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Anais do XII Encontro Nacional de Docentes de
Terapia Ocupacional
Terapia Ocupacional e Docência: Articulação e Gestão nos Desafios e Conquistas
TRABALHOS COMPLETOS
22 a 24 de setembro de 2010 Universidade Federal do Paraná - UFPR Curitiba
ISSN 0104-4931
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar
Revista Quadrimestral
Universidade Federal de São Carlos
Vol. 18 – Suplemento Especial
Setembro/2010
SUMÁRIO
Trabalhos Completos
1. Oficina de sensibilização de educadores para o desenvolvimento
inclusivo – estratégias desenvolvidas por acadêmicos do curso de
Terapia Ocupacional da UNIFOR
5
PORTO, C. M. V.; RODRIGUES, M. S.; OLIVEIRA, L. S
2. Estágio Profissional em Contexto Hospitalar - Relato de
Experiência
15
TOYODA, C. Y.; GIARDINETTO, A. R. dos S. B
3. Formar terapeutas ocupacionais: descobrir para conhecer 24
PERUZZOLO, D. L.; PACHECO, A. B.
4. Utilização de metodologias ativas na disciplina de modelos
teóricos em terapia ocupacional do curso de graduação em
Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Paraná (UFPR)
SILVA, D. B.
5. Documentação do processo de Terapia Ocupacional em estágios
supervisionados: sugestão de protocolo para guiar o raciocínio
clínico de supervisores e estagiários
44
SILVA, D. B.; PEREIRA, R. A. B.
6. Crônicas de encontros e notícias do mundo – a presença das
narrativas no acompanhamento do desempenho profissional de
estudantes de Terapia Ocupacional
57
INFORSATO, E. A; GHIRARDI, M. I. G.
7. A ação como precursora do pensamento no humano 65
MARQUETTI, F. C.; KINOSHITA, R. T.
8. Metodologia da Problematização: articulando saberes a partir
dos cenários de prática em Terapia Ocupacional
75
CASTANHARO, R. C. T.
9. O estágio curricular na formação acadêmica do Terapeuta
Ocupacional na Universidade Federal do Paraná – UFPR
87
PALM, R. D. C. M.; MARIOTTI, M. C.; PEREIRA, R. A. B.; OMAIRI, C.;
CASTANHARO, R. C. T.
10. Estudo da ação humana, de atividades e recursos terapêuticos em
Terapia Ocupacional
96
MAXIMINO, V.; LIBERMAN, F.
11. Cinema como recurso pedagógico de terapia ocupacional 107
GARCIA, A. L.; COUTINHO, G. C.; CONSTANTINIDIS, T. C.
12. O plano de tratamento como estratégia de ensino-aprendizagem
no estágio de Terapia Ocupacional em disfunção física
118
CRUZ, D. M. C. da; SOUZA, A. C. de A.; CARDOSO, P. T
13. Atividades de extensão no curso de Terapia Ocupacional:
inventário de potência Oficina da ação
133
MARQUETTI, F. C.; KINOSHITA, R. T.
14. A extensão universitária como estratégia de formação na
graduação: a experiência do Projeto Caixa de Histórias
143
PINTO, M. P. P.
15. Cartografias femininas: a constituição de um grupo de mulheres
na zona noroeste de Santos
156
LIBERMAN, F.; MAXIMINO, V.; FRUTUOSO, M. F.; TEIXEIRA, B.
16. Terapia Ocupacional em equoterapia: uma proposta de disciplina
para o curso de Terapia Ocupacional do Centro Universitário
Franciscano-UNIFRA
169
PRESTES, D. B.; TONUS, D.
17. O perfil do egresso do curso de Terapia Ocupacional da
Universidade Presidente Antônio Carlos - Conselheiro Lafaiete-
MG
182
TREVISAN, E. R.; ALMEIDA, D. T. de.
18. O Programa de Educação pelo Trabalho para Saúde (PET-
SAÚDE) como facilitador para implementação de metodologias
ativas no curso de graduação em Terapia Ocupacional da
Universidade Federal do Paraná (UFPR)
195
SILVA, D. B.; CASTANHARO, R. C. T.; PEREIRA, R. A. B.; TOMASI, A.
R. P.
19. O Contribuição da mostra das profissões para o conhecimento
sobre Terapia Ocupacional para estudantes do ensino médio
208
SANTOS, M. P.; PAOLI, A. C. de, GUERRA, F. P.; SILVEIRA, I. F.;
OLIVEIRA, P. M. R.; SALLES, B. G.; VALADÃO, P. A. C. S.; ALMEIDA,
D. E. R. G.; PYLÓ, R. M.; REZENDE, M. B.; ALVES, W. L. T.; ARAÚJO,
N. C. G.
20. Contribuições das ações do PET-TO para a formação acadêmica
ampla em Terapia Ocupacional segundo a percepção do corpo
docente
219
BAPTISTA, A. K.; PAOLI, A. C. de, GUERRA, F. P.; SILVEIRA, I. F.;
SANTOS, M. P.; OLIVEIRA, P. M. R.; SALLES, B. G.; VALADÃO, P. A.
C. S.; COELHO, M. P.; SINGULANI, M. L. G.; ALMEIDA, D. E. R. G.;
ALCÂNTARA, P. M. L.; REZENDE, M. B.
21. Contribuições das ações do PET-TO para a ampla formação
acadêmica em Terapia Ocupacional segundo a percepção do
corpo discente
231
ALCANTARA, P. M. L.; BAPTISTA, A. K.; PAOLI, A. C. de; GUERRA,
F. P.; SILVEIRA, I. F.; SANTOS, M. P.; OLIVEIRA, P. M. R.; SALLES, B.
G.; VALADÃO, P. A. C. S.; PINTO-COELHO, M.; SINGULANI, M. L. G.;
ALMEIDA, D. E. R. G.; REZENDE, M. B.
22. Encontro de preceptores: educação continuada e extensiva 242
COSTA, S. L. da; MAXIMINO, V. S.
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OFICINA DE SENSIBILIZAÇÃO DE EDUCADORES PARA O
DESENVOLVIMENTO INCLUSIVO - ESTRATÉGIAS DESENVOLVIDAS
POR ACADÊMICOS DO CURSO DE TERAPIA OCUPACIONAL DA UNIFOR
CHRYSTIANE MARIA VERAS PORTO
1
MÉRCIA SANTIAGO RODRIGUES2
LÍVIA SOUZA DE OLIVEIRA3
RESUMO
Introdução: O desenvolvimento inclusivo e suas peculiaridades são inerentes ao
contexto educacional contemporâneo, devendo ser conhecido e vivenciado no cotidiano
do educador para maximizar as potencialidades da criança com deficiência e facilitar
sua aprendizagem. Objetivo: Analisar estratégias educativas aplicadas na mediação
terapêutica ocupacional junto aos educadores de uma escola inclusiva para facilitar o
desenvolvimento de crianças com deficiência auditiva e/ou motora. Metodologia: A
intervenção, realizada por acadêmicos da disciplina de Terapia Ocupacional aplicada às
Deficiências Sensoriais da UNIFOR ocorreu em uma escola do município de Fortaleza-
CE, historicamente especializada em educação de surdos, mas que, atualmente, também
recebe alunos ouvintes e com deficiência motora. Foram utilizadas estratégias
educativas em oficina realizada em maio de 2010 com sete educadoras, uma psicóloga e
um membro da diretoria da escola, mediante vivências orientadas por manual impresso,
apresentação de lâminas em Power Point, finalizando com análise da estratégia
mediante roda de conversa com os participantes. Resultados: Identificou-se a
importância da vivência na oficina e do manual para educadoras, psicóloga e gestora,
devido ao acesso delas as informações essenciais à dinâmica do contexto educacional,
viabilizando sua melhor qualificação mediante os desafios da inclusão escolar.
Conclusão: Constatou-se que as estratégias educativas aplicadas na oficina
possibilitaram às educadoras melhor compreensão acerca das habilidades de uma
criança com deficiência, bem como o reconhecimento de que é possível facilitar o seu
desenvolvimento mediante técnicas e recursos adequados. Verificou-se, ainda, que a
desinformação por parte da comunidade escolar pode de fato trazer consequências
negativas para o desenvolvimento inclusivo.
1 Prof.ª Ms. do Curso de Terapia Ocupacional da Universidade de Fortaleza - UNIFOR. [email protected] 2 Acadêmica do Curso de Terapia Ocupacional da Universidade de Fortaleza - UNIFOR 3 Acadêmica do Curso de Terapia Ocupacional da Universidade de Fortaleza - UNIFOR
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PALAVRAS-CHAVE: Terapia Ocupacional, Deficiência, Docentes, Educação
Infantil.
INTRODUÇÃO
A educação inclusiva é uma questão de direitos humanos e, portanto, tem sido um
assunto bastante discutido devido à sua importância para a sociedade, que deve levar em
consideração a diversidade, as diferenças particulares e as coletivas, sobretudo a
realidade social e o cotidiano, com vistas ao acesso igualitário e à participação social de
todos.
De acordo com a Declaração de Salamanca, escolas com orientação inclusiva “são os
meios mais eficazes para combater as atitudes discriminatórias, criar comunidades de
acolhida, construir uma sociedade inclusiva e conseguir uma educação para todos”
(UNESCO, 1994). Incluir não é apenas colocar junto, não é negar diferenças, mas
respeitá-las como constitutivas do ser humano.
É nessa perspectiva que o terapeuta ocupacional utiliza como instrumento de trabalho a
atividade humana, de acordo com os contextos ambientais e habilidades pessoais,
atuando nos eixos de formação clínico, educacional e social. Para tanto, utiliza
procedimentos específicos e adequados às necessidades e expectativas do cliente,
buscando métodos, abordagens, técnicas e atividades significativas.
A Terapia Ocupacional trabalha com o fazer humano, com o seu cotidiano, visando às
condições biopsicossociais e tendo como grande objetivo promover a qualidade de vida.
Consoante Munguba (2007), esta profissão aborda o desenvolvimento do ser humano, o
processo de aprendizagem e autonomia, tendo função determinante na sensibilização e
capacitação dos elementos envolvidos: família, escola e comunidade.
Para Hagedorn (2003), o terapeuta ocupacional na educação pode ser mais formal e
rapidamente identificável. Independente da situação, as necessidades de intervenção são
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direcionadas para auxiliar as pessoas a aprender o que é necessário para funcionar de
maneira competente.
A Terapia Ocupacional na educação atua favorecendo o processo de inclusão escolar,
identificando, avaliando e estimulando crianças com necessidades educacionais
especiais, contribuindo para o seu desenvolvimento e visando à instrumentalização do
aluno e da escola para uma ação pedagógica efetiva.
Vários métodos de instrução podem ser utilizados pelo terapeuta ocupacional para
facilitar a aprendizagem em escolas com orientação inclusiva. A estratégia educativa
selecionada neste estudo foi o manual impresso associado à oficina como uma
ferramenta de comunicação que pode ser acessada de acordo com a necessidade. Por ter
como método a escrita e a ilustração e uma vivencia a partir da autogênese do individuo
facilita a compreensão do público alvo.
O manual contém informações e esclarecimentos para os educadores de uma escola
inclusiva quanto aos cuidados com o desenvolvimento infantil na educação de modo a
auxiliarem essas crianças em suas necessidades, no desenvolvimento de suas
capacidades e maturação de suas habilidades.
É importante que os educadores conheçam as fases de desenvolvimento infantil para
que possam acompanhar o crescimento da criança. Mais importante ainda é saber que
cada criança é um ser único, tendo ela seu próprio ritmo de desenvolvimento, ou seja, o
que para uns é rápido, para outros nem tanto.
O desenvolvimento motor das mãos revela infindáveis segredos em suas formas e
gestos, pois com elas se constroem as experiências de ação no mundo: um aperto de
mão, um desenho, um bordado, uma brincadeira. As mãos captam do mundo diferentes
temperaturas, texturas e sentimentos, além de proporcionarem o resgate da sensibilidade
humana.
Não se seguram todos os objetos da mesma maneira, então quem determina o tipo de
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preensão adequada para ser usada com segurança é o objeto. Têm-se como tipos de
preensão a dígito-palmar, a preensão em gancho, preensão em pinça, pinça bidigital
curta, pinça com hiperextensão da falangeta do indicador, pinça tridígito-polpar, pinça
em circulo, pinça bidigital longa, pinça entre o polegar em oposição e os dedos longos
em extensão, Pinça em flexo-adução do polegar, pinça digito-lateral (PEDRETTI,
2004).
O desenvolvimento das atividades pré-gráficas tem por finalidade a preparação para as
tarefas gráficas escolares, visando dar para a criança força muscular e flexibilidade
articular necessárias aos diferentes movimentos da escrita. Isso ocorre antes de a criança
pegar no lápis: trabalha-se cada articulação do membro superior: articulação do ombro,
punho e dedos (MEUR; STAES, 1991).
O desenvolvimento das atividades gráficas tem por intuito a preparação para as tarefas
escolares e mais particularmente para a escrita e a leitura. Anterior à leitura e à escrita
situa-se a linguagem gráfica, que é uma forma de comunicação expressiva. De início a
criança desenha pelo prazer de desenhar, realizam traços e riscos, verdadeiras garatujas
que ninguém entende.
Essas garatujas iniciais são longitudinais e os traços bem desordenados. À medida que
vai havendo um maior amadurecimento visomotor, as garatujas se tornam mais
arredondadas, espiraladas. Por último, surgem as bolinhas. Ela não acalca mais o lápis a
ponto de rasgar o papel, ou desenha tão clarinho que não se enxerga, mas passa a
adquirir um maior controle da tonicidade de seus músculos e dos instrumentos que
utiliza como o lápis, a borracha e a tinta (MEUR; STAES, 1991).
Para Piaget (1975) a fase da brincadeira e a escolha dos brinquedos pelas crianças é
decomposta em períodos: sensório-motor (de 0 a 2 anos), pré-operatório (de 2 a 4 anos),
intuitivo (de 4 a 7 anos) e operatório concreto (de 7 a 12 anos).
Os professores podem „orientar‟ o desenvolvimento infantil (e inclusivo)
proporcionando às crianças os materiais apropriados. Todavia, o essencial para que uma
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criança entenda é que ela mesma construa e reinvente. Cada vez que se ensina algo a
uma criança se está impedindo que ela descubra por si mesma. Por outro lado, aquilo
que permitimos que descubra por si mesma permanecerá com ela (PIAGET, 1975).
Com base nessas considerações, o presente estudo objetivou analisar estratégias
educativas na mediação terapêutica ocupacional junto aos educadores de uma escola
inclusiva para facilitar o desenvolvimento de crianças com deficiência auditiva e/ou
motora.
MATERIAL E MÉTODOS
O estudo de campo, com abordagem qualitativa busca entender um fenômeno específico
em profundidade, em que o pesquisador é um intérprete da realidade, preocupando-se
com um nível de realidade que não pode ser quantificado (BRADLEY, 1993;
MINAYO, 1994). A pesquisa de campo para este estudo foi do tipo exploratória e
intervencionista (MARCONI; LAKATOS, 2002).
A coleta de informações ocorreu em maio de 2010, durante atividade prática da
disciplina de graduação denominada Terapia Ocupacional nas Deficiências Sensoriais
da UNIFOR, mediante a realização de uma oficina junto a educadores, apoiada em
manual impresso elaborado pelos acadêmicos, além de apresentação em Power Point
com recurso audiovisual e vivência em: desenvolvimento motor global,
desenvolvimento motor da mão, atividades pré-gráficas, atividades gráficas e
elaboração e utilização de brinquedos com sucata.
As técnicas para coleta de informações utilizadas no estudo foram a observação
participante e a roda de conversa, com apoio de máquina fotográfica e manual impresso
previamente produzido por acadêmicos da disciplina e apresentado ao grupo durante a
oficina.
O local da pesquisa foi uma escola localizada no município de Fortaleza-CE,
historicamente especializada em educação de surdos, mas que atualmente recebe alunos
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ouvintes e com deficiência motora.
Participaram do estudo 7 professoras da educação infantil e ensino fundamental
selecionadas pela própria diretoria da escola, 1 psicóloga e 1 gestora.
A pesquisa configurou-se nas seguintes etapas:
1º etapa: Identificação do público alvo;
2º etapa: Planejamento da oficina e construção do manual;
3º etapa: Realização da oficina junto aos educadores e gestores;
4º etapa: Realização da roda de conversa com participantes para a avaliação das
estratégias aplicadas.
Os resultados das informações foram descritos com apoio na literatura. E o estudo
adotou os princípios éticos preconizados pela Resolução de nº. 196/96 do Conselho
Nacional de Saúde/Ministério da Saúde, que regulamenta pesquisas envolvendo seres
humanos (CNS, 1996).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Considerando os desafios postos no contexto escolar inclusivo, educadores e gestores da
escola e acadêmicas do curso de Terapia Ocupacional planejaram e realizaram uma
oficina com estratégias educativas para a sensibilização de educadores acerca do
desenvolvimento inclusivo.
Segundo Cavalcanti (2007), dada participação direta em experiência é possível afirmar
que o terapeuta ocupacional contribui significativamente com pessoas que possuem
necessidades especiais.
Na escola, o terapeuta ocupacional utiliza o enfoque de promoção da saúde,
fortalecendo o entendimento dos profissionais quanto ao desenvolvimento inclusivo.
Para Hagedorn (2003), o terapeuta ocupacional na educação pode ser mais formal e
rapidamente identificável. Independente da situação, as necessidades de intervenção são
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direcionadas para auxiliar as pessoas a aprender o que é necessário para funcionar de
maneira competente.
Na oficina realizada, inicialmente, abordou-se o desenvolvimento motor global com a
apresentação das etapas que o compõem, bem como se oportunizou a vivência de
algumas delas pelos educadores.
Após a explicação todas as professoras foram convidadas a ficar próximas a um
colchonete e seguirem as instruções que iriam ser passadas. No início houve rejeição
por partes das professoras, tendo em vista não conseguirem fazer tais posições.
Primeiramente elas necessitariam ficar na posição fetal, passando para a posição
sentada, logo após para a posição de quatro, apoio de joelho e depois para a posição de
pé, vivenciando, assim, todas as posições de uma criança de 0 até 1 ano de vida.
Após essa experiência, as professoras vivenciaram os padrões posturais e motores da
criança de 2 a 7 anos. Destarte, vivenciaram subir e descer degraus com o apoio dos
dois pés, para 2 anos; para a vivência de 3 a 4 anos chutaram bolas grandes,
caminharam e andaram na ponta dos pés; de 5 a 6 anos vivenciaram pular e girar com
um pé só e para 7 anos inclinaram-se tocando o solo com as mãos.
Em seguida, enfocou-se o desenvolvimento motor da mão, assunto de grande relevância
por se tratar de uma escola para pessoas com surdez que utilizam a LIBRAS-Língua
Brasileira de Sinais no processo de ensino e aprendizagem. Foi enfatizada a importância
da mão para a comunicação do sujeito surdo.
Posteriormente, professoras, psicóloga e diretora foram convidadas a preparar uma
adaptação em material etil vinil acetato (E.V.A) para lápis, indicada para individuo que
não tem a preensão tridigital adequada por algum problema motor ou atraso no seu
desenvolvimento. Após a confecção da adaptação, os participantes tiveram a
oportunidade de experimentá-la realizando atividades gráficas.
Em seguida, foram apresentadas as atividades pré-gráficas que antecedem às atividades
gráficas na pré-escola, destacando a importância do fortalecimento da musculatura das
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articulações do membro superior, bem como o conhecimento do desenvolvimento motor
no sentido proximal a distal.
Durante essa vivência, professoras, psicóloga e diretora apresentaram alguma rejeição
por ser necessário o uso de tinta e jaleco descartável. Foi iniciada com a colagem de
uma folha de papel Canson nas paredes da sala e cada participante posicionado à frente
aguardando o comando verbal.
A vivência teve início com a ponta do dedo na folha com um pouco de tinta fazendo
movimentos amplos e circulares no sentido horário com ambos os braços sem
ultrapassar a folha. Ao término desse movimento todas tiveram que fazer o mesmo
movimento com ambos os cotovelos e punhos. Para os dedos, os exercícios foram
adução e abdução com cola entre os dedos para ter uma força oposta. Para vivenciar a
pinça fina esperou-se a cola secar na palma da mão para que fosse retirada com a ponta
dos dedos.
Já nas atividades gráficas foram comentadas as formas de desenhos das crianças que
podem ter vários significados. A princípio todas ficaram bastante entusiasmadas, pois
começavam a entender a experiência em sala de aula e a partir daí vivenciar o traçado
horizontal, vertical, caracol e ondas, podendo perceber a importância disso tudo para
uma melhor proposta pedagógica.
Na última sessão da oficina, abordou-se a escolha de brinquedos apropriados para cada
fase, associando-a com as etapas do desenvolvimento propostas por Piaget (1975).
Nesse momento todas tiveram que ficar em dupla para a criação de um brinquedo feito
com material reciclável. Construíram um “vai-e-vem” a partir de garrafas pet. Quando
finalizaram a confecção do brinquedo, iniciaram uma brincadeira coletiva com eles.
Durante a finalização da oficina com a roda de conversa, houve uma narrativa de
destaque para a importância das vivências de acordo com os temas abordados e as
emoções sentidas durante cada atividade.
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Observou-se a importância da mediação do terapeuta ocupacional na fase pré-escolar e
escolar, pois esta deve ser compreendida em todos os âmbitos escolares, como os
aspectos físicos, cognitivos e sensoriais.
O terapeuta ocupacional pode desenvolver uma proposta de intervenção interdisciplinar
com educadores, fazendo o uso de abordagens necessárias para uma melhor
estruturação do desenvolvimento infantil e, juntamente com outros profissionais,
promover uma proposta inclusiva no contexto educacional.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As estratégias inclusivas são determinantes para a eficácia de um programa de educação
inclusiva. E a participação do terapeuta ocupacional no campo educacional pode
facilitar o acesso e a participação social da pessoa com necessidades educacionais
especiais numa perspectiva de promoção da saúde, baseada na abordagem grupal.
Percebe-se, ainda, a importância do trabalho interdisciplinar no contexto educacional
para que todos – educadores, psicólogos, terapeutas ocupacionais, assistentes sociais e
gestores – possam ser agentes transformadores de uma realidade social.
Há entre os profissionais um senso de compromisso, mas com consciência dos desafios
que ainda se interpõem no cotidiano da escola.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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pediátrica. São Paulo: Santos livraria, 2002.
MARCONI, M.A.; LAKATOS, E.M. Técnicas de pesquisa: planejamento e execução
de pesquisa, amostragens e técnicas de pesquisa, elaboração, análise e interpretação
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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MEUR, A.; STAES, L. Psicomotricidade. São Paulo: Manole, 1991.
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NICOLA, M. Psicomotricidade: manual básico. Rio de Janeiro: Revinter, 2004.
PEDRETTI, L.W.; EARLY, M.B. Terapia ocupacional: capacidade práticas para as
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PIAGET, J. A formação do símbolo na criança: imitação, jogo e sonho, imagem e
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1994.
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ESTÁGIO PROFISSIONAL EM CONTEXTO HOSPITALAR:
RELATO DE EXPERIÊNCIA
CRISTINA YOSHIE TOYODA
1 ANDRÉA RIZZO DOS SANTOS BOETTGER GIARDINETTO2
RESUMO
Os alunos do 4º ano de TO realizam estágio em dois hospitais universitários: um com
pacientes adultos e idosos pós-AVE, em fase aguda; outro que atende bebês prematuros,
crianças e adolescentes acometidos por diversas patologias. Apesar do aporte teórico
recebido, os alunos mostram dificuldades e dúvidas quanto aos procedimentos que
deverão adotar para atender a demanda hospitalar. Nos dois estágios onde a situação dos
pacientes se mostra crítica, os alunos aprendem a lidar com: doenças e patologias que
oferecem risco de contágio; pacientes terminais e a iminência da morte; manipulação
dos pacientes no leito e na UTI Neo com sondas, tubos de oxigênio, além de aparelhos
que monitoram os sinais vitais; restrição de horário dos atendimentos aos pacientes
adultos e idosos, pois os procedimentos de higiene e de atenção hospitalar são
prioridade no local; utilização de poucas atividades terapêuticas, aos pacientes adultos e
idosos, pois o paciente está muitas vezes sedado ou com dificuldade em responder ao
solicitado; desenvolvimento de atividades que priorizam amenizar o estresse hospitalar
ao paciente e seus familiares, promovendo seu bem-estar e qualidade de vida; pacientes
em situações de internação breve ou prolongada; orientação aos familiares e
acompanhantes para esclarecer a situação do paciente durante a permanência hospitalar
e pós-alta; importância do TO na equipe, pelas ações efetivas que demonstram o papel
do profissional em contexto hospitalar. As avaliações dos alunos pós-estágios
hospitalares revelam eles permitem um crescimento pessoal e profissional, com
prevalência deste último fator pelas atividades desenvolvidas e aprendizado
consolidado.
PALAVRAS-CHAVE: Supervisão, Contexto Hospitalar, Estágio Profissional em TO.
1 Prof.ª Dr.ª do Departamento de Terapia Ocupacional da Universidade Estadual Paulista – UNESP
Campus de Marília. [email protected] 2 Prof.ª Dr.ª do Departamento de Terapia Ocupacional da Universidade Estadual Paulista – UNESP
Campus de Marília.
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INTRODUÇÃO
Uma das características importantes da formação do profissional de Terapia
Ocupacional é a realização da chamada prática que, em geral, ocorre no último ano do
Curso de Graduação. O Estágio Profissional, como é denominada a prática, se constitui
da prática clínica e também em locais como creches, escolas inclusivas, LA (Liberdade
Assistida). No Curso de Graduação em Terapia Ocupacional da UNESP Campus de
Marília, os Estágios ocorrem em diferentes locais: PSF Cavalari e PSF Parque dos Ipês,
Hospital Espírita de Marília, CAPS, Hospital Materno Infantil (HMI), Hospital
Universitário da UNIMAR (HU), Asilo, Cerest/ASTI, Santa Casa e CEES, com uma
carga horária média de 12 horas/semanais por local de estágio. A cada 7 semanas o
aluno faz câmbio dos locais, percorrendo ao longo do ano as 11 instituições que
oferecem estágio.
No momento do estágio é pressuposto pelo docente-supervisor que o aluno já tem um
conhecimento prévio de atendimento nos dois semestres que antecedem o estágio e pelo
aprendizado teórico recebido. No entanto, observa-se, na maior parte das vezes, que o
aluno encontra dificuldades em realizar o estágio por uma série de dúvidas e
insegurança que afloram no momento da atuação. O desafio maior é atender a clientela
ou paciente adequadamente:
Claro está que deve haver uma diferença em relação ao conhecimento teórico, intelectual, adquirido pelo profissional através do estudo o
que não significa, que, de posse desse saber, aquele possa dar conta
de tudo o que se refere a este, e talvez, exatamente por não poder fazer isso, por sentir-se incompetente apesar de seu “saber”
(insuficiente) só intelectual. (AKASHI, 2000, p.44)
A autora citada mostra que para se construir como terapeuta ocupacional o aluno traz
uma série de questões profissionais, pessoais e sociais que interferem no processo de
ensino-aprendizagem, particularmente para a futura formação, no momento do estágio.
E a supervisão de estágio na área de contexto hospitalar mostra que os alunos
necessitam de orientação e direcionamento para técnicas específicas de atendimento ao
paciente hospitalizado, tanto no que se diz respeito à escrita (relatórios técnicos, com
uso de terminologia apropriada), quanto para o desempenho enquanto futuro
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profissional, ou seja, os estagiários não têm capacidade para conciliar o corpo de
conhecimento teórico com a prática que iniciam principalmente no que se refere a
manejos específicos, tais como órteses e adaptações de materiais para os pacientes,
posicionamento do paciente no leito ou na incubadora, orientação para cuidadores
(mães, esposas, irmãos, acompanhantes do paciente acamado), bem como identificação
das necessidades mais imediatas do paciente e compartilhamento dos conhecimentos
com os outros profissionais da equipe, particularmente com os alunos do curso de
Medicina e de Enfermagem, que fazem intervenções no mesmo local.
