Análise paleográfica de 02 registros de óbito

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ANÁLISE PALEOGRÁFICA DE 02 REGISTROS DE ÓBITOS DA INTENDÊNCIA MUNICIPAL DE SANTA MARIA DA BOCCA DO MONTE 1896 Fabiana Fagundes Fontana [email protected] Acadêmica do Curso de Arquivologia UFSM Fabia Dalla Nora [email protected] Acadêmica do Curso de Arquivologia - UFSM RESUMO O presente estudo tem por objetivo fazer uma análise paleográfica de dois registros de óbito datados do ano final do século XIX, custodiado pelo Arquivo Municipal de Santa Maria. Utilizou-se como base os conteúdos apreendidos no decorrer da disciplina de Paleografia, com a finalidade de estudar a evolução da escrita e dos suportes utilizados na época, no quesito leitura, interpretação e transcrição de textos antigos. A análise compreende os aspectos gráficos, materiais e complementares de cada documento. O estudo também contemplou um breve relato da cidade na época contextualizando o documento no momento histórico de sua criação. Palavras-Chaves: Análise Paleográfica. Registro de Óbito. Arquivo Municipal de Santa Maria.

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ANÁLISE PALEOGRÁFICA DE 02 REGISTROS DE ÓBITOS DA INTENDÊNCIA

MUNICIPAL DE SANTA MARIA DA BOCCA DO MONTE – 1896

Fabiana Fagundes Fontana

[email protected]

Acadêmica do Curso de Arquivologia – UFSM

Fabia Dalla Nora

[email protected]

Acadêmica do Curso de Arquivologia - UFSM

RESUMO

O presente estudo tem por objetivo fazer uma análise paleográfica de dois registros de óbito

datados do ano final do século XIX, custodiado pelo Arquivo Municipal de Santa Maria.

Utilizou-se como base os conteúdos apreendidos no decorrer da disciplina de Paleografia, com a

finalidade de estudar a evolução da escrita e dos suportes utilizados na época, no quesito leitura,

interpretação e transcrição de textos antigos. A análise compreende os aspectos gráficos,

materiais e complementares de cada documento. O estudo também contemplou um breve relato

da cidade na época contextualizando o documento no momento histórico de sua criação.

Palavras-Chaves: Análise Paleográfica. Registro de Óbito. Arquivo Municipal de Santa Maria.

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo fazer uma análise paleográfica de dois documentos

do Arquivo Municipal de Santa Maria, tendo como base os conteúdos já estudados no decorrer

da disciplina de Paleografia, com a finalidade de estudar a evolução da escrita e dos suportes

utilizados na época, objetivando o ensino da leitura, interpretação e transcrição de textos antigos.

Na análise foi feita a transcrição do documento, ou seja, passar um texto de um suporte

para outro sem alterar a informação contida no documento, seguindo as regras da transcrição

com suas respectivas normas, respeitando a forma original do texto, buscando manter a visão do

passado na leitura do documento para melhor compreender o mesmo.

Ao longo deste trabalho será apresentada a análise paleográfica em dois documentos do

Arquivo Municipal de Santa Maria, especificamente registros de óbito, tendo todas as

características do documento descritas de forma clara e objetiva para o entendimento sobre a

paleografia e sua importância para o estudo arquivístico.

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1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Os procedimentos metodológicos concernentes para a elaboração deste estudo

caracterizam-se pelo método indutivo comparativo, pois segundo Silva e Meneses (2005, p.26) o

método indutivo “considera que o conhecimento é fundamentado na experiência, não levando em

conta princípios preestabelecidos”, partido de observações vindas da realidade. E comparativo

por realizar comparações entre as características presentes nos documentos.

Neste contexto, inicialmente foram realizadas visitas ao Arquivo Municipal de Santa

Maria- AHMSM para conseguir ter acesso ao conjunto documental. Em seguida foi feita a

seleção dos documentos de forma aleatória dentro do conjunto documental ofertado pelo

AHMSM. Após a seleção dos documentos foi realizada a leitura, juntamente com a transcrição

do documento.

