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APARECIDA CARDOSO POZO
HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO
1ª edição
Universidade Braz Cubas - UBC
Mogi das Cruzes
2014
Reitor: Prof. Maurício Chermann
DIRETORIA DE UNIDADES EDUCACIONAIS
Coordenação Geral Acadêmica - EaD: Prof.ª Dra. Mara Yáskara Paiva Cardoso
Assessoria Administrativa: Adriane Aparecida Carvalho
Coordenação de Produção: Diego de Castro Alvim
Revisão de Textos: Adrielly Rodrigues, Taciana da Paz
Edição de Arte: Michelle Carrete
Diagramação: Amanda Holanda, Vanessa Lopes
Ilustração: Noel Oliveira Gonçalves, Everton Arcanjo
Impressão: Grupo VLS / Jet Cópias / MogiPress
Av. Francisco Rodrigues Filho, 1233 - Mogilar
CEP 08773-380 - Mogi das Cruzes - SP
1ª edição 2014
O autor dos textos presentes neste material didático assume total
responsabilidade sobre os conteúdos e originalidade.
Proibida a reprodução total e/ou parcial.
© Copyright UBC 2014
Prof. Aparecida Cardoso Pozo 1*
* Graduação em Pedagogia pela Universidade Braz Cubas; especialização em Teorias de Ensino e Aprendizagem
pela Universidade de Mogi das Cruzes. Ingresso no magistério público de São Paulo por concursos de títulos e provas,
sendo respectivamente, professora primária e diretora de escola. Atuação na equipe técnica da Divisão Regional
de Ensino Dre-5 Leste de Mogi das Cruzes, tendo elaborado e implantado o projeto Proleste de alfabeizaçao e o
projeto Esperança para a pré-escola, professora universitária de 1975 a 2011 na UBC, onde desempenhou, além
da função docente, assessoria pedagógica ao Curso de Direito por 5 anos. Membro do Conselho Municipal de
Educação e atualmente atua no Conselho Delibertivo da APAE deste município.
55 SUMÁRIO
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO 7
INTRODUÇÃO 9
U N I D A D E I
1RAÍZES HISTÓRICAS 11
1.1 IMPORTÂNCIA DA HISTÓRIA 12
1.2 O PENSAMENTO PEDAGÓGICO GREGO 14
1.2.1 OS SOCRÁTICOS E PÓS-SOCRÁTICOS 17
1.2.2 OS SOFISTAS 20
1.2.3 OS PÓS-SOCRÁTICOS 21
1.3 O PENSAMENTO PEDAGÓGICO GRECO-ROMANO 23
1.4 IDADE MÉDIA 27
1.5 CONSIDERAÇÕES DA UNIDADE I 34
U N I D A D E I I
2A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA 37
2.1 O CONTEXTO DO RENASCIMENTO 38
2.2 A PEDAGOGIA INOVADORA DA REFORMA PROTESTANTE 40
2.3 A CONTRARREFORMA E O CONSERVADORISMO PEDAGÓGICO
CATÓLICO 41
2.4 PEDAGOGOS RENASCENTISTAS E AS MUDANÇAS NAS CONCEPÇÕES
DA INFÂNCIA 42
2.5 A CONSOLIDAÇÃO DO MODELO INDUSTRIAL E A CONSEQUENTE
PEDAGOGIA REALISTA 43
2.6 O ILUMINISMO E A TENDÊNCIA NATURALISTA NA EDUCAÇÃO 46
6 SUMÁRIO
2.7 CONSIDERAÇÕES DA UNIDADE II 51
U N I D A D E I I I
3EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL 55
3.1 EDUCAÇÃO COLONIAL E O CONSERVADORISMO CATÓLICO 56
3.1.1 O JESUITISMO COLONIAL 56
3.1.2 POMBAL 62
3.2 EDUCAÇÃO NO IMPÉRIO E A PREDOMINÂNCIA RELIGIOSA 64
3.2.1 FASE JOANINA 64
3.2.2 FASE INDEPENDENTE 65
3.2.3 SEGUNDO REINADO 67
3.3 EDUCAÇÃO NA PRIMEIRA REPÚBLICA 68
3.4 EDUCAÇÃO NA ERA VARGAS 74
3.5 A LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA – 4024/61 77
3.6 A TENDÊNCIA TECNICISTA 78
3.7 CONSIDERAÇÕES DA UNIDADE III 86
U N I D A D E I V
4EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA 89
4.1 O CONTEXTO PÓS-MODERNO NEOLIBERAL 90
4.2 O PERFIL NECESSÁRIO AO MUNDO GLOBALIZADO 93
4.3 IDEOLOGIA NEOLIBERAL E EDUCAÇÃO 96
4.4 PROPOSTAS EDUCACIONAIS ATUAIS PARA O CONTEXTO NEOLIBERAL 100
4.5 O ALUNO NAS COMUNIDADES DE APRENDIZAGEM 103
4.6 CONSIDERAÇÕES DA UNIDADE IV 107
REFERÊNCIAS 111
77 APRESENTAÇÃO
APRESENTAÇÃO
Caro aluno!
Bem-vindo à disciplina História da Educação.
Estou convidando-o para um passeio diferente e instigante, como deve ser a
busca de nossas raízes e de nossa identidade como cidadãos.
Este passeio certamente será de grande utilidade para a função de educador.
Você poderá descobrir que um profissional da educação que não define seu passado
dificilmente conseguirá planejar futuros mais auspiciosos para seus alunos.
A época atual é de grande complexidade e coloca para seus educadores o
grande desafio de definir perfis ideais para uma sociedade globalizada que consiga
reverter suas séries crises sócio-culturais e educacionais.
A retaguarda histórica se impõe como importante vetor para que os educadores
definam com clareza a educação que desejam para a sociedade brasileira.
A legislação sobre a educação escolar é vasta e garantidora dos direitos das
crianças e dos adolescentes, mas carece de legitimação, garantindo real igualdade
de oportunidades a todos, independentemente do nível socioeconômico. Educação
de qualidade no Brasil de hoje é privilégio de classe. Esta situação emergiu de uma
construção histórica carente de mudanças.
Vamos conhecê-la, preservá-la ou mudá-la?
99 INTRODUÇÃO
INTRODUÇÃO
Quando penso em você como uma grande e ótima possibilidade para a nossa
educação, me sensibilizo por pensar que, devido a esta mágica da tecnologia, temos
a oportunidade de aproximação, de dividir nossos anseios e nos enriquecermos
mutuamente. Saiba que respeito profundamente você por ser meu aluno e fico feliz
por lhe oferecer o que tenho de melhor nesta disciplina apaixonante. Sinta-se muito
bem-vindo e vamos começar nossa caminhada juntos.
Na elaboração deste Livro Didático, o que orientou e definiu nossa reflexão foi
o compromisso de elaborar uma síntese suficiente para incentivá-lo a iniciar andanças
históricas que o leve à definição clara de perfis ideais para seus futuros alunos.
Sem definirmos com clareza e precisão qual é a real natureza de nossos alunos
culturalmente situados, nossas práticas pedagógicas serão desprovidas de objetivos e
intencionalidade filosófica. Nossas ações estarão sem rumo.
Como as respostas estão na história, condensamos este trabalho em quatro
unidades de estudo. No conteúdo da primeira unidade buscamos destacar a importância
da História da Educação no exercício profissional, nossas raízes greco-romanas e
medievais. Na unidade II enfocamos o pensamento pedagógico do Renascimento e
Idade Moderna. Na unidade III a abordagem é sobre a educação brasileira. Já na
unidade IV analisamos os desafios da contemporaneidade.
Não se abstenha em participar de nossas teleaulas, na qual você aprofundará
conhecimentos. Não deixe de consultar também os materiais disponíveis na plataforma
de estudos e participar dos Fóruns, nele você poderá esclarecer dúvidas, expor seus
pontos de vista e opinar sobre o que aprendeu.
Boa viagem e bons estudos!
1111UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
U N I D A D E I
1RAÍZES HISTÓRICAS
OBJETIVOS DA UNIDADE
• Identificar na história a importância de formarmos os sujeitos
construtores de suas próprias vidas como cidadãos;
• Analisar criticamente as concepções da educação e da infância na
cultura greco-romana;
• Definir valores greco-romanos a serem preservados e os equívocos a
serem modificados;
• Analisar o pensamento pedagógico medieval como fundamento
histórico da educação brasileira.
HABILIDADES E COMPETÊNCIAS
• Compreensão dos determinantes históricos de constituição de nossa
identidade.
12 UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
1.1 IMPORTÂNCIA DA HISTÓRIA
É comum entre os estudantes de Pedagogia não encontrar uma razão para
o estudo de civilizações antigas, mesmo que se façam presentes neste momento
histórico.
Construir uma concepção atual sobre a infância e a juventude implica,
necessariamente, em percorrer o trajeto histórico de modo a nos permitir inferências
reais sobre os modos de se perceber os alunos como produto que são da história. O
perfil da criança, do adolescente e da juventude moderna é consequência de passados
longínquos que se secularizaram e resultaram na visão que temos hoje sobre aqueles
que devemos educar. Acreditamos que definir o que seja realmente um aluno sem nada
conhecer sobre sua evolução histórica será, no mínimo, um equívoco, que resultará
também em formas equivocadas de conduzi-lo no processo educativo.
Como somos culturalmente situados, nossa própria identidade se define pela
nossa inserção num determinado modelo de governo, de família, de economia e
de política, desde que nascemos. Nessas formas de pensar, sentir e agir em nossos
contextos sociais. Somos produtos de uma dinâmica história sucessiva e contínua.
Conhecer a História que nos possibilita autoidentificação se constitui no grande
fundamento para analisarmos decisões presentes e futuras. A análise dessa dinâmica
é que nos possibilita promover mudanças sobre erros históricos e a manter princípios e
valores transcendentais, que sempre serão metas ideais a serem atingidas e mantidas
no percurso de nosso trabalho como educadores.
Se como brasileiros temos dificuldade em compreender a importância do
passado isso se deve ao fato de que o Brasil, num curto espaço de tempo, sofreu os
impactos de duas ditaduras, a Vargas e a militar, causadoras de grande atraso nas reais
relações democráticas de nosso país. Esta última, ao longo de trinta anos, formou
mentes tecnizadas, considerando disciplinas curriculares como a História e a Filosofia,
“perfumarias” desnecessárias à formação dos alunos. Tecnizados também foram os
educadores, que ainda não conseguem fundamentar suas práticas pedagógicas.
1313UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
Meros executores de livros e apostilas prefabricados naquela época segundo
os ditames da ditadura, e hoje pelos interesses financeiros de editoras e políticos são,
geralmente, inadequados para alunos reais. Essa prática, ao longo dos anos, retirou
dos professores o hábito de planejar suas aulas conforme a natureza de seus alunos.
Inconscientemente veiculam o pacto da mediocridade, em que uns fingem que cuidam
da educação, outros que educam e outros que aprendem. Neste quadro de referência
e sem consciência sobre nosso passado, dificilmente nos perceberemos como sujeitos
de nossa história e formaremos outros dessa mesma maneira.
Neste sentido, nos alerta Galeano (2010) na contracapa de sua memorável
obra “As Veias Abertas da América Latina” “[...] a história é como um profeta com o
olhar voltado para trás, pelo que foi e contra o que foi anunciando o que será”.
O pensamento de Galeano nos permite sentir a necessidade da construção de
uma consciência histórica crescente e esclarecedora, não apenas sobre os conflitos
educacionais atuais, como também o aumento da probabilidade de projetarmos
futuros mais promissores enquanto agentes de nossa história.
Em Roosevelt “... quem não tiver uma visão histórica dos tempos ficará surpreso
com a visão histérica dos fatos”. Consideremos a situação ainda bastante caótica de
nossa educação escolar em plena vivência do século XXI, defasada em quantidade e
qualidade, entendemos que nossa visão histórica dos tempos requer revisões urgentes
para que a histeria não permaneça.
Com relação ao nosso papel de construtores de uma nova história, mais justa e
mais digna, consideremos o que Aranha (2006, p.19) nos coloca : “... que o presente
humano não se esgota na ação que realiza, mas adquire sentido pelo passado e pelo
presente”.
Urge dar sentido ao nosso passado e presente para seguirmos em direções mais
transformadoras. Essa consciência nos situará como sujeitos e não meros objetos na
construção de novas histórias.
Cada ser humano e cada educador de maneira especial, sempre será produtor
de cultura, quer como inovadores, quer como conservadores. Essa ambivalência é
14 UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
indicadora de que, conscientes ou não, estamos dentro da dinâmica histórica e não
fora dela. Escolha é uma prerrogativa de humanos e, como tais, podemos entender
que história se faz no dia a dia de cada um, porque não é nem privilégio de políticas
públicas ideológicas, nem de porões de ditaduras É construída no cotidiano de cada
escola e de cada sala de aula. A educação escolar não é nem inocente e nem neutra,
mas sempre um ato político segundo determinados interesses e, já se faz urgente
nesta história que os interesses sejam os da sociedade brasileira. Educação escolar
deve formar cidadãos e não seres humanos manipulados como meros meios de se
obter lucros para uma minoria.
Já podemos responder à indagação inicial de nossos estudantes, que precisam
percorrer as culturas passadas para se situarem como agentes de novas histórias. Neste
estudo os futuros pedagogos poderão compreender qual a real natureza da criança,
dos adolescentes e jovens, cuja educação lhes será confiada. Neste percurso poderá
compreender a grande dívida que temos com relação as nossas crianças culturalmente
situadas. Milênios se passaram antes que a sociedade desse maior importância a seus
pequenos, começando a diferenciá-los dos adultos.
Já se faz tempo de viajarmos pelo passado elucidador deste presente. Vamos
iniciar pelos gregos.
1.2 O PENSAMENTO PEDAGÓGICO GREGO
Descrever o papel extraordinário dos gregos na construção cultural das
civilizações ocidentais nas quais estamos incluídos é, no mínimo, reconstruir nossa
trajetória histórica e ainda constatar essa presença neste século. Evidentemente o
espaço deste trabalho não tem a pretensão de esgotar ou mesmo de aprofundar em
amplitude uma cultura de tal envergadura. Procuraremos, no entanto, manter sua
essência, de modo que possa favorecer a construção de conceitos que nos permitam
identificá-la em nossa modernidade.
1515UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
Entendemos que educação como ato político estará sempre contextualizada
como a resultante das formas de sobrevivência entre os homens, de suas organizações
sociais que definem o modelo de educação que necessitam. Na cultura grega não
foi diferente. Sua periodização histórica está intimamente ligada às suas formas de
produção econômica.
A Grécia, como as demais culturas primitivas, se desenvolveu a partir de uma
economia agrária marcada por um comércio rudimentar, sem moeda circulante e na
base de trocas. Esse contexto não exigia escolas como uma instituição própria para
educar. Politeísta e antropomórfica tinha uma pedagogia voltada para o culto aos
deuses e aos conhecimentos necessários a uma sociedade agrícola.
A educação se fazia diretamente na vida diária, na qual os pais inseriam seus
filhos nos rudimentos da agricultura, pastoreio e artesanato. Essa sociedade não
necessitava de leitura, escrita ou estudo de números.
À medida que esse comércio começou a intensificar-se a Grécia caminhou
em direção ao período arcaico, considerado como de transição daquela sociedade
primitiva mítica para uma sociedade filosófica e citadina.
O comércio promoveu o desenvolvimento das “poleies”, cidades-estados
gregas, e de um novo modo de vida. Começaram a surgir transformações sociais
significativas e diferenciadoras do estilo de vida rural para um estilo urbanizado. Neste
contexto o comércio é o elemento desencadeador de uma sociedade de classes, com
grande diferenciação de “status” e de seus conflitos decorrentes, o que irá enfraquecer
a crença no poder dos deuses mitológicos para resolver os novos problemas dos
cidadãos.
Contabilizar lucros, perdas e danos financeiros da nova classe de comerciantes,
gerou a necessidade social de que a novas gerações deveriam aprender a escrever,
calcular e operacionalizar moedas como forma de intercâmbio. Eram formas de educar
que transcenderam o poder do pai para ensinar seus filhos. Nesse contexto surgem
as escolas como instituições próprias para educar e para elas eram encaminhados os
meninos a partir dos sete anos. As meninas permaneciam na família sendo preparadas
para a vida doméstica.
16 UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
O fortalecimento extraordinário das cidades se firmou historicamente como
o período clássico, sacralizado pelos historiadores como o auge da cultura grega,
“suas obras primas são modelos que inspiraram o mundo durante séculos e que ainda
iluminam nossos artistas e escritores” (LARROYO, 1978, p.27).
Tal contexto exigia um novo ideal educativo, que foi sintetizado na “paidéia”
originada do antigo “paidós”, pai que educava o filho diretamente nas práticas
agrícolas, o que se tornou insuficiente para compreender o conceito da “paidéia”
que, em sua totalidade, significava a formação integral da criança e do adolescente.
Foi também no contexto das “pólies” que os socráticos firmaram as bases
da filosofia grega desvinculando os cidadãos do poder dos deuses, tornando-os
definidores de seu próprio destino e da vida da cidade.Educar nas escolas se tornou
uma exigência social que pretendia assegurar a sobrevivência futura da economia e
das novas gerações.
A “paidéia” teve sua concretização didática especialmente em Atenas, onde a
formação intelectual era considerada indispensável para a formação do cidadão.
A educação escolar tinha início aos sete anos de idade como já o dissemos, o
menino era enviado ao ginásio para a prática da educação física, música, leitura, escrita
e cálculo. As meninas permaneciam em casa e eram iniciadas nos afazeres domésticos.
Nesse período da história grega são raros os dados sobre uma concepção da
infância e da adolescência. Parecia não haver grandes preocupações quanto a um
estágio específico que as diferenciasse dos adultos e como decorrência, as didáticas
não eram diferenciadas e adequadas às crianças, embora nossas concepções atuais
sobre a infância se ratifica na “Paidéia”, que ao propor o desenvolvimento integral do
aluno já o situa em sua multidimensionalidade presente. Essa proposta atravessou os
séculos e está viva com muita intensidade até hoje.
Sócrates, Platão e Aristóteles, considerados os grandes filósofos, não trataram
especificamente da criança como tal, mas apenas como alunos a serem desenvolvidos,
sem maiores preocupações com didáticas e procedimentos metodológicos ajustados
à natureza deles.
1717UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
Um dos aspectos comuns da cultura grega era a prática da educação física e
música, destacando-se neste aspecto Esparta, muito militarizada. Esses componentes
curriculares eram os pontos comuns culturais e compunham a máxima da educação
integral consubstanciada no conceito de “mente sã em corpo são”.
Silabação, repetição, memorização, declamação, se constituíram nos métodos
de ensino para leitura, escrita e aritmética a partir dos 7anos.
A partir dos 13 anos as crianças mais pobres saiam em busca de um ofício e as
mais favorecidas eram encaminhadas para as academias. Aqui estamos diante de uma
realidade moderníssima: quem pode paga por um ensino de maior qualidade e quem
não pode, vai para a escola pública.
1.2.1 OS SOCRÁTICOS E PÓS-SOCRÁTICOS
Quando analisamos explicadores da educação brasileira é ponto comum
entre eles recomendar aos educadores o desenvolvimento do hábito de repensarem
exaustivamente suas práticas pedagógicas, ou de estabelecer uma filosofia como
norte a ser alcançado, ou ainda, que nossos estudantes são portadores de diferentes
potencias a serem desenvolvidos pela escola. Esses autores estão empregando os
distantes princípios propostos por Sócrates, Platão, Aristóteles e seus seguidores.
Hoje, nos nossos cursos de Pedagogia, quando estudamos Piaget, Vygotsky e
seguidores das linhas construtivistas, estamos radicados em Sócrates que nos orienta
em direção da dúvida metódica e a fragilidade de nosso conhecimento.
Frases socráticas sacralizadas pela história, como a inscrição no templo de
Apolo: “Conhece-te a ti mesmo” e a proferida por ele na sequência da observação
do mesmo “O que sei é que nada sei”, nos convida a adotarmos a necessidade de
duvidar de nosso próprio conhecimento como princípio de sabedoria.
18 UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
Ser sábio para ele é, primeiramente, reconhecermos que nada sabemos, como
elemento desencadeador de uma dinâmica de se parir ideias novas para saber, superando
continuamente nossos enganos. Qualquer semelhança com a progressão continuada
proposta hoje não é mera coincidência, é herança histórica, mas ultramoderna.
Considerava a aprendizagem como a construção de conceitos a serem
concretizados na mente do aluno e não da do professor. Assim, toda educação era
autoeducação, sempre ativa e subjetiva. Tenho boas razões para crer que Piaget andou
por caminhos socráticos.
“A filosofia socrática sempre esteve orientada para a vida moral”, ”conhecer o
bem e praticá-lo deve ser a mesma coisa” dizia Sócrates e, ainda, “as pessoas não são
más, apenas não conhecem o bem”. Assim, estimulava os educadores a conduzir as
pessoas para o bem, instituindo o caráter formativo da educação, que deve prevalecer
sobre a mera informação. A educação para todos como aspiração democrática
moderna tem raízes em Sócrates ao entender que o acesso ao conhecimento era
direito de todos.
Segundo ele, toda educação era essencialmente ativa e subjetiva, de modo
a permitir que o aluno se autoeducasse. Sócrates, coerente com essas posturas
doutrinárias, nunca daria uma aula expositiva e sugeriria que as aulas fossem sempre
mediadas pelo diálogo, ter significado para o aluno e partir sempre de abordagens
socioculturais. Acho que Paulo Freire também passeou por lá quando mantinha com
seus alunos uma postura dialógica.
Aluno de Sócrates, Platão foi além de seu mestre. Ao indagar-se sobre o próprio
conhecimento concluiu que o autoconhecer-se não lhe bastava para a busca da
verdade.
No suposto domínio de si mesmo criou o “Mundo das Idéias”, que está além da
terra e habita o mundo metafísico. Escreveu “A República”. Nessa obra criou o Mito
da Caverna e através dessa narrativa explicou sua teoria, segundo a qual o homem
acorrentado à materialidade e dominado pelas paixões, só percebe as sombras da
realidade e por não conhecê-la a mantém inalterada.
1919UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
Para libertar-se dessa materialidade o ser humano precisa ser filósofo “filos”=
amigo e “shofos”= o sábio. Nesse sentido só será sábio o homem que habitar o mundo
das essências imutáveis, no Mundo das Ideias. Será então, capaz de rememorá-las
como normas de vida. Considerava essências imutáveis o bem, o belo e o justo. O bem
era o mais alto grau de perfeição.
