ANÁLISE INSTITUCIONAL ABRIGO NOSSO LAR- VERSAO MELHORADA

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ANÁLISE INSTITUCIONAL ABRIGO NOSSO LAR Dirce Barroso França Paula Nogueira I-O QUE É UM ABRIGO? O abrigo situa-se como um ponto de interseção de diferentes atores sociais: os Conselhos Tutelares, a Vara de Infância, a família de origem, os candidatos a adotantes e, acima de tudo, a criança afastada do convívio familiar. O abrigo deve dialogar com essas diferentes instâncias sempre na defesa dos interesses da criança e em seu bem-estar. Nessa função de intermediação, é fundamental que o abrigo se reconheça como instituição competente e autorizada a exercer plenamente o seu papel. Este não se limita à guarda da criança. Poder, por exemplo, interceder junto à Vara da Infância, sempre que considerar que determinados ritos possam ser prejudiciais à criança. Intervir em processos de adoção, acompanhando tecnicamente as visitas dos candidatos, intermediando os contatos destes com a criança. Poder, no limite, até mesmo opinar desfavoravelmente em relação a um processo desde que com fundamentos e critérios técnicos e sempre tendo em vista, em primeiríssimo lugar, o bem-estar da criança. Além da guarda da criança, deve o abrigo exercer o seu papel de promoção da competência das funções parentais. Evidente que se uma criança é afastada de seu lar, os pais necessitam suporte para (re) assumirem suas funções. O simples correr do tempo não os habilitará Será preciso investimento nessas famílias (especialmente para a dimensão psíquica, pois a simples pobreza não leva ao abandono). A direção de um abrigo deve ter a compreensão de que o bom abrigo não é aquele que mantém a criança por anos, por vezes, mesmo até a maioridade, afastada de seu ambiente natural. Bom abrigo é aquele que, paralelamente aos cuidados de qualidade, pode promover a reintegração familiar no tempo mais breve possível. Por vezes, impõem-se a decisão de encontrar uma família substituta. Não se trata de decisão fácil e nem deve ser tomada sem rigorosa análise técnica das condições dos pais naturais e pressupõe que se esgotaram os recursos para o retorno à família de origem. Embora não seja fácil, o que é inaceitável é que crianças sejam criadas por anos e anos no ambiente institucional

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ANÁLISE INSTITUCIONALABRIGO NOSSO LARDirce Barroso França

Paula Nogueira

I-O QUE É UM ABRIGO?

O abrigo situa-se como um ponto de interseção de diferentes atores sociais: os Conselhos Tutelares, a Vara de Infância, a família de origem, os candidatos a adotantes e, acima de tudo, a criança afastada do convívio familiar. O abrigo deve dialogar com essas diferentes instâncias sempre na defesa dos interesses da criança e em seu bem-estar.

Nessa função de intermediação, é fundamental que o abrigo se reconheça como instituição competente e autorizada a exercer plenamente o seu papel. Este não se limita à guarda da criança. Poder, por exemplo, interceder junto à Vara da Infância, sempre que considerar que determinados ritos possam ser prejudiciais à criança. Intervir em processos de adoção, acompanhando tecnicamente as visitas dos candidatos, intermediando os contatos destes com a criança. Poder, no limite, até mesmo opinar desfavoravelmente em relação a um processo desde que com fundamentos e critérios técnicos e sempre tendo em vista, em primeiríssimo lugar, o bem-estar da criança.

Além da guarda da criança, deve o abrigo exercer o seu papel de promoção da competência das funções parentais. Evidente que se uma criança é afastada de seu lar, os pais necessitam suporte para (re) assumirem suas funções. O simples correr do tempo não os habilitará Será preciso investimento nessas famílias (especialmente para a dimensão psíquica, pois a simples pobreza não leva ao abandono). A direção de um abrigo deve ter a compreensão de que o bom abrigo não é aquele que mantém a criança por anos, por vezes, mesmo até a maioridade, afastada de seu ambiente natural. Bom abrigo é aquele que, paralelamente aos cuidados de qualidade, pode promover a reintegração familiar no tempo mais breve possível.

Por vezes, impõem-se a decisão de encontrar uma família substituta. Não se trata de decisão fácil e nem deve ser tomada sem rigorosa análise técnica das condições dos pais naturais e pressupõe que se esgotaram os recursos para o retorno à família de origem. Embora não seja fácil, o que é inaceitável é que crianças sejam criadas por anos e anos no ambiente institucional ( que, por mais adequado que seja, NÃO É UMA FAMÍLIA!) por que o abrigo abdica de sua função de indicar à Vara da Infância os fatos relativos àquela criança e a sua família. Se a decisão é da Vara da Infância, esta, porém, só pode exercer sua função a partir de elementos fornecidos pelos profissionais que acompanham o dia-a-dia da criança. E estes profissionais se encontram no abrigo, pois é ali que a criança vive.

