Arquitetura Interdisciplinar Alegorias de Carnaval

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. ⁄ .⁄ . , º - 213 Experimento interdisciplinar no ensino de arquitetura: percepção, interpretação e o projeto de uma (polêmica) alegoria * Resumo A importância de experimentar a interdisciplinaridade no ensino para formação de arquitetos- urbanistas é o objeto de análise deste artigo. O tema é instigante na medida em que envolve a procura do “novo” como fonte de investigação e pode surpreender as expectativas nos resultados obtidos. Estabelecer “conexões” entre os novos conhecimentos que estamos transmitindo e a “realidade” de experiências que o aluno, ingressante na universidade, traz consigo, tem mostrado eficácia em resolver a dificuldade inicial de abstração para o aprendizado de conceitos mais complexos, como o de “espaço” ou o de “vazio”. A experiência do Carnaval inspirou um caminho para responder à questão: por onde e como começar? Palavras-chave Arquitetura e urbanismo. Ensino e aprendizado interdisciplinar. Alegoria do Carnaval Title An Interdisciplinary Experiment in the Teaching of Architecture: Perception, Interpretation, and the Project of a (Polemic) Allegory Abstract The importance of experimenting interdisciplinarity in the formation of architects-urbanists is the subject of this article. The theme is challenging in the sense that it involves the search for the ‘new’ as a source of investigation, and it can surprise the expectations concerning the obtained results. The act of setting up ‘connections’ between the new knowledge we are transmitting and the ‘reality’ of the experiences the students entering the university brings with him has proved to be efficient in the solving of an initial difficulty in the learning of more complex concepts, such as ‘space’ or ‘emptiness’. The Carnival experience inspired an answer to the question: Where and how to start? Keywords Architecture and Urbanism, teaching and interdisciplinary learning, Carnival allegory Data de recebimento: 13/06/2008. Data de aceitação: 27/06/2008. * Doutor pela FAU-USP, professor-pesquisador no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Arquitetura e Urbanismo (mestrado) da USJT. Linha de pesquisa: Percepção e Representação do Espaço Habitado. E-mail: [email protected]. . O conteúdo deste artigo apresenta um relato e uma proposta de discussão sobre o que poderia caracterizar um experimento interdisciplinar de ensino, ocorrido em 2006, mais precisamente em uma das disciplinas que compõem o currículo do curso de Arquitetura e Urbanismo da USJT: Pro- jeto de Arquitetura 1 (Proja-1), desenvolvido para alunos recém ingressados naquele ano. O universo desconhecido do “outro que che- ga” é sempre um mistério a ser desvendado no relacionamento de um cotidiano que desafia o professor, porque a questão a ser resolvida não está na existência, a priori, de uma ementa da dis- ciplina que expressa um desejo e uma intenção teórica de obtenção de resultados; ou de um ro- teiro programado de conteúdos que vão sendo ministrados na tentativa de construir conheci- mentos, mas sim em como estes conhecimentos vão se somar ou se situar ao lado de conteúdos e conhecimentos de outras disciplinas que estarão sendo ministradas horizontal e simultaneamente. O aprofundamento do conteúdo ministrado (conceitos teóricos e sua aplicação numa prática) vai sendo construído no fazer das aulas com dife- rentes graus de complexidade variando em fun- ção do tempo disponível, sempre muito restrito para todos. A estrutura desses conteúdos deve perpassar os domínios das ciências exatas, sociais e humanas através de suas três grandes vertentes: a ciência, a técnica e a arte. E uma visão mais sim- plista da questão poderia definir esta formação como de caráter multidisciplinar com algum grau de complexidade na elaboração de um currículo que permita abranger as três vertentes inicial- mente apresentadas.

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Alegorias de carnaval

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Experimento interdisciplinar no ensino de arquitetura: percepção, interpretação e o

projeto de uma (polêmica) alegoria *

Resumo ● A importância de experimentar a interdisciplinaridade no ensino para formação de arquitetos-

urbanistas é o objeto de análise deste artigo. O tema é instigante na medida em que envolve a procura do

“novo” como fonte de investigação e pode surpreender as expectativas nos resultados obtidos. Estabelecer

“conexões” entre os novos conhecimentos que estamos transmitindo e a “realidade” de experiências que

o aluno, ingressante na universidade, traz consigo, tem mostrado efi cácia em resolver a difi culdade inicial

de abstração para o aprendizado de conceitos mais complexos, como o de “espaço” ou o de “vazio”. A

experiência do Carnaval inspirou um caminho para responder à questão: por onde e como começar?

Palavras-chave ● Arquitetura e urbanismo. Ensino e aprendizado interdisciplinar. Alegoria do Carnaval

Title ● An Interdisciplinary Experiment in the Teaching of Architecture: Perception, Interpretation, and the

Project of a (Polemic) Allegory

Abstract ● The importance of experimenting interdisciplinarity in the formation of architects-urbanists

is the subject of this article. The theme is challenging in the sense that it involves the search for the ‘new’

as a source of investigation, and it can surprise the expectations concerning the obtained results. The

act of setting up ‘connections’ between the new knowledge we are transmitting and the ‘reality’ of the

experiences the students entering the university brings with him has proved to be effi cient in the solving

of an initial diffi culty in the learning of more complex concepts, such as ‘space’ or ‘emptiness’. The

Carnival experience inspired an answer to the question: Where and how to start?