Todas as filosofias da educação em países que se consideram democráticos estão
radicadas em Platão. Nesse sentido de democratização da educação, na ótica deste
filósofo, essa deveria ser dever do Estado. Para garantir que esse direito dependesse
mais do mérito do aluno que do bolso do pai, as escolas seriam apenas estatais,
garantindo reais igualdades de oportunidades.
Aristóteles, aluno de Platão, discordou do mestre em relação à verdade. Autor
da teoria realista, focou sua especulação na objetividade da vida real. Considerou que
as explicações sobre o mundo estão nele próprio, em sua “physis”, sua natureza física.
Todos os fatos da vida estão explicados nas relações de causa e efeito, em constante
devir, o que devem ser. Ao estabelecer o devir como ideal a ser atingido, demonstrou
a influência de Platão ao colocar um Ato Puro como referencial a ser constantemente
buscado.
Para ele todos os seres, animados ou inanimados, são constituídos de dois
elementos naturais: a matéria e a forma. Esses elementos são submetidos a relações
causais, na qual todo efeito é resultante de causas.
Considerava a matéria como pura passividade, mas sempre portadora de uma
força potencial, que submetida a uma causa eficiente tende a aflorar em termos
comportamentais e em seres da mesma espécie. O desenvolvimento do ser seria uma
sucessão de transformações de matéria e forma, de potência e ato na mais pura
progressão continuada moderna.
Aplicada à educação, a pedagogia aristotélica apoiava-se no princípio segundo
o qual todo ser humano está em constante devir, em busca contínua do que deve ser. A
finalidade da educação era desenvolver o mais plenamente possível as potencialidades
dos alunos. Levar o aluno a tornar-se que deve ser no que pode ser sendo sempre
conduzido para o bem. Para ele não existiam maus alunos, mas apenas portadores de
20 UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
potenciais diferentes, mas reais. A um professor não competia discutir o que o aluno
era, mas o que poderiam fazer por ele como causas eficientes.
A questão do desenvolvimento de potencialidades nos remete à reflexão das
contribuições aristotélicas à nossa atualidade. Teóricos modernos de nossa educação
indicam uma organização escolar que atenda às diferenças individuais. Essa ótica está
também contida na proposta de inclusão social para todos, na democratização real
da educação, oportunizando a todos o acesso ao conhecimento para que alunos se
construam subjetivamente.
Embora discordando teoricamente de seus mestres, encontramos nele o
princípio socrático da subjetividade como fonte e efetivação de conhecimento e o
idealismo de Platão na valorização do mérito de cada um. O subjetivismo de Sócrates,
e o realismo de Aristóteles mediado pelo idealismo de Platão, sedimentaram-se em
nossas práticas não apenas pedagógicas, mas também humanas.
1.2.2 OS SOFISTAS
O comércio e o florescimento das cidades levaram a sociedade grega a uma
condição de maior maturidade política, desvinculando-se paulatinamente da mitologia
e procurando formas mais científicas e filosóficas para resolver os conflitos próprios
da cidade.
Exigiam da ciência, que até então fora o agradável esporte de
saber pelo próprio saber, a solução dos problemas que os agitavam;
reclamavam dela o remédio para esclarecer a dúvida que ameaçava
destruir o crescente apogeu de sua própria cultura (LARROYO, 1970,
p.154).
Nesse contexto de transição do período arcaico para o clássico é que se situam
os sofistas.
2121UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
A sofística pode ser considerada como a arte de persuadir pelo discurso, sem
grandes preocupações com a veracidade dessa oratória. Sócrates, ferrenho opositor
dos sofistas, se opunha a esses discursos que considerava demagógicos e contrários
ao espírito grego puramente filosófico. Criticava ainda o fato de cobrarem por suas
aulas por ferir o direito de todos ao conhecimento.
Os sofistas eram professores itinerantes, indo de cidade em cidade, onde
trabalhavam mediante contratos. Vencidos estes, partiam em busca de outras fontes.
A oratória sofística atendia aos interesses de políticos e comerciantes na medida
em que convencia compradores com seus discursos inflamados e os levavam a concluir
grandes negócios.
O discurso sofístico como método de ensino ganhou tão grande notoriedade
naquele momento histórico, que no Império Romano foram criados cursos superiores
nos quais o mestre de retórica era o mais considerado. Esse gosto atravessou os tempos
e é presença constante em nossa época.
Como herança cultural sofística, podemos destacar o grande valor dado ao
academicismo e à inteligência intelectual, instituição do professor como profissional
da educação; a sistematização e organização escolar pela elaboração de um currículo.
Esse currículo era composto pelas Sete Artes Liberais- gramática, retórica, dialética,
aritmética, geometria, astronomia e música e chegou ao Brasil com os jesuítas.
1.2.3 OS PÓS-SOCRÁTICOS
As constantes guerras levaram pensadores da época em questão a não
encontrarem respostas significativas para os conflitos, nem na política, oratória ou
na metafísica. Essa discordância de pensamento gerou uma preocupação maior com
questões éticas, característica dos pós-socráticos. Destacaram-se nessa corrente os
estoicos e os epicuristas.
22 UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
Considerando a questão da materialidade como impeditiva da realização
humana, os estoicos, representados por Zeno de Cítio, propunham a libertação de
todos os prazeres materiais que pudessem causar sofrimentos, incluindo-se aqui o
domínio das paixões.
O ideal do sábio estoico era a ataraxia ou grande resistência à dor física ou
moral e indiferença à matéria; a apatia, processo de domínio das paixões e pela aponia
ou ausência de dor.
Tal perfil se revelou como ideal para os romanos em suas invasões expansionistas,
predominando na formação de seus militares, e ainda se faz presente em toda
formação desse tipo nas nossas sociedades ocidentais.
Os epicuristas, representados por Epicuro, tinham como o ideal do sábio o
hedonismo ou busca do prazer. A formação epicurista consistia em evitar tudo que se
opunha à felicidade. A busca do prazer, evitar todo medo, dor e sofrimento eram seus
objetivos. Satisfazer suas necessidades físicas e mentais era seu devir, o que deveriam
ser. Os seguidores de Epicuro entendiam que só os prazeres evitavam os sofrimentos.
Tal ótica se firmou como fundamento das orgias romanas e das nossas bacanais
atuais que não são meras coincidências, são históricas. Se desejarmos mudanças
nesse sentido necessitamos conhecer suas origens, porque dificilmente haverá futuros
melhores sem passado.
CONHEÇA MAIS
Os Inventores do Amor
“Éramos Andróginos”
A civilização que gerou filósofos como Sócrates e Aristóteles discutia
política, ciência e poesia durante os chamados simpósios, festas, nas quais
os participantes partilhavam uma grande taça de vinho. É em torno de
uma delas que se desenvolve “O Banquete”, célebre obra de Platão, uma
das mais reveladoras sobre o pensamento grego a respeito do Dmetade,
quando um dos convidados, Aristófanes, recorreu à mitologia para falar
sobre a origem do amor. Segundo ele, éramos seres andróginos de duas
2323UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
cabeças, quatro pernas e quatro braços. Temendo que o poder destas
estranhas criaturas ameaçassem os deuses, Zeus dividiu-as em duas outras
e desde então carregamos a sensação de estarmos sempre incompletos,
em busca da metade afastada de nós. (HARGREADEL, 2007, p.27)
DICA DE FILME
Tróia; 300; Alexandre, O Ladrão de Raios.
Nesta breve síntese procuramos mostrar a presença da cultura grega na
construção de nossa sociedade. Aprofundar-se nesses fatos é, ao mesmo
tempo, um convite e um desafio aos nossos futuros educadores.
1.3 O PENSAMENTO PEDAGÓGICO GRECO-ROMANO
Roma, ao contrário da Grécia, teve uma política expansionista de seu território
na busca de terras cada vez mais agriculturáveis.
Enquanto os gregos buscavam o conhecimento sem intenção prática, os
romanos colocavam-no a serviço da pátria. A filosofia grega permaneceu entre os
romanos, mas com esse caráter pragmático de servir a Roma. Preocupada em formar
seus exércitos e com suas conquistas, entregavam seus filhos a pedagogos gregos,
que dessa forma perpetuaram sua filosofia e pedagogia.
A educação romana evoluiu na medida em que Roma se expandia. Originária
de uma sociedade cujas tribos iniciais eram formadas pelos itálicos ou italiotas e
organizada em regime de comunidade primitiva e não escravista, também tinha suas
formas de sobrevivência apoiadas na agricultura, pastoreio e artesanato.
Sua pedagogia estava alicerçada no “paterfamílias”, o pai como autoridade
suprema e absoluta, cujo perfil encerrava o conceito de poder máximo sobre todos
que estivessem sob sua liderança.
24 UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
Politeístas e antropomórficos, sua pedagogia se caracterizava pelo culto aos
deuses e antepassados, patriarcal doméstica e com ausência total de escolas.
Com o aumento do comércio de cereais, Roma expandiu seu território e deu
origem às cidades, as “urbs” romanas. Era uma sociedade estratificada em classes cujas
camadas eram formadas por patrícios, plebeus e escravos, com pequenas possibilidades
de mobilidade social. Os patrícios compunham uma aristocracia de nascimento porque
se consideravam descendentes de Rômulo e Rêmulo, supostos fundadores de Roma.
Sua pedagogia se pautava pelos valores da elite num reforçamento dos poderes
patrísticos.
Com o aparecimento de muitas cidades por conta de um comércio cada vez
mais intenso, Roma se expandiu até se constituir politicamente em uma República. Sua
pedagogia estava toda voltada para as elites, perpetuando seus valores. A educação
escolar passou a ser uma exigência dessa mesma sociedade.
A República Romana tornou-se muito poderosa e expandiu-se para além de seu
território, constituindo um vasto e dominante Império.
O contexto do Império teve grande desenvolvimento cultural e urbano, além de
franca expansão do comércio. Caracterizou-se pela construção de grandes templos,
aquedutos, termas, estradas, edifícios públicos e portos. Tornou-se complicado
administrar o Império e manter o poder político sobre todos os povos conquistados.
O Império teve sua pedagogia definida pela “Humanitas” por decorrência da
expansão do mesmo. Tinha um sentido de universalidade. Onde estivesse o domínio
romano, sua juventude deveria ser educada à maneira romana. A “Humanitas” foi
greco-romana, e consistia na formação filosófica grega combinada com o sentido
prático dos romanos em colocá-la a serviço da pátria. Compreendia o ensino das
humanidades tanto para os romanos como para os povos conquistados. Culturalmente,
houve grande expansão de bibliotecas, museus, apoio à Universidade de Atenas e
fundação do ateneu no Capitólio romano.
A Magna Grécia foi uma colônia fundada ao sul da Itália pelos helenos, com
povos de várias procedências, mas com forte predomínio grego. Os romanos em
2525UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
contato com a Magna Grécia contrataram professores gregos helênicos para educar
seus filhos. Esses, a fim de perpetuarem a filosofia grega ensinavam em duas línguas:
o grego e o latim.
As escolas organizadas para consecução desses ideais eram encíclicas. De zero a
2 anos a criança permanecia no lar aos cuidados da mãe ou de uma matrona romana.
A partir dos 7 anos as meninas permaneciam no lar e os meninos passavam para a
tutela do pai. Dos 12 aos 16 anos os meninos estudavam na escola dos gramáticos,
cujo currículo era composto da análise dos clássicos gregos e da arte da retórica.
A retórica sofística era a disciplina mais conceituada, na medida em que
persuadir pelo discurso era fundamental para o senado romano, para os juristas e
para a competição nos negócios. Os mestres de retórica eram bem pagos, lecionavam
para as elites no preparo dos tribunos. O currículo era composto de política, retórica,
filosofia, gramática grega e latina. Como dado importante da permanência da cultura
grega, muitos jovens foram enviados à Universidade de Atenas para completar os
estudos. É interessante também ilustrar o respeito dos romanos pela educação grega.
Quando invadiram a Grécia, respeitaram aquela instituição e não a destruíram.
Também entre os romanos não encontramos uma concepção clara sobre a
infância, eles demonstravam apenas uma noção subjacente de que seus meninos
deveriam ir à escola aos 7anos para uma aprendizagem elementar. Ainda na puberdade
eram encaminhados ao ginásio para o que consideramos hoje como aprendizagem de
nível médio.
Em se tratando de educação romana helênica, é fundamental destacar-se o
ensino jurídico como meio de solucionar conflitos decorrentes de tal conjuntura social.
O futuro jurista frequentava um curso superior de Direito Romano por cinco anos. Esse
direito constituiu-se nos fundamentos de todo o direito das sociedades ocidentais, nas
quais se inclui a nossa.
Os principais expoentes da “Humanitas” foram Cícero, Sêneca e Quintiliano.
Cícero destacou-se por rígida formação moral, orador com sólida cultura geral
e rigorosa formação jurídica. Sêneca, filósofo estoico, estimulava a formação da
juventude para o domínio das paixões, moral, virtuoso e com tranquilidade de alma.
26 UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
Quintiliano, como pedagogo, deu preferência aos aspectos práticos da educação e
valorizou a psicologia como instrumento para conhecer a individualidade do aluno.
Não podemos deixar de abordar, ainda que rapidamente, a questão de mudanças
na estratificação social romana, que foi a ascensão da plebe. Plebeus eram os homens
livres camponeses, comerciantes, artesãos, porém sem direitos políticos. Lutaram por
direitos civis e políticos, conseguindo representatividade no senado pelo Tribunato da
Plebe, o casamento misto e o estudo da Lei das Doze Tábuas.
A consequência pedagógica mais significativa dessa expansão foi a criação
de escolas elementares e particulares, denominadas de “ludi magister” ou mestres
de jogos. Esses mestres eram pessoas simples sem grande formação intelectual, mal
pagos, sem material e espaço físico adequados. As crianças escreviam em tábuas
com estiletes e memorizavam sob as ameaças de uma disciplina extremamente rígida.
Acho que em muitos aspectos ainda estamos vendo esse filme, não é?
Ao encerrarmos essa abordagem greco-romana, é imprescindível mencionarmos
o nascimento de Cristo na Judeia, então sob o domínio romano, e que se constituiria
na grande força aglutinadora no decadente Império e daria início à Idade Média, de
primordial importância para a educação brasileira e de toda a América Latina.
DICA DE FILME
Nero; Império Romano; Cleópatra.
Nero-O filme narra o domínio e a personalidade paranóica de Nero e
também o início da perseguição aos cristãos por ele acusados de incendiar
Roma.
Império Romanao e Cleópatra expressam a expansão romana e conquistas
de territórios.
2727UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
1.4 IDADE MÉDIA
Se percorrer gregos e romanos é reconstruir nossa cultura, percorrer a Idade
Média é sem dúvida fundamentar toda a educação brasileira e latina. Organizações
escolares, procedimentos didáticos, medidas disciplinares, memorizações, equívocos
nas concepções da infância e da adolescência, entre outros aspectos, ainda estão
presentes em nosso cotidiano escolar.
Fatos políticos como a invasão dos povos bárbaros e outros de ordem social
e administrativa e decadência moral das elites romanas, foram, de maneira geral,
determinantes da queda do Império Romano.
Como já o dissemos, Cristo nasceu na Judeia e sua doutrina universalizou-se
pela ação dos evangelistas A doutrina de Jesus se expandiu para o mundo e começaram
as primeiras comunidades cristãs.
Porém, ao fundir-se o Cristianismo primitivo com velhas concepções
do mundo e da vida, não só da Palestina, mas também da Grécia e
de Roma, foi se gerando um conjunto de crenças e de ideias cada vez
mais universal. O resultado disso foi a Igreja Católica (LARROYO, 1970,
p.257).
Considerada como subversiva pelo poder romano, os cristãos foram largamente
perseguidos pelos imperadores. Apesar dos grandes sacrifícios aos quais foram
submetidos surgiram como uma grande força aglutinadora das massas e dos exércitos
atraídos e convertidos pela filosofia cristã. Fundamentada no “charitas”, amor e
igualdade entre os homens, Cristo acenava com possibilidades de melhores condições
de vida aos menos favorecidos. Nesse contexto, para que não fossem dominados
pelas massas cristãs, foi que Constantino, imperador romano, decretou o cristianismo
como a religião oficial de Romano, ano 315 D.C., concedendo a liberdade de culto
religioso.
28 UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
A adesão da elite romana teve como consequência um cristianismo com
características mais políticas que propriamente religiosas. A estrutura social era
composta pela nobreza, clero, camponeses ou servos. Cada estamento era uma
concessão divina de Deus aos homens, que manteve-se pelo monopólio de tarefas.
Cumprir as tarefas determinadas por Deus significava zelar pela vontade divina. Aos
nobres cabia zelar por todos, ao clero orar e converter a todos os servos; antigos
escravos, produzir para todos. Os dissidentes poderiam ser julgados como hereges e
até enfrentar os tribunais da Inquisição.
O comércio retroagiu, como também o poder das cidades. Refugiados em
grandes castelos e terras, os feudos, os nobres recomeçaram uma economia fundiária
baseada na terra. A posse de terra era o símbolo de poder; quanto mais terra, mais
força política.
À medida que o cristianismo se consolidou como forma política, ser padre
se tornou uma posição de alto prestígio e poder. As grandes famílias, para garantir
seu prestígio, encaminhavam seus filhos e seus dotes para a carreira eclesiástica.
Conforme o valor do dote, o baixo e o alto clero eram constituídos. Como única
classe intelectualizada, detentora de grande poder econômico pela posse de terras
e do controle divino por serem os únicos estudiosos dos Evangelhos, os eclesiáticos
influenciaram poderosamente os comportamentos sociais, da nobreza aos servos.
O ideal educativo medieval descentralizou o humanismo greco-romano para
um ideal cristocêntrico. Sem afastar-se do homem, subordina sua formação de modo
a servir a Cristo para salvar a própria alma. A filosofia educacional era definida pela
Patrística, cuja origem remonta ao final do Império romano com os padres apostólicos
que tiveram contato imediato com os apóstolos. A ação dos Pais da Igreja se desenvolveu
ao longo dos séculos e se consolidou após o Édito de Constantino, definindo o ideal
de homem cristão. A formação cristã permeou toda a educação, desde as elites até
os servos, na qual todos deveriam subordinar-se a Cristo e imitá-lo, assim a criança
deveria ser introduzida e educada religiosamente desde cedo conforme a sua posição
social.
Considere-se que as concepções sobre a infância estavam muito distantes dos
nossos sentimentos e de nossa visão sobre a criança e o adolescente. Esses eram
2929UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
considerados apenas adultos em miniatura, tendo como critério para educá-los apenas
o tamanho corporal e não o estágio psicológico.
Estigmatizadas pelo pecado original eram, não raro, comparadas a pequenas
víboras a serem vergadas pela religião. Pedagogicamente, nessa forma de se perceber
a infância, significava que poderia aprender e a fazer da mesma forma que um adulto.
[...] os alunos iniciantes geralmente tinham cerca de 10 anos, mas seus
contemporâneos não prestavam atenção nisso e achavam natural que
um adulto desejoso de aprender se misturasse a um auditório infantil,
pois o que importava era a matéria ensinada, qualquer que fosse a
idade dos alunos (ARIÉS, 1973, p. 108).
Qualquer semelhança com organizações escolares e planejamentos inadequados
à natureza dos alunos, ainda tão presentes nos dias atuais, ou são erros históricos que
não devem se repetir ou interferências ideológicas se utilizando deles para atingir
objetivos diversos dos interesses da sociedade.
Considere-se que toda educação, quer escolar, quer clerical, consistia em
adestrá-las graças a uma disciplina autoritária e rigorosa e vergá-las pelos castigos
físicos. Com esse espírito as crianças eram educadas conforme sua classe social.
Assim, o ideal educativo para a nobreza era a formação do perfeito cavaleiro
que deveria aprender a cavalgar, atirar com arco, lutar, caçar, jogar xadrez, versificar,
ser virtuoso, protetor dos fracos e das viúvas, fiel a Deus, à Igreja, a sua dama e ao seu
senhor. Iniciava essa formação a partir dos 7anos como pagem e aos 21 anos entrava
para a ordem da cavalaria na cerimônia da espadeirada. A formação intelectual
não era importante e, geralmente não passava de rudimentos de leitura e escrita.
Detalhes de uma educação para o ócio como essa só interessam aos estudiosos do
desenvolvimento histórico dos preconceitos e privilégios.
A nobreza romana refugiou-se em seus castelos e feudos, mas as pessoas que
não tinham posses para isso permaneceram nas vilas e cidades, também denominadas
de burgos. À medida que foram se firmando economicamente, foram também
30 UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
exigindo direitos políticos e entre eles, tinha um sistema educacional municipal e uma
educação técnica para os que almejassem um ofício.
É importante salientar que essas escolas municipais se constituíram em marcos
iniciais do período de transição, sinalizador do fim da Idade Média, pela lenta ascensão
dos burgueses, que se consolidariam na Revolução Francesa e aí estão até hoje com
seus vícios e virtudes. Ainda profundamente religiosas, essas escolas foram um direito
adquirido pelos habitantes dos burgos, os burgueses. Eram escolas unitárias com os
alunos reunidos em três seções: os tabulistas, donatistas e alexandritas.
Os tabulistas aprendiam a ler, escrever e contar em tábuas em formato de
cartão. Escreviam letras, frases, o Pai Nosso e o Credo. Os donatistas eram grupos
intermediários que aprendiam latim em um livro de textos escritos por Donato. Os
alexandristas aprendiam gramática na obra de Alexandre de Vila Rei.
Eram escolas marcadas por uma disciplina rígida, com castigos físicos, memorista,
cuja metodologia ancorava-se em ditados e cópias devido à ausência de livros. Seus
professores eram ambulantes como os sofistas e a maioria padres paroquiais.
Os burgueses não possuíam servos para produzir para eles e sua forma de
sobrevivência advinha das produções artesanais das corporações de ofício e voltadas
para um mercado consumidor ainda que incipiente, reiniciando, lentamente, a
retomada do comércio. Ao terminar a formação inicial nas escolas municipais
paroquiais, o adolescente era encaminhado para a aprendizagem de um ofício. A
atividade comercial dos artesãos era regulamentada pelas corporações de ofício,
precursoras dos sindicatos, que se organizavam em grêmios, compostos pela associação
de artesãos do mesmo ofício;
Esses artesãos eram muito organizados e habitavam a rua do mesmo ofício
a qual davam o nome de um santo patrono. Além da produção manual de móveis,
vestimentas, ourivesaria, armas, também constituíram uma classe de mercadores
e banqueiros, desde então considerados os mais progressistas por multiplicarem o
capital circulante, firmando uma espécie de nobreza financeira. Aí temos o embrião
histórico do capitalismo.