O abrigo é uma instituição que se destina ao amparo e proteção da criança que se encontra afastada de sua família. Deve conciliar a exigência de prover cuidados reparadores que possibilitem à criança superar o trauma da separação e/ou de possíveis experiências negativas que tenha motivado o afastamento do lar, com a exigência de sempre favorecer o convívio familiar. O abrigo, embora represente importante papel em um dado momento da vida de uma criança, deve adotar estratégias que tornem essa permanência o mais breve possível.

No que se refere aos cuidados a serem propiciados à criança, deve haver a compreensão de que esta tem necessidades específicas que decorrem da situação muito especial em que a criança se encontra. Cuidar de uma criança em situação de abrigamento não é o mesmo que cuidar de uma criança em sua família ou mesmo em uma creche. E que necessidades são estas?

Creio que para darmos essa resposta, teremos antes que nos fazer duas outras questões:

II-QUEM É A CRIANÇA QUE CHEGA A UM ABRIGO? EM QUE CONDIÇÕES ESTA CRIANÇA CHEGA AO ABRIGO?

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Trata-se de uma criança que não pôde receber de sua família a proteção, os cuidados básicos e a segurança tão essenciais a este tempo da vida. Frequentemente, essas crianças são filhas e filhos de mulheres que sofreram, elas próprias, abandonos em suas infâncias. Sabe-se que só se aprende a ser mãe quando se é cuidada por uma. Talvez por esta razão as histórias de abandono se repetem de uma geração a outra.

Trata-se, sempre, de uma criança que sofre. Sofria pela ausência dos cuidados de qualidade junto à família. Mas sofre, igualmente, pelo afastamento dessa família. Muito frequentemente ela se avalia como a causadora do próprio abandono: se ela não fosse má, certamente ainda estaria com a mãe. Não teria sido abandonada. É, portanto, uma criança que tem baixa auto-estima.

É preciso também considerar que o ambiente do qual provém a criança, por mais que lhe fosse hostil, lhe era familiar. Já o ambiente do abrigo é totalmente novo. Em decorrência, a criança que ali chega encontra-se sempre assustada. Ela não sabe o que pode esperar dali. Sua experiência até aquele momento já lhe ensinou a não confiar muito no adulto. Por que confiaria nos adultos do abrigo? Que garantias ela pode ter de que naquele ambiente será diferente? De que naquele ambiente ela será tratada com respeito, sem violência? Que ali ela será tratada como SUJEITO e não mais como OBJETO?

É tarefa dos profissionais do abrigo demonstrar à criança que ela poderá confiar novamente no adulto. É tarefa desses profissionais propiciarem cuidados de qualidade à criança para que esta, sentindo-se tratada com delicadeza e respeito, possa resgatar sua auto-estima. Para tanto, é necessário que haja também constância e regularidade no modo como esses cuidados são dispensados, é isso que assegurará à criança a estabilidade de seu mundo interno. A criança que chega até um abrigo já sofreu demais com as inconstâncias e com a falta de previsibilidade de seu mundo. Se queremos que o abrigo seja mais que um lugar de passagem, que seja acima de tudo um lugar de reparação para essa criança, então a atenção e os cuidados devem ser constantes.

Mas esta não é uma tarefa simples! Não é também uma tarefa para a qual basta ter sido mãe para que possamos executar. É tarefa que exige preparo técnico, supervisão e orientação constantes. Sem o respaldo técnico, os profissionais facilmente são absorvidos pela multiplicidade de sentimentos evocados com as histórias dramáticas presentes nos abrigos. Mas, não se trata apenas de preparo técnico. Aspectos relacionados à personalidade, tais como o grau de amadurecimento do profissional, sua própria história de vida, capacidade de se colocar no lugar da criança e se sensibilizar com sua dor e suas necessidades específicas, são também de fundamental importância.

É tarefa que envolve todos os profissionais do abrigo e não apenas as mães-sociais. Estas últimas têm consigo a responsabilidade dos cuidados diretos e cotidianos com a criança. Mas, para que possam bem desempenhar suas funções, é necessário que a instituição, em sua totalidade, se envolva. Seja provendo as condições materiais, seja estabelecendo as regras que possibilitarão à mãe social lidar com as situações do dia-a dia. A mãe social deve, ela própria, sentir que está em um ambiente seguro e previsível para que possa transmitir esses aspectos à criança de que cuida.