A especificidade da área e a exiguidade temporal tornam o estágio em contexto
hospitalar um desafio no momento de se decidir o que oferecer para o estudante do
último ano. Como bem pontua MacKinnon (1987), a prática avançada da Terapia
Ocupacional envolve a identificação sistemática dos problemas dos pacientes e o
estabelecimento de planos para intervenção, com a finalidade de efetivas mudanças. No
caso dos estagiários, as barreiras principais se encontram na falta de percepção das
demandas hospitalares, nas restrições do espaço físico e nas limitações impostas pela
doença, particularmente com pacientes em estado crítico.
Nos dois estágios onde a situação dos pacientes se mostra crítica, os alunos aprendem a
lidar com: doenças e patologias que oferecem risco de contágio; pacientes terminais e a
iminência da morte; manipulação dos pacientes no leito e na UTI Neonatal com sondas,
tubos de oxigênio, aparelhos que monitoram os sinais vitais; restrição de horário dos
atendimentos aos pacientes adultos e idosos, pois os procedimentos de higiene e de
atenção hospitalar são prioridade no local; utilização de poucas atividades terapêuticas
para os pacientes adultos e idosos, pois eles estão muitas vezes sedados ou com
dificuldade em responder ao solicitado; desenvolvimento de atividades que priorizam
amenizar o estresse hospitalar ao paciente e seus familiares, promovendo o seu bem-
estar e qualidade de vida; pacientes em situações de internação breve ou prolongada;
orientação aos familiares e acompanhantes para esclarecer a situação do paciente
durante a permanência hospitalar e pós-alta; importância do TO na equipe, pelas ações
efetivas que demonstram o papel do profissional em contexto hospitalar
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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Os dois locais de estágio têm como característica comum a demanda de pacientes
internados por estarem com problemas graves de saúde ou por serem prematuros.
Infecções do trato urinário, do trato respiratório por pneumonia, gripe, doenças
pulmonares obstrutivas decorrentes do tabagismo, etilismo, anemia por carência
nutricional ou por problemas oncológicos constituem as principais causas da
permanência do paciente adulto/idoso, bem como pós-acidente vascular encefálico. No
caso do HMI as internações na enfermaria pediátrica decorrem de doenças respiratórias,
que vão desde bronquiolite até pneumonia, doenças infecto-contagiosas, doenças
oncológicas e hematológicas, problemas ortopédicos, cirurgias variadas, queimaduras,
abuso infantil dentre outros; na UTI Neo e na UCI (Unidade de Cuidados
Intermediários), ficam os bebês prematuros acometidos por diversas patologias
decorrentes da própria prematuridade.
A revisão de literatura constitui-se outro eixo norteador do estágio (Hahn, 1990), pois é
o momento em que o aluno se defronta com os portadores de patologias e constata que,
apesar de ter tido teoria, esta ainda não lhe fornece embasamento suficiente para
compreender e manejar toda a problemática apresentada pelo paciente, com a devida
eficiência. Tal constatação é importantíssima, pois o estagiário irá aprofundar a leitura
de textos ou ver com outros olhos o referencial teórico que lhe é oferecido. A
oportunidade de discutir com o supervisor e com colegas o conteúdo de um seminário
constitui um momento especial na formação do aluno porque se observa que o caso
estudado apresenta correlação com os aportes teóricos, razão para a associação teoria-
prática tão necessária para a prática reflexiva da Terapia Ocupacional.
Outro aspecto que deve ser destacado é o local de estágio, pois este aproxima o aluno da
realidade da profissão, por meio da instituição onde se realiza a prática, com as
qualidades e limitações. As qualidades do local de estágio compreendem desde a
variedade de patologias, atendimento multiprofissional, manejo técnico específico,
como no caso de UTI Neo, até contato com profissionais variados, com profissionais da
área da saúde e profissionais administrativos. No caso das limitações, há falta de espaço
próprio, falta de local para atendimentos específicos ou especiais, uma vez que no
hospital não há espaço para um paciente apenas, mas a convivência de dois pacientes
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
138
num quarto, o que pode ser problema, por exemplo, para um atendimento terapêutico
ocupacional voltado para as demandas de pacientes pós-AVE. O paciente que está no
mesmo quarto com outra patologia não entende por que não pode receber as mesmas
atenções que seu companheiro/companheira. Por vezes torna-se necessário explicitar ao
acompanhante que o atendimento é específico e por isso seu familiar não necessita de
TO. Já no atendimento pediátrico, muitas vezes para aquela criança que não pode sair
do leito, o companheiro de quarto é muito importante, principalmente para a realização
de atividades interativas, com trocas de experiências e exteriorização de sentimentos.
Segundo Motta e Enumo (2004), a maioria das crianças hospitalizadas gosta de brincar
com as próprias crianças que frequentam o hospital. Na maioria das vezes os estagiários
são orientados a retirar dos leitos as crianças que podem sair, para realizar as atividades
em outro local dentro da enfermaria. Nesse momento, observa-se certa imaturidade por
parte dos estagiários quanto à interação com a equipe, pois ficam receosos em solicitar
informações sobre o paciente, dependendo da orientação da supervisora muitas vezes.
Outro problema é quanto aos horários restritos de atendimento aos pacientes adultos e
idosos, pois os procedimentos de higiene e de atenção hospitalar são prioridade no local.
Não ter uma sala para escrever relatórios, discutir casos ou guardar materiais se
constitui em outra dificuldade para o estágio de Neurologia adulto/idoso, pois tanto os
estagiários quanto o supervisor necessitam permanecer no saguão do andar, no aguardo
da liberação dos pacientes acamados. Essa falta de privacidade não constitui empecilho
para atendimento, mas dificulta a confecção de órteses, adaptações ou outros recursos
terapêutico-ocupacionais que são uma das tônicas do atendimento a pacientes adultos.
Essa falta de um espaço próprio também ocorre no estágio realizado no HMI, como no
HU. Também não se constitui em empecilho para os atendimentos, mas atrapalha a
dinâmica das discussões e muitas vezes algumas atividades grupais, principalmente com
os acompanhantes das crianças hospitalizadas.
Por não se ter um espaço próprio para as atividades grupais, principalmente para os
grupos de mães, muitas vezes ocorrem certos tumultos dentro da sala de atendimento,
por falta de espaço. A falta de espaço também acaba limitando a participação de todos
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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que querem realizar as atividades, pois fica praticamente impossível colocar dentro da
sala (classe hospitalar – espaço usado para a realização dos grupos) mais de seis adultos,
isso sem contar muitas vezes com a entrada das crianças e membros da equipe. Nesse
sentido, para o aluno, os objetivos propostos por ele para aquele grupo acabam, muitas
vezes, ficando confusos e a aprendizagem prejudicada.
Outra dificuldade imposta pelo local é quanto ao posicionamento no leito: no pós-AVE
é fundamental que o paciente seja posicionado de modo adequado para não ter
limitações funcionais ou mesmo úlceras de pressão. No caso dos pacientes adultos o
leito padrão, com tamanho e capacidade de inclinação reduzidos, não permite realizar as
mudanças de decúbito necessárias, tampouco alterar o mobiliário para estimular o lado
hemiplégico, pois os acessórios hospitalares (tubos de sonda, ponto para colocação de
máscara de oxigênio são fixos) restringem a estimulação, tão necessária para
atendimento nos primeiros momentos pós-AVE. Para os bebês internados na
enfermaria, o posicionamento também é prejudicado, muitas vezes limitando sua
movimentação e desenvolvimento motor. Por terem que ficar seguros, para não
escorregar e cair do leito, apesar da grade dos berços, eles são privados de
movimentação e, dependendo do tempo de internação, podem apresentar atrasos no
desenvolvimento, grande irritação e desconforto com choro intenso. Nesse sentido, os
estagiários são orientados a tirar os bebês dessa posição para lhes dar liberdade,
estímulos e lhes permitir um desenvolvimento saudável nos momentos possíveis.
Outro aspecto a ser destacado é a confecção de órteses em gesso, em local fora do
hospital. Há uma demanda em realizar a medidas no paciente, moldar e modelar em
outra pessoa com biotipo aproximado e adaptar ao tamanho do paciente. Por vezes,
enquanto a órtese está sendo confeccionada, o paciente recebe alta hospitalar. Tal fato
torna necessária a vinda de um familiar para levar a órtese para a residência do paciente.
Uma visita domiciliar também auxilia a averiguar se a órtese está adequada, se o uso
está de acordo com as prescrições feitas e se o paciente está com ganhos funcionais.
Como outro eixo norteador da disciplina, optou-se por ensino de órteses em gesso, dos
principais modelos para adultos pós-AVE como forma de oferecer suporte técnico aos
estagiários. A moldagem e modelagem da órtese em gesso ocorrem semanalmente e
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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visam oferecer recursos terapêuticos e suporte específico para o aluno.
Com as confecções destinadas aos pacientes, os alunos aprendem a valorizar as
prescrições corretas e o modo de adequá-las à deficiência e/ou disfunção para uma
situação de funcionalidade e facilidade no desempenho de tarefas da vida diária. As
órteses são confeccionadas em gesso, pois o material termo-moldável é muito oneroso.
Outra demanda que o aluno traz é quanto ao posicionamento no leito. As vivências do
aluno com esse problema têm o objetivo de oferecer a ele suporte teórico-prático para as
demandas do estágio.
No atendimento com adultos pós-AVE são realizados controles de edema por meio de
malha elástica e mais algodão. O edema consegue ser reduzido ou mesmo controlado
após uma hora de uso. A compressão é suave e feita com todos os cuidados porque pode
ser o membro superior direito que está sendo controlado. Esse controle é feito também
por meio de movimentação passiva que antecede o uso da malha elástica.
Uma peculiaridade do atendimento hospitalar é a pouca utilização de atividades pelos
pacientes porque a demanda é para a recuperação dos casos graves: o controle é
rigoroso, muitos estão com infecções bacterianas ou virais e por isso a movimentação
passiva é realizada com luvas de procedimento, respeitando os limites articulares e a dor
do paciente. As movimentações suaves constituem um dos focos do atendimento. No
HMI, aos alunos estagiários de qualquer curso não é permitida a manipulação de
crianças e bebês que estejam em isolamento ou com precaução de contato, para não
haver perigo de contágio. Assim, em determinados períodos, os atendimentos são
reduzidos devido a situações de surtos de doença infecto-contagiosa. Outro aspecto do
atendimento hospitalar é a lavagem constante das mãos e a higienização dos materiais e
brinquedos utilizados. Os estagiários são sempre orientados a lavar muito as mãos entre
um atendimento e outro, principalmente dentro da UTI Neo, para evitar as infecções
cruzadas. A limpeza dos materiais e brinquedos também é muito controlada e cada
material é higienizado com álcool a 70% após serem utilizados. Já os materiais
utilizados dentro da UTI Neo e da UCI são sempre descartáveis.
Ainda quanto às atividades, pacientes com memória e cognição preservadas, com
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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capacidade de elaborar respostas adequadas receberam orientação para realização das
atividades básicas e atividades instrumentais da vida diária, bem como o seu
acompanhante. Esses pacientes foram objeto de atenção e cuidados por estarem
disponíveis para mudanças e orientação. Além desses cuidados foram introduzidos os
fatores de risco do AVE, na forma de um folder explicativo. Cada tema foi
desenvolvido com utilização de linguagem simples, evitando a terminologia técnica.
No estágio pós-AVE muitos pacientes têm infecção do trato urinário, do sistema
respiratório, por vezes com quadro agudo e permanecem por curto tempo internados.
Outros não resistem e falecem. A questão da morte e do morrer é abordada no momento
com o aluno que fica extremamente sensibilizado com a perda de seu paciente. Essa
questão da morte e do morrer também perpassa pelos estagiários no HMI,
principalmente com os pacientes da oncologia e com os bebês prematuros. Atender o
paciente em um dia e não saber se ele estará no hospital no outro dia se constitui grande
dificuldade para os estagiários, isso sem contar quando eles presenciam o sofrimento
intenso e a morte das crianças hospitalizadas e precisam dar suporte a suas famílias. A
supervisão para esses estagiários vai além de questões acadêmicas, ela também os
auxilia nas questões emocionais, levando-os a um autoconhecimento e compreensão de
seus limites, preparando-os para enfrentar problemas reais e achar soluções imediatas.
A supervisão geralmente tem duração de 1 hora e nela são realizados: seminários,
confecção de órtese, discussão de casos e discussão de atividades. O aluno recebe um
feedback do seu desempenho que é averiguado pela leitura do rascunho do relatório e
pela forma que conduziu o atendimento. Os atendimentos aos adultos e idosos são feitos
em duplas para facilitar a aprendizagem e reduzir as dificuldades apresentadas quanto à
insegurança, ansiedade e medo diante dos pacientes com tubos, sondas, dificuldades
respiratórias, afasia, transtornos de memória, dificuldades emocionais dos
acompanhantes diante do sofrimento de seu parente. Os atendimentos dos estagiários às
crianças e aos bebês se iniciam em dupla e depois se tornam individuais, com cada
estagiário ficando responsável pela intervenção no seu paciente. As atividades grupais,
grupo de mães da enfermaria e grupo de mães da UTI Neo são sempre realizadas em
duplas para facilitar a condução da dinâmica do grupo e para diminuir situações de
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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stress e nervosismo dos alunos.
RESULTADOS
São visíveis as mudanças no comportamento dos estagiários após duas semanas. Eles
conseguem atuar com segurança ao realizar a anamnese; ao observar o comportamento
dos pacientes e identificar suas necessidades e interesses; ao realizar a avaliação
física/funcional, a avaliação dos comportamentos dos bebês prematuros e identificar os
sinais para verificar se o estímulo está sendo benéfico ou não; ao averiguar a
necessidade de órtese ou alguma adaptação para execução das AVDs. Os alunos
impõem sua presença ao explicitar as razões dos procedimentos para o acompanhante.
Também as intervenções se tornam mais elaboradas, com propostas diferentes para cada
paciente. A mudança de visão dos alunos quanto ao modo de atuação da Terapia
Ocupacional na área de disfunção física e na pediatria em contexto hospitalar talvez se
deva ao fato de a supervisão enfatizar os aspectos afetivos envolvidos nas patologias ou
deficiências. Ao permitir também que o estagiário seja um agente ativo no processo de
aprendizagem, com a valorização do conteúdo que traz na atuação, e um agente ativo no
processo de ensino e aprendizagem, a supervisão possibilita que seu desempenho se
direcione para as reais necessidades do pacientes.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AKASHI, L.T. Construindo-se como terapeuta ocupacional. Cadernos de Terapia
Ocupacional UFSCar, v.8, n.1, p.38-47, 2000.
HAHN, M.S. Educação continuada – o processo de supervisão em psiquiatria do aluno
ou profissional. Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, v.1, p.50-65, 1990.
MAcKINNON, J.R. National perspective – educating for the future. Canadian Journal
of Occupational Therapy, v.54, n. 4, p.161-164, 1987.
MOTTA, A. B.; ENUMO, S. R. F. Brincar no hospital: estratégia de enfrentamento da
hospitalização infantil. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 9, n. 1, p. 19-28, 2004.
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FORMAR TERAPEUTAS OCUPACIONAIS: DESCOBRIR PARA CONHECER
DANI LAURA PERUZZOLO1
ARTEMIS BARBOSA PACHECO2
RESUMO
A formação de Terapeutas Ocupacionais implica a transmissão de conhecimentos
específicos, mas exige também a construção da descoberta do aluno sobre si. Duas
tarefas que dificilmente se interligam. Porém, se defendemos que um dos eixos do
tratamento é a possibilidade de um sujeito construir recursos pessoais para superar
obstáculos que dificultam seu cotidiano, é preciso que o Terapeuta Ocupacional, durante
sua formação, conheça e experimente seus recursos pessoais. Confrontar-se com seu
processo de construção de conhecimento é um bom caminho. Para isso é necessário que
o docente instigue o aluno a descobrir maneiras ativas de produzir conhecimento sobre
o outro, mas principalmente sobre si, mesmo não sendo tarefa fácil, pois os obstáculos
que bloqueiam a produção de conhecimento podem ser da ordem social, cultural, e
também inconsciente. Partindo dessa premissa, temos construído outro fluxo para
produção de conhecimento: primeiro conhecemos os sujeitos, depois vamos estudá-los
e, posteriormente, estudar suas patologias. O fio condutor de disciplinas, como as de
desenvolvimento e tratamento infantil, é construído a partir das descobertas dos alunos
na convivência com crianças em espaços sociais. A aula se dá no convívio com crianças
em suas escolas e clínicas e a transmissão de conteúdos é construída a partir dos
interrogantes dos alunos sobre as ações das crianças, das famílias, dos terapeutas e sobre
as angústias pessoais produzidas a partir das relações que se armam entre eles. Esse
encontro intelectual e afetivo tem oferecido ao aluno a oportunidade de compreender a
si e, a partir daí, colocar-se como Terapeuta Ocupacional.
PALAVRAS-CHAVE: Terapia Ocupacional, Ensino, Docente.
A formação do estudante de Terapia Ocupacional tem sido tema recorrente nas
discussões tanto na preparação quanto nas avaliações das disciplinas que
1 Prof.ª Ms. do Curso de Terapia Ocupacional do Centro Universitário Metodista do Instituto Porto Alegre
da Igreja Metodista - IPA. 2 Prof.ª Ms. do Curso de Terapia Ocupacional do Centro Universitário Metodista do Instituto Porto Alegre
da Igreja Metodista - IPA.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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administramos. Preocupamos-nos com uma possível transmissão de conhecimento que
remete o aluno à condição de ouvinte e que estimule nele simplesmente a capacidade de
memorização e não de interpretação. Didáticas antigas ainda são utilizadas por alguns
que acreditam que o necessário para sermos bons profissionais é dominarmos o
conteúdo, conhecermos a patologia, é sabermos o que o paciente necessita. Na
perspectiva de romper com essa metodologia, temos buscado recursos para a construção
de conhecimento do aluno a partir da oferta de experiências com os sujeitos estudados
desde o início da formação. É sobre isso que trataremos nestes escritos.
Compreendemos que existem conhecimentos específicos que precisam ser apresentados
e que o aluno necessita dominar para exercer com eficiência nossa profissão. Porém,
defendemos que não existe conhecimento transmitido que seja absorvido
suficientemente se o sujeito não está disposto a adquiri-lo a fim de transformar sua
própria compreensão sobre si e sobre o mundo. A respeito dessa relação sujeito/mundo,
McLaren (2001), apud Peruzzolo (2003), diz que o “sujeito se conhece na relação com o
mundo e se reconhece na relação com o objeto” (p. 49), ou seja, compreendendo o
mundo poderá compreender-se nele.
Existem, durante a formação, conteúdos que exigem uma transmissão de conhecimento,
mas deve existir também a construção da descoberta do aluno sobre si e sobre o outro
(seu paciente). Mais complexo ainda, a formação de Terapeutas Ocupacionais exige a
experiência de armar uma relação dialética, na perspectiva de que o saber do paciente
transforme o saber do terapeuta e vice-versa. Pensamos um aluno como um sujeito que
“sempre pode estar se transformando enquanto participa do trabalho de construir com
outros os saberes das culturas de seu mundo social” (BRANDÃO, 2002, p. 92).
É possível compreender que estamos falando da formação de um Terapeuta
Ocupacional cuja visão sobre o terapêutico está na possibilidade de o sujeito (paciente)
construir recursos pessoais para superar os obstáculos que dificultam seu cotidiano.
Obstáculos estes que podem ser de ordem motora, cognitiva, psíquica, mas que também
podem ser de ordem cultural, social, política, econômica etc.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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Se somos, então, terapeutas que ajudam o sujeito a construir ou reconstruir seu dia-a-dia
a partir da compreensão de seu potencial, mas também a partir de uma interpretação
sobre o mundo, como diz Santos (1997, p.15) “somente a História nos instrui sobre o
significado das coisas. Mas é preciso sempre reconstruí-la, para incorporar novas
realidades e novas idéias”, é preciso que o Terapeuta Ocupacional, durante sua
formação, conheça seus recursos pessoais e experimente-os como instrumentos para a
transformação do mundo ao seu redor.
Com essa visão, encontrávamos eco nas discussões propostas por Medeiros (2003) na
defesa da formação do profissional “para uma atuação crítica e criativa” (p. 155). Ela
diz que “o processo de formação deveria estimular a capacidade de refletir, de
sensibilizar-se com o mundo circundante e de criar” (p. 156).
Passamos a apostar que o espaço acadêmico, envolvendo a relação entre docentes e
discentes, a relação entre discentes, entre os conteúdos disponibilizados, entre colegas
de outros cursos, mas, principalmente, a relação com os futuros sujeitos da ação do
Terapeuta Ocupacional, poderia ser um bom laboratório para o exercício da descoberta
ou fortalecimento sobre si e sobre o lugar que iria ocupar no tratamento de seus futuros
pacientes.
Confrontar-se com seu próprio processo de construção de conhecimento no período de
sua formação seria então um bom caminho, mesmo não sendo tarefa fácil, pois os
obstáculos que bloqueiam essa produção podem também ser da ordem social, cultural, e
inconscientes. Essa articulação entre cultura (transmitida pelos adultos às crianças) e o
inconsciente (subjetividade) é complexa e exige do docente mais do que o domínio
sobre determinada metodologia de ensino. Segundo Bacha (2002, p. 46), “a fantasia do
conhecimento como uma transgressão é suficientemente difundida para não a
invocarmos em nossa defesa”. Não foi por causa de um fruto proibido retirado
indevidamente da árvore do conhecimento que Eva e Adão foram expulsos do paraíso?
É necessário que o docente esteja na posição de instigar o aluno a descobrir maneiras
ativas de produzir conhecimento sobre o outro, sobre si e sobre o mundo. Mas é
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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necessário também que esteja ali para acolher as angústias que este processo convoca.
Segundo Streck (2003, p.110) “O educador não é um facilitador da aprendizagem, mas
ele se coloca como testemunha do processo de conhecer. Ele é alguém que faz e refaz
diante dos educandos e com eles os caminhos do conhecimento”.
Partindo deste lugar, foi na área da educação, sob a perspectiva das reflexões de Paulo
Freire e da Educação Popular, que encontramos os primeiros referenciais teóricos que
embasaram esta proposta de formação. Paulo Freire, porque, como diz Streck (2001, p.
93), “ele é atual se estamos à procura de um companheiro que nos ajude a enfrentar
novos desafios com ousadia e com criatividade, como ele fez em seu tempo”, e a
Educação Popular, porque “traz em suas bases históricas, teóricas e práticas um
movimento pedagógico e político na defesa dos segmentos sociais mais fragilizados”
(Peruzzolo, 2003, p. 24).
A Partir dessa certeza temos nos dedicado a construir e experimentar outro fluxo de
produção de conhecimento que não o tradicionalmente oferecido pela academia. O fio
condutor das disciplinas de desenvolvimento e tratamento infantil é construído a partir
da convivência dos alunos com crianças em espaços sociais já nos primeiros dias de
aula.
Destinamos os primeiros encontros em sala de aula a qualificarmos a relação
transferencial entre docentes e discentes e a apresentarmos a proposta de trabalho.
Pensando na influência da cultura dominante que mantém o sujeito/aluno oprimido
temeroso de romper com a relação opressora normalmente imposta pelo professor, a
Educação Popular defende a necessidade de uma postura do educador que possua
intencionalidade, mas não imposição. Apesar de, na Educação Popular, a organização
não ser um fim, mas um meio para atingir um processo mais amplo (Beca, 1987), ela
não é um evento espontâneo. É desse lugar que falamos aos alunos. “Os educadores são
os responsáveis de conduzir a reflexão ordenadamente, não para impor suas idéias, mas
para orientar o desenvolvimento de pensamento coletivo e incentivar a participação”
(Beca, 1987, p. 155).
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A seguir, o campo de conhecimento passa a ser o lugar onde o cotidiano da infância
acontece. Mejía (2001) defende que “la vida cotidiana es el lugar donde se hacen
concretos los fenómenos culturales y contextuales” (p.154). É também o lugar onde os
processos educativos se iniciam e “donde se regresa después, a través de una práctica
con sentido y con opción transformadora” (p. 154).
A aula se dá dentro das escolas, hospitais e clínicas na perspectiva de que o aluno
construa uma reflexão crítica sobre a importância dessas “instituições” na vida dos que
por ela circulam. Professores, cuidadores, médicos, enfermeiros, terapeutas, crianças e
suas famílias criam e também estão à mercê das normas e dos ritmos das instituições
que frequentam. É necessário que o Terapeuta Ocupacional compreenda sob que
influências históricas e sociais essas instituições foram erguidas e com quais objetivos,
para daí pensar seu lugar como agente transformador e não reprodutor de um sistema
tradicionalmente opressor.
É oferecida ao aluno a possibilidade de identificar as relações institucionais a partir da
observação-ação e analisá-las trazendo autores para uma discussão também teórica
como, por exemplo, Foucault (1997), que, mesmo dirigindo seu olhar inicialmente às
prisões, faz uma análise ampla, comparando-as com outras instituições e dizendo que
“devemos ainda nos admirar que a prisão se pareça com as fábricas, com as escolas,
com os quartéis, com os hospitais, e todos se pareçam com as prisões?” (p. 199).
Compreender que o sistema no qual estão inseridos, onde os adultos definem todas as
regras e ações é oriundo do início do século XVII, onde a aprendizagem passa a ser
ministrada através da escola, começando um processo de enclausuramento das crianças,
tem o objetivo de provocar o aluno a compreensão sobre em quais perspectivas estará
inserido quando estiver pronto para construir seu plano de tratamento. Nos estudos,
encontram já em Rousseau a critica às instituições onde essa educação é praticada, tanto
a pública e comum quanto a particular e doméstica: “só serve para criar homens de duas
faces, que sempre parecem atribuir tudo aos outros, e nunca atribuem nada senão a si
mesmos” (ROUSSEAU, 2004, p. 13).
Por fim, essa experiência pedagógica oferece ao aluno a oportunidade de conhecer os
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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sujeitos que estamos nos habilitando a tratar, depois vamos estudá-los e, posteriormente,
estudar suas patologias.
Seguindo a mesma perspectiva da análise cultural da criação das instituições, é
necessário conhecer o lugar e o papel ocupado pela infância no âmbito familiar e social,
ao longo da história da humanidade. Quando o aluno descobre que a infância como
conceito e posição social surgiu somente a partir dos séculos XVI e XVII, ainda como
fonte de distração e relaxamento para o adulto e que até então elas estavam a mercê de
punições físicas, trocas, enclausuramentos, mortes por abandono, ou doadas para o
Estado com destino marcado para ser soldado, passa a compreender também por que
ainda encontramos abordagens terapêuticas que repetem ações/exercícios e propõe
objetivos pertinentes ao tratamento de adultos e não de crianças.
É importante que o aluno conheça o caminho brasileiro na defesa dos direitos da
infância e o quanto nos diferenciamos de parte do mundo, pois mesmo surgida no
século XX, ela veio a partir de movimentos sociais nos quais o Brasil assumia uma
posição de vanguarda na América Latina no que tangia às ações jurídicas de proteção à
infância. Foi o primeiro país a, por exemplo, realizar o I Congresso Brasileiro sobre a
Infância que aconteceu no Rio de Janeiro em 1923, e criar o Código Civil de 1927, que
formalizou as principais ações de proteção da criança e do adolescente na época.
Quando instigamos o aluno a refletir sobre essa trajetória estamos também apresentando
para ele a idéia de que, como Terapeutas Ocupacionais, não estamos voltados somente
para o tratamento da patologia.
Provocamos no aluno a reflexão sobre uma Terapia Ocupacional que interprete as
perspectivas em que está sendo construído o cotidiano desses sujeitos (a criança e sua
família) para desse lugar pensar sua ação. É necessário que encontremos no cotidiano
“infantil” inserido em uma família que está inserida em uma cultura, em uma política,
os recursos e os caminhos para o tratamento. Não podemos mais focar nossa avaliação e
nosso plano de tratamento simplesmente na patologia ou nos sintomas apresentados pela
criança.
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O Terapeuta Ocupacional que estamos formando precisa pensar sob uma perspectiva
social, cultural e política e desse lugar construir, com esse outro, seu paciente, o
caminho terapêutico. O depoimento de uma aluna quando diz “Nossa, nós pensamos
muita coisa, não é? Não deixamos escapar nada!” anuncia a angústia produzida nos
ingênuos que erroneamente entendem nossa profissão como instrumentalizadores do
cotidiano e não como transformadores sociais a partir da oferta do conhecimento de
instrumentos para tal. Mas também dá voz a uma aluna, futura Terapeuta Ocupacional,
que já se coloca na posição de uma profissional, agente transformadora quando diz “nós
pensamos”.