3131UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
Essa educação gremial era técnica e profissionalizante. Mantida pelos grêmios,
realizava-se diretamente dentro das oficinas, no próprio trabalho, onde aprendiam
a fazer, fazendo. O professor era o mestre do ofício e dono da mesma. O mestre
hospedava o aluno, provendo suas necessidades básicas e exercia sobre o menino
completa autoridade. Estava organizada em graus e após os fundamentos iniciais o
aluno atingia o grau de companheiro. Era um período de aperfeiçoamento. Podiam
permanecer na casa do mestre e passavam a ser assalariados; podiam emancipar-se e
peregrinar ou ascender a um grau superior, a mestria. Era o grau mais elaborado da
educação gremial e para obtê-la o aluno deveria elaborar uma obra de mestre, que
ao ser aprovada conferia o grau de mestre, sendo nomeado oficial. Ele também podia
montar sua oficina e participar com voz e voto nas assembleias do grêmio.
Temos aí as raízes da educação técnica com grande aceitação social neste nosso
momento histórico, a organização do ensino em graus e o mestrado como exigência
para exercícios profissionais mais exigentes.
Conforme já o citamos, cada classe social era educada de maneira específica e
resta-nos tratar da educação dos padres, dos servos e das mulheres medievais.
Como perpetuação secular da filosofia e humanismo grego, interessa-nos a
educação monacal. Os mosteiros, por definição etimológica, significavam locais
de solidão e abrigavam os padres desejosos de entregar-se ao aprofundamento do
cristianismo. Nesse isolamento se tornavam grandes copistas dos escritos gregos. Essas
cópias eram mantidas em profundo segredo por significarem uma ampla liberdade
do homem nas suas escolhas, independentemente da Igreja Católica. Esses escritos
permaneceram como documentos históricos sobre toda a cultura grega e chegaram
até nossos dias. Foram preservadores daquelas culturas.
Outra dimensão da educação clerical foi a ministrada nas escolas episcopais
pelos padres catequistas, assim chamados por utilizarem o “katchen”, ou catecismo
com a finalidade de formar os mestres cristãos. Fundaram seminários para a formação
de bispos e de funcionários eclesiásticos.
A filosofia dessas escolas estava consubstanciada na Escolástica, composta por
um conjunto de saberes transmitido nas escolas clericais.
32 UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
Tomás de Aquino, codificador literário da escolástica, conciliou a razão grega à
fé cristã. A revelação divina era suprarracional, mas não antirracional. Como acima da
razão humana, deveria ser aceita por esta sem contestações.
O Ato Puro de Aristóteles deixou de ser um deus demiurgo para ser criador e a
busca do bem platônico, a proposta de amor cristão. As potencialidades aristotélicas
eram obra divina e segundo a Teoria da Iluminação Agostiniana, habitam o homem
e o orientam pelos corretos caminhos da fé. A filosofia cristã que dirigiria o mundo
pelos séculos era uma síntese de cristianização de gregos e romanos.
Como herança pedagógica temos a obra de Tomás de Aquino, “De magistro”
de caráter altamente acadêmico, com supervalorização da educação intelectual em
detrimento da formação técnica, reservada para almas inferiores. Classificaram assim
as profissões em profanas e sagradas.
Outra herança cultural que interessa de forma especial para compreendermos
o descaso com a educação das massas nos tempos atuais foi a que se destinou aos
servos e as mulheres medievais. Convém que antes desse relato salientemos que todo
o pensamento pedagógico medieval foi transportado integralmente pela Companhia
de Jesus para educar o Brasil e a América Latina. Por aqui permaneceu de forma
contundente por mais de 500 anos e ainda tem traços muito significativos em nossas
escolas.
Quem eram os servos medievais? Eram antigos escravos convertidos em servos
por exigência cristã, pois os “charitas” cristãos não admitiam escravos. Convertidos
em servos não podiam ser vendidos, mas se o feudo fosse comprado acompanhavam o
novo senhor, pertencendo ao suserano na mais completa ignorância. Não frequentavam
escolas e tinham apenas instruções limitadas ao cultivo do campo. Aprendiam ideias
religiosas simples nas paróquias.
Perante a moral cristã católica, a mulher era inferior ao homem, considerada
um apêndice dele por ter sido gerada de sua costela. Era tida como responsável pelo
pecado original e por isso fora castigada com as dores do parto e com a dominação
masculina. Eram completamente excluídas das funções políticas e submetidas ao
pátrio poder, sem liberdade até para escolher o marido.
3333UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
PARA REFLETIR
1 Repense sua própria escolaridade e verifique se encontra nela traços da
educação medieval.
Provavelmente você deve ter encontrado muitos professores ocupando
o centro do processo educativo, o cerceamento dos alunos dentro dos
estreitos limites de uma sala de aula, muita violência simbólica, muitos
alunos esquecidos, avaliações memoristas, etc. Fique atento!
2-Você encontra traços da produção de sofismas em nosso tempo? Quais?
Provavelmente você os identificou nas propagandas enganosas da
mídia, de líderes religiosos, na exaltação ao triunfo das nulidades, e
fundamentalmente, na demagogia política que parece ter vindo para
ficar.
Nossa contribuição como educadores parece ser mudar ou mudar, ser
sujeito e não objeto da história a ser construída.
Você encontrará excelentes leituras complementares em Aranha:
ARANHA, Maria Lúcia. História da Educação e da Pedagogia:geral e do
Brasil. São Paulo: Moderna, 2006.
DICA DE FILME
“O Nome da Rosa” refere-se ao esclarecimento sobre crimes da Igreja
Católica em um convento medieval e sobre o papel da Inquisição.
“O Gladiador” - Período do Império Romano e seus bastidores políticos.
Na magnífica interpretação de Roussel Crowel nos premia com um banho
de cultura imperdível. Confira!
34 UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
1.5 CONSIDERAÇÕES DA UNIDADE I
Encerramos aqui nossa síntese sobre este período da História da Educação e
fica o convite para o aprofundamento de cada um de seus aspectos. Você encontrará
detalhes em nossa indicação bibliográfica, em filmes, literatura, teatro, leituras
complementares.
Procuramos também destacar o pensamento pedagógico medieval como
fundamento da educação brasileira. Voltaremos oportunamente a essa questão.
Neste breve histórico sobre a importância da História da Educação para a
função do ofício de educador, pode-se inferir que até este presente momento ainda
temos dificuldades em definir qual a natureza de nossos alunos. Consideráveis atrasos
nessa definição têm sedimentado crenças equivocadas no trato didático daqueles que
necessitamos educar.
Embora fundadores de princípios filosóficos transcendentes, os gregos não
cogitavam sobre a natureza própria das crianças e jovens, o mesmo se repetiu com
os romanos se considerarmos as condições precárias das escolas infantis, além
da grande preocupação com a militarização da juventude. A Idade Média anulou
qualquer tentativa nesse sentido ao considerar as crianças como adultos em miniatura
e pecadoras.
3535UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
TESTE SEU CONHECIMENTO
36 UNIDADE I - RAÍZES HISTÓRICAS
3737UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA 37
U N I D A D E I I
2A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA
OBJETIVOS DA UNIDADE
• Definir o contexto sociocultural do Renascimento e os primórdios da
industrialização na Idade Moderna;
• Situar as mudanças que redefiniram o papel da escola e as decorrentes
alterações nas concepções da infância e da adolescência;
• Analisar o caráter inovador da Reforma Protestante e o conservadorismo
da Contrarreforma católica.
HABILIDADES E COMPETÊNCIAS
• Inserção da educação escolar no contexto do capitalismo renascentista
e industrial da Idade Moderna;
• Compreensão das relações entre a Contrarreforma, a Cia de Jesus e
a educação brasileira.
38 UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA38
2.1 O CONTEXTO DO RENASCIMENTO
O Renascimento foi o período de transição entre a Idade Média e a Idade
Moderna. A partir da Itália, mais precisamente da cidade de Florença, expandiu-se por
toda a Europa nos séculos XIV, XV e XVI.
Representou a decadência do poder da Igreja católica sobre a sociedade
europeia. Olivieri (1989, p.3) considera essa época como “[...] um dos momentos mais
ricos e férteis que a humanidade já viveu em sua história”.
A transição da economia medieval agrícola e fundiária foi lentamente sendo
submetida aos avanços do comércio burguês, que foi retomado pelas produções das
corporações de ofício medievais. O sistema feudal foi entrando em decadência pela
supremacia econômica desse comércio. O poder papal se debilitou e a própria unidade
católica sofreu grande impacto, não só pela dissidência entre os papas de Roma e da
França como pela Reforma Protestante.
A nova sociedade que foi imergindo pelo aumento das cidades, locais ideais
para as práticas comerciais, foi sentindo o desejo constante de laicizar as questões
econômicas da religião.
O desenvolvimento desse comércio sofreu um grande impacto pela tomada de
Constantinopla pelos turcos, ao norte da África. Por ser esse o ponto de entrada para
as caravanas que negociavam com as Índias, navegar tornou-se necessário e urgente,
o que culminou no grande desejo dos soberanos europeus de encontrar um caminho
marítimo para aquela região.
As grandes invenções favoreceram os descobrimentos revelando à Europa um
novo e imenso mundo com outras culturas, o que também colocou em cheque o
poder cristão medieval. A invenção da imprensa colocou o saber ao alcance de todos, a
bússola possibilitou direções mais seguras para os navegadores, a invenção da pólvora
transformou a arte da guerra e da defesa, a imprensa oportunizou grande expansão
de livros, socializando o conhecimento e propagando ideias que favoreceram a
3939UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA 39
popularização do Humanismo e da Reforma Protestante. A pedagogia experimentou
notáveis mudanças com a multiplicação de materiais impressos.
A circulação das ideias, devida à imprensa e ao movimento
humanista, aumentou de modo considerável graças à emigração dos
gregos expulsos de Constantinopla pelos turcos (1493). Muitos sábios
destas terras levaram para o ocidente os tesouros de suas bibliotecas
e de sua sabedoria. Produziu-se vigorosa atividade intelectual, ávida
de conhecer a cultura clássica; renascia a Antiguidade; ocorria um
renascimento da cultura greco-romana (LARROYO,1970, p.349).
O ideal educativo deixava, paulatinamente, de ser cristocêntrico para ser
novamente humanista e individual, na mais pura maneira socrática. Foi o retorno do
homem ao centro educativo. Procurava-se um ideal de homem diferente do medieval,
um homem situado no mundo. O Humanismo, em sua essência, não foi irreligioso,
apenas procurava vencer o teocentrismo da Idade Média, não era contra Cristo, mas
contra o poder da Igreja Católica que antagonizava o desenvolvimento do comércio.
Buscava um saber mais humano que religioso.
Esse movimento manifestou-se de forma contundente no desenvolvimento das
ciências e das artes. A respeito, apreciemos a citação de Monroe,1978, p.149:
O estudo das literaturas clássicas não só se torna a principal
manifestação externa do espírito do Renascimento, como proporciona
os meios de uma nova vida. Isto porque as novas aspirações para
o desenvolvimento de uma personalidade moral livre, intelectual,
tanto quanto emocionalmente, não encontravam bases no passado
imediato e nem na atualidade, porém, a vida dos antigos, revivida na
sua literatura, ministrava modelos e incentivos para a imitação.
40 UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA40
2.2 A PEDAGOGIA INOVADORA DA REFORMA PROTESTANTE
O clero católico, possuidor de grande poder político, econômico e social, que
deveria atender os anseios espirituais dos povos europeus estava muito mais ocupado
em ampliar seu poder financeiro do que com as necessidades da alma dos fiéis. A falta
de sensibilidade com a qual a Igreja encarou esse momento delicado manifestou-se
na comercialização de relequías, tidas como sagradas, e na venda de indulgências.
Segundo Veiga,1991, p.24, “calculava-se quantos anos de perdão das provas do
Purgatório era possível se obter com a posse de determinada peça de vestuário de um
santo ou com o valor da doação feita para o tesouro da Igreja”.
Desse modo, somente para os que podiam pagar o preço exigido pela Igreja
era garantida a salvação da alma e isso aumentava os conflitos para aqueles que
necessitavam de assistência espiritual vinda da instituição religiosa. Acrescente-se a
isto, o comportamento escandaloso do clero, que vivia em total desacordo com o que
pregava.
Martinho Lutero, membro da Igreja Católica, inconformado com esse estado
de coisas e angustiado com a salvação da própria alma, publicou 95 teses na porta
da igreja de Wittenberg, Alemanha, que desencadeou um processo religioso de
proporções muito elevadas que deu início ao protestantismo e levou ao movimento
denominado de Reforma.
O credo protestante negava a autoridade do papa, dos padres da Igreja e dos
concílios, admitindo apenas a autoridade do Evangelho, concedendo ao homem o
direito do livre exame do mesmo sem a mediação dos padres.
Consideravam a riqueza material como uma conquista humana a ser obtida
para a glória de Deus e melhor servi-lo. Tal concessão resultou em maior liberdade
econômica para os países que se libertaram da excessiva centralização de Roma,
possibilitando melhores condições para o novo sistema econômico que surgia: o
capitalismo. Entendemos oportuno comentar que os países que se desenvolveram sob
a ética protestante são hoje grandes potências econômicas e o mesmo aconteceu com
4141UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA 41
os que foram colonizados por esses princípios, como os Estados Unidos. Já com os que
foram influenciados pela ética, ocorreu o contrário, e em pleno século XXI, atingiram,
no máximo, a posição de emergentes, como é o caso do Brasil.
Pedagogicamente, por conceder ao homem a liberdade de consulta aos
Evangelhos, entendiam que todos tinham o direito de aprender a ler. Geralmente,
ao lado de uma igreja protestante havia uma escola, ocorrendo o início das escolas
leigas e públicas. Assim, modificaram a filosofia da educação agora voltada para a
formação do espírito crítico, introduziram um currículo diversificado em humanidades
e ciências, rompendo com a seletividade das escolas confessionais e religiosas
católicas. Escolas leigas proliferaram na Europa convivendo com escolas confessionais.
Além de contribuírem com a democratização da educação escolar, inovaram seus
objetivos, conteúdos, métodos e currículos pela introdução das ciências e empenho
no desenvolvimento do espírito crítico.
2.3 A CONTRARREFORMA E O CONSERVADORISMO PEDAGÓGICO CATÓLICO
A Igreja Católica reagiu e esta reação denominou-se de Contrarreforma. Como
um dos mecanismos do contra-ataque criou a Companhia de Jesus com o objetivo de
educar a juventude e resgatar províncias perdidas para os protestantes.
Fundada por Inácio de Loyola, um militar que se convertera ao catolicismo,
deu a essa ordem um caráter rigidamente militar a serviço da Santa Sé. Inicialmente
fundada como uma ordem religiosa missionária, dedicou-se à formação de padres
cultos, eruditos, moralmente intocáveis com a finalidade de combater os protestantes.
Mas ao longo do tempo foram assumindo a função educativa destinada a manter
a juventude fiel ao catolicismo. Fundaram então o Colégio dos Jesuítas, no qual
preservaram o currículo medieval escolástico acadêmico das Sete Artes Liberais
sem inclusão de disciplinas científicas. A metodologia do ensino continuou livresca,
memorista e sob rigorosa disciplina, que incluía castigos físicos e morais.
42 UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA42
Vieram para o Brasil em 1554 com a finalidade de impedir o avanço protestante
na colônia e influenciaram fortemente a educação brasileira por quase 500 anos e com
significativa presença nas posturas e didáticas atuais. A pedagogia da Contrarreforma
manteve-se conservadora, reprodutivista e católica.
2.4 PEDAGOGOS RENASCENTISTAS E AS MUDANÇAS NAS CONCEPÇÕES DA INFÂNCIA
Retomando a questão do Humanismo pedagógico, este caracterizou-se pela
existência de elementos novos.De um lado, uma sociedade desejosa de mudanças
e de outro, a resistência dos conservadores, como foram os colégios dos jesuítas. A
dualidade dessa educação reproduzia a divisão da sociedade moderna em católicos e
protestantes.
Entre os inovadores se destacaram como pedagogos renascentistas Victorio
de Feltre, Erasmo de Rotherdam, Rabelais, Michele de Montaigne e seguidores.
Possivelmente, a contribuição mais significativa desses pedagogos foi a de começar a
produzir mudanças nas concepções sobre a infância e a adolescência, fazendo uma
crítica contundente à educação medieval, livresca, memorísta e dissociada da vida dos
alunos.
Victorino de Feltre (1373-1443) fundou na Itália a ”Casa Giocosa” ou “casa
alegre”, introduzindo a pedagogia atrativa, cujos traços se veem em seu lema: ”Vinde
ó meninos, aqui se instrui, não se atormenta” (Feltre; apud ARANHA, 2006, p.126).
Assim, visava-se a formação integral dos alunos, fortalecendo o corpo e o espírito
pela alegria de viver. A relação professor/aluno deveria ser alicerçada no amor sem
desviar-se da moral cristã, mas sem subordinações.
Na França, Rabelais (1494-1553) teve como grande mérito pedagógico o
rompimento com o caráter formalista e livresco do catolicismo, propondo a condução
do ensino de forma prática e por meio de uma didática em contato direto com a
natureza. Em sua obra educativa, “Gargântua e Pantragruel”, de forma irônica e
4343UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA 43
jocosa colocou sua crítica sobre a educação medieval, que considerava distante do
interesse infantil e da vida real.
Notável como contribuição a uma nova forma de se ver a criança foi o
trabalho de Michel de Montaigne, na crítica contundente à educação de seu tempo,
considerando-a apenas contida nos livros, separada da vida, pedante e sustentada
pelo medo dos castigos corporais. Questionava sobre o juízo que realmente tinham
sobre uma educação completamente afastada da vida real. Preconizava a educação
do juízo, que podemos considerar como sendo a formação do espírito crítico a ser
construído desde criança.
Aqui já temos os primeiros passos que consideravam a criança com construtora
do próprio juízo. Aparece a figura do preceptor como orientador dessa criança e não
propriamente aquele que ensina, era aquele que não apenas falava, mas que também
ouvia. Rejeitava alunos como sujeitos passivos e propunha métodos ativos. Pode ser
considerado o precursor da pedagogia realista, que se concretizaria na Idade Moderna.
Erasmo de Rotterdam, (1467-1336), holandês, não se distanciou de seus
contemporâneos nas críticas à educação católica.
“Erasmo defendia o respeito ao amadurecimento da criança e por isso criticava a
educação vigente, excessivamente rigorosa recomendava o cuidado com a graduação
do ensino e o abandono dos castigos corporais” (ARANHA, 2006, p.133).
2.5 A CONSOLIDAÇÃO DO MODELO INDUSTRIAL E A CONSEQUENTE PEDAGOGIA REALISTA
Em fins do século XVI o estilo de vida da sociedade europeia começava a
ultrapassagem para a era industrial.
Como consequência do avanço e consolidação do comércio, os modos de
produção foram se transformando para atender a um mercado cada vez mais consumidor.
44 UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA44
Foram assim superadas as produções artesanais individuais das antigas corporações
de artes e ofícios medievais, dando lugar, inicialmente, pela reunião de artesãos em
um mesmo local, iniciando-se os trabalhos coletivos que durante os séculos XVI e XII
evoluíram para as manufaturas e destas para a industrialização. Já nas manufaturas
teve início a divisão do trabalho, em que cada trabalhador passou a executar uma tarefa
específica, originando-se assim as especializações tão em moda hoje em dia.
A intervenção das ciências como força produtiva, o êxodo rural para trabalhar nas
fábricas, promoveram mudanças sociais e políticas e, entre elas, os questionamentos
sobre a educação escolar se torna imperioso.
O pensamento pedagógico moderno privilegiou as ciências naturais e a análise
da adequação das instituições escolares ao novo modelo econômico, superando o
Renascimento, de modo a fundamentá-lo no uso da razão científica.
Se você é um observador astuto, já deve ter percebido o retorno do nosso
Aristóteles ao propor como forma de conhecer a verdade objetiva o realismo das
relações de causa e efeito no determinismo natural.
A educação deveria ser uma preparação direta para a vida
prática. Útil, vitoriosa e feliz do homem de negócios, numa civilização
bastante formal nas suas pretensões, mas caracterizada pela ausência
de rigidez quanto às normas de conduta (MONROE,1978, p.201).
A citação de Monroe explicita as exigências educacionais dos novos tempos
industriais.
Para nós educadores interessa particularmente, entre outros representantes,
as contribuições de João Amós Comênio, o educador que colocou na sua prática
pedagógica um modelo de realismo sensorial ao consolidar a crença de que o
conhecimento se adquire primeiramente pelo treino das percepções sensoriais. Os
sentidos humanos (tato, visão, audição, olfato e paladar) nos colocam em condições
naturais de aprendizagem. Como uma das formas para atender às crianças, o ensino
era em língua vernácula por ser mais coloquial que o latim.
4545UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA 45
Fiel a essa doutrina, vai propor como materiais didáticos aqueles que podemos
retirar da natureza e como método de ensino a prática da indução, substituindo a
dedução tomista como meio de se chegar ao conhecimento. Nesse sentido, o aluno
iria percorrendo os caminhos da construção dos seus conhecimentos até inferir os
princípios gerais que regem os fenômenos.
Filosoficamente era adepto da “pansofia” e de seu sentido democrático de
se ensinar tudo a todos, por considerar que o conhecimento não era privilégio dos
mais abastados. É tido como o precursor das primeiras tentativas de uma psicologia
educacional e dos planejamentos do ensino. O saber a ser ofertado aos alunos deveria
ser reduzido, aplicado pelo método indutivo e na língua materna.
A grande inovação pedagógica de Comênio estava em seus manuais didáticos,
nos quais colocava o percurso de cada aula. Se no medievalismo e princípios do
Renascimento consideravam que a mente infantil era oca e vazia e que nela se poderia
imprimir tudo o que se desejasse, Comênio recomendava que todo ensino deveria levar
o aluno a perceber pelos sentidos os novos desafios dos conteúdos. Essa percepção
deveria ocorrer de tudo que pudessem ver, apalpar, degustar, cheirar, ouvir. Como
os sentidos não podem ver, apalpar, degustar, cheirar ou ouvir as ideias abstratas,
coerente com esses princípios, para ele o ensino deveria partir do concreto para o
abstrato, do simples para o complexo, do próximo para o remoto.