Foi por termos a clara noção da importância do trabalho da mãe social que propusemos um trabalho de capacitação das mães sociais. Decorridos quase dois anos, é chegado o momento de fazermos uma avaliação: em que medida alcançamos nossos objetivos? Quais foram os seus limites e possíveis méritos?

II- AVALIAÇÃO DO TRABALHO DE CAPACITAÇÃO DAS CUIDADORASEm abril de 2005 iniciamos um trabalho de capacitação das cuidadoras ou mães sociais do Nosso Lar. Vejamos o que pudemos fazer nesse período:

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Houve a sensibilização para a importância dos rituais, especialmente no caso da partida da criança. Algumas cuidadoras passaram a elaborar rituais de despedida tanto da criança como para a própria cuidadora quando vai embora. E por que é tão importante este ritual? Para que a criança não viva o episódio como mais um abandono. Para os que ficam possam elaborar a perda ( inclusive a cuidadora) e para que aquele que vai possa integrar a vida no abrigo como fazendo parte de sua história. Deve-se considerar que mesmo para aquele que vai há uma vivência de perda: afinal, a criança até ali viveu no abrigo e fez ali vínculos de afeto que irão se romper. Despedir-se é dar a oportunidade para elaboração.

Houve a sensibilização para o sofrimento da criança e, pelo menos para algumas cuidadoras, a adoção de procedimentos em relação à criança levando este sofrimento em conta. Ainda relacionado a este fato, algumas cuidadoras puderam entender que por vezes a criança, por não saber como lidar com sua dor, ataca as cuidadoras, como se estivesse a testá-las. Ao compreenderem que o modo de agir da criança decorre de sua dor, algumas cuidadoras puderam aprender a lidar melhor com esses ataques, sentindo-se menos atingidas. Entendendo que tais ataques não eram tanto direcionados a elas como pessoas, mas fruto de uma situação, elas puderam ajudar a criança a lidar com as situações que lhes causava dor e sofrimento.

Algumas cuidadoras passaram a ter um olhar mais singularizado para a criança. Isso decorreu do fato de que em vários encontros elas eram levadas a falar sobre alguma criança e nesse processo sempre apareciam as dificuldades na relação. Ao se falar disso, tornava-se possível também refletir sobre o que estava ocorrendo com aquela criança, a possível significação de seu modo de agir, por fim, qual a melhor forma da cuidadora lidar com aquela dificuldade.

Claro que não há uniformidade entre as cuidadoras. Algumas são muito mais sensíveis e aptas a compreenderem as crianças. Um processo seletivo ajudaria bastante na escolha de pessoas com perfil mais adequado.

E O QUE NÃO PUDEMOS FAZER? Não pudemos aprofundar o trabalho no que se refere à garantia de cuidados de qualidade.

Em primeiro lugar, por considerar que não há como exigir mais nada dessas mulheres que têm um ritmo de trabalho absolutamente insano. Elas trabalham quase 24 hs por dia ( sim, pois o sono nunca é tranqüilo, dada a existência de bebês que demandam cuidados noturnos). O dia apresenta uma rotina de tarefas muito intenso. O ideal seria que a cuidadora só se ocupasse das crianças e pudesse acompanhar o ritmo destas. No entanto, a exigência institucional se impõe a tudo. Nenhuma cuidadora dispõe de tempo para acompanhar o ritmo da criança. Os momentos de banho, trocas e alimentação são sempre momentos tensos, pressionados pela exigência de várias outras tarefas a serem cumpridas.

Decorridos quase dois anos, avaliamos que nosso trabalho encontrou seus limites e que para avançarmos se fazem necessárias mudanças institucionais.

III- ANÁLISE INSTITUCIONAL:

Tendo visto acima algumas das características esperadas em um abrigo, cabe a interrogação: em que medida NOSSO LAR tem atendido ao que se espera de um abrigo?

Ao tratarmos deste tópico é inegável que constatamos aspectos positivos, mas, também, alguns aspectos que exigem uma reflexão profunda. Se nos dispomos a abordar tais aspectos é por considerarmos que o interesse maior da direção de NOSSO LAR é promover as melhores condições para as crianças que aqui se encontram. Se em alguns aspectos há falhas, elas não decorrem de modo algum da ausência de vontade e de desejo de fazer o melhor e, sim, de um possível desconhecimento acerca dos processos envolvidos na condução de um abrigo. Pode

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parecer pretensioso de nossa parte afirmar isso. Afinal, esta direção já cuida do abrigo há quase 30 anos! Podemos imaginar o quanto já lutaram em defesa dessas crianças e o quanto já construíram nesses anos. Do que estamos falando é de conhecimentos técnicos específicos que permitem delinear o funcionamento do abrigo de modo a atender às suas funções essenciais, quais sejam, a de propiciar o adequado cuidado da criança e a interlocução com os diversos atores envolvidos na área, mas, muito especialmente, a de promover a reintegração familiar da criança.