Quando nos encontramos subjetivamente neste lugar, a patologia e seus sintomas ou
sequelas tomam outra dimensão. Conseguimos compreendê-las como um obstáculo a
ser ultrapassado para que se construa ou reconstrua um cotidiano que não deve estar
preso às regras estipuladas por normas e leis sociais ou políticas. Se o menino com
paralisia motora não quer usar mais seu laptop na aula, pois não consegue escrever um
bilhete para entregar no recreio para a menina por quem está apaixonado, como fazem
seus colegas, é preciso repensar o lugar deste instrumento na inclusão de crianças
deficientes físicas nas escolas, ou repensá-lo como instrumento para este menino, afinal,
ele compreende muito bem o universo feminino e sabe que receber de um pretendente
um cartão feito a mão é muito mais romântico do que um impresso em uma folha A4.
Jerusalinsky, apud Heinz et al (2009) diz que o paciente tem a esperança de que o
clínico saiba como fazer para que sua deficiência não faça obstáculo a seu desejo. Para
isso é necessário que o clínico, aqui o Terapeuta Ocupacional, compreenda este sujeito
como possuidor de desejos que vão muito além da idéia de “cura” de sua patologia, ou,
quando tratamos de crianças, que este desejo de estar com o outro e estar no mundo
passa pelos pais e pelas instituições que os acolhem.
O conhecimento dos conteúdos é construído a partir das descobertas dos alunos e de
seus interrogantes sobre as ações das instituições, das crianças, das famílias, dos
terapeutas e sobre as angústias pessoais produzidas a partir das relações que se armam
entre eles. Delors (1998), no Relatório para a UNESCO, na “Comissão Internacional
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
150
sobre Educação para o Século XXI – Educação um tesouro a descobrir”, identifica
quatro pilares fundamentais para a educação: aprender a conhecer, isto é, adquirir os
instrumentos da compreensão; aprender a fazer, para poder agir sobre o meio
envolvente; aprender a viver juntos, a fim de participar e cooperar com os outros em
todas as atividades humanas e, finalmente, aprender a ser, via essencial que integra as
três precedentes (p. 90). Este é o exercício constante que convidamos os alunos a
seguirem durante seu processo de construção de conhecimento nas disciplinas que
oferecemos.
Este encontro intelectual e afetivo tem oferecido ao aluno a oportunidade de
compreender a si, compreender o outro inserido em um mundo a ser construído e deste
lugar colocar-se como Terapeuta Ocupacional. Pensamos que, principalmente no Brasil,
onde as políticas de saúde pública são construídas na defesa da integralidade, igualdade
e participação popular para garantir a promoção, proteção e recuperação da saúde e de
onde partem desde Paulo Freire propostas para uma pedagogia da autonomia e do
empoderamento dos oprimidos sobre si e sobre os opressores, é necessário que os
Terapeutas Ocupacionais também se posicionem nesta perspectiva.
Este tem sido um tema recorrente nas práticas profissionais e em alguns artigos,
dissertações de mestrado e teses de doutorado de Terapeutas Ocupacionais brasileiros e
que hoje faz eco em outros países. Como exemplo temos a discussão sobre pesquisa em
Terapia Ocupacional no Canadá apresentada por Lílian Magalhães no I Seminário
Nacional de Pesquisa em Terapia Ocupacional, publicado pelo “Cadernos de Terapia
Ocupacional” da UFCAR 2009 em que ela coloca que na década de 80 diversos autores
passaram a assinalar a “necessidade de reorientar teórica e praticamente a intervenção
profissional em direção a ideais de democracia e justiça social (CAOT, 1991)”
(MAGALHÃES, 2009, p.97). A autora chama a atenção para o uso dos conceitos e
reflexões apontados por nomes como o de Paulo Freire e Augusto Boal (p. 98),
utilizados para a construção da base das “propostas de desenvolvimento comunitário
indicadas no documento publicado pela CAOT e para orientar o exercício profissional
dos Terapeutas Ocupacionais no Canadá (TOWNSEND & POLATAJKO, 2007)”
(MAGALHÃES, 2009, p. 98).
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
151
Na mesma direção do quanto as experiências brasileiras no campo social têm
contribuído para seguirmos pensando e investindo na prática da formação de um
Terapeuta Ocupacional que precisa descobrir para conhecer, Kroneberg, et al (2006)
busca no sociólogo brasileiro Herbert de Souza os princípios fundantes do livro
“Terapia Ocupacional sin Fronteras: Aprendiendo del Espíritu de Supervivientes”,
publicado em espanhol pela editora Médica Panamericana em 2006.
Brandão (1986) diz que “o lugar onde se dão as trocas de conhecimento não é uno” (p.
31) e, seguindo nesta direção, acreditamos que a sala de aula não é o único espaço para
troca de conhecimentos. Segundo Oliveira (2003, p.101), “do mesmo modo que o
tempo da educação tende a tornar-se o do conjunto da vida, assim também os espaços
educativos e as ocasiões de aprendizado tendem a se multiplicar”. O social, na
concepção da educação para a autonomia, está pela via do coletivo, do relacionar-se
com outro, seja na família, na escola, na praça, no bairro, no time de futebol, na igreja,
no hospital, na clínica, na universidade, pois “crescer, entre nós, é uma experiência
atravessada pela biologia, pela psicologia, pela cultura, pela história, pela educação,
pela política, pela estética, pela ética” (FREIRE, 1995, p. 126). E é a partir das relações
construídas neste social, não desconsiderando a dimensão individual, que
compreendemos a possibilidade de que o sujeito aprendente se torne sujeito cidadão e
produtor de cidadanias.
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Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
153
UTILIZAÇÃO DE METODOLOGIAS ATIVAS NA DISCIPLINA DE
MODELOS TEÓRICOS EM TERAPIA OCUPACIONAL DO CURSO DE
GRADUAÇÃO EM TERAPIA OCUPACIONAL DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DO PARANÁ (UFPR)
DERIVAN BRITO DA SILVA1
RESUMO
Introdução e justificativa: A prática em Terapia Ocupacional está fundamentada em
modelos teóricos da profissão que se articulam às teorias, referenciais teóricos e
abordagens. Desde sua criação, a profissão sofre influências filosóficas e metodológicas
que culminam na construção de referenciais teóricos que guiam o raciocínio do
terapeuta ocupacional em seu exercício profissional. O ensino desses modelos se
constitui em um desafio ao docente tendo em vista as contradições em torno dessa
temática, a baixa divulgação da utilização desses modelos na atuação profissional e a
falta de compreensão dos estudantes acerca da importância desse conhecimento para sua
prática supervisionada e futura prática profissional. Justifica-se este trabalho pela
necessidade de compartilhar a experiência da utilização de metodologias ativas para
construção do conhecimento em torno dos Modelos Teóricos em Terapia Ocupacional.
Objetivo: Relatar o processo ensino-aprendizagem vivenciado na Disciplina de
Modelos Teóricos em Terapia Ocupacional do curso de graduação em Terapia
Ocupacional da UFPR. Materiais e Métodos: Os estudantes foram estimulados a
correlacionar as temáticas das aulas teóricas com experiências vivenciadas nos campos
de estágio. Foi utilizada a metodologia da Problematização com as cinco etapas do
Arco de Maguerez: Observação da Realidade; Identificação dos Problemas/Pontos-
Chave; Teorização; Hipóteses de Solução – Planejamento; Aplicação – Execução da
Ação. Resultados e Discussão: A correlação dos temas das aulas com as experiências
de estágio utilizando o Arco de Maguerez favoreceu a discussão dos Modelos Teóricos
de forma contextualizada e reflexiva. Conclusão: Os estudantes ao final da disciplina
demonstraram habilidades na seleção e aplicação de Modelos Teóricos às situações
problematizadas.
PALAVRAS-CHAVE: Terapia Ocupacional, Educação Profissionalizante, Modelos
Teóricos.
1 Prof. Ms. do Curso de Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Paraná – UFPR
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
154
INTRODUÇÃO
Os Modelos de Terapia Ocupacional se constituem em valiosas ferramentas para guiar o
raciocínio do terapeuta ocupacional em seu exercício profissional. Ou seja, esses
modelos juntamente com os princípios fundamentais da Terapia Ocupacional fornecem
uma estrutura para prática profissional (HAGEDORN, 2007).
O conhecimento da Terapia Ocupacional se desenvolveu a partir das ciências
psicológicas, que explicam o comportamento humano e suas funções mentais; das
ciências sociológicas, que compreendem o homem como ser social que cria e é criado
pelo modo de vida da sociedade em que vive; das ciências biológicas, que estudam a
dimensão anatomofisiológica do corpo humano; e das ciências médicas, que visam
compreender as dimensões da saúde e doença tanto individual como social e a
aplicabilidade de procedimentos terapêuticos (MEDEIROS, 2003).
Ao longo de sua evolução, com base nas ciências supracitadas, foram sendo construídos
os “modelos” da profissão, sendo que nas décadas de 1980 e 1990 eles sofreram uma
crítica pelos acadêmicos de área, devido à profissão ter sua fundamentação em
conhecimentos emprestados que se preocupavam mais em explicar o que fazer – foco na
prática, do que as razões do por que fazer (HAGEDORN, 2007). Essas críticas levaram
pesquisadores à procura de uma lógica que refletisse as características específicas da
profissão e, consequentemente, a desenvolverem os Modelos da Terapia Ocupacional e
buscarem “por um paradigma unificado para a prática, perante o que a relevância da
prática e da teoria poderia ser testada e desafiada” (HAGEDORN, 2007, p. 7).
Todo esse movimento em torno da construção de Modelos da Terapia Ocupacional que
refletissem fundamentos filosóficos articulados com a prática e o contexto onde ela se
insere, culminou em uma “família” de modelos teóricos que passaram a mostrar o
interesse da profissão na capacidade das pessoas para desempenhar suas
ocupações/atividade competentemente e adaptadas no ambiente (físico e social). Cada
autor buscou descrever um modelo integrado para guiar a intervenção e distinguir a
contribuição específica da Terapia Ocupacional das demais profissões (HAGEDORN,
1999; 2007).
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
155
A partir dessas constatações, o ensino dos modelos na graduação em Terapia
Ocupacional se constitui em um desafio ao docente, tendo em vista as contradições
terminológicas e de aplicabilidade dos modelos na realidade brasileira, a baixa
divulgação da utilização desses modelos na atuação profissional e a falta de
compreensão dos estudantes acerca da importância desse conhecimento para sua prática
supervisionada e futura prática profissional.
Assim, é necessário desafiar os estudantes a compreender: que a história desta profissão
está demarcada por reorganizações, rupturas e mutações em um enquadramento
cultural1; que, “como profissão da área da saúde, não está alheia aos acontecimentos e
ao processo de produção dos pensamentos e ações das ciências, particularmente das
ciências biológicas e humanas”; e que as diferentes concepções de homem, como, por
exemplo, as derivadas do positivismo, do humanismo/fenomenologia e do materialismo
histórico irão guiar o raciocínio do terapeuta ocupacional para práticas diferentes e até
mesmo divergentes, nas quais a utilização de determinado modelo teórico pode revelar
o embate epistemológico e social do terapeuta ocupacional, visto que sua prática se
constitui em uma intervenção social com base em valorações acerca do homem, da
sociedade e do processo saúde/doença (MEDEIROS, 2003).
Como realizar tal tarefa? Como estimular os estudantes para este debate necessário à
construção do conhecimento em torno desta temática? Que estratégias de ensino
implementar? Como avaliar o processo de ensino e aprendizagem? Estas, entre outras,
foram indagações que nos levaram à reflexão durante o planejamento da Disciplina de
Modelos Teóricos em Terapia Ocupacional do curso de graduação em Terapia
Ocupacional da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
No cenário da docência tem sido apregoada a necessidade de transcender ao modelo
tradicional de ensino. As críticas ao modelo tradicional de ensino – paradigma
flexneriano – que, conforme Abreu (2009) influenciou a formação médica no Brasil e,
acreditamos que também influenciou o processo formativo em Terapia Ocupacional,
1 “Conjunto de relações e valores ideológicos da formação social em que se insere (MEDEIROS, 2003, p.
35)”.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
156
apontam para as metodologias ativas como um caminho a ser explorado e trilhado em
sua diversidade teórica e prática.
O objetivo deste trabalho é relatar a experiência da utilização de metodologias ativas no
processo de ensino e aprendizagem vivenciado na disciplina Modelos Teóricos em
Terapia Ocupacional do curso citado.
MATERIAIS E MÉTODOS
A disciplina Modelos Teóricos em Terapia Ocupacional foi ministrada para os 27
estudantes do 7.º período do curso de graduação, com característica apenas teórica –
duas horas semanais – tendo como ementa os “Fundamentos conceituais da prática da
Terapia Ocupacional. Modelos teórico-filosóficos”.
Os objetivos pedagógicos foram direcionados a: estudar a influência do pensamento
positivista, fenomenológico, marxista e da teoria da complexidade nos fundamentos
teórico-práticos da Terapia Ocupacional; apresentar diferentes Modelos Teóricos de
Terapia Ocupacional; desenvolver o raciocínio clínico para a seleção, articulação e
utilização de modelos teóricos, quadros de referências e abordagens necessários à
fundamentação teórico-prática do Processo de Terapia Ocupacional.
A disciplina foi divida em quatro unidades, a saber: Bases Filosóficas e Epistemologia
da Terapia Ocupacional; Modelos Teóricos de Terapia Ocupacional; Quadro de
Referências e Abordagens utilizadas em Terapia Ocupacional; Modelos – Quadros de
Referências – Abordagens, na prática clínica.
Em todas as unidades os estudantes foram estimulados a correlacionar as temáticas das
aulas teóricas com experiências vivenciadas nos campos de estágios (anteriores e
presente). As unidades foram ordenadas apenas para efeito de apresentação. Todavia,
durante o processo de ensino e aprendizagem, os seus temas se articulavam com os
temas de outras unidades, de acordo com as necessidades dos estudantes em seu
processo problematizador. Para tanto, foi utilizada a Metodologia da Problematização
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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com as cinco etapas do Método do Arco de Maguerez: Observação da Realidade;
Identificação dos Problemas – Pontos-Chaves; Teorização; Hipóteses de Solução –
Planejamento; Aplicação – Execução da Ação (BERBEL, 1998; MORAES; BERBEL,
2006; MITRE et al., 2008).
Na primeira etapa – Observação da Realidade, os estudantes traziam para sala de aula
relatos de experiências nos campos de estágio e/ou o docente apresentava aos estudantes
uma situação-problema da prática profissional.
Na segunda etapa – Identificação dos Problemas – Pontos-Chaves, o docente estimulava
os estudantes a identificarem quais os problemas existentes e quais eram os mais
relevantes – demandas para o terapeuta ocupacional.
Na terceira etapa –Teorização, dando sequência às discussões das aulas expositivas e
dialógicas, os estudantes recorriam à bibliografia buscando referenciais teóricos que
apontassem para Bases Filosóficas e Epistemologia da Terapia Ocupacional, Modelos
Teóricos de Terapia Ocupacional, Quadro de Referências e Abordagens utilizadas em
Terapia Ocupacional, de acordo com a necessidade da situação problematizada.
Na quarta etapa – Hipóteses de Solução – Planejamento, a partir das demandas
observadas e da composição do referencial teórico, os estudantes apresentavam sua(s)
hipótese(s) de solução para a situação problematizada. Estas hipóteses eram discutidas e
aprimoradas com sugestões do docente e de outros estudantes da turma, tecendo uma
rede de socialização necessária à produção do conhecimento.
Na quinta etapa – Aplicação à realidade – Execução da Ação, os estudantes foram
estimulados a executar em seu campo de estágio, sob supervisão e consentimento do seu
supervisor, as ações propostas com base no raciocínio clínico desenvolvido nas etapas
anteriores. Posteriormente, em sala de aula, foram apresentados, voluntariamente,
relatos a respeito da implementação das ações e como elas poderiam ter seus resultados
avaliados.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
158
Fonte: BORDENAVE; PEREIRA, 2005.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados serão apresentados seguindo a mesma sequência das Unidades da
Disciplina apresentadas anteriormente, a fim de facilitar sua exposição. Assim, na
primeira unidade – Bases Filosóficas e Epistemologia da Terapia Ocupacional, os
alunos estudaram temas relativos a: Reducionismo e Holismo; Pensamento Positivista,
Fenomenológico e Marxista; Teoria da Complexidade; Construção Epistemológica da
Terapia Ocupacional – Influências da Biologia, Psicologia, Sociologia e Medicina;
Terapia Ocupacional – Objeto Profissional; Modelos em Terapia Ocupacional –
Sanitaristas, Históricos e Filosóficos. Ao final dessa unidade os estudantes, em sua
maioria, demonstraram capacidade de identificar as diferentes perspectivas filosóficas
assumidas pela profissão, desde o seu processo de criação até a atualidade. Também
argumentaram sobre as influências filosóficas e de Modelos Sanitaristas, Históricos e
Filosóficos em Terapia Ocupacional, na prática profissional identificada através de
artigos e relatos de experiências de profissionais e em experiência de observação da
prática profissional (por exemplo, nos campos de estágios).
Na segunda unidade – Modelos Teóricos de Terapia Ocupacional, foram estudados
temas relativos a: Modelo Canadense de Desempenho Ocupacional; Modelo de
Ocupação Humana; Componentes Centrais da Terapia Ocupacional e Competência
Teorização
Pontos-chave Hipótese de Solução
Observação da realidade Aplicação à realidade
(problema) (prática)
R E A L I D A D E
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
159
Ocupacional; Modelo COPE (Competent Occupational Perfomance in the
Environment) – Desempenho Ocupacional Competente no Ambiente. Foram
selecionados apenas esses três modelos pela disponibilidade dos mesmos na língua
portuguesa, por serem utilizados pelos docentes do curso e pela possibilidade de
permitir um estudo mais aprofundado e reflexivo. Ao final dessa unidade os estudantes,
em sua maioria: posicionaram-se frente à utilização dos Modelos de Terapia
Ocupacional na prática profissional, com justificativa teórica e prática; indicaram e
justificaram teoricamente a utilização de Modelos de Terapia Ocupacional para guiar o
Processo de Terapia Ocupacional; demonstraram habilidades na análise de casos
clínicos e/ou situações-problema e apresentaram possibilidades de intervenção com base
em Modelos de Terapia Ocupacional.
Na terceira unidade – Quadro de Referências e Abordagens utilizadas em Terapia
Ocupacional, foram estudados temas relativos aos Quadros de Referência: Fisiológicos
(Homeostase): Biomecânico, Neurodesenvolvimentista e Cognitivo-Perceptivo;
Psicológico (Comportamento Humano): Biológica – Neurociência, Comportamental,
Cognitiva, Psicanalítica e Fenomenológica – Humanista. Também foram estudados os
Quadros de Referências – Abordagens: Biomecânicas; Neurodesenvolvimentistas;
Cognitivo-Perceptivas; Comportamentais; Analítico-Psicodinâmicas; Trabalho Grupal;
Humanistas. Ao final dessa unidade os estudantes, em sua maioria, conseguiram:
identificar, em relatos de experiências, observação da prática profissional e/ou trabalhos
científicos, os quadros de referências e/ou abordagens utilizados; selecionar e indicar
quadros de referências e/ou abordagens para executar na prática o Processo de
Intervenção – Tratamento em Terapia Ocupacional.
Na quarta e última unidade – Modelos – Quadros de Referências – Abordagens, na
prática clínica,os estudantes foram instigados à aplicabilidade em seus respectivos
campos de estágio – prática supervisionada. Ao final dessa unidade os estudantes, em
sua maioria, conseguiram estruturar um Processo de Terapia Ocupacional para intervir
em uma situação-problema e/ou caso clínico, justificando a articulação de Modelos –
Quadros de Referências – Abordagens selecionados para guiar tal processo.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
160
Ao final do semestre letivo, dos 27 estudantes matriculados que cursaram a disciplina,
apenas dois não atingiram os objetivos.
A partir dessa experiência ora relatada e de achados na literatura, tanto em relação aos
Modelos de Terapia Ocupacional quanto acerca das metodologias ativas, percebemos
uma convergência para a necessidade de levar os estudantes a utilizarem estratégias para
resolução de problemas do cotidiano profissional baseadas em metodologias de ensino
que favoreçam ao estudante a crítica e autocrítica, a reflexão, o (re)conhecimento de
suas potencialidades, limitações e necessidades de estudo para articulação teórico-
prática sólida e necessária à prática em Terapia Ocupacional.
É notório que as discussões em torno das metodologias ativas nem sempre apontam para
direções convergentes. O resultado dessas divergências, por vezes, tem gerado
contradições que produzem sentimentos de receio e comportamentos resistentes em
estudantes e docentes, no sentido de avançar no planejamento e implementação de
procedimentos didáticos que realmente tornem o processo de ensino e aprendizagem
desafiador, reflexivo e significativo para os atores envolvidos.
Diversos estudos têm sido publicados apontando para o efeito das metodologias ativas
no processo de ensino e aprendizagem, todavia é comum encontrar diferentes
denominações para essas metodologias. Zanotto e De Rose (2003) realizaram um estudo
de revisão de literatura acerca das metodologias de ensino com foco na resolução de
problemas e concluíram que tais metodologias – Resolução de Problemas ou
Problematização, estão calcadas no trinômio problema-explicação-solução. Ou seja,
independente de fases, etapas e passos, nessas metodologias o estudante “deve
relacionar três momentos ou movimentos: identificação de um problema, busca de
fatores explicativos e proposição de solução ou soluções”. Para essas autoras a diferença
entre as metodologias está no papel que cada uma atribui ao sujeito que realiza a ação.
Assim, dos princípios e características que devem estar presentes em propostas de
formação voltada para a ação de problematizar, apontadas pelas autoras, destacamos:
ênfase no aprender a problematizar – problema-explicação-solução; ênfase no sujeito
ativo; ter a noção de problema tomada no sentido da reflexão filosófica (não sei/preciso
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
161
saber); considerar a práxis (realidade de quem problematiza); aquisição de estratégias de
aprendizagem (contexto real) visando à mudança conceitual.
Durante as experiências na disciplina Modelos Teóricos em Terapia Ocupacional,
observamos que a correlação dos temas das aulas com as experiências de estágios,
utilizando a metodologia ativa do Método do Arco de Maguerez favoreceu a discussão
dos Modelos Teóricos de forma contextualizada e reflexiva. Os estudantes
demonstraram habilidades na seleção e aplicação de Modelos Teóricos às situações
problematizadas.
CONCLUSÃO
Compreender o processo de construção do conhecimento em Terapia Ocupacional é
essencial para o (re)conhecimento dos Modelos de Terapia Ocupacional como
ferramentas eficazes para guiar o raciocínio do terapeuta ocupacional em seu exercício
profissional.
O ensino dos Modelos de Terapia Ocupacional oferece ao docente possibilidades de
reflexão de sua prática profissional, tanto clínica como no ensino/formação. Durante o
processo de ensino e aprendizagem é possível enxergar com mais clareza a articulação
de tais modelos com a prática profissional de forma crítica e reflexiva. A utilização da
metodologia ativa – Método do Arco de Maguerez – facilitou este processo, todavia, por
se tratar de uma disciplina com carga horária apenas teórica, houve a necessidade de
estimular os estudantes a articularem a disciplina teórica com campos de estágio/prática.
Essa articulação permitiu integrar a disciplina em questão a outras disciplinas do
currículo que os estudantes já haviam cursado e às disciplinas que estavam cursando,
principalmente as de Estagio Supervisionado. Esta experiência, juntamente com outras
vivenciadas nos últimos semestres de prática docente, apontam para a necessidade de
pesquisa neste campo para averiguar a real percepção dos estudantes acerca da
implementação de metodologias ativas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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ZANOTTO, M. A. do C.; DE ROSE, T. M. S. Problematizar a própria realidade: análise
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Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
163
DOCUMENTAÇÃO DO PROCESSO DE TERAPIA OCUPACIONAL EM
ESTÁGIOS SUPERVISIONADOS: SUGESTÃO DE PROTOCOLO PARA
GUIAR O RACIOCÍNIO CLÍNICO DE SUPERVISORES E ESTAGIÁRIOS
DERIVAN BRITO DA SILVA1
RITA APARECIDA BERNARDI PEREIRA2
RESUMO
Introdução e justificativa: O Processo de Terapia Ocupacional refere-se às ações que o
terapeuta ocupacional desenvolve de forma organizada para intervir junto a clientes. Ele
envolve avaliação, intervenção e avaliação de resultados e precisa ser descrito de forma
clara, objetiva, concisa e coerente com a prática em Terapia Ocupacional. Na prática
supervisionada de estágios, supervisores e estagiários deparam-se com o desafio de
ajustar as diferentes representações da estrutura organizacional desse processo para
guiar o raciocínio clínico na elaboração e sistematização de registros clínicos e
divulgação da prática profissional. Justifica-se este trabalho pela necessidade de
compartilhar a experiência da utilização do protocolo intitulado “Processo de Terapia
Ocupacional: Documentação Clínica” elaborado pelos autores acima identificados.
Objetivo: Divulgar o protocolo intitulado “Processo de Terapia Ocupacional:
Documentação Clínica” e sua utilização em Disciplinas de Estágio Supervisionado em
Terapia Ocupacional do curso de graduação de Terapia Ocupacional da Universidade
Federal do Paraná. Materiais e Métodos: Com base em estruturas propostas por autores
que abordam a temática “Processo de Terapia Ocupacional” foi organizada a primeira
versão do protocolo, utilizado de 2005 a 2008. Em 2009 ele foi revisado para
contemplar os avanços advindos da publicação da Classificação Internacional de
Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) e do documento da Associação Americana
de Terapia Ocupacional (AOTA) intitulado “Occupational Therapy Practice
Framework: Domain and Process”. Resultados e Conclusão: A utilização do protocolo
tem facilitado os registros clínicos em estágios supervisionados e favorecido o
raciocínio clínico de forma contextualizada, reflexiva e esclarecedora da especificidade
da profissão.
1 Prof. Ms. do Curso de Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Paraná – UFPR
2 Prof.ª Ms. do Curso de Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Paraná – UFPR
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
164
PALAVRAS-CHAVE: Terapia Ocupacional, Estágios, Documentação.
INTRODUÇÃO
A formação em Terapia Ocupacional requer o planejamento e implementação de
atividades pedagógicas que proporcionem ao estudante o desenvolvimento do raciocínio
clínico necessário à prática profissional. De acordo com as Diretrizes Curriculares
Nacionais do Curso de Graduação em Terapia Ocupacional, o perfil do formando
egresso/profissional – o Terapeuta Ocupacional – deve ser fruto de uma formação
humanista, generalista, crítica e reflexiva. Espera-se ao final da formação que o
estudante esteja capacitado ao exercício profissional nos diversos contextos de atuação,
com base científica e intelectual e amparado em princípios éticos, fundamentos
históricos, filosóficos e metodológicos da Terapia Ocupacional, bem como
conhecimento dos diferentes modelos de intervenção. O objetivo da formação deve ser
o de “dotar o profissional dos conhecimentos requeridos para o exercício das seguintes
competências e habilidades gerais”: Atenção à saúde, Tomada de decisões;
Comunicação; Liderança; Administração e gerenciamento; Educação permanente
(BRASIL, 2002, p. 01 e 02).
Considerando esses aspectos da formação em Terapia Ocupacional, o estudante deve ser
estimulado, instigado e desafiado a conhecer e reconhecer os fatores que interferem de
forma positiva e/ou negativa na prática profissional e como, a partir do raciocínio
clínico em Terapia Ocupacional, esses fatores podem ser explicados e soluções podem
ser propostas para a resolução de determinada problemáticas encontrada em um campo
de atuação. Uma das ferramentas pedagógicas utilizadas para dar conta desse conhecer,
reconhecer e atuar durante o processo formativo tem sido os estágios supervisionados.
