Análise Da Gestão e Funcionamento Dos Cartórios Judiciais

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    Ministrio da Justia - Secretaria de Reforma do Judicirio

    Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento - PNUD

    Anlise da Gesto e Funcionamento dos

    Cartrios Judiciais

    1 Edio

    Apoio Institucional

    Centro Brasileiro de Estudos ePesquisas Judiciais CEBEPEJ

    Escola de Direito de So Paulo da FundaoGetlio Vargas DIREITO GV

    Braslia

    Junho de 2007

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    REPBLICA FEDERATIVA DO BRASIL

    Presidente da Repblica

    Luiz Incio Lula da Silva

    MINISTRIO DA JUSTIA

    Ministro de Estado da JustiaTarso Genro

    Secretrio de Reforma do Judicirio

    Rogerio Favreto

    Consultores:

    Coordenao:

    Paulo Eduardo Alves da Silva

    Orientao Cientfica:

    Jos Reinaldo de Lima Lopes; Maria Teresa Sadek

    Pesquisadores:

    Alba Cantanhede Frana; Alexandre Ferraz Herbetta; Ana Lucia Pastore Schritzmeyer;

    Dorival Carreira; Frederico de Almeida; Leslie Shrida Ferraz; Suzana Henriques

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    MINISTRIO DA JUSTIASecretaria de Reforma do JudicirioEndereo: Esplanada dos Ministrios, Bloco T, 3 Andar, Sala 324Cep 70.064-900, Braslia - DF, Brasil.Fone: 55 61 3429 9118Correio eletrnico: [email protected]: www.mj.gov.br/reforma

    Distribuio gratuita

    Primeira edio - Tiragem: 1.000 exemplares

    Projeto Grfico: Renato Berlim FonsecaReviso: Jos Geraldo Campos TrindadeImpresso pela Ideal Grfica e Editora Ltda.

    A transcrio e a traduo desta publicao so permitidas,

    desde que citadas a autoria e a fonte.

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    Sumrio

    Apresentao 7

    I A Pesquisa 9

    1. Introduo 9

    2. Informaes Metodolgicas 10

    3. Perfis dos cartrios judiciais estudados 13

    II Os Resultados 19

    1. Dados gerais dos cartrios estudados 192. O impacto dos cartrios sobre a morosidade da Justia 23

    3. A invisibilidade dos cartrios judiciais 29

    a) A jurisdio exercida em cartrio 29

    b) A invisibilidade dos cartrios perante o Tribunal, as normas processuais e a reforma do

    Judicirio 29

    c) A importncia de funes protocolares e de relacionamentos pessoais 36

    4. Organizao e funcionamento dos cartrios judiciais 41

    a) Falta de planejamento e rotinas complexas 41b) Estrutura organizacional ultrapassada 44

    c) O cartrio e a informatizao dos servios de justia a cultura do balco e

    a cultura do papel 45

    5. Dois dos cartrios estudados, comparativamente 50

    III As Concluses 55

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    Apresentao

    A Secretaria de Reforma do Judicirio tem desenvolvido uma srie de polticas pblicas com vistas a

    diminuir a distncia entre o cidado brasileiro e o sistema de Justia.As pesquisas e os diagnsticos sobre o funcionamento das instituies de Justia so instrumentos

    que auxiliam na compreenso, de um lado, das suas qualidades e potencialidades e, de outro, das limi-taes e dificuldades. Por estas razes, formam importantes subsdios para orientar as aes e polticasinstitucionais do Governo Federal.

    O presente estudo, sobre a gesto e o funcionamento dos cartrios judiciais, insere-se neste contextode formao de opinio consubstanciada em elementos cientficos e culturais. Porm, no tem a preten-so de exaurir o assunto, tratando-se de uma anlise parcial que visa a servir como importante indicativoda forma de organizao e estruturao do servio cartorrio a partir de anlise e avaliao nas unidadesintegrantes do Poder Judicirio do Estado de So Paulo.

    Cabe ressaltar, que mesmo sendo o presente estudo baseado em investigao pontual, os elementos co-lhidos indicam certa realidade do sistema nacional, ressalvadas as peculiaridades de funcionamento em outrosEstados da Federao.

    Deste modo, o presente estudo de casos e a sua divulgao objetivam colaborar para que o governo brasi-leiro e a sociedade civil formem suas opinies com base em elementos de convico colhidos com rigor tcnicoe, por isto, mais aproximados da realidade, proporcionando medidas de aprimoramento compatveis com aimportncia do tema.

    Busca-se, por fim, adotar este como subsdio, para que se possa escolher possibilidades mais adequadas daatuao da Secretaria de Reforma do Judicirio, com vistas a sugerir medidas para tornar a administrao carto-rria judicial mais gil e eficiente, de modo a assegurar maior acesso da populao ao Poder Judicirio, com uma

    prestao jurisdicional mais clere e qualificada.

    Rogrio FavretoSecretrio da Reforma do Judicirio

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    I A Pesquisa

    1. Introduo

    Este relatrio sintetiza concluses de um estudo amplo e multidisciplinar destinado a conhecer aorganizao e o funcionamento de cartrios judiciais e seus efeitos sobre o que se convencionou chamarde morosidade da Justia.

    O tempo de tramitao de processos judiciais comumente apontado como um dos maiores obs-tculos dos sistemas judiciais em geral. Quais so as causas da morosidade da justia brasileira? Difcilidentific-las precisamente. Mas possvel sugerir que algumas delas esto ligadas burocracia judiciale, mais diretamente, aos cartrios judiciais, temas que pouca ateno tm recebido nos debates sobre areforma do judicirio.

    Como esto organizados e como funcionam os cartrios judiciais? Que prticas do cartrio geramefeitos de aumento e diminuio do tempo de tramitao dos processos? Quais so os integrantes e quemgere o cartrio judicial? Uma gesto da burocracia cartorial tem possibilidades de melhorar o tempo detramitao dos processos? Essas so algumas das questes para as quais este estudo busca trazer elementosesclarecedores.

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    2. Informaes Metodolgicas

    Os cartrios judiciais constituem um universo peculiar e de modo geral desconhecido, a ponto de no sersuficiente analis-los superficialmente. Um levantamento quantitativo destinado a saber, por exemplo, quantosso e onde esto situados traria pouca informao sobre a realidade que existe por detrs dos balces dos fruns.

    Antes, preciso conhecer e compreender suas articulaes internas, como se organizam, como sua organizao

    e funcionamento afetam o andamento dos processos, como seus integrantes percebem o exerccio jurisdicionalque passa por suas mos, entre outras inexploradas questes.Partindo dessa premissa, esta pesquisa escolheu como ferramenta metodolgica o estudo de casos, tcnica

    metodolgica que no permite extrair concluses generalizantes, mas a mais adequada para explorar um objetocomplexo e desconhecido, como so os cartrios judiciais.

    Dada a necessidade do maior aprofundamento possvel no objeto de estudo, preferiu-se limitar a pesquisaa um nmero reduzido de cartrios judiciais e a um universo preciso. Considerando a maior representatividadenumrica das justias estaduais na movimentao processual brasileira (Diagnstico do Poder Judicirio, 2004)e, entre elas, o maior contingente de processos, funcionrios e ndice de litigncia na justia do Estado de SoPaulo (idem), optou-se por limitar os casos a cartrios judiciais estaduais paulistas.1

    De forma alguma isto significa que as concluses aqui apresentadas sejam exclusivas dos cartrios estudadosou da Justia paulista2. Os casos estudados representam tiposde cartrios judiciais oficializados, possivelmentepresentes em outras regies e unidades da Federao, j que todos, em maior ou menor medida, comungam decaractersticas semelhantes, funo idntica e submetem-se a uma mesma legislao processual.

    A escolha dos quatro cartrios estudados baseou-se em estudos e entrevistas preliminares com gestores detribunais e operadores do direito em geral, com juzes, advogados, diretores e escreventes. A partir desses pri-meiros dados, optou-se por focar a anlise em dois cartrios da Capital do Estado e em dois do interior. Entreaqueles, um cartrio recente e um antigo e, entre estes, um considerado de fcil provimento e outro conside-rado de difcil provimento do cargo de juiz titular3.

    As entrevistas preliminares tambm subsidiaram as hipteses orientadoras do incio da investigao: a)cartrios da Capital tendem a funcionar diferentemente dos de comarcas do interior por uma srie de razesligadas s relaes dos funcionrios com o pblico, o juiz, o tribunal e com a funo jurisdicional de modo geral assim, escolheu-se dois cartrios da Capital e dois do interior; b) cartrios mais antigos tendem a sedimentarrotinas de trabalho que se perpetuam mais por costume do que por algum critrio de racionalidade organiza-cional nesse sentido, selecionou-se um cartrio antigo e um recente da Capital; c) cartrios em que os juzespassam perodos curtos tendem a funcionar pior do que aqueles em que o juiz, por estar lotado h mais tempo,assume a gesto do cartrio um cartrio de comarca considerada de difcil e outro de fcil provimento4.

    1

    As Justias estaduais representam 73% de todo esse movimento e, entre elas, a Justia paulista apresenta o maior volumede processos, a maior estrutura judiciria e o maior ndice de litigncia (MJ-SRJ, Diagnstico..., 2004). Apenas em 2003,o Ministrio da Justia constatou que 5,9 milhes (48,9%) dos 11,9 milhes de processos foram ajuizados perante a jus-tia paulista; computou 1.926 juzes paulistas para um total nacional de 13.474 e uma mdia de 361 juzes por estado e50.985 funcionrios perante uma mdia estatal de 6.620 por estado; e mediu um processo para cada 6,62 habitantes doEstado de So Paulo, para uma mdia nacional de um processo para 10,2 habitantes (MJ-SRJ, Diagnstico..., 2004).

    2Em debate prvio sobre as concluses desta pesquisa, realizado com as principais entidades envolvidas, ficou claro queos problemas apontados no so exclusivos da Justia paulista. Alguns deles, inclusive, j podem ter sido resolvidos nombito deste Estado - como o tempo da rotina da publicao -, embora ainda sejam verificados em cartrios de outrosEstados.