Keywords ● Architecture and Urbanism, teaching and interdisciplinary learning, Carnival allegory

Data de recebimento: 13/06/2008.Data de aceitação: 27/06/2008.* Doutor pela FAU-USP, professor-pesquisador no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Arquitetura e Urbanismo (mestrado) da USJT. Linha de pesquisa: Percepção e Representação do Espaço Habitado. E-mail: [email protected].

.

O conteúdo deste artigo apresenta um relato e

uma proposta de discussão sobre o que poderia

caracterizar um experimento interdisciplinar de

ensino, ocorrido em 2006, mais precisamente em

uma das disciplinas que compõem o currículo do

curso de Arquitetura e Urbanismo da USJT: Pro-

jeto de Arquitetura 1 (Proja-1), desenvolvido para

alunos recém ingressados naquele ano.

O universo desconhecido do “outro que che-

ga” é sempre um mistério a ser desvendado no

relacionamento de um cotidiano que desafi a o

professor, porque a questão a ser resolvida não

está na existência, a priori, de uma ementa da dis-

ciplina que expressa um desejo e uma intenção

teórica de obtenção de resultados; ou de um ro-

teiro programado de conteúdos que vão sendo

ministrados na tentativa de construir conheci-

mentos, mas sim em como estes conhecimentos

vão se somar ou se situar ao lado de conteúdos e

conhecimentos de outras disciplinas que estarão

sendo ministradas horizontal e simultaneamente.

O aprofundamento do conteúdo ministrado

(conceitos teóricos e sua aplicação numa prática)

vai sendo construído no fazer das aulas com dife-

rentes graus de complexidade variando em fun-

ção do tempo disponível, sempre muito restrito

para todos. A estrutura desses conteúdos deve

perpassar os domínios das ciências exatas, sociais

e humanas através de suas três grandes vertentes:

a ciência, a técnica e a arte. E uma visão mais sim-

plista da questão poderia defi nir esta formação

como de caráter multidisciplinar com algum grau

de complexidade na elaboração de um currículo

que permita abranger as três vertentes inicial-

mente apresentadas.

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Multidisciplinaridade, entretanto, sem intera-

ção – característica comum de uma grande parte

dos currículos aplicados em cursos de Arquitetu-

ra – signifi ca um numeroso elenco de disciplinas

que não cumpre seu objetivo pelo fato de essas

matérias estruturarem-se em ementas teóricas es-

tanques. Referimo-nos a conteúdos abrangente-

mente vagos na teoria de apresentação da ementa

e que, na prática, criam autonomia em sua aplica-

ção e apresentam-se como barreira às necessárias

conexões que conduziriam às salutares sínteses

por parte dos alunos.

A tendência para esse tipo de procedimento é

a construção, pelos alunos, de um conhecimento

fragmentado, no qual se torna difícil estabelecer

interações através de conexões que poderiam gerar

produção de conhecimento novo.

Essa parece ser a prática corrente que carac-

teriza a maioria dos cursos superiores de uma

forma geral e os de Arquitetura e Urbanismo não

são exceção. Um refl exo desta estrutura fi ca extre-

mamente claro quando os alunos atingem o último

ano e encontram-se diante da grande síntese inter-

disciplinar representada pelo Trabalho Final de

Graduação (TFG) para Arquitetura1 e Trabalho de

Conclusão de Curso (TCC) para os demais cursos.

A síntese interdisciplinar2 proposta como es-

sência do desenvolvimento do TFG, não ocorre

como um processo simples e, para amadurecer

como método, deve estar presente para os alunos

desde o 1º ano, e em diferentes graus de comple-

xidade no transcorrer do curso como um todo. A

visão interdisciplinar tem seu início crítico exata-

mente no momento em que novas turmas são re-

cebidas no curso, submetidas a um vestibular não

mais seletivo e que pressupõe, de antemão, um

universo muito heterogêneo no perfi l dos alunos

que chegam à universidade. A principal caracte-

rística desse momento é o ingresso de grande nú-

mero de alunos muito jovens, recém-saídos do

Ensino Médio (grande parte sem ter passado por

algum curso preparatório para vestibulares)3; de-

monstram alto grau de imaturidade para enfren-

tamento de uma postura responsável e consciente

do ambiente universitário.

Uma enquete inicial realizada como forma de

aproximação e de conhecimento desse universo

tem mostrado sistematicamente que a maioria

desses alunos lê pouco, e este aspecto fi ca muito

presente em sua escrita, que se confi gura mal es-

truturada e mostra, por sua vez, a ausência de re-

pertório não somente de linguagem, mas de

vivências do contexto que habitam, seja cultural

ou da arquitetura da cidade (neste caso, São Pau-

lo); a enquete mostrou ainda, neste início de ano

(2006), que aproximadamente 37% dos alunos

fi zeram curso preparatório para vestibular! Um

dado importante, considerando que em anos ante-

riores este percentual era irrisório. Esta informa-

ção instaurou um alerta quanto a um diferencial

que deveria ser considerado no processo de ensino

e confi rmou a constatação de que não há turmas

iguais a cada ano e que uma ementa, um progra-

ma, um método ou, ainda, tipologias de exercícios

de projeto devem conter fl exibilidade de mudanças,

atualização e ajustes às realidades de cada ano letivo.