Neles, estudantes inicialmente observam a prática profissional e a problematizam e,
posteriormente de forma supervisionada, desenvolvem atividades práticas. Espera-se
que, a partir dessas atividades formativas (estágios), articuladas a outras, como, por
exemplo, as disciplinas teóricas e teórico-práticas, os estudantes desenvolvam e
apliquem o raciocínio clínico em Terapia Ocupacional. O Processo de Terapia
Ocupacional aparece, portanto, como um conhecimento necessário ao desenvolvimento
das atividades de estágios supervisionados.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
165
O Processo de Terapia Ocupacional refere-se às ações que o terapeuta ocupacional
utiliza de forma organizada para intervir junto a clientes. Ele envolve avaliação,
intervenção e avaliação de resultados e precisa ser descrito de forma clara, objetiva,
concisa e coerente com a prática em Terapia Ocupacional (HAGEDORN, 1999, 2007;
MANCINI E COELHO, 2008; AOTA, 2008;). Esse processo é consciente, intencional e
estruturado, e nele procedimentos são incluídos e/ou excluídos para auxiliar o terapeuta
ocupacional e seu cliente na tomada de decisões (HAGEDORN, 2007). As experiências
clínicas aliadas ao desenvolvimento do raciocínio clínico1 favorecem ao estudante
caminhar para frente e para trás, nas diversas etapas do Processo de Terapia
Ocupacional, tornando-o um processo fluído e dinâmico (SCHELL, 2002;
HAGEDORN, 1999, 2007; CANIGLIA, 2005; MANCINI; COELHO, 2008).
Durante o desenvolvimento das atividades de estágios supervisionados, sejam eles na
modalidade de observação ou de prática2, supervisores, estagiários e preceptores
deparam-se com o desafio de ajustar as diferentes representações da estrutura
organizacional deste processo para guiar o raciocínio clínico na tomada de decisões, no
planejamento e na implementação de ações, na elaboração e sistematização de registros
clínicos e divulgação da prática profissional.
Em nossa experiência na docência, observamos a dificuldade dos estudantes em
registrar, na forma escrita, o Processo de Terapia Ocupacional. Muitas vezes, a escrita
está relacionada à elaboração de relatórios de avaliação, planejamento da intervenção,
evolução e reavaliação, bem como à composição de um relatório final de todo o
processo vivenciado. A partir dessa dificuldade começamos a pensar em uma estrutura
que pudesse facilitar tais atividades pedagógico-assistenciais. Justifica-se este trabalho
pela necessidade de compartilhar a experiência da construção e utilização do protocolo
intitulado “Processo de Terapia Ocupacional: Documentação Clínica”, elaborado pelos
autores deste trabalho. Isso posto, o objetivo é divulgar o referido protocolo e sua
1 Refere-se ao processo utilizado por profissionais para orientar, planejar, realizar e refletir acerca do
tratamento do cliente (SHELL, 2002). 2 A Modalidade de Observação no Curso de Graduação em Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Paraná refere-se àquele estágio em que os estudantes observam um docente/terapeuta ocupacional
atuando em um contexto de prática profissional. Já na Modalidade de Prática, os estudantes desenvolvem
atividades de práticas em Terapia Ocupacional de forma supervisionada.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
166
utilização em Disciplinas de Estágio Supervisionado em Terapia Ocupacional do curso
de graduação de Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
MATERIAIS E MÉTODOS
Em 2005 foi organizada a primeira versão do protocolo “Processo de Terapia
Ocupacional: Documentação Clínica” (Figura 1). Sua elaboração teve como base
experiências em estágios supervisionados na modalidade de observação e de prática na
utilização do Processo de Terapia Ocupacional como ferramenta para guiar a atuação
nos contextos de prática profissional e supervisão pedagógica, bem como no estudo das
estruturas do referido processo propostas por autores que abordam as temáticas
relacionadas ao Processo de Terapia Ocupacional, como, por exemplo, Hagedorn (1999,
2007), Francisco (2001), Medeiros (2003), Neistadt e Crepeau (2002), Caníglia (2005).
Também foram considerados aspectos relacionados à elaboração de estudo de
caso/relatório de caso encontrados na literatura (ROSA NETO, MORI E CERCI, 2003).
A primeira versão buscou construir uma estrutura na qual o estudante/estagiário pudesse
registrar procedimentos “gerais” (comuns a diversos profissionais da saúde) e
“específicos” (mais utilizados na profissão) (CANÍGLIA, 2005). Ressaltamos que, a
parte que se referia aos procedimentos específicos da prática do Processo de Terapia
Ocupacional (Avaliação e Processo de Intervenção) foi estruturada com base na
Terminologia Uniforme para Terapia Ocupacional – 3.ª Ed. da Associação Americana
de Terapia Ocupacional - AOTA (AOTA, 1994).
PROCESSO DE TERAPIA OCUPACIONAL
PARTE I
1. PROCESSO DE AVALIAÇÃO
1.1.COLETA DE DADOS
1.1.1 Identificação (nome, sexo, data de nascimento/idade, estado civil, religião,
profissão, nacionalidade)
Perfil Psicossocial
1.1.3 Queixas Principais
1.1.4 História Mórbida Atual
1.1.5 História Mórbida Pregressa
1.1.6 História Mórbida Familiar
1.1.7 Condições e Hábitos de Vida
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
167
2. AVALIAÇÃO
2.1 REVISÃO DE ÁREAS DE DESEMPENHO
2.1.1 Atividades de Vida Diária
2.1.2 Atividades Produtivas e de Trabalho
2.1.3 Atividades de Lazer e Diversão
2.2 EXAME DOS COMPONENTES DE DESEMPENHO
2.2.1 Sensório-Motor
2.2.2 Integração Cognitiva e Componentes Cognitivos
2.2.3 Habilidades Psicossociais e Componentes Psicológicos
2.3 CONTEXTOS DE DESEMPENHO OCUPACIONAL
2.3.1 Aspectos Temporais
2.3.2 Ambiente
2.4 PARECER TERAPÊUTICO OCUPACIONAL
3. PROCESSO DE INTERVENÇÃO
3.1 OBJETIVOS (Gerais e Específicos/Curto, Médio e Longo Prazo)
3.2 METODOLOGIA DE ATENDIMENTO
3.2.1 Modalidade (individual/em grupo)
3.2.2 N.º de atendimentos/sessões
3.2.3 Horários de atendimento
3.2.4 Periodicidade
3.3 PROGRAMA DE ATIVIDADES (incluir referencial teórico: modelos, quadro de
referências, abordagens)
3.3.1 Processo de Atividades
3.4 DESENVOLVIMENTO DO PROCESSO TERAPÊUTICO OCUPACIONAL
3.5 ENCAMINHAMENTOS
3.5.1 Pós-processo de avaliação
3.5.2 Pós-alta
3.6 REAVALIAÇÕES
PARTE II
1. DOCUMENTAÇÃO CLÍNICA (Relatório Final)
1.1 RELATO DO PROCESSO DE AVALIAÇÃO
1.1.1 Identificação e/ou Informação Básica
1.1.2 Resultado de Avaliação
1.2 PLANO DE TRATAMENTO (Planejamento e Implementação)
1.2.1 Nota de contato, tratamento ou visita
1.2.2 Frequência e Participação
1.2.3 Relatório de Atendimento
1.2.4 Relato de Progresso
1.3 EVOLUÇÃO DO TRATAMENTO
1.4. RELATO DE REAVALIAÇÃO
1.4.1 Processo de Reavaliação
1.5 RELATO DE ALTA OU INTERRUPÇÃO
1.6 SÍNTESE DO PROCESSO DE TERAPIA OCUPACIONAL
1.7 ENCAMINHAMENTOS
REFERÊNCIAS BIBILIOGRÁFICAS (as utilizadas para guiar o Raciocínio
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
168
Clínico no Processo de Terapia Ocupacional)
ASSINATURAS
SUPERVISOR DE ESTÁGIO (obrigatório)
PRECEPTOR DE ESTÁGIO (quando for o caso)
ESTAGIÁRIO (obrigatório)
RESPONSÁVEL PELO SERVIÇO (quando for o caso)
Figura 1: Processo de Terapia Ocupacional: Documentação Clínica
A primeira versão deste protocolo foi utilizada em estágios supervisionados no período
de 2005 a 2008. Durante as atividades de estágio o estudante/estagiário ia alimentando e
retroalimentando o protocolo com as informações clínicas do processo vivenciado junto
a clientes e/ou grupos. O objetivo da “PARTE I” era possibilitar o registro de cada etapa
do Processo de Terapia Ocupacional à medida que ela fosse ocorrendo. Com base
nessas informações, a “PARTE II”1 objetivava a elaboração de um Relatório Final de
Estágio para cada cliente e/ou grupo atendido. Dessa forma, o supervisor acompanhava
a organização do estudante/estagiário no planejamento e implementação das ações
necessárias à execução do Processo de Terapia Ocupacional, bem como o
desenvolvimento do seu raciocínio clínico. Assim, à medida que o estudante/estagiário
fosse demonstrando evolução na habilidade de condução e registro do Processo de
Terapia Ocupacional, era orientado a iniciar seus registros já na PARTE II. Dessa forma
era possível acelerar o desenvolvimento do raciocínio clínico e habilidade de síntese no
momento de efetuar seus registros. A aplicabilidade do protocolo em Processos de
Terapia Ocupacional voltado a clientes estava relacionada com os atendimentos
individuais. Em se tratando de grupos, os estudantes/estagiários deveriam utilizar o
protocolo para registrar informações de um grupo e não apenas a somatória de
indivíduos. Ou seja, a documentação deveria refletir o caráter de um processo de
atividade grupal e/ou de grupo de atividades. Esses registros deveriam apontar para as
histórias individuais (verticalidade) e histórias coletivas construídas no campo grupal
(horizontalidade), conforme apontam referências que subsidiam o trabalho com grupos
(PICHON-RIVIÈRE, 1991; ZIMERMAN et al., 1997; ZIMERMAN, 2000) aplicáveis
em processos grupais em Terapia Ocupacional (MAXIMINO, 2001; BALLARIN, 2003,
2007; BENETTON, 2006).
1 Para elaboração da Parte II foi utilizada a linguagem exposta no documento intitulado “Elementos da
Documentação Clínica (Revisão)” da AOTA (1995) publicado por Neistadt e Crepeua (2002) - Apêndice
G.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
169
Em 2009, esse protocolo foi revisado para contemplar os avanços advindos da
publicação pela Organização Mundial da Saúde (OMS) da Classificação Internacional
de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF, 2003) e do documento da Associação
Americana de Terapia Ocupacional (AOTA) intitulado “Occupational Therapy
Practice Framework: Domain and Process” (AOTA, 2008). Essa nova versão
denominada “Documento Guia para Registro do Processo de Terapia Ocupacional, em
Campos de Estágios Supervisionados” (Figura 2) buscou atualizar a linguagem do
protocolo1, inserir sugestões dos docentes/supervisores, bem como torná-lo mais
sintético para permitir a sua aplicação em contextos de atuação em que o tempo
disponível para esse tipo de registro era limitado.
PROCESSO DE TERAPIA OCUPACIONAL
1. CONSIDERAÇÕES DO CONTEXTO DE TRATAMENTO/ATUAÇÃO
2. RELATO DO PROCESSO DE AVALIAÇÃO
2.1 IDENTIFICAÇÃO DO CLIENTE (Dados Gerais: Nome, Idade, entre outros)
2.2. HISTÓRIA CLÍNICA/SOCIAL
2.2.1 Perfil Psicossocial
2.2.2 Queixas principais
2.2.3 História Mórbida/Social: (Atual, Pregressa e/ou Familiar)
2.3 PERFIL OCUPACIONAL (Anamnese)
2.3.1 Experiências e histórico ocupacional, padrões de vida, interesses, valores e
necessidades
2.3.2 Problemas de Desempenho Ocupacional
2.3.3 Prioridades do Cliente
2.4 ASPECTOS AVALIADOS
( ) Áreas da Ocupação ( ) Padrões de Desempenho
( ) Fatores do Cliente ( ) Contexto e Ambiente
( ) Habilidades de Desempenho
2.5 ESTRATÉGIAS UTILIZADAS:
( ) Entrevista elaborada pelo Estagiário/Supervisor
( ) Técnica de Observação
( ) Protocolo de Avaliação Não-Validado
( ) Protocolo de Avaliação Validado
( ) Outro? Qual?____________________________________________________
_______________________________________________________________
2.6 ANÁLISE DO DESEMPENHO OCUPACIONAL
1 A linguagem adotada está baseada no “Occupational Therapy Practice Framework: Domain and
Process” (AOTA, 2008). Este documento está organizado em duas partes. Na primeira é apresentado o
Domínio da Terapia Ocupacional (objeto de investigação e intervenção) e na segunda, o Processo da Terapia Ocupacional. Para melhor compreensão dos termos e raciocínio clínico empregado no protocolo,
consultar o referido documento.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
170
2.6.1 Ocupação/Atividade/Tarefas analisadas
2.6.2 Protocolos utilizados (Análise Básica da Tarefa/Análise de Demanda/Análise
Aplicada)
2.6.3 Resultados
2.7 CONCLUSÃO DO PROCESSO DE AVALIACÃO
2.7.1 Diagnóstico/Parecer Técnico
2.7.2 Encaminhamentos
3. RELATO DE INTERVENÇÃO
3.1 PLANO DE INTERVENÇÃO
3.1.1 Objetivos (Gerais e Específicos/Curto, Médio e Longo Prazo)
3.1.2 Abordagem(ns) de Intervenção
3.1.2.1 Tipos de Abordagem
( ) Promoção de Saúde
( ) Remediação/Restauração
( ) Manutenção
( ) Modificação: Compensação e Adaptação
( ) Prevenção
3.1.2.2 Teorias/Modelos/Quadros de Referências sustentam e/ou se articulam ao(s) tipo(s)
de abordagem(ns) selecionada(s)
( ) Teoria. Qual?
( ) Modelo Externo à Terapia Ocupacional. Qual?
( ) Modelo de Terapia Ocupacional. Qual?
( ) Quadro de Referência. Qual?
3.1.3 Indicação dos Tipos de Intervenção em Terapia Ocupacional:
( ) Uso terapêutico do Self
( ) Uso Terapêutico de Ocupações e Atividades
( ) Intervenção baseada em ocupações
( ) Atividade com propósito
( ) Métodos preparatório (métodos e técnicas)
( ) Processo de Consultoria: ( )Pessoa ( )Organização ( )População
( ) Processo Educacional: ( )Pessoa ( )Organização ( )População
( ) Justiça Ocupacional: ( )Pessoa ( )Organização ( )População
3.1.4 Modalidade de Atendimento
( ) Individual
( ) Grupo
3.1.5 Periodicidade
( ) Atendimento
( ) Diário
( ) Semanal
( ) Quinzenal
( ) Outro?______________________________________________________
( ) Acompanhamento
3.1.6 Duração da Intervenção
3.2 IMPLEMENTAÇÃO DA INTERVENÇÃO
3.2.1 Tipos de Intervenção em Terapia Ocupacional usados
( ) Uso terapêutico do Self
( ) Uso Terapêutico de Ocupações e Atividades
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
171
( ) Intervenção baseada em ocupações
( ) Atividade com propósito
( ) Métodos preparatórios (métodos e técnicas)
( ) Processo de Consultoria: ( )Pessoa ( )Organização ( )População
( ) Processo Educacional: ( )Pessoa ( )Organização ( )População
( ) Justiça Ocupacional: ( )Pessoa ( )Organização ( )População
3.2.2 Freqüência e participação do cliente
3.2.3 Relatório do atendimento/sessão
3.2.4 Relato de Progresso
3.3 REVISÃO DA INTERVENÇÃO
3.3.1 Reavaliação do Plano e apontamento dos Resultados
3.3.2 Modificações no Plano de Intervenção
3.3.3 Processo de Alta ou Interrupção
4. RESULTADOS
4.1 Promoção de Saúde e Participação na Vida através do Engajamento em Ocupações
4.2 Seleção de Medidas de Resultados
4.3 Evidências
REFERÊNCIAS BIBILIOGRÁFICAS (as utilizadas para guiar o Raciocínio Clínico no
Processo de Terapia Ocupacional)
ASSINATURAS
SUPERVISOR DE ESTÁGIO (obrigatório)
PRECEPTOR DE ESTÁGIO (quando for o caso)
ESTAGIÁRIO (obrigatório)
RESPONSÁVEL PELO SERVIÇO (quando for o caso)
Figura 1: Documento Guia para Registro do Processo de Terapia Ocupacional, em
Campos de Estágios Supervisionados
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Uma análise da primeira versão do protocolo indica pontos positivos e negativos.
Dentre os pontos negativos estão: o tempo necessário para preenchimento de todo o
protocolo; a aplicabilidade em contextos de atuação onde o estudante/estagiário tinha
um número de contato restrito (um a três contatos); a não utilização em todos os campos
de estágios; a incompatibilidade da forma de registro proposta no protocolo com outras
formas já incorporadas em serviços onde aconteciam os estágios; tempo disponível do
docente/supervisor para o acompanhamento e correção desse protocolo durante as
atividades de estágio. Quanto aos pontos positivos estão: a existência de uma estrutura
com linguagem padronizada que guiava o raciocínio clínico e o processo de
aprendizagem de registros clínicos; organização e posse de dados dos Processos de
Terapia Ocupacional vivenciados no campo de estágio; facilitação da continuidade da
assistência a determinado cliente e/ou grupo pelo estudante/estagiário em suas
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
172
mudanças de campo de estágio; facilitação para a elaboração de estudos de caso e
apresentação de resultados em reuniões de equipe.
A partir das considerações de docentes/supervisores e estudantes/estagiários, o
protocolo foi sendo revisto a cada semestre. Quanto aos pontos negativos, os autores do
protocolo em reuniões pedagógicas com os docentes/supervisores discutiam e
propunham adaptações para facilitar a aplicabilidade do protocolo, enquanto ferramenta
pedagógica para supervisões de estágio. Entre as adaptações, estavam: a seleção de um
caso clínico (cliente/grupo) para que estudante/estagiário pudesse preencher o protocolo
por completo e instigá-lo a generalizar tal conhecimento para outras situações; a
utilização do protocolo para preparação de estudos de caso; preenchimento, ainda que
incompleto apenas com as informações existentes, como forma de mostrar ao
estudante/estagiário a necessidade de síntese durante o Processo de Terapia
Ocupacional, ou seja, mesmo em situações onde o número de contatos é limitado, o
estudante/estagiário deve estar atento para tomar decisões que contemplem todo
processo. Os pontos positivos foram reforçados para estimular a utilização por parte
daqueles que demonstravam resistência e potencializar as estratégias de aplicação nos
campos de estágios e ampliação da utilização do protocolo em disciplinas aplicadas e de
Fundamentos de Terapia Ocupacional, como, por exemplo, a de Processo de Avaliação
e Intervenção em Terapia Ocupacional1, Terapia Ocupacional Aplicada à Atenção
Básica2 e Terapia Ocupacional Aplicada à Geriatria e Gerontologia
1.
Os ajustes, que foram sendo feitos na forma de aplicação do protocolo juntamente com
as mudanças em referenciais teóricos de saúde e da profissão, resultaram na atualização
desse protocolo. A sua utilização tem facilitado os registros clínicos em estágios
supervisionados e favorecido o raciocínio clínico de forma contextualizada, reflexiva e
esclarecedora da especificidade da profissão. Das competências e habilidades gerais
apontadas pelas Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Terapia
Ocupacional, a utilização do protocolo tem favorecido o Raciocínio Clínico de forma a
potencializar estratégias de ensino no desenvolvimento de: I - Atenção à saúde: os
1 Disciplina do 2º Período do Curso de Graduação de Terapia Ocupacional da UFPR. 2 Disciplina do 4º Período do Curso de Graduação de Terapia Ocupacional da UFPR.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
173
profissionais de saúde, dentro de seu âmbito profissional, devem estar aptos a
desenvolver ações de prevenção, promoção, proteção e reabilitação da saúde, tanto em
nível individual quanto coletivo; II - Tomada de decisões: o trabalho dos profissionais
de saúde deve estar fundamentado na capacidade de tomar decisões visando ao uso
apropriado, eficácia e custo/efetividade da força de trabalho, de medicamentos, de
equipamentos, de procedimentos e de práticas. Para esse fim, esses profissionais devem
possuir competências e habilidades para avaliar, sistematizar e decidir as condutas mais
adequadas, baseadas em evidências científicas; III - Comunicação: a comunicação
envolve comunicação verbal, não verbal e habilidades de escrita e leitura; IV -
Liderança: envolve compromisso, responsabilidade, empatia, habilidade para tomada de
decisões, comunicação e gerenciamento de forma efetiva e eficaz; V - Administração e
gerenciamento: os profissionais devem estar aptos a tomar iniciativas, fazer o
gerenciamento e administração tanto da força de trabalho, dos recursos físicos e
materiais e de informação, da mesma forma que devem estar aptos a serem
empreendedores, gestores, empregadores ou lideranças na equipe de saúde; VI -
Educação permanente: os profissionais devem ser capazes de aprender continuamente,
tanto na sua formação, quanto na sua prática. (BRASIL, 2002, p. 01 e 02).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Sabemos que toda e qualquer padronização possui suas vantagens e desvantagens. A
formação de terapeutas ocupacionais exige no mínimo um compromisso ético e social
com a população a ser assistida e com os estudantes/graduandos. Pensar o Processo de
Terapia Ocupacional e como este é registrado, documentado, pode facilitar o olhar
crítico e reflexivo da prática profissional que ocorre em campos de estágios neste
processo de formação. Para tanto, é necessário que se padronizem procedimentos, entre
eles, o registro clínico. A padronização é necessária para que se saiba o que é possível
flexibilizar e o que não é, ou ainda, se determinado protocolo é viável e eficaz ou não,
se há necessidade e possibilidade de adaptação ou elaboração de outro. Estes
questionamentos, entre tantos outros, surgem a partir do momento em que se padroniza.
Logo, padronizar aguça os nossos sentidos na observação da realidade e nos faz
questionar, criticar, refletir e mudar. Este é o caminho que temos trilhado ao longo
1 Disciplina do 7º Período do Curso de Graduação de Terapia Ocupacional da UFPR.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
174
destes cinco anos de utilização do protocolo “Documento Guia para Registro do
Processo de Terapia Ocupacional, em Campos de Estágios Supervisionados”.
Acreditamos que este protocolo representa apenas uma, dentre tantas outras já
elaboradas, aplicadas, criticadas e revistas tentativas que buscam melhorar o ensino em
Terapia Ocupacional em nosso país e facilitar o processo de ensino e aprendizagem
daqueles que são o presente e o futuro desta profissão – nossos estudantes/graduandos
em Terapia Ocupacional. Também almejamos que esta ferramenta torne o aprendizado
significativo, reflexivo e transformador.
Por fim, agradecemos àqueles que se permitiram utilizar, criticar, sugerir e implementar
as modificações necessárias ao aperfeiçoamento desta ferramenta.
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Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
176
CRÔNICAS DE ENCONTROS E NOTÍCIAS DO MUNDO - A PRESENÇA DAS
NARRATIVAS NO ACOMPANHAMENTO DO DESEMPENHO
PROFISSIONAL DE ESTUDANTES DE TERAPIA OCUPACIONAL
ERIKA ALVAREZ INFORSATO
1
MARIA ISABEL GARCEZ GHIRARDI2
RESUMO
O acompanhamento de estudantes em fase final de formação na graduação em Terapia
Ocupacional exige a pesquisa contínua de modos de expressão e instrumentos de
localização e deslocamento diante de um cenário profissional com vinculações e
constituições institucionais delicadas. O trabalho aqui apresentado é um ensaio neste
campo de ensino-aprendizagem. Uma produção de crônicas de encontros e notícias do
mundo foram os percursos narrativos propostos com os quais se buscou estimular a
posição autoral das estudantes diante do próprio trajeto, além da indagação sobre as
intervenções produzidas em lugares determinados no espaço urbano. Quinze aulas, com
doze estudantes de quarto ano, foram molduras dessa incursão durante a disciplina
Desempenho Profissional em Terapia Ocupacional. A cada aula, buscou-se estimular a
produção narrativa do vivido em diversos panoramas que compõem as disciplinas
práticas profissionalizantes, por meio de coleção de notícias; leitura de extratos
literários; rodas de conversa; filmes; oficinas de sensibilização para a escrita; e
atividades pontuais de trocas com estudantes de todos os períodos do curso e com o
espaço urbano. O entrecruzamento das cenas vivenciadas nos estágios com os exercícios
propostos pela disciplina investiu numa direção ética e política em que o pensamento
das formas de presença profissional e suas implicações na produção dos discursos e
práticas permitiram às estudantes um reconhecimento autoral que, no geral, acentuou
sua responsabilidade para com o coletivo – micro e macro – além de incentivá-las à
invenção de caminhos – não usuais, nem compulsórios – de produção e trocas das
narrativas desses instantes.
PALAVRAS-CHAVE: Terapia Ocupacional, Ensino, Métodos, Narrativa, Prática
Profissional.
1 Terapeuta Ocupacional do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP. [email protected] 2 Profª Drª do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
177
Tudo é vida, tudo é motivo de experiência e reflexão, ou
simplesmente de divertimento, de esquecimento momentâneo de
nós mesmos a troco do sonho ou da piada que nos transporta
ao mundo da imaginação. Para voltarmos mais maduros à vida, conforme o sábio. (CANDIDO, 2004, p. 32).
INTRODUÇÃO
O cenário ético-político de inscrição das práticas em Terapia Ocupacional complexifica-
se na mesma medida de sua expansão. Atualmente, a formação de estudantes de
graduação nesta área tem como espaços de experimentação práticas muito variadas –
dentro e fora do âmbito universitário – que, em geral, provocam tensionamentos
significativos no contraste entre o espaço acadêmico da sala de aula e a exposição aos
espaços profissionais.
A inscrição social dessas experiências se dá numa ambiência de passagem, com
elementos da sociedade disciplinar e de controle cuja lógica é de domínio dos corpos
em circulação. Muitos jovens solicitam novos estágios e formação permanente. Cabe a
eles descobrir a que estão sendo levados a servir, assim como seus antecessores
descobriram, não sem dor, a finalidade das disciplinas (Deleuze,1992). Assim, a
construção de uma posição crítica torna-se urgente e, nesse sentido, o papel dos espaços
de acompanhamento e formação deve operar com responsabilidade aguda.
No caso específico da formação em Terapia Ocupacional, diante de um mapa
profissional com vinculações e constituições institucionais delicadas, verifica-se que o
acompanhamento dos estudantes em fase de conclusão da graduação exige pesquisa
contínua de modos de expressão e de instrumentos de localização e deslocamento. Disso
decorre que o curso de graduação em Terapia Ocupacional da USP/SP, seguindo as
diretrizes curriculares do Ministério da Educação, propõe, no sétimo semestre de sua
grade curricular, a disciplina Desempenho Profissional em Terapia Ocupacional. Essa
disciplina tem como proposta “favorecer que o aluno elabore as experiências de
estágios, as articule às reflexões sobre a construção do campo profissional e se aproprie
de elementos que irão compor a estruturação da vida profissional” (USP, 2010).
Durante o 1º semestre de 2010, o desenvolvimento desta disciplina delineou uma
estratégia de ensino-aprendizagem que teve lugar num ambiente de experimentação
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
178
contínua de modos de expressão, de instrumentos de localização e de deslocamento,
neste cenário profissional complexo. O trabalho aqui apresentado é um ensaio dessa
estratégia.
OBJETIVOS
A proposição principal para a disciplina no 1º semestre de 2010 foi a de articular um
espaço de interlocução semanal sobre aspectos do desempenho da terapia ocupacional,
de modo a favorecer, a partir das experiências práticas das estudantes em seus diversos
locais de estágio, o compartilhamento das vivências, e provocar uma relação crítica com
as implicações do exercício profissional como forma de intervenção social.
A possibilidade de encontrar uma autoria, um discurso impessoal e coletivo que,
paradoxalmente, abarcasse a singularidade das vivências nos estágios e as transpusesse
ao plano da experiência – passível de compartilhamento – foi um elemento transversal
elencado como foco importante deste trabalho didático.
Assim, o curso organizou-se a partir de dois percursos narrativos: crônicas de encontros
e notícias do mundo, que conduziram a organização da disciplina numa forma de
experimentação e de articulação de níveis de complexidade profissional diversos
pautando a condição autoral do discurso profissional, considerando os compromissos e
responsabilidades dela decorrentes.