Na sequência, após a transcrição dos documentos, deu-se início a análise dos documentos

conforme os princípios da análise paleográfica, sendo composta de aspectos gráficos, materiais e

complementares, além de apresentar um comentário histórico do referido documento.

Os aspectos gráficos dos documentos referem-se ao estudo intrínseco dos documentos,

realizando um estudo completo e detalhado sobre a forma das letras e do escrito, como tipo de

escrita, peso da letra, ritmo da escrita, pontuação, numeração, módulo da letra, entre outros. A

análise dos aspectos materiais referem-se ao suporte onde a informação foi registrada, como a

dimensão do suporte, o estado de conservação do material, a forma e dimensão, e por fim os

aspectos complementares referem-se a data, procedência, localização do documento, relação do

autor com a escrita, entre outros.

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2 REFERENCIAL TEÓRICO

A palavra Paleografia segundo Spina (1994) é oriunda do grego palaios = antigo e

graphien = escrita, sendo definida como a ciência que estuda a escrita antiga, sua evolução e seus

suportes. Para Blanco (1987, p. 13) a paleografia é definida como “a ciência que ensina a ler

corretamente toda a classe de documentos manuscritos ou impressos, abordando também a

origem e evolução da escrita”.

De acordo com Acioli a paleografia é entendida como:

a ciência que lê e interpreta as formas gráficas antigas, determina o tempo e o lugar em

que foi escrito o manuscrito, anota os erros que possa conter o mesmo, com o fim de

fornecer subsídios à História, à Filologia, ao Direito e a outras ciências que tenham a

escrita como fonte de conhecimento.(ACIOLI, 2003, p. 5)

Neste contexto, os estudos referentes a paleografia segundo Dias e Bivar (2005, p. 17-

18), podem ser divididos em três períodos de análise desde sua origem:

1. Paleografia Antiga ou Greco-romana – do século V a. C. ao século VII d. C.;

2. Paleografia Medieval – do século VIII d. C. ao século XV d. C.; e

3. Paleografia Moderna – do século XVI ao século XIX.

A análise paleográfica é entendida como o estudo do documento observando sua

formação, estrutura, tipo de escrita utilizada na época em que foi gerado. Segundo Berwanger e

Leal (2008, p. 107) a análise paleográfica “tem por objetivo informar as características dos

documentos paleográficos, possibilitando uma virtual visualização dos aspectos que lhes são

marcantes”.

Nessa perspectiva é necessário apresentar aspetos gráficos, materiais e complementares

observados no documento, os elementos gráficos possuem relação direta com a escrita dos

documentos, os elementos materiais com o suporte que está contido a informação e os

complementares com os gerais como a data, local, autoria e outros. Nesse sentido,

[...]a paleografia é, assim, antes de tudo, um instrumento de análise de documentos

históricos. Não cabe ao paleógrafo somente ler textos; a ele compete igualmente datá-

los, estabelecer sua origem e procedência e criticá-los quanto à sua autenticidade,

levando em consideração o aspecto gráfico dos mesmos. Das ciências auxiliares da

História, a Paleografia é a mais importante, porque ela se dedica ao estudo da escrita

sobre material brando, principal fonte de informação do historiador. (ACIOLI, 2003,

p. 6).

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Senso assim, para a realização de uma análise paleográfica é fundamental ter uma visão

atenta e observadora das características presentes em cada palavra que compõem o documento,

analisando a autenticidade e veracidade de cada documento com plena dedicação a este trabalho

que busca compreender e conhecer os fatos que compõem a história de uma sociedade.

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3 REGISTRO DE ÓBITO DE 21 DE DEZEMBRO DE 1896 – PG 08

Segue conforme figura 1 o representante digital do registro de óbito analisado.