    3Curioso notar que, para diversos entrevistados, o volume de processos existente no cartrio no foi considerado, por si s,como fator relevante capaz de afetar seu desempenho.

    4 Essa terminologia no existe mais e aqui adotada apenas para ilustrar as comarcas mais ou menos procuradas pelos juzes

    para permanecerem por um perodo de tempo maior.

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    Levantamentos interdisciplinares forneceram os dados da pesquisa: uma etnografia dos cartrios judiciaisestudados, um relatrio gerencial de sua organizao e mtodos de trabalho e o levantamento de seu desempe-nho em termos de tempos processuais. Os dois primeiros basearam-se em observao e entrevistas realizadas inloco durante seis meses e o ltimo, em anlise de processos judiciais dos cartrios estudados5.

    A escolha da amostra de processos analisados pautou-se pelo cuidado em isolar a varivel organizao efuncionamento do cartrio de outras variveis que poderiam influenciar o tempo do processo. Alm disso, op-

    tou-se por explorar tambm a relevncia dos ritos processuais para a produo de diferentes tempos do processo.Assim, foram selecionadas amostras de processos de ritos ordinrio e sumrio, cada qual composta de feitos deuma mesma classificao oficial do objeto ou natureza da ao (indenizao por danos morais em ordinrios eacidente/seguro de veculos em sumrios), e originrios dos quatro cartrios judiciais escolhidos6.

    Por fim, optou-se pela coleta de dados de processos distribudos segunda instncia e que aguardavamjulgamento no acervo do Arquivo Geral do Tribunal de Justia de So Paulo. Isso permitiu a anlise de processosjudiciais com andamento completo em primeira instncia (j que sua localizao no Arquivo Geral pressupeexistncia de sentena de primeiro grau e de recurso de apelao).

    Alm dos critrios acima relatados, a seleo dos processos da amostra atendeu ao critrio da relevnciasocial do objeto da ao: da a escolha de processos de indenizao por danos morais, tema que suscita impor-

    tantes debates doutrinrios e jurisprudenciais e j desponta entre as principais demandas da justia brasileira; ede acidente e seguro de veculo, relevante pela proximidade do cotidiano de setores mdios da sociedade, repre-sentando uma demanda significativa da justia7.

    As amostras possuem um tamanho de 50% dos processos originrios de cada um dos cartrios seleciona-dos. Assim, buscou-se garantir representatividade dos processos de todos os quatro cartrios - mesmo daquelescom baixo nmero total de processos da classificao selecionada.

    Alm do levantamento junto amostra de processos, a pesquisa optou por realizar, em seguida, uma anliseem profundidade em alguns poucos processos de cada cartrio estudado, de forma a compreender em detalhesos fenmenos e causas de morosidade inicialmente apontados.

    5 Utilizou-se um instrumento de coleta que registrou dados gerais de uma amostra de processos de rito ordinrio e sum-rio (nmero do processo, vara de origem, nmero e qualificao de autores e de rus, tipo de ao) e atos praticadosdurante o procedimento (manifestaes do juiz e Ministrio Pblico, sadas e retornos a cartrio, protocolos e juntadasde peties de advogados, protocolos e juntadas de outros documentos, atos de publicao em Dirio Oficial, atos decumprimento de diligncias e certides). Calculou-se a freqncia desses atos nos processos e o tempo acumulado emcombinaes necessrias entre eles, como deciso/publicao, protocolo/juntada; etc. Para as seqncias mais freqentesnum mesmo processo (como protocolo-juntada de peties), gerou-se tempos acumulados por processo (soma dos tem-pos de cada seqncia naquele processo), de cuja soma dos valores chegou-se mdia e mediana para cada amostra.Criados os instrumentos, foi realizado um pr-teste de metodologia que permitiu seu detalhamento, de acordo comos objetivos da pesquisa. Cuidou-se de tentar isolar a varivel organizao e funcionamento do cartrio de outras quepoderiam influenciar o tempo do processo. E optou-se por explorar a relevncia dos ritos processuais para a produode diferentes tempos do processo (amostras de processos de ritos ordinrio e sumrio). Entre os tipos de processo, esco-lheu-se aleatoriamente aes de indenizao por danos morais sob rito ordinrio e acidente/seguro de veculos sob ritosumrio, originrios dos quatro cartrios judiciais escolhidos.

    6Procurou-se selecionar categorias oficiais que, alm dos demais critrios, contemplassem processos originrios dos quatrocartrios escolhidos a fim de garantir a comparao entre as unidades de anlise da pesquisa.

    7Apenas a ttulo de exemplo, estudo nacional sobre os Juizados Especiais Cveis, responsveis pelo tratamento de demandascveis de valor mximo de 40 salrios mnimos, constatou pedidos de indenizao por danos morais em 20% dos pro-cessos, em geral cumulados com outros pedidos, sendo que esse percentual chega a 50,4% no Rio de Janeiro; acidentesde trnsito representaram 17,5% da demanda dos Juizados, menor apenas que as decorrentes de relaes de consumo(37,2%); nesse sentido, ver MINISTRIO DA JUSTIA. Diagnstico dos Juizados Especiais Cveis, Braslia, Minist-rio da Justia, 2006, tabelas 3 e 6, pp. 26 e 28. Os processos classificados como pedidos de indenizao por danos moraispelo sistema oficial paulista representam cerca de 20% do total de processos originrios dos quatro cartrios selecionadospela pesquisa, que aguardam julgamento em segunda instncia, afetos antiga competncia da seco de Direito Pblicodo Tribunal de Justia; no caso dos processos classificados como relacionados a acidente e seguro de veculo pelo sistemaDireito Privado 3, do qual extraiu-se a amostra da pesquisa, essa proporo chega a 23,12% (Fonte: Tribunal de Justia

    do Estado de So Paulo).

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    8O uso de servios bancrios um imperativo da moderna vida urbana, e os processos dessa classificao, originrios doscartrios escolhidos e aguardando julgamento em segunda instncia, includos no sistema afeto antiga competncia doPrimeiro Tribunal de Alada Cvel - 1 TACSP, somam 557 feitos, 13,2% do total; quanto relevncia jurdica do tema,basta apontar a recente controvrsia, tratada pelo Supremo Tribunal Federal, sobre a aplicao ou no do Cdigo de De-fesa do Consumidor aos contratos bancrios, que resultou no entendimento de que esses negcios jurdicos constituemrelaes de consumo.

    9 Observou-se os tempos totais de 47 processos selecionados de acordo com essa classificao e origens, e comparou-os ar-bitrariamente com os resultados do teste metodolgico, buscando destacar processos com tempo total em torno de doisanos (tempo prximo ao total mdio dos casos observados no teste) e, em relao aos cartrios da Capital que apresenta-vam maior universo de processos dessa categoria em segunda instncia, um caso com tempo menor (cerca de um ano) e

    um caso de tempo maior (at seis anos) de cada ofcio.

    Optou-se pela seleo de oito processos relacionados a contratos bancrios, sendo trs de cada cart-rio da Capital e um de cada cartrio do interior. A escolha baseou-se nos mesmos critrios utilizados paraseleo dos feitos de indenizao por danos morais e acidente de veculos 8e em tempos medidos no testeda metodologia9.

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    3. Perfis dos cartrios judiciais estudados

    Os cartrios A e B situam-se na Capital e os cartrios C e D, em comarcas do interior. O cartrio Afoiinstalado h algumas dcadas e o cartrio Btem mais de cem anos. O cartrio C est em comarca consideradade fcil provimento (juiz est lotado h mais de dez anos) e o cartrio D em comarca considerada de difcilprovimento (juiz atual est na Vara h menos de um ano).

    Os cartrios A e D tm bons ambientes de trabalho e o diretor tem apoio dos funcionrios, o que no se ve-rificou nos cartrios B e C. Em todos, em maior ou menor grau, diretores e chefes redigem minutas de decisespara o juiz assinar. O cartrio A tem a maior relao processos/escrevente e apenas recentemente aderiu divisode processos por numerao final entre os escreventes. No cartrio B, o diretor se limita a atividades adminis-trativas e h sees chefiadas por escreventes-chefe que se organizam e funcionam com relativa autonomia. Ocartrio C no mais utiliza fichas de andamento em cartolina. O cartrio D realiza sesses prvias de conciliaoem determinados processos, o que diminuiu seu volume de feitos e aumentou a motivao dos funcionrios.

    Perfis dos cartrios judiciais estudados e alguns resultados

    Cartrios /

    caractersticasA B C D Mdia

    Dados gerais.

    capital capital interior interior --------

    9245 processos 8261 processos 6014 processos 3603 processos --------

    523 proc./escrev. 463 proc./escrev. 515 proc./escrev. 423 proc./escrev. 481.5

    0,51 comp./func. 0,43 comp./func. 0,5 comp./func. 0,6 comp./func. 0,51

    Tempos* (dias)

    Tempo total 815 741 1056 740 701

    Tempo at

    sentena591 376 701 570 559.5

    Tempo sentena-

    remessa170 365 355 224 278.5

    Tempo total depublicao

    519 369 561 423 468

    Tempo total de

    juntada290 131 99 46 141.5

    Tempo em

    cartrio748 718 1001 664 782.7

    Ambiente de

    trabalho

    (0=pss.;5=excel)

    4,1 2,47 2,47 4,1 3.4

    ------- ------- maior mdia etriamenor mdia

    etria37.9 anos

    Organizao

    interna do

    trabalho e

    distribuio dos

    processos10

    por nmero final

    do processo

    recente

    implantao

    por Sees e, em

    cada seo, por

    nmero final;

    por final h 15

    anos; um escrev.

    por nmero final;por final; ------

    duas fichas de

    andamento (fsica

    e informatizada)

    duas fichas de

    andamento (fsica

    e informatizada)

    somente ficha

    informatizada (do

    sistema)

    duas fichas

    de andamento

    (fsica e

    informatizada)

    ------

    10 Em geral, os cartrios organizam o servio interno pela mistura de trs critrios: por tarefas, por finais e por rito.Na organizao por tarefas, cada funcionrio responsvel por uma nica tarefa em todos os processos do cartrio.