Outra característica detectada com frequência

é que, além de diferentes graus de conhecimento

e de experiências de vida, os alunos apresentam,

invariavelmente, problemas signifi cativos com a

representação e a expressão de conteúdos de apren-

dizado pelas diferentes linguagens da escrita e do

desenho. Estes problemas referem-se com frequên-

cia a conceitos elementares de geometria, desenho,

matemática simples, estrutura da nossa língua,

entre outros, que já deveriam estar resolvidos pelo

Ensino Médio. Mas as grandes difi culdades concen-

tram-se em compreender e trabalhar com concei-

tos que exijam um grau mais aprofundado de

abstração, como os de espaço e de vazio, essências

de uma das defi nições do que seja arquitetura e que,

assimiladas com alguma profundidade, propor-

cionam a liberdade de projetar para atingir o

grande objetivo do aprendizado e da formação de

um arquiteto-urbanista: materializar fi sicamente

os espaços idealizados na mente, em seguida, no

papel, pelo desenho e fi nalmente materializados

quando fi sicamente construídos! Uma vez cons-

truídos, que estes espaços possam ser habitados

não somente como um confortável abrigo utilitá-

rio (obrigatório), mas que sejam percebidos por

meio da emoção captada com a sensação produ-

zida pela dimensão simbólica sempre recorrente,

porém da qual nem sempre o arquiteto que os

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projetou está consciente. Esta dimensão, também

presença obrigatória, constitui o grande desafi o

de todos os professores envolvidos na construção

de conteúdos do currículo como um todo, por-

que traz em seu bojo a carga de relações intersub-

jetivas inerentes a qualquer atividade humana de

interação com o espaço habitado. Em resumo, é a

dimensão simbólica de um espaço que sintetiza a

essência principal do que seja projetar ambientes

e seu signifi cado para a arquitetura.

.

A partir desse panorama, a questão que se impõe

é por onde começar? Começar pelo começo, diria

o senso comum, mas como fazê-lo?

Essa foi a questão que se apresentou para os

professores que ministraram a disciplina Projeto de

Arquitetura 1, em 20064, que por natureza procura

discutir e ensaiar conceitos de percepção, concep-

ção e representação do espaço habitado. Inicial-

mente a ênfase na apresentação destes conceitos

estrutura-se em sínteses de conhecimentos múlti-

plos extraídos do imaginário acumulado pelas

experiências do aluno. A imaginação e a criativi-

dade são exercitadas com o método de observação

de fenômenos da realidade que o cerca, visando o

aprimoramento da percepção por meio da cons-

ciência do uso dos sentidos e da construção de signi-

fi cados pelo desenvolvimento da visão espacial tão

necessária à formação do arquiteto. Visão espa-

cial que se consolida com experimentos sugeridos

pelas formas oriundas da geometria, vislumbra-

das por sistemas de representação por meio do

desenho, de modelos reduzidos (maquetes), da

fotografi a, ofi cinas de expressão e pela pesquisa

para elaboração de textos. Estes instrumentos

consolidam conhecimentos quando se materiali-

zam pela aplicação de processos construtivos e

pelo uso de materiais na construção de espaços

que permitem sua utilização em escala real como

ocorre, num segundo estágio, na experiência de

produção de um espaço habitacional em forma

de mock-up5.

Retornando à questão inicialmente formulada,

a do “por onde e como começar”, surgiu para os pro-

fessores da disciplina a necessidade de investigar

melhor o universo dos alunos recém-chegados

quanto aos conhecimentos que já possuíam e que

poderiam indicar caminhos mais adequados. Ini-

ciar sem conhecer estes dados poderia provocar

bloqueios inibidores por complexidade de conteú-

dos ministrados, ou, noutro extremo, os conteúdos

elementares demais poderiam ser desmotivadores.

Cabe lembrar que estamos discutindo aspectos

que requerem uma visão mais atenta para a escala

de ensino que se apresenta como “ensino para um

grande número de alunos, ou seja, ensino de massa”.

O caminho inicial sugeriu investigar quais habili-

dades e competências já estariam presentes nos

grupos e quais ainda requeriam uma revisão de

conceitos que “teoricamente” já deveriam estar

incorporados no Ensino Médio, mas que a prática

mostrava que não estavam!

Há uma prática de recepção do aluno-calouro

que já se vem consolidando, ano após ano, no

curso de Arquitetura e que favorece esta investi-

gação inicial: na primeira semana de início das

aulas alunos veteranos e alguns professores orga-

nizam o evento de recepção chamado de Jornadas

Culturais, em substituição ao antigo e polêmico

trote. Trata-se de um acontecimento inesperado,

que cria impacto pela surpresa que causa nos alu-

nos ao serem convidados a criar material para uso

em experimentos espontâneos em espaços públicos

durante as jornadas de visitas a lugares da cidade.

Acompanhados por veteranos e alguns professo-

res, os novos alunos são estimulados a observar,

perceber, capturar pelo desenho e pela fotografi a a

arquitetura e a vida da cidade de São Paulo6, e, ao

fi nal das jornadas, eles avaliam e discutem os re-

sultados em sala de aula.