Sua obra pedagógica mais significativa nesse sentido pedagógico foi a Didática
Magna, atual até nossos dias.
CONHEÇA MAIS
Aprenda-se a fazer fazendo.
Os mecânicos não detêm os aprendizes de suas artes como especulações
teóricas, mas põem-nos imediatamente a trabalhar, para que aprendam
a fabricar fabricando, esculpir esculpindo, a pintar pintando, a dançar
dançando, etc. Portanto, também nas escolas, deve-se aprender a escrever
escrevendo, a falar falando, a cantar cantando, a raciocinar raciocinando,
etc..., para que as escolas não sejam senão oficinas onde se trabalha
fervidamente. Assim, finalmente, pelos bons resultados da prática todos
experimentarão a verdade dos provérbios: fazendo aprendemos a fazer.
46 UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA46
Mostre-se o uso dos instrumentos, mais com a prática que com palavras,
mais com exemplos do que com regras. ( Comênio apud ARANHA,2000,
p.104).
2.6 O ILUMINISMO E A TENDÊNCIA NATURALISTA NA EDUCAÇÃO
O capitalismo industrial seguiu seu curso histórico irreversível e caminhou no
século XVIII para a Época das Luzes, que abalou o absolutismo dos reis e já esboçava
em si os primeiros acordes das revoltas, que culminaram com a Revolução Francesa
em 1789.
Caracterizou-se pela mais absoluta confiança na razão humana que se opunha
a todos os abusos, quer sociais, políticos, pedagógicos ou religiosos.
O período inteiro foi dominado por uma crença profunda
nas prerrogativas do indivíduo, no seu direito individual de julgar
e determinar suas questões sem sofrer as influências das crenças e
superstições da Igreja, nem das tradições, da sociedade. Liberdade
de pensamento, liberdade de consciência, suficiência da razão para a
conduta na vida, senhas e chaves para a interpretação deste movimento
do século XVIII (MONROE, 1978, p.250).
Aí estão todos os anseios da sociedade em questão e também a expressão
de todo liberalismo econômico. John Locke cria a teoria liberal consubstanciada em
cinco princípios que trazem em si os anseios e os interesses da burguesia: liberdade,
individualidade, igualdade, posse da propriedade e democracia.
O pensamento pedagógico iluminista vai refletir esses princípios liberais, e a
teoria educacional preponderante na época foi a tendência naturalista da educação,
cujo expoente máximo foi Jean Jaques Rousseau.
4747UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA 47
Considerava que:
[...]a felicidade e o bem-estar humanos são direitos naturais de todos
os indivíduos, não o privilégio especial de uma classe de favorecidos e
que, a organização social e a educação legítima existem somente para
efetuar a realização deste desiderato (MONROE, 1958, p.250).
O texto expressa a concepção política de Rousseau que vai refletir-se sobre sua
proposta pedagógica, considerada um importante passo histórico para a pedagogia
contemporânea.
Máximas políticas contemporâneas de que o todo o poder emana do povo
e em nome dele deverá ser exercido ou que os depositários do poder não são os
governantes e sim o povo, são genuinamente rousseaunianas e fermentaram as ideias
populares que promoveram a Revolução Francesa, depôs as monarquias absolutistas
e estabeleceu o acesso político dos burgueses.
Esse conjunto de pensamentos consubstanciou seu pensamento pedagógico,
considerando que o homem nasce naturalmente bom, mas que é corrompido pela
sociedade. Sua filosofia educacional está expressa na seguinte postura: “Viver é o que
desejo ensinar-lhe. Quando sair de minhas mãos, ele não será magistrado, soldado ou
sacerdote, ele será antes de tudo um homem” (Rousseau apud ARANHA, 2006,178).
Redefine as concepções sobre a infância negando que fosse um adulto em
miniatura, livre do pecado original por nascer pura e com as especificidades próprias
de um estágio de desenvolvimento em progressão para a vida adulta.
Sua obra educacional foi “O Emílio”, onde os alunos seriam educados
conforme a natureza e afastados da sociedade corruptora. Condenava a transmissão
de conhecimentos como método de ensino e que as crianças aprendessem a pensar a
partir de seu interior e de forma natural. Nada tão socrático, tão construtivista e tão
moderno, não é?
48 UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA48
CONHEÇA MAIS
(Educação do Emílio)
A natureza quer que as crianças sejam crianças antes de serem homens.
Se quisermos perturbar essa ordem, produziremos frutos precoces que
não terão maturação nem sabor e não tardarão em corromper-se; teremos
jovens doutores e crianças velhas. A infância tem maneiras de ver, de
pensar, de sentir que lhes são próprias; nada menos sensato do que
querer substitui-las pelas nossas; e seria o mesmo que exigir que uma
criança tivesse cinco pés de altura do que juízo aos dez anos. Com efeito,
que lhe adiantaria ter razão nesta idade? Ela é o freio da força, e a criança
não tem necessidade desse freio (Rousseau apud ARANHA, 2006, p.184).
Considera-se Rousseau o iniciador da tendência psicológica da educação. Assim
vamos entrando no século XIX e o capitalismo industrial avança em passos largos e com
exigências educacionais cada vez mais ideológicas, que vêm subordinando a educação
escolar aos interesses do mercado, do capital e do lucro. A grande necessidade de mão
de obra que atendesse à complexidade do trabalho nas fábricas exigiu a organização
da educação pública laica e liberal. O camponês inculto para trabalhar nas fábricas
necessitava agora aprender a ler, escrever, contar e aperfeiçoar seu desempenho técnico.
Destacaram-se como os principais pedagogos Pestalozzi, Froebel e Herbat, cujo
trabalho e obra revelam a finalidade social da educação escolar.
Pestalozzi, influenciado pelo pensamento pedagógico de Rousseau, dedicou-
se especialmente à educação de crianças preferencialmente pobres. Acolhia em sua
escola menores abandonados, aliava formação geral e moral à profissional. Foi um
grande defensor da escola popular, extensiva a todos e de caráter tanto formativo
como informativo.
CONHEÇA MAIS
[...] para os primeiros elementos da geografia éramos levados ao ar livre.
Começavam por conduzir nossos passos para um vale afastado perto de
Verdun ao longo do qual flui o Bûron. Deveríamos olhar para esse vale
como um todo e em suas partes, até que tivéssemos dele uma visão exata
4949UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA 49
e completa. Então nos era dito, a cada um de nós, que devíamos cavar
certa quantidade de barro, que havia em camadas de um lado do vale,
e, com isso, enchíamos grandes folhas de papel, trazidas para este fim.
Quando chegávamos à escola éramos colocados ao redor de grandes
mesas, que eram divididas, e cada criança devia construir com o barro
na parte que lhe fora destinada, um modelo do vale que havíamos
recentemente observado... Então, somente então, olhávamos para o
mapa, pois só agora havíamos adquirido a capacidade de interpretá-lo
corretamente (Relato de um aluno de Pestalozzi, apud F.EBY).
Froebel notabilizou-se na educaçâo infantil. Criou os primeiros jardins da infância
conduzidos por uma metodologia lúdica e motivadora, destacando a importância de
se educar desde essa fase inicial dos alunos.
Herbart destacou-se na utilização da instrução como meio de formação moral.
Pautava-se pelo rigor do método de ensino e organizou uma proposta metodológica
formalizada em cinco passos formais: preparação, apresentação, assimilação,
generalização e aplicação. O destaque dado à organização metodológica do currículo
expressou a finalidade científica da didática. A pedagogia herbatiana influenciou a
educação brasileira tradicional complementando o jesuitismo, o que se caracterizou
por dar um sentido pouco mais científico à tendência tradicional de nossa educação.
50 UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA50
Assim, o pensamento pedagógico do século XIX se manifestou, não apenas
eclético com relação ao caráter psicológico, sociológico e científico daqueles
pensadores, como acentuou essas tendências na busca de propostas educacionais
cada vez mais adequadas às exigências sociais e econômicas sempre mais complexas
e exigentes.
Como característica marcante da pedagogia do século XIX, torna-se necessário
analisar a influência do positivismo científico na pedagogia. Segundo seu expoente
maior, Augusto Comte, a construção histórica do conhecimento da humanidade, na
dependência de modelos agrícolas de sobrevivência, seguiu, por longos anos, um
percurso metafísico até que as exigências do modo de produzir capitalista, como as
novas formas de trabalho, impuseram exigências mais rigorosas na comprovação de
determinado conhecimento. Este, só deveria ser aceito se positivado pelo rigor do
método científico, proposto por Francis Bacon.
As pesquisas neste sentido levaram Comte a conclusões sobre a presença do
determinismo natural nas relações entre as pessoas. Invocando Aristóteles, socialmente
nossas interações ocorrem em função de causa e efeito. Essa comprovação deu forma
à sociologia como ciência empírica e também à psicologia da criança e do adolescente.
Pedagogicamente, a sociologia como ciência nos dias atuaisnos remete à questão
da natureza de nossos alunos. Para conhecê-la hoje, é indispensável considerar que as
formas de pensar, sentir e agir de seus status de origem se redefinem na escola. Essa
redefinição deve orientar didáticas significativas para os alunos que, não pode nunca,
ser afrontado em seus valores culturais de origem.
Se pensarmos que desde a Idade Moderna até nossa contemporaneidade
nossas escolas têm sido organizadas a partir de valores burgueses, podemos inferir a
violência simbólica sobre as crianças com estilos de vida não burgueses.
Antes de iniciarmos nosso percurso rumo aos séculos XX e XXI verificaremos,
na próxima unidade, como e quando essas inovações chegaram ao Brasil.
Até lá!
5151UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA 51
DICA DE FILME
“O Leopardo”; “Em Nome de Deus”; “Lutero”, “As Bruxas de Salém”.
“O Leopardo” – Este é um filme que mostra a ascensão da burguesia
sobre o domínio político da Idade Média;
“Em nome de Deus” – Este filme nos traz a reação do poder católico
sobre a laicização Renascentista.
“Lutero” – Este filme apresenta claramente as características da Reforma
Protestante;
“As Bruxas de Salém” – Este filme nos mostra a reação da Igreja Católica
contra o Protestantismo.
2.7 CONSIDERAÇÕES DA UNIDADE II
Nesta síntese procuramos enfatizar o longo caminho histórico percorrido
pela educação do século XIV ao XIX. Do humanismo inicial do Renascimento ao
realismo e iluminismo, a Europa percorreu aproximadamente 600 anos para conseguir
compreender que as novas exigências econômicas, sociais e culturais exigiam uma
escola leiga, pública, democrática e como dever do Estado e da família.
Destacaram-se nesse período pedagogos que marcaram época e estilo nas
mudanças sobre as concepções da infância e da adolescência e não só influenciaram
nas novas finalidades sociais da educação escolar como nos rumos das pedagogias e
didáticas atuais. Fica a sugestão para que vocês se aprofundem em cada um deles, de
modo a identificá-los como referências ao perfil de cidadão que deverão formar na era
pós-moderna e neoliberal.
Caro aluno, já se faz tempo de comprarmos uma passagem para o Brasil. Vamos,
portanto, caminhar para nossa 3ª unidade e procurar conhecer a face da educação
brasileira como legado desse passado histórico e ainda tão presente entre nós.
Espero você lá! Boa viagem!
52 UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA52
TESTE SEU CONHECIMENTO
5353UNIDADE II - A PEDAGOGIA RENASCENTISTA E MODERNA 53
5555UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
U N I D A D E I I I
3EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
OBJETIVOS DA UNIDADE
• Analisar o conservadorismo da educação brasileira e seus tardios
avanços;
• Situar as crianças nas várias tendências educacionais construídas ao
longo da História da Educação no Brasil.
HABILIDADES E COMPETÊNCIAS
• Análise das etapas de nosso desenvolvimento industrial e suas
consequências na educação escolar;
• Construção de uma consciênciacrescente sobre as exigências da
ideologia liberal no que concerne à educação escolar.
56 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
3.1 EDUCAÇÃO COLONIAL E O CONSERVADORISMO CATÓLICO
Por ocasião do descobrimento do Brasil, a Europa já se encontrava em pleno
mercantilismo e Portugal subordinou a colônia brasileira aos seus interesses comerciais,
reduzindo nossa sobrevivência a um sistema agrário que se arrastaria praticamente até
1930. Como a sociedade só desperta para a questão educacional quando impulsionada
pelo sistema econômico, nossas demandas efetivas por escolas sofrerá um atraso de
quase quinhentos anos.
A unidade em questão procura recuperar essa memória histórica na expectativa
de que sociedade e educadres se conscientizem profundamente sobre a urgência de
transformações escolares.
3.1.1 O JESUITISMO COLONIAL
Antes de entrarmos nesta questão, se faz necessária uma retrospectiva histórica
até a Idade Média e ao Renascimento em sua fase humanística.
Se você não se lembra, retorne ao texto do livro didático para rever as
características básicas da educação cristocêntrica medieval e a criação da Cia. de Jesus
como reação dos católicos à Reforma Protestante, o que interessa ao estudioso da
educação brasileira pelo transporte mimético deste pensamento pedagógico, intacto
para a colônia brasileira.
Como já dissemos, a Cia de Jesus foi criada por Inácio de Loyola, um militar
convertido ao catolicismo, cuja ideologia e objetivo era de combater a Reforma, o
avanço protestante e os ideais cristocêntricos da Idade Média, por meio da educação
da juventude. Pretendiam formar padres cultos, eruditos, puros e castos. Inicialmente
foi criada como uma ordem missionária e aos poucos foi se dedicando à função de
educar. Como reação enérgica ao espírito crítico nascente na Europa, elaboraram
as regras da Cia contidas na “Rátio Studiorum”, com grande apego ao ensino de
5757UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
humanidades, o raciocínio dedutivo escolástico, um fechamento total às ciências, às
experimentações, às atividades artísticas e literárias como disciplinas escolares. Foi um
retorno ao dogmatismo da Escolástica memorista, livresca, dissociada da vida real.
Compunham o currículo: latim, grego, retórica, teologia, filosofia, dialética e música,
as sete ninfas da narrativa sobre as núpcias de Mercúrio e da Filologia.
Tenho fortes razões para acreditar que as ninfas gostaram muito daqui, já que
permaneceram por quase 500 anos. E você, o que acha?
Para que se possa compreender os motivos da presença jesuítica no Brasil,
se faz necessário considerar que, enquanto a Europa, por conta de uma economia
capitalista que se acelerava, buscava a separação da economia, sociedade e educação,
das influências da Igreja, Portugal e Espanha mantiveram-se fiéis ao catolicismo de
Roma. Mantiveram uma economia agrária que se sustentava sem a necessidade de
escolas e permaneceram pedagogicamente escolásticos.
Como nossos descobridores e colonizadores viram na colônia brasileira grandes
possibilidades econômicas para suas finanças, já que sempre estavam arruinados pela
falta de competitividade com outros contextos europeus, optaram então por definir
a economia colonial açucareira, iniciando os ciclos econômicos monocultores. Estes
prevaleceram como os fatores hegemônicos da economia brasileira de 1554 até a
queda das oligarquias do café pela Revolução de 1930, quando o governo de Getúlio
Vargas impulsionou nossa tardia Revolução Industrial.
O açúcar era um produto altamente aceito na Europa, a ponto das moças
casadoiras levarem como dote sacas desse produto. Portugal transformou o nordeste
brasileiro em um imenso canavial, inaugurando uma economia agrária, exportadora
e dependente, definindo o que produzir, quanto produzir e quem deveria produzir.
A sociedade colonial se estruturou a partir do estilo de vida da fazenda
açucareira, restrita à casa-grande, capela e senzala. Na casa- grande habitava a elite
colonial originária da pequena nobreza portuguesa empobrecida, cujo chefe era o
senhor do engenho, com plenos poderes políticos e sociais. Exercendo o pátrio poder
herdado dos romanos, tinha direito de vida e morte sobre tudo que fosse de sua
propriedade, incluindo-se os bens materiais, a mulher, os filhos e os escravos.
58 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
As formas de manter os anseios econômicos portugueses sobre a colônia
brasileira foi a organização da produção em torno da grande propriedade de terras e
da mão de obra escrava.
Como uma economia agrária não necessita de escolas para ter lucros, o governo
português não se interessou pela educação. Fiel à igreja católica, e esta, interessada em
impedir o avanço protestante na colônia brasileira e espanhola, assumiu a educação
do Brasil.
Assim, a educação brasileira iniciou-se formal, elitista, seletiva, excludente e
mantenedora das estruturas sociais coloniais inalteradas.
Nos tempos modernos, nosso sistema escolar, agora manipulado pela ideologia
capitalista, ainda é formal, privilégio de classe, elitizado, excludente das massas, sempre
estigmatizadas, desde nossas bases sociais escravocratas até o presente momento
histórico.
O projeto pedagógico proposto pela “Rátio Studiorum” foi inadequado à
realidade da estratificação da colônia, pois ocasionou um grande processo de exclusão
que atingiu a estrutura social da elite aos escravos. A partir da casa-grande era excluído
da escola o filho mais velho por ser o primogênito e, como tal, o herdeiro da fortuna
material, ao mesmo tempo em que se tornava o responsável pela vida financeira
da família. Sua formação era tão importante que não poderia perder tempo com
livros e escolas. Desde criança acompanhava o pai, à moda romana, aprendendo a
administrar a propriedade.
A mulher branca colonial estava condenada a viver na ignorância, representando
o prestígio do marido, engravidando e zelando pala casa do pátrio poder, e as solteiras,
não raro, eram enviadas a conventos. A mulher negra era simples objeto de trabalho
escravo. Destinada a procriar e muitas vezes seviciadas pelos senhores, contribuiu de
forma decisiva para o enorme processo de miscigenação entre brancos e negros, que
compuseram nossa etnia inicial e ao longo de nossa história.
Atente, meu caro aluno, que esta massa espera dos nossos educadores e de
você o resgate histórico ao qual tem direito.
5959UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
Resta-nos colocar qual a situação das crianças coloniais. Como não poderia
deixar de ser, herdamos também as formas medievais de pensar, sentir e agir com
relação às crianças e os adolescentes, que continuaram sendo vistos como adultos em
miniatura e marcados pelo pecado original.
As crianças da casa-grande frequentavam a escola jesuítica para aprender a ler
e escrever, e muitas vezes eram educadas por preceptores vindos da Europa. Tinham
a chamada “educação de príncipe”. Ao entrar na puberdade iam para o colégio dos
jesuítas, quase que exclusivamente criados para eles, segundo os moldes da “Rátio
Studiorum” e iriam completar estudos na Europa.
Embora desfrutando do que se considerava uma educação de melhor qualidade,
foram bastante violentados simbolicamente, pela inadequação de objetivos,
conteúdos e métodos de ensino. Como adultos em miniatura, memorizavam o que
não compreendiam sob severa disciplina. O jesuíta não batia diretamente nos alunos,
mas contratava um aplicador de castigos físicos, desde que não exagerasse nos socos.
CONHEÇA MAIS
Anchieta, o apóstolo do Brasil e outros jesuítas foram
enviados para São Vicente, subiram a Serra do Mar a pé auxiliados
pelo português João Ramalho e pelo chefe Tibiriçá. Instalaram-se no
planalto de Piratininga e, a 25 de janeiro de 1554, fundaram o colégio
que deu origem à cidade de São Paulo. (KARNAL, 1963, p.6)
Se você desejar conhecer o colégio, ele permanece na Praça da Sé, em
São Paulo. Vá lá e conheça melhor a pedagogia jesuítica.
A população indígena, pelo estilo de vida livre em contato com a natureza, nua
ou seminua, com rituais, danças e bebedeiras pagãs, também não tinha condições
mínimas de se adaptar ao programa dos jesuítas. Dá para imaginar um pequeno
curumim aprendendo gramática, retórica, dialética, geometria? Acho que as sete
60 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
ninfas não tiveram muito sucesso com eles, a não ser pela música, hábito largamente
utilizado nos rituais pagãos de suas tribos e adotado pelos jesuítas, desde que fosse
sacra.
Segundo Chambouleyron apud DEL PRIORE (2000, p.63):
No aprendizado da doutrina apostava-se principalmente na sua
memorização e os padres orgulhavam-se dos meninos que sabiam tudo
de cor. Para isto, os jesuítas desenvolveram os catecismos dialogados
por meio dos quais as crianças davam conta da doutrina.
Aprendiam a cantar e a tocar instrumentos substituindo as canções tidas como
lascivas por músicas sacras, como forma de melhor sedimentar a evangelização.
Como eram pardos, logo almas a serem salvas para os céus, foram apenas
catequizados. Em tese, a catequese significou a catolização da população escolar
indígena e caracterizou-se pela imposição de um deus único e seus santos, cobrir
o corpo, constituir uma família nuclear pelo casamento católico e substituição dos
rituais pelas missas, confissões, procissões e músicas sacras.
Acrescente-se que os jesuítas foram grandes protetores dos índios no que se
referia a sua vida física e escravatura, mas inconscientemente, desestruturaram sua
cultura, o que acabou por gerar um abandono político secular dessas populações.
No sentido de protegê-los dos ataques dos bandeirantes construiram missões no
interior da selva e lá desenvolveram um trabalho comunitário de produção agrícola,
pecuária e artesanatos, tornando-se autossuficientes em dependência econômica, o
que, posteriormente, foram destruídas por Pombal. Os índios, sem cultura própria
tribal, foram abandonados sem nenhuma política integradora e achamos que, de
certa forma, estão à deriva até hoje.
6161UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
PARA REFLETIR
A lei que lhes hão de dar, é defender-lhes de comer carne humana e
guerrear sem licença do Governador; fazer-lhes ter uma só mulher,
vestirem-se, pois têm muito algodão, ao menos depois de cristãos,
tirar-lhes os feiticeiros, mantê-los em justiça entre si e para com os
cristãos, fazê-los manterem-se quietos sem se mudarem para outra
parte,(...) tendo terras repartidas que lhes baste, e com estes Padres
da Companhia para os doutrinarem. (Trecho de uma carta do padre
Manoel de Nóbrega, enviada a Lisboa em 1558 - apud ARANHA,
2006, p.145)
Resta-nos abordar a situação da criança negra. Escravas ou filhas de escravos
eram treinadas desde cedo para serem apenas escravas. As que conseguiam sobreviver
à travessia da África para o Brasil eram vendidas com seus pais ou separadas deles.