    Na organizao por finais, os processos so distribudos entre os funcionrios conforme sua numerao final, ou seja,

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    o funcionrio responsvel por todas as tarefas em processos com determinada numerao final, independentemente dotipo de processo ou de procedimento. Na organizao por rito, cada grupo de funcionrios se encarrega de processaraes judiciais que tramitam por determinado rito ou procedimento: aes de rito ordinrio, aes de rito sumrio, aesde despejo, aes de execuo, etc. Os cartrios costumam conjugar mais de um critrio.

    Juiz

    Tempo na Vara recente 2 anos 16 anos 1 ano ------

    Aval. p/ funcion. 4.16 4.16 2.12 2.47 3.36

    juizite

    (0=mn;5=mx.)1.48 1.15 3.06 3 2.17

    Diretor mulher homem homem mulher

    Tempo na funo 15 anos 17 anos 20 anos 1 ano

    Relac. c/ func.

    (0 a 5)4.4 3.5 3.6 4.4 3.98

    Perfil ouvidora

    autoritrio/

    fechado a

    mudanas

    escrivo de

    processosouvidora ------

    Relac. com

    escrev.chefe4.4 3,8 4 4,5 4.2

    Relac. com os

    escreventes4.2 3,76 3,71 4,05 3.9

    Relac. com o

    Tribunal1,37 1.92 0,38 2 1.52

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007. (*: amostra de processos de rito ordinrio e sumrio)

    A estrutura funcional dos cartrios estudados relativamente comum. O diretor o grande responsvelpela gesto do cartrio e o juiz uma figura distante nesse aspecto. O oficial maior, um escrevente-chefe que res-ponde pelo cartrio na ausncia do diretor, pode assessorar o diretor na gesto do cartrio (como no cartrio A eno D) ou se limitar chefia dos escreventes. Os escreventes-chefe exercem tarefas burocrticas de controle de umgrupo de escreventes e tambm processam feitos (servio em atraso dos escreventes e minutas de decises para

    o juiz assinar). Os escreventes so os grandes processadores dos feitos: cumprem as rotinas necessrias, como asjuntadas, concluses, datilografia, publicaes, etc. e se dividem por numerao final. Os auxiliares e estagiriosgeralmente atendem o balco tarefa considerada desagradvel por quase todos os funcionrios -, cuidam doleva-e-traz de documentos e processos, enviam e recebem ofcios, documentos e correspondncias e, em algunscasos, realizam a rotina de publicao.

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    Cartrio A

    Cartrio B

    O quadro abaixo ilustra as funes, nmeros de cargos e relacionamentos profissionais principais e acess-rios observados nos cartrios judiciais estudados.

    Organograma dos Cartrios Estudados

    Cartrio C

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo de

    casos, 2007.

    Cartrio D

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    O cartrio A localizado na Capital, tem o maior volume de feitos (9,2 mil processos), a maior relaoprocessos por escrevente (523,2/1) e 15 computadores em rede para 29 funcionrios. Recentemente, foi reorga-nizado por numerao final de processos (cada escrevente cuida de processos com uma dada numerao final).H uma seo administrativa que centraliza e distribui algumas tarefas para os demais funcionrios, como orecebimento de peties do protocolo e o envio de processos para a concluso. Os auxiliares e o oficial maiortambm centralizam e distribuem processos e tarefas aos escreventes, como o recebimento e envio de mandados

    e correspondncias. Segundo o diretor, a prtica de redigir minutas de decises para o juiz analisar e assinar restrita. O oficial maior e os escreventes-chefe afirmaram redigir decises e despachos mais simples.O diretor est no cartrio A h 15 anos, tem bom relacionamento com os funcionrios e o ambiente de

    trabalho agradvel. Ele divide seu tempo entre a organizao e gesto do cartrio e rotinas de processamentodos feitos, por ele assumidas para desafogar escreventes com trabalho atrasado11. O juiz titular, recm-chegado, distante da gesto do cartrio, auxiliando o diretor apenas quando este lhe submete alguma questo pontualque no tenha conseguido resolver sozinho. O oficial maior o brao direito do diretor na gesto do cartrio,mas tambm divide seu tempo entre processos de uma numerao final e o auxlio ao diretor em atividades or-ganizacionais.

    O cartrio Btem mais de um sculo de existncia, est localizado na Capital, tem o segundo maior volu-

    me de processos (8,2 mil), a terceira relao de processos por escrevente (463,2/1) e 14 computadores para 32funcionrios. Est organizado em quatro sees processuais organizadas por tipo de processo/rito (processos derito ordinrio, sumrio, execues e cautelares e procedimentos especiais) e uma seo administrativa. Em cadaseo, um escrevente-chefe a organiza e gere com relativa autonomia e escreventes dividem entre si os processospelo nmero final. O ambiente de trabalho no dos melhores e o diretor no possui relao amistosa com al-guns funcionrios.

    O diretor est naquele cartrio h dezessete anos e, pelo que se observou, concentra-se em atividades admi-nistrativo-burocrticas do cartrio. O juiz tambm no atua diretamente na organizao do cartrio.

    As sees parecem desempenhar papel importante no funcionamento desse cartrio, j que se organizame funcionam com relativa autonomia. Os escreventes-chefe distribuem as tarefas processuais interna e exter-

    namente e elaboram minutas das decises mais simples. Os escreventes realizam todas as rotinas processuais(juntada, publicao, concluso, etc.) dos processos que assumem.Auxiliares e estagirios atendem o balco, ficham todos os processos e fazem o leva-e-traz de documentos

    interna e externamente. A Seo Administrativa, que funciona no cartrio e na sala do juiz, tambm centralizaa distribuio de tarefas e d suporte ao juiz, especialmente atravs dos escreventes de sala.

    O cartrio Clocaliza-se no interior, tem cerca de 6 mil processos, segunda relao processos por escreven-tes (515,5/1) e 10 computadores para 20 funcionrios. Segundo o diretor, est organizado por numerao finalh mais de 15 anos e h mais de cinco anos cada escrevente cuida de apenas um nmero final. Substituiu asfichas de andamento pelo registro no sistema informatizado.

    No h sees, mas os funcionrios esto divididos em trs grupos informais organizados em torno de doisescreventes-chefe e do oficial maior. Os escreventes-chefe realizam a administrao burocrtica desses grupos etambm assumem o processamento de feitos, como os escreventes. A redao de minutas de deciso generali-zada, realizada tanto por chefes como por escreventes.

    O diretor, no cartrio h vinte anos, centraliza e decide todas as questes administrativas do cartrio e considerado autoritrio pelos funcionrios. O juiz, h 16 anos na Vara, tem muito pouca ingerncia em questesadministrativas e praticamente nenhum contato com os funcionrios. O juiz desce em cartrio todos os dias,por cerca de uma hora, para assinar as minutas de decises que os escreventes e chefes elaboram.

    O cartrio D, tambm do interior, possui o menor contingente de processos (3,6 mil) e a menor relaode processos por escrevente (423,8/1). H 12 computadores ligados em rede para 20 funcionrios (sem contar

    11At h pouco tempo, por exemplo, o diretor assumia uma numerao final de processos, como qualquer outro escrevente

    do cartrio.

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    os quatro guardas-mirins vinculados Prefeitura que auxiliam o cartrio). Realiza sesses de conciliao em de-terminados processos, o que diminui seu volume de feitos.

    O diretor, h 16 anos funcionrio da Justia e h apenas um ano nessa funo, exerce toda a gesto docartrio e tem apoio dos funcionrios. O juiz, h pouco mais de um ano na Vara, distante da organizao docartrio e delega aos funcionrios a elaborao das minutas das decises. Segundo entrevistas, a elaborao deminutas de decises ampla e generalizada; abrange despachos simples, decises e sentenas e feita por chefes

    e escreventes.Um grupo de funcionrios, composto pelo diretor, o oficial maior, um escrevente-chefe e dois escreventes,elabora as minutas de decises e sentenas. Os demais escreventes processam os feitos conforme os nmerosfinais e, quando h requerimento, enviam a um desses funcionrios para que elaborem as minutas de deciso.Outro grupo de funcionrios, composto pelo diretor, o oficial maior e um escrevente-chefe, rene-se periodica-mente para criar e atualizar as regras de funcionamento e organizao do cartrio.

    O juiz, ao assumir a Vara, implantou uma sesso de conciliao qual so enviados processos de deter-minada natureza para que se tente a conciliao das partes. Com isso, praticamente no mais se realizam asaudincias preliminares do art. 331 e o ndice de acordos reduziu o movimento geral do Juzo.

    Todos os processos esto cadastrados no sistema informatizado, mas a localizao dos autos pelos funcion-

    rios, para atendimento ao pblico e processamento interno, ainda feita pelas fichas de andamento.

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    II Os Resultados

    1. Dados gerais dos cartrios estudados

    possvel identificar caractersticas gerais dos cartrios estudados. Basicamente, eles so compostos porfuncionrios do sexo feminino e jovens. O cartrio C o cartrio mais velho e o cartrio D o mais jovem, doponto de vista da idade de seus integrantes.

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

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    Em mdia, os entrevistados trabalham em cartrios h 13,16 anos e ingressaram no cartrio atual h 3 anos12.

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudode casos, 2007.

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo

    de casos, 2007.

    A interao de trs fatores parece definir o funcionamento dos cartrios estudados:relacionamentos pessoais ambiente de trabalho organizao/ distribuio de tarefas.

    A maioria (51,1%) declarou como principal motivo da escolha pelo trabalho cartorrio o sal-rio e/ou a estabilidade, tendo 22,8% apontado incentivos familiares. Outras motivaes incluram gostardo Direito; gostar do trabalho; ter surgido a oportunidade; trabalhar na rua (oficiais de justia) etc.

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    12No cartrio C a mdia foi de 18,12 anos e 14,07 anos, respectivamente, e 29,4% trabalham h mais de 20 anos no

    local.

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    Mais de um tero dos funcionrios (35,9%) declarou no ter nenhum estmulo para trabalhar atualmenteno cartrio e 20,7% do total se declararam totalmente desestimulados (escala = zero).