Portanto, gostaríamos que a avaliação que aqui fazemos possa ser acolhida como uma contribuição para a melhoria das condições de funcionamento de NOSSO LAR.

A) Para ser uma instituição o mais breve possível na vida de uma criança, é necessário um trabalho de fortalecimento da condição parental. Isso se dá de variadas formas: desde facilitar e mesmo promover a reaproximação ou a manutenção dos vínculos com a família de origem, até mesmo por trabalhos mais complexos com essas famílias.

Neste aspecto, o que temos? NOSSO LAR se caracteriza por ser uma instituição na qual as crianças, pelo menos muitas delas, passam anos. Muitas ali chegaram pequeninas e somente saíram ao completarem 18 anos. Portanto, no que se refere a essa característica, NOSSO LAR tem deixado a desejar. Vislumbramos dois planos de dificuldades:

As visitas dos pais não apenas não são favorecidas e estimuladas, como são mesmo prejudicadas pelo funcionamento institucional. Limitadas aos domingos, mesmo dia das visitas de centenas de voluntários, os pais têm dificuldade de estar com seus filhos de forma tranqüila. Eles se vêem obrigados a “disputar” a atenção de seus filhos com as visitas. Como muitas vezes os voluntários são mais regulares em suas visitas que os pais, a criança finda por receber melhor o voluntário que os próprios pais. E se há dificuldade no contato entre filho e pai, a presença de vários voluntários “ tentando ajudar” a aproximação impede que a díade possa se ajustar em um ritmo próprio. Sentindo-se fracassado diante de estranhos ( que, por serem de condição social superior, desqualificam ainda mais os pais, mesmo naqueles casos em que não têm de modo alguma esta intenção) o pai finda por sentir-se também humilhado. A visita ao filho acaba por se configurar em uma situação desagradável para ambos e a conseqüência mais provável é esse pai ou mãe deixar de visitar seu filho.

Além disso, as visitas dos pais aos seus filhos sem qualquer intermediação de um técnico, colocam a cuidadora em situação muito difícil. Será ela que terá que lidar com a carga emocional que a situação impõe a todos: aos pais, à criança e a ela própria. Se a criança está adoentada, a mãe responsabilizará a cuidadora por este estado de coisas. Acusa-a de não estar cuidando adequadamente de seu filho. Mas sua reação poderá ser ainda pior naqueles casos em que percebe que seu filho está bem cuidado. Aí a rivalidade encontrará vazão e não apenas da parte da mãe. A cuidadora também se vê enredada por esses afetos, em geral de forma inconsciente para ambas. Mas o fato de ser inconsciente não torna tais afetos menos eficazes, ao contrário.

Um trabalho efetivo com as famílias é imperioso. Um trabalho em que se possam reconhecer as dificuldades dos pais, mas sem os julgar moralmente ou desqualificá-los. Trabalho que promova a competência parental que se encontra fragilizada. Pensamos que a proposta em curso de desenvolvimento pela Psicóloga Shyrlene tem esta perspectiva. Seria preciso pensá-la como uma prática rotineira da instituição, a ser desenvolvida com todos os pais.

B) A SEGUNDA CARACTERÍSTICA fundamental do abrigo deve ser a de propiciar cuidados estáveis e de qualidade. Para tanto são necessárias:

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adoção de um regramento que possibilite o funcionamento institucional de modo seguro e estável e permita às cuidadoras saberem como lidar com as crianças;

condições adequadas de trabalho, tanto no que se refere ao número de horas trabalhadas, ao repouso suficiente, quanto às atribuições das cuidadoras (nos parece que as cuidadoras tem atribuições excessivas)

compreensão acerca das necessidades gerais de uma criança e das muito específicas de uma criança em situação de abrigamento.

adoção de rotinas de cuidados que contemplem os princípios da qualidade, estabilidade e previsibilidade.