Figura 1- Registro de óbito I

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3.2 Transcrição do Documento

Quadro 1- Transcrição Paleográfica - caixa 02, Tomo 13, p08

3.3 Análise Paleográfica

Segue as características dos documentos paleográficos com a descrição dos aspectos mais

marcantes nos registros de óbito analisados.

3.3.1 Aspectos Gráficos

A letra utilizada na escrita documento é a humanística cursiva, do final do século XIX,

tamanho pequeno e escrita de mão pesada, principalmente nas letras maiúsculas e tombada à

direita. O Papel foi cortado durante a encadernação o que dificulta a leitura em alguns trechos do

texto.

3.3.2 Aspectos Materiais

O documento foi redigido em papel pautado comum, semelhante a folha de caderno. A

caixa de texto mede 240 mm x 190 mm e contém 21 linhas. O documento está em bom estado de

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conservação, o papel está apenas amarelado devido à ação do tempo, o documento possui a

forma de códice, no processo de encadernação a folha foi cortada, o que resultou na supressão de

uma letra na linha 20 do documento, a página do documento encadernado é a de número oito.

3.3.4 Aspectos Complementares

No cabeçalho do registro de óbito encontra-se a identificação da época do documento e

de sua localidade geográfica, Santa Maria.

A caixa de texto contém 21 linhas, com destaque para a assinatura das testemunhas que

estão identificadas pelo nome, porém pela grafia idêntica demonstra ter sido assinado pela

mesma pessoa que não as verdadeiras testemunhas, ou seja trata-se de um documento hológrafo

e autógrafo, ou seja foi escrito e assinado pelo autor do documento. O registro de óbito pertence

ao tomo 13 na caixa 02, página 08 (oito).

3.3.5 Comentário Histórico

Em 1876 a vila de Santa Maria passa à categoria de cidade passando à denominar-se

Santa Maria da Boca do Monte, e em 1892 ocorre a instauração no Brasil do sistema republicano

de governo trouxe mudanças no sistema administrativo do país e para comandar os municípios,

foram nomeados Intendentes.

Santa Maria teve 14 Intendentes, o primeiro foi o Coronel Francisco de Abreu Vale

Machado, foi nomeado no dia 1o de setembro de 1892, governando até 1900. O último

intendente de Santa Maria foi Manoel Ribas designado para o período de 1928 a 1932.

Manoel Ribas exerceu o cargo até 03 de outubro de 1930, quando explodiu a

Revolução que depôs o governo do presidente Washington Luís e dissolveu as

intendências. (RECCHIS, 1999).

Poucos dias depois, foi nomeado novamente líder do município, porém com a designação

de Prefeito Municipal, através do Ato da Intervendoria Federal do Estado. Manoel Ribas exerceu

o cargo até 10 de janeiro de 1932.

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4 REGISTRO DE ÓBITO DE 07 DE FEVEREIRO DE 1896 – PG 32

Segue conforme figura 1 o representante digital do registro de óbito analisado.

Figura 2- registro de óbito 2

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4.1 Transcrição do Documento

Quadro 2- Transcrição Paleográfica - caixa 02, Tomo 13, p32.

4.2 Análise Paleográfica

Segue as características dos documentos paleográficos com a descrição dos aspectos mais

marcantes nos registros de óbito analisados.

4.2.1 Aspectos Gráficos

A letra utilizada na escrita do documento foi a humanística cursiva, do final do século

XIX, tamanho pequeno e escrito de mão leve.

2.2.2 Aspectos Materiais

O documento encontra-se sem identificação no cabeçalho. O papel utilizado é pautado

comum, semelhante à folha de caderno. A caixa de texto mede 100 mm x 190 mm e contém 11

linhas, e está inserido em um tomo no formato de códice.

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O papel está amarelado pela ação do tempo, no entanto o documento está em bom estado

de conservação. No processo de encadernação foi cortada a folha em ambos os lados o que

resultou na supressão de algumas letras, como verificou-se nas linhas um, três e quatro.