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    Os cartrios estudados possuem uma estrutura operacional relativamente comum: diretores/chefesorganizam ofuncionamento, redigem minutas de deciso e socorrem escreventes em grande atraso; escreventesprocessam os feitos;auxiliares e estagirioscuidam do leva-e-traz de documentos, atendimento no balco e outras tarefas.

    A organizao interna de trabalho mais adotada a de distribuio dos processos entre os funcionrios segundoo dgitofinalde numerao dos autos: 70,7% declaram trabalhar desse modo, especialmente no cartrio D (90,0%)13.Mas nem sempre h um escrevente para cada nmero final, sendo preciso haver redistribuio de nmeros finais entreeles. As demais formas de organizao (por tarefa e por rito) existem em situaes isoladas, paralelamente organizaopor final14.

    Nenhum dos cartrios estudados possui computadores ligados em rede disponveis a todos os funcionrios. comum entre os funcionrios a percepo de que, por mais que haja empenho, nunca se consegue colocar os

    processos em dia: o trabalho no tem fime as mesas nunca ficam vazias. Impera, nos cartrios, um cenrio de ac-mulo, de excesso e de desordem. Volumes de processos que transbordam das prateleiras e se espalham sobre as mesas e,mesmo, pelo cho.

    13 V. nota 5, supra.14No cartrio D, uma auxiliar incumbida exclusivamente de todas as publicaes do cartrio e no cartrio C, um es-

    crevente cuida apenas de processos de inventrio, arrolamento e outras questes afins. Em ambos os casos, os demais

    escreventes dividem os processos pela numerao final.

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    Os funcionrios discordam de que a contratao de mais funcionrios resolva o problema do exces-so de trabalho, inclusive por conta da falta de espao disponvel em cartrio. Pelo contrrio, demandaminvestimentos na qualificao dos recursos humanos existentes, especialmente dos funcionrios mais envolvidos com otrabalho15.

    15Os prprios funcionrios criticaram os funcionrios encostados, que recebem seus salrios no final de cada ms da mesma

    forma que aqueles que se desdobram para executar bem suas tarefas.

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    2. O impacto dos cartrios sobre a morosidade da Justia

    Os dados levantados confirmam que as rotinas dos cartrios compem a maior parte do tempo dos processosjudiciais. E, enquanto o processo est em cartrio, h perodos que podem ser considerados tempos mortos: tem-pos em que no se praticam atos necessrios soluo do conflito e que, portanto, poderiam ser eliminados16.

    Essas concluses sustentam-se nos dados abaixo sumarizados, abordados em detalhes em seguida:

    o tempo do processo em cartrio; os tempos de espera; o tempo aps sentena; os tempos de publicao e juntada; o tempo dos procedimentos sumrio e ordinrio.

    a) O tempo do processo em cartrio

    O tempo em que o processo fica em cartrio grande em relao ao tempo total de processamento. Des-contados os perodos em que os autos so levados ao juiz para alguma deciso ou retirados por advogados paravista e manifestao, eles ficam nos cartrios por um perodo equivalentea 80% (no cartrio A) e 95% (noscartrios B e C) do tempo total de processamento17.

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    No foi possvel apontar precisamente os vrios elementos que compem o tempo em cartrio. Mas foi possvelapontar os atos que ocorreram com pouca freqncia (e, portanto, menor representao nesse tempo) e medir o tempogasto nas rotinas que mais afetaram esse tempo, porque realizadas em muitos dias em relao ao tempo total.

    16Para fins deste estudo, consideramos tempos mortos aqueles em que o processo aguarda alguma rotina a ser praticada pelofuncionrio (nas pilhas sobre as mesas ou nos escaninhos), bem como os tempos gastos em rotinas que poderiam ser elimi-nadas se o fluxo de tarefas do cartrio fosse racionalizado.

    17O tempo em cartrio no pode ser entendido como perda de tempo ou confundido com tempo morto do processo emcartrio, pois nele esto includos tempos absolutamente necessrios. A amostra sobre a qual foram calculados esses tempos

    era composta de feitos de rito ordinrio e sumrio. A distino entre os ritos feita em alnea especfica, adiante.

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    Primeiramente, neutralizamos o impacto das audincias, percias e tempo gasto em diligncias externasde citao e intimao porque, na amostra estudada, aconteceram com baixa freqncia. Isso permitiu sugerirque, de fato, durante a maior parte do tempo que passa sob domnio do cartrio, o processo aguarda algumaprovidncia a ser realizada pelo funcionrio ou o cumprimento de algum prazo pelos advogados18.

    Computou-se a mdia de uma audincia por processo e, segundo os registros oficiais dos cartrios, aespera para a sua realizao (tempo de pauta) foi indicada como sendo de 2,5 meses, em mdia.

    Tambm houve baixa freqncia de diligncias de citao e intimao. Porm, quando associadas dificuldade de localizao da pessoa a ser intimada/citada ou em caso de relao processual complexa (li-tisconsrcio passivo ou ativo), verificou-se tempo excessivo para o cumprimento de mandados de citao eintimao. Em um dos processos analisados, por exemplo, a intimao por telefone de um perito levou cercade trs meses.

    Apenas em um dos processos analisados em profundidade houve expedio de cartas precatrias, e namaior parte deles houve apenas uma expedio de mandado (citao do ru). Nesses casos, o tempo paracumprimento da citao foi de cerca de 20 dias a um ms.

    A comunicao por ofcios foi verificada em poucos casos, em geral na relao com instituies finan-ceiras e de crdito, com tempo de resposta de cerca de 20 dias aps a expedio.

    As percias tambm no foram freqentes, mas aconteceram justamente nos processos com maior tempototal, com intenso debate posterior entre as partes sobre os resultados obtidos.Os recursos para reforma de decises no so muito utilizados em primeira instncia; mas, quando o

    so, prolongam consideravelmente o tempo das demandas. Nos processos analisados, houve relativamentepouco uso das ferramentas recursais19. Contudo, nos processos mais longos (tempos totais de cinco a seisanos), houve interposio de embargos (3 em processos de A e 1 em processos de B) e agravos (1 em proces-sos de B).

    b) Os tempos de espera

    As atividades dos cartrios no so realizadas no menor tempo, mas no tempo possvel. Isso provavel-

    mente est ligado a dois fatores: as rotinas dos cartrios so complexas (envolvem muitos pequenos atos) e hconsidervel tempo de espera at que sejam iniciadas.A prtica de cada ato processual pelo cartrio, como uma juntada ou uma publicao, implica uma srie de pe-

    quenos atos20.Por maior rapidez que se lhe imprima, a rotina toda demandar algum tempo at ser completada.Embora as rotinas de cartrio sejam complexas, a maior demora no est nos seus tempos de ciclo, mas

    em seus tempos de espera. At que a rotina seja iniciada, h uma espera (geralmente representada pela pilha deprocessos que se forma no escaninho ou na mesa do escrevente) que pode ser apontada como responsvel pelamaior parte do tempo em que o processo fica em cartrio.

    c) Os tempos de publicao e juntada

    As rotinas mais representativas do tempo total do cartrio so apublicaoe ajuntada. Somados os temposgastos em publicao, computa-se o equivalente a algo entre 51,4% a 69,3% dos tempos totais em cartrio21. E,somados os tempos de juntada, computa-se o equivalente a algo entre 7% a 38,8% do tempo total em cartrio22.

    18Outras sadas de cartrio (como carga ao Ministrio Pblico e percias) e algumas esperas necessrias (como aguardo dedecursos de prazo e cumprimento de diligncias externas) aconteceram com pouca freqncia, o que permitiu que fossemincludas no conceito de tempo em cartrio para fins da pesquisa.

    19Em toda pesquisa, registrou-se apenas 10 embargos e seis agravos nos 61 processos do cartrio A; 11 embargos e sete agra-vos nos 48 feitos de B; um embargos em oito processos do ofcio C; e um embargos nos sete processos do cartrio D.

    20Uma concluso, por exemplo, envolve o registro, remessa, entrega escrevente de sala, disponibilizao ao juiz, exame,assinatura, devoluo ao cartrio, recebimento, registro, disponibilizao dos autos para a rotina seguinte, etc.

    21Especificamente, 69,3% em A, 51,4% em B, 55,5% em C e 63,7% em D.22

    Especificamente, 38,8% em A, 18,2% em B, 9,8% em C e 7% em D.

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    O quadro abaixo ilustra quanto equivaleo tempo acumulado nas rotinas de publicao e juntada em rela-o ao tempo total do processo.

    A

    B

    C

    D

    Tempos totais acumulados em publicaes, juntadas, tempo total em cartrioe total em primeira instncia nos cartrios estudados(Brasil, So Paulo, 2006)

    Juntadas (total)

    Publicaes (total)

    Tempo total em cartrio

    Tempo total

    46,5423

    664740

    290,5 519748

    815

    131369,5

    718,5741

    99,5561

    10101056,5

    0 200 400 600 800 1000 1200 DIAS

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007. P.,

    O tempo mdio para se realizar uma publicao variou de, no mnimo, 7,6 dias a, no mximo, 61,5 dias.O tempo mdio para se realizar uma rotina de juntada de petio variou de 2,5 dias a 10,2 dias. As publicaesde decisesso as que apresentam maior tempo equivalente ao tempo total do processo. Em mdia, computou-se25 dias em B e 49,6 dias em C entre o retorno da concluso e a publicao23.

    A

    B

    C

    D

    Tempo acumulado em publicaes de decises judiciais, tempo total em cartrioe total em primeira instncia por cartrio estudado(Brasil, So Paulo, 2006)

    Publicaes de decises judiciais

    Tempo total em cartrio

    Tempo total

    374664

    740

    264748

    815

    159718,5

    741

    272,51010

    1056,5

    0 200 400 600 800 1000 1200 DIAS

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    23

    Parciais de 44,6 dias em A, 25 em B, 49,6 em C e 33,3 em D.