. ,

Inicia-se a discussão de conceitos de percepção de

espaço, e ensaia-se o conhecimento do fi ltro da rea-

lidade pelos nossos seis sentidos (visão, audição,

tato, olfato, paladar e equilíbrio cinestésico)7. A

consciência da quarta dimensão, o tempo, procura

desenvolver e aprofundar a visão espacial necessária

à formação de experiência projetiva do arquiteto.

Neste caso, prepara repertório a ser trabalhado

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216 ● Ensino de Arquitetura

mais à frente, no projeto de maior alcance, envol-

vendo a compreensão de um conceito mais com-

plexo: o de partido arquitetônico8, que será suporte

para entendimento do exercício mais denso: a

concepção de um espaço habitacional.

Nos anos anteriores, a disciplina desenvolvia

pequenos exercícios básicos de preparação para esse

tema maior como tentativa de suprir necessidades

de repertório imediato de linguagem e represen-

tação pelo desenho.

Os temas nesse início têm sempre o caráter ex-

perimental e conduzem os alunos a vivenciar sen-

sações ligadas a questões do dia-a-dia, aprimorando

um “novo olhar”, mais atento e curioso, que passa a

ser incorporado na produção e expressão de lin-

guagens de projeto, trabalhado pelos professores

nas avaliações coletivas com a classe ao término

de cada exercício.

Nessa etapa inicial, estabelecer “conexões” entre

os novos conhecimentos que estamos transmitin-

do e a “realidade” de experiências que o aluno traz,

tem mostrado efi cácia em resolver a difi culdade

inicial de abstração para aprendizados mais com-

plexos. Naquele ano (2006), após a recepção das

Jornadas Culturais, houve uma interrupção das

aulas no período letivo para a comemoração do

Carnaval. Nossa procura de conexões com a reali-

dade dos alunos era fundamental e conduziu-nos

ao assunto (Carnaval), ainda muito presente no

reinício das aulas como um fato de realidade próxi-

ma de todos, surgindo, assim, o tema da alegoria.

.

O Carnaval, apesar de alterado em seu espírito

original, tornou-se um evento fortemente incor-

porado à cultura nacional e assumiu, ao longo de

sua história, características de um fenômeno social

ímpar! No caso brasileiro, por agregar pessoas de

diferentes níveis sociais, diferentes níveis de inte-

resse e objetivos pessoais, espera-se, em princípio,

a existência de confl itos, entretanto, estes fatores

são impressionantemente neutralizados pela con-

tribuição voluntária e a dedicação de cada parti-

cipante. Imbuídos de uma sinergia total, que se

desenvolve ao longo de fases intensas, com dife-

rentes tempos de duração, na quarta dimensão,

idealização, projeto, planejamento, concepção, pro-

dução, ensaio, seus trabalhos devem estar conclu-

ídos em 364 dias, para, fi nalmente, ser apresentado

como produto de uma experiência que simboliza

um sonho coletivo, que se realiza, ou não, durante

apenas 60 minutos!

Estudado por sociólogos, antropólogos, psicó-

logos, cineastas, escritores, fi lósofos e por que não?,

por arquitetos-urbanistas, o fenômeno “Carnaval”

apresenta-se como exemplar amostra de uma su-

perprodução em escala interdisciplinar, que, exce-

tuando o viés do risco de fracasso (como em

qualquer empreendimento humano), é sempre um

sucesso, pelos resultados que obtém como produto,

quase impossível, de um esforço coletivo perfeito

de motivação – de, no mínimo, 3.000 componentes

–, aliado à junção de imaginação, criatividade, pla-

nejamento, organização, administração, projeto e

execução de “sonhos”, para serem experimentados

uma única vez, durante 60 minutos, que é o tempo

regulamentar de percurso para apresentação. Qua-

se uma utopia, sempre possível a cada 365 dias,

pode ser considerado um exemplo de experiência

completa que está além do caráter interdisciplinar

do primeiro momento, podendo ser interpretado

como um experimento de síntese transdisciplinar!

.

O fenômeno do Carnaval constitui um projeto

perfeito que pode ser compreendido e explicado

por meio da presença de, pelo menos, seis dimensões

do “pensar um projeto”: as três primeiras dimensões

da construção geométrica do espaço físico pelos

sistemas construtivos e materiais, que oferecem

suporte para que a quarta dimensão, o tempo, atue

com possibilidades plenas de liberdade para via-

bilizar a quinta dimensão, a cultura, que inspira a

pesquisa e a produção do tema-enredo construtor

da alegoria, materializado em infi nitas imagens e

sons para, por fi m, satisfazer a sexta dimensão, que

é o desejo de realização psicológica tanto social

quanto pessoal de cada indivíduo presente na expe-

riência. Este indivíduo presente constitui um cole-

tivo social que não se resume ao fi gurante que

participa do desfi le, nem à platéia presente que

assiste a tudo, nem ao público que acompanha pela

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televisão, mas a um conjunto de participantes que

pode atingir uma escala planetária. Arriscaremos

defi ni-lo como uma experiência vivenciada, trans-

disciplinarmente, de felicidade coletiva!

Qual seria uma forma de aplicar a análise desse

modelo ao ensino de projeto em arquitetura?