2.2.3 Aspectos Complementares

O documento foi redigido no século XIX e está datado de 8 de fevereiro de 1896. Possui

duas assinaturas distintas, e se presume que sejam das testemunhas. O registro de óbito pertence

ao tomo 13 na caixa 02, página 32.

2.2.4 Comentário Histórico

Santa Maria tem sua formação histórica iniciada por um acampamento militar e seu

crescimento deu-se vagarosamente em fases distintas, foi acampamento, povoado, curato, distrito

(de Cachoeira do Sul), freguesia, vila e por fim elevada a categoria de cidade.

No período de 1896, do qual se trata o documento transcrito, a intendência de Santa

Maria era governada por Francisco de Abreu Vale Machado, primeiro Intendente de Santa Maria

nomeado para governar o município e reeleito pelo conselho municipal neste mesmo ano para o

segundo mandato, os membros do conselho eram cidadãos santa-marienses.

Durante seu governo enfrentou uma revolução que durou de 1893 a 1895, foi considerado

um líder justo, brilhante e visionário, em sua gestão inaugurou a luz elétrica na cidade, fato

ocorrido em 15 de novembro de 1898, que substituiu a iluminação de querosene utilizada até

então.

Fundou em 1898 a Sociedade de Caridade Santa – Mariense, instituição de saúde que

mais tarde daria origem ao Hospital de Caridade.

Destaca-se também em sua gestão a instalação do Colégio Santa Maria, primeira

instituição de ensino secundário do município.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho nos possibilitou aplicar a análise paleográfica em documentos do final do

século XIX, custodiados no Arquivo Histórico Municipal de Santa Maria. Esses documentos

analisados eram registros de óbitos de crianças que viveram e morreram na cidade.

A análise propiciou o estudo das características extrínsecas de cada documento, assim

como a realização da leitura metódica para determinação da idade e nacionalidade do mesmo,

auxiliando para a compreensão da escrita antiga. A transcrição foi realizada com auxílio das

normas técnicas para transcrição de documentos paleográficos.

Com isso pôde-se colocar em prática toda a teoria adquirida no decorrer do semestre

letivo, além de perceber a importância da paleografia não só para os estudantes, mas também sua

relevância como disciplina integrante do currículo do curso de arquivologia. Além da

contribuição deixada para os pesquisadores e para a sociedade santa-mariense, pois possibilita o

resgate da memória através da compreensão de documentos antigos que estão sob a guarda do

arquivo Histórico Municipal.

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REFERÊNCIAS

ACIOLI, V. L. C. A escrita no Brasil colônia: um guia para leitura de documentos manuscritos.

2. ed. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Massangana, 2003.

BERWANGER, Ana Regina; LEAL, João E. Franklin. Noções de Paleografia e de

Diplomática. 3.ed. rev. e ampl. Santa Maria/RS: Ed. Da UFSM, 2008.

BLANCO, R. R. (1987) Estudos paleográficos. São Paulo: Laserprint.

DIAS, M. M.; BIVAR, V. dos S. B. Paleografia para o período colonial. In: Paleografia e fontes

do período colonial brasileiro. Estudos CEDHAL, Nova Série nº 11. São Paulo:

Humanitas/FFLCHUSP, 2005, p. 11-38.

RECHIS, Aristilda A. Santa Maria: Panorama histórico-cultural. Santa Maria: Associação Santa-

Mariense de Letras, 1999. 312p.

RICHTER, Eneida Izabel Schirmer; ARAÚJO, João Cândido Graça. (Org.). Paleografia e

Diplomática no Curso de Arquivologia UFSM. Santa Maria: FACOS; UFSM, 2007. 239 p.

SANTA MARIA. AHMSM - Arquivo Histórico Municipal de Santa Maria. 1896. In: Fundo

Intendência Municipal. Registros de Óbito, caixa 02, Tomo 13, p 08 e 32.

SPINA, Segismundo. Introdução à Edótica (crítica textual). 2. ed. São Paulo: Ars

Poética/EDUSP, 1994.