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    A grande representao da publicao e juntada nos tempos totais no condiz com a baixa freqncia com queforam observadas. Contabilizou-se cerca de 5,9 a 9,2 publicaes e cerca de 6,7 a 9,7 peties por processo analisado.

    Nmero de publicaes por processo pesquisado de acordo com o cartrio de origem e

    tempo mdio da rotina (Brasil, So Paulo, 2006).

    Cartrio Processos pesquisadosPublicaes Tempo mdio por

    publicao (em dias)Total Por processo

    A 61 363 5,9 61,5

    B 48 479 9,9 48,3

    C 8 66 8,2 8,04

    D 7 65 9,2 7,6

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    Nmero de peties por processo pesquisado de acordo com o cartrio de origem

    (Brasil, So Paulo, 2006).

    Cartrio Processos pesquisadosPeties Tempo mdio por

    juntada (em dias)Total Por processo

    A 61 478 7,8 2,5

    B 48 469 9,7 8,2

    C 8 59 7,3 10,2

    D 7 47 6,7 3,8

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    O tempo de publicao pode estar atrelado espera decorrente do agendamento pelo cartrio da data emque a deciso ser publicada. Alguns entrevistados reconheceram que o cartrio adia propositalmente o agenda-mento da publicao no Dirio Oficial para controlar o afluxo de peties e, assim, equilibrar o fluxo de serviodo cartrio.

    Vale observar que, embora a publicao seja a rotina de cartrio com maior representao no tempo totalde processamento, ela foi apontada como mais importante por apenas 4,3% dos funcionrios entrevistados. Ja juntada foi considerada a mais importante para 38% dos entrevistados. Esses dados sero abordados no item3, c, infra.

    d) O tempo ps-sentena

    O processo demora muito tempo em cartrio mesmo depois de proferida a sentena. Cerca de 35% dotempo total dos processos analisados foi gasto aps a sentena, para o recebimento de eventual recurso e respos-tas e remessa dos autos para o Tribunal. No cartrio B, essa proporo chega a 50%.

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    A

    B

    C

    D

    0 200 400 600 800 1000 1200

    Tempo em dias at sentena e total em primeira instnciade acordo com o cartrio de origem(Brasil, So Paulo, 2006)

    Sentena

    Tempo total

    DIAS

    570740

    591815

    376741

    7011056,5

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    Isso leva a crer que h alguma forma de presso eficaz exercida antes da sentena para a acelerao do pro-cessamento.

    No mesmo sentido, tambm se observou que as juntadas realizadas aps a sentenademoraram mais doque aquelas praticadas antes, e que, como se ver no item seguinte, a menor durao dos feitos de rito sumrio mais evidente antes da sentena.

    e) O tempo dos procedimentos ordinrio e sumrioA diferenciao estabelecida em lei entre o procedimento sumrio e o ordinrio dos processos cveis de

    conhecimento foi responsvel, nos casos analisados, por uma reduo de 30% no tempo total do processo (ata remessa ao Tribunal).

    Os processos de rito sumrio duraram 70,5% do tempo dos processos de rito ordinrio. Antes da senten-a, contudo, a diferenciao legal mais eficaz: os sumrios representaram 56,3% do tempo dos feitos de ritoordinrio.

    ORDINRIO

    SUMRIO

    0 200 400 600 800 1000

    Tempo at sentena e total em primeira instnciade acordo com o rito processual(Brasil, So Paulo, 2006)

    Tempo

    Tempo t

    DIAS

    351

    615,5

    623,5

    872

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

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    A menor durao dos feitos de rito sumrio, previsvel a partir do desenho legal dos procedimentos, podeestar atrelada concentrao de atos processuais estabelecida neste rito, em contrapartida disperso observadanos feitos de rito ordinrio, como ilustra o grfico seguinte:

    185207

    188204

    351615,5

    Tempos de atos processuais do protocolo at a sentenae tempo total em primeira instncia(Brasil, So Paulo, 2006)

    Primeira contestao (protocolo)

    ltima rplica (juntada)

    Primeira audincia

    ltima audincia

    Sentena

    Tempo total

    0 200 400 600 800 1000 DIAS

    134241

    403540,5

    623,5 872

    ORDINRIO

    SUMRIO

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    Pode-se supor, a partir desses dados, que, pela disperso dos atos processuais e a maior complexidade doprocedimento ordinrio, o impacto do tempo dos cartrios sobre a morosidade dos processos mais sentido nosfeitos de rito ordinrio que nos de rito sumrio.

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    3. A invisibilidade dos cartrios judiciais

    A despeito do impacto que provocam sobre a morosidade do processo, os cartrios judiciais no so vistoscomo atores do sistema de justia. A exata medida da influncia que os cartrios projetam sobre o acesso jus-tia e a morosidade processual parece tambm no ser compreendida pelos demais atores. No sistema de justia,os cartrios judiciais so, praticamente, invisveis.

    Pelas informaes levantadas, possvel sugerir que cartrios sejam invisveis para o legislador, para oTribunal e, inclusive, para os prprios funcionrios. Os seguintes dados, em seguida abordados em detalhes,sustentam essa concluso:

    a jurisdio exercida em cartrio; a invisibilidade dos cartrios perante o Tribunal e o legislador; o destaque dado s tarefas burocrticas e aos relacionamentos pessoais;

    a) A jurisdio exercida em cartrio

    A influncia dos cartrios sobre a justia no se limita aos seus efeitos sobre a morosidade do processo.Estende-se a aspectos materiais do exerccio jurisdicional: funcionrios de cartrio so quem elabora um volumeconsidervel de decises judiciais.

    A chamada preparao de decises ou despacho em preto consiste na apreciao, geralmente pelo dire-tor, escrevente-chefe ou escrevente, dos requerimentos mais simples formulados pelas partes e na elaborao deuma minuta de deciso, que submetida ao juiz e, se aprovada, por ele assinada.

    Esse fenmeno foi constatado em todos os cartrios analisados, variando apenas o nvel de utilizao e otipo de deciso preparada. Em alguns, ele bastante utilizado para todo tipo de deciso (inclusive liminares esentenas). Em outros, utilizado apenas nas decises mais corriqueiras ou simples, como afirmam os fun-cionrios.

    Como no se trata de uma prtica oficialmente reconhecida embora bastante difundida no se verificouhaver padro ou critrios na elaborao das minutas ou na conferncia feita pelo juiz. Em um dos cartrios estu-dados, por exemplo, o juiz permanece uma hora por dia na mesa do diretor conferindo e assinando cerca de 80

    minutas o que leva a crer que a conferncia no rigorosa. Em outro cartrio, o diretor confirmou que, aps ojuiz assinar as decises, ele, o diretor, as confere para saber se a deciso est mesmo correta.

    b) A invisibilidade dos cartrios perante o Tribunal, as normas processuais e a reforma do

    Judicirio

    provvel que a influncia dos cartrios na distribuio de justia tambm no seja considerada pelo ad-ministrador da justia e pela lei. Embora seja o responsvel ltimo pela organizao dos cartrios judiciais, oTribunal de Justia , para os funcionrios dos cartrios estudados, uma entidade abstrata e distante. E quantoao legislador, ele no considerou as rotinas de cartrio ao disciplinar os procedimentos judiciais e, mais recente-mente, ignorou o papel dos cartrios ao promover a reforma do Poder Judicirio.

    Para a maioria dos funcionrios dos cartrios estudados, especialmente os do interior, o Tribunal aindauma instncia mais abstrata e que os desconhece. A queixa mais generalizada dos funcionrios, por parte de to-das as categorias, foi a de no serem ouvidos pelo Tribunal. Predomina um desestmulo geral, uma sensao dedesprezo e a certeza de que o Tribunal s se dirige aos cartrios para exigir dos funcionrios o cumprimento demedidas vistas como descabidas, tpicas de quem desconhece o dia-a-dia do trabalho.

    Pelo levantamento quantitativo, a relao entre seu cartrio e o Tribunal foi avaliada de forma negativacom mdia 1,52 (de zero a cinco). Do total, 21,7% atriburam nota zero a essa relao e 18,5% nota 1.

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    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    Os cartrios no participam da gesto dos seus recursos humanos, oramentrios, materiais e tecnolgicosfeita pelo Tribunal. Observou-se no haver adequao entre funes e perfis: h funcionrios da mesma categoriacom variados perfis. Os cartrios no participam da elaborao do seu oramento e no gerenciam (e no soresponsveis por) seus gastos. No h verba para adiantamento de despesas midas e os funcionrios angariam

    verbas entre si para compra de materiais para consumo imediato. Os funcionrios informaram no terem sidoconsultados para a elaborao do novo sistema informatizado de registro dos andamentos processuais (v. item4, c, infra).

    Os funcionrios, em geral, no so oficialmente treinados e no recebem cursos de aperfeioamento 24. Asprticas consolidadas durante os anos de existncia do cartrio, sobre as quais est montada toda sua organizaoe funcionamento, so passadas do funcionrio mais antigo ao ingressante. Como dito acima, a inovao dessasprticas depende, em grande medida, da criatividade e iniciativa dos diretores.

    Por outro lado, a Lei tambm parece ignorar a presena e influncia dos cartrios no sistema de justia.Embora responsveis pelo processamento das aes judiciais, so poucos os dispositivos legais na Lei 5.869/73(Cdigo de Processo Civil) referentes aos servidores de cartrios judiciais. E as regras desse diploma relativas

    seqncia de atos ou aos prazos dos procedimentos judiciais cveis ignoram a existncia e o tempo necessriopara as rotinas internas dos cartrios.

    A cada ato processual previsto em lei, o cartrio realiza inmeros outros atos preparatrios, para cuja prti-ca o legislador fixou genericamente o prazo de 48 horas (CPC, art. 190) prazo esse que o cartrio sequer tentacumprir, dada a absoluta impossibilidade. Conseqentemente, h uma discrepncia entre o tempo do processoque a lei processual (e o legislador reformista) considera existir e o tempo real do processo.

    Os grficos abaixo ilustram a comparao entre os tempos dos procedimentos judiciais segundo reza a leie os tempos verificados nos processos dos cartrios estudados.