O diferencial apresentado pelas turmas de es-

tudantes estimulou a proposta desse tema, aplica-

do a um exercício de “aquecimento” preparatório

para a introdução do conceito de partido a ser

adotado para idealizar um projeto. Iniciou com a

discussão do conceito de “partido de projeto” (um

conceito inicial bastante abstrato para os alunos),

porém, introdutório para a discussão do signifi -

cado de “partido arquitetônico” em arquitetura.

Compreender este conceito de projeto pressupôs

a necessidade de discutir um método para pensar

um projeto, procurando mostrar aos alunos que

“o pensar projeto” está presente em qualquer situ-

ação que exija o planejamento de uma ação que

procurará soluções criativas para qualquer que seja

o problema apresentado. O tema da “Alegoria de

Carnaval” mostrou-se, naquele momento, ideal

para ensaiar a interdisciplinaridade no entendi-

mento do signifi cado e da importância do termo

“partido de um projeto”.

Traçamos um paralelo entre partido de projeto

para a Alegoria e partido de projeto para a Arqui-

tetura ao estudar um espaço habitacional mos-

trando pontos em comum relacionados com a

concepção de espaços para ambos os propósitos.

Foram discutidos e comparados, simultanea-

mente, os signifi cados de partido e condicionantes

do partido, tanto para a alegoria quanto para o es-

paço habitacional (o programa, o lugar, o clima, o

sistema construtivo e os materiais, o signifi cado da

forma, o conteúdo simbólico e a estética, os custos,

entre os principais condicionantes).

O tema previa que o aluno utilizasse a meto-

dologia apresentada para aplicá-la na concepção

de uma “Alegoria de Carnaval” e percebesse a com-

plexidade de atividades de projeto e de diferentes

conhecimentos necessários para viabilizar uma

proposta como esta. Em termos didáticos, realizar

refl exões sobre um fato da vivência cotidiana dos

alunos auxilia-nos a “desmontar” preconceitos e

tornar consciente a necessidade de planejar e

projetar em qualquer situação que envolva o con-

ceito de espaço (abstrato para um primeiranista);

O tema proposto, “Alegoria de Carnaval”, con-

siderou:

o• signifi cado das palavras: compreendido o

signifi cado de Alegoria (defi nido em con-

junto: pelos alunos e no dicionário que faz

parte da bibliografi a básica)9, iniciou-se o

processo para idealização do tema que

orientaria a produção total; constatou-se

que a não compreensão de um conceito

que está sendo ensinado pode estar ligada

ao desconhecimento do signifi cado das pa-

lavras. A dúvida primeira de um professor

talvez devesse ser: os alunos estarão com-

preendendo o signifi cado das palavras do

vocabulário que estou utilizando?

o • atuar em equipe: outro aspecto importante

para o processo ocorre pela livre escolha de

colegas para formarem equipes de 6 alunos,

lembrando que neste momento eles eram

recém-chegados ao ambiente universitário,

quase estranhos uns aos outros e necessitan-

do integrarem-se para trabalhar em conjun-

to! Foi uma forma de consolidar o trabalho

iniciado pelo corpo de professores nas Jor-

nadas Culturais dos primeiros dias de aula,

prosseguindo com o processo de integra-

ção desejável, que em outras circunstâncias

pode demorar mais tempo para acontecer;

o• contato inicial com o tema teve como refe-

rência o cinema, considerado um ótimo

instrumento de observação da realidade.

Um trecho de fi lme extraído do desfi le de

Carnaval daquele ano foi mostrado com a

apresentação de uma escola de samba, res-

saltando aspectos de projeto que deveriam

ser considerados. Cada membro da equipe

deveria “dar asas à imaginação” e propor sua

idéia a ser apresentada, discutida e defendi-

da para a equipe decidir por uma delas10;

o• programa para conceituar o projeto deve-

ria inspirar-se nos mesmos critérios utili-

zados para julgamento das escolas que se

apresentam no Carnaval (reduzidos a apenas

alguns itens extraídos do total de 9 quesitos)11.

Foram considerados subsídios da realidade

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218 ● Ensino de Arquitetura

do projeto apenas os quesitos que tinham

relação direta com os principais conceitos

que permitiam estabelecer comparações e

referências entre a experiência de projeto

em arquitetura e uma experiência para um

projeto qualquer extraído da realidade dos

alunos, e a alegoria assume apenas um papel

circunstancial no processo.

o• espaço físico deveria considerar as carac-

terísticas do contexto do Sambódromo

(escala, dimensões, disposição da platéia

em termos de posição e visibilidade), for-

necido pelos professores;

o• número mínimo de pessoas: 3.000 (pelo

regulamento), que, divididas pelas alas,

exigiram dos alunos algum cálculo aritmé-

tico e conceitos simples de geometria para

que elas fossem distribuídas em cada ala, ou,

para que se dimensionasse a formatação dos

blocos, considerando o limite de pessoas que,

na evolução, poderiam ocupar a largura e a

extensão da avenida;

o• tempo (quarta dimensão): deveriam ter

incorporado como consciência de que tudo

deve acontecer, teoricamente, no período

de 60 min., sob o risco de a escola perder

classifi cação! (Este tópico era um condicio-

nante apenas “virtual” de projeto);

o clima• e a possibilidade de chuva (quase

sempre chove!), circunstâncias de o desfi le

ocorrer à noite ou de dia, infl uenciando na

proposta dos materiais, sistemas construti-

vos, uso das cores, a qualidade da luz, tem-

peratura ambiental, entre outros itens;

