ApresentaçãO No Recife

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O PERCURSO HISTORIOGRÁFICO DO AMOR ROMÂNTICO ATRAVÉS DAS ERAS Prof. Thiago de Almeida (Psicólogo e pesquisador do Instituto de Psicologia – Departamento de Psicologia Clínica) Home page: www.thiagodealmeida.com.br

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"Uma verdadeira viagem de descoberta não é procurar novas terras, mas ter um

olhar novo" (Marcel Proust).

“O Amor é uma ciência, que não pode haver maior, pois por mais que o Amor se

estude, ninguém sabe o que é o Amor” (Caldas Barbosa).

“Buscar o amor é bom, melhor é achá-lo” (Shakespeare, na obra ‘Noite de reis’)

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IntroduçãoEm muitas pesquisas

realizadas, a maioria das pessoas reporta que a intimidade com outros seres humanos é isoladamente, o aspecto mais gratificante da vida (Davidoff, 1983; Bytronski, 1992; 1995).

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"Os homens são seres que vivem em relação. Alimentam-se tanto de carícias e de atenções como de pão. Privados de comunicação, sofrem. Aliás, o isolamento é a punição preferencial destinada aos prisioneiros rebeldes e também é utilizada como instrumento de tortura”

(Isabelle Filiozat, em “A Inteligência do Coração”)

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Questionamentos• Quais as idéias que uniram as pessoas ao longo do

tempo ao amor relacionadas?• Qual é o berço cultural do que se concebe por amor

romântico?• Será mesmo que o amor romântico sempre existiu em

todas as culturas e em todos os tempos? • Será que o amor e os estados a ele relacionados, como

a paixão, por exemplo, sempre foram tão valorizados positivamente como o são atualmente?

• Qual é o prognóstico do mecanismo de casamento, freqüentemente relacionado ao amor, a despeito dos seus inúmeros modelos, percursos e de, por vezes, estar desacreditado, ao menos para a sociedade ocidental?

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O que se concebe por AMOR nesta palestra...

♥ Amor ≠ relacionamento amoroso ≠ sexo e relacionamento sexual; ♥ O amor é um sistema complexo e dinâmico que envolve cognições, emoções e comportamentos freqüentemente relacionados à felicidade para o ser humano; ♥Já, o relacionamento amoroso refere-se ao envolvimento com o outro na relação. Nessa interação com o outro pode ou não haver amor que envolve laços de afeto, apego,libido, dentre outras características.

♥ A relação amorosa não tem a função de preencher vazios ou ainda, solucionar a vida de qualquer pessoa.

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• Embora expresso de maneiras diferenciadas, o amor é sumamente importante para o desenvolvimento da personalidade e crescimento da humanidade;

• Ao que se sabe o desenvolvimento emocional se dá imediatamente após o nascimento e percorre um longo caminho através das etapas determinadas pela idade e cultura, que caracterizam a evolução do ser humano (Bowlby, 1989);

• Infelizmente, tal importância é mais bem percebida quando as pessoas se deparam com problemas como a carência amorosa, o ciúme e a infidelidade, dentre outros. Quando isso acontece, tanto o nosso humor, quanto a nossa capacidade de concentração, a nossa energia, nossa auto-estima, o nosso trabalho e a nossa saúde, dentre outras dimensões das nossas vidas, podem ser profundamente afetados.

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Há que se ter em mente que o amor, a princípio, é uma crença emocional. E como toda e qualquer crença “pode ser mantida, alterada, dispensada, trocada, melhorada, piorada ou abolida. Nenhum dos seus constituintes afetivos é fixo por natureza” (Costa, 1999, p. 12). Segundo a autora Mary Del Priore (2006) o amor é um milagre de encantamento, uma espécie de presente que atravessa os séculos.

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E por que devemos refletir a respeito do amor?

• pensar a respeito do amor nos coloca frente deste fenômeno que conhecemos desde a mais tenra idade, e o experimentamos diariamente, através das fortes emoções que os acompanham, mas não refletimos sobre as concepções que eles podem assumir;

• Grande parte dos seres humanos não vive a plenitude do amor, muitas vezes, por ter errôneos ou idealizados conceitos e imagens distorcidas do que este seja. Dessa forma, recorrem a estereotipagens amorosas, resultando arremedos afetivos que empobrecem o que concebem por amor e que tanto desgastam as pessoas.