Será que NOSSO LAR atende aos requisitos acima? Lamentavelmente, não. Citemos algumas das dificuldades constatadas:

AUSÊNCIA DE EQUIPE TÉCNICA: profissionais com conhecimento acerca das necessidades específicas de crianças em situação de abrigamento que estariam cotidianamente orientando as cuidadoras e ajudando a definir as prioridades da instituição, entendendo-se que a criança e seu bem-estar deveriam sempre estar em primeiro lugar. Cabe à equipe técnica elaborar o regramento institucional de modo a garantir a estabilidade e segurança tão fundamentais para a cuidadora poder desempenhar seu papel. Na ausência desse regramento, cada cuidadora, quando se vê em dificuldades, adota um modo se agir com a criança. Nem sempre aquele é o melhor modo, fica-se na inteira dependência do “bom senso” da cuidadora. Ademais, ao deixar por conta do discernimento de cada uma, têm-se variadas formas de se lidar com a criança, perdendo-se o aspecto tão importante da CONSTÂNCIA NOS CUIDADOS. Será também responsabilidade da equipe técnica avaliar as condições de chegada da criança, bem como fundamentar tecnicamente os relatórios a serem encaminhados à vara da Infância nos casos de reintegração familiar e de adoção.

DEMANDA EXCESSIVA DIRIGIDA ÀS MÃES SOCIAIS: a rotina de trabalho dessas mulheres é simplesmente enlouquecedora. Elas trabalham praticamente 24 hs por dia ( pois, à noite, havendo bebês na casa, estes demandam cuidados noturnos). Além de cuidar da casa, são elas que acompanham as crianças nos hospitais, lá permanecendo, por vezes, semanas se a criança necessita ser internada. Permanentemente estressadas, trabalhando, por vezes, no limite da exaustão, não há como se esperar que na relação com a criança a cuidadora esteja calma, bem disposta, atenta aos interesses da criança. O que ocorre frequentemente é a cuidadora prejudicar a qualidade do atendimento à criança para manter-se dentro do ritmo que lhe permita desempenhar todas as suas tarefas (cuidar da casa, dar banho em várias crianças, acompanhar ao hospital, qdo necessário, levar e buscar na escola, manter as crianças sempre limpas e penteadas para irem às várias atividades do dia, tais como estimulação precoce, visitas de voluntários, etc)

AUSÊNCIA DE QUALQUER PROCESSO SELETIVO. O que leva à contratação de pessoas muito inadequadas à complexa função de cuidadora, bem como contribui para a elevada rotatividade.

AUSÊNCIA DE QUALQUER ORIENTAÇÃO ÀS MÃES SOCIAIS. E aqui não estamos falando apenas da necessidade de se orientar as novatas, ou da necessidade de orientações específicas quando a criança exige tratamento especial. Estamos falando da necessidade de as mães sociais receberem orientações e acompanhamento rotineiramente. Orientar a mãe social a partir das dificuldades que estas encontram no dia-a-dia é uma forma de promover a sua qualificação permanente. Ao contrário, se não há orientação e as inadequações das cuidadoras são mencionadas em reuniões

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( ainda que não se identifique a cuidadora alvo das críticas) , isso se presta apenas para humilhar e desqualificar a profissional.

AUSÊNCIA DE DIÁLOGO ADEQUADO ENTRE A DIREÇÃO E AS MÃES SOCIAIS. Direção e cuidadoras deveriam se ver como parceiros que somam esforços visando o bem-estar da criança. Representam duas importantes dimensões do trabalho na instituição e se torna necessário um esforço para construírem uma relação mais harmoniosa. Se a instituição contasse com uma equipe técnica, esta se encarregaria dos contatos diários com as cuidadoras e liberaria a direção para cuidar das suas atribuições mais específicas ( vinculadas aos aspectos administrativo e financeiro)

AUSÊNCIA DE VALORIZAÇÃO DO TRABALHO DA MÃE SOCIAL. Parece haver dificuldade, por parte da direção, em reconhecer que o trabalho da cuidadora é a pedra fundamental de toda a estrutura do abrigo e é de um valor inestimável. Se há limitações ( e efetivamente existem), deve-se orientar visando-se a correção e aprimoramento e não tratá-las como se fossem facilmente substituíveis. Ao não valorizar o trabalho da mãe social, contribui-se para o aumento da rotatividade, o que é altamente desaconselhável se levamos em conta a necessidade de estabilidade para a criança.

IV- PROPOSTAS Contratação de profissionais da área de psicologia e de serviço social que possam

trabalhar em regime de 40 hs semanais. Esta equipe técnica se responsabilizaria pelas atribuições descritas no item acima.

Alteração do atual esquema de trabalho integral da mãe social para turnos de trabalho de 8 hs/ diárias.

Flexibilização dos horários e dias de visitas dos familiares, de acordo com os critérios a serem estabelecidos pela equipe técnica.

V- MODELO Apresentar alguns fragmentos do vídeo de Lóczy que demonstrem a qualidade dos cuidados e a preocupação com a capacitação das cuidadoras.

Brasília, 25 de Setembro de 2006