a • pesquisa da forma e do conteúdo simbólico

da Alegoria efetuada por meio de pesquisa

histórica para defi nir os temas a serem de-

senvolvidos pelas equipes (a exemplo de

Mitologia grega, Egito, As 7 maravilhas do

mundo antigo, Os 7 pecados capitais, São Tomé

das Letras, Copas do Mundo, Adoniran Bar-

bosa, O estado de Pernambuco, A cidade de

São Paulo, entre outros). Ficou patente

para os alunos a diferença de qualidade no

resultado fi nal dos projetos apresentados

por equipes que dedicaram tempo maior à

pesquisa inicial do tema antes de iniciar o

projeto (caso dos que trabalharam com o

tema de Adoniran Barbosa). A pesquisa,

em alguns casos conduziu a preocupações

com o simbolismo das cores, para dar sig-

nifi cado às formas utilizadas no projeto,

como em Os 7 Pecados Capitais, As 7 Ma-

ravilhas do Mundo Antigo; os títulos das

alegorias apontaram também para diversi-

dade de repertórios e de imaginário dos

grupos (os mistérios e o exotismo do Egito,

das 7 maravilhas do mundo antigo, do eso-

terismo, São Tomé cidade mística, ao lado

de realidades mais próximas como a políti-

ca, as Copas do Mundo, a vida da cidade de

São Paulo e a música de Adoniran Barbosa,

mulheres e a cultura japonesa);

sistemas construtivos e materiais:• nem todas,

mas várias equipes chegaram a propor ma-

teriais e alguns sistemas construtivos quan-

do projetaram o “carro alegórico”, usando

mais a intuição que o conhecimento a res-

peito, mas já conscientes do processo;

O produto fi nal, um caderno memória do proje-

to, no formato A-3, registrou todo o processo des-

de o início, para criar o hábito de documentar

todas as atividades discutidas em sala de aula: con-

ceitos, defi nições, desenvolvimento preliminar de

estudos e croquis, produção fi nal de projetos, tex-

to de pesquisas. E ele é apresentado para a avalia-

ção dos professores. Este caderno contém peças

gráfi cas de representação da idéia e do projeto e

não limitava, mas minimizava o conteúdo para:

A1. sinopse (memorial descritivo) justifi cando

a escolha do tema e das características gerais

de seu desenvolvimento e o registro de con-

teúdo de pesquisa realizada para alimentar

a idealização do tema (com o objetivo de

fazê-los utilizar a linguagem escrita, um item

problemático do repertório!) (Figura 1).

Implantação geral no espaço físico do per-2.

curso (planta ensaiando proporções em es-

cala reduzida) com indicação do conjunto

de todos os setores que compunham o

enredo em sequência lógica, pois era preci-

so contar uma história (cada carro deveria

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volumetria, conteúdo simbólico; apesar de

discutido, em aula, o uso de materiais bá-

sicos para execução de maquetes com di-

ferentes tipos de papéis, elementos de

sucatas de embalagens, os alunos, porém,

apresentaram na produção inicial um re-

pertório de representação e linguagem

representar um símbolo da narrativa do

enredo da alegoria com especifi cações

descritivas de conceitos das fantasias, das

cores que caracterizariam as respectivas

alas) (Figura 2).

Projeto3. de um dos carros alegóricos (plan-

ta, elevações em escala ampliada), utili-

Figura 1. a) Pesquisa para o tema “Mitologia grega” b) Memorial descritivo/Sinopse da proposta do tema “Política”

Figura 2. Implantação geral do conjunto na extensão do “sambódromo”, com descrição de número de carros, de blocos, de pessoas por bloco, de temas de desenvolvimento do enredo, características de uso de formas, materiais, cores e resultado simbólico da proposta.

questionável (mas inevitável neste mo-

mento) quanto à forma. Ocorreu o uso de

materiais inadequados para expressar um

trabalho de arquitetura de nível universi-

tário: papéis brilhantes, purpurinas, etc.,

fruto de modelos utilizados no Ensino

Fundamental e que no decorrer do tempo

zando a linguagem do desenho técnico,

ainda precário para a maioria dos alunos,

com preferência pela visualização da idéia

por meio de uma perspectiva, do jeito que

soubessem fazer (Figura 3.1 e Figura 3.2);

Modelo reduzido (maquete)4. do carro pro-

jetado, procurando mostrar dimensões,

Figura 3.1. Linguagem de representação: a) em planta e elevações de um carro alegórico e b) modelo reduzido (maquete) para o tema das “Copas do Mundo”

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220 ● Ensino de Arquitetura

devem ser alterados pelo contato com ou-

tras referências mais adequadas como

meios de representação e linguagem (Fi-

gura 4.1 e Figura 4.2).

.

Um tema que representou, de início, apenas uma

circunstância de ilustração para um método de

pensar o partido para um projeto foi assimilado

com tal profundidade pelos alunos, que surpreen-

deu, superando de longe as expectativas iniciais

quanto aos resultados; afi nal, era a primeira vez

que se introduzia esse assunto, tanto para os pro-

fessores quanto para os alunos, e “o risco” em rela-

ção à motivação pelo tema logo se desfez, quando

nas assessorias percebeu-se que havia grande entu-

siasmo nas atividades.