MATERIAIS E MÉTODOS
Tendo em vista os eixos norteadores do trabalho da disciplina, no início do semestre,
um esboço de plano de percurso foi proposto, considerando-se que pudesse ser
modificado durante os encontros semanais. Numa perspectiva panorâmica, as estratégias
metodológicas propostas foram:
mapear os diversos locais de estágio, bem como a variedade das práticas de cada
estudante nesses locais;
elencar temas de interesse de cada estudante e temas de interesse coletivo no
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
179
campo do desempenho profissional;
definir coletivamente formas de abordagem das temáticas elencadas; dialogar
com profissionais do campo da terapia ocupacional, convidando-os a participar
dos debates coletivos;
elaborar maneiras de evidenciar as ressonâncias da ação profissional na vida
cotidiana;
construir um acervo dos encontros semanais.
Para tanto, os procedimentos adotados circunscreveram-se a algumas ações sistemáticas
e outras pontuais, costurando as proposições iniciais com as emergentes no andamento
do processo. Assim se obteve:
coleção de notícias das circunstâncias atuais relacionadas, de modo mais ou
menos evidente, às experiências vivenciadas nas situações de estágio;
rodas de conversa e atualização dos acontecimentos semanais, entrecruzando a
cidade e os espaços específicos de estágio, para acolhimento dos pontos de
conflito, análise coletiva das situações, construção crítica de alguns
posicionamentos e intervenções;
leitura coletiva de textos indicados e outros selecionados pelas estudantes,
fossem extratos ou pequenos textos de diários ou livros, escritos acadêmicos,
contos, poemas, estudos, narrativas, crônicas, artigos de periódicos etc.;
oficinas de sensibilização para a escrita, com momentos de acolhimento,
estímulo e apropriação do processo de escrita;
produção de narrativas na forma de crônicas, cartas e relatos;
exercícios inventivos de situações de questionamento e flexibilização dos
lugares de poder internos ao espaço da disciplina (proposição e coordenação de
atividades didáticas pelas estudantes, mudanças do cenário da sala de aula,
sustentação de atividades externas);
construção de um mapa avaliativo das trajetórias individuais e coletivas
vivenciadas de forma entrecruzada no decurso da disciplina.
RESULTADOS
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
180
Quinze encontros de quatro horas reuniram, semanalmente, um grupo de quatorze
mulheres, doze na posição de estudantes e duas na de docentes. Durante as três
primeiras semanas de cada mês as estudantes buscaram na mídia notícias do mundo
que, na sua perspectiva, se relacionavam com a prática profissional a que estavam se
dedicando naquele semestre. Na quarta semana elas deveriam produzir, a partir das
vivências transcorridas ao longo daquele mês, narrativas referidas no gênero crônica.
Essas crônicas de encontros foram constituindo camadas de consistência para o
processamento e o compartilhamento das experiências, por meio de estratégias de rodas
de leitura e de conversas e da composição de painéis coletivos. As aulas, ou encontros,
às quintas-feiras no período da manhã, constelavam o cenário em que a produção
autoral ganhava visibilidade. Essa visibilidade permitia um espessamento da discussão
em torno da prática ou do desempenho profissional. O território da ação ganhava
complexidade também pela percepção da relação autoral, de estilo, no fazer
profissional.
A partir de alguns disparadores coletivos, durante os encontros e oficinas, os estudantes
foram convidados à preparação de textos, na forma de narrativas de instantes (crônicas),
em estreita relação com as experiências profissionais efetuadas nos campos de estágio
em Terapia Ocupacional e com os temas do entorno da cidade abordados, na coleção de
notícias discutidas no decorrer da disciplina. A cada estudante foram oferecidos três
momentos de produção de textos que posteriormente foram apreciados, numa
interlocução crítica, cuja devolutiva era também um exercício de confrontação com os
lugares de poder do leitor e também com a produção acadêmica na qual duas leitoras
detinham também o lugar de professoras.
A escolha do gênero literário da crônica se deu em função da possibilidade que o
mesmo oferece de se lidar com o efêmero cotidiano, de navegar pela superfície dos
fatos, numa sintaxe solta entre o literário e o coloquial, que favorece a abordagem de
temáticas aparentemente banais e insignificantes do dia-a-dia, oferecendo-lhes
relevância e espaço de exploração crítica. Considerando a especificidade do gênero
crônica, Antonio Candido (2004), ressalta que
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
181
“... o fato de ficar tão perto do dia-a-dia age como quebra do monumental e da
ênfase. Não que estas coisas sejam necessariamente ruins. Há estilos roncantes
mas eficientes, e muita grandiloquência consegue não só arrepiar, mas nos
deixar honestamente admirados. O problema é que a magnitude do assunto e a pompa da linguagem podem atuar como disfarce da realidade e mesmo da
verdade. A literatura corre com frequência este risco, cujo resultado é quebrar
no leitor a possibilidade de ver as coisas com retidão e pensar em consequência disto. Ora, a crônica está sempre ajudando a estabelecer ou restabelecer a
dimensão das coisas e das pessoas. Em lugar de oferecer um cenário excelso,
numa revoada de adjetivos e períodos candentes, pega o miúdo e mostra nele uma grandeza, uma beleza ou uma singularidade insuspeitadas.” (p. 26-7)
Os escritos produzidos transitaram com leveza por entre elementos desse gênero de
escrita, sem a ele aprisionar-se, resultando em narrativas espirituosas por onde dor,
indignação e encantamento surgiam em imagens leves e fugidias, que pareciam ser
parceiras das estudantes na tentativa de diluir momentos duros de sofrimento e solidão,
inevitáveis no exercício profissional.
Raramente esses textos puderam ser lidos coletivamente, ainda que houvesse muitas
situações de convite. A extensão de modos de expressão no campo profissional foi
percebida em sintonia com exercícios efetivos de estilo e prazer de escrita. Ainda assim,
a situação de troca era sempre enfrentada com constrangimento e desconforto,
revelando que a autoria permanecia como um ponto de dificuldade de exposição.
Ocorreram intercâmbios de leitura silenciosa, entre algumas leitoras com as quais as
estudantes tinham mais intimidade na turma, além de situações pontuais em que alguns
trechos foram lidos para uma gravação que preservara o anonimato das autoras, e
recortados para a construção de um painel coletivo sem assinaturas individuais, numa
tentativa de compartilhamento autoral.
No geral, o espaço de conversa foi predominante em relação aos demais gestos, os quais
mostraram uma flutuação sensível, menos apreensível para aquele momento. A
possibilidade de acomodação cognitiva dessas experimentações era conflitante com os
sobressaltos e urgências no contato com a população, equipes e serviços onde se dava
sua prática profissionalizante.
DISCUSSÃO
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
182
Focalizar a atenção em acontecimentos que ocorrem no contexto urbano em que as
práticas profissionais se ancoram e narrar o acontecido em encontros, num espaço de
estranhamento, foram estratégias que abriram possibilidades de esboçar lugares
profissionais autorais.
Para avaliação do percurso metodológico da disciplina considerou-se que o desempenho
acadêmico das estudantes estaria atrelado a uma dessincronização entre a
experimentação e a possibilidade de reconhecimento de seus efeitos. Mesmo diante de
um acesso limitado à assimilação do vivido, os sinais que permitiram assumir a
efetividade do processo se relacionaram ao deslocamento sutil e errante dos corpos e
dos discursos na relação com o entorno.
Considerando os vários exercícios realizados no decorrer da disciplina, é possível
pensar de um modo ampliado aquilo que Barthes (2006) refere em relação ao texto:
“O prazer do texto não é forçosamente do tipo triunfante, heróico,
musculoso. Não tem necessidade de se arquear. Meu prazer pode muito bem assumir a forma de uma deriva. A deriva advém toda a vez que eu
não respeito o todo e que, à força de parecer arrastado aqui e ali ao
sabor das ilusões, seduções e intimidações da linguagem, qual uma
rolha sobre as ondas, permaneço imóvel, girando em torno da fruição intratável que me liga ao texto (ao mundo). Há deriva, toda vez que a
linguagem social, o socioleto, me falta (como se diz: falta-me o ânimo).
Daí por que outro nome da deriva seria: o Intratável [...].”
O entrecruzamento das cenas vivenciadas nos estágios com os exercícios propostos pela
disciplina investiu numa direção ética e política em que o pensamento das formas de
presença profissional e suas implicações na produção dos discursos e práticas permitiu
às estudantes um reconhecimento autoral que, no geral, acentuou sua implicação com o
engendramento do coletivo – micro e macro – além de incentivá-las à invenção de
caminhos – não usuais, nem compulsórios – de produção e trocas das narrativas desses
instantes. Os vários gestos produzidos na disciplina constelaram momentos de deriva,
importantes para abarcar, de um modo crítico e melhor localizado, a complexidade das
práticas em Terapia Ocupacional inscritas neste mundo de controle e porvir.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARTHES, R. O prazer do texto. São Paulo: Ed. Perspectiva, 2006.
CANDIDO, A. A vida ao rés-do-chão. In: Recortes. Rio de Janeiro: Ed. Ouro sobre
Azul, 2004. p. 26-34.
DELEUZE, G. Post-scriptum sobre as sociedades de controle. In: Conversações.
Rio de Janeiro: Ed. 34, 1992. p. 219-26.
USP, Júpiter - Sistema de Graduação. Informações sobre a disciplina: MFT0154
Desempenho Profissional em Terapia Ocupacional. Disponível no site:
http://sistemas2.usp.br/jupiterweb/obterDisciplina?sgldis=MFT0154&verdis=3. Acesso
em 20 ago 2010.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
184
A AÇÃO COMO PRECURSORA DO PENSAMENTO NO HUMANO
FERNANDA CRISTINA MARQUETTI1
ROBERTO TYKANORI KINOSHITA2
RESUMO
Introdução: A Terapia Ocupacional geralmente tem seus pressupostos teóricos
ancorados em diversas áreas como psicologia, sociologia, medicina, entre outras. Essa
estratégia de fundamentação teórica da profissão faz que algumas vezes o caminho
traçado teoricamente apresente vieses que nos desviam do foco principal da nossa
profissão: ação e atividades. No módulo “A ação como precursora do pensamento no
humano” buscamos fundamentar a prática da TO a partir dos efeitos do próprio
processo da ação/atividades no sujeito. Justificativa: Contribuir para o eixo identitário
da profissão. Objetivos: fundamentar o ensino e a prática da TO na teoria da ação;
demonstrar a importância da ação/atividade na filogênese e na ontogênese;
problematizar no ensino da TO a noção de supremacia do pensamento em relação à ação
humana. Metodologia: Este módulo de ensino foi ministrado em três turmas do curso
de TO da UNIFESP e visava construir um modelo teórico da ação que consolidasse a
prática da TO nas diversas áreas de atuação. Também elaboramos aulas vivenciais que
demonstravam como as ações, as sensibilidades do corpo e as atividades são precursoras
de pensamentos e afetos no homem. Resultados: Ao final da experiência pudemos
observar o aprendizado dos alunos na construção de uma prática de TO a partir de
concepções teóricas mais pertinentes ao estudo da ação humana. Esse processo teve
como repercussões no curso: um projeto de monitoria, a elaboração de Atividade de
Extensão com alunos da TO e a construção de uma linha de pesquisa.
PALAVRAS CHAVES: Ação Humana, Ensino, Terapia Ocupacional.
INTRODUÇÃO
O módulo de ensino do curso de Terapia Ocupacional da UNIFESP/Baixada Santista
1 Prof.ª Dr.ª do curso de Terapia Ocupacional do Departamento de Ciências da Saúde, Universidade
Federal de São Paulo, campus Baixada Santista [email protected] 2 Prof. Dr. do Departamento de Ciências da Saúde, Universidade Federal de São Paulo, campus Baixada
Santista.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
185
“A Ação como precursora do pensamento no humano” tem como objetivo principal
criar uma matriz teórica centrada na ação humana e articular as diversas áreas da
Terapia Ocupacional. Ou seja, buscamos subsídios teóricos próprios para a Terapia
Ocupacional e também uma articulação com todas as áreas deste campo: saúde mental,
campo social, reabilitação física, educação, etc.
A construção de uma matriz teórica da ação para a Terapia Ocupacional, neste projeto
de ensino e aprendizagem, buscou construir um referencial conceitual centrado no
núcleo identitário da profissão: a ação humana. Para o desenvolvimento de uma teoria
centrada na ação humana, consideramos que um dos obstáculos está no pré-conceito de
que a ação humana está fundada pelo pensamento. A inversão desta lógica de
pensamento apresenta desafios importantes, pois vemos que a construção do
pensamento científico está dada em outras bases. Nesta experiência optamos por um
caminho alternativo ao tradicional, sustentado na premissa de que as ações, gestos,
emoções são precursores do pensamento.
No módulo de ensino “A ação como precursora do pensamento no humano” buscamos
novos pressupostos teóricos para compor esta fundamentação da Terapia Ocupacional a
partir do processo da ação, das atividades e de seus efeitos na produção do humano.
Trabalhamos com autores como Humberto Maturana e Varela da Teoria da Enação
(2001) e Leroi-Gourhan (1965).
Na teoria da Enação temos como principais conceitos: o acoplamento estrutural entre
organismo e meio, a ação corporificada, a auto-organização como capacidade do
sistema vivo de se transformar continuamente na interação com o meio, o conhecimento
como processo auto-organizador, a natureza retroativa e recursiva dos sistemas
dinâmicos na busca constante do equilíbrio, a causa e efeito transformando-se
mutuamente, o sujeito como interprete da realidade de acordo com suas estruturas, a
circularidade como condição fundamental da auto-organização dos sujeitos, a
complexidade dos diversos elementos que constituem um sistema, a refutação da
fragmentação da realidade e a mudança como parte intrínseca da natureza da matéria
(MATURANA, 2001).
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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Da perspectiva teórica de Leroi-Gourhan (1965) nós articulamos alguns conceitos na
nossa matriz teórica: cadeias operatórias, rupturas de cadeias operatórias, reorganização
de cadeias operatórias, exteriorização de gestos em utensílios, as sensibilidades
corpóreas como fundamentos dos valores humanos, entre outros.
Esta proposta de matriz teórica centrada na ação para o curso de Terapia Ocupacional
mostrou-se produtiva, pois permitiu o desenvolvimento de um conjunto de conceitos
alternativos para a reflexão teórico-prática da profissão. Este processo de ensino foi
desenvolvido em quatro turmas do curso e revelou uma apreciação e valorização desta
nova perspectiva pelos alunos, talvez porque contribua para a identidade da profissão.
OBJETIVOS
A elaboração deste módulo de ensino teve alguns objetivos, todos eles articulados numa
proposta de construção de um curso novo de Terapia Ocupacional na UNIFESP/BS.
Neste processo também estabelecemos vários diálogos com outros módulos do curso de
Terapia Ocupacional, como os módulos de Atividades e Recursos Terapêuticos e os
módulos de Terapia Ocupacional Aplicada às diversas áreas da profissão. Elencamos
como objetivos:
* Construir uma matriz teórica para a Terapia Ocupacional baseada na “Ação Humana”;
* Valorizar a profissão a partir de aspectos inerentes à Terapia Ocupacional, ao invés de
construir fundamentações teóricas sustentadas na psicologia, medicina,e outras áreas de
conhecimento;
* Resgatar o eixo identitário da profissão: a ação e as atividades;
* Articular os vários campos teóricos da profissão num único referencial teórico e
conceitual, atribuindo, assim, unicidade às várias áreas de atuação da Terapia
Ocupacional;
* Contribuir para a identidade profissional.
MATERIAIS E MÉTODOS
O processo de construção de conhecimento no módulo de ensino foi elaborado a partir
de várias discussões entre os professores responsáveis e muitas diferenciações e
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
187
contribuições foram incorporadas de uma turma para outra. O módulo é ministrado por
dois docentes, um da área de Terapia Ocupacional e o segundo de outra formação
acadêmica, especialista na Teoria da Enação. Esta possibilidade de uma apresentação
dos conteúdos do módulo por dois docentes com diferentes formações, complementares,
mas, por vezes, com perspectivas e concepções diversas enriquece a produção
acadêmica junto aos alunos. O módulo de ensino possui alguns princípios que
apresentamos abaixo comuns a todas as turmas.
Este módulo de ensino foi ministrado desde o início do curso de Terapia Ocupacional
da Universidade Federal de São Paulo/Baixada Santista. Até o momento este processo
de ensino se deu em quatro turmas (nos anos de 2007, 2008, 2009 e 2010), sendo cada
turma composta de 30 alunos. A carga horária do módulo é de 4 horas semanais, com
20 encontros no semestre, totalizando 80 horas semestrais.
O módulo é proposto aos alunos em sala de aula como um processo de ensino específico
para o curso de Terapia Ocupacional, com base em conceitos que valorizam a
identidade profissional e uma fundamentação teórica especifica para a profissão. Na
grade curricular do curso de Terapia Ocupacional o módulo “A ação como precursora
do pensamento no humano” está inserido no eixo das ART (cinco módulos referentes a
Atividades e Recursos Terapêuticos).
Também esclarecemos aos alunos que o módulo é composto de dois blocos
concomitantes que ocorrem em paralelo ao longo do semestre: um de aulas teóricas, que
articulam autores diferentes daqueles usualmente abordados na área, e outro de aulas-
vivências que visam fazer experimentações sobre os conteúdos teóricos estudados.
Os subtópicos dos blocos de ensino no módulo são:
* A divisão Mente-Corpo estabelecida pelo pensamento ocidental e como esta
influenciou e distorceu a compreensão do humano;
* A compreensão do processo de como “A ação precede o pensamento” e as
consequências desta concepção no conhecimento do humano;
* A construção da mente pelo fazer/ação na interação sociocultural;
* O reconhecimento de como os aspectos da ação/fazer foram relegados ao segundo
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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plano no pensamento científico atual;
* A compreensão de como a ação/atividade pode ser produtora de pensamento;
* A discussão das relações entre a ação e a construção do código simbólico da
linguagem;
* A articulação de conceitos da teoria da Enação com o campo da Terapia Ocupacional:
campo operatório, autopoiese, acoplamento estrutural, coordenação de condutas, deriva
estrutural, interações instrutivas, relações entre organização e estrutura, a constituição
do observador, entre outros;
* A articulação de conceitos de Leroi- Gourhan com o campo da Terapia Ocupacional: a
constituição, as rupturas e reorganização das cadeias operatórias, os aspectos da
ação/fazer exteriorizados pelo homem e as consequências deste processo para o
humano, os fundamentos básicos corporais: sensibilidade visceral e muscular,
tato/olfato/gustação e integração espaço-temporal como determinantes na organização
do pensamento e afeto do sujeito, a percepção e organização do tempo e do espaço
consolidadas sobre a ação e o fazer do homem, entre outros.
Em todos estes tópicos sempre articulamos este referencial conceitual e sua concepção
de homem com o campo e a prática da Terapia Ocupacional.
As aulas-vivências são específicas para cada tema do módulo. A título de
exemplificação citamos algumas:
* Vivência de coordenação de ação e emoção: nesta experiência os alunos divididos em
dois grupos devem executar uma tarefa simples (passar grãos de uma vasilha a outra
com utensílios confeccionados por eles com alguns materiais) sem o uso das mãos e
sem linguagem verbal. Nesta atividade busca-se que os alunos encontrem uma solução
para o problema proposto com ações e emoções coordenadas do grupo. Discutimos
como é esta coordenação de ação-emoção do grupo que permite a solução do problema
e não a construção de um pensamento e sua posterior aplicação na solução.
* Vivência no laboratório de atividades da vida diária sobre a especificidade das cadeias
operatórias de cada sujeito: solicitamos que dois alunos executem os gestos cotidianos
de levantar-se, tomar café da manhã, vestir-se e sair para a faculdade. Posteriormente
discutimos como as cadeias operatórias de cada aluno são diversificadas e como
revelam o sujeito e sua história inscrita nos gestos.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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* Experimentação das sensibilidades tátil, gustativa, olfativa, cenestésica-cinestésica:
nesta atividade nosso objetivo é comprovar como estas formas de sensibilidade
conformam o pensamento e a emoção do sujeito. Para alcançar tal objetivo na
experimentação solicitamos aos alunos que limitem a forma de apreensão da realidade
mais usada no nosso cotidiano (visão) e observem como as outras sensibilidades são
significativas na formação da percepção, do afeto, da memória, das cadeias operatórias
do sujeito. Também discutimos como a ausência de qualquer uma destas sensibilidades
desorganiza o sujeito. Assim, reiteramos nossa proposta, ou seja, a de que mais
significativas que a linguagem verbal-pensamento são as ações/gestos e as
sensibilidades do corpo.
A forma de acompanhamento e avaliação dos alunos neste módulo é feita por meio de
diários de classe onde os alunos elaboram suas reflexões em algumas diretrizes
apontadas pelos professores: as percepções e conexões entre as aulas teóricas e as aulas-
vivências, as possíveis relações entre o conteúdo deste módulo e os outros módulos do
curso e as relações entre o conteúdo do módulo e os conhecimentos adquiridos sobre a
prática da Terapia Ocupacional.
RESULTADOS
Ao final desta experiência de ensino nestes quatro anos pudemos observar o
aprendizado dos alunos na construção de uma prática de Terapia Ocupacional com
concepções teóricas mais pertinentes ao estudo da ação humana. A partir da avaliação
dos alunos observamos alguns resultados. Acreditamos que o principal resultado obtido
seja o fortalecimento da identidade da profissão e a percepção pelos alunos da Terapia
Ocupacional de um conjunto teórico único e articulado.
No processo de ensino do módulo, geralmente surgem algumas dificuldades dada a
forma inversa de concepção de homem-mundo que é defendida conceitualmente. No
início do módulo, particularmente, há dificuldades de compreensão pelos alunos desta
concepção adotada, mas geralmente tais questões são diluídas, sanadas, ou apaziguadas
durante a sua evolução. Enfim, observamos pelos diários de classe dos alunos uma
excelente aceitação das propostas do módulo.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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Este processo também teve outras repercussões no curso de Terapia Ocupacional, sendo
um deles um projeto de monitoria. O projeto de Monitoria do curso de Terapia
Ocupacional que articulou os cinco módulos denominados Atividades e Recursos
Terapêuticos (ART) e o módulo “A ação como precursora do pensamento no humano”
foi muito significativo quanto à sua assimilação no conjunto do curso. Por isso
abordamos aqui este projeto sucintamente.
No curso de Terapia ocupacional da UNIFESP/BS são realizados cinco módulos
denominados Atividades e Recursos Terapêuticos (ART). Cada módulo possui suas
especificidades, entretanto este conjunto de módulos tem em comum objetivos gerais:
aprofundar o estudo de ações realizadas pelos seres humanos e proporcionar aos
estudantes a vivência de diversas atividades, assim como a análise e a compreensão
delas no processo terapêutico ocupacional e na constituição do homem. Além dos cinco
módulos temos como eixo central o módulo “A ação como precursora do pensamento
no humano” que, como descrevemos, aborda o desenvolvimento do homem na
perspectiva da filogênese e ontogênese, apontando a importância da ação na
constituição do humano.
O objetivo geral deste projeto acadêmico de monitoria foi estudar e desenvolver
atividades com a utilização dos conceitos teóricos estudados no módulo “A ação como
precursora do pensamento na constituição do humano” e articulá-los com as atividades
desenvolvidas nos cinco módulos de Atividades e Recursos Terapêuticos.
Participaram do projeto seis estudantes de Terapia Ocupacional, cada monitor ficando
responsável por um módulo específico. Isto lhe permitiu participar da elaboração de
atividades e aprofundar temas específicos para contribuir com a articulação do estudo
da ação como precursora do pensamento com os demais módulos de ART.
Todos os monitores participaram quinzenalmente da elaboração e efetivação de
atividades práticas, experimentações e vivencias com outros alunos da classe. A
proposta era articular os conteúdos do módulo “A ação como precursora do pensamento
no humano” com as diversas áreas do campo da Terapia Ocupacional e suas estratégias
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
191
de utilização de atividades.
Esse processo permitiu estabelecer as correlações existentes entre os seis módulos e
buscou melhorar o processo de ensino-aprendizagem dos conteúdos estudados. A
articulação entre os módulos de ART e o módulo “A ação como precursora do
pensamento no humano” permitiu nortear num eixo único as áreas, as práticas e o
ensino de atividades na formação do terapeuta ocupacional.
Entretanto, temos que ressaltar as dificuldades de aceitação dessa proposta teórico-
prática por parte do corpo docente do curso de Terapia Ocupacional. Ou seja, os
professores responsáveis pelos módulos de ART demonstraram pouca disponibilidade
em desenvolver suas linhas de estudo de atividades na perspectiva do módulo.
Observamos que a aceitação de tal desafio, na construção da proposta descrita, foi
assimilada melhor pelos alunos do curso.
Tal fato talvez se deva à cristalização de diferentes áreas no campo da Terapia
Ocupacional e suas respectivas concepções de atividade. Acreditamos que esta
fragmentação da profissão em diferentes campos de atuação e com diferentes
fundamentações teóricas tem como consequência um enfraquecimento da identidade
profissional. A diversidade de campos de atuação da Terapia Ocupacional é
enriquecedora se abordada num eixo organizador que ajude a construir uma identidade
profissional.
Outros resultados desta experiência de ensino foram: a elaboração de atividade de
extensão baseada nos princípios do módulo e a construção de uma linha de pesquisa.
Essas duas atividades consequentes ao módulo serão discutidas em outra parte, pois
fogem do âmbito da discussão da graduação.
DISCUSSÃO
Os conceitos campo operatório, acoplamento estrutural, deriva natural, coordenação de
ação e emoção, cadeias operatórias, inversão do postulado mente-corpo e outros se
descolam dentro do cotidiano da experiência de aprendizagem descrita como
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
192
fundamentais na compreensão do argumento do módulo.
Sabemos de antemão que tais conceitos incomuns ao campo da Terapia Ocupacional
devem ser paulatinamente discutidos e abordados dentro da nossa área se desejamos
uma discussão com nossos pares. A possibilidade de consolidação desta nossa
perspectiva para a Terapia Ocupacional depende do debate e discussão com o conjunto
de profissionais e estudantes da área. Por isso estamos seguindo este caminho para
ampliar a discussão sobre este projeto.
Apesar das dificuldades inerentes à construção de uma nova abordagem acreditamos
que os resultados são promissores, pois construímos uma legítima “Coordenação de
ação e emoção” com os alunos do curso de Terapia Ocupacional da UNIFESP/BS
durante este processo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRIGATTI, E. & RODITI, I. Como é que chama o nome disso? Ou como os Físicos
estudam o nascimento das palavras. Ciência Hoje, Vol. 45, No. 270, p. 38-43, 2010.
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GOURHAN, A. L. A. O gesto e a palavra: técnica e linguagem. Vol. I. Lisboa: Editora
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_____________. O gesto e a palavra: memória e ritmos. Vol. II, Lisboa: Editora
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MATURANA H. Emoções e linguagem na educação e na política. Belo Horizonte: Ed.
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2001.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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MATURANA, H.; YANEZ, X. D. Habitar Humano. São Paulo: Editora Palas Atena,
2009.
VÁSQUEZ, A. S. Filosofia da práxis. São Paulo/Buenos Aires: Editora CLACSO,
2007.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
194
METODOLOGIA DA PROBLEMATIZAÇÃO: ARTICULANDO SABERES A
PARTIR DOS CENÁRIOS DE PRÁTICA EM TERAPIA OCUPACIONAL
REGINA CÉLIA TITOTTO CASTANHARO1
RESUMO
Introdução e justificativa: A busca por procedimentos metodológicos que visam
favorecer o processo de ensino-aprendizagem tem norteado nossa prática docente,
enquanto formador reflexivo. Experiências com a Metodologia da Problematização em
campo de Estágios de Observação e Prática Terapêutica Supervisionada, nos últimos
três anos de curso, culminaram em procedimentos formativos qualificados e inovadores
enquanto currículo institucional. Objetivo: Divulgar experiências na implementação de
metodologias ativas nas disciplinas de Estágio de Observação e Prática Terapêutica
Supervisionada no Curso de graduação em Terapia Ocupacional da UFPR. Materiais e
Métodos: Foi utilizada a Metodologia da Problematização, seguindo as cinco etapas do
Método do Arco de Maguerez: Observação da Realidade; Identificação dos
Problemas/Pontos-Chaves; Teorização; Hipóteses de Solução e Aplicação à realidade
no Campo da Atenção Básica de Saúde. Resultados e Discussão: O reconhecimento de
demandas e a construção de um referencial teórico problematizados a partir da prática
de campo na área da Atenção Básica de Saúde pelos estagiários/discentes têm sido
fortalecidos pela constatação da aprendizagem estabelecida por meio do ensaio prática-
teoria-prática, em que discentes problematizam a partir de situações constatadas no
cenário de observação/atuação do terapeuta ocupacional. Buscando o referencial teórico
e elaborando hipóteses de solução, os discentes voltam ao campo para aplicar tal
referencial à realidade observada. Procedimentos de avaliação de desempenho
processual e cumulativa reforçam a Metodologia proposta. Os resultados apontam para
discentes críticos em seu processo de aprendizagem e maior identificação com práticas
humanísticas voltadas para a comunidade, enquanto profissionais de saúde.
