.

    S depois de inteiramente pronta a cobertura, definida a vedao das

    paredes. Provisoriamente, colocado babau na horizontal, com as pnulas dobradas

    para um s lado e um espaamento de 10cm entre os talos das folhas. Dessa forma, os

    vos das portas so deixados livres e ai colocados lateralmente, marcos enterrados no

    solo, amarrados ao frechal apenas para prender as folhas. Posteriormente, esta vedao

    poder ser substituda por pau-a-pique ou adobe. possvel tambm proceder-se

    renovao do babau. A cobertura feita na estiagem, de preferncia ao anoitecer, pois o

    orvalho amacia as pnulas das folhas secas de palmeira e facilita o trabalho evitando-se

    grandes cortes na pele do arteso.

    O tipo atual de construo delimita um espao interno bastante amplo, onde as

    subdivises no apresentam marcas visveis, porquanto so apenas limitadas pelo prprio

    uso convencional. Contrastando com o tipo anterior, observa-se que a casa est livre da

    grande quantidade de esteios internos. Apenas aparece acrescido cmodos s unidade

    de moradia, para utilizaes especificas. Nestes casos, a subdiviso realizada por uma

    parede e o objetivo imediato separar o local destinado a dormitrio daquele destinado

    cozinha.

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    Habitao Karaj Casa de palha pseudo-tradicional Ilha do Bananal

    Com o fim de estabelecer uma tipologia preliminar das atuais casas de moradia

    observadas em quatro aldeias Karaj, foram definidos seis tipos: 1 casa pseudo-

    tradicional, cuja matria-prima quase exclusivamente a palha; 2 casa mista, isto ,

    aquela para cuja construo concorre tanto a palha quanto outros materiais, tais como o

    adobe ou barro batido (pau-a-pique), crus; 3 casa de alvenaria em Hawal, cujo material

    de construo constitudo de tijolos cozidos, assentados e revestidos com argamassa,

    apresentando a casa cobertura com telhas de cimento-amianto; 4 casa de pau-a-pique

    ou de alvenaria com revestimento em massa e cobertura de telhas de barro; 5 casa de

    alvenaria com cobertura em zinco, encontrada, em sua maioria, em Butwiro; 6 casa de

    alvenaria com cobertura de palha, encontrada em Butwiro e Heryri.

    Outros tipos com emprego variado de materiais de construo foram vistos,

    mas ainda constituem casos isolados e no ocorrem simultaneamente em pelo menos

    duas aldeias. So eles: casa mista de palha e pau-a-pique com cobertura em telha de

    barro; casa de adobe com cobertura idntica; casa mista com cobertura de zinco.

    A proporo em que se apresentavam tais casos em todas as aldeias, de 1979 a 1981,

    a seguinte: ocorriam com maior freqncia as casas de palha; em segundo lugar, vinham

    as casas mistas; e em menor nmero, as casas de alvenaria mencionadas no itemterceiro. Casos menos comuns so os registrados pelos itens quarto, quinto e sexto.

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    2.6.2. A casa Tupi: Tapirap

    As casas Tapirap tm planta baixa retangular e cobertura em abbada de

    bero, como as Tupinamb. Seus extremos so vedados como eram aquelas. Essas

    casas de moradia no seriam tradicionais. Somente teria tal caracterstica a Takana, deplanta baixa em elipse bastante alongada e seco transversal em abobada de bero.

    Apresentaria, assim, um corte longitudinal parecido ao da casa alto-Xinguana, isto , em

    asa de cesto. Parece-nos que ambas as modalidades de edificao seriam tradicionais. A

    diferenciao morfolgica indicaria, apenas, a natureza funcional de cada uma delas: a

    moradia, mbito das mulheres; a Takana, lugar cerimonial e de reunio coletiva dos

    homens da aldeia.

    So construdas em determinadas pocas do ano, por grupos de famlias queas ocuparo, conduzidas pelos seus chefes. Por volta do ms de agosto, durante a parte

    da manh, os homens cortam a madeira anteriormente escolhida, bem como as folhas de

    helicnia e palmeira, com as quais fazem o revestimento, e tambm a embira necessria

    para as amarraes da estrutura. Ao entardecer, transportam o material necessrio para a

    aldeia. Entre quatro a cinco horas da tarde do inicio construo, fazendo os buracos no

    solo, onde sero fincados os esteios da casa. Estes constituem trs alinhamentos

    longitudinais paralelos, eqidistantes cerca de 2,75 m. Cada alinhamento apresenta igual

    quantidade de esteios, fincados a intervalos variveis entre 3 a 4 metros. Os esteios

    extremos distam entre 1 a 1,30m dos demais, includos nos respectivos alinhamentos. O

    central possui cerca de 3,80m de altura e ambos os laterais 1,60m, terminando todos em

    forquilha, sobre as quais so encaixados e amarrados os frechais e a cumeeira.

    Travesses so fixados aos frechais, unindo ambos os alinhamentos laterais de esteio ao

    alinhamento central. Sobre os travesses, duas longarinas so amarradas ladeando o

    alinhamento de esteios centrais. Outras quatro longarinas ficam presas, duas a duas, logo

    abaixo da cumeeira, distando delas, ao cho, cerca de 3,20m de altura.

    Varas flexveis e compridas constituem os caibros que, fincados ao solo entre

    os esteios laterais, a uma distancia varivel entre 30 e 50 cm devem ser fletidos e

    amarrados sobre os frechais e a cumeeira. Sobre tais caibros so presas as ripas.

    Tomando-se os lados maiores da construo, logo acima dos frechais, costuma-se

    prender aos caibros, grampos de um metro de comprimento, a intervalos de cerca de um

    metro. As partes inferiores dos referidos grampos ficam livres para serem interligadas por

    tiras torcidas de embira. O revestimento colocado por cima da estrutura, prendendo-se

    entre a cumeeira e as longarinas, os talos das folhas de helicnia. Suas extremidades

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    pendentes passam sob a embira torcida, interligando as pontas inferiores dos grampos.