    Pelos prazos da lei, da distribuio at a remessa dos autos ao Tribunal, um processo de rito ordinrio du-raria 209 dias (pouco mais de 7 meses) e um processo de rito sumrio duraria 178 dias (quase seis meses). Na

    prtica, contudo, como vimos acima (item 2, a, supra), os processos de rito ordinrio e sumrio dos cartriosestudados duraram, em mdia, 872 dias (29 meses) e 615,5 dias (20,5 meses), respectivamente, at a remessaao Tribunal.

    24Durante a coleta, noticiou-se a nobre iniciativa do Tribunal de dar treinamento gerencial e de liderana aos diretores. Mas

    as entrevistas indicaram que essa iniciativa pioneira nos ltimos anos.

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    Anlise da Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais 31

    4057

    100130

    148209

    Tempos processuais pelo rito ORDINRIOde acordo com o CPC e os dados empricoscoletados, em dias(Brasil, So Paulo, 2006)

    Primeira contestao (protocolo)

    ltima rplica (juntada)

    Primeira audincialtima audincia

    Sentena

    Tempo total

    0 200 400 600 800 1000 DIAS

    134241

    403540,5

    623,5872

    PESQUISA

    CPC

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo de

    casos, 2007.

    373956

    99117

    178

    Tempos processuais pelo rito SUMRIOde acordo com o CPC e os dados empricoscoletados, em dias(Brasil, So Paulo, 2006)

    Primeira contestao (protocolo)

    ltima rplica (juntada)

    Primeira audincia

    ltima audincia

    Sentena

    Tempo total

    0 100 300 500 600 700 DIAS

    188185

    207204

    351615,5

    PESQUISA

    CPC

    200 400

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007. (*considerar contestao e audincia na mesma data)

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    32 Anlise da Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo de

    casos, 2007

    J o fluxograma abaixo ilustra os procedimentos ordinrio e sumrio de acordo com os prazos da lei, semconsiderar os demais tempos que, na realidade, tambm compem essa linha procedimental. Mantida a escala,uma linha similar baseada no tempo real desses procedimentos demandaria quase quatro pginas.

    AutuaoDespacho

    Expedio de mandado

    Registro (1)ConclusoPublicao

    Juntada de mandadoCitao (21)

    Contestao (38)

    ConclusoPublicao

    Juntada de mandadoDespacho

    Rplica

    Concluso Juntada de rplica (57)

    DecisoPublicao

    Audincia preliminar (100)

    Audincia de instruo (130)

    Memoriais do autorMemoriais do ru e junt.

    dos mem. do autor Juntada dos memoriais do ru

    Sentena (148)

    Apelao

    Publicao

    Concluso

    Registro

    Juntada da apelao (167)

    PublicaoDeciso

    Juntada das contra-razesContra-razes

    Concluso

    Publicao

    Deciso

    Envio para o Tribunal (209)

    Procedimento Ordinrio (pelo CPC)

    Total: 209 dias

    AutuaoDespacho

    Registro (1)Concluso

    Audincia de conciliao

    ConclusoPublicao

    Juntada de contestaoDespacho

    Rplica

    Concluso

    Juntada de rplica (57)

    DecisoPublicao

    Audincia de instruo (99)Memoriais do autor

    Juntada dosmemoriais do ru

    Apelao

    Deciso

    ConclusoJuntada da apelao (138)

    Contra-razesJuntada

    DecisoEnvio para o Tribunal (178)

    Publicao

    Procedimento Sumrio (pelo CPC)

    Total: 178 dias

    Memoriais do ru e juntadados memoriais do autor

    Concluso

    Sentena (117)

    PublicaoRegistro

    Publicao

    Concluso

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    Anlise da Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais 33

    Apenas a rotina de autuao (da petio inicial e documentos), por exemplo, que no fluxograma acima representada por um evento simples de 48 horas (seta vermelha), implica o cumprimento de uma srie complexade atos que podem durar mais de uma semana. O fluxograma abaixo ilustra as vrias operaes necessrias parase completar a rotina da autuao, conforme observado em um dos cartrios estudados. O procedimento legalparece ignorar a existncia desses pequenos atos, mas so eles responsveis por grande parte do tempo total dosprocessos.

    AUTUAO: O advogado distribui a ao junto ao Cartrio Distribuidor do Frum, que a recebe, numera e registra nosistema duas vezes. Em seguida, o Distribuidor emite duas etiquetas e as separa por cartrio, enviando-as aos cartriosrespectivos. (segue)

    Cartrio A

    Fluxograma real da rotina de autuao

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    34 Anlise da Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais

    O envio ao cartrio respectivo feito, normalmente, ao final do expediente. No caso do Cartrio A, as peties vindas doDistribuidor so recebidas pela Seo de Administrao, que as registra no sistema informatizado, etiquetam-nas (registran-do novamente no sistema informatizado) e encaminham-nas Vara, especificamente ao escrevente de sala, que encami-nhar a petio inicial... (segue)

    ao juiz, que a analisa, despacha e devolve ao escrevente de sala, que a encaminha Seo de Administrao. Essa registrao envio para a autuao no sistema fsico de andamento de processo (ficha de cartolina) e envia para... (segue)

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    Anlise da Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais 35

    ... o escrevente responsvel (conforme o nmero final do processo) consolidar propriamente a autuao, o que ser feitoquando o volume de servio permitir.

    A autuao implica colocar uma capa de papel nos documentos j existentes (petio inicial, algumas certides e despachodo Juiz).Ela abrange algumas operaes: primeiro, o registro no sistema informatizado e a colocao de uma etiqueta com nmerodo processo na capa. Em seguida, ...(segue)... furar a petio inicial, junt-la encadernao, numerar as folhas e registrar o envio para a prxima rotina.Esse registro realizado duas vezes: fisicamente na ficha de cartolina e virtualmente, no sistema informatizado.Em seguida, os autos do processo podem ser encaminhados publicao, datilografia ou escaninho de prazo, conforme asituao.Finda-se aqui a rotina de autuao.

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    36 Anlise da Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais

    Por fim, os prprios funcionrios demonstraram-se alheios ao debate sobre a crise da justia brasileira, o que tal-vez explique a praticamente inexistente representao poltica e institucional dessa categoria na Reforma do Judicirio.Questes relacionadas a essa temtica raramente apareceram nos discursos dos funcionrios, o que indica que no estoem suas pautas de preocupaes, embora tenham relao direta com seu trabalho.

    Diferentemente, a pauta de demandas dos funcionrios gira em torno de insatisfaes com a poltica de gestode recursos humanos por parte do Tribunal e os aspectos mais valorizados ou criticados nos juzes e diretores esto, de

    alguma forma, ligados ao relacionamento pessoal que tm com os funcionrios. Some-se a isso a importncia conferidaa tarefas burocrticas em detrimento de tarefas mais prximas da resoluo efetiva dos conflitos, como as audincias.Em alguns cartrios, o fato dos funcionrios elaborarem as minutas de decises foi criticado no pelo aspecto de legiti-midade envolvido, mas por representar uma tarefa extraordinria em sua pauta.

    c) A importncia de funes protocolares e de relacionamentos pessoais

    A maioria dos funcionrios entrevistados concordou que seu trabalho exerce alguma influncia sobre os conflitossubmetidos Justia. Porm, provvel que no dimensionem a medida dessa influncia, j que costumam apontarelementos perifricos ao exerccio da jurisdio, como as rotinas burocrticas e os relacionamentos pessoais, como osmais relevantes.

    Ao serem indagados: Voc acha que com seu trabalho exerce alguma influncia nos conflitos que chegam aoJudicirio?, 67,6% responderam afirmativamente e 18,9% negativamente.

    Percepo da influncia do prprio trabalho nos conflitos contidos nos autos process

    Base: total da amostra do interior (37 funcionrios)

    Sim, influencia-os

    No os influencia

    Outras respostas

    14%

    19%

    67%

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    Ainda assim, a juntada a tarefa apontada como a mais importante por 38% dos funcionrios entrevistados. Se-guem-na, a alguma distncia, o atendimento de advogados (17,4%) e a concluso (16,3%). O atendimento das partes(6,5%) e a publicao (4,3%)25so importantes para poucos funcionrios.

    Hierarquizao das tarefas, segundo sua importnciana composio do processo judicial, em %Base: total da amostra (92 funcionrios)

    Juntada

    Atendimento a advoga

    Concluso

    Atendimento das parte

    Publicao

    Sem informao

    17%

    4% 39%

    7%

    16%

    17%

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.25Esses percentuais indicam a quantidade de funcionrios que apontaram, em primeiro lugar, como mais importante, cada

    uma das tarefas mencionadas.

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    Anlise da Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais 37

    Entre aspessoasconsideradas mais importantes para ofuncionamento da justia, 30,4% dos funcionriosapontaram o escrevente - em seguida ao juiz, mais importante para 35,9%. As partes so indicadas apenas por7,6% dos entrevistados e o diretor por 4,3%. Os advogados so indicados por 2,2% apenas.

    Hierarquizao de pessoas segundo sua importncia parao rpido e bom andamento do processo judicial, em %Base: total da amostra (92 funcionrios)

    Juiz

    Escreventes

    Partes

    Escriv(o)-diretor(a)

    Auxiliares

    Estagirios do cartrio

    Advogados

    Sem informao

    12%

    4% 37%

    5%

    8%

    30%

    2%2%

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    Em contrapartida, a audincia, ocasio em que o contraditrio e o exerccio jurisdicional so concentrados eimediatos, mencionada nas falas de alguns entrevistados como um algo parte26. Da mesma forma, os funcio-nrios consideraram pequena a importncia justamente daqueles que constroem o contraditrio, como as partes(7,6%) e advogados (2,2%). Tambm do pouca importncia ao diretor (4,3%), embora tenham conhecimentode que muitas das decises que o juiz assina so feitas por ele.

    Os relacionamentos pessoais em cartrio tambm tm importncia destacada em relao aos demais elemen-tos. A quase totalidade dos funcionrios (91,3%) se reportou ao papel determinante dos relacionamentos pessoaisno interior dos cartrios explicando que estes constituam a base do ambiente.