Antonil, escrevendo sobre o tormento da cana de açúcar batida,
torcida, cortada em pedaços, arrastada, moída, espremida e fervida,
descreveu o calvário de escravos pais e escravos filhos. Estes também
haveriam de ser batidos, torcidos, arrastados, espremidos e fervidos.
Era assim que se criava uma criança escrava. (Góes e Flrentino in DEL
PRIORE, 2000, p.184)
A citação acima dispensa comentários mais detalhados sobre a formação
da criança negra. Acrescente-se o fato de que, só por acidente iam à escola do
jesuíta. Alguns autores se referem à postura da igreja em relação aos negros, que
os consideravam sem alma por se originarem da África, onde viviam como animais.
Apesar dessa posição, a igreja exigia que a partir de dois anos eles deveriam ser
batizados para adquirirem o direito de serem enterrados em campo santo. Porém,
a maioria dos senhores de engenho ignorava essa exigência e até depois de mortos
permaneciam abandonados.
62 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
CONHEÇA MAIS
Quem desejar por negros e negras de 8 até 10 anos de idade a aprender
o ofício de jardineiro, cocheiro ou cozinheiro, além disso a ler, escrever,
cortar e cozer,dirija-se à casa de Carlos Durand, Rua Direita, n.9 As
condições são as seguintes:1.deve ter boa constituição e boa saúde,
ter tido bexigas naturais ou vacinadas, 2.ter ao menos duas camisas
e calças, uma jaqueta, 3- nos primeiros três meses o Senhor poderá
tirar o escravo, depois de três meses deverá deixá-lo três anos a pessoa
que dele se encarregar a qual se obriga a fazê-lo aprender tudo o
que o Senhor houver destinado, e de mais e diversos conhecimentos
elementares indicados.(GAZETA DO RIO DE JANEIRO,15|9|1819)
A situação das crianças brancas e negras do Brasil colonial não se alterou legalmente
até a Lei Áurea em 1888, e de fato, só as brancas abastadas continuaram a ter uma
educação de elite. As negras e seus descendentes permanecem, em sua maioria, apenas
como exército de reserva da ideologia capitalista e sem reais igualdade de oportunidades.
Já a criança indígena sofreu completo abandono com as Reformas Pombalinas.
3.1.2 POMBAL
O Marquês de Pombal, Sebastião José de Carvalho e Melo, primeiro ministro do
rei de Portugal D. José I, era contra a existência da Cia de Jesus. Entendia que a riqueza
que estava em mãos da Cia pertencia à coroa portuguesa e a Educação deveria estar
a serviço de Portugal e não da igreja. Condenava o currículo humanístico dos jesuítas
pela exclusão das ciências, por não preparar um nobre português necessário ao
enfrentamento da economia europeia, da qual se encontrava devedor, especialmente
da Inglaterra.
Pombal não conseguiu promover plenamente as reformas nem em Portugal e
muito menos no Brasil. Expulsou os jesuítas em 1759 e destruiu as missões brasileiras,
deixando a população indígena à própria sorte.
6363UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
Quanto à educação escolar, desestruturou todo o ensino jesuítico, deixando-o
sem uniformidade de ação pela ausência total de uma filosofia, sem continuidade
ou graduação. Nesse vazio pedagógico restou aos tios- padres dos engenhos, aos
mestres- escolas e preceptores, seguir a moda jesuítica, com os mesmos métodos
didáticos, autoridade absoluta dos mestres e disciplina rígida. Em substituição ao
colégio, reduziu o secundário a aulas régias, as aulas do rei e não da igreja.
Cada aula régia se constituía de uma unidade de ensino, com um
professor único, instalada para cada disciplina. Era autônoma e isolada,
pois não se articulava com outras, e nem pertencia a qualquer escola.
Não havia currículo no sentido de estudos hierarquizados e ordenados e
nem duração pré-fixada. O aluno se matriculava em tantas aulas régias,
quantas fossem as disciplinas que desejasse estudar. Os professores
eram de baixo nível, improvisados e mal pagos em contraste com o
magistério dos jesuítas, cujo preparo chegava as raias do requinte.
Nomeado por indicação e sob a concordância dos bispos, tornavam-se
proprietários das aulas régias, que lhes eram atribuídas, vitaliciamente,
como sesmarias ou títulos de nobreza. (CHAGAS, 1954, p.91)
PARA REFLETIR
1- Se o ensino secundário estava assim, desestruturado e abandonado,
dá para imaginar com seria o ensino primário?
Acho que você adivinhou que estava abandonado às traças e as crianças
junto com eles. Nesse contexto nem as sete ninfas sobreviveriam, não é?
2-Agora você já consegue imaginar o porte do atraso da educação
brasileira em relação à Europa?
Sem muitos comentários, dá pra sentir que a educação não evoluiu
porque permanecemos agrários e extrativistas. Lucros ocorriam sem
necessidade de uma população escolarizada, porque para plantar cana,
fumo, algodão e extrair ouro das minas, não se precisava aprender a ler,
escrever ou contar.
Só para lembrar, a Europa já caminhava a passos largos pelos caminhos
do capitalismo industrial.
64 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
DICA DE FILME
L“A Muralha”- minissérie da Globo adaptada da obra de Dinah Silveira
de Queiroz.
A obra é uma narrativa histórica sobre a fundação e colonização da
cidade de São Paulo em 1554. Aborda todos os aspectos das relações
sociais sob a tutela e poder da Igreja Católica.
Filme: “A Missão” - O enredo se desenvolve em torno do extermínio das
missões jesuíticas no Brasil por ordem do Marquês de Pombal.
Na magnífica interpretação de Robert de Niro, o filme nos coloca diante
do desmantelamento da cultura indígena e a definição dos destinos dessa
população.
3.2 EDUCAÇÃO NO IMPÉRIO E A PREDOMINÂNCIA RELIGIOSA
O período colonial se encerrou com a vinda da Família Real Portuguesa para o
Brasil em 1808 e permaneceu até 1889, com a Proclamação da República.
Compreendeu historicamente três fases: a fase Joanina, o primeiro reinado com
D. Pedro I e o segundo reinado com D. Pedro II.
3.2.1 FASE JOANINA
Ao chegar ao Brasil, D. João, por imposição da Inglaterra, decretou a abertura
dos portos brasileiros às ações amigas. Assim a Inglaterra, com os portos europeus
bloqueados ao seu comércio por Napoleão Bonaparte, imperador dos franceses,
passaria a impor a venda de seus produtos nas colônias da América.
6565UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
A abertura dos portos do Brasil influiu significativamente na abertura da cultura
brasileira:
“[...] Pela primeira vez, atônitos e deslumbrados viam os brasileiros entrar
pelos portos e pelas terras de sua pátria livros, idéias e pensadores, carregando outras
ideologias e plantando novas filosofias de educação”. (TOBIAS,1995, p.9)
A instalação do reino português no Brasil exigia mudanças nas estruturas
educacionais. A corte e o rei necessitavam de oficiais, médicos e engenheiros. Com
o objetivo de formar esses oficiais, D. João inaugurou o ensino superior no Brasil
criando a Academia Real da Marinha, a Academia Real Militar, a Escola Nacional de
Engenharia e os cursos de Cirurgia e Anatomia.
Com relação à cultura criou a Imprensa Régia, cujo primeiro lançamento
foi o jornal “O Patriota” e a revista “Variações e Ensaios de Literatura”. O ensino
secundário permaneceu sem organicidade e foram mantidas as aulas régias, já no
ensino primário os moldes coloniais de educação ainda permaneceram, ou seja, as
escolas se restringiam ao ato de ler e escrever.
A educação como um todo permaneceu formal, seletiva propedêutica e
mantenedora do “status quo”.
3.2.2 FASE INDEPENDENTE
Dois atos significativos para a educação escolar foram a Constituição de 1824
e o Ato Adicional de 1834.
O primeiro continha a ideia de um sistema nacional de educação. O texto
permaneceu no papel, reforçando o já tracional formalismo da educação brasileira. Já
o segundo ato significativo descentralizou o ensino.
O texto da lei diz o seguinte:
66 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
“Haverá no Império escolas primárias em cada termo, ginásios em cada comarca
e universidades nos mais apropriados locais”. (Constituição Brasileira de 1824, art.
250)
O que sobrou da lei foi, num futuro bem distante, a instituição do Dia do
Professor, por ter sido promulgada em 15 de outubro de 1827.
O segundo ato significativo (Ato Adicional de 1834), Aranha define como o
“ato de misericórdia” sobre a educação brasileira.
Essa reforma descentralizou o ensino, atribuindo à Coroa, a
função de promover e regulamentar o ensino superior, enquanto às
províncias (futuros estados) foram destinadas a escola elementar e a
secundária. Desse modo a educação da elite ficou a cargo do poder
central, e a do povo, confiada às províncias (ARANHA, 2006, p.224).
Precisa comentar? Acho que não!
Com relação ao secundário convém mencionar a fundação do Colégio Pedro II,
no Rio de Janeiro. Destinado à formação da elite imperial, era mantido com recursos
públicos, conferia o grau de bacharel e isentava o aluno dos exames vestibulares.
Subordinavam a ele os liceus provinciais, que deveriam seguir o padrão de ensino
daquele educandário.
Será que era elitista e seletivo? O que você acha?
Caro leitor, atenção a esse ato, pois acompanhará o secundário até hoje.
Acho que é hora de perguntar a você se já desconfiou por onde anda a criança
brasileira, não é?
O primário ficou abandonado. Que peninha, não é? Não fique com pena,
prepare-se para recebê-las no século XXI, pois elas te esperam perdidas na massa atual
e precisam ser tiradas dela.
6767UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
DICA DE FILME
“Independência do Brasil” e “D. Leopoldina”
Os filmes têm como enredo o desdobramento do processo político
da Independência e boas pitadas de malícia a respeito das aventuras
amorosas de D.Pedro I, bem como os desvios da conduta afetiva de D.
Leopoldina, então imperatriz do Brasil. Vale a pena conferir!
3.2.3 SEGUNDO REINADO
Infelizmente, nada ocorreu para que mudasse a essência da educação escolar
brasileira durante todo o Império.
Segundo Fernando Azevedo apud ARANHA (2000, p.224) “a educação teria
que arrastar-se por todo o século XIX, inorganizada, anárquica, incessantemente
desagregada. Entre o ensino primário e o secundário, não há pontes ou articulação:
são dois mundos que se orientam, cada um na sua direção”.
Vale mencionar o início do positivismo e liberalismo pela Reforma do Ensino de
Leôncio de Carvalho, concedendo a liberdade de ensino, de frequência e da prestação
de exames vestibulares. Não se esqueça de que permanecíamos agrários, exportadores
e escravocratas e essa liberdade e cientificidade no trato da educação não vingaram.
Com relação ao ensino profissionalizante, destaca-se a criação das primeiras
Escolas Normais para a formação de professores, inicialmente destinada a homens
maiores de 18 e que soubessem ler e escrever. O ensino técnico, sem expressão
social e estigmatizado pelo preconceito às manualidades de origem escrava, não
obteve expressão. Não havia no governo a preocupação com a educação das massas
populares. Este tinha os olhos voltados para a educação da elite e da formação do
doutor, de preferência jurista.
68 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
Em 1846 é criada (...) a primeira escola normal de São Paulo, destinada
somente a homens, e com um único professor, Manoel José Chaves,
catedrático de filosofia e moral no curso anexo à Faculdade de Direito;
essa escola funcionou numa sala do Cabido, contígua a Sé Catedral, e
foi suprimida em 1867, tendo formado cerca de 40 professores em 20
anos ( dois em média por ano),(...) Em 1864 é criada na capital de São
Paulo, uma escola normal com um curso de dois anos, que se instalou
em 1875, com 33 alunos,numa sala do curso anexo da Faculdade de
Direito. Também esta, por falta de verba para a instalação se fechou
em 1878, para se abrir, e desta vez, com três anos de curso, a 2 de
agosto de 1870. (Azevedo apud ARANHA, 2006, p.234)
DICA DE LEITURA
Indico a obra de José Antonio Tobias- “História da Educação
Brasileira”-1978, p.263.
Tobias, numa linguagem agradabilíssima, oferece detalhes interessantes
sobre os primeiros cursos para a formação de professores no Brasil.
Meu caro estudante, note que já estamos a 300 anos do início de nossa
educação. Não desanime, porque a República vem surgindo no horizonte.
3.3 EDUCAÇÃO NA PRIMEIRA REPÚBLICA
A fase republicana é dividida em períodos, conforme as mudanças na economia
brasileira.
Nunca perca de vista o contexto econômico de cada fase, pois será sempre ele
que definirá o estilo de vida de uma dada sociedade, inclusive o meu e o seu. Não
esqueça que sua identidade, e também a minha, se define pelas nossas formas de
sobrevivência.
6969UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
O contexto econômico e social da Primeira República ou República Velha
compreende o período que vai da Proclamação, em 1889, até 1930. Pode e deve ser
considerado um período de transição econômica, social e política, pois foi marcado
por intensos momentos de crítica à sociedade imperial.
Nesse período, novas forças sociais começaram a emergir, resultantes de um
novo modelo econômico e social. Finalmente a industrialização vinha chegando ao
Brasil, com respeitável atraso de 150 anos em relação à Inglaterra e 100 anos em
relação aos Estados Unidos. Adivinhe se nos tornamos satélites econômicos dos
Estados Unidos o que, de certa forma, prevalece até hoje em tempos de globalização.
De 1889 a 1930 continuamos com a economia agrária de ciclo do café e
paralelamente a ela nossa indústria foi se desenvolvendo lentamente, porém, sem
hegemonia, devido à política dos oligarcas do café.
Já dá para se perceber que a educação escolar quase nada mudou nesse período,
mas foi impulsionada pela efervescência de forças sociais, principalmente, a partir dos
anos vinte, que definiu, ao menos teoricamente, os rumos da educação. O divisor de
águas foram os princípios da Escola Nova, que vão dar início à tendência escolanovista
da educação no Brasil. Foi o primeiro contraponto real à tendência tradicional, mas
antes de entrarmos nessa questão, é preciso determinar de onde surgiram as forças
sociais que repercutiram na educação.
Lentamente, a industrialização chegou ao Brasil. Desde o final do Império
veio se consolidando devagar, devido ao boicote ocasionado pelos oligarcas do café.
Dominavam a política brasileira, do executivo ao legislativo. Essa política mantinha no
governo central, ora um presidente de São Paulo, ora de Minas Gerais, ocasionando
a política do café com leite ou dos coronéis. Como o voto não era secreto criaram o
“voto de cabresto”, garantido a eleição de presidentes, deputados e vereadores.
Não comporta aqui detalharmos quais os fatores determinantes da obtenção
dos capitais necessários à nossa industrialização. Porém, as mudanças na estratificação
da sociedade urbano industrial que se formou em São Paulo foi, sem dúvida,
preponderante nas reivindicações de um novo modelo para a educação.
70 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
Os escravos foram libertados em 1888 pela Princesa Isabel. Escravo livre deveria
ser assalariado. Os barões do café perceberam que empregados assalariados tinham
um custo muito menor que a manutenção do trabalho escravo. Negaram-se, porém,
a pagar salário para os escravos livres e seus descendentes. Trouxeram grandes massas
de imigrantes italianos e espanhóis, que à época, devastados pela pouca oferta de
empregos em seus países de origem, sonhavam em fazer a vida no Brasil.
Inicialmente destinados à lavoura cafeeira, um grande número de trabalhadores
deixou também a vida rural para trabalhar nas indústrias paulistas, que vinham
ganhando força econômica contínua por investimentos de alguns cafeicultores de
visão mais ampla e pelos capitais familiares, que deram origem a futuros grupos
econômicos paulistas. Esse êxodo rural gerou o fenômeno da urbanização de São
Paulo, definindo dois estilos de vida: a rural em torno da plantação do café e a urbana,
com uma diversidade de profissões necessárias à vida nas cidades e que exigiam
formação escolar.
Acho que você, meu caro aluno, inteligente como é, já viu esse filme lá pelas
bandas do Renascimento e início da era industrial europeia, não é? Lembra o que
aconteceu com a sociedade da época? Saiu em desabalada carreira atrás de escola,
agora uma exigência para garantir trabalho na cidade. Embora com um atraso de um
século e meio, o fenômeno se repetiu em São Paulo.
Reservadas as devidas proporções, a diversidade profissional da cidade e a
tecnologia das fábricas exigiam uma formação escolar. A demanda social por escolas
aumentou. Políticos e intelectuais levantaram, pela primeira vez, a questão do
analfabetismo das massas e o atraso que causava ao progresso econômico do país.
Convém acrescentar que os imigrantes, vindos de uma Europa há muito industrializada,
reivindicavam direitos não apenas trabalhistas, mas também educacionais, por virem
de lugares nos quais a alfabetização era generalizada por exigência da própria
sobrevivência de empregados e empregadores.
Nesse contexto urbano, a classe média, como decorrência da urbanização,
ganha expressão política, mas não se envolve propriamente com a questão da
educação popular, interessando-lhe aquelas profissões que a classificava socialmente
e, não eram, certamente, aquelas relacionadas ao trabalho escravo.
7171UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
Vários movimentos sociais ocorreram nessa época, como modernismo,
tenentismo, socialismo, etc., mas aqui abordaremos os que se relacionaram diretamente
com a educação, oferecendo destaque para o anarquismo e o escolanovismo.
O anarquismo foi produto dos imigrantes italianos e espanhóis, oriundos de
países onde a alfabetização já era generalizada para as famílias dos operários. Foram os
fundadores do anarco sindicalismo no Brasil. Exigiam uma escola pública anarquista, isto
é, autônoma em sua pedagogia, universal e única, sob a responsabilidade financeira do
Estado. Entendiam que a escola deveria ser pública, mas sem a intervenção ideológica
do Estado. Era a proposta de uma educação libertária, organizada pelo grupo social
que gerenciaria sua própria educação.
Se você, meu caro aluno, sonha com uma escola que garanta igualdade de
oportunidades educacionais para todos, pode inspirar-se no modelo anarquista e
aprender a rejeitar qualquer proposta pedagógica vinda do Estado.
Como conseguiram organizar a classe operária e promoveram greves significativas
em São Paulo, a reação do Estado foi a aprovação de uma lei de perseguição, prisão e
extradição de anarquistas, então considerados inimigos do país.
DICA DE FILME
“Anarquistas, graças a Deus”.
Adaptação da obra de Zélia Gattai para o cinema, o filme exibe a atuação
dos anarquistas com relação às relações de trabalho na sua nascente
industrialização e suas exigências com relação à educação escolar de seus
filhos e dos menores abandonados.
“Sinhá Moça”
Drama desenvolvido no ciclo do café sobre a crueldade da escravidão, a
obra aborda a participação dos abolicionistas e a consequente assinatura
da Lei Áurea.
Telenovelas: “Terra Nostra” e “Esperança”. A narrativa gira em torno dos
primeiros imigrantes em São Paulo e suas lutas políticas na cidade.
72 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
O movimento que se constituiu no primeiro contraponto real à educação
tradicional foi o escolanovismo, que segundo Nagle foi marcado pelo “otimismo
pedagógico” e pelo “entusiasmo pela educação”.
O primeiro tinha caráter quantitativo, propondo a construção de escolas em
quantidade e qualidade para combater o analfabetismo. O segundo tinha caráter
qualitativo e significava uma nova concepção da infância e adolescência brasileira.
Finalmente a criança deixou de ser vista como um adulto em miniatura, para ser
considerada um ser em desenvolvimento, com características específicas próprias
desse estágio que deveriam ser atendidas pela escola. A Psicologia da Criança chegava
às salas de aula do Brasil. Até que enfim, você não acha?
Didaticamente, o movimento propunha a reformulação das salas de aulas,
métodos ativos para que a criança aprendesse por descoberta, e em plena liberdade.
As propostas da Escola Nova chegaram ao Brasil através de Anísio Teixeira,
ganharam adeptos e organizaram um pronunciamento à nação publicado em 1932.
Foi o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova que reivindicava uma escola pública
obrigatória, gratuita, leiga, coeducável e como dever do Estado e da família. Pretendiam
também a democratização do ensino médio pela eliminação legal do dualismo do
sistema de ensino consubstanciado em dois tipos de educação: pública e particular.
Foram vitoriosos na Constituição de 1934, pela instituição legal da escola pública com
aquelas características supracitadas, mas não conseguiram eliminar a dualidade do
sistema que mantém o caráter de elitização e seletividade do ensino em pleno século
XXI.
Antes de encerrar essa fase, quero indagar por onde andará a nossa criança. As
crianças da elite continuavam protegidas e encaminhadas para os colégios particulares,
geralmente em mãos da igreja católica, principal opositora da escola pública. As de
classe média com alguma posse, também eram encaminhadas para as escolas públicas
consideradas de qualidade. Mas a realidade não era essa. O povo, menos favorecido
econômica e socialmente, raramente frequentava essas escolas. Os filhos de imigrantes
ou perambulavam pelas ruas como jornaleiros, engraxates, meninos de recado, ou nas
fábricas como mão de obra produtiva e barata. Submetidos a condições de trabalho
deploráveis, eram vítimas de acidentes muitas vezes fatais ou mutiladores.
7373UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
Alimentos e bebidas, tecidos e chapéus, cigarros e charutos,
vidros e metais tijolos e móveis, entre uma série de outros produtos
fabricados então em São Paulo passavam por mãos pequeninas,
trazendo na sua esteira e indiferença as particularidades e as
necessidades da infância e da adolescência. (Bolsonaro de Moura in
DEL PRIORE, 2000, p.204)
Pena que o trabalho infantil ainda marca presença no século XXI.
PARA REFLETIR
1-Vou desafiar você, caro leitor, a me responder se imagina para onde
foram nossos amigos católicos tomistas. Onde andarão?
Tudo certo se você inferiu que estão firmes e fortes desde a colônia. Na
época em questão monopolizavam todo o ensino médio a altos custos,
como o são até hoje, representados pelas escolas mais caras do país e
frequentadas pelos filhos das elites para aprenderem a serem sempre
elites condutoras.
De forma bastante semelhante ao combate que levaram a efeito contra
os protestantes no Renascimento, eram frontalmente contra a laiscização
entre escola pública e religião. Embora os pioneiros tenham conseguido
a instituição legal da escola pública leiga, os católicos vão reagir com
força total nos debates sobre nossa primeira Lei de Diretrizes e Base-
Lei4024/61. Aguarde!
2- Vou lançar mais um desafio a você. Com a vinda em massa de imigrantes
para trabalhar nas lavouras de café e nas fábricas paulistas, para onde
será que foram os escravos e seus descendentes?