    Sobre as folhas de helicnia coloca-se uma camada de folhas de palmcea, amarradas

    entre si sobre a cumeeira. Outra camada de folhas de palmeira presa entre os frechais e

    as ripas, sendo que suas extremidades pendentes tocam o solo. Nova camada de folhas

    de helicnia ento colocada. O fechamento da parte menos do retngulo feito com asfolhas de helicnia e palmeira em camadas superpostas, em posio perpendicular ao

    solo.

    Casa Tapirap Planta baixa retangular

    As moradias podem apresentar uma a trs portas. Uma delas se situa na

    fachada de maior dimenso, voltada para a praa; e as outras duas so abertas, de

    preferncia, nas fachadas mais estreitas, podendo s-lo, entretanto, em qualquer outra

    fachada.

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    Casa Tapirap Cortes e fachadas

    2.7. Casas com planta baixa poligonal:

    As casas dos Marboe Mayorna, grupos de lngua pano da fronteira Brasil-

    Peru, apresentam respectivamente planta decagonal e hexagonal.

    2.7.1. A Shabonodos YanomamisShabono como chamam os Yanomami, a aldeia-casa permanente, ocupada

    por um grupo de parentes, ou teri.

    Essa aldeia-casa tem forma circular ou poligonal, correspondendo cada lado do

    polgono residncia de uma famlia, ou nano.

    Aldeia-casa Yanomami Planta baixa circular

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    A shabono dura apenas um ou dois anos, ou porque as folhas comeam a

    romper-se, ou porque se torna necessrio queimar a aldeia a fim de destruir baratas,

    aracndeos e outras pragas invasoras. No existem tipos distintos dessa aldeia-casa, mas

    apenas diferentes tamanhos de um nico tipo de shabono, cujo dimensionamento

    funo do numero de pessoas que abriga. A cobertura das unidades de moradia articulada de modo a formar uma nica superfcie que abriga a todas. um cone truncado

    em sua parte superior onde permanece aberto para a penetrao da luz solar na praa

    central, bem como para exausto da fumaa.

    A cobertura executada para tapar o grande vo central chega a atingir 15

    metros de dimetro. Utilizam como revestimento da mesma apenas as pnulas das folhas

    de palmeira, o que a torna bastante leve. Preocupam-se em proteger esse teto contra os

    ventos, lanando sobre ele varas compridas e galhos; e tambm, utilizam-se da magiaprotetora dos xams. O local escolhido para a construo da shabono deve ser bem

    drenado, de preferncia em alguma elevao do terreno.

    Escolhido o lugar de implantao, os Yanomami tratam da limpeza do terreno e

    da construo de uma aldeia temporria, composta de abrigos, onde vivem at o termino

    definitivo da shabono. Cabe ao homem localizar, cortar e transportar a madeira para o

    local, bem como edificar e revestir a shabono. mulher reservada a tarefa de coletar os

    cips a serem empregados na amarrao, bem como as folhas de palmeiras para o

    revestimento.

    A estrutura de cada shabonose constitui de quatro esteios fincados no terreno:

    dois interiores, com 1,50m de altura, distando estes dos anteriores cerca de 2,40m a

    2,70m. colocada a tera nica sobre os esteios de dentro; sobre os exteriores

    colocado o frechal. Numerosos caibros de bitola estreita com comprimento variando

    entre 6 a 9 metros, conforme o raio de circunferncia que define a shabono -, so

    sobrepostos tera e ao frechal. Os caibros mantm entre si intervalo de

    aproximadamente a metade da altura dos esteios interiores, os caibros ultrapassam

    frechal e tera, formando ngulo de 25a 30, com o plano horizontal do terreno. O

    pequeno beiral que apresenta a cobertura evita que as guas das chuvas escorram sobre

    a parede externa da construo. Os caibros formam tambm um grande balano de

    4,50m de comprimento, ou mais, alm da tera, cobrindo parcialmente o ptio interno da

    aldeia.

    Toda a estrutura amarrada com cip, e de cip tambm so confeccionadas

    as ripas da cobertura. Tais ripas so esticadas paralelamente umas s outras, interligando

    a base ao topo. Cada cip amarrado recebe isoladamente o revestimento de pnulas de

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    folhas de palmeira. Segue-se outro cip no qual as pnulas so presas fiada anterior.

    Quando as fiadas de pnulas atingem a altura da tera construdo um andaime, no ptio

    da aldeia, para efetuar-se o revestimento, em toda a extenso dos caibros. pendurada

    no topo da cobertura, a cerca de 6 metros de altura, uma franja do mesmo material de

    revestimento, qual a funciona como pingadeira. Com efeito, sem essa franja, as guasda chuva escorreriam de modo a molhar o local de colocao de redes.

    Aldeia-casa Yanomami Planta baixa encaibramento

    A shabono pode ter intervalos de um metro entre os esteiros de duas nano

    consecutivas, os quais so cobertos pelos homens que as constroem adjacentes quela

    j construda. Alguns espaos no so totalmente cobertos, originando-se sadas de

    emergncia prximas ao frechal. Os compartimentos de habitao abrem-se para a praa

    interna. No apresentam revestimento lateral ou frontal. Apenas as paredes de trs das

    unidades em questo que constituem o circulo exterior da grande casa coletiva, aqum

    da paliada so revestidas.

    Cada moradia Yanomami uma seo da shabono, seo esta que apresenta

    forma trapezoidal, tomando-se a planta baixa. Varias construes lateralmente contguas

    forma um anel circular que contorna uma rea vazia: o ptio central da casa-aldeia.

    A aldeia est completa quando construda em volta dela uma paliada. Esta

    dista de 1m a 1,60m do beiral, deixando espao para um caminho que contorna a aldeia.Tem cerca de 3m de altura. feita de barrotes de madeira dura e palmeira.

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    Aldeia-casa Yanomami Corte e fachada

    Quando viajam, os Yanomami constroem abrigos de rpida execuo, com

    planta baixa triangular, onde trs pessoas podem acomodar-se. Empregam, em sua

    construo, um grande esteio frontal, com cerca de 1,80m de altura, unido por duas varas

    ou caibros a dois outros esteios, posteriores e menores, com certa de 1,20m de altura.Sobre os caibros, so amarradas algumas varas finas, maneira de ripas. O revestimento

    efetuado com algumas camadas de folhas de bananeira. Utilizam-nas tambm, quando

    constroem aldeias temporrias, a fim de edificarem a aldeia-casa (shabono). Neste caso,

    os abrigos devero ser destrudos aps terminarem a construo da aldeia permanente.