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O amor e a paixão: pontos de intersecção e de ruptura

• Concepção greco-romana do amor;• Segundo Buss (2000): “Geralmente pensamos a

paixão como restrita ao sexo ou amor, o amplexo ardente ou o desejo constante” (p. 13);

• Compreensão grega da passividade da paixão e de seu aspecto inerentemente destrutivo.

• Mecanismos fisiológicos para o Amor e para a Paixão.

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Mas, o que é o amor?O amor é um sistema complexo e

dinâmico que envolve cognições, emoções e comportamentos relacionados muitas vezes à felicidade para o ser humano; diferiria da paixão por sua maior permanência e menor efusividade que a paixão, embora não se omitam os estados de alegria e de tristeza relacionados à sua presença ou mesmo a sua ausência para o ser humano.

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Entra-se em contato com o perfil amoroso de cada época por meio do que se é produzido em cada período, tal como suas músicas, artes plásticas, literaturas, teatros dentre outras fontes orais e escritas (Murstein, 1988). Esses construtos refletem as visões do amor de cada época retratando suas peculiaridades. É claro que nem toda realidade é suscetível a se transmutar em obras como poemas, epopéias, ou pinturas. Contudo, mesmo os legados culturais transmitem suas ideologias particulares que acabam consolidando, muitas vezes, os ideais de uma época (Grimal, 1991).

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Pré-História• Aproximadamente 1.600.000 a.C. a 4.000 a.C.;• Para a etologia, ciência que estuda as origens

dos comportamentos dos seres humanos e animais, esse contrato determinaria que, em troca de recursos trazidos por um homem para garantir a alimentação, o abrigo e a proteção da mulher e dos filhos dele, esta, em contrapartida, disponibilizaria o seu útero, com exclusividade, à disposição do mesmo.

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O amor no Egito Antigo

• Do Egito, há aproximadamente 1500 anos a.C., temos retratado em papiros os remotos cânticos amorosos (Montet, 1989). Ainda, no Egito, no ano 1000 a.C., no antigo Egito, o amor já era retratado como um esmagamento do eu, e, portanto, semelhante a uma espécie de doença (Malinowski, 1970, 1955).

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Enquanto isso na China…

Segundo Joppert (1979) e Watson (1969), na China, na época da Primeira Dinastia Shang (séculos XVIII-XII a.C.), os primeiros poemas de amor foram compostos.

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O amor greco-romano

Todavia, ao contrário do que se observa atualmente, os homens gregos geralmente não nutriam amor por mulheres (Grimal, 1991; S. S. Hendrick e C. Hendrick, 1992). Independentemente disso, o amor para eles era uma temática muito importante para sua filosofia (Philippe, 1999).

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• Hesíodo, com sua Teogonia, e Parmênides de Eléia (século V a.C.), foram os pioneiros ao sugerir que o amor é a força que impulsiona as coisas, que as conduz e as mantém juntas;

• Empédocles (século V a.C.), reconheceu o amor como a força que conserva unidos os quatro elementos e na discórdia a força que os separa;

• Platão (427-347 a.C.) contribuirá para a historiografia do amor com o primeiro tratado filosófico amoroso intitulado de: “O Banquete”

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Idade Média • 476 d.C. – 1453 d.C.;• Com o advento do Cristianismo, a noção de amor é

acentuadamente influenciada sob duas égides. Por um lado, é entendido como uma relação ou um tipo de relações que se devem estender a todas as pessoas entendidas como “próximos”. Por outro lado, foi eleito como um mandamento, que não tinha conexões com as situações de fato, e que se propõe a transformar estas situações e criar uma comunidade que ainda não existe, mas que deverá tornar irmãos todos os homens: o reino de Deus. Assim, o amor agápico é evidenciado e apontado como uma realidade absoluta e primordial.

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E o casamento para a Idade Média?• Na Idade Média, o casamento, tinha uma

diretriz diferente da qual se tem hoje por referência. Algo que desse vazão aos sentimentos, como amor, era considerados impróprio para o casamento (Batten, 1995);

• O “Jus primae noctis”;• Na realidade, o casamento era uma instituição

que visava à estabilidade de uma sociedade, e desempenhava apenas a função da reprodução, união e manutenção de riquezas, assim, dando continuidade à estrutura. A partir do momento em que o amor aparece no casamento, esses sustentáculos, como a reprodução e união de riquezas foram relegados a um segundo plano, ameaçando toda essa organização social.