Que ótimo se respondeu que, sem trabalho, sem uma política social
de integração e necessitando sobreviver, foram para a criminalidade e
consequente marginalidade. Por isso, ainda temos uma maioria negra nas
prisões e nas moradias mais indignas do país habitadas por aqules que
ajudaram a construir o Brasil. Em pleno século XXI ainda lutam para vencer
os preconceitos, e hoje, mesmo protegidos pela lei, já compreenderam
que a brutal discriminação que sua condição de escravos lhes legou, não
se resolve por decreto, mas por lutas, que nossos educadores,nos quais
incluo você que me lê, podem contribuir de forma significativa. Admita
que haja história para ser conhecida e modificada, não é?
74 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
3.4 EDUCAÇÃO NA ERA VARGAS
O ano de 1930 marca o início de uma fase bastante decisiva na história de
nossa República. Como não poderia deixar de ser, mudanças políticas e econômicas
vão determinar o começo de novos rumos para o Brasil.
A política protecionista das oligarquias do café favorecia apenas dois Estados:
São Paulo e Minas Gerais, que se revezavam no poder. Os demais Estados da Federação,
descontentes com essa situação, se organizaram sob a liderança do gaúcho Getúlio
Vargas, que comandou uma revolução vitoriosa, e derrubou os oligarcas do café. Estes
encontravam-se muito fragilizados pela queda da Bolsa de Nova York em 1929. Como
os Estados Unidos eram nossos principais compradores de café, muitas fazendas de
café, superlotadas de produtos e sem ter para quem vender, foram à falência. Se
considerarmos que o café era nosso produto hegemônico, quem na verdade estava
falido era o Brasil.
O governo de Vargas, no sentido de superar o sufoco econômico ocasionado
pelo café, impulsionou a indústria, subsidiou-a e consolidou como hegemônico o
modelo industrial capitalista. O período foi nossa primeira revolução industrial pela
produção interna de bens de consumo, antes importados da Inglaterra, que nos vendia
desde agulhas para costura até caixões de defunto.
Esta supervalorização do modelo industrial acentuou o fenômeno do urbanismo,
provocando intenso êxodo rural e a consequente demanda de educação escolar pela
sociedade.
Após a Revolução Constitucionalista de 1932, Getúlio promulgou a nova
Constituição em 1934, e por influência do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova,
instituiu a escola pública com as características liberais de obrigatoriedade, gratuidade,
leiga, coeducável e como dever do Estado e da família.
Em 1930 foi criado o Ministério da Educação e Saúde, sob o comando ministerial
de Francisco Campos, escolanovista que promoveu a reforma do ensino que levou seu
nome. O maior mérito foi a criação de nosso primeiro sistema nacional de educação. Tal
7575UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
organização visava atender ao novo modelo econômico urbano-industrial, e como tal
apresentou os níveis de coerência que se exige em qualquer sistema: a interna e a externa.
A coerência interna é a organização específica e intrínseca do ensino, atende
à verticalidade do sistema. Foi legalizada pela reforma, que definiu os graus do
ensino em primário, secundário e superior, sob rigorosa seriação e terminalidade.
Reformulou o ensino superior, definindo com clareza as funções da universidade em
ensino, pesquisa e extensão; rompeu com a justaposição das faculdades, criando o
“campus” universitário, instituiu o regime universitário como gerador de estudos
desinteressados e em nível de autonomia administrativa.
Quanto à coerência externa, de caráter horizontal, a lei promovia a articulação
entre escola, sociedade e sistema econômico e integração com os sistemas estaduais
de ensino. Em relação ao ensino secundário, eliminou os cursos paralelos e exames
vestibulares parcelados, definiu uma seriação rigorosa, frequência obrigatória,
terminalidade e equiparação dos liceus provinciais ao Colégio Pedro II. Criou a
carreira do inspetor escolar, que deveria controlar rigidamente as escolas. Quanto ao
ensino técnico regularizou a profissão de contador e definiu as escolas normais como
formadoras de professores para o ensino primário.
Agora, fique pasmo, o ensino primário ficou abandonado e o mais grave, por
um ministro escolanovista. Nada de muito significativo ocorreu na realidade de fato.
Em 1937, Getúlio Vargas deu um golpe de Estado e implantou o Estado
Novo, que foi uma ditadura de caráter nazi-fascista totalitária. Todos os movimentos
ideológicos da sociedade entraram em hibernação. Era calar ou morrer nos porões da
ditadura.
DICA DE FILME
“Olga”
Esta obra é um relato sobre a luta ideológica de Luis Carlos Prestes, esposo
de Olga, contra o governo de Getúlio Vargas. Olga era descendente de
judeus, presa por Vargas foi deportada para a Alemanha Nazista, onde
foi torturada. Vale a pena conferir!
76 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
“Aquarela do Brasil” e “Agosto” - Telenovelas da Globo
A “Aquarela do Brasil” ocorre durante o Estado Novo e narra a atuação
da Polícia Política, suas perseguições e torturas da ditadura Vargas.
“Agosto” aborda o final da Era Vargas e as tramas políticas que culminaram
com seu suicídio. Vale a pena conferir!
Com relação à legislação nesse período, o então ministro Gustavo Capanema,
organizou as Leis Orgânicas do Ensino. Era um conjunto de seis decretos-lei, que
ordenavam o ensino primário, secundário, técnico, normal e agrícola. Em regime de
ditadura, não foi produto de consenso. Manteve a dualidade do sistema de ensino,
preservando o ensino superior e médio para formar as “elites condutoras” e o ensino
primário e técnico para os menos favorecidos.
Em síntese, a julgar pelo texto da lei, o ensino secundário
deveria: a) proporcionar cultura geral e humanística; b) alimentar uma
ideologia política definida em termos de patriotismo e nacionalismo
de caráter fascista; c) proporcionar condições para o ingresso no
curso superior; d) possibilitar a formação de lideranças. Na verdade,
com exceção do item b, constituído de um objetivo novo, é bem
característico do momento histórico em que vivíamos, a lei nada
mais fazia do que acentuar a velha tradição do ensino secundário
acadêmico, propedêutico e aristocrático. (ROMANELLI, 1980, p.157).
Com relação ao ensino técnico ouve relativo avanço na formação de mão de
obra qualificada para a indústria e para o comércio. Foi criado o SENAI para formar
técnicos na área industrial e o SENAC para atender às exigências do comércio sempre
em ascensão. Criou-se também um curso de zootecnia para atender ao ensino agrícola.
Eram cursos só procurados pelo povo que tinha necessidade urgente de entrar
para o mercado se trabalho. Não classificavam socialmente, não eram propedêuticos
e diplomavam em nível médio.
7777UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
Só foi oficializada em dois de janeiro de 1946, após o término do Estado Novo
e vigorou até 1961, com a aprovação de nossa primeira Lei de Diretrizes e Bases da
Educação.
3.5 A LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA – 4024/61
Com a queda de Getúlio Vargas nosso país retornou ao Estado de Direito e foi
apresentado ao Congresso Nacional o projeto da primeira Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional- LDB 4.024/61.
Permaneceu em debates por longos treze anos, e adivinhem quem foram os
debatedores? Não adivinhou? Foram os nossos incansáveis pioneiros da Educação
Nova e a santa madre igreja católica. O conteúdo da discussão era sobre a destinação
das verbas públicas. Os conservadores católicos entendiam que as famílias menos
favorecidas tinham o direito à liberdade de escolha sobre o tipo de ensino que
desejassem dar aos filhos, se religioso ou profano. Em nome desse direito entendiam
que verbas públicas deveriam subsidiar a escola particular que recebesse esse tipo de
aluno.
Após treze anos de um debate que atingiu a sociedade como um todo, a lei
foi aprovada através do Substitutivo Lacerda, que consubstanciou o pacato das elites.
As verbas governamentais atenderiam, preferencialmente, a escola pública, mas
subsidiariam também as escolas particulares.
Veja o texto da Lei:
A União dispensará sua cooperação financeira a estabelecimentos
mantidos pelo Estado, Município ou particular, para compra,
construção, reforma de prédios escolares e respectivas instalações e
equipamentos, de acordo com as leis em vigor. (BRASIL. LDB 4924/61,
apud ARANHA, 2000, p.311)
78 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
Você percebeu o que aconteceu? Já imaginou prédios, reformas ou equipamentos
que foram construídos com essa ajudinha. A partir daí, o crescimento de escolas
particulares foi notável, mas se alguém desejar uma bolsa de estudo, naquele tempo
e agora, só por acaso ou apadrinhamento vai conseguir. E, o mais grave foi que essa
condição permaneceu até a Constituição de 1988, que finalmente destinou verbas
governamentais só para a escola pública.
3.6 A TENDÊNCIA TECNICISTA
Vamos iniciar esta apresentação com uma panorâmica abordagem dos anos JK,
governo de Juscelino Kubitschek de Oliveira, precursor das mudanças capitalistas no
nosso modelo econômico.
A campanha eleitoral de JK foi marcada por um mote que era “50 anos em
5”. Significava que JK pretendia levar o Brasil a ter um desenvolvimento econômico
grandioso em cinco anos de governo. Desejava construir Brasília e internacionalizar
o parque industrial pela vinda das empresas multinacionais. Sendo assim, promoveu
nossa segunda Revolução Industrial, com as empresas de bens duráveis como a
automobilística e de eletrodomésticos.
Concedeu para isso, aproveitando-se de uma portaria da Superintendência da
Moeda e do Crédito, benefícios irrecusáveis para a instalação e lucratividade dessas
empresas, que encontraram aqui um lindo “berço esplêndido” e foram os coadjuvantes
da instalação da ditadura militar de 1964.
Com a renúncia do presidente Jânio Quadros, o Brasil passou a reivindicar
reformas de base, como distribuição de renda, educação e saúde. As greves se
tornaram frequentes e persistentes. Se ganhassem força política, significavam uma
ameaça aos benefícios do capital estrangeiro aqui instalado nas bases de uma
altíssima concentração de renda e mão de obra abundante e excedente. A posse de
João Goulart, vice de Jânio Quadros, foi impedida pelo Congresso e em 31/03/1964
instalaram a ditadura militar, rompendo com a eleição direta e democrática do voto.
7979UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
Para que se internalize o conceito de tecnicismo educacional, é de fundamental
importância que não se confunda educação técnica com tecnicismo. A primeira é
a formação necessária para se atuar profissionalmente num mercado definido pela
sofisticação da tecnologia de ponta, que exige esmero técnico. Tecnicismo foi uma
tendência educacional que pretendia formar o cidadão para a tecnologia, mas de
forma acéfala. Produzir, dar muito lucro e não pensar. Muitos que ousaram pensar
caíram nos porões da ditadura, onde os torturadores ou a morte os esperavam.
Mataram e torturaram bastante, mas como não se pode fazer isso indefinidamente e
dobrar toda a sociedade por esse método, voltaram-se para a educação escolar, pois
é aí que se formam as cabeças do país e que agora precisavam ser dóceis ao sistema.
Acho que em nenhum momento de nossa história o sentido político de cada
aula que damos ficou tão em evidência. Nós, educadores daquela época e de agora,
nos deixamos tecnizar de tal maneira que parecemos impotentes diante das mudanças
que podemos realizar, dando, simplesmente, a maior qualidade possível às nossas
aulas de cada dia.
O espaço deste trabalho não me permite detalhar e criticar as reformas do
ensino, promovidas com a única finalidade de ajustar a educação escolar ao sistema
econômico multinacional.
No que se refere à educação convém relembrar que uma das benesses
concedidas por JK ao capital estrangeiro foi o fornecimento de mão de obra barata,
abundante e excedente, que seria obtida, preferencialmente, na escola pública.
Mecanismos ideológicos sutis e difíceis de serem percebidos pelo observador comum
desencadearam o êxodo da classe média para a escola particular e as públicas como
prerrogativa do povo, que afinal tinha o direito de estudar e o governo o dever
constitucional de prover esse estudo.
O sistema escolar destinou-se a formar o cidadão necessário a cada dimensão
das estruturas hierarquizadas das grandes empresas. Se nos demorarmos um pouco
para entender essa estrutura, perceberemos melhor a engrenagem ideológica entre
escola e sistema.
80 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
Observe o esquema abaixo:
Fonte: Elaborado pela autora.
Percebeu? Não? Preste atenção porque estamos todos nessa “fita”. A dualidade
do sistema de ensino está firme e forte nesta demonstração. Para as elites, escolas
de altíssimo padrão, no país ou no estrangeiro, para as classes médias, as escolas
particulares de suas cidades e para os menos favorecidos, escolas públicas. A ideologia
aí veiculada é que, mesmo passando por um sistema de ensino completo, os ricos
serão sempre ricos, os médios sempre médios e os pobres sempre pobres. Isso aí é
tecnicismo, é formar capital humano acéfalo, acrítico, mas que dá muito lucro.
Quantos questionamentos você está fazendo às políticas públicas? Espero que
muitos!
A tendência tecnicista em educação resulta da tentativa de aplicar
na escola o modelo empresarial, que se baseia na “racionalização”
própria do sistema de produção capitalista. Um dos objetivos dos
teóricos desta linha é, portanto, adequar a educação às exigências da
sociedade industrial e tecnológica evidentemente com economia de
tempo, esforços e custos. Em outras palavras, para inserir o Brasil no
sistema do capitalismo internacional, seria preciso tratar a educação
como capital humano. (ARANHA, 2006, p.213)
8181UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
PARA REFLETIR
1 - Será que você consegue imaginar ser tratado como “capital humano”?
Acho que você está se sentindo muito mal por ser considerado apenas
um produtor de lucros sem o direito de pensar ou de exercer sua
cidadania plena, já que não foi formado para ela. Dessa forma, os alunos
que passaram por tal engessamento não se situam na história e só por
acaso poderão pensar um futuro que realmente respeite a educação,
reconhecendo, em cada criança e em cada jovem, sujeitos de direito
desde que nascem.
2 - O que seria para você um aluno como sujeito de direito?
Certamente você deve ter respondido que reconhecer cada aluno como
sujeito de direito implica, necessariamente, prepará-lo desde cedo para
o exercício da cidadania. È desde a infância que aprendemos a conhecer
nossos direitos constitucionais e nossos deveres para com sua prática.
Meros “capitais humanos” não conseguem reconhecer essa característica
da própria cidadania.
3 - Qual seria o local que formaria o “capital humano”?
Evidentemente, isso só poderia se concretizar lá naquelas aulas
aparentemente neutras e inocentes. Tome tento e lembre-se da promessa
de JK, de mão de obra barata, abundante e excedente. De onde é que
saíram? Como isso se concretizou? Simples, pela adoção da teoria
comportamentalista como pressuposto teórico de aprendizagem. Toda
aula deveria ser fragmentada em objetivos específicos divididos em passos
a serem percorridos pelos alunos. Nem mais e nem menos do que se
definia como a quantidade de conteúdo necessária para que produzissem
lucros nas linhas de produção das grandes empresas
Foram assinados acordos entre o governo brasileiro e a agência AID, norte-
americana, conhecidos como Acordos MEC/USAID, que previa assistência técnica e
cooperação financeira para elaborar e implantar as reformas educacionais no Brasil.
Nossos educadores foram afastados dos debates, tendo sido considerados incapazes
de promover reformas educacionais. Autoritária, vertical, domesticadora, as reformas
visavam ajustar a educação escolar ao modelo econômico desnacionalizante, imposto
pela política norte-americana para a América Latina, especialmente para o Brasil, cujos
investimentos eram vultuosos.
82 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
[...] ao mesmo tempo em que centenas de intelectuais, professores,
cientistas, técnicos e artistas brasileiros deixavam o país por causa
da perseguição política, da falta de condições de trabalho ou de
ambas as coisas, milhares de consultores norte-americanos aqui
desembarcavam como agentes de desenvolvimento e da modernização
[...]. A universidade brasileira também sofreu os efeitos da atuação
desses consultores, indiretamente pelo seu emprego no Ministério
da Educação; e diretamente, pelos cursos, seminários e treinamento
voltados para seu corpo docente, administrativo, quando não pelo seu
ansiado emprego como professores (CUNHA, 1998, p.28).
Caro aluno, eu estava lá e participei de todos estes cursos que nos retirava o
direito de refletir e decidir o que seria melhor para nossos alunos, mesmo porque,
só nós professores é que temos condições para realmente conhecê-los. Lembrando
Rousseau, queremos antes de tudo formá-los homens e estes não são, certamente,
meros “capitais humanos”.
A reforma do ensino de 1º e 2º grau foi instituída pela Lei 5692/71. Continha
como objetivos gerais um tríplice aspecto: desenvolver potencialidades, qualificar para
o trabalho e desenvolver uma cidadania consciente. Este último aspecto me indigna
de modo especial, e me pergunto, como seria possível desenvolver uma cidadania
consciente em um contexto de ditadura? Será uma nova moda de “conscientizar”
que eu desconheço?
Para atender o desenvolvimento de potencialidades e a qualificação para o
trabalho, foi instituído o ensino de oito anos para o 1º grau pela aglutinação do antigo
ginásio e primário, eliminando-se assim, o exame de admissão. Aglutinados também
foram o secundário e o técnico, garantindo continuidade de um grau para outro, além
da exigência legal de terminalidade entre um nível e outro, o que nem sempre ocorreu
no Brasil.
Merece menção especial a instituição do novo currículo, que esfacelou com
a Língua Portuguesa, a História, a Geografia, Ciências e Matemática. O currículo foi
composto de um núcleo comum para atender às exigências de uma formação geral
básica, e uma parte diversificada para atender às diversidades regionais. O núcleo
comum era composto de Comunicação e Expressão, Estudos Sociais e Ciências Físicas
8383UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
e Biológicas. Assim, enfatizar aulas de Língua Portuguesa ficava na dependência de
outros enfoques, como música, dança, artes em geral. Estudos sociais ficaram ao sabor
de se dar maior ênfase à História ou à Geografia, conforme a preferência professoral.
O mesmo aconteceu com as ciências e mecanização da matemática.
Os danos pedagógicos foram consideráveis em relação aos conteúdos do
ensino. As aulas de Língua Portuguesa se reduziram praticamente a aulas de gramática
pela gramática, sem função no discurso oral ou escrito. Redações e leituras, cada vez
mais raras, se reduziram ao indicado nos milhões de livros didáticos. A historia foi
reduzida a fatos, datas e heróis distanciados do povo como construtor da mesma,
meros objetos que nem conseguem se situar no passado, afim de poder identificar
seus erros e não repeti-los.
Os conteúdos de geografia se reportavam mais aos planetas ou estepes russas,
sem a preocupação com o espaço físico mal cuidado pelas políticas públicas. As
ciências foram estudadas como se fossem literatura, sem observação do entorno e
seus determinismos. O raciocínio matemático foi de tal forma mecanizado, que a
operacionalização de cálculo substituiu quase por completo esse ensino. Percebeu
as influências ideológicas que agem com força constante na formação de nossa
personalidade e na de nossos alunos? Se você está atento, já estará descobrindo o
que verdadeiramente significa formar aquela consciência crescente da qual lhe falei
no início deste trabalho.
Cartilhas manipuladas mecanicamente e operacionalizadas por soletrações
fragmentadas e desvinculadas da realidade dos alunos nos livros didáticos, planejamentos
prontos, com poderosa carga ideológica, foram produzidos nos Estados Unidos por
um dos acordos MEC/USAID, com direitos autorais para as editoras americanas. Foram
distribuídos milhares de livros pelo país inteiro, uniformes para todas as regiões e com
as lições na dosagem certa em quantidade e qualidade para formar, desde criança, o
“capital humano”.
A avaliação escolar enfatizou as provas objetivas tipo testes, bem mecanizados,
sem grandes exigências de raciocínio para respondê-los. Neutralizaram as provas de
resposta livre e de livre organização do pensamento. Nossos alunos não liam e nem
escreviam no cotidiano das escolas e nem nos processos avaliativos.
84 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
Convido você a fazer uma rápida introspecção sobre as dificuldades que tem
para interpretar textos ou organizar o próprio pensamento na escrita.
[...] Outro prejuízo inestimável foi a desativação da antiga Escola
Normal, destinada à formação de professores para o ensino fundamental.
Com a nova denominação “Habilitação para o Magistério”, e incluída
no rol das profissões esdrúxulas, perde sua identidade e os recursos
humanos e materiais necessários à especificidade de suas funções.
(ARANHA, 2006, p.215)
Esta professora que lhe escreve, felizmente, foi formada pela antiga Escola
Normal, e posso dizer que não conseguiram me engessar nessa formação reduzida em
objetivos, conteúdos e métodos. Minha consciência histórica não me tornou tecnicista
à moda do militarismo, fragmentada, e que não conseguiu formar, segundo Gonçalves
e Pimenta, nem o professor e nem o especialista.
Agora vamos dar uma voltinha pela reforma do secundário. Esta visava à
qualificação para o trabalho e se pretendia que fosse profissionalizante. Foram criadas
mais de cem habilitações, porém o Estado não reservou verbas para estruturar cursos,
como agrícolas, patologia, arquitetura, etc.. e nem forçou as escolas particulares a se
estruturarem. Acabaram por fornecer um arremedo de profissionalização e continuaram
a ter demanda social para os cursos que poderiam classificar socialmente a classe
média, que ainda sonhava com o filho doutor. Na realidade, esse grau do ensino foi
relegado às traças e agora parece ter seu caráter propedêutico mais comprometido
com o ensino técnico, que ganha espaço e demanda nas escolas de tempo integral,
nas Etecs e Fatecs sobre os quais falaremos na próxima unidade.
A reforma universitária foi promulgada pela lei 5.540/68 com objetivo
estritamente ideológico de conter a formação de grupos, tanto de alunos como de
professores, no interior da universidade. Convém citar que em 1968 os estudantes
se revoltaram contra o regime pela ausência de vagas nas universidades públicas,
ficando assim vedado às classes médias o acesso aos cargos médios nas estruturas
hierarquizadas das grandes empresas, que exigiam o diploma universitário para serem
ocupados.
8585UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
Por conta disso, os estudantes decidiram enfrentar o regime, em movimentos
que tiveram repercussões nacionais importantíssimas após a morte de um jovem no
restaurante Calabouço, no Rio de Janeiro. Tornava-se urgente a reforma universitária.
Esta foi elaborada e aprovada em trinta dias e com uma oposição de fachada e
consentida pelo governo central.