    O contrario ocorre nos acampamentos de viagem, em que so preservadas as edificaes

    e, periodicamente, estas tm substitudo o revestimento da cobertura. Podem ainda

    colocar uma outra camada de folhas, sobre a j existente, para melhor se abrigaremcontra as chuvas.

    2.7.2 A casa-aldeia dos Marbo

    Cada unidade constitui um grupo local. H, entretanto, agrupamentos de

    malocas, localizadas em colinas vizinhas, ou sobre uma s colina, constituindo tambm,

    provavelmente, um grupo local. No as constroem nos postos indgenas. A, cada famlia

    nuclear habita casas sobre pilotis.

    Uma semelhana entre casa Marbo e casa alto-Xinguana seria o

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    antropomorfismo que ambas conotariam, conforme se depreende da terminologia de

    partes da construo e de acordo com as noes indgenas. Os Marbo identificariam a

    casa ao corpo do Xam, assim como a do alto Xingu seria assimilada a um ser masculino

    (ou andrgino), dotado de enfeites e pintura corporal que o humanizam.

    Aldeia Marbo: Maloca de Paulo Rio Paraguau

    A casa-aldeia Marbo construda segundo um modelo padro, cuja planta tem

    forma poligonal, irregular, de dez lados. Apresenta simetria em relao a um eixo

    longitudinal, em cujas extremidades so colocadas as portas da referida maloca. Os lados

    intermedirios do decgono, situados nas extremidades de um eixo transversal, so

    maiores que os demais. Suas medidas variam entre 9 e 31 metros de comprimento, 7 e

    17 metros de largura e cerca de 8m de altura.

    A maloca apresenta um total de 24 esteios: 8 centrais e 16 perifricos,

    dispostos da seguinte maneira: os centrais, mais elevados, so colocados em duas fileiras

    paralelas de 4 esteios. Mantm-se uma distancia constante entre eles, deixando-se a

    meio da construo um corredor em toda sua extenso longitudinal. Existem 8 esteios

    laterais chamados txibi toba nati, dispostos paralelamente a esses do centro ao longo dois

    2 lados maiores do polgono. Tomando-se quaisquer dimenses da maloca, maiores ou

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    menores, h 4 esteios que chamamos intermedirios, dispostos entre os anteriores e os

    que se seguem em ngulos formados pelos lados menores do polgono. Outros quatro

    esteios, aos quais chamamos umbrais, designados pelos ndios coit, esto dispostos dois

    a dois nos extremos da construo, a cada lado das portas.

    Casa-aldeia Marbo Planta baixa decagonal

    Algumas teras so amarradas sobre encaixes localizados nos topos dos

    esteios: as centrais e as laterais tm o mesmo comprimento do lado maior da construo;

    as que correspondem aos lados menores do polgono so chamadas rep pisque. Quatrotravesses paralelos so assentados e amarrados sobre as teras centrais, unindo dois a

    dois os esteios correspondentes. As salincias por elas produzidas na face externa da

    cobertura de palha so chamadas de capemarechquic, isto , semelhante s salincias

    da barriga do jacar. Os caibros so colocados por cima das teras, amarrados a elas

    com cip por meio de um lao denominado mai mtsisca, que significa unha de

    preguia. Os caibros que formam as guas dos lados maiores so os caya txip. Os

    correspondentes s guas dos lados menores apiam-se nos caibros frontais extremos.Outros cano txipse apiam, por sua vez, nos caibros laterais: correspondem aos lados

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    menores do polgono. Os quatro caibros frontais que incidem, dois a dois, sobre os

    esteios-umbrais so chamados bosecti an nech, e sustentam as vergas do mesmo

    nome, em numero de duas, uma para cada porta. Estas vergas apiam-se nos caibros

    que incidem sobre os esteios dos umbrais, e no diretamente sobre eles. As soleiras e os

    seis caibros que incidem sobre as vergas (trs para cada uma) so chamados aresr,sendo que os centrais correspondem aos espiges. A amarrao desses caibros frontais

    feita em lao que forma desenhos losangulares.

    Casa-aldeia Marbo Corte e fachada

    A cumeeira sustentada pelos caibros relativos aos lados maiores do polgono.

    A estrutura das paredes formada por paus finos verticais, fincados no cho, com cerca

    de um metro de altura tocando os caibros em suas extremidades. Esta unio reforadapor uma vara longitudinal, qual estes paus e caibros so amarrados. Na casa-aldeia

    Marboexiste, ainda, uma parte mvel da cobertura disposta sobre ambas as entradas

    da casa que levantada como uma bscula, toda vez que se deseja uma maior

    claridade no interior da maloca. noite, as entradas podem ser fechadas com portas

    confeccionadas em folhas de palmeira tranadas. Dois paus chamados tanti mastteso

    fincados no cho, para fixar cada porta. A cobertura efetuada com folhas de jarina,

    amarradas diretamente, na horizontal, sobre os caibros. Seus talos funcionam como ripas.

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    Casa-aldeia Marbo Corte e fachada

    As construes indgenas, resultado de uma evoluo de centenas ou milhares

    de anos pela interao do homem com o ambiente no qual vive, proporcionam

    informaes importantes sobre como possvel a sobrevivncia em clima equatorial

    mido sem necessidade de recorrer a meios de condicionamento artificial.

    No caso da arquitetura indgena, nos deparamos com uma arquiteturavernacular, na qual os prprios ocupantes desenvolveram, com material local, formas e

    estruturas que no destoam com o ambiente.