PALAVRAS-CHAVE: Terapia Ocupacional, Educação Profissionalizante, Atenção
Básica à Saúde, Avaliação de Desempenho.
1 Prof.ª mestranda do Curso de Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Paraná – UFPR.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
195
INTRODUÇÃO
O presente trabalho motiva-se pela ação reflexiva da docência, no processo de ensino-
aprendizagem da Prática Terapêutica Ocupacional Supervisionada, em campo de
estágio na área da Atenção Básica à Saúde.
A atual formação universitária, principalmente na área da Saúde, vem passando por um
processo de mudanças e transformações, tanto no que concerne à sua prática, como em
seu modelo educacional.
As universidades e seus docentes estão passando por um momento de revisão e estudo
de seus processos de ensino-aprendizagem, repensando suas ações e modelos utilizados
na atual Saúde Pública. Acadêmicos dos cursos de Saúde anseiam por mudanças
curriculares e nos modelos de avaliação. Como podemos pensar estas possíveis
mudanças, como transformação deste processo?
OBJETIVOS
Buscando fundamentação em estudo e revisão bibliográfica, objetivamos apresentar um
relato de experiência de possíveis transformações do modelo de ensino e processo de
aprendizagem em nossa aldeia. Apontamos uma proposta de metodologia, a
Metodologia da Problematização, realizada em campo de estágio de Prática Terapêutica
Ocupacional Supervisionada, na área da Atenção Básica à Saúde, com acadêmicas do
curso de Terapia Ocupacional da UFPR.
A proposta se situa no contexto aluno/supervisor, na produção e assimilação de
conhecimento, através do trabalho grupal, possibilitando às alunas a expressão de
saberes prévios, aliando conhecimentos teórico-práticos de disciplinas correlatas, mas
também da investigação e compreensão da demanda apresentada pela clientela atendida
nesta área.
Num primeiro momento discutimos a ação clínica, fundamentando-nos em
procedimentos clínicos sob a referência de Perrenoud que neste momento nos desperta
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
196
para repensar esta prática, principalmente nos objetivos de mudança.
Em seguida, apresentamos a proposta da Metodologia da Problematização segundo
Berbel, que procuramos utilizar como sustentação teórica para fundamentação de um
processo de transformação de nossa prática. E finalizamos com o relato da experiência
vivenciada com acadêmicas do curso de Terapia Ocupacional da UFPR, em campo de
estágio usando esta metodologia.
JUSTIFICATIVA: NOVOS SABERES PARTINDO DA PRÁTICA
“Um procedimento clínico desenvolve saberes, os quais, inicialmente, são situados e
contextualizados e, em seguida, vinculados às teorias acadêmicas e aos saberes
profissionais acumulados. De modo paralelo, ele desenvolve capacidades de
aprendizagem, auto-observação, autodiagnóstico e autotransformação” (PERRENOUD,
2002).
Partindo desta afirmação, procuramos pensar sobre esse procedimento, buscando refletir
sobre suas ações educativas e o que se encontra implícito nesta situação de
aprendizagem.
Nosso ponto de partida é a Prática Terapêutica Ocupacional Supervisionada nas
modalidades Observação e Prática Assistida, estágio de formação realizado com alunos,
a partir do 4º e 6º período do curso de Terapia Ocupacional da UFPR. Em específico nos
deteremos à área da Atenção Básica à Saúde, prática realizada em uma Unidade de
Saúde da Família - USF, da cidade de Curitiba, estado do Paraná.
Consideramos necessário que o aprendiz tenha conhecimento de si mesmo, de sua
própria subjetividade, de sua cultura, a fim de poder relacioná-lo ao contexto desse outro
que se encontra em situação de cliente.
São grandes os desafios com os quais os aprendizes em geral se encontram, aqui em
especial os aprendizes da área da Saúde. Partir para uma prática, acreditando ter da
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
197
teoria todo o conhecimento, sem a vivência e aprofundamento nas questões
socioeconômicas e culturais e não apenas clínicas dessa clientela, com a qual se fará o
primeiro contato, esses acadêmicos são tomados muitas vezes por uma sensação de
desamparo, calcada na realidade utópica por eles construída, tornando esse momento de
encontro frustrante e desmotivador.
Na função de docente/supervisor desta prática, podemos observar que o conhecimento
adquirido pelos alunos, muitas vezes está restrito ao perfil epidemiológico desta
população, aos conhecimentos básicos da profissão, porém sem a contextualização
implicada no atendimento dessa clientela.
Perrenoud (2002) nos auxilia neste momento, destacando que, na maioria das vezes,
trabalha-se com casos reais, surgindo de imediato, a questão de saber como organizar,
durante esta etapa de formação, a troca entre a experiência vivida e a sua própria
reflexão.
Este mesmo autor refere que “o procedimento clínico não deixa em segundo plano a
teoria e a apropriação de saberes constituídos.” Há de se considerar importante que uma
parte destes saberes básicos, que sustentam a aprendizagem, sejam complementados
com saberes didáticos e pedagógicos, psicológicos e sociológicos sendo então
“transmitidos como elementos estruturados de acordo com sua própria lógica, distante
de qualquer contexto de ação e de todo envolvimento do sujeito em uma prática”
(PERRENOUD, 2002).
Em um procedimento clínico, a prática – em companhia do doente ou em alguma
função similar a essa em outras profissões humanistas – não é um simples
exercício de aplicação de conhecimentos adquiridos. Ela é ao mesmo tempo:
- um trabalho de construção de conceitos e de novos saberes teóricos (ao menos
para o estudante) a partir de situações singulares; - um trabalho de integração e
de mobilização de recursos adquiridos, criador de competências. (LÊ BOTERF,
1994; ROEGIERS, 2000; PERRENOUD, 2002, p.108)
Concordamos com Perrenoud (2002) que um procedimento clínico, favorece a formação
de profissionais capazes de aprender e mudar por si próprios, individualmente ou em
grupo, através de uma dinâmica de equipe ou institucional.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
198
O plano de ensino para a Prática Terapêutica Ocupacional Supervisionada, objetiva
desenvolver habilidades e competências para com o aprendiz, dentre as quais
destacamos:
- Processo de avaliação da clientela;
- Estabelecimento dos objetivos de tratamento;
- Planejamento;
- Execução do Plano de tratamento;
- Reavaliação;
- Relatórios de atendimentos e Registros em prontuário;
- Estudo de caso;
- Seminários;
- Avaliação da integração do conhecimento teórico-prático.
Também são considerados o comportamento ético profissional, critérios de frequência,
pontualidade, organização e manutenção do espaço físico.
Altet (1994/96), citado por Perrenoud (2002), afirma que o saber-analisar pode ser
alimentado pela iniciação à pesquisa, mas que também resulta, sobremaneira, de um
treinamento em análises de situações educativas complexas.
Procurando repensar sobre a docência neste campo da saúde e também de educação,
buscando a reflexão dos aprendizes em relação ao atendimento da clientela em questão,
podemos pensar em possíveis transformações a partir deste processo de ensino-
aprendizagem.
Perrenoud (2002) destaca que um procedimento clínico de formação, baseado e
orientado pela prática reflexiva, permite uma complexidade referencial, porém, em boa
parte dos casos aprendidos, aprende-se com a situação real apresentada.
Mosey (1986) citada por Hagedorn (2003) destaca que o “processo ensino-
aprendizagem” tem sido uma ferramenta da terapia ocupacional desde o seu início.
Cabe-nos ressaltar aqui que este processo não se restringe aos objetivos de tratamento
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
199
destinados à clientela, mas que também se aplica à Terapia Ocupacional como área de
conhecimento.
Podemos pensar, então, em como fundamentar a troca entre a experiência e a reflexão
sobre ela. Perrenoud (2002) nos auxilia, revelando “que neste momento, observamos
verdadeiros alunos e verdadeiros professores, e depois, trabalhamos junto a eles, com
responsabilidade total ou parcial”.
Durante o processo de especialização no curso de Ativadores dos Processos de
Mudança na Formação Superior de Profissionais de Saúde, através de referencial
teórico, construímos o conhecimento a respeito da Metodologia da Problematização.
Então nos propusemos a utilizá-la em nossa prática docente.
MATERIAIS E MÉTODO: FUNDAMENTANDO A METODOLOGIA DA
PROBLEMATIZAÇÃO
Podemos, aqui então, buscar auxílio no estudo por problematização, proposta que
pretende nortear este trabalho.
Berbel (1998) nos apresenta a Metodologia da Problematização, tendo como primeira
referência o Método do Arco, de Charles Maguerez, citando Bordenave e Pereira
(1982), que apresentam um esquema com cinco etapas:
- Observação da Realidade;
- Pontos-chaves;
- Teorização;
- Hipótese de Solução;
- Aplicabilidade à Realidade (prática).
Pretendemos descrevê-los, procurando articular sua fundamentação ao que
consideramos importante destacar neste trabalho: a proposta da problematização na
prática terapêutica supervisionada do curso de Terapia Ocupacional da UFPR, motivada
pela especialização da supervisora/docente, durante o curso de Ativação de Processos
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
200
de Mudança na Formação Superior de Profissionais de Saúde.
Segundo Berbel (1998), a proposta desta metodologia de ensino, estudo e trabalho pode
ser utilizada em situações em que os temas estejam relacionados com a vida em
sociedade, portanto o nosso interesse em desenvolvê-la se dá em razão do campo de
estágio desta disciplina se efetivar através do trabalho desenvolvido por alunos do
quarto, quinto, sexto e sétimo período do curso de Terapia Ocupacional da UFPR, em
uma Unidade de Saúde da Família, no contexto da Atenção Básica à Saúde da cidade de
Curitiba, no estado do Paraná, minha aldeia.
A mesma autora destaca as cinco etapas da Metodologia da Problematização, sendo a
primeira a Observação da Realidade social, partindo de um tema ou unidade de
estudo. Nessa etapa os alunos são orientados para o olhar atento e o registro
sistematizado sobre a realidade em que aquele tema está sendo vivido ou acontecendo,
sempre dirigidos por questões que busquem focar o tema. Assim é possível que os
alunos identifiquem dificuldades, carências, discrepâncias, que serão problematizadas.
Elege-se um problema para estudo e este passa a ser discutido. O grupo redigirá o
problema e uma síntese servirá de referência para as demais etapas do estudo.
A segunda etapa é a dos Pontos-chaves, na qual se permitem aos alunos as reflexões
das possíveis causas do problema, ou seja, por que ele existe. Nessa etapa segundo
Berbel (1998) “os alunos através das informações obtidas, passam a perceber que os
problemas de ordem social (os da educação, da atenção à saúde, da cultura, das relações
sociais etc.) são complexos e geralmente multideterminados”. Assim os alunos passam a
refletir sobre os possíveis determinantes e variáveis que envolvem tal problema. Nessa
fase uma nova síntese é elaborada, elegendo os principais pontos para objeto de estudo
mais aprofundado, visando a formas de interferência na realidade com a obtenção de
soluções ou desencadear passos nessa direção.
A terceira etapa é a Teorização, na qual acontece o estudo, a investigação. É nesse
momento que os alunos buscam toda a fundamentação sobre o problema. A busca se dá
em livros, artigos, internet, revistas especializadas, palestras etc. É o fenômeno
ocorrendo como Berbel (1998), afirma. Todas as informações colhidas são analisadas e
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
201
avaliadas em suas contribuições para a solução do problema. Essas informações são
sistematizadas por registros dos próprios alunos, permitindo assim evoluírem para a
etapa seguinte.
A quarta etapa é a das Hipóteses de solução. Os alunos utilizam os registros efetuados
para elaborarem as possíveis soluções, de forma crítica e criativa. São pensadas as
formas de resolução do problema, ou seja, o que é necessário para resolvê-lo. Essa etapa
leva a uma reflexão profunda do conhecimento do problema, que é investigado sob
todos os ângulos possíveis.
A quinta e última etapa é a da Aplicação à Realidade, na qual o exercício intelectual é
ultrapassado. Para Berbel (1998) é nessa etapa que as decisões tomadas devem ser
executadas ou encaminhadas, norteadas pelos componentes político e social. É nesse
momento que se encontra implícito o compromisso do aluno com o meio. “Do meio
observaram os problemas e para o meio levarão uma resposta de seus estudos, visando
transformá-lo em algum grau” (BERBEL, 1998).
Berbel (1998) pontua que assim se completa o Arco de Maguerez, segundo o qual os
alunos são levados ao exercício da cadeia dialética de ação-reflexão-ação, ou da relação
prática-teoria-prática, partindo e chegando à realidade social, através do processo de
ensino e aprendizagem.
RESULTADOS E DISCUSSÃO: A EXPERIÊNCIA COM A METODOLOGIA
DA PROBLEMATIZAÇÃO NA PRÁTICA TERAPÊUTICA OCUPACIONAL
SUPERVISIONADA
O processo de aprendizagem vivenciado durante o curso de Ativação de Processos de
Mudança na Formação Superior de Profissionais de Saúde motivou a supervisora de
estágio a buscar fundamentação na Metodologia da Problematização, mediante novas
alternativas do processo de ensino-aprendizagem dos estagiários, ampliando os
objetivos previstos em sua metodologia tradicional.
Iniciamos esse novo processo com a apresentação da proposta de estudo da
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
202
Metodologia da Problematização à Coordenação do Curso de Terapia Ocupacional da
UFPR e ao grupo de cinco a seis estagiárias do quarto e sexto período, buscando
ampliar os recursos metodológicos e de formação, inicialmente propostos no plano de
ensino da disciplina Prática Terapêutica Supervisionada. Posteriormente, a mesma
metodologia foi apresentada às turmas subsequentes, correspondentes ao quinto e sexto
período do curso.
O campo de atuação em questão é uma Unidade de Saúde da Família, localizada em um
Distrito Sanitário do município de Curitiba. Trata-se de uma unidade com 10 anos de
existência tendo como estratégia de atenção a Estratégia de Saúde da Família, composta
por quatro equipes.
É uma Unidade-escola recebendo acadêmicos de duas universidades locais, uma pública
e outra privada de caráter filantrópico.
O território de abrangência dessa área apresenta significativa vulnerabilidade social,
porém possui equipamentos comunitários articulados em rede social, que visam
fortalecer os princípios de atenção integral aos seus usuários.
A inserção do terapeuta ocupacional até o momento se dá pelo convênio entre a IES-
UFPR e a Secretaria Municipal de Saúde, contemplando campo de estágio e projetos
integrados de pesquisa e extensão.
Os acadêmicos do Curso de Terapia Ocupacional da UFPR participam desse campo de
estágio em duas modalidades distintas: a observação, em que o professor supervisor
realiza a atenção aos usuários, contemplando todo o processo terapêutico ocupacional,
as modalidades de atendimento, os aspectos da interdisciplinaridade e a integração com
os níveis de média e alta complexidade; a segunda modalidade é a prática assistida que
faz os acadêmicos passarem a atores nesse cenário, orientados e supervisionados por um
professor diretamente no campo de atuação.
A experiência com a Metodologia da problematização foi gradualmente inserida nesse
campo de estágio. Inicialmente propusemos às alunas que durante o processo ensino-
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
203
aprendizagem as apresentações de casos clínicos fossem elaboradas através de
situações-problema, seguindo as etapas da Metodologia da Problematização,
assimiladas durante o processo de supervisão dos atendimentos clínicos e
fundamentação teórica.
Nos encontros para supervisão clínica, estagiárias e supervisora passaram a discutir, a
partir dos relatórios de atendimento, o contexto envolvido em cada caso (Observação da
Realidade), a problemática encontrada e suas possíveis causas (Pontos- Chaves), para
que as estagiárias pudessem buscar a fundamentação sobre o problema. Posteriormente
realizaram a coleta de dados e a pesquisa para a solução dos problemas, registrando-as.
A partir dessa etapa as estagiárias elaboravam as apresentações dos casos, apresentando
ao grupo, sob sustentação teórica, as possíveis soluções para os problemas, através de
hipóteses (Hipóteses de solução), que eram discutidas por todo o grupo. Esse momento
era de profunda reflexão para o grupo, constituindo cada caso clínico em uma discussão
coletiva para a resolução da problemática apresentada.
Ao final as decisões acerca dos procedimentos a serem adotados eram aplicadas,
podendo a estagiária envolvida particularmente com a questão e todo o grupo observar a
evolução e a eficácia dos procedimentos e ações adotados (Aplicação à Realidade).
A proposta se estendeu à equipe interdisciplinar, para a qual as estagiárias e supervisora
puderam apresentar a experiência com a Metodologia da problematização em reunião
clínica, fundamentando e esclarecendo o processo terapêutico ocupacional através de
casos clínicos.
Quanto à clientela observamos que houve maior adesão ao processo terapêutico,
evidenciada pela compreensão por parte das estagiárias da demanda real da clientela
(usuários/familiares), demanda esta não só da ordem da saúde, mas dos aspectos
socioeconômicos e culturais que permeiam essa população.
No processo ensino-aprendizagem, observamos maior motivação das estagiárias com as
pesquisas e referências bibliográficas, compromisso com a clientela e seu contexto, a
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
204
busca de soluções para as situações e problemáticas apresentadas, mudança no processo
de aquisição e transmissão do conhecimento, passando a atuar de forma dinâmica no
seu processo de aprendizagem. Houve fortalecimento do vínculo grupal e com a
clientela. Consequentemente as acadêmicas comprometeram-se com a transformação da
realidade encontrada no campo da Atenção Básica à Saúde.
A aplicação da avaliação do processo ensino-aprendizagem também foi transformada,
buscando o exercício da competência clínica e não apenas o
preenchimento de requisitos considerados básicos para tal prática. O processo de
avaliação pôde, de forma qualitativa e formativa, responder aos critérios quantitativos
que o currículo formal do curso contempla.
Sob a ótica da mudança de paradigmas, iniciamos um pequeno percurso, motivado pelo
curso de ativadores. Há um longo caminho a percorrer, que hoje se apoia na citação de
Alarcão (2005): “A supervisão é uma atividade de natureza psicossocial, de construção
intra e interpessoal, fortemente enraizada no conhecimento do outro e dos contextos em
que os atores interagem, nomeadamente aos contextos formativos”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Este trabalho nos possibilitou relatar um momento de transformação da prática docente,
motivada pelo curso de ativadores. Estudar e avaliar propostas de mudança requerem
disponibilidade profissional, além da crença na ação docente. Podemos muitas vezes
desistir mediante o primeiro obstáculo, o da “desolação”, quando nos consideramos
sozinhos na busca da efetividade de nossa prática.
Porém, há o momento de maior estímulo, aquele que alimenta a sede do saber, fazendo
com que a engrenagem comece a se mover, mesmo que cautelosamente. É o momento
em que nos encontramos com nossos aprendizes, abertos à troca, dispostos a somar
saberes, a viver a verdadeira história do ensino-aprendizagem; o momento de revelação
de sujeitos dispostos à aprendizagem e à prática de uma clínica saudável, com objetivos,
processos e atitudes favoráveis aos que dela necessitam.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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Citando Alarcão (2001), “as funções do professor são hoje acrescidas, para além de
mera lente de avaliador, o professor, o educador deve ser o mobilizador de
conhecimentos e capacidades, o supervisor, o designer de tarefas de aprendizagem de
grande valor formativo, o “treinador, o guia, o ativador, o promotor, o tutor”. Pode
parecer utópico, difícil, mas não podemos deixar de ativar a mudança.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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2001. p. 107.
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diferentes termos ou diferentes caminhos? Revista Interface UNESP, v.2, p.140-144,
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HAGEDORN, R. Fundamentos para a prática em Terapia Ocupacional. São Paulo:
ROCA, 2003. p. 199.
PERRENOUD, P. A Prática reflexiva no ofício de professor: Profissionalização e
Razão Pedagógica. Porto Alegre: ARTEMED, 2002. p. 105-106.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
206
O ESTÁGIO CURRICULAR NA FORMAÇÃO ACADÊMICA DO TERAPEUTA
OCUPACIONAL NA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ – UFPR
ROSIBETH DEL CARMEN MUÑOZ PALM1
MILTON CARLOS MARIOTTI2
RITA APARECIDA BERNARDI PEREIRA3
CLAUDIA OMAIRI4
REGINA CÉLIA TITOTTO CASTANHARO5
RESUMO
Introdução: Este trabalho analisa a dinâmica de formação do terapeuta ocupacional na
perspectiva do desenvolvimento do estágio curricular na Universidade Federal do
Paraná - UFPR. O estágio está organizado em oito períodos, distribuídos em introdução
à prática de Terapia Ocupacional, prática de observação, prática assistida e prática
autônoma, com o acompanhamento pedagógico do docente. As diretrizes do estágio
curricular estabelecidas pelo Projeto Pedagógico do Curso preconizam a diversidade em
diferentes cenários de aprendizagem, na população atendida e nos níveis de atenção. A
estrutura e organização foram delineadas a partir das diretrizes curriculares nacionais e
das normas mínimas para a formação de terapeutas ocupacionais da Federação Mundial
de Terapeutas Ocupacionais, com 1.005 horas na prática de campo. O processo de
ensino e aprendizagem e a avaliação de desempenho envolvem o desenvolvimento de
competências e habilidades gerais e específicas, e atitudes e valores requeridos por essa
prática. Objetivo: Socializar o processo de formação profissional na proposta curricular
do curso de Terapia Ocupacional da UFPR. Material e métodos: A metodologia
empregada baseou-se na análise do projeto político-pedagógico do curso, nos planos de
ensino e nos instrumentos de avaliação de desempenho dos acadêmicos. Resultados e
Conclusão: A inserção precoce dos acadêmicos no estágio curricular articula e
aproxima a realidade das instituições e o trabalho profissional, possibilitando a
superação da dicotomia entre o ensino curricular e a prática profissional. A proposta
1 Prof.ª Ms. do Curso de Terapia Ocupacional do Departamento de Terapia Ocupacional da Universidade
Federal do Paraná – UFPR [email protected] 2 Prof. Dr. do Curso de Terapia Ocupacional do Departamento de Terapia Ocupacional da Universidade
Federal do Paraná – UFPR 3 Prof.ª Ms. do Curso de Terapia Ocupacional do Departamento de Terapia Ocupacional da Universidade
Federal do Paraná – UFPR 4 Prof.ª Ms. do Curso de Terapia Ocupacional do Departamento de Terapia Ocupacional da Universidade
Federal do Paraná – UFPR 5 Prof.ª Mestranda do Curso de Terapia Ocupacional do Departamento de Terapia Ocupacional da
Universidade Federal do Paraná – UFPR
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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oferece o desenvolvimento das competências necessárias para a compreensão gradual da
complexidade do mundo do trabalho e do desempenho profissional.
PALAVRAS-CHAVE: Terapia Ocupacional, Formação de Recursos Humanos,
Ensino.
INTRODUÇÃO
O curso de Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Paraná vem priorizando o
desenvolvimento de todos os níveis da prática de campo em serviços públicos de
assistência à saúde, de assistência social e educacional. A prática de campo (formação
em serviço) ocorre no âmbito da universidade, unidades afins e na comunidade em
geral, por meio de convênios, atendendo as orientações do Projeto Político-Pedagógico
(UFPR, 2006, 2009) e dos órgãos reguladores de estágio (Comissão de Orientação de
Estágios – COE), da Comissão Geral de Estágios de acordo com a Portaria nº. 467/07 e
Resolução n° 46/10 do Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão da Universidade
Federal do Paraná e a Lei Federal n° 11788/08 (BRASIL, 2008).
As diretrizes da prática de campo estabelecidas pelo Projeto Pedagógico (2009) do
curso preconizam a diversidade em diferentes nas áreas de trabalho, população atendida
e níveis de atenção conforme descrito a seguir:
- População: são atendidas todas as faixas etárias, gênero e condições de saúde, sociais,
educacionais, e laborais.
- Áreas de trabalho de campo: área física e saúde do trabalhador, saúde mental,
disfunções do desenvolvimento e contextos escolares, campo social, saúde coletiva e
contextos hospitalares.
- Cenários de aprendizagem ou contextos ou níveis de atenção: A assistência à saúde
acontece em todos os níveis de atenção e complexidade: baixa complexidade (atenção
básica na comunidade), média complexidade (atenção especializada) e alta
complexidade (hospitais, Centros de Reabilitação). Na área social dois níveis de atenção
são contemplados: proteção social básica e proteção social especial (média e alta
complexidade).
OBJETIVO
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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O objetivo deste estudo é socializar o processo de formação profissional na proposta
curricular do curso de Terapia Ocupacional da UFPR.
MATERIAL E MÉTODO
Trata-se de um estudo descritivo, de natureza qualitativa. A metodologia empregada
baseou-se na análise documental do projeto pedagógico do curso, nos planos de ensino,
nos instrumentos de avaliação de desempenho dos acadêmicos e na legislação vigente.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A carga-horária da prática de campo foi estabelecida em 1.005 horas, em consonância
com as Diretrizes Curriculares Nacionais (MEC, 2002) e as Normas Mínimas para a
Formação de Terapeutas Ocupacionais da Federação Mundial de Terapeutas
Ocupacionais (FMTO, 2002).
Quanto à especificação das disciplinas, o curso de Terapia Ocupacional oferece a
seguinte estrutura para a realização da prática de campo (UFPR, 2009 e 2010):
- Introdução à Prática em Terapia Ocupacional I e II, disciplinas que estão alocadas no
segundo e terceiro semestre, com duas horas-aula semanais cada uma. Têm como
objetivos: contextualizar a profissão de Terapia Ocupacional em diferentes contextos
institucionais; conhecer a atuação do terapeuta ocupacional em diferentes contextos,
procedimentos utilizados e a natureza das intervenções do profissional.
- Estágio Supervisionado em Terapia Ocupacional - Observação I, II, alocadas no
quarto e quinto semestres com a carga horária de quatro horas-aula semanais
respectivamente. Seus objetivos são: desenvolver a capacidade de observar os conceitos
e fundamentos teóricos na prática e descrevê-los; identificar o que se observou do
Processo de Terapia Ocupacional em todas as suas etapas, realizado pelo
docente/terapeuta ocupacional; discutir e correlacionar o processo desenvolvido pelo
professor/terapeuta ocupacional com os conhecimentos adquiridos em sala de aula
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
209
(Processo Terapêutico ocupacional).
- Estágio Supervisionado em Terapia Ocupacional - Prática I, II (Prática Assistida) no
sexto e sétimo semestres com oito horas-aula semanais cada uma, com os objetivos de:
reconhecer e atuar de acordo com as normas institucionais do campo de estágio; debater
e correlacionar as políticas públicas que permeiam o campo de estágio com a prática
profissional em Terapia Ocupacional; praticar o processo de Terapia Ocupacional em
todas as suas etapas, com supervisão direta do docente; discutir e documentar o
processo de Terapia Ocupacional, correlacionando teoria e prática; desenvolver a
capacidade de atuar em equipe multiprofissional e interdisciplinar.
- Estágio Supervisionado em Terapia Ocupacional - Prática III, IV (Prática Autônoma)
no oitavo e nono períodos, com vinte e vinte e três horas-aula semanais
respectivamente, com os objetivos de: reconhecer e atuar de acordo com as normas
institucionais do campo de estágio; debater e correlacionar as políticas públicas que
permeiam o campo de estágio com a prática profissional em Terapia Ocupacional;
praticar o processo de Terapia Ocupacional em todas as suas etapas de forma autônoma,
sob supervisão direta do docente e/ou supervisão semidireta (preceptoria); aprimorar a
capacidade de atuar em equipe multiprofissional e interdisciplinar; discutir e participar
do planejamento, implantação e/ou gestão de serviço de Terapia Ocupacional.
No curso de Terapia Ocupacional da UFPR, o tempo de permanência em cada local de
prática de campo é de quatro meses ou um semestre letivo. O número máximo de
acadêmicos estabelecido para os grupos de prática de campo é de seis e, quanto à
qualificação do supervisor, é requerido que seja terapeuta ocupacional graduado há no
mínimo dois anos.