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O amor cortês e o feudalismo do amoroso• Segundo S.S. Hendrick e C. Hendrick, o amor

cortês vigorou, aproximadamente no século XII, embora tenha sido semeadas as primeiras manifestações alguns séculos antes;

• Era essencialmente aristocrático, reservado às elites que freqüentam as cortes. Considerado uma ocupação de ociosos, libertos de qualquer preocupação material;

• Funcionalmente, foi um meio de educar os cavaleiros, civilizá-los, ou seja, apenas uma estratégia, na qual a mulher era o engodo para subordiná-los à vontade de seus senhores (Costa, 1999; Heer, 1976).

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Renascimento e Idade Moderna

• 1453 d.C. – 1789 d.C.;• No decurso de tais acontecimentos, a nobreza tem um

enriquecimento e, assim, torna-se mais liberal perante os filhos. O medo de dissipar as fortunas devido ao grande número de filhos vai desaparecendo e as famílias começam a permitir o casamento dos filhos que não quisessem seguir a carreira eclesiástica;

• Uma vez estabilizado o amor romântico, como forma de conduta emocional na Europa, foram atendidos os anseios de autonomia e felicidade pessoais para a classe burguesa, legitimando-a no poder. “Sua íntima associação com a vida privada burguesa o transformou em um elemento de equilíbrio indispensável entre o desejo de felicidade individual e o compromisso com idéias coletivos” (Costa, 1999, p.19) .

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Alguns pensadores expoentes…• Rousseau (1712-1778), realça o que considera

imperativo para a humanidade: voltar ao "estado de natureza", pois o progresso tornou os homens egoístas, violentos e desordenados. O amor deve encontrar de novo sua dimensão mais autêntica, aquela que a própria natureza lhe atribuiu e os seres humanos distorceram;

• Spinoza (1632-1677) identifica o amor como uma forma suprema de racionalidade, possível quando o conhecimento liberta o espírito dos desejos, aproximando o homem da felicidade completa.

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Marcado pelo pessimismo, o pensador Arthur Schopenhauer (1788-1860) classifica o amor como um sentimento falso e enganoso. Segundo ele, por mais etéreo que possa parecer, o sentimento amoroso está sempre enraizado no instinto sexual e seu objetivo final é o ardente desejo de reproduzir. Consoante este autor, em nome do amor, o ser humano está disposto a cometer qualquer perversidade e aceitar qualquer sofrimento.

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Relacionamentos amorosos e internet• Ao contrário dos outros séculos, uma novidade

que veio para interagir com a questão dos relacionamentos amorosos é a participação da internet no cotidiano, sobretudo, em relação aos relacionamentos amorosos;

• Mais do que um fenômeno circunscrito aos teens, ou ainda, a adultos solitários, os relacionamentos românticos via internet tendem a se expandir em um futuro próximo e devem, como conseqüência, provocar um relaxamento das normas sociais e morais tais como as entendemos hoje.

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O “Ficar” “O estabelecimento de relações sociais mais temporárias, de

comunidades abertas e mais frouxamente ligadas pode fazer com que o indivíduo se sinta mais só e desamparado, e se veja obrigado a uma constante negociação com o outro e com ele mesmo visando à continuidade ou quebra do vínculo forjado. Entretanto, a fluidez dessas relações possibilita a constituição de redes, a vivência de novas e diversas formas relacionais que pode, paradoxalmente, minimizar essa solidão e lhe dar segurança e apoio. Isto acontece, por exemplo, no estar-junto; ao mesmo tempo em que ele é marcado por uma certa superficialidade e fugacidade, também propicia o compartilhamento espontâneo de experiências vividas, sentimentos, desejos e interesses. Além disso, por se caracterizar como um ajuntamento efêmero, no qual os indivíduos não cobram, por exemplo, fidelidade, profundidade de sentimento ou investimento afetivo, o estar-junto facilita o trânsito e o vínculo com outras pessoas e grupos” (Chaves, 2003, p. 87-88).

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“A idéia de que o amor como o conhecemos é uma experiência universal e atemporal decorre, fundamentalmente, de nossa certeza de, no amor, encontrar a expressão mais completa de nossa possibilidade de entrega, doação e, na mesma medida, nossa maior capacidade de receber, compreender, aceitar e desejar outra pessoa escolhida por nós e que, por sua vez nos escolheu”

(Lázaro, 1996, p. 199).