    Quando estudamos as terras da Amrica do sul, encontramos um clima

    totalmente diferente: do norte de Roraima at o estado de So Paulo, estamos em um

    clima equatorial ou tropical, no qual a variao de temperatura entre o dia e a noite

    superior variao da temperatura entre o perodo mais frio e o perodo mais quente do

    ano. Em grande parte da regio, o calor, e no o frio, o elemento do qual o homem devese proteger, e a umidade o grande vilo do conforto. nesse contexto que surge a

    arquitetura indgena, feita de estruturas leves, permeveis ao ar, que retira o calor em

    excesso e, principalmente, remove a umidade, que embolora e mofa qualquer coisa.

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    3. TECNOLOGIA INDGENA

    Tcnicas construtivas, materiais aplicados e adaptaes ao meio so partculas

    do contexto da tecnologia indgena. Geralmente as tcnicas e materiais empregados se

    assemelham entre as tribos. O que difere algumas vezes so as formas aplicadas e o

    mais importante a adaptao que a tecnologia sofreu em relao a regio climtica que a

    tribo esta inserida, pois encontra realidades diferentes de composio natural, e

    conseqentemente na disponibilidade de materiais diferentes e condies metrolgicas

    diferentes que interferem e ditam a forma e o emprego da tecnologia

    3.1. A construo da casa xinguana:

    A casa construda em cerca de seis meses. Normalmente as obras so

    iniciadas na estao das chuvas, entre janeiro e maro, e inaugurada na estao seca.

    As peas maiores em ais pesadas so cortadas prximo da aldeia, enquanto que as mais

    compridas e flexveis so coletadas em locais mais distantes. A ordem do corte da

    madeira na mata corresponde ordem de construo na aldeia. tambm nessa poca

    de chuvas que os cips e amarras so cortados, devendo ficar embebidos em gua para

    permanecerem macios e flexveis.

    Aldeia Kamayur Parque indgena do Xingu

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    A construo da casa tradicional xinguanadeve ser realizada atravs de um

    nico processo, com uma variante. Escolhido o local da edificao, inicia-se a perfurao

    dos buracos para a colocao dos esteios centrais, chamados pernas da casa. O

    tamanho da casa marcado pela distancia entre esses buracos, ou seja, entre dois

    esteios centrais. Estes devem ser fincados ao mesmo tempo, nas primeiras horas doamanhecer. Coloca-se mais um esteio (provisrio ou no), marcando o centro. A distancia

    constante entre os trs repetida para os lados. Observa-se que, se as medidas so

    muito grandes, permitido colocar-se mais esteios centrais, mas que no sero to

    importantes quanto os dois anteriores e principais. Isso se comprova pela observao da

    bitola das peas, bem como pela decorao posterior.

    A altura escolhida pelo dono. Na maioria das vezes, d-se preferncia a que,

    internamente, a altura equivalha distancia entre dois esteios principais e o provisrio.Marca-se, com varas, o quadro da parte reta central, compreendido pelos

    esteios principais e por pequenos esteios laterais: uma vara junto dos esteios centrais e

    outra, perpendicular, com o comprimento equivalente distancia anteriormente referida.

    Caminha-se at o esteio onde ficar a rede do dono da casa. L chegando, gira-se a vara

    em torno do esteio at completar 180, j do lado d e trs do mesmo. Prossegue-se para o

    outro esteio oposto, gira-se novamente a vara num raio de 180, at alcanar o ponto de

    partida. Desta maneira marcado, no cho, o desenho da planta baixa da casa.

    Segundo outro procedimento, dois homens participam dessa marcao, um de

    cada lado do eixo dos esteios principais. Caminham juntos, devagar, cada qual executa

    uma das partes curvas, ou, ento, um apenas executa ambas. Segundo um terceiro

    procedimento, os dois homens executam a marcao uma parte de cada vez.

    Marcada a planta baixa e fincando os esteios centrais, colocam-se quatro

    esteios menores, com bitola tambm menor, em torno de 20cm. So dispostos dois de

    cada lado do eixo horizontal da elipse alinhados pelo eixo vertical, para delimitar as

    portas. Em seguida, completa-se o permetro da construo com outros esteios menores,

    sendo que, em primeiro lugar, executam-se as partes retas. No encontro do

    prolongamento do eixo dos esteios principais com as curvaturas laterais, mais quatro

    esteios de 20cm de bitola so colocados: dois de cada lado. Todos esses esteios so

    chamados atati, que significa tudo em p, ou paredes.

    No topo desses pequenos esteios, pela parte interna da construo, implantam-

    se varias vigas de amarrao a partir de 1,80m de altura, marcando o tamanho da porta.

    Esta pode atingir 2,50m de altura, formando-se assim, uma faixa em todo o permetro

    interno da construo. o frechal (ipuku) que, como os esteios principais, pode receber

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    pintura decorativa.

    Pouco abaixo do topo dos esteios centrais, correm duas teras, de 20cm de

    bitola, unindo e fixando estes esteios (Mauanataka). Na construo de estruturas

    simplificadas, essas duas teras so eliminadas, mas em qualquer tipo de construo a

    cumeeira (pahne putakuiati) indispensvel. Ela apenas assentada em encaixe sobreos dois esteios principais.

    Varas flexveis so fincadas no solo, externamente s fileiras de atati, mantendo

    um afastamento constante do permetro da construo, entre 50cm a 1m. Cada vara

    corresponde a um esteio lateral, isto , a um atati. Essas varas so amarradas cumeeira

    e constituem os caibros (matari). As peas da fachada frontal so cortadas na cumeeira, e

    as da fachada posterior (que d par o mato) avanam cerca de 1m para receber os

    brincos. So compostos de troncos com razes, os quais arrematam as pontas das varasflexveis posteriores. As varas que sobem pela fachada principal sob esse conjunto

    no so cobertas pelo revestimento: so os dentes da casa. Atravs deles sai a fumaa

    interior e penetram rsteas de luz durante o dia.

    Outras varas flexveis so amarradas juntamente com os caibros, e fletidas

    mais abaixo, para serem amarradas s teras, formando um forro-falso. As varas

    correspondentes s partes retas da construo superpem-se quelas que correspondem

    s partes curvas.

    A partir do frechal que pode ser considerado como um anel de amarrao, o

    mais importante da construo so dispostos cerca de cinco ou seis outros anis,

    compostos, cada qual, de apenas uma ou duas varas eqidistantes 1m entre si, at

    atingirem a cumeeira.

