ANO 605 | 08 | 2013 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO · PDF fileo Sistema Nacional de...

3
ANO 6 05 | 08 | 2013 ONLINE TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL I N F O R M A T I V O 277 Eduardo Nichele Combate às drogas O uso e o tráfico de drogas são portas de entrada para a criminalidade. Em Alvorada, um dos municípios com os maiores índices do Estado, uma iniciativa do Poder Judiciário, em parceria com o Ministério Público, vem tentando conscientizar os usuários de maconha sobre os efeitos lesivos da droga, vista por eles como mais “leve” em comparação com outras substâncias entorpecentes ilícitas. Em audiências coletivas, especialistas falam sobre o assunto do ponto de vista da prevenção e da legalidade. Depois do projeto, o número de reincidências diminuiu em 80%, comemoram os organizadores. PÁGINAS 2 e 3

Transcript of ANO 605 | 08 | 2013 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO · PDF fileo Sistema Nacional de...

A N O 6 05 | 08 | 2013

ONLINETRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

I N F O R M A T I V O

277

Edua

rdo

Nic

hele

Combate às drogas

O uso e o tráfico de drogas são portas de entrada

para a criminalidade. Em Alvorada, um dos

municípios com os maiores índices do Estado, uma

iniciativa do Poder Judiciário, em parceria com

o Ministério Público, vem tentando conscientizar

os usuários de maconha sobre os efeitos lesivos

da droga, vista por eles como mais “leve” em

comparação com outras substâncias entorpecentes

ilícitas. Em audiências coletivas, especialistas falam

sobre o assunto do ponto de vista da prevenção

e da legalidade. Depois do projeto, o número de

reincidências diminuiu em 80%, comemoram os

organizadores.

PÁGINAS 2 e 3

Fumar um baseado não dá nada’. É essa mentalidade que faz com que

muitos dos usuários de maconha acabem ingressando no mundo das drogas mais pesadas, como a cocaína e o crack, num caminho destrutivo sem volta. Para alertar sobre os malefícios do uso de substân-cias entorpecentes, é que a Comarca de Alvorada, na Região Metropolitana, está desenvolvendo o projeto de prevenção ao uso e conscientização aos usuários de drogas. A iniciativa consiste em reunir em audiências coletivas os que não têm ante-cedentes criminais por tráfico de drogas para assistir as palestras com especialistas. O resultado tem sido uma redução de 80% das reincidências.

A Juíza Melba Elisabeth Reginato Zardo, do Juizado Especial Criminal (JECRIM) da Comarca de Alvorada, explica que as audiências coletivas são bimestrais, pré-agendadas e realizadas no Salão do Júri. Ali, são reunidos cerca de 50 participantes, todos flagrados com

maconha, intimados a comparecem à pa-lestra de conscientização. Os participantes recebem um certificado de participação e o Termo Circunstanciado é arquivado. Há um acompanhamento da reincidência no uso de entorpecentes e, em caso positivo, não há nova chance de assistir as palestras. A ação conta com o apoio do Ministério Público, através da Promotora de Justiça Ana Adelaide Brasil Sá Caye.

Questão de saúdeA Juíza conta que o projeto foi uma saí-

da para tentar conscientizar os usuários, que acreditam ter controle sobre o consumo da droga. “Eles estão mais preocupados se vão ir para a cadeia ou não. Mas queremos fazer um alerta sobre o problema de saúde que o consumo pode causar. Também queremos dar apoio às famílias, porque há muita in-ternação compulsória na nossa Comarca. Geralmente, os familiares não aguentam mais a situação”, relata a magistrada.

Outra justificativa para inserção do projeto na Comarca, ressaltou a Juíza

Melba, é colocar em prática o que deter-mina a Lei n° 11.343/2006, que instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, prevendo mecanismos que viabilizam o tratamento e a reinserção social ao dependente químico quando em conflito com a lei.

Na quarta audiência coletiva realizada pelo projeto, o convidado a palestrar foi o Promotor de Justiça Márcio Emílio Lemes Bressani, que também integra a Associação do Ministério Público do RS e o Instituto Crack Nem Pensar. “Vejo com otimismo a presença de vocês aqui. A iniciativa da Juíza e da Promotora é mais produtiva do que simplesmente iniciar um processo criminal”, disse ele aos presentes.