ATIVIDADES DESENVOLVIDAS NAS PRÁTICAS DE CAMPO POR NÍVEIS
DE COMPLEXIDADE
A Federação Mundial de Terapeutas Ocupacionais (2002, p.26) destaca que o propósito
da prática de campo é que o estudante integre conhecimento, raciocínio clínico e
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
210
comportamento profissional dentro da prática e desenvolva conhecimentos, destrezas e
atitudes de acordo com as competências requeridas para a qualificação como terapeuta
ocupacional.
As Diretrizes Curriculares Nacionais de Terapia Ocupacional salientam que “as
atividades práticas específicas da Terapia Ocupacional deverão ser desenvolvidas
gradualmente desde o início do Curso de Graduação em Terapia Ocupacional, devendo
possuir complexidade crescente, desde a observação até a prática assistida” (BRASIL,
2002).
Especificamente no que se refere às atividades desenvolvidas nas práticas de campo, a
proposta por níveis de complexidade utilizada no Curso (UFPR, 2009) é a seguinte: as
disciplinas de Introdução à Prática I e II têm como objetivo oferecer ao estudante um
panorama dos Serviços de Terapia Ocupacional existentes em Curitiba e no Estado do
Paraná, caracterizando as instituições, as populações atendidas.
As disciplinas Estágio Supervisionado em Terapia Ocupacional - Observação I e II
envolvem a observação dos atendimentos e ações realizadas com a clientela e equipe
pelo docente supervisor. O estudante tem a possibilidade de ver a atuação de um
profissional terapeuta ocupacional com sua clientela e equipe. O processo implica a
apresentação teórico-metodológica de todo o processo de Terapia Ocupacional. Na
supervisão são abordados aspectos teóricos relativos à prática observada, utilizando-se a
metodologia da problematização com o objetivo de estabelecer a articulação entre teoria
e prática.
As disciplinas Estágio Supervisionado em Terapia Ocupacional - Prática I e II são
caracterizadas como Prática Assistida. As atividades envolvem avaliação, planejamento
e execução dos atendimentos e ações a serem realizados pelos estudantes com clientela
e equipe, com a supervisão direta do docente/supervisor. Na supervisão são abordados
aspectos teórico-metodológicos relativos à prática desenvolvida, estabelecendo a
articulação teoria e prática visando à aprendizagem e vivência do processo de Terapia
Ocupacional pelo estudante.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
211
As disciplinas Estágio Supervisionado em Terapia Ocupacional - Prática III e IV
caracterizadas como Prática Autônoma envolvem a realização de procedimentos de
avaliação, planejamento e execução dos atendimentos e ações com a clientela, família e
equipe, com a supervisão direta, semidireta ou indireta de um docente.
SUPERVISÃO
O supervisor é o profissional com formação ou experiência na área de conhecimento
específica de Terapia ocupacional, encarregado de supervisionar o estudante em todas
as etapas do processo de estágio.
As modalidades de supervisão, de acordo com o Regulamento de Estágio da
Universidade Federal do Paraná, Resolução N° 46/10 (2010, p. 3) são: Supervisão
Direta – Acompanhamento e orientação do estagiário de forma contínua e direta das
atividades que ocorrem no campo de estágio, durante todo o processo; Supervisão
Semidireta – Acompanhamento e orientação do estagiário por meio de visitas
sistemáticas ao campo de estágio pelo professor supervisor, que manterá também
contato com o profissional responsável (Preceptor); Supervisão Indireta –
Acompanhamento e orientação do estagiário, através de relatórios, reuniões, visitas
ocasionais ao campo de estágio, ocorrendo contatos e reuniões com o profissional
responsável.
Palm et al. (2006; 2010) explicitam a supervisão de acordo com os níveis de
complexidade nas práticas de campo. Na supervisão da prática de campo no âmbito da
observação são abordados aspectos teóricos relativos à prática observada, utilizando a
metodologia da problematização com o objetivo de estabelecer a articulação teoria e
prática; na supervisão da prática assistida são abordados aspectos teórico-metodológicos
relativos à construção da identidade profissional, desenvolvimento do papel de co-
terapeuta e manejo do processo terapêutico. O objetivo é estabelecer a articulação teoria
e prática visando à aprendizagem e vivência do processo de Terapia Ocupacional; na
prática autônoma são enfatizados aspectos teórico-metodológicos envolvidos nessa
modalidade, estabelecendo a articulação teoria e prática visando à prática com
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
212
independência pelo estudante.
AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO NA PRÁTICA DE CAMPO
De acordo com a Resolução 46/10-CEPE, a avaliação dos estágios é parte integrante da
dinâmica do processo de acompanhamento, controle e avaliação institucional extensível
a todo processo de ensino.
As competências representam uma combinação dinâmica de conhecimentos,
compreensão de habilidades e capacidades. O processo de ensino e aprendizagem na
prática de campo oferece a compreensão gradual da complexidade do mundo do
trabalho e da prática profissional.
O desempenho do estudante na prática de campo no curso de Terapia Ocupacional-
UFPR é avaliado de acordo com as normas (Regulamento de Estágio) elaboradas pelos
professores orientadores, aprovadas pelas Plenárias Departamentais e homologadas pelo
Colegiado do Curso.
Os aspectos avaliados no estágio de Observação envolvem: Habilidades e
Competências: atenção a saúde, comunicação, liderança e educação permanente
(participação em supervisão); Integração Teórico-Prática: desempenho na elaboração e
apresentação escrita e/ou oral dos trabalhos solicitados: relatórios, estudos de casos,
seminários, documentação clínica e prova; Observação do Processo de Intervenção em
Terapia Ocupacional: capacidade de observação, iniciativa, crítica, autocrítica, postura
ética e deontológica, criatividade e organização.
Os Estágios de Prática envolvem: Habilidades e Competências: atenção a saúde, tomada
de decisões, comunicação, liderança, administração e gerenciamento e educação
permanente (participação em supervisão); Integração Teórico-Prática: desempenho na
elaboração e apresentação escrita e/ou oral dos trabalhos solicitados: relatórios, estudos
de casos, seminários, documentação clínica e prova; Conduta no Processo de
Intervenção em Terapia Ocupacional: autonomia, iniciativa, crítica, autocrítica, postura
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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ética e deontológica.
A avaliação tem como eixos transversais a conduta ética; a integração teórico-prática e
o cumprimento do Plano de Estágio. A cada atendimento, o estudante elabora relatórios
cujos dados vão compondo toda a documentação clínica do processo de Terapia
Ocupacional, utilizada como estudo de caso. Nos estágios de prática, também elabora os
registros de atendimento para inclusão no prontuário clínico. Além disso, vale ressaltar
que a avaliação é processual sendo discutido pelos docentes envolvidos o progresso do
estudante em cada etapa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A estrutura e dinâmica da prática de campo na experiência do Curso de Terapia
Ocupacional da Universidade Federal do Paraná, com a inserção dos acadêmicos desde
os períodos iniciais, articulam e aproximam a realidade das instituições e o trabalho
profissional, possibilitando a superação da dicotomia entre o ensino curricular e a
prática profissional e uma maior adesão ao curso.
Os diferentes níveis de complexidade respeitam o processo de aprendizagem do
acadêmico, possibilitando vivências integradas junto ao professor/supervisor e ao
preceptor e promovendo a autonomia necessária à prática de campo. O aporte teórico
que norteia os diferentes campos de estágio é fortalecido pelos referenciais apresentados
pelas disciplinas aplicadas. Essas disciplinas, obedecendo aos princípios metodológicos
propostos, como, por exemplo, a metodologia da problematização, respeita a constante
busca pela observação da realidade, articulada à hipótese de solução e aplicação à
realidade, de forma a não fragmentar o raciocínio clínico esperado nessa etapa de
formação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Decreto Lei. n 11.788, de 25 de setembro de 2008. Dispõe sobre estágio de
estudantes. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 25 fev.
2008. Seção 1, p. 3.
FEDERACIÓN MUNDIAL DE TERAPEUTAS OCUPACIONALES. Normas
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
214
Mínimas Revisadas para la Formación de Terapeutas Ocupacionales – 2002. Austrália:
FMTO. 2002, p. 7- 26.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Diretrizes curriculares para os cursos de Terapia
Ocupacional. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CES062002.pdf. Acesso em 15 mar 2010.
PALM, R. D. C. M.; BALLARIN, M. L. G. S.; TOLDRÁ, R. C.; SÁ. M. J. C. N.;
CARVALHO, F. B. Avaliação e Acompanhamento do Processo Ensino Aprendizagem
nas Práticas Terapêuticas Supervisionadas da PUC-Campinas. In: X ENCONTRO
NACIONAL DE DOCENTES DE TERAPIA OCUPACIONAL. Universidade
Federal de Minas Gerais. Anais do X Encontro Nacional de Docentes de Terapia
Ocupacional. Belo Horizonte: UFMG, setembro de 2006. CD Rom.
PALM, R. D. C. M.; BALLARIN, M. L. G. S.; CARVALHO, F. B.; TOLDRÁ, R. C.
Metodologias Ativas: O papel do docente/supervisor no contexto da supervisão. In:
CONGRESSO BRASILEIRO DE TERAPIA OCUPACIONAL. Anais do XI
Congresso Brasileiro de Terapia Ocupacional. Fortaleza: ACTO, ABRATO, 2009.
CD Rom.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ. Resolução nº 19/90 do CEPE de 1992.
Dispõe sobre a Política de Estágios na UFPR. Curitiba, 2009.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ. Portaria nº 467 de 2007. Dispõe sobre
estágio na UFPR. Curitiba, 2007.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ. Projeto Político-Pedagógico do Curso de
Terapia Ocupacional. Curitiba, 2006.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ. Projeto Político Pedagógico do Curso de
Terapia Ocupacional. Curitiba, 2009.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ. Resolução nº 46/10 – CEPE. Dispõe
sobre estágio na UFPR. Curitiba, 2010.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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ESTUDO DA AÇÃO HUMANA, DE ATIVIDADES E RECURSOS
TERAPÊUTICOS EM TERAPIA OCUPACIONAL
VIVIANE MAXIMINO1
FLAVIA LIBERMAN2
JANAÍNA MORENO GARCIA1
RAFAELA PORCARI MOLENA3
ANA CAROLINA COSTA SAVANI3
JULIANA MONTEIRO ANTUNES3
DANIELA HONDA PASTRELLO3
CAROLINA MELO3
RESUMO
Introdução e justificativa: A monitoria, na Universidade Federal de São Paulo, está
organizada em torno de projetos de um conjunto de docentes e requer dos alunos que
participem das atividades dos cursos de uma maneira mais ampla do que apenas auxiliar
o docente em suas funções habituais. Como espaço de desenvolvimento de habilidades
para o ensino supõe-se que essa função seja ampla e inclua reflexão e desenvolvimento
teórico. Nesse caso, o projeto, dando sequência a um estudo anterior, voltou-se para o
ensino das Atividades e Recursos Terapêuticos (ARTs) como uma das linhas
estruturantes da formação, desenvolvendo-se em três eixos de trabalho: 1. a criação de
um blog; 2. a organização de conferências e oficinas e 3. a interlocução com o programa
de extensão Laboratório de Sensibilidades, do campus Baixada Santista. Objetivos: 1.
reunir as diversas produções do curso de Terapia Ocupacional no campo das ARTs; 2.
estudar e organizar ferramentas contemporâneas buscando desenvolver novas
estratégias de ensino e espaço coletivo de produção; 3. experimentar a docência; 4. fazer
articulação com programas de extensão que abordam o tema; 5. compor e trabalhar em
grupo. Metodologia: Estudo e criação de um BLOG com postagem de trabalhos de
docentes e alunos, orientação de alunos para a confecção de pôsteres, coordenação de
oficinas, organização de conferências com convidados, participação em atividades
conjuntas no Laboratório de Sensibilidades. Conclusão: A avaliação realizada indicou
que o conjunto de estratégias contribuiu para o desenvolvimento das monitoras e
docentes, para o conjunto dos alunos e para o curso.
1 Prof.ª Dr.ª do curso de Terapia Ocupacional do Departamento de Ciências da Saúde, Universidade
Federal de São Paulo, campus Baixada Santista [email protected] 2 Prof.ª Dr.ª do curso de Terapia Ocupacional do Departamento de Ciências da Saúde, Universidade
Federal de São Paulo, campus Baixada Santista.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
216
PALAVRAS-CHAVE: Atividades e Recursos Terapêuticos, Novas Tecnologias.
INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA
Segundo alguns guias de orientação ao docente, define-se Monitoria como uma
modalidade de ensino-aprendizagem, dentro das necessidades de formação acadêmica,
destinada aos alunos. Objetiva despertar o interesse pela docência, mediante o
desempenho de atividades ligadas ao ensino, possibilitar a experiência da vida
acadêmica, por meio da participação em diversas funções da organização e
desenvolvimento das disciplinas dos cursos, além de possibilitar a apropriação de
habilidades em atividades didáticas (CESUPA, 2007).
A prática da Monitoria no contexto educativo data de longo tempo e se define como
processo pelo qual alunos auxiliam alunos na situação de ensino-aprendizagem.
Nos últimos anos, com o desenvolvimento do pensamento pedagógico de orientação
crítico-progressista, procedimentos monitorais vêm ganhando espaço no contexto da
realidade educacional das instituições de educação superior.
A Monitoria, como procedimento pedagógico, tem demonstrado sua utilidade, à medida
que atende às dimensões “política, técnica e humana da prática pedagógica”
(CANDAU, 1986, p.12-22).
O aluno monitor encarrega-se de organizar a disciplina, o material didático, aplicar
provas e fazer correções. Alguns têm a chance de colaborar auxiliando na preparação de
aulas e tirando dúvidas dos colegas, outros chegam até a substituir os professores em
algumas aulas. Assim como os projetos de iniciação cientifica têm por objetivo
introduzir a prática da pesquisa e os de extensão, a prática profissional, a Monitoria tem
como objetivo explicito aproximar os alunos da docência.
Visando, além de estimular a iniciação à docência, contribuir para a melhoria da
qualidade dos cursos de graduação e promover cooperação entre professores e alunos
(PROGRAD, 2010), e tentando evitar que as ações dos alunos se restrinjam a apenas
secretariar o professor, a Monitoria na Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP),
organiza-se em torno de projetos de um conjunto de docentes a partir de uma temática
1 Graduandas do curso de Terapia Ocupacional do Departamento de Ciências da Saúde, Universidade
Federal de São Paulo, campus Baixada Santista.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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de interesse do curso ou de um eixo comum, e solicita aos alunos que participem das
atividades de uma maneira mais abrangente do que apenas auxiliar o docente em suas
funções habituais. Como espaço de desenvolvimento de habilidades para o ensino,
indica que essa função seja ampla e inclua reflexão e desenvolvimento teórico.
Dessa forma, o aluno monitor tem a oportunidade de participar, por exemplo, de
discussões a respeito da organização da matriz curricular, das questões que envolvem a
escolha das temáticas e metodologias desenvolvidas ao longo do curso e do perfil do
profissional que se quer formar. Exercita também o trabalho em equipe, aqui constituída
pelo grupo de monitores e seus orientadores e atividades de ensino no contato com os
colegas que buscam auxílio.
Neste trabalho faremos um relato de um projeto de Monitoria vinculado ao ensino das
Atividades e Recursos Terapêuticos no qual foi possível experimentar diversas
estratégias.
O estímulo à docência adquire relevância no momento atual do desenvolvimento da
profissão visto que inúmeros cursos novos estão se estruturando e há carência de
pessoal qualificado para essa função. Ampliar para o aluno a docência como
possibilidade de encaminhamento profissional desde a graduação pode contribuir para
minimizar a escassez de recursos humanos. A proximidade com os docentes e suas
questões cotidianas no ensino também contribuem para a compreensão do processo de
ensino-aprendizagem e suas vicissitudes. Para os docentes, abre-se uma oportunidade de
compreender melhor o lugar em que se encontra o aluno, suas formas de pensar e como
ele está vivendo sua formação. Outro aspecto importante nessa aproximação é a troca de
idéias e a criação de novas estratégias metodológicas no ensino.
O breve histórico a seguir revela aspectos interessantes da Mentoria. Em maio de 2008,
um conjunto de docentes do curso de Terapia Ocupacional da Universidade Federal de
São Paulo (UNIFESP), Baixada Santista, apresentou um projeto de Monitoria que tinha
por objetivo articular teoricamente os conteúdos dos módulos de Atividades e Recursos
Terapêuticos (ARTs), considerados como um dos eixos estruturantes da formação, com
outro módulo, denominado: “A ação como precursora do pensamento na constituição do
humano”, com base nas teorias de Maturana e Varella, entre outras. O projeto
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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desenvolveu-se por um ano, com alunas bolsistas e voluntárias que, em conjunto com
docentes, estudavam e organizavam oficinas, entre outras atividades.
O objetivo principal foi conhecer, socializar e construir relações teóricas que pudessem
sustentar o ensino das ARTs. Uma das conclusões dessa fase foi que, entre os vários
docentes que ministravam os módulos das ARTs, havia grande diversidade de
referenciais teóricos, impossibilitando que tomássemos apenas um deles como
sustentação para o conjunto das ARTs. Considerou-se também que a diversidade teórica
enriquecia o aprendizado do aluno, contribuindo para sua formação.
Em maio de 2009, solicitamos a renovação do projeto que, nessa segunda fase foi
coordenado pelas docentes que assinam este trabalho. Descrevemos a seguir a segunda
fase do mesmo projeto, que se desenvolveu de maio de 2009 a maio de 2010. Nessa fase
interessava-nos verificar como as ARTs estavam sendo abordadas pelos diversos
docentes, ampliando o leque de possibilidades de articulação. O conteúdo abordado no
ensino das ARTs esta distribuído nos seguintes módulos: 1. Atividades e Recursos
Terapêuticos I: Cotidianos e repertório de atividades; 2. Atividades e Recursos
Terapêuticos II: Atividades de vida diária, vida pratica e de trabalho; 3. Atividades e
Recursos Terapêuticos III: Atividades lúdicas e lazer; 4. Atividades e Recursos
Terapêuticos IV: Processos criativos, atividades expressivas e comunicação humana; 5.
Abordagem Grupal; 6. A ação como precursora do pensamento na constituição do
humano. Cada temática passou a ser abordada durante um semestre em módulos de 60
ou 80 horas.
Este projeto foi realizado em dois blocos. O primeiro, de agosto a dezembro de 2009,
quando iniciamos a construção de um Blog, destinado a sistematizar e possibilitar a
produção coletiva a partir da temática, e o segundo, de fevereiro a maio de 2010,
período em que realizamos encontros presenciais na forma de conferências com
convidados externos e oficinas relacionadas às temáticas dos encontros com alunos. No
primeiro semestre tivemos 4 monitoras, duas do 6.º termo e duas do 4.º termo; no
segundo semestre, os alunos que foram para o 7.º termo não deram continuidade devido
aos estágios curriculares, sendo substituídas por outras duas alunas do 3.º termo. O
projeto foi contemplado com duas bolsas.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
219
OBJETIVO GERAL E OBJETIVOS ESPECÍFICOS
O objetivo geral era reunir e ampliar o estudo de alguns referenciais teóricos e
metodológicos que embasam o ensino das Atividades e Recursos Terapêuticos no curso
de Terapia Ocupacional da UNIFESP, BS e os específicos foram assim estabelecidos:
oferecer aos monitores oportunidades de aprofundamento conceitual; oferecer
oportunidades de experiência didática; desenvolver habilidades de organização e
desenvolvimento de propostas de ensino diversas; discutir e estudar as possibilidades
pedagógicas e de produção de conhecimento oferecidas por novas mídias; sistematizar
informações sobre alguns referenciais teóricos e metodológicos utilizados no campo da
Terapia Ocupacional; auxiliar os professores na compilação e organização de materiais
produzidos pelos alunos; auxiliar os alunos na elaboração de seminários e trabalhos de
conclusão dos módulos; orientar aos alunos na realização das atividades práticas de
laboratório; oferecer horários para plantão de dúvidas.
ACOMPANHAMENTO DAS ATIVIDADES
O grupo de monitoras era supervisionado diretamente pelas docentes coordenadoras em
reuniões mensais de 3 horas, e quinzenais de 1 hora e 30, além das orientações pontuais
ao final das aulas e em mensagens eletrônicas. As docentes acompanharam as
conferências e fizeram orientações específicas para a organização das oficinas. As
monitoras tinham como tarefa avaliativa a redação de relatórios mensais onde
descreviam e qualificavam suas atividades.
DESENVOLVIMENTO DO PROJETO: PRIMEIRO MÓDULO
O primeiro momento do projeto foi de agosto a dezembro de 2009. Nós o iniciamos
propondo às monitoras que fosse utilizada a ferramenta virtual BLOG como espaço para
sistematização dos conteúdos ministrados nos módulos. Essa ferramenta tem sido
estudada e citada como interessante, pois se apresenta como linguagem contemporânea
com a qual os alunos se identificam, é acessível e democrática e permite, entre outras
coisas, a aprendizagem colaborativa e a construção coletiva do conhecimento
(BARBOSA, C.A.P. e SERRANO, C.A., 2005; GOMES, M.J., 2005; COUTINHO, C.
P. e BOTTENTUIT Jr, J. B., 2007).
Para tanto, as monitoras então realizaram as seguintes ações, acompanhadas em
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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reuniões sistemáticas: 1. Pesquisa bibliográfica sobre ferramentas virtuais e seu uso no
ensino; 2. Contatos com alunos dos diferentes termos com o objetivo de reunir as
produções passíveis de postagem; 3. Contato com os diferentes docentes dos módulos
de ARTs visando à postagem de artigos e propostas de aula; 4. Reflexão sobre o uso
dessa ferramenta como espaço, não só de armazenagem, mas também de produção
coletiva de conhecimento; 5. Reflexão sobre as dificuldades e potenciais da criação
coletiva pautada no espaço virtual.
Nas reuniões foram estudados diversos formatos de blogs já existentes e a partir disso
escolhemos a ferramenta, o design, definimos objetivos e funcionalidade. Discutimos
também as dificuldades tanto dos monitores quanto dos demais alunos do curso no uso
da ferramenta e delineamos ações para viabilizar o projeto. As reuniões receberam
também outros alunos interessados, houve a criação de um endereço de e-mail para
agilizar a comunicação e o esforço de constituição de um grupo de trabalho.
Além do Blog, as monitoras também organizaram material didático referente às
temáticas dos módulos e realizaram orientação de trabalhos acadêmicos dos alunos,
disponibilizando um horário para plantão de dúvidas. Orientaram os alunos quanto à
confecção de pôster contribuindo no ensino, organização e sistematização de trabalho
científico.
RESULTADOS DO PRIMEIRO MOMENTO
Ao final do semestre, monitoras e coordenadoras avaliaram que a ferramenta Blog pode
ser um recurso interessante no espaço acadêmico, no entanto seu uso apresentava
algumas dificuldades tais como o gerenciamento e a escolha dos conteúdos, a timidez
na postagem, a organização do conteúdo, a elaboração de um desenho atraente e de fácil
manejo etc. A construção do Blog exigiu reflexões teóricas e conceituais para a
definição das séries temáticas e dos critérios de inserção dos conteúdos, além de
possibilitar o contato com docentes dos módulos, com os conteúdos específicos
ministrados e com as referências bibliográficas. Consideraram também que a
manutenção do BLOG era trabalhosa e exigia tempo.
As monitoras avaliaram a experiência de orientação dos colegas positivamente e
solicitaram mais oportunidades nesse sentido. Indicaram dificuldades nessa atividade
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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devido à impossibilidade de estarem presentes nos módulos por incompatibilidade de
horário, no entanto, o contato com os colegas, quando possível, pareceu ser mais
estimulante do que o uso da ferramenta virtual.
DESENVOLVIMENTO DO PROJETO: SEGUNDO MOMENTO
O segundo módulo foi desenvolvido de fevereiro a maio de 2010. No início do ano
tivemos a substituição de duas monitoras que iniciaram estágios fora da cidade.
Respondendo à avaliação realizada no final do ano reformulamos a metodologia para
oferecer mais possibilidades de exercício da Monitoria através da atuação junto aos
alunos, não só do curso de Terapia Ocupacional, mas do campus todo. Dessa forma
decidimos que o projeto BLOG poderia seguir com outro grupo de alunas, e as
monitoras iriam se dedicar a outras atividades, mais diretamente voltadas ao
aprofundamento e transmissão no processo de ensino-aprendizagem. Criamos um
programa que denominamos Ciclo de Conferências e Experimentações Comentadas. As
ações desenvolvidas foram: organização das conferências através de divulgação,
recebimento das inscrições, contato com conferencista, verificação da estrutura do
evento (data-show, compatibilidade de programas, som etc.), recebimento dos inscritos
e confecção de declarações; coordenação de oficinas relacionadas às temáticas
desenvolvidas pelos conferencistas; inserção em outros espaços institucionais
favorecendo a aproximação interprofissional e entre projetos, como, por exemplo, no
Laboratório de Sensibilidades, espaço interdisciplinar onde são realizadas oficinas,
instalações e experimentações diversas.
A PRIMEIRA CONFERÊNCIA
Foi proferida pelo Dr. Leopoldo Fulgêncio Filho, psicanalista, especialista na teoria do
desenvolvimento emocional de Winnicott, com o titulo: O brincar na teoria de
Winnicott. Essa conferência ofereceu aos participantes subsídios teóricos bastante
utilizados por terapeutas ocupacionais e outros profissionais da saúde. Houve 122
inscrições de alunos dos diversos cursos do campus. Os conteúdos abordados na
conferência puderam ser retomados nos módulos de ART III, ART IV e abordagem
grupal.
A SEGUNDA CONFERÊNCIA E PRIMEIRA OFICINA
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
222
A segunda conferência ocorreu no dia 19 de abril, com a presença da terapeuta
ocupacional Aide Mitie Kudo, do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e abordou a temática da
hospitalização infantil. Essa conferência, com 110 participantes foi precedida por uma
oficina preparatória organizada pelas monitoras, realizada no dia 12 de abril com a
participação de 30 alunos. Foi organizada por uma dupla de monitoras, acompanhada
por outra dupla de observadoras. Através de dinâmicas de grupo e diversas atividades,
as monitoras apresentaram o livro ˝O Hospital através do olhar das crianças” de Kudo e
instigaram os participantes a construir questões para a autora. Foram discutidas as
seguintes temáticas retiradas do próprio livro: o Hospital, a Alimentação, Amizades, os
Profissionais.
As monitoras criaram um instrumento de avaliação da conferência que foi distribuído
aos participantes. Esse instrumento indicou que 98% consideraram-na ótima e 2%
avaliaram-na como boa.
A TERCEIRA CONFERÊNCIA E A OFICINA DE APROFUNDAMENTO
A terceira conferência foi proferida pelo Prof. Leonardo José Costa de Lima, da
Universidade de Sorocaba e do Centro de Atenção Psicossocial Adulto da Lapa,
prefeitura do município de São Paulo, discorrendo sobre a interface arte-saúde. Nesse
evento, estavam presentes alunos de diversos cursos do campus.
Como últimas atividades do projeto Monitoria, duas alunas coordenaram uma oficina de
aprofundamento do tema voltada para alunos do curso de Terapia Ocupacional. A partir
da história do uso de atividades artísticas em contextos terapêuticos apresentaram
projetos contemporâneos e propuseram uma atividade pratica.
PARTICIPAÇÃO EM OUTROS PROJETOS INSTITUCIONAIS
As monitoras iniciaram participação nas reuniões do Laboratório de Sensibilidades,
contribuindo com idéias e colaborando nos projetos em desenvolvimento. Essa
participação teve como objetivo aproximar alunos e docentes do curso de Terapia
Ocupacional desse espaço interdisciplinar no qual ocorrem inúmeras atividades que
podem contribuir para a formação. Nosso intuito era ampliar a parceria e poder oferecer
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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novas atividades que ampliassem o repertório e a criatividade, como relata uma das
monitoras:
˝... de 23 a 27 de março, foi realizada a primeira semana do projeto Curta-n[o-curto] por
mim e por Danilo (5º termo-psicologia). Expusemos, no Laboratório de Sensibilidades
curtas-metragem de animação do festival brasileiro chamado Anima Mundi, em três
seções diárias, duas durante os intervalos do turno da manhã e do turno da tarde e uma
seção durante o almoço, de 15min cada. Dividimos as animações por temas a nosso
critério, sendo eles: morte, música, vida e comédia, cada tema com dois ou três curtas.