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    Interior da casa dos ndios Asurin grupo Tupi do Igarap Ipiaaba, mdio rio Xingu Observar a

    curvatura dos caibros e a forma de revestimento

    As ripas, ou costelas da casa, so amarradas em toda a volta da estrutura de

    varas flexveis (caibros), mantendo-se uma distancia de 30 cm entre uma e outra.Entre junho e agosto, j na estao seca, efetuado o revestimento da casa

    com sap. Este chamado plo ou cabelo. O sap corado nas proximidades da aldeia,

    ao entardecer, ainda verde, quase seco. deixado durante a noite ao sereno, sombra,

    onde preparado aos feixes para ser enlaado nas ripas com cip fino, ao entardecer.

    Em algumas construes de dimenses avantajadas utilizado o recurso de

    contraventamentos: duplas de esteios inclinados em X. Dessa forma, a casa adquire

    maior resistncia aos ventos da estao das chuvas.O fechamento das portas executado em folhas de palmeira trancadas, ou em

    sap preso em quadros de ripas cruzadas, ou ainda, com materiais exgenos, como folha

    de zinco, incorporados aps o contato com a sociedade nacional.

    3.2. A amarrao

    Chamamos amarrao ao conjunto de procedimentos tcnicos visando a fixaros elementos construtivos includos na estrutura ou no revestimento.

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    Entre as maneiras de fixar os elementos estruturais, cabe citar o enlaamento

    das peas de madeira em cip. Observa-se tambm a tcnica do encaixe lateral, segundo

    a qual os paus so ligeiramente escavados para a obteno de melhor ajustamento. Esta

    segunda forma utilizada para grandes peas, porquanto assim se evita o deslocamento

    das mesmas, que seria produzido pelo excesso de peso. Em caso de serem empregadasmadeiras menores e mais leves, utilizam-se simultaneamente ambas as tcnicas: a de

    enlace e a d encaixe lateral. Outro tipo de encaixe o de topo, quando uma pea

    horizontal fixada acima de outra vertical.

    Todos os grupos indgenas brasileiros empregam o cip na tcnica de

    amarrao por enlace. Usavam-no os Karajpara a construo da casa antiga. O encaixe

    lateral, assim como a tcnica mista (encaixe lateral conjugado ao enlaamento),

    corrente entre os Tiriy. O encaixe de topo utilizado no alto Xingu, e tambm entre osTukno, que alem dessa usam a tcnica mista.

    empregada ainda a tcnica de simples ajustamento de uma pea horizontal

    sobre outra em posio vertical ou inclinada, terminando em forquilha ou na parte

    superior. Tal modo de ajustar torna desnecessrio o uso do enlaamento. Essa tcnica

    usada pelos Karaj na construo da casa atual, e tambm encontrada entre os

    Tapirap.

    A) Tipo de amarrao: enlace com cips B) Tipo de amarrao: enlace com cips sobre

    caibros

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    Cabe citar um modo menos complexo de fixao do madeiramento da estrutura,

    tcnica esta adquirida pelos ndios atravs do contato com regionais. Trata-se da

    utilizao de pregos em todos os cruzamentos das peas, o que pode, em alguns casos,

    reforar tanto a fixao por meio de encaixe, como substituir o enlaamento. Constituem

    exemplo deste procedimento as atuais casas Karaj e Xavante.Fazendo-se necessrio o emprego de um elemento curvo na estrutura (por

    exemplo, coberturas em abbada ou ogival), so confeccionados arcos com varas

    flexveis ou bambu. Caso se pretenda reforar a resistncia de tal elemento curvo, usa-se

    a tcnica de enlaamento das varas encurvadas com cip. Isto era observado nas antigas

    casas Xavante e Karaj, nas Tapirape Tiriy, e ainda no alto Xingu. Enfim, todas as

    construes cupulares e de cobertura com seo reta em ogiva ou abobada (casa do alto

    Xingu) apresentam tal tipo de amarrao.

    A) Tipo de amarrao: encaixe lateral B) Tipo de amarrao: encaixe no topo ou apoio sobre

    a forquilha

    No que concerne ao revestimento de cobertura e paredes, a amarrao pode

    apresentar as seguintes modalidades:a)procede-se ao entrelaamento das pnulas de duas folhas de palmeira, de

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    modo a formar painis que so aplicados sobre a estrutura e ai presos atravs da tcnica

    de enlace.

    b) utilizam-se para esse fim grampos de madeira (ou pregos, em se tratando de

    casas atuais).

    Grampos de madeira eram utilizados para fixar portas (painis) nas casas Tiriye nas antigas Xavante, e ainda nas moradias Tukno. Os Tiriy usavam tambm tais

    painis na cumeeira e no encontro da cobertura com o solo, nas casas cupular e semi-

    elptica de seo ogival. O enlaamento usado pelos Tukano para a fixao desses

    painis nas paredes laterais. (painis de entrecasca de arvore, pintados e fixados atravs

    de enlace com cip so encontrados nas fachadas frontais das casas Tukno).

    A fixao horizontal s folhas de palmeira pode se feita com as pnulas dobradas

    para baixo (na vertical), por intermdio de enlaamento de cios (ou uso de pregos). O taloda folha de palmeira, neste caso, funciona como ripa de parede ou cobertura. Outro tipo

    consiste na fixao vertical das folhas de palmeira, passando estas sobre a primeira ripa

    e, em seguida, sob a segunda cobertura, e dobrada esta folha tambm sobre a segunda

    ripa, volta para ser fixada sob a primeira.

    O primeiro tipo encontrado atualmente entre os Karajcomo revestimento de

    paredes. Os Tukano usam-no na cobertura. O segundo tipo tambm hoje observado

    entre os mesmos Karaj - usado somente na cobertura. Variantes deste segundo tipo

    so encontradas entre os Xavantese os Tiriy.

    A) Fixao de painis. A1) Folhas de palmeira entrelaadas sobre a cumeeira. Utilizao de grampos A2) Revestimento parietal em lber. Enlace com cips. B) Revestimento em folhas de palmeira

    (vista interna). Enlace com cips (tipo Tukno).