    ESCRIVO

    Compreenso de ambiente de trabalho como determinado porrelaes de trabalho, segundo categorias profissionais, em%

    0 20 40 60 80 100

    ESCRIV. CHEFE

    ESCREVENTE

    AUXILIAR

    ESTAGIRIO

    OFICIAL DE JUSTIA

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    26A audincia pode ser uma chave para incrementar a percepo que o funcionrio tem de sua importncia para a Justia.No cartrio D, por exemplo, em que funciona um setor de conciliao, os funcionrios afirmam que, a curto prazo, as au-dincias representam uma interrupo no restante do trabalho, mas demonstraram perceber que, a mdio e longo prazo,elas representam o fim de muitos processos que durariam anos. Alguns escreventes ressaltaram gostar muito de assumir atarefa de conciliadores, pois se percebem participando mais diretamente dos desfechos processuais. Por outro lado, a audi-ncia pode revelar as idiossincrasias do funcionamento cartorial. No cartrio C, as audincias comuns so percebidas como

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    38 Anlise da Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais

    Os funcionrios depositam muitas expectativas no relacionamento com diretores e juzes. A maioria(75,1%) declarou ser importante o juiz estar presente no dia-a-dia do cartrio (mdia 3,62 em uma escalade zero a cinco)27. Por outro lado, sentem em concreto que o juiz nem sempre presente no cotidiano docartrio: a mdia da avaliao acerca da presena fsica dos juzes foi 2,89 28.

    Na avaliao que fazem do papel do juiz, a capacidade de estabelecer bom relacionamento comos funcionrios29 uma qualidade considerada to fundamental quanto a competncia no trabalho 30:

    66,3% dos funcionrios indicaram ambas como mais importantes31

    . No geral, essas duas qualidades fo-ram muito enfatizadas em todos os segmentos etrios e funcionais dos quatro cartrios.Coerentemente, o principal defeito de um juiz, apontado por todos os entrevistados, seria o que

    chamam de juizite (pedantismo, arrogncia, falta de tato e de educao com os funcionrios): 79,3%.Em segundo, mas um tanto distante, est a incompetncia: 23,9%.

    Ou seja, para o cartrio, o juiz que se relaciona bem com os funcionrios tem o mesmo valor queo juiz tecnicamente competente e o pior juiz, para o funcionrio, no o incompetente, mas o que temjuizite.

    Principais qualidades esperadas em um juiz,segundo os funcionrios, por cartrio, em%

    0 20 40 60 80

    D

    C

    B

    A

    Competncia

    Bom relacionamento

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    momentos tensos de avaliao do trabalho dos cartorrios pelo juiz e pelo escrivo-diretor, tanto que, antes da audinciaocorrer, o respectivo processo checado pelo funcionrio que responde por seu final, para evitar punies. E, na Capital,as audincias so consideradas momentos que interferem no ritmo de trabalho, mesmo porque no envolvem todos os fun-cionrios e so percebidas como algo parte.

    27Os diretores consideraram isso mais importante (4,50) do que os auxiliares (3,50) e, nos cartrios C e B, tal importnciatambm foi mais enfatizada (4,12 e 4,08) do que nos cartrios D e A (3,45 e 2,96) talvez porque aqueles cartrios tenhampior relacionamento com o diretor que esses.

    28Em uma escala de zero a cinco (zero para o menos presente e cinco para o mais presente).29 Ser justo, ser humilde.30 Ter pulso firme, ser prtico, ser rpido, ter conhecimento tcnico-jurdico.31

    As respostas foram espontneas e podiam acumular referncias, por isso as categorias citadas somam mais do que 100%.

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    Principais defeitos de um juiz,segundo os funcionrios, por cartrio, em%

    0 20 40 60 80

    D

    C

    B

    A

    Juizite

    Incompetncia

    100

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    A importncia dos relacionamentos pessoais tambm fica evidente na avaliao que os funcionrios fizeramde seus diretores. Os mais bem avaliados foram os que exercem o papel de ouvidores dos funcionrios, suprindo emediando a ausncia de comunicao entre cartrio e Tribunal as diretoras dos cartrios A e D. E os diretoresmal avaliados so lembrados como autoritrios, mas nada dito quanto a serem incompetentes.

    D

    Mdia das notas atribudas pelos funcionrios aorelacionamento com os(as) diretores(as) dos cartrios(0 = pssimo, 5 = excelente)

    0 1 2 3 4 5

    C

    B

    A

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    Pelo exame especfico de cada um dos cartrios estudados, percebe-se que a motivao dos funcionriose a percepo da importncia de sua funo na justia so influenciadas pela postura do juiz ou do diretor. E a

    ausncia do juiz contrabalanada pela presena, desejada ou no, do diretor.Entre os casos estudados, os cartrios A e D so considerados bons ambientes de trabalho pelos funcion-

    rios, ao contrrio dos cartrios C e B. Coincidentemente ou no, funcionrios dos cartrios A e D pareceramcompreender melhor a importncia de sua interao para prestar o melhor servio sociedade do que os fun-cionrios dos cartrios C e B32.

    32Nos cartrios A e D, vrias declaraes apontaram para a noo de que o cartrio formado por uma equipe e queas lideranas (diretoras e escreventes-chefe) tm o papel de articular as partes, ao passo que, especialmente no cartrio B,lideranas so, em geral, sinnimo de guetos que se opem.

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    40 Anlise da Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais

    D

    Avaliao do ambiente de trabalho, segundo cartrio(0 = pssimo, 5 = excelente)

    C

    B

    A

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    No cartrio A (diferentemente do cartrio B), apesar de os funcionrios julgarem relevantes a proximida-de e a presena do juiz, nem por isso o consideram central na gesto. O juiz percebido como quem assina ecoordena por fora, como o grande chefe. Em contrapartida, a diretora assume o papel de ouvidora do cartrioe bem avaliada.

    J no cartrio B, em que o diretor foi considerado autoritrio, a presena do juiz considerada funda-mental para respaldar e aprimorar a administrao e gesto do cartrio. As principais dvidas, principalmenterelativas a inadequaes e descumprimentos de normas e provimentos do Tribunal, so percebidas como ques-tes que exigem necessria retaguarda do Juiz.

    No cartrio C, o juiz est naquele cartrio h 16 anos mas considerado distante. O relacionamento como diretor no bom, mas a responsabilidade pela gesto do cartrio acaba depositada nele. Vrios funcionriosconsideram que o juiz desconhece a realidade do cartrio em decorrncia de uma barreiraque o diretor-escri-vo construiu e mantm entre o cartrio e o gabinete33.

    No cartrio D, o jovem juiz assumiu o cartrio recentemente e implementou mudanas na organizaoque geraram efeitos positivos de diminuio do volume de processos e aumento da motivao dos funcionrios34.

    Ainda assim, criticado por seu relacionamento com os funcionrios, que, por sua vez, atribuem a diminuioda morosidade muito mais ao empenho deles prprios do que atuao do juiz. generalizada a sensao deserem usados pelo juiz, especialmente por serem impelidos a elaborarem as minutas de decises e de sentenas35.Por esse conjunto de fatores, neste cartrio, a presena do juiz no foi declarada muito desejvel e a diretora, queat h pouco tempo era escrevente-chefe, assume o papel de ouvidora dos funcionrios.

    33Uma oficial de justia assim se expressou em relao ao seu acesso e dos demais colegas sala do juiz: Bater na porta vocpode, mas quando ela se abre, voc sabe que no deveria estar l.

    34Sua principal medida foi instalar um Setor de Mediao que funciona junto Vara com o objetivo de promover ten-tativas de resoluo amigvel para os casos propostos. Segundo as entrevistas, esse Setor conseguiu diminuir o volume deprocessos e gerou motivao dos funcionrios ao conscientiz-los da importncia de sua funo para a Justia.

    35Especialmente a dois funcionrios delegada essa tarefa de avaliar o processo em sua fase final para pr-elaborarem a

    sentena cabvel.

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    4. Organizao e funcionamento dos cartrios judiciais

    Alm do fator relacionamento pessoal, debatido acima (v. item 3, b), questes organizacionais tambmforam apontadas como determinantes do ambiente de trabalho dos cartrios: 27,2% dos entrevistados mencio-naram questes relacionadas ao sistema de trabalho e qualidade tcnica dos profissionais e 17,4% tocaram emaspectos ligados a recursos materiais36.

    O aprimoramento da estrutura organizacional e dos mtodos de trabalho dos cartrios judiciais assumeespecial relevncia para o controle da morosidade da justia, principalmente se considerarmos que os temposde ciclo de suas rotinas representam a maior parte do tempo de tramitao dos processos judiciais (v. item 2,supra).

    Nessa seara, os dados permitem fazer ao menos trs apontamentos conclusivos: 1. o funcionamento doscartrios no planejado e suas rotinas internas poderiam ser mais simples; 2. a estrutura organizacional atual deuma unidade judiciria do Estado de So Paulo no apta a suportar a crescente demanda por acesso justia e3. a cultura organizacional dos cartrios um grande obstculo informatizao da justia.

    a) Falta de planejamento e rotinas complexas

    Os cartrios judiciais no dispem de administrao profissional e no utilizam ferramental tcnicoapurado para planejar, organizar, controlar, dirigir e coordenar os recursos humanos, financeiros, materiais etecnolgicos com base cientfica. Isso pode ser apontado como responsvel, dentre outras disfunes, por filas,tempos de ciclos extensos e indesejados, controles em duplicidade, falta de informao ou informao sem cre-dibilidade, estresse e falta de realizao profissional dos recursos humanos.

    Geralmente, os cartrios adotam aes pontuais visando reduzir o volume de trabalho de uma determina-da rotina, no formato de mutiro. Essas medidas, contudo, so paliativas e de baixa efetividade.

    A gesto dos cartrios (pelo Tribunal ou pelo diretor) no est baseada em relatrios de gesto ou ndicesde resultados. No h contrato de manuteno preventiva dos equipamentos. Tambm no h um manual deoperaes (eletrnico ou fsico) nem um plano diretor de informtica, ou similares.