Onde foi parar a vez e a voz dos estudantes no interior da universidade? E
os Diretórios Acadêmicos? Extintos, foram substituídos por Estudos dos Problemas
Brasileiros e os que ousassem se manifestar eram enquadrados pelo decreto 477/68 e
impedidos de se matricular por oito anos em qualquer curso superior. A União Nacional
dos Estudantes, a UNE, foi colocada na clandestinidade e vem lentamente ressurgindo
das cinzas. È preciso e urgente apoiá-los. Há muito mais para ser dito. Desperte sua
curiosidade para compreender melhor este nosso presente no qual, nossos educadores,
não conseguem sequer pensar suas aulas e nem perceber o enorme viés ideológico,
que sob as aparências de discursos que não batem com a realidade, atuam com força
constante no interior de nossas escolas.
A reforma neutralizou as funções do ensino superior no sentido de minimizá-las
e garantir mercado à tecnologia americana.
Desafio para você
1 - Você, por acaso, já comprou um computador, um celular brasileiro ou outro
produto com tecnologia de ponta aqui fabricado? Não!? Por que será?
Lembra-se de que na Reforma Francisco Campos, de1931, foram instituídas
como função da universidade o ensino, a pesquisa e a extensão?
No militarismo o ensino se tornou rarefeito em semestralidades e cargas
horárias reduzidas; a pesquisa, sem recursos, capengou nas universidades públicas,
não se concretizou nas particulares e também não produzimos nossos computadores
que estavam sendo preparados nas universidades do norte, garantindo mercado
consumidor entre nós. Resta a extensão, que foi reduzida a mero assistencialismo,
sem projetos que realmente atendam aos problemas sociais.
86 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
Tal situação perdurou de 64 ao início dos anos 80, quando a política brasileira
iniciou um processo de abertura lenta e gradual até culminar com a eleição direta de
Fernando Collor de Melo para presidente.
Já lhe disse que há muito mais detalhes para serem analisados. Espero que você
esteja pelo menos curioso e busque esta análise. Por ora, encerramos esta parte por
aqui a fim de irmos para a contemporaneidade.
3.7 CONSIDERAÇÕES DA UNIDADE III
Ao longo de nossa história educacional, do jesuitismo e até este presente
momento, a educação brasileira ainda se apresenta formal e seletiva. O dualismo do
sistema se mantém presente e seleciona com força constante os destinatários dos
melhores cargos no mercado tecnológico em ascensão.
O ensino técnico, historicamente destinado à população de baixa renda, agora
ganha expressão e classifica socialmente os bem sucedidos, que nos tempos modernos
ainda têm base no status de origem e nível socioeconômico das famílias que lhes
oportuniza mais qualidade de ensino, desde a pré-escola até ao ensino superior.
Os que frequentam a escola pública perdem competitividade pela falta de
qualidade neste grau de ensino e pela negação de seus potenciais, pois ser pobre no
Brasil ainda é sinônimo de pouca inteligência.
O futuro parece acenar com melhores ares, mas fique certo de que a escola
que realmente precisa mudar é a pública das periferias, onde se concentram alunos
que vivem quase em pobreza absoluta. Nossos políticos têm que responder por isso se
usarmos conscientemente nosso voto.
Vamos agora caminhar para nossa quarta unidade, na qual pretendemos
delinear o contexto pós-moderno.
8787UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
TESTE SEU CONHECIMENTO
88 UNIDADE III - EDUCAÇÃO BRASILEIRA: DA COLÔNIA À REPÚBLICA ATUAL
8989UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
U N I D A D E I V
4EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
OBJETIVOS DA UNIDADE
• Identificar no contexto globalizado, tecnológico e neoliberal a
urgência em se definir um novo perfil de cidadão;
• Desenvolver o senso crítico com relação aos mecanismos ideológicos
e conservadores do presente momento histórico;
• Propor projetos para a formação das comunidades de aprendizagem
como forma de se colocar como sujeito da própria história.
HABILIDADES E COMPETÊNCIAS
• Conscientização sobre este presente momento em suas conexões
com a educação escolar;
• Conhecimento sobre o perfil do homem generalista como ideal para
os tempos contemporâneos;
• Identificação das comunidades de aprendizagem como meio ideal de
democratização da escola e diminuição da interferência ideológica
na educação.
90 UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
4.1 O CONTEXTO PÓS-MODERNO NEOLIBERAL
Nesta análise vou convidar você que me lê, a fazer uma viagem de inserção em
seu momento histórico. Este momento é de uma história que não faz, exatamente,
parte de nosso passado, pois estamos mergulhados até o pescoço neste presente, que
é o nosso.
Sugiro que você retorne à nossa primeira unidade, quando recebeu um convite
para conhecer sua identidade no passado histórico e definir-se como sujeito deste
futuro, que pretendemos, seja aquele que nos conduza da educação que temos para
a que precisamos e desejamos. È o momento no qual os educadores devem definir
claramente sua ideologia, sair literalmente da caverna material de Platão, inserir-se
com coragem e profundidade em toda teoria educacional, para obter o fundamento
teórico real para uma prática transformadora. Hoje, a nossa prática educacional ou
é transformadora de estruturas sociais extremamente injustas ou é conservadora das
injustiças que nos estão conduzindo a conflitos sociais inimagináveis.
Você, certamente, já ouviu falar muito em globalização, mas bem pouco sobre
os desafios que ela exige para continuarmos a ser gente com alguma dignidade.
Vamos mergulhar no conceito de globalização, mas não como algo teórico que está
fora de mim ou de você, mas no qual estamos inseridos profundamente, dia a dia.
Globalização da economia consiste na transformação das economias locais
numa economia mundial. Em termos coloquiais, o que eu e você estamos produzindo
hoje nos limites de nossas cidades ou país, deve contribuir de alguma maneira com
o livre comércio. É uma economia de mercado, numa aldeia global, organizada em
blocos econômicos. São contatos comerciais, culturais, financeiros e tecnológicos
em nível mundial. Significa que direta ou indiretamente, nos tornamos cidadãos do
mundo.
Há fatores impulsionadores e facilitadores deste novo processo no modo de
garantirmos nossa sobrevivência. Você, por exemplo, desde que acordou até agora já
acionou quantos objetos de automação para obter informações? Quantos botões foram
tocados desde a manhã de hoje até ao anoitecer, para que você obtivesse as informações
9191UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
que desejou num curtíssimo tempo? Você e eu e as demais pessoas deste mundo, que
nos parece obra de magia, estamos mergulhados numa cultura de informação que
apresenta grandes vantagens e também grandes prejuízos. Falaremos desses prejuízos
mais adiante. Por ora, nos interessa esse mergulho em nosso próprio mundo.
A cultura da informação tem como finalidade última, gerar consumo material
garantidor de economias mundiais, e por isso nos mergulha num mundo de imagens
que acabam por se constituir em meios para o consumo de ideias e geração de
necessidades nem sempre reais.
PARA REFLETIR
Atente para esta narrativa de Gentili (2005, p.229), para que compreenda
melhor o escrito acima.
Preocupada, Nora chegou um dia na sala de aula (Nora trabalha
como professora em uma escola pública) e pergunta a seus alunos de
terceira série: ‘O que é que não se pode comprar com dinheiro?’Os
quase quarenta meninos e meninas, a olharam surpresos, talvez
suspeitando que se tratava de outra loucura típica de sua professora
politicamente inquieta. Nora, insistente, voltou a perguntar: ‘O que
é que não se pode comprar com dinheiro?’. Após intermináveis
segundos de silêncio, uma das crianças ensaiou uma resposta: ‘Um
transatlântico’ Confiante outro arriscou: ‘jogar futebol com Maradona’.
Outro disse: ’uma casa com quadra de futebol e tênis’. Outra: ‘toda
a coleção da Barbie’. ‘Passar um dia com a Xuxa’, sonhou outra... As
respostas começaram a se espalhar pela sala de aula. Nora tentava em
vão organizá-las. De repente, todos queriam contar aquilo com que
sonhavam, e provavelmente jamais poderiam ter.
A narrativa nos remete para um quadro de mercantilização de todas as coisas.
Desde a infância, a cultura da informação privilegia o consumo necessário para a
globalização nos colocando, diariamente, diante de um show de imagens que criam
em nós necessidades de consumo nem sempre reais. Aqui, a guiza de reflexão,
empresto o pensamento de Marcuse, quando indaga se necessitamos mesmo de tudo
aquilo que compramos.
92 UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
A questão é que a tecnologia avançada está aí e não podemos mudar seus
avanços. O que realmente podemos é definir claramente suas vantagens e desvantagens
para educar as novas gerações no sentido da crítica e definição de critérios de ação,
para nos beneficiarmos realmente com estas conquistas.
É importante que nos conscientizemos de que estamos mergulhados na
globalização e que temos de aprender e a ensinar os melhores meios de convivência,
conhecendo as novas formas de nossas interações sociais. Convém para melhor
entender qual será a função da educação escolar em contexto de globalização, que a
meta capitalista seja sempre o lucro a qualquer custo, acima mesmo de qualquer pessoa.
Se esta se tornar improdutiva por alguma razão estará exposta a mecanismos sutis de
exclusão social, apesar das aparências de uma democracia efetiva, estabelecedora da
igualdade de direitos.
CONHEÇA MAIS
No dizer de Habermas a cosequência é que o ser humano se
vê afastado do seu centro, isto é, da sua visão autônoma (crítica e
reflexiva), e incapaz de gerir seu próprio destino. Dá-se também
o enfraquecimento dos laços de uma desejável intersubjetividade,
marcada pela solidariedade e cooperação, já que nessa ordem
empobrecida da universalização da razão instrumental predominam o
egoísmo, a competição e a exploração. (ARANHA, 2006, p.360)
A posição de Habermas nos coloca como educadores no impasse de decidir se
desejamos uma educação transformadora ou transmissora. É crucial decidir isso para
que você aprenda a não cair nas armações da ideologia neoliberal.
9393UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
4.2 O PERFIL NECESSÁRIO AO MUNDO GLOBALIZADO
Se você está lembrado, quando tratamos da tendência tecnicista na educação
brasileira, esta tinha como meta formar em nossas escolas o “capital humano”,
necessário para produzir lucros nas linhas de produção das grandes empresas
multinacionais aqui instaladas. Sem formação crítica sobre sua real condição de
dominados e explorados pelo capital tiveram suas personalidades mecanizadas.
Para essa condição de alienação, os conteúdos veiculados nas escolas públicas
eram dosados nas quantidades necessárias para fazer funcionar as linhas de produção
compostas por homens. Eram quantidades de conteúdos embutidas nos livros didáticos
produzidos pela AID, via Acordos MEC/USAID. Tinham a dosagem necessária de
conhecimentos contidos nos objetivos específicos de cada unidade, de modo a garantir
a produtividade, mas sem uma base acadêmica para evitar explorações. Obviamente
não concordamos com isso, mas era a ideologia do paradigma da modernidade.
Agora estamos no mundo globalizado, que exige mudanças de paradigmas e também
a redefinição de um novo perfil de cidadão a ser buscado pela escola.
O pós-moderno se caracteriza como a era da informação universalizada para
todos que conseguem ter acesso aos meios de comunicação informatizados. È muita
informação disponível para todos que acessam os modernos meios disponíveis e os
que não têm esse acesso estão automaticamente excluídos.
Assim, não dá mais para concentrar o ensino e a aprendizagem em livros
didáticos únicos, em aulas fragmentadas ou apostilas, na quantidade necessária para
o exercício profissional no mundo globalizado. Assim também como a velha escola
transmissora de conhecimentos, centrada em um professor que definia sozinho o que
seus alunos deveriam aprender, está superada no novo modelo. Quem permanecer na
velha forma estará, sem dúvida, excluído.
Se o velho modelo deve ser superado na sociedade da informação é de
fundamental importância que se defina um novo perfil de cidadão que a educação
escolar deve buscar. A proposta atual dos explicadores da educação está em se definir
como necessário um cidadão generalista que use o universo informativo a seu favor.
94 UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
O que entendemos por um perfil generalista?
Vamos tentar um conceito para o cidadão generalista como aquele que, desde
a infância, aprende a aprender; que é conduzido a resolver problemas criados nas
práticas educativas ao longo de sua formação escolar, desde a pré-escola até o superior
e seus decorrentes aperfeiçoamentos. Não se trata de alguém que sabe muito ou que
nada sabe, mas o que soluciona os impasses de toda ordem na vida e no exercício
profissional.
Essa conceituação nos remete, necessariamente, à revisão de objetivos,
conteúdos e métodos de ensino, para pormos em prática atitudes educacionais
contra ideológicas. Essa criança, ao chegar ao nível superior, certamente promoveria
uma revolução copérnica nesse grau de ensino e nas políticas públicas, por ter a
habilidade de buscar informações e meios para esses impasses. Porém, atente bem
para a ambivalência ideológica deste perfil. Tanto ele pode servir aos interesses do
capital como aos do cidadão livre e sujeito de sua história.
O que está aí na prática pedagógica é uma acentuada tendência para a
formação instrumental de nossas crianças e jovens em detrimento do que Boaventura
coloca, como a dimensão vital, compreendida como o desenvolvimento da afetividade,
solidariedade e cooperação. Paixões, sentimentos, emoções são transformados “em
inimigos do pensamento”. O fato mais objetivo e concreto do predomínio da lógica
instrumental na escola é a propaganda televisa sobre a emergência de se formar
técnicos. ETECs, FATECs, PRONATECs estão diariamente no show da mídia. Sejam bem-
vindos, mas com uma base acadêmica bem sólida, que lhes garanta sua humanidade
e afaste a possibilidade de serem meros apertadores de botões para não sei quem.
Educadores e pais devem concordar com isso, sem se descuidar de formar, sobretudo,
um homem capaz de evitar a robotização da mente humana. Para escolher bem
vamos nos lembrar de Rousseau, quando há séculos, diante dos avanços capitalistas,
nos orientou para formarmos homens antes de qualquer profissão técnica. Antes de
formar um técnico é fundamental sedimentar um homem lá na educação básica, sem
a qual só restarão as mentes tecnizadas. Fique atento!
9595UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
PARA REFLETIR
1- Considere o nosso contexto globalizado para responder o que o
preocuparia mais na educação de um filho: a boa faculdade que ele
deverá fazer no futuro para ter uma ótima profissão, um curso técnico
garantidor de emprego no mercado ou a educação fundamental que ele
deve ter?
Se respondeu que a preocupação maior está na educação fundamental,
acertou em cheio. É exatamente aí que se fundamenta a possibilidade
de bons estudos superiores, de uma formação humana que precede a
técnica pelos valores que veicula na formação da personalidade e que
preservam nossa humanidade. Nunca se esqueça de que a mente de uma
criança é extremamente plástica e preserva na memória profunda o que
aprendeu. Tudo que você desejar num homem coloque numa criança.
Atente bem para o fato de que será professor ou professora dela. Se está
curioso sobre o que realmente pode fazer, nunca deixe um aluno sair da
educação fundamental semianalfabeto.
2- Mais um desafio: Você se sente impotente como transformador diante
da realidade ideológica?
Posso supor que sua resposta será sim, mais ou menos e não. No primeiro
caso você já está, inconscientemente, condicionado pela ideologia
neoliberal. Cuidado e lembre-se sempre de que somos seres humanos
antes de tudo e que, principalmente não somos robôs que reagem a
toque de botões. Estamos dentro da dinâmica histórica e não fora dela.
Se respondeu mais ou menos pode estar em estado de alerta, que pode
pender ou para a subordinação, ou para a emancipação. Se respondeu
não é porque já se sente sujeito participativo de uma nova história. É
fundamental decidir-se.
No sentido de auxiliar suas decisões vamos agora conduzir nossas reflexões para
uma rápida análise do que é uma ideologia neoliberal e seus reflexos na educação
escolar.
96 UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
4.3 IDEOLOGIA NEOLIBERAL E EDUCAÇÃO
Vamos iniciar tentando dizer o que é ideologia.
A ideologia não significa mais do que sua etimologia deveria
significar, isto é, estudo das ideias. Passou a significar coisa muito
diferente e a ter uma figura bem pejorativa. Acontece que alguns usam
a palavra “ideologia” para significar o conjunto de ideias e valores e
maneiras de pensar de pessoas ou grupos. (GUARRESCHI, 2005, p.14)
O que o autor quer dizer é que, etimologicamente, é o estudo das ideias, mas
que pode significar a veiculação de “ideias erradas, incompletas, distorcidas, falsas
sobre fatos e a realidade” (op. cit., p.14)
É isso aí, a ideologia tem duas caras: acenar com ideais como a definição das
filosofias da educação e a realidade de consecução dessas filosofias com discursos
demagógicos e falsos. Estes na realidade tendem a defender valores que negam,
de forma sutil e pouco perceptível pelo observador comum, que acabam por nos
mergulhar em falsas realidades.
Platão retorna aqui com toda a força de sua utopia. Nossa visão do real é
imperfeita, porque é projetada pelas sombras da caverna da lucratividade. Já dissemos
que a realidade econômica globalizada influencia a formação de nossas personalidades.
Vivemos numa época de apologia do ter em detrimento de ser humano. Ter o melhor
estilo de vida que o dinheiro pode comprar é o imperativo de aceitação social, fator
que hierarquiza a sociedade entre os bem e os malsucedidos. Isso desencadeia o
desejo intenso de ter mais para consumir mais, estabelecendo um círculo vicioso de
consumo. Todos os círculos viciosos são difíceis de serem rompidos.
Como isto vai se redefinir na educação escolar? Vamos retroceder um pouco ao
modelo da modernidade industrial, no qual a escola passou a ser tratada como o lugar
por excelência para formar o “capital humano”. Na visualização das três pirâmides
vimos um sistema escolar colocado como um funil, que não garantia transformações
sociais em termos de direitos e deveres educacionais.
9797UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
Nesse período, embora o Estado fosse o garantidor financeiro e pedagógico
das escolas, era também protecionista de um certo tipo de educação pública e de leis
que favoreceram o trabalhador das bases das empresas.Marque bem este fato: quem
estava na linha de produção eram homens que garantiam essa mesma produção,e que
precisavam saber ler e escrever para o desempenho nas empresas, ter boa alimentação
e saúde. O Estado do bem-estar social é aquele que sustenta a escola pública, a
previdência social, as metas sociais como transportes, saúde e educação, que regula os
vícios do mercado, que interfere na esfera econômica, e não interessa mais à ideologia
neoliberal, que robotizou as empresas. As máquinas substituem muitos homens e
dispensam o protecionismo das leis ou do Estado.
A ideologia neoliberal dá um novo caráter ao velho capitalismo, acusando a ação
protecionista do Estado como causadora de atrasos no desenvolvimento econômico
dos empreendimentos, tido como o único válido para o progresso da sociedade.
A teoria neoliberal remonta a 1869, com Leopold Von Waiese, da escola
austríaca e na Europa ocidental foi amplamente aplicada por Margareth Tatcher, a
partir dos anos de 1980. Ela privatizou empresas estatais, afrouxou a carga tributária
contra os ricos e sobre as empresas, estabilizou a moeda e anulou a ação sindical
nas mediações salariais. A partir daí serviu de modelo para as políticas europeias que
compõem o grupo econômico dos mais ricos do planeta, o G8, no qual se inclui os
Estados Unidos.
DICA DE FILME
Cidadão Keynne- Período do capitalismo liberal. Fase de implantação da
produção em série iniciada por Henry Ford e instituidora do estado do
Bem-Estar Social.
A Dama de Ferro- Atuação neoliberal de Tatcher na Inglaterra. Mostra-nos
a anulação sindical nas negociações salariais, a diminuição de impostos
para os mais ricos, a estabilização da moeda, entre outros detalhes
neoliberais. Vale a pena conferir!
98 UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
O que estamos percebendo aí é que, embora se autodenominem pós- modernos,
na realidade continuam firmes na concentração de renda nas mãos de poucos, obtida
pela subordinação de muitos, agora em escala mundial em relação aos países que
não pertencem ao G8. Lucros a qualquer custo, até da pessoa humana, em qualquer
estágio de desenvolvimento. Crianças e jovens oriundos da miséria e pobreza absoluta
provavelmente não serão bons “capitais humanos” e não justificam investimentos,
idosos são improdutivos, logo descartáveis, portadores de necessidades especiais só
serão incluídos na base da caridade das empresas.
Centralizam as responsabilidades pelo atravancamento de suas empresas no
Estado do Bem-Estar, condenando o fato dos recursos públicos serem destinados
à saúde, educação, habitação, dos menos favorecidos. As leis trabalhistas que
favorecem os trabalhadores com o décimo terceiro salário, direito a férias, direitos
de recisão de contratos e demissões, licença saúde e maternidade, intervenção dos
sindicatos nas decisões salariais, passam a ser problema dos indivíduos. Hipocritamente
consideram que só os fortes sobrevivem e que a existência de ganhadores implica
necessariamente na existência de perdedores, que devem conformar-se e apelar para
a caridade. Portanto, impostos que oneram as empresas não devem ser utilizados e
nem aumentados para esse fim.
As questões sociais passam a ser de responsabilidade dos indivíduos, que devem
procurar esse atendimento na privatização, não só de empresas como de escolas, de
planos de saúde, na conquista habitacional e de transporte individual.
Não pense que ainda estamos longe disso e saiba que já se fala em projetos nas
câmaras brasileiras de se modificar as leis trabalhistas para favorecer o progresso das
empresas e que a famosa inclusão social dos portadores de deficiência, como é o caso
das APAEs, estão condenadas a viver à míngua por falta de recursos públicos cada
vez mais cerceados. Também não é por acaso que pessoas pobres estejam morrendo
nos chãos do SUS, e que os aposentados não recebam aumento nas aposentadorias
porque são improdutivos e devem ser descartados.
Caro leitor, abra bem os olhos sobre a atuação do político que elegeu. Ele é
vencedor por fazer o jogo do sistema. Não se descuidem, porque pelo poder investido
por nós mesmos, ele poderá acabar conosco e ainda ter a proteção policial que nós
9999UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
pagamos. Tem mais, muito mais, a se dizer sobre isso, mas por ora vou desafiar você
mais um pouco.
PARA REFLETIR
1- No contexto exposto acima, dá para você inferir sobre os destinos da
escola pública?
Acertou se concluiu que essa ideologia nos faz dizer um adeus à escola
pública, pois esta deverá deixar de receber o protecionismo do Estado
porque os muito pobres são descartáveis como futuro “capital humano”.