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    As folhas de palmeira podem ser tambm fixadas, em posio vertical, apensa

    pelo canho do talo. Podem ser usadas as folhas de helicnia na vertical, recebendo um

    talho longitudinal no canho por onde so fixadas s ripas. Colocam-se, em seguida,

    sobre estas primeiras folhas, outras de palmeira, formando uma segunda camada.

    encontrada esta modalidade entre os Tapirap.Ocorre ainda o revestimento efetuado com sap, o qual preso estrutura

    atravs do enlaamento de molhos dessa gramnea. Encontramos este tipo no alto Xingu.

    Falaremos agora de um tipo de amarrao que pode ser observada na cobertura das

    aldeias-casas (shabono) dos Yanomami.

    O emprego de cips esticados e amarados aos caibros a intervalos de 20 cm

    desde a base no beiral (sobre o frechal), at o topo, no balano que se projeta alm da

    tera torna leve a armao da cobertura da shabono, como leve tambm seurevestimento em pnulas de folhas de palmeira.

    A) Revestimento em folhas de palmeira. A1) Fixao sob presso (tipo Karaj). A2) Enlace

    com cips (tipo Xavante). A3) Enlace com cips (tipo Tiriy) B) Revestimento em folha de palmeira e de

    Heliconia superposta (tipo Tapirap).

    A primeira fiada do revestimento feita com cada pnula dobrada sobre o cip.

    Para isso, necessrio desfiar a pnula, desde a base ate o meio, onde dobrada pela

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    nervura, pelo cip, e fica a este amarrada pelo limbo desfiado. Quando a fiada est

    completa, um outro cip esticado e amarrado aos caibros. A as pnulas so presas da

    seguinte maneira: cada qual inserida no revestimento da primeira fiada, ficando presa a

    pela base na nervura; em seguida, dobrada sobre o cip, e a presa segundo o mesmo

    processo utilizado para a fiada anterior. A ponta de cada pnula sobrepe-se anterior. Otranado das pnulas, dispostas a cada 25 cm de distancia uma das outras, resulta em

    uma cobertura inteiramente impermevel e compacta.

    A) Tipos de amarrao. Revestimento em sap. Enlace com cips (tipo alto Xingu). B) Tipos de

    amarrao. Enlace com limbo da pnula (tipo Yanomami).

    3.3. Tecnologias indgenas e as adaptaes ao clima

    Este tpico trata da adaptao das tecnologias indgenas, s realidades climticas

    impostas pelo vasto territrio brasileiro, caracterizando tribos que esto inseridos

    em algumas zonas climticas, e citando transformaes e adequaes tecnolgicas

    a esses condicionantes.

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    3.3.1. Af Clima Tropical mido

    Tiriy:

    Na regio quente e mida da parte setentrional da Amaznia, as edificaesapresentam estruturas totalmente abertas, como a maloca dos Tiriye a Shabonodos

    Yanomami, garantindo a circulao do ar e a eliminao da umidade. A Maloca tradicional

    comunal fechada, a planta circular ou elptica com cobertura cnica, comum a grande

    parte do planalto Brasileiro e da Amaznia, em geral, assume, nas regies mais quentes e

    midas, uma maior flexibilidade nos fechamentos laterais, variando de um fechamento

    total, com a existncia de unicamente duas aberturas para comunicao, a uma total

    ausncia de paredes. Os Tiriyapresentam grande variedade de tipos de casa, o que explicado como resultado do contato destes ndios com outras tribos amaznicas.

    3.3.2. Transio de Af a AM (Equatorial a Clima de Mono)

    Quando se analisa um corte transversal da Amrica do Sul, na altura do

    equador, do Atlntico ao Pacfico, onde a variao altimtrica da cordilheira permite a

    observao da progressiva adaptao a um clima mais rgido de altitude, e no qual a

    abertura e o fechamento das edificaes em funo das variveis climticas mostra uma

    abertura total na regio atlntica, como entre os Wayana, um fechamento (e uma troca de

    materiais de construo) na regio andina e uma nova abertura da edificao na vertente

    pacfica.

    Os Cofanes, no Alto do Amazonas, ainda na regio quente mida, utilizam

    estruturas totalmente abertas e ventiladas para defender-se da umidade.

    3.3.3. Transio de Af a Aw (Equatorial a Tropical com estao seca de inverno)

    Aldeias Xinguanas:

    Passando parte meridional da Amaznia, as construes registram um

    progressivo fechamento, como a maloca do Xingu, mas as edificaes so amplas e

    possuem um fechamento relativamente leve, para permitir a criao de um colcho de ar

    na parte alta, que suaviza a temperatura ambiente durante o perodo de maior calor.

    Finalmente, indo em direo sul, no planalto central, as construes assumem estruturas

    mais fechadas, e principalmente mais compactas, para uma proteo mais rigorosa do

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    frio, como se registra na regio central do Pantanal e do Chaco.

    A aldeia xinguana tradicional esta compreendida em um grande crculo,

    variando entre 80 e 200m de dimetro, segundo o tamanho da populao que abriga.

    Atualmente, cada aldeia corresponde a uma nica tribo. Este crculo formado por casas

    dispostas na periferia de uma praa central, onde fica situado o cemitrio dos adultos. Adistncia entre as casas numa aldeia do alto Xingu de cerca de 5 ou 20 metros.

    3.3.4. Transio de Af a Cf (Equatorial a Clima Temperado mido)

    A poucos quilmetros de distncia os Worani, em clima mais frio, da montanha j utilizam edificaes totalmente fechadas, para proteger-se do frio da noite. Durante o

    dia a vida se desenvolve ao ar livre. A comear do sul do Estado de So Paulo, Paran,

    Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, a proteo em relao ao frio chega a assumir a

    forma de habitaes subterrneas. Curiosamente trata-se apenas de edificaes

    sazonais, de populao ainda em uma fase incipiente da agricultura.