    E, como j informado, o treinamento dos funcionrios e a inovao dos mtodos de trabalho dos cartriosesto baseados na prtica e na experincia profissional, mais que em critrios racionais de organizao. As rotinasso construdas por empirismo e transmitidas dos funcionrios mais antigos aos mais novos. Os funcionrios in-gressantes so treinados por algum dos funcionrios mais velhos e incorporam seus cacoetes organizacionais.

    Alm disso, as rotinas realizadas em cartrio - que, como vimos, prolongam consideravelmente o tem-po total dos processos (v. item 2, b) - poderiam ser mais simples. Em geral, o cumprimento de uma rotinade cartrio implica uma dezena de pequenas operaes, realizadas por mais de um funcionrio com repetidosdeslocamentos de documentos ou dos autos. Muitas dessas pequenas operaes ou deslocamentos precisam serregistradas nos diferentes sistemas de registro dos cartrios (v. infra, 4, c). Tudo isso torna cada rotina de car-trio bastante complexa e multiplica o dispndio de tempo e recursos.

    Para ilustrar, apresentamos o fluxograma da rotina de juntada realizada por um dos cartrios estudados.Perceba-se as vrias operaes, deslocamentos de documentos entre os funcionrios e repetidos registros.

    36A pergunta permitia mltiplas respostas, da as categorias mencionadas somarem mais de 100%, pois um mesmo entre-

    vistado podia se referir a mais de uma delas.

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    42 Anlise da Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais

    2

    Documentoou petio

    Advogado

    Protocolo

    Seo deAdministrao

    Assinarprotocolo derecebimento

    Diaseguinte

    Documentoou petio

    Documentoou petio

    Juntada de petio: o Advogado protocola a petio junto ao Setor de Protocolo do Frum ou diretamente em Cartrio.No primeiro caso, a petio protocolada remetida ao Cartrio na manh seguinte.

    Em Cartrio, a petio protocolada recebida pela Seo de Administrao, que assina o protocolo de recebimento eenvia a petio a ser juntada ao... (segue)

    Cartrio A Fluxograma da Rotina de Juntada

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    3

    JuntadaEscrevente

    Selecionaraleatoriamenteum processo

    Furar osdocumentosou peties

    Juntar aoProcesso

    CarimbarCertificao

    4

    Atraso

    No h como calcular o tempo de espera,pois depende do volume de trabalhode cada Escrevente.

    T=?

    H hiptese de ser selecionadoum processo por motivos de urgncia(liminares, idosos, alimentos, etc.)

    Datar(data atual)certificao

    Assinarcertificao

    O furador de papel utilizado domstico e fura, no mximo,dez folhas de cada vez.

    2

    JuntadaAuxiliar Judicirio

    Ordenar osdocumentos por

    n final deprocesso

    Retirarprocesso doescaninho

    Inserir documentoou petio aps a

    ltima pginado processo

    Registrar enviodo processo

    para juntada

    Distribuiconformeo n final

    -N

    Processo

    3

    Localizarprocesso

    Atraso

    Ficha decartolina

    O processo colocado noescaninho ou na mesa doEscrevente, dependendodo volume de processos

    Ficha decartolina

    ... auxiliar judicirio.

    Esse, quando a demanda de trabalho permitir,ordena os documentos recebidos, localiza osprocessos pela consulta ficha de cartolina, retira oprocesso do escaninho, insere a respectiva petioa ser juntada na ltima pgina dos autos e registra,

    tambm na ficha de cartolina, o envio daqueleprocesso para a juntada.

    O auxiliar, ento, coloca os autos no escaninho dajuntada ou os entrega diretamente ao escreventeresponsvel por aquele final conforme haja ouno espao na mesa desse escrevente. (segue)

    O escrevente, quando possvel, iniciar a juntadados processos pelos quais responsvel. Salvomotivos de prioridade de processamento ouurgncia, no h ordem ou critrios para a escolhadas juntadas que sero feitas primeiramente oque depende de como as pilhas de processo ou

    os autos esto organizados no escaninho. Tambmno possvel estimar com preciso quando elefar essas juntadas, eis que depende do seu volumede servio aproximadamente 12 dias.

    Escolhido um processo com documento para serjuntado, ele ento: furar a petio e os documen-tos que a acompanham com um furador domstico(de at 10 folhas por vez), inserir os mesmos aosgrampos dos autos, carimbar a certificao neces-sria, preencher o carimbo e assinar a certifica-o. (segue)

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    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    b) Estrutura organizacional ultrapassada

    Outra importante concluso que a estrutura organizacional das varas e cartrios cveis do Estado no compatvel com o volume crescente de processos distribudos e o intuito manifestado pelos gestores dos tribu-nais de compatibilizar justia com eficincia. Aparentemente, h necessidade de um redimensionamento dessaestrutura e redistribuio das funes entre os servidores.

    4

    Concluso

    EscreventeChefe

    Autos

    SistemaProdesp

    Ficha decartolina

    Registrar enviopara a prxima

    rotina

    Rubricar aPgina

    Numerarpgina

    AutosAutos

    Autos

    Registrar enviopara a prxima

    rotina

    Auxiliar

    Escaninho dePublicao Escaninho deDatilografia

    Ento, o escrevente numerar as pginas da petio edocumentos juntados, rubricar a numerao e registrar nosistema informatizado o envio para a prxima rotina quepoder ser a Concluso, a Publicao ou a Datilografia,conforme o caso. Antes de enviar para a prxima rotina,disponibilizar os autos para o auxiliar judicirio, que far asanotaes na ficha de andamento e disponibilizar os autosno escaninho da prxima providncia.

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    Em tese, uma unidade judiciria realiza basicamente atividades de duas naturezas: processar e decidir. Oscartrios devem processar as aes judiciais que o juiz deve decidir. Porm, tal como esto estruturadas as unida-des judicirias (um cartrio para uma vara), ambos no conseguem desempenhar a contento suas tarefas.

    Para ilustrar, nos cartrios da Capital estudados, h em mdia 8.750 processos, 22 funcionrios, um diretore dois juzes. Nos do interior, h em mdia 4.900 processos, 11,6 funcionrios, um diretor e um juiz.

    Primeiramente, esse volume de feitos impede que a estrutura funcione como programado. Processar, orga-

    nizar e decidir cerca de 5 mil processos judiciais no possvel de ser feito, da forma prevista, por 11 funcionriose um juiz.Em segundo, provvel que haja um desequilbrio entre o nmero de pessoas incumbidas de processar os

    feitos e o nmero dos incumbidos de decidi-los. Nos cartrios estudados, o servio de cerca de 11 funcionrios concentrado em apenas um juiz. Isso impede que o agente decisor (juiz) acompanhe o ritmo dos muitos agentesprocessantes (cartrio) e se torna habitual a transferncia de parte das atividades decisrias para os agentes pro-cessantes. o que se observou nos quatro cartrios estudados: diretores e escreventes minutando decises parao juiz apenas assinar (item 3, a).

    Por fim, bastante provvel que seja necessrio realocar as atividades do cartrio e as funes dos servi-dores. A luz do que foi observado nos cartrios estudados, uma das redistribuies viveis seria, por exemplo,

    desincumbir alguns funcionrios de tarefas burocrticas e incumbi-los de tarefas de gesto, assessoria jurisdicio-nal e resoluo consensual dos conflitos. Alguns seriam alocados para gerenciar o funcionamento do cartrio,outros para auxiliar o juiz nas atividades decisrias e outros para exercerem as tentativas de resoluo amigvel,tcnica revelada proveitosa na experincia de um dos cartrios estudados. Isso dependeria, por um lado, da di-minuio da complexidade das rotinas do cartrio e, por outro, em qualificao dos funcionrios realocadospara as novas funes.

    c) O cartrio e a informatizao dos servios de justia a cultura do balco e a

    cultura do papel

    Por fim e no menos importante, o modo como hoje se organizam e funcionam os cartrios judiciais um

    grande obstculo difuso e sedimentao da propalada informatizao da Justia, especialmente por contadas chamadas cultura do balco e cultura do papel que parecem existir nos cartrios judiciais.

    A iniciativa de informatizar a justia paulista um exemplo. Em que pese a instalao de computadoresem rede e o desenvolvimento de um programa especfico, os cartrios no incorporaram essa inovao. No caso,especialmente porque as peculiaridades do funcionamento dos cartrios no foram consideradas: o programano reproduzia o mtodo de trabalho ao qual os funcionrios estavam acostumados e no houve treinamentosuficiente para aprenderem a operar a nova interface37.

    Em trs dos quatro cartrios estudados, o sistema representou duplicao do servio de registro de an-damento dos processos. Por no saber operar ou simplesmente por no confiar no sistema informatizado, ocartrio no abandona o tradicional registro feito nas fichas de cartolina.

    O trecho do fluxograma abaixo ilustra a duplicidade de registros realizada por um dos cartrios estudados.Observe-se que, ao fim de uma rotina de concluso, o escrevente-chefe da seo registra a ocorrncia no sistemainformatizado e, em seguida, o auxiliar repete a mesma operao na ficha de cartolina.

    37Segundo as entrevistas, o programa foi desenvolvido sem consulta aos funcionrios que, agora, no conseguem mani-pul-lo a contento e o treinamento dos funcionrios no novo sistema praticamente no existiu, o que impede que seu

    desempenho seja otimizado.

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    46 Anlise da Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    Cartrio A - Fluxograma da Rotina de Concluso

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    Conseqentemente, no pequena a possibilidade de divergncia de informao entre a ficha da Internete as fichas fsicas de andamento (em cartolina)38. Isso tende a aumentar a demanda por atendimento e gera o quese chamou por cultura do balco.

    Ficha de andamento em cartolina (frente)

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    Ficha de andamento em cartolina (verso)

    Fonte: Ministrio da Justia/Secretaria de Reforma do Judicirio Gesto e Funcionamento dos Cartrios Judiciais Estudo decasos, 2007.

    38 Pelo que se observou, algumas informaes so registradas em um sistema e no registradas em outro (voluntariamente

    ou no). Estes registros no acontecem ao mesmo tempo e no so os mesmos funcionrio