O lado lesivo da maconhaO membro do MP explicou que, apesar

das discussões em torno da legalização do uso da maconha, o seu consumo continua sendo crime. Ele destacou estudos que as-sociam o uso prolongado da droga com o desenvolvimento de cânceres nos sistemas

Palestras de conscientização reduzem reincidência em AlvoradaPor Janine Souza

EDIÇÃO 277

ONLINE22

respiratório e reprodutivo. “Pois a fumaça possui de 50% a 70% a mais de hidrocar-bono cancerígeno que o tabaco presente no cigarro normal”. Ainda, conforme a Orga-nização Mundial da Saúde (OMS), preju-dica também o desenvolvimento cognitivo, desempenho psicomotor, capacidade de recordar, entre outros. Na gravidez, pode causar alterações no desenvolvimento fetal.

Outros estudos indicam o risco aumen-tado do usuário ter AVC e Alzheimer. O uso frequente da maconha também está associa-do ao câncer de testículo, disfunção sexual e diminuição da fertilidade. “Portanto, se a maconha possui um componente que pode ser usado para fins medicinais, como justi-ficam os que apóiam a sua legalização, por outro lado, ela tem muito mais substâncias lesivas à saúde”, justifica Bressani.

O palestrante alertou ainda para o potencial lesivo diferenciado quando a maconha é consumida com outras drogas. “Fragmentos de crack no ‘baseado’ cau-sam dependências mais severas”, frisou

Equipe coloca em

prática o projeto que

visa alertar sobre

os males do uso de

droga, a partir da

esquerda: Oficial

Escrevente Cláudia

Brum, estagiário

Renan Gross,

Promotor Márcio

Bressani, Juíza Melba

Zardo e a Assessora

da Juíza, Gláucia

Santos Brum

ele. Falou ainda da sensação de satisfação momentânea quando as pessoas fumam um cigarro de maconha. “Costumam se enga-nar de que têm o controle total da vida. Mas se ficam sem, não relaxam, não comem, não dormem, não fazem mais nada da vida”.

CrackAlguns participantes da audiência fa-

laram sobre a sua relação com as drogas. A maioria reconhece apenas os males cau-sados pelas mais pesadas, especialmente o crack, e consideram que usam a maconha para relaxar. “Experimentei crack, mas vi que não era para mim. Depois, fiquei com nojo da situação”, disse um deles. Outro relatou que usou crack durante dez anos, mas que o fundamental para fazê--lo largar a droga foi quando ele próprio se deu conta do mal que fazia para si. “Foi difícil eu criar a minha consciência e parar. Mas minha família me ajudou muito. Também troquei de ambiente e de amizades”, contou.

O Promotor Márcio Bressani falou que,

em casos extremos, a internação psiquiá-trica compulsória é a saída. “Geralmente o primeiro trabalho de contato é com os familiares, que estão desesperados. Nessa fase, os usuários não querem o tratamento. O resultado das internações é muito dife-renciado, pois após a limpeza do organis-mo, eles se vêm apoiados”.

Um dos presentes revelou que ficou in-ternado durante sete meses em uma clínica de recuperação, em Taquara. “Costumava só usar maconha. Mas depois, comecei a traficar e aí que experimentei o crack. Foi meu maior erro. Não existia mais nada para mim, virei um lixo humano”, disse o homem de 25 anos. “Minha família me ajudou, mas o mais importante foi eu me dar conta do mal que estava fazendo para mim. Hoje eu dou aula de skate para os jovens. Fui pego com um baseado dentro da carteira de cigarro e é por isso que estou aqui hoje”.

A próxima audiência coletiva aconte-cerá em 30/9.

Ed

uard

o N

iche

le

Em 23 de novembro de 2010 foi criado o Ins-tituto Crack Nem Pensar (ICNP), organização de direito privado e sem fins lucrativos, com o objetivo de prestar serviços de maneira conti-nuada, permanente e planejada em benefício de programas e projetos voltados à prevenção ao uso de drogas. Compõem o conselho do ICNP a Associação do Ministério Público do RS, a Associação do Ministério Público de SC, a Associação dos Juízes do RS (AJURIS), a Associação Catarinense de Magistrados, a Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul e a Universidade Federal de Santa Catarina.

Sobre o Instituto Crack Nem Pensar

EDIÇÃO 277

ONLINE 33