Figura 3.2. a) Estudo de volumetria resultante da forma do carro alegórico para o tema da “Política”, representado pela linguagem do desenho e b) Modelo reduzido (maquete) de materialização do estudo e “caderno memória do projeto”

Figura 4.1. a) Estudo de volumetria resultante da forma do carro alegórico para o tema de “Adoniran”, representado pela linguagem do desenho;b) Modelo reduzido (maquete) de materialização do estudo. A presença de um domínio de repertório já desenvolvido torna-se uma referência natural de aprendizado para a maioria dos alunos, que iniciam com poucas noções da linguagem do desenho e do modelo.

Mitologia Grega O estado de Pernambuco EgitoFigura 4.2. Desenhos e modelos reduzidos (maquetes) de alguns temas apresentados com problemas de inadequação de linguagens no uso de materiais (detectados para serem trabalhados com base no experimento)

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Questões de disciplina, que neste estágio de

imaturidade também se constituem um proble-

ma difícil para o professor, foram atenuados com

o desenvolvimento do trabalho.

O exercício permitiu que os alunos ensaiassem

“o imaginário” em diferentes formas de lingua-

gens de expressão e representação do espaço (a

pesquisa de conteúdo histórico em bibliotecas físicas

ou virtuais, a escrita, o desenho, a maquete, a ver-

balização na apresentação do projeto para a classe),

iniciando a compreensão do método proposto,

aplicado a uma ação concreta: intervenção em ele-

mentos de uma realidade como forma de ensaiar o

conceito de partido arquitetônico de um projeto.

Enquanto esperávamos apenas ensaiar concei-

tos de percepção, imaginação e criatividade que

pudessem ser traduzidos em desenhos de repre-

sentação e expressão gráfi ca, como forma de de-

senvolvimento de linguagens e repertório básico,

os alunos foram além. As equipes dispuseram-se

voluntariamente a projetar fi gurinos completos

para as “fantasias” ou, ainda, compuseram criati-

vos versos para representar o “samba-enredo” da

Alegoria proposta; o solicitado era apenas que

descrevessem características simbólicas, signifi ca-

dos do uso de cores, materiais ou formas. Ao fi nal

do experimento, fi cou caracterizado o quanto o

tema estimulou a imaginação, motivando a ne-

cessidade de busca de sensações mais completas

para o resultado dos projetos (Figura 5).

As experiências de aprendizado quanto ao tra-

balho em equipe também contribuíram para dis-

seminar diferentes habilidades e competências

trazidas ou desenvolvidas durante o fazer entre

todos os alunos, complementadas pelas discussões

levantadas durante as avaliações coletivas com os

professores. Observou-se por ocasião das avalia-

ções gerais com a classe o interesse, despertado

também nos alunos de outros anos, em conhecer

os resultados obtidos com o tema (apareciam

para acompanhar as avaliações coletivas!).

A experiência descrita resume uma possibilida-

de de investigação de um tema (polêmico) e do

potencial de uma classe de alunos que foi limitada

a apenas uma disciplina (Proja-1). Uma proposta

mais completa de visão interdisciplinar pode, po-

rém, ser sugerida por meio do diálogo horizontal

entre professores que compõem o elenco de disci-

plinas em cada ano do curso. O aprimoramento do

processo de integração de conhecimentos permite

que os ensaios de sínteses parciais tornem-se mais

complexos quando realizados transversalmente

como diálogos tanto horizontais quanto verticais.

A difi culdade de uma proposta desse teor na

prática é quase intransponível, por envolver a dispo-

nibilidade de tempo e a vontade do corpo docente

como um todo. A sua importância é, entretanto,

inegável quando permite objetivamente estabelecer

oportunidades de sínteses mais profundas pelo cor-

po discente, sem o enorme dispêndio de energia

pela grande sobrecarga de trabalhos individualiza-

dos. Estes, além de não ultrapassarem o estágio de

anteprojeto preliminar, em alguns casos, culminam

com desistências ao longo do curso.

Existiu desde o início um potencial nos alunos

que nos estimulou a investir com maior profundi-

dade, considerando o patamar diferenciado em que

esta turma se apresentava. A intuição do processo

sugeriu ousar na proposta do tema, acreditando

em sua qualidade de estímulo motivador. Poderia

Figura 5. Trechos de alguns sambas-enredo, incluindo um estandarte, desenvolvidos para os temas “A cidade de São Paulo” e “São Tomé das Letras – cidade mística”. Foram atividades extras que espontaneamente geraram produtos além do que foi solicitado, uma vez que o objetivo era apenas aplicar

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ter sido utilizado qualquer outro fato da vivência

dos alunos, porém, o projeto da Alegoria de Car-

naval foi circunstancial e adequado para aquele

momento. A confi rmação do experimento na

prática refl etiu-se na resposta da classe. No pro-

duto gerado pelas equipes fi cou confi gurada a efi -

ciência do trabalho em grupo, em razão da

contribuição de cada membro com o que possuía

de melhor em conhecimento, habilidade e com-

petência. A partir deste ponto, o processo revelou

caminhos que foram acelerados diferentemente

das formas tradicionais, que levariam um tempo

maior para emergir.