    Guerreiro Kamayur colocando a cobertura vegetal na oca

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    4. INFLUNCIAS DA ARQUITETURA INDGENA HOJE

    Depois de uma convivncia pacifica, aps os colonizadores aprenderem a viver

    nos trpicos e os lusos se apropriarem dos conhecimentos indgenas, os ndios passarama ser vistos apenas como fora de trabalho. Muitas revoltas se estabeleceram e as

    populaes indgenas foram sendo exterminadas e substitudas por negros.

    Este processo foi caracterstico do nordeste, durante o perodo do ciclo do

    acar. No extremo sul (SP e PR), a opo foi a continua escravizao indgena, mas

    dependendo da situao econmica e das facilidades da aquisio de escravos africanos,

    as negras passaram a substituir as concubinas nativas.

    Alguns valores do mundo indgena foram plenamente aceitos. Entre eles osmais evidentes foram: o cultivo dos frutos da terra e o consumo desses alimentos, os

    banhos dirios e a rede de dormir. Outros valores foram desdenhados como a harmnica

    convivncia com a natureza e sua preservao.

    O europeu tambm passou a incorporar a terminologia indgena em seu

    vocabulrio, tanto como elementos encontrados na terra, como termos indgenas na

    arquitetura: biboca (casa pequena), caiara (palhoa), capuaba (casa da roa), cop

    (cabana de palha), copiar (varanda), favela (casa miservel cujo significado indgena

    urtiga), jirau (armao para guardar apetrechos, cama de varas), maloca(o mesmo que

    favela; e,em tupi quer dizer casa grande), oca (cabana ; em tupi significa casa), poperi

    (abrigo provisrio), taba (aldeia indgena), tapiri (choa), tijup ou tijupara (cabana de

    ndio), urupema (peneira; por extenso, ramado semelhante usado na vedao de portas,

    janelas e de forro). Quando os termos no so pejorativos, trata-se de construes que o

    colonizador adotou da cultura indgena: carij, barbaqu: (instalaes para produo de

    erva-mate); ou so de origem das culturas inca ou asteca (cancha, chcara, galpo,

    tambo).

    Uma das caractersticas das casas indgenas sua construo integral com

    materiais vegetais. Isso tem levado alguns autores a identificar qualquer tipo de

    construo vegetal como sendo de influncia indgena. necessrio ter muito cuidado

    para estas qualificaes. Em primeiro lugar preciso atentar para a etnia dos ocupantes,

    nesse sentido, identificou-se como de influncia nativa a construo mais simples que

    encontramos at o presente e que servia de local de dormir para lenhadores que estavam

    abatendo as raras manchas florestais na periferia de Braslia em construo, no incio da

    dcada de 60. Todas as demais atividades eram realizadas a cu aberto, uma vez que o

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    perodo era das secas e no necessitavam de cobertura. O clima extremamente generoso

    do planalto favorecia a despreocupao com qualquer tipo de vedao.

    Algumas influncias indgenas podem ser reconhecidas nos barraces dos

    seringalistas amaznicos e, de forma mais expressivas, na casa dos seringueiros

    amaznicos a comear pelo nome que do a suas construes (tapiripara suas casas epoperipara os abrigos onde feita a defumao do ltex). O local onde o seringueiro vive

    e trabalha chamado de colocao. A h uma casa (eventualmente, duas), um

    defumador e uma casa de farinha eventualmente associada com um depsito. As

    construes so feitas, na maior parte das vezes, com a madeira da palmeira conhecida

    por pixaiba (por vezes a barriguda ou a pixaiubinha) e fazem-se vincos, de ponta a

    ponta, com o machado, que batido at o tronco rache. Depois se tira o miolo com um

    faco. Este batido para formar o pano que ser utilizado na cobertura do entrepiso.Enquanto isso, o tronco continuar a ser fendido em ripas de comprimento conveniente e

    com uma largura de cerca de 10 cm. Esses sarrafos so amarrados entre si ou pregados,

    enfixados na expresso local. Depois de concluda a construo, coloca-se o pano sobre

    o entrepiso devidamente pregado, que serve para atenuar as irregularidades dos sarrafos

    e os tornam mais suaves ao contato.

    A cobertura feita de palha seca. Depois de cortada, ela disposta no solo

    para secar de modo como ser colocada sobre a armao da cobertura. Dependendo do

    tipo da palha, essa secagem pode durar vrios dias at estralar. O numero de camadas

    a serem colocadas sobre a armao varia com o clima do local. A espessura pode varias

    entre 10 e 20 centmetros. Isso permite que somente as camadas externas se

    encharquem com a chuva, enquanto as internas permanecem totalmente secas, formando

    em seus interstcios um colcho de ar que funciona como isolante trmico.

    Paulatinamente, as folhas externas vo apodrecendo at o consumo total da cobertura,

    que poder durar uma dezena de anos.

    As casas do centro, isto , interior da floresta, dispem de um amplo

    avarandado, que se liga por um corredor cozinha. Por esta se tem acesso a um quarto

    situado entre os dois compartimentos. Esse quarto serve de dormitrio e s tem uma

    abertura, que a porta que o comunica cozinha. Dorme-se em redes sobrepostas umas

    s outras. Toda a construo esta apoiada em palafitas de cerca de 60 cm de altura.

    O uso de uma varanda totalmente aberta para permitira ampla ventilao

    durante o descanso do calor do meio-dia. O emprego da rede e a construo em palafita

    no s para as enchentes dos rios e igaraps, mas, como prevenes das constantes

    chuvas tropicais, que deixam o terreno permanentemente encharcado, denotam que a

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    convivncia com os silvcolas foi proveitosa.