Agora, o que prevalece é a formação técnica em níveis de excelência e
por isso necessita de base acadêmica que possibilite o domínio correto e
pleno da língua, dos cálculos e de uma segunda língua, preferencialmente
o inglês, por sua pretensa universalidade. Dá para você imaginar nosso
molequinho que vem sofrendo os malefícios da miséria desde que nasceu
tendo uma real oportunidade em tal ordem se ele já é um excluído desde
o nascimento?
2- Você consegue perceber outros mecanismos ideológicos que
contribuem para a manutenção conservadora da escola pública?
Aqui vale alertá-lo para a questão da valorização do magistério público
e, de forma especial, os professores da educação básica, que é só
demagogia. Por que será que este profissional é o mais mal remunerado e
mais desprestigiado? Atente também para a propaganda massiva sobre os
cursos técnicos em notável valorização instrumental em detrimento da vital.
Por que será? Observe mais que você vai ver quais as reais oportunidades
que tem um aluno pobre de vencer os vestibulares elitizados do novo
ensino técnico ou mesmo de classificar-se com vantagens no ENEM? E os
analfabetos funcionais, será que ninguém mais sabe alfabetizar ou foram
produzidos com o aval do sistema? Chega por ora, não dá para colocar,
tudo. Fique atento e descubra por si. Lembrete amigo: o neoliberalismo
está descartando os extremos considerados improdutivos e formando
marginais em larga escala.
100 UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
4.4 PROPOSTAS EDUCACIONAIS ATUAIS PARA O CONTEXTO NEOLIBERAL
Os explicadores da educação na sociedade globalizada neoliberal entendem
que a educação ideal é aquela que se propõe a ser transformadora. Qualquer tentativa
de conservadorismo que mantenha relações laborais de exploração ou subordinação
como forma de garantir alta produtividade na sociedade da informação será,
certamente, alienada no que se refere à exclusão social.
As consequências de um processo de exclusão social contínuo estão eclodindo
pelo mundo a fora e as reações sociais daqueles que pareciam não ter consciência de
seu poder estão depondo governos em nações onde estes pareciam intocáveis, como
no caso mulçumano. E estes fatos ganham a aldeia global pela informação rápida e
imediata de tudo o que ocorre no planeta.
Depuseram ditadores que pareciam inabaláveis nos seus tronos. Os Estados
Unidos gastam fortunas com suas fronteiras para impedir que os excluídos pelos suas
políticas satelizadoras da América Latina, lá habitem. Para um observador atento, eles
continuam a penetrar o território apesar dos impedimentos americanos e já reivindicam
alguns direitos. O grupo do G8, organizador do bloco econômico europeu, cria todos
os obstáculos possíveis para que a África não vá morar lá.
A sociedade da informação é uma janela aberta para o mundo e mostra muito
bem as possibilidades e direitos de todos os excluídos e os dinamiza para uma ação
antes não imaginada pelos donos do capital. Até os brasileiros estão aprendendo a
reagir. A alienação dos produtores da exclusão que persistem nessa busca desumana
e desenfreada de lucros a qualquer custo está criando um nível de violência e
criminalidade sem precedentes, porque pobres também precisam sobreviver e estão
reagindo pelo seu lado mais primitivo de predadores. Têm cérebro, pensam, sentem,
agem e reagem com força igual ou contrária e com um agravante, pois, em maior
ou menor grau, habitam o mundo da informação e das imagens do consumo que
desejam e que não podem ter.
101101UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
Poderíamos prosseguir nessa linha de análise por um longo espaço redacional a
fim de convencê-lo, meu leitor, a engajar-se na ideia de uma educação transformadora.
Levantei apenas a premissa básica das consequências sociais se persistirmos na mesma
história econômica empresarial e seremos coniventes com os tiros que estão sendo
disparados neste momento pelos chamados marginais.
Vamos à proposta, que não é minha, mas que me agrada.
A coerência mínima da educação com a sociedade informacional é que a mesma
se caracterize pela transformação e pela inclusão.
O primeiro passo é descentralizar decisões, criando na escola as comunidades
de aprendizagem. Entenda-se que essas comunidades de aprendizagem não se
constituem de ideias de alguns teóricos ou políticas pedagógicas públicas, ou ainda,
de especialistas mais comprometidos com o sistema que com a escola.
De quem você está lembrando agora? Não seria dos anarquistas? Lembra? O
governo paga a conta e as comunidades decidem e gerenciam a pedagogia de sua
educação.
Sendo a integração a característica imperativa dessas comunidades nenhum
agente escolar esta excluído, desde os governos, secretarias, supervisores, famílias,
alunos e funcionários. Essa ideia vem sendo veiculada desde o fim da ditadura militar
no Brasil pelas teorias propostas nos cursos de pedagogia, como a elaboração do
projeto político pedagógico emancipador. Gestões centralizadas contrariam a natureza
desse projeto e o imperativo da democratização se impõe a elas desde o Ministério
da Educação até a escola. Ninguém deverá ser excluído, como ninguém deterá poder
de mando.
Essas propostas permaneceram apenas na teoria sem a sustentação de uma
prática. A guiza de ilustração, desde os anos 90 na Europa neoliberal, já proliferam as
comunidades de aprendizagem como forma de garantir o poder. Espertos eles, não acha?
O que realmente muda é que as decisões não devem ser mais prerrogativas
de grupos em posições hierarquizadas superiores. Se a questão está na escola, lá é o
102 UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
palco das decisões. Serão, necessariamente, comunidades participativas, permanentes,
interdisciplinares e intersubjetivas.
CONHEÇA MAIS
As comunidades de aprendizagem não são as ideias de alguns
teóricos, muito pelo contrário, as comunidades de aprendizagem são
o resultado do esforço dialogante e igualitário de muitas pessoas:
professores e professoras, assessores e assessoras, autores e autoras,
familiares e voluntários. Não se justificam com o argumento de quem
deve levá-las à prática e que não as entendem bem e, por isso, fracassa
sua aplicação. (FLECHA e TORTAJADA, 2000, p.35)
Acredito que você já tenha uma boa noção do que seja uma comunidade de
aprendizagem, pela integração igualitária de todos. Neste momento devemos colocar
alguns pressupostos a serem considerados.
São comunidades participativas entre iguais e não se admite outra linguagem
que não seja dialógica, historicamente já praticada no Brasil por Paulo Freire. Não
basta conversar, mas é fundamental desenvolver-se a habilidade para dialogar, o que
também é uma questão de aprendizagem para todos os agentes educacionais.
A construção histórica de nossas estruturas administrativas nos coloca, desde
a colônia até agora, diante da rigidez hierárquica, em que alguns poucos mandam e
outros tantos obedecem. Por outro lado, os obedientes simples e naturalmente, só
esperam ordens para serem cumpridas e as executam como podem ou simplesmente
consentem na aparência, mas resistem na realidade de fato.
Não basta informar-se; é primordial desenvolver a habilidade de processar as
informações e utilizá-las, rompendo com a dicotomia secular de que teoria é uma
coisa e prática é outra.
103103UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
PARA REFLETIR
1- Vamos imaginar que você, na condição de educador, pudesse retroceder
no tempo da Grécia Clássica e passeando pelas ruas encontrasse Sócrates.
Considerando o que está escrito acima, o que você acha que ele lhe diria?
Acertou se disse “Conhece-te a ti mesmo” como agente educacional,
reconheça “que o que sabes é que nada sabes” e vá dialogar para parir
ideias novas.
2- Prosseguindo no passeio e encontrando Aristóteles, o que você iria
ouvir?
Aprenda a dialogar, porque o equilíbrio de todas as coisas está nas
decisões mediadas e nunca no radicalismo das imposições arbitrárias.
Tenha a habilidade de ser uma causa eficiente em sua vida e na de seus
alunos. Nunca negue os potenciais de seus alunos. Desenvolva-os porque
ele sempre poderá aprender se você souber como fazer.
3- Agora é a vez de Platão. O que ele lhe diria?
Certamente que não há valores dignos que justifiquem materialidades
desumanas. Sai da caverna e descubra seu próprio poder de mudança.
Percorra novamente a história e achará uma lista muito grande de
possibilidades que não foram praticadas. Associe teoria e prática
analisando as possibilidades que oferecem. Direcione sua prática tendo
como norte valores reais a partir do bem, do belo e do justo.
4.5 O ALUNO NAS COMUNIDADES DE APRENDIZAGEM
Você deve estar lembrado do que falamos sobre um cidadão generalista.
Relembrando um pouco esse perfil, como aquele cidadão capacitado para buscar e
elaborar informações diante de situações problemas, pergunto: Quando se inicia a
formação deste generalista? Se você pensou que se inicia pela formação básica, da pré-
escola até o término do ensino fundamental, possibilitando infindáveis continuidades,
acertou em cheio.
104 UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
Considere que aprender a utilizar os signos linguísticos para informar-se
é indissociável do desenvolvimento do processamento dessa informação. Daí a
importância da alfabetização para um acesso real ao conhecimento. Aí já podemos
inferir o papel social das aprendizagens significativas e dialógicas, na qual os educadores
descem de seus status superposto a de seus alunos e pareiam ou curvam-se para
eles. Sempre será possível um adulto curvar-se para uma criança do que esta tentar
alongar-se até ele, não é?
Considere aqui que os contextos acadêmicos da alfabetização vão bem além
da circunscrição da sala de aulas e abrange outros contextos da vida cotidiana.
Considerando isso, entenda que seus alunos vão pouco a pouco desenvolvendo
habilidades comunicativas dialogais. Dessa matriz podemos criar práticas didáticas
riquíssimas em processos interativos, na qual todos os diferentes potenciais têm
oportunidade de se desenvolver. Cobre isto de suas aulas de didáticas.
Com relação aos conteúdos do ensino a serem veiculados na educação básica,
o domínio da língua materna, tanto oral como escrita, deve ser a coluna dorsal de
todo o ensino fundamental. Se você deseja realmente saber o que pode fazer pelo seu
país, não permita, em hipótese alguma, que seus alunos deixem esse grau de ensino
semianalfabetos. Oralidade, leitura e escrita são valores transcendentes para todos os
tempos e qualquer sociedade e são imperativos na sociedade da informação. Alunos
vão dominando a linguagem, e também vão sendo iniciados no mundo da cultura
histórica, geográfica, científica, matemática, moral, artística, etc.
Não se alfabetiza sem fundamentos a não ser que nos portemos como tecnicistas
puros. Logo, as contribuições das ciências sociais e pedagógicas exercem um grande
papel. Volto a Aristóteles, nunca radicalizar optando por uma única teoria. As ciências
sociais podem ajudar se houver consenso lá nas comunidades de aprendizagem.
Radicalizações e imposições têm causado prejuízos difíceis de reverter na formação de
alunos, como foi o caso do comportamentalismo puro da ditadura militar, que ainda
persiste nas práticas pedagógicas.
Como contraponto a isso, podemos referir à imposição arbitrária das linhas
construtivistas. No caso de São Paulo, que conheço mais de perto, ocorreu um
reducionismo da alfabetização à Psicogênese da Língua Escrita proposta por Ferreiro.
105105UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
Na prática, atingido o nível alfabético, no qual o aluno é semianalfabeto, este persistiu
até o último ano do fundamental, criando-se o fenômeno do analfabeto funcional
que, quando consegue chegar ao oitavo ano, ainda não escreve, com correção, o
próprio nome. Como isso ocorreu através de discursos demagógicos o que aconteceu
foi a intervenção de um poderoso viés ideológico, concretizado por uma apologia
gritante sobre progressão continuada, que não teve respaldo nem recursos para que
realmente ocorresse em nível de escola. Atrevo-me a afirmar que o Estado gerou
tantos analfabetos funcionais quanto o sistema precisou para justificar o desemprego
dos não qualificados. É a velha fórmula de excluir, responsabilizando alunos, suas
famílias, seus professores e professoras.
Acho que você deve estar se questionando que, se a proposta não é nem
construtivista e nem tecnicista, qual seria? Um vazio teórico? Nem de longe. Decidir
por uma teoria fundamentadora de aprendizagem é lá nas comunidades e não
nos gabinetes superiores. Porém, o que minha prática, tanto na educação pública,
como no ensino universitário lhes indica, é que sejam holísticos. Todas as teorias
têm algo a oferecer se considerarmos que atuamos em diversidades de potenciais.
Considere isso a partir de algumas contribuições da escola tradicional, escolanovista,
sociointeracionista, gestaltista, comportamentalista e outras que possam surgir e que
devem marcar presença nos dias atuais. Estude bem todas elas para ter condições de
levar esse debate para as comunidades de aprendizagem. Esse deve ser o conteúdo da
Psicologia da Aprendizagem nos cursos de Pedagogia.
Saiba que países do G8, aqueles dos ricaços de todo o mundo e que decidem
poderosamente as nossas vidas têm uma educação fundamental de altíssima
qualidade. Cada vez que alguém me colocava essa questão eu ficava uma pimenta
de irritada por não se considerar reais as possibilidades entre culturas tão díspares.
Algumas reflexões me conduziram a repensar isso. A primeira são os defensores da
educação e desenvolvimento social em torno do papel decisivo que esta tem com
relação ao progresso econômico. Outra foi a leitura de Ibérnnon, de que necessitamos
conhecer essas propostas educacionais para verificarmos o que elas têm e nós não
temos,verificando aí qual a extensão da responsabilidade política de nossos governos.
E outra, também devo a Ibérnnon, que conduziu meu pensamento para uma reflexão
tão óbvia que quase não a percebi. Se estamos dentro da dinâmica histórica e temos
habilidade comunicativas somos capazes de ações. Simples, não é?
106 UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
Harbemas(1987), desenvolve uma teoria da competência
comunicativa na qual demonstra que todas as pessoas são capazes
de se comunicar e gerar ações. Todos nós possuímos habilidades
comunicativas entendidas como aquelas que permitem comunicarmos-
nos e atuarmos em nosso meio. (In Ibérnon, op cit, 2000, p.29)
Desenvolvidos ou não, ricos ou pobres todos estão dentro da dinâmica histórica
e não fora dela por possuirem habilidades comunicativas. A questão é redirecionar o
foco.
A Finlândia e a Suécia são dois países desenvolvidos do grupo europeu que tem
o mais alto padrão de vida social. Como cuidam da educação básica para preservar
essa qualidade de vida? Possuem uma concepção claríssima sobre a infância como
portadora de potenciais plenos a serem desenvolvidos para atingir a vida adulta,
necessária à manutenção daquele estilo de vida. Apostam na infância e consideram a
educação infantil como fundamental.
A educação básica é pública, obrigatória e gratuita. O salário de um professor está
em torno de sete mil dólares; com orientação profissional contínua, não há avaliações
excludentes ou classificatórias; enfatizam a arte e a criatividade a fim de desenvolver
o raciocínio lógico, pela ênfase dada á criatividade. Com relação aos procedimentos
didáticos têm “software” educativos e multimídias para todos os alunos e professores
executarem seus projetos pedagógicos, além de bibliotecas atualizadas e com grande
acervo de livros, revistas, DVDs.
É um sonho que parece impossível, mas não é. Temos que aprender a
reivindicar, pois afinal pagamos impostos altíssimos para isso, temos comunidades
com habilidades comunicativas e participativas, somos capazes de agir. Vivemos um
momento da história de nossa pedagogia no qual as concepções sobre a infância e
de seus potenciais já atingiu um patamar mais elevado. Temos consciência sobre seus
estágios e como devem ser atendidos pela escola. Há espaços para novas ações, ainda
que tardias. Se você concordar comigo já somos dois, e mais outro, e mais outro.
Pense nisso.
107107UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
4.6 CONSIDERAÇÕES DA UNIDADE IV
Esta unidade não se encerra aqui. Há muito o que escrever sobre este momento
de nossa história no qual estamos inseridos. A realidade histórica da educação brasileira
é que vivemos numa intensa época de transformações científicas e tecnológicas e a
grande maioria dos brasileiros não tem consciência desta realidade e muito menos dos
desafios que ela representa.
Autoconscientizar-se é primordial para os educadores em exercício e para
os que se pretendem pedagogos, caso desejem elaborar práticas pedagógicas
transformadoras. Se o embasamento não for histórico, as didáticas tendem a ser
conservadoras, restringindo cada vez mais a questão das oportunidades educacionais.
Os grandes bolsões de miséria e pobreza, tidos como descartáveis por ideias neoliberais
conservadoras de concentração de renda nas mãos de poucos, já gerou uma subclasse
social de marginais, quase impossível de conter.
Cada brasileiro tem o dever de analisar qual o seu papel nesta situação, mas
nós, os professores, temos a obrigação de definir mais claramente qual o papel político
que concretizamos em cada aula que damos. É aí mesmo, nessa escolinha pequena,
nessas salinhas de nossas escolas de cada dia, que temos uma oportunidade imensa
de transformar. Como? Comece por não permitir que nenhum aluno da educação
básica chegue até o final do Ensino Fundamental semianalfabeto. Alfabetizá-los e
torná-los escritores e leitores após nove anos de escola é seu grande dever e você
nem pode imaginar o leque de oportunidades que se abrirá para ele. Por isso, nunca
abandone um aluno no canto da sala durante a educação básica.
Agora, para encerrar, um pouco de Geraldo Vandré:
“Vem, vamos embora que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora e não espera acontecer.”
Entendeu? Vamos fazer a hora?
108 UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
TESTE SEU CONHECIMENTO
109109UNIDADE IV - EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA
111111 REFERÊNCIAS
REFERÊNCIAS
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3.ed. São Paulo: Moderna, 2006.
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Zahar,1981.
CAMBI, Franco. História da Pedagogia. 1.ed. São Paulo: Unesp,1999.
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Escravrocata. Brasília: Unesp/Flacso, 2000.
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Flacso, 2000.
DEL PRIORE, Mary (org). História das Crianças no Brasil. 1.ed. Petrópolis: Vozes,
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HABERMAS, J. Teoria da Ação Comunicativa. Madrid: Taurie, 1984.
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2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2000.
112 REFERÊNCIAS
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1970.
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dias. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2005.
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NAGLE, George. Educação e sociedade na Primeira República. São Paulo: EDU/
Edusp, 1974.
ROMANELLI, Otaíza de Oiveira. História da Educação no Brasil.1.ed.Petrópolis:
Vozes,1983.
ROUSSEAU, Jean Jacques. O Emílio. São Paulo: Martins Fontes, 2004.
TOBIAS, José Antônio. História da educação brasileira. 2.ed. São Paulo:
Juriscred,1995.
VEIGA, Cyntia Greive. História da educação. 1. ed. São Paulo: Ática, 2007.
113113 RESPOSTAS COMENTADAS 113
RESPOSTAS COMENTADAS
UNIDADE I
1. b)
Porque as ideias contidas nas três primeiras alternativas definem a importância da história no
resgate de identidades e participações ativas como participantes da dinâmica histórica.
2. c)
Pois Sócrates foi subjetivista, Platão idealista e Aristóteles realista. Os pós-socráticos estoicos foram
antimaterialistas por considerar a matéria como causa de sofrimentos.
3. b)
Porque o que ocorria nesse período era uma total ignorância sobre as particularidades.
UNIDADE II
1. a)
Entre outras inovações, as ciências deveriam contribuir para o desenvolvimento do espírito crítico,
indispensável pra as alterações do credo religioso.
2. b)
Você já percebeu que quando se alteram as formas de produção alteram-se também as filosofias
e formas de relacionamento social. A passagem do humanismo para o realismo ocorreu pelo
surgimento das fábricas, que mudou as formas de pensar e agir da sociedade em questão.
3. e)
Embora com fins religiosos, os protestantes influenciaram a democratização da escola entendendo
que ela deveria atender a todos, como o faria o próprio Cristo. Entendiam que, ao lado de cada
igreja protestante haveria uma escola.
114 RESPOSTAS COMENTADAS114
4. c)
As novas formas capitalistas de produzir geraram não apenas grande demanda social por educação
escolar como um grande interesse para com o aproveitamento dos alunos nas escolas. Tal fato
gerou severas críticas à educação livresca e distante da realidade do aluno, o que conduziu a
reflexões sobre as diferenciações entre uma criança e um adulto e esta deixou de ser vista como
um adulto em miniatura.
UNIDADE III
1. a)
O sistema econômico agrícola, exportador e dependente de Portugal, apoiado na grande
propriedade e mão de obra escrava, não gerou no colonizador a necessidade de escolas para
garantir lucros.
2. c)
Os filhos da elite brasileira que completavam estudos na Europa trouxeram para cá os ideais liberais
associados às oportunidades de bons empregos para os escolarizados. Nesse quadro de referência
se destacaram anarquistas e escolanovistas, por reivindicarem uma escola pública sem interferência
do Estado e de estilo democrático.
3. c)
Qualquer pretensão de democratizar a educação escolar está na preservação do direito de todos,
independentemente de sua condição econômica de ter acesso e permanência na escola.
4. d)
Você já percebeu que uma educação desenvolvida sob os ditames de uma ditadura jamais formaria
alunos ou aceitaria professores críticos, reflexivos e criativos. Se tivessem oportunizado a formação
de uma cidadania consciente, a ditadura não teria resistido por trinta anos, não acha?
UNIDADE IV
1. c)
É fundamental que, como futuro educador, você esteja atento às transformações do trabalho, a fim
de entender para onde direcionar seus alunos e filhos.
115115 RESPOSTAS COMENTADAS 115
2. d)
A ideologia neoliberal condena qualquer política pública por entender que educação, saúde,
moradia, transportes são problemas individuais e que quem não consegue se prover não é problema
do Estado, mas da própria incompetência dos menos favorecidos. Argumenta ainda que todos,
pobres ou ricos, são democraticamente expostos às leis de mercado e nesse desafio vencem os
mais capacitados. Nesse sentido são chamados de neoliberais conservadores, que exigem cada vez
mais a concentração de renda nas mãos dos mais “capazes”.
3. a)
Atente que para se memorizar tudo que determinadas áreas do conhecimento exigem seria
necessário mais de um cérebro. Determinadas bases bem consolidadas, como o domínio da leitura,
da escrita e cálculos matemáticos sedimenta a busca de qualquer conhecimento que se fizer
necessário em determinados momentos específicos.
4. b)
Somente comunidades de aprendizagem compostas por todos os agentes educacionais, como
pais, diretores, professores, supervisores, secretários, é que podem optar por um trabalho conjunto
e cooperativo, que tenha como norte o perfil do cidadão a ser formado com a participação
indispensável da escola. Já temos algumas experiências de comunidades de aprendizagem pela
proposta de gestão democrática, que descentraliza o poder de decisão dos diretores de escola.