Como conclusão fi nal, sabemos que, em proces-

sos de ensino e aprendizado, não há “certezas abso-

lutas” de propostas e resultados, mas algumas

certezas podem surgir com maior clareza e intensi-

dade quando nos dispomos a experimentar o novo!

Referências bibliográfi cas

COSTA, L. Arquitetura. Rio de Janeiro: José Olympio, 2006.

LEMOS, C. O que é arquitetura. São Paulo: Brasiliense,

2003.

BASARAB, Nicoleus. Manifesto da transdisciplinaridade. São

Paulo: Triom, 1999.

Notas

1 Antigo Trabalho de Graduação Interdisciplinar (TGI),

nome que consideramos mais apropriado, criado

inicialmente pelo arquiteto e professor Hélio de Queiroz

Duarte, quando participou da estruturação do TGI, como

coordenador do 5º ano na FAU-USP, por volta de 1971. O

termo TFG atual surgiu com a Portaria 1770/94 do MEC.

2 Em nossa concepção, multidisciplinaridade não envolve

necessariamente interação entre disciplinas;

interdisciplinaridade, por sua vez, sim, envolve a referida

interação. Esta interação pode abrir caminhos que vão além

e poderá atingir níveis de transdisciplinaridade, um

conceito ainda recente e não desgastado como outros em

uso no discurso acadêmico. Educação possui o caráter

transdisciplinar em sua essência, e talvez a busca dessa

essência seja o caminho desafi ador do novo.

3 Cabe aqui um esclarecimento: não se está defendendo a

existência e utilidade dos cursinhos, que seriam

desnecessários se o Ensino Médio cumprisse seu papel

formador para o ingresso na universidade.

4 O autor deste texto juntamente com o prof. Gilberto

Machado Rizzi.

5 Espaço Habitacional – proposta para exercício de projeto

de uma habitação mínima que deve conter espaços

necessários para a realização de todas as atividades que

caracterizam as funções principais do “habitar”: repousar,

alimentar, higiene, lazer, trabalho/estudo (eventual), contidos

nas dimensões limites de 4,0 x 4,0 x 4,0 metros. Após o

projeto desenvolvido em desenhos e maquetes, os alunos o

constroem em escala real (1:1), em forma de “mock-up”

(protótipo utilizando madeira e placas de papel corrugado),

que permite experienciar sensações reais do uso do espaço

projetado, aferindo e aprofundando a relação de

transferência da intenção idealizada no desenho para o

espaço construído.

6 São programadas visitas com os alunos durante três dias a

áreas emblemáticas na confi guração da cidade: o Centro

antigo e expandido, o bairro de Higienópolis, a Avenida

Paulista e o bairro da Luz.

7 Normalmente há surpresa dos alunos quando se fala em

seis sentidos, uma vez que aprenderam no ensino médio

que são cinco os sentidos. Está sendo introduzido a eles o

“quase desconhecido” sentido de equilíbrio, percebido pelo

ouvido interno, no labirinto, e que referencia a posição de

nosso corpo no espaço. A consciência deste sentido é

importante no desenvolvimento da visão espacial.

8 O conceito de partido arquitetônico, segundo o arquiteto-

urbanista Lúcio Costa (citado em LEMOS, 2003):

conceituado a partir da defi nição de arquitetura como

“qualquer intervenção no meio ambiente criando novos

espaços, quase sempre com determinada intenção plástica,

para atender a necessidades imediatas ou a expectativas

programadas por aquilo que chamamos de partido. Partido

seria uma consequência formal derivada de uma série de

condicionantes ou determinantes; seria o resultado físico da

intervenção sugerida”.

9 Eis, de acordo com Aurélio Buarque de Hollanda, alguns

dos signifi cados de “alegoria”: (grego, Allegoría; latim,

Allegoria): 1. Exposição de um pensamento sob forma

fi gurada; 2. Ficção que representa uma coisa para dar idéia de

outra; 3. Sequência de metáforas que signifi cam uma coisa

nas palavras e outra no sentido; 4. Obra de pintura ou

escultura que representa uma idéia abstrata por meio de

formas que a tornam compreensível; 5. Simbolismo concreto

que abrange o conjunto de toda uma narrativa ou quadro.

10 São estes os temas das alegorias surgidos

espontaneamente das equipes:

1. Os 7 pecados capitais• 2. São Tomé das Letras (cidade mística)• 3. Política• 4. Copas do mundo• 5. Egito• 6. Adoniran (Adoniran Barbosa)• 7. As 7 maravilhas do mundo antigo e os 7 •

pecados capitais

8. O estado de Pernambuco• 9. Misticismo e esoterismo• 10. A cidade de São Paulo• 11. Mitologia grega• 12. Mulheres• 13. A cultura japonesa•

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14. Folclore maranhense• 11 Os quesitos foram extraídos de consulta ao regulamento

utilizado em São Paulo, que adota 9 quesitos,

diferentemente do Rio de Janeiro, que conta com 10 (Liga

Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro

(Liesa). A diferença refere-se somente ao quesito samba-

enredo, que no Rio de Janeiro subdivide-se em letra e

melodia. Os 9 quesitos usados em São Paulo são: comissão

de frente, evolução, mestre-sala e porta-bandeira, samba-

enredo, harmonia, bateria, enredo, fantasia e alegoria (Fonte:

Agência Estado: 09/12/2007).

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