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A questão do etnocentrismo e do a-historiscismo no estudo do amor

No dicionário, o etnocentrismo é definido como a “tendência do homem para menosprezar sociedades ou povos, cujos costumes divergem dos da sua própria sociedade ou povo”, ou ainda como a, “disposição habitual de julgar povos ou grupos estrangeiros pelos padrões e práticas de sua própria cultura ou grupo étnico” (Dicionário eletrônico Michaelis). Dion e Dion (1988) o definem como “a tendência para usar o próprio grupo e seus valores como o padrão de comparação e avaliação para si mesmo e para os outros” (Dion & Dion, 1988, p. 281). Portanto, corresponde a uma percepção da vida e da sociedade do ponto de vista do observador que faz de sua cultura, a norma ou a referência na análise de outras realidades sociais (Rocha, 1994).

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“Quando se julgam pessoas de outros períodos ou sociedades, há a tendência para começar com os valores que são importantes no tempo de quem julga, selecionando-se fatos relevantes à luz desses valores. Esta abordagem impede o acesso ao contexto especial das pessoas que se procura compreender. Elas são separadas das estruturas que formam com outras pessoas, e dispostas de forma heteronômica em contextos determinados por valores contemporâneos, aos quais não pertencem”(Norbert Elias, citado por Casey, 1992, p. 13).

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O a-historiscismo• Outro problema da mais recente pesquisa no

amor é a questão do a-historiscismo. Consoante ao dicionário o a-historiscismo é definido como sinônimo de “1. Não histórico; alheio à história; aistórico. 2. Contrário à história; anti-histórico” (Ferreira, 1999, p. 144). Assim, podemos compreender o a-historiscismo enquanto a falta de consciência histórica do contexto que está em foco (Lee, 1988).

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Conclusões• O amor entre duas pessoas não é um fenômeno

local ou contemporâneo;• Ao longo dos séculos, muitos pensadores

manifestaram suas idéias a respeito do amor, quer ressaltando seu valor positivo e exclusivamente humano, quer identificando nele a expressão inefável da transcendência, ou ainda, tratando-o como meta inalcançável, e considerando-o como algo alienador e, portanto, execrável.

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• Nas palavras de Grimal (1991, p. 1): o amor “está sujeito a modas” de forma que se pode dizer que “no reinado de Luís XIII não se amava como na época de Carlos X” (Grimal,1991, p. 1);

• um tipo de amor, ou ainda de ideologias amorosas, não devem ser vistos como superiores, ou mais verdadeiros do que outros, prevalecendo sobre os demais (Lee, 1988).

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• pode-se observar que embora sejam grandes as diferenças entre as concepções amorosas da Grécia Antiga até a Idade Contemporânea. Costa evidencia um paralelo em comum: “o amor sempre buscava um Bem objetivo, independente do sujeito. O Supremo Bem greco-romano; o Deus cristão, A Dama do amor cortês; ou a posição social nas artes da sedução e da galanteria no Renascimento e nas sociedades de Corte” (Costa, 1999, p. 41), e assim, por diante. Em suma, segundo Rougemont (1988) a teleologia amorosa vinha do objeto contemplado. E todos estes fatores configuram e servem de background para o que se concebe atualmente sobre o amor;

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• Não podemos inferior, contudo, se as pessoas de épocas remotas que nos precederam utilizavam concepções próximas as nossas na tentativa de descreverem o que convencionalmente identificamos como amor;

• Expresso de maneiras diferenciadas, o amor, sobretudo o de natureza romântica, é sumamente importante para o desenvolvimento da personalidade e crescimento da humanidade. E, certamente, a evolução do que se concebe por amor evoluiu e continua a evoluir constantemente, e acompanha o pensamento das pessoas da época no qual ele está inserido;

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Um último e oportuno questionamento é divagar o quão imersas vivem as pessoas em suas próprias culturas e embasadas em seus próprios referenciais a ponto de desconsiderarem outros paradigmas amorosos, como os retratados por esta palestra, e passar a definir e caracterizar outras culturas a partir destes, sobretudo no que diz respeito ao estudo do amor?

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A todos vocês, pela atenção recebida, o meu muito obrigado e…

Ao amor… Sempre!!