    Mas no apenas na Amaznia que pode ser percebida a influncia indgena

    na arquitetura popular. Ela mais ou menos presente na exata proporo da mestiagem

    com o indgena. Um bom exemplo pode ser encontrado no municpio de Barra, na

    margem ocidental do rio So Francisco, onde constituda por trs traves paralelas, emque a central mais elevada que as laterais. Os suportes verticais terminam em forma de

    forquilha, onde so encaixadas peas horizontais (cumeeira e frechais), so amarrados os

    caibros que tambm so de buriti fendido. Neles so amarradas as folhas do buriti de

    baixo para cima, utilizando o prprio pecolo (a nervura) da folha como ripa. Toma-se

    cuidado para que os limbos da folha fiquem para o mesmo lado. As paredes so feitas

    com troncos de buriti ou de carnaba fendidos o meio, que so fincados no cho,

    maneira do pau-a-pique. As frestas entre os troncos so vedadas com folhas de buriti eamarradas com cordas de caro, tranadas com fibras do corao do buriti. A diviso

    interna da casa banto meridional, idntica casa aoriana. O cho de terra batida e o jeito

    de cozinhar com a panela apoiada sobre trs pedras; o modo de fazer o traado da fibra

    de caro e o traado das esteiras que servem para dormir sobre o cho tambm denotam

    a influencia indgena, do mesmo modo que a forma de amarras as folhas nas frestas das

    paredes. Assim tambm parece ser o ritual das refeies. Embora as casas tenham

    banquinhos de madeira, os comensais se sentam em circulo ao redor da panela de

    comida no cho, e servem para o preparo da comida, mas no para as refeies. Por

    outro lado, a presena de apetrechos como a moringa ou fogo de barro, sustentados

    sobre duas traves de madeira denota influencias africanas.

    Em todas as regies de desmatamento em que a via de transporte fluvial,

    existem as balsas, formadas pelos troncos. Estes so levados aos rios, colocados uns ao

    lado dos outros e amarrados entre si por meio de cordas, que passam sobre galhos

    transversais que garantem a solidez da embarcao. Uma das formas permanentes

    dessas balsas era a de buriti dos rios So Francisco e Parnaba. Hoje possivelmente j

    desapareceram, mas em meados do sculo passado ainda eram relativamente

    freqentes. Essas embarcaes eram constitudas de um colcho flutuante de pecolos

    de buriti, que eram amarrados com cordas coro em varam transversais superiores que

    mantinham a integridade da estrutura. Para a firmeza da embarcao, essas varas eram

    amarradas a outras 3 longitudinais, montadas no meio e nas laterais do colcho. O

    tamanho dessas balsas variava conforme o uso a que se destinavam e as posses do

    proprietrio. As menores tinham 2m de comprimento por 4 de largura e as maiores

    podiam ter em torno de 5m de largura por pouco mais de 10 de comprimento. O colcho

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    flutuador era montado em terra e, de tempos em tempos, tinha de voltar a ela para secar

    quando ficava por demais encharcado.

    Normalmente, essas barcaas se destinavam ao transporte de mercadorias

    entre vilas e cidades ribeirinhas. Por serem de boa resistncia e os pecolos terem uma

    resina que servia de isolante gua, as barcaas maiores podiam carregar variastoneladas de carga ao mesmo tempo em que servia de moradia para as famlias dos

    barqueiros.

    Se a influncia da casa indgena no mais freqente e se o indgena, desde longo

    tempo, aderiu tcnicas das construes de paredes de madeira e de taipa conforme o

    demonstravam figuras dos viajantes chegados aps a Abertura dos Portos -, isso no

    quer dizer que os indgenas no tenham deixado marcas indelveis. O caso mais tpico

    na formao das vilas.Em regra, os jesutas procuravam seus aldeamentos para iniciar a catequese.

    Logo que esta comeava a apresentar resultado, a primeira coisa que faziam era construir

    um cruzeiro no meio da ocara (terreno). O segundo passo era construir uma capela na

    frente do cruzeiro ou em substituio a alguma casa. Progressivamente, a igreja acabava

    por ocupar sozinha um dos lados da ocara. A colocao de um cruzeiro em meio praa

    pode ser documentada nos primeiros mapas portugueses da costa brasileira, e sua

    permanncia pode ser constatada em levantamentos de aldeias das fases seguintes.

    Diante da progressiva vinda de colonizadores, essas aldeias foram se

    expandindo com a abertura de novas ruas ao longo das trilhas abertas pelos indgenas. A

    conseqncia dessa origem foi a implantao constante das igrejas num dos lados de

    uma praa, cuja perpetuao explicvel pela conjugao dessa forma de conurbao

    com a tradio portuguesa, que procurava construir seus templos em largos e nas

    praas da s. A manuteno do binmio praa-igreja teve tamanho vigor em decorrncia

    da interao das duas culturas. Quando, porm, os indgenas de contato no adotavam

    uma praa como centro da aldeia, a formao das vilas tomou outras formas.

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    Exemplos de adaptaes e transformaes nas habitaes indgenas

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    Referncias Bibliogrficas

    Habitaesindgenas,CaiubyHabitaesindgenas,CaiubyHabitaesindgenas,CaiubyHabitaesindgenas,CaiubyNovaes,Sylvia(org),Novaes,Sylvia(org),Novaes,Sylvia(org),Novaes,Sylvia(org),----Nobel,Ed.daUniversidadedeSoNobel,Ed.daUniversidadedeSoNobel,Ed.daUniversidadedeSoNobel,Ed.daUniversidadedeSoPaulo,1983Paulo,1983Paulo,1983Paulo,1983....

    SSSSumaumaumaumaetnolgicaetnolgicaetnolgicaetnolgicabrasileibrasileibrasileibrasileirararara----2222----tecnologiaindgenatecnologiaindgenatecnologiaindgenatecnologiaindgena2edio2edio2edio2edio----Coordenao:RCoordenao:RCoordenao:RCoordenao:RibeiroibeiroibeiroibeiroG.,G.,G.,G.,BertaBertaBertaBerta----EEEEditoravozes,1987ditoravozes,1987ditoravozes,1987ditoravozes,1987....

    Weimer,GUNTERWeimer,GUNTERWeimer,GUNTERWeimer,GUNTER----ArqArqArqArquiteturapopularbrasileira.uiteturapopularbrasileira.uiteturapopularbrasileira.uiteturapopularbrasileira.Ed.Ed.Ed.Ed.MarMarMarMartinsFontestinsFontestinsFontestinsFontes----2005200520052005

    O Xingu dos Vilas Boas Organizao e edio: Cristina Muller, Luiz Octvio Lima eMoses Rabinovici Ed. Metalivros - 2002

    http://www.mrdavila-architecture.com/Projekte/indios/comunidades%20ind%EDgenas_port.html