Ao fim de cada seção, às vezes surgia naturalmente uma discussão, outras vezes os
espectadores saíam em silêncio, outras apenas se reacomodavam, outras se
entreolhavam e riam. Ou seja, os diferentes temas e curtas, surtiram diferentes efeitos,
afetações e não-afetações.
Do dia 6 a 9 de abril, foi realizada a segunda semana do projeto Curta-n[o-curto], com
os seguintes temas: religião, vida extraterrestre, temas variados e possibilidades. “Só
consegui estar presente na sexta-feira, o que me deixou frustrada, pois dediquei tempo e
energia junto a Danilo, para selecionar as animações, organizar o evento, fazer a
divulgação, e acabei impossibilitada de aproveitar o projeto enquanto ele estava sendo
realizado e participar das discussões ou do silêncio, enfim, de colher o resultado de um
trabalho.”
Outra monitora ingressou no Clube dos Saberes, outro projeto do laboratório no qual as
pessoas ensinam e aprendem. No entanto, as alunas que estavam no 5.º termo tiveram
dificuldades em ampliar sua participação devido ao horário das reuniões e ao excesso de
trabalhos escolares.
RESULTADOS DO SEGUNDO MOMENTO
Consideramos que a tarefa de organizar eventos e principalmente de elaborar e
coordenar oficinas ofereceu às monitoras oportunidades de estudo e aprofundamento, e
de transmissão, cumprindo os objetivos do projeto. As monitoras cresceram em
organização e segurança, aspectos que foram também ressaltados por elas. Relataram
também que o trabalho em grupo trouxe elementos de reflexão e crescimento, pois
exigiu o respeito ao ritmo e possibilidades do outro.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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As conferências trouxeram informações ricas que foram acrescentadas às oficinas e às
reuniões do Laboratório de Sensibilidades, criando conexões de sentido e aprendizado.
As reuniões de supervisão, que ocorreram mensalmente, a comunicação virtual e as
reuniões sistemáticas do grupo de monitoras orientaram o trabalho e esclareceram
conflitos, ajudando a superar as dificuldades.
Como dificuldade, as monitoras relataram excesso de atividades, pois a carga de
trabalho escolar é muito alta, principalmente no final do semestre, o que aponta para
maior flexibilização curricular, com valorização de atividades diversas como recursos
pedagógicos.
As monitoras também puderam exercitar a escrita das ATAS de reunião favorecendo a
leitura e organização de dados a partir das discussões em grupo. A nosso ver as reuniões
foram produtivas abordando aspectos relacionados às dificuldades no processo de
Monitoria, às relações com os alunos e com a instituição, encaminhamento de tarefas,
avaliação e análise do projeto, além de permitir a constituição de um espaço para
compartilhar e refletir em grupo sobre diferentes temáticas, enfrentamentos de situações
as mais diversas, favorecendo maior crescimento pessoal e acadêmico.
O grupo também teve como tarefa final a elaboração de um pôster para apresentação no
PIBIC, encontro anual de monitoria e iniciação cientifica da UNIFESP.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os monitores consideraram as diferentes vertentes do projeto como ações importantes e
bastante positivas para o exercício de atividades voltadas ao ensino, como organização
de eventos, contatos com alunos, apresentação de trabalhos direcionados aos alunos
tanto da Terapia Ocupacional quanto aos outros cursos etc.
Encontramos como obstáculo, principalmente, os horários dos módulos que não
permitiam a participação presencial das monitoras, pois ocorriam simultaneamente. A
matriz curricular não é flexível e a semana dos alunos tem poucos períodos livres. A
institucionalização de um período livre semanal no segundo semestre do projeto foi
fundamental para garantir as reuniões com monitoras e desenvolvimento do projeto.
Por fim salientamos que a Monitoria permitiu o exercício de organização de eventos
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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científicos, possibilitou o contato entre alunos dos diferentes cursos, ampliou o
conhecimento dos monitores acerca das dinâmicas institucionais e principalmente
contribuiu nas atividades acadêmicas propostas no Campus.
Nesse sentido a Monitoria constitui ainda em mais uma oportunidade de a Terapia
Ocupacional apresentar suas práticas, propostas e problematizações, aprofundando
conteúdos específicos e contribuindo simultaneamente com ações/estudos, propostas
interprofissionais resultando em uma discussão interdisciplinar coerente ao Projeto
Pedagógico do campus Baixada Santista.
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CINEMA COMO RECURSO PEDAGÓGICO DE TERAPIA OCUPACIONAL
ÁTALA LOTTI GARCIA1
GILMA CORREA COUTINHO2
TERESINHA CID CONSTANTINIDIS3
RESUMO
Este artigo trata de uma análise da utilização de obras cinematográficas como recurso
pedagógico na formação de graduandos de Terapia Ocupacional na perspectiva de
Edgar Morin. O cinema, em nossa cultura, tem se apresentado como um meio de
comunicação cuja técnica e linguagem conferem aos homens a possibilidade de
reconstruir a realidade e construir outras versões acerca dela. As histórias vividas
podem proporcionar uma revelação sobre o mundo do outro, ampliando o espectro do
olhar sobre a diferença. Durante a graduação, o aluno de Terapia Ocupacional tem
acesso a uma gama considerável de conhecimentos teórico-práticos que constituem o
leque de informações necessárias à atuação na profissão. A utilização de obras
cinematográficas contribui com a formação profissional, pois os filmes aproximam os
alunos de realidades diferentes e da compreensão de protagonistas ricos de detalhes da
vida comum. Para nós os filmes surgem como possibilidade ímpar de análise, por isso
utilizamos os temas estudados para analisar todas as características, as atividades, sinais
e sintomas que caracterizam o personagem, além de uma análise da forma e das
condições de sua vida. Acreditamos que desta maneira, ao assistir e analisar um filme e
em especial um dos protagonistas e sua forma de existir e interagir nas cenas seja uma
forma adequada de ensaio para a compreensão dos casos e sua condição de existir.
PALAVRAS-CHAVE: Cinema, Educação Superior, Terapia Ocupacional.
INTRODUÇÃO
A origem do cinema começou pelas sombras chinesas, a lanterna mágica e o nascimento
da fotografia no século XVII. A partir de 1950 foi possível a viabilidade do desenho
animado, com cenas do cotidiano. Assim se configura o mito do realismo total, a
recriação do mundo à sua imagem (LEITE, 2003).
1 Prof.a Ms. do curso de Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) [email protected] 2 Prof.a Ms. do curso de Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) 3 Prof.a Ms. do curso de Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
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O cinema funde o mecânico com o elétrico, a química com a física, enrola o mundo real
em uma fita para depois desenrolá-lo em uma vida de sonhos e fantasias, formando uma
sucessão de tomadas estáticas que ganham vida e movimento diante dos olhos do
espectador. Apreciar um filme significa desenvolver sensações sensoriais e psíquicas
podendo tornar as experiências ricas e envolventes. A experiência cinematográfica é
uma arte que permite uma ligação poderosa com o espectador (MAIA; MAIA;
CASTILHO; LUTUFO NETO, 2005). Num arranjo de imagens o expectador se envolve
na história, no roteiro, nas próprias imagens e, por aquele tempo determinado, se
identifica, se reencontra e se redescobre. Este movimento com o cinema permite ao
sujeito uma vivência indireta de conflitos e aventuras pessoais, além de outras maneiras,
como a literatura, a arte em geral, as telenovelas. Talvez seja essa magia do cinema que,
ao inebriar o humano, o prende por horas frente a uma enorme tela de projeção.
O cinema é um meio de comunicação cuja soma de técnicas e linguagem confere aos
homens a possibilidade de reproduzir a realidade e construir versões acerca dela, além
de constituir parte do tecido da vida cotidiana. Os filmes proporcionam o contato com a
realidade de forma a reconstruí-la sem desestruturação psicológica, pois é mais fácil ver
nos personagens as questões que se tem dificuldade de aceitar em si mesmo
(OLIVEIRA; OLIVEIRA; IGUMA, 2007).
Segundo Morin (1970), o cinema pode ser uma reconstrução da realidade e a linguagem
cinematográfica possui vários recursos que permitem que as relações entre o filme e o
imaginário social se efetivem, sendo possível reconhecer uma identificação entre a vida
dos personagens e a nossa vida, ou uma oposição entre os valores de alguns
personagens, que não são recomendados socialmente.
De acordo com Schwartz (2005) o cinema surge na cultura urbana metropolitana que
levou a novas formas de entretenimento e atividades de lazer e à predominância da
visão entre os outros sentidos (audição, tato, olfato, paladar), correspondente no corpo
ao local de centralidade que requer atenção e estimulação. O cinema proporciona o
desejo de definir, fixar e representar instantes isolados em face das distrações e
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sensações da modernidade, um anseio que ultrapassou e perpassou o impressionismo e a
fotografia. Ele proporciona a indefinição cada vez maior da linha entre a realidade e
suas representações, entre o sonho e a realidade.
Podemos considerar que esta atividade também contribui para a produção de novas
formas de ver o mundo, que pode levar à situação de diversão e entretenimento, a
expandir suas funções, caracterizando se- como uma maneira de re-arranjar conflitos,
sonhos, desejos e outros conteúdos com os do personagem.
A aceitação popular de um filme está intimamente ligada à relação do que é real ou
ideal a partir de uma busca pela perfeição, pelos ideais de beleza, de sabedoria, de força,
que compõem o imaginário social. Um filme pode ser um veículo poderoso, numa
mescla de sonho e fantasia, que pode possibilitar ao indivíduo uma reorganização de
suas vivências e experimentações.
Não existe mais o indivíduo sem influências externas, o que existe é o indivíduo que se
forma dia a dia através do outro, um ser construído através da comunicação e da
alteridade. O cinema proporciona este sentimento de identificação com o outro, a pessoa
sente que não é a única a ter determinadas características ou se sentir diferente, mas que
o personagem acompanha todos estes mecanismos e ela pode inclusive aceitar melhor
suas características individuais e sua forma de estar no mundo (MAFFESOLI, 1996).
Na modernidade vigorou a imagem de um indivíduo senhor de si, já na pós-
modernidade percebe-se uma pessoa que representa vários papéis, o conjunto prevalece
sobre o particular, pode-se reconhecer os outros em si, utilizando várias máscaras que se
constroem através dos outros. A pessoa constrói-se na e pela comunicação, ela é
formada por todas as potencialidades humanas: a imaginação, os sentidos e afetos. O
sujeito torna-se uma multiplicidade de objetos. Esses gostos, valores, idéias que são
partilhados entre as pessoas sedimentam-se, e quem não possui esses códigos corre o
risco de ficar excluído (LANGIE, 2005).
“O filme nos dá o sentimento de estarmos assistindo diretamente a um espetáculo quase
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real” (METZ, 1972, p. 16). Essa arte logo se tornou espetáculo, devido à participação
que incentiva o agrupamento e um meio para estimular a participação nas Atividades de
Vida Diária (AVD). Para Morin (1983), através da história e da projeção individual
sobre determinadas características de um personagem, o homem pode se reencontrar na
dinâmica da vida dos personagens e pode experimentar outras possibilidades de existir,
viver as mais variadas condições e aventuras humanas.
O cinema estimula um processo de identificação e reflexão das histórias “fictícias”
narradas na película com as histórias reais, traçando um paralelo e relacionado-as de
maneira a despertar emoções, sentimentos, insights, lembranças e expectativas naqueles
que assistem. Pode-se dizer que, ao olhar tais imagens, o mundo externo é
ressignificado internamente (RAINONE, 2004).
O filme pode ser do tipo documentário, entrevistas, pesquisa, romance, drama, suspense
etc., caracterizando-se por suas possibilidades, como tema, personagens, cenário,
equipamentos, figurinos e outras.
O filme também pode ser um auxiliar na compreensão da dinâmica existencial de
pessoas ao contribuir para desvelar realidades outras. As histórias vividas pelos
personagens podem falar de quem assiste ao filme e podem também proporcionar uma
revelação sobre o mundo do outro de uma forma amplamente apresentada que muitas
vezes só será possível pelo cinema. As histórias apresentadas podem também aumentar
o repertório de conhecimento sobre o cotidiano do outro, ampliando o espectro do olhar
sobre as diferenças, sejam quais forem, culturais, étnicas, físicas, religiosas e outras,
trazendo a idéia de inclusão social que tem como pressuposto uma sociedade que
admite a convivência de todas as pessoas, sem qualquer discriminação, com igualdade
de direitos a uma cidadania plena ressaltando a riqueza da diversidade.
OBJETIVO
Este estudo teve como objetivo fazer uma análise da utilização de obras
cinematográficas como recurso pedagógico na formação de graduandos na área da
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Terapia Ocupacional.
MATERIAS E METODOS
Adotamos uma metodologia qualitativa baseada nas discussões do grupo focal. As
vantagens de trabalhar com o grupo focal são: o clima relaxado das discussões; a
confiança dos participantes em expressar suas opiniões; a sua participação ativa; a
obtenção de informações que não ficam limitadas a uma prévia concepção dos
avaliadores; bem como a alta qualidade das informações obtidas. Por outro lado,
apresenta desvantagens, tais como: dificuldades para conseguir participantes, quando
estes devem obedecer a critérios muito específicos; a produção de polêmicas e
oposições na discussão; além de invalidação dos achados devido à ingerência de alguns
dos participantes (VEIGA; GONDIM, 2001).
O universo de pesquisa foi uma faculdade particular localizada em Vitória-ES, no bairro
São Pedro. Considerando que a única faculdade particular do estado do Espírito Santo
foi a criadora do curso de Terapia Ocupacional, optamos por fazer a primeira
abordagem nela. Escolhemos duas turmas que já estavam finalizando o curso. Desse
universo, selecionamos como colaboradores/informantes os alunos apontados por outros
professores como os mais frequentes do projeto “Cinema, sociedade e saúde”. Para isso,
sugerimos aos outros alunos que ficassem como observadores e só ao final expusessem
suas opiniões que foram também consideradas na pesquisa.
Primeiramente, em reunião com todos os alunos, explicamos o conteúdo do projeto e
obtivemos a autorização para o seu desenvolvimento. Em seguida requeremos a
indicação dos nomes das pessoas-chave. Foram realizados três encontros dos quais 6
alunos foram escolhidos para discutir os temas levantados e 6 como observadores. Os
temas foram discutidos da seguinte forma: as palavras foram colocadas no quadro e os 6
alunos deveriam discuti-las e suas relações. Por exemplo: nomes de filmes, terapia
ocupacional, emoções. Foram colocadas várias palavras e retiradas à medida que as
discussões se repetiam. O tempo de duração foi de aproximadamente duas horas. As
falas foram gravadas e transcritas e os conteúdos mais significativos foram retirados.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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RESULTADOS
Algumas falas foram escolhidas para ilustrar, mas a pesquisa colheu um material rico e
extenso para a discussão. Eis algumas delas:
“... na minha idade não tenho como entender o climatério, mas os filmes indicados por...
puderam me ajudar a entender esta etapa da vida.”
“... eu não tinha idéia de como um familiar se sentia, até que assisti... e pude entender o sofrimento e as dificuldades da família, eu simplesmente os achava acomodados antes do
filme”.
“... os professores falavam de esquizofrenia e eu não tinha a menor idéia do que eles tentavam dizer, até que assisti aos filmes... e pude entender o universo destas pessoas, principalmente no
filme... que o personagem não distingue a realidade do delírio e alucinação”.
Poderíamos citar várias falas, mas optamos por fazer uma discussão mais aprofundada.
DISCUSSÃO: FILMES COMO RECURSO VIVENCIAL E PEDAGÓGICO
Durante a graduação, os profissionais de saúde têm acesso a uma gama considerável de
conhecimentos teórico-práticos que vão constituir o leque de informações necessárias à
atuação clínica na profissão. Todo esse conhecimento não deriva tão somente dos
estudos, trabalhos e livros essenciais ou complementares aos acadêmicos, mas de toda a
bagagem adquirida das observações, convívio com os professores e da história de vida
do estudante e das pessoas que o cercam.
Para tanto, são ofertadas oportunidades e grande variedade de situações e informações
diferentes que serão incorporadas, pouco a pouco, aos conceitos e à formação de cada
aluno. Diante disso, a profissão da área da saúde constitui-se de bases complexas e
maleáveis, estruturada principalmente sobre o pilar da compreensão da diferença e das
formas diferenciadas de existir e estar na vida. Compreende-se também como o sujeito
pode construir sua autonomia. Há de se concordar que, para a autonomia e devida
integração social, deve haver a formação de um sujeito ativo, participativo, protagonista
de sua história.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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Consideramos autonomia a capacidade que o homem tem de construir uma forma de
viver que lhe possibilite um rearranjo em sua própria vida e nas relações que vai
estabelecendo com o mundo. De acordo com Eirado e Passos (1994, p.78): “A vida é
criação e conhecer é um ato de poiesis [...]. O vivo é, portanto, o domínio da autonomia
por excelência, já que sua existência se define e constrói a partir de um ato a um só
tempo criador e cognitivo daquele que vive/conhece e do mundo vivido/conhecido”.
No que diz respeito à formação dos alunos de Terapia Ocupacional, é preciso que haja o
desenvolvimento de estratégias que possibilitem a “assunção de uma posição crítica, de
potencialização da criação de dispositivos subjetivantes, de linhas de fuga passíveis de
causar estranhamento no que é familiar e poder ressignificar o tratamento para com o
diferente” (RAINONE, 2004). Então, ao pensarmos em um conceito como o de
autonomia, devemos pensar antes de tudo na capacidade de criação e autocriação
contínua do ser humano. “Autonomia significa antes de tudo, autocriação, autopoiese:
diferença entre aquilo que é construído por outro e aquilo que se constrói a si mesmo”
(EIRADO; PASSOS, 1994, p. 79). Talvez este conceito possa aproximar as mais
variadas profissões que atualmente estão compondo a equipe de saúde dos diversos
serviços da rede de saúde do SUS.
Cabe ao professor de Terapia Ocupacional inteirar-se de um maior número possível de
recursos e estratégias que possibilitem aos alunos compreender as diferentes demandas
e necessidades que chegam até eles, a fim de construir um plano de intervenção em cada
situação específica apresentada. Por isso a utilização de obras cinematográficas pode se
apresentar como um recurso dinâmico e rico contribuindo para a ampliação de
conhecimentos de realidades distintas vividas pelos personagens criados em uma obra
que também se apresenta de forma ilustrativa como um protagonista de uma história
real.
O cinema é um recurso com elementos sugestivos, que contribuem na produção de
novos significados e permite a livre associação a partir do repertório de imagens que
habitam o imaginário do espectador. Também pode promover a abordagem de
determinadas questões de uma forma que não sejam vividas de modo direto, ou de
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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forma a expor a história pessoal daquele que está exposto (RAINONE, 2004) ou com
quem se identifica. No caso de utilização de obras cinematográficas para contribuir com
a formação profissional com o objetivo de aproximação de realidades diferentes e
compreensão de protagonistas ricos de detalhes da vida comum, o filme surge como
uma possibilidade impar de análise dos futuros profissionais.
Os docentes com formação em Terapia Ocupacional e outros profissionais da saúde,
ligados à saúde mental, reabilitação física, profissionais da área social e de outras áreas
vêm utilizando obras cinematográficas como auxiliar pedagógico, procurando definir
junto aos graduandos o trabalho a ser desenvolvido, com o objetivo de observar e
analisar sinais e sintomas que caracterizam sofrimentos psíquicos e físicos, além de uma
análise da forma e das condições de vida daquele personagem. Acreditamos que, dessa
maneira, ao analisar um filme e em especial um dos protagonistas e sua forma de existir
e interagir nas cenas, seja uma forma adequada de ensaio para a compreensão do
homem e sua condição de existir.
O processo se inicia com a escolha de uma gama de filmes que podem ser vistos por
todos os alunos, ou por aqueles que se interessam mais diretamente pelo universo
cinematográfico. Os alunos são divididos em grupos e cada grupo passa a definir o
filme específico com o qual irá trabalhar. Após a definição do filme passamos a analisar
qual protagonista apresenta maior riqueza em sua composição. Em grupo, os alunos
definem o filme e o protagonista a ser analisado por todos os componentes. Assim
estabelece-se um “estudo de caso simulado” a ser apresentado pelo grupo a todos os
demais alunos da turma.
O grupo passa, então, a assistir ao filme diversas vezes, resgatando o protagonista e as
cenas que podem ilustrar os temas discutidos em sala. É feita a análise do protagonista a
partir da referência da disciplina e das interpretações que possam ocorrer. As atividades
que envolvem a análise de personagens de obras cinematográficas têm as seguintes
orientações: inicialmente o grupo escolhe um dos protagonistas da obra para análise,
seja a semiologia, seja a forma de viver ou qualquer outro tema em discussão na
disciplina corrente. Após essa definição, os alunos escolhem as cenas que podem
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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ilustrar a análise prevista por eles com base no referencial teórico utilizado na
disciplina. O grupo passa a produzir um material explicativo com a sinopse do filme,
apresentação do personagem escolhido, situações analisadas e o referencial utilizado.
Em data previamente definida o grupo apresenta as cenas e explicita para os demais
colegas de turma como chegou àquela análise e quais os caminhos trilhados para
alcançar aquela conclusão ou hipótese analítica, sempre apresentando as cenas e o
conteúdo teórico concomitantemente para contribuir com os demais e ainda
apresentando outros caminhos analíticos possíveis.
Inicialmente sugerimos alguns filmes que podem ser utilizados para essa atividade, mas
buscamos estimular a invenção e a criatividade dos alunos tanto na escolha como no
caminho de análise. Dos filmes que sugerimos, podemos listar: O aviador, O operário,
Uma mente brilhante, As Horas, Asas da liberdade, Uma lição de amor, Rain Man,
Forrest Gam, Meu nome é Rádio, Shine, Mr. Jones, Amnésia, Spider, Geração Prozac,
Melhor é impossível, Efeito borboleta, Decisões extremas, Antes de partir, dentre
outros.
A partir dessa experiência percebemos que os alunos vêm adquirindo autonomia
analítica, além de construir um caminho para exposição de idéias e apresentação de
formulação de hipótese para defender o processo de pensamento que os conduziu até
aquela análise.
É importante ressaltar que num filme o que importa não é a realidade, mas o que dela se
pode extrair, já que a imaginação é a tendência do cinema para romper fronteiras,
exprimir as linhas de força da existência e se preocupar menos em ser cópia da
realidade. O futuro profissional da saúde pode transitar entre o mundo do real e do ideal,
entre histórias ficcionais lúdicas e histórias reais com a possibilidade de compreender as
diferentes formas de ser e estar no mundo. Tal prática pode facilitar a aproximação do
graduando às diversas realidades, em um momento anterior àquele em que ele vai ao
encontro do usuário de seu serviço.
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CONCLUSÃO
Um recurso cinematográfico, quando utilizado para aproximação da vida cotidiana, é
sempre um intermediário entre a ficção e a vida real. Esta possibilidade vem permitindo
inclusive amenizar as dúvidas e inseguranças dos graduandos em formação, já que no
filme o personagem “não é real”, a pessoa não sofre nenhuma consequência de uma
análise e condução equivocada. O cinema é um recurso didático utilizado como
intermediário que busca uma aproximação devida e necessária com as situações da vida
cotidiana.
O cinema também possibilita destacar os aspectos da cultura de um povo, mostrando
seus hábitos, os aspectos típicos, as belezas naturais, as danças, os costumes em geral ou
então criticar um sistema ou uma instituição, contribuindo tanto para valorizar a cultura
dos graduandos quanto fazê-los refletir e ainda possibilitar a formação de um cidadão
mais critico e mais consciente dos seus direitos.
Os profissionais que utilizam o filme como recurso didático podem apresentar vários
recortes a serem explorados de acordo com seus enquadramentos, movimentos,
observações e demonstração de alguns pontos de vista. Nessa perspectiva vários
assuntos podem ser destacados e ressaltados de acordo com o interesse dos alunos e
necessidades do professor.
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Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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O PLANO DE TRATAMENTO COMO ESTRATÉGIA DE ENSINO-
APRENDIZAGEM NO ESTÁGIO DE TERAPIA OCUPACIONAL EM
DISFUNÇÃO FÍSICA
DANIEL MARINHO CEZAR DA CRUZ1
ALESSANDRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE E SOUZA2,
PAULA TATIANA CARDOSO3
RESUMO
A formação em Terapia Ocupacional (TO) para a área de Disfunção Física (DF)
engloba o processo da TO, caracterizado pela avaliação, intervenção e resultados. O
desenvolvimento do raciocínio clínico, que implica a tomada de decisões, é uma
habilidade cognitiva essencial ao aluno em seu processo de formação. Concorrem para
isso estratégias que capacitem o aluno a traçar metas e objetivos, escolher métodos de
intervenção e avaliação de desfechos na reabilitação em DF. Objetiva-se relatar neste
estudo a experiência da utilização do Plano de Tratamento (PT) como estratégia de
ensino. A experiência ocorreu em atividades de práticas supervisionadas e estágio
profissionalizante do Curso de Terapia Ocupacional de Universidades Federais
(UFSCar e UFTM), no primeiro semestre de 2010, ao longo de quatro/cinco meses, sob
a supervisão de docente da subárea de DF. Um PT padronizado em formulário foi
desenvolvido a partir de referências da área e utilizado pelos alunos de uma das
universidades. O outro PT foi implementado subjetivamente em prontuário da atividade
desenvolvida. Para avaliar a utilização dos planos foi elaborada uma entrevista aberta
com três questões, nas quais os alunos de ambas as universidades reportaram a opinião
sobre a utilização. Os resultados ilustraram que o PT é significativo para o processo de
ensino-aprendizagem no que se refere a pensar sobre metas, objetivos, métodos de
intervenção e avaliação de desfechos. Implica, para futuras ações, a implementação do
PT como estratégia para o ensino-aprendizagem de habilidades que envolvem a
documentação e a estruturação da prática da TO no campo da disfunção física.
PALAVRAS-CHAVE: Terapia Ocupacional, Educação, Avaliação da Deficiência,
Planejamento de Assistência ao Paciente.
1 Prof. Ms. do Departamento de Terapia Ocupacional da Universidade Federal de São Carlos - UFSCar.
[email protected] 2 Prof.ª Assistente do curso de graduação em Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Triângulo
Mineiro-UFTM. 3 Prof.ª Ms. Substituta do Departamento de Terapia Ocupacional da Universidade Federal de São Carlos -
UFSCar.
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INTRODUÇÃO
Este relato trata de duas experiências em cursos de formação superior em Terapia
Ocupacional no Brasil, na área de disfunção física (adulto e infância). A partir da prática
em estágio supervisionado no campo da disfunção física são discutidas questões
relacionadas ao desempenho dos alunos quanto ao processo da terapia ocupacional junto
à clientela com essas disfunções. São apresentadas e aventadas as estratégias de ensino
que possibilitaram o ensino-aprendizagem da prática clínica e as implicações que dela
resultaram na formação de profissionais da saúde no Brasil.
O ALUNO-TERAPEUTA NO CAMPO DA DISFUNÇÃO FÍSICA
É comum aos alunos, durante seu processo de formação, a insegurança quanto à prática
junto aos clientes (crianças, adolescentes, adultos e idosos) com disfunções físicas. A
necessidade e a procura por conhecimento de patologias, técnicas e métodos para
tratamento parecem ser uma preocupação constante dos alunos e muitas vezes é
justificativa para um desempenho não satisfatório junto a essa clientela.
Frequentemente, sentenças como “estou insegura”, “não sei quais objetivos traçar”, ou
mesmo “estou perdida” surgem durante as práticas supervisionadas. Em parte, essas
afirmações sugerem um problema anterior, que se relaciona ao processo da terapia
ocupacional, às habilidades e desempenhos necessários para a tomada de decisões pelos
alunos. Confusões conceituais muitas vezes se refletem no desenvolvimento de práticas
confusas e isso fica explícito, por exemplo, na interpretação da palavra avaliação como
sinônimo de testes padronizados.
Chagas e Mancini (2004) esclarecem que testes são instrumentos específicos, que geram
dados sobre o objetivo elencado como tratamento e geralmente estão contidos em uma
avaliação. A avaliação é definida como um processo intricado e característico no qual se
coletam as informações necessárias para a identificação do perfil ocupacional e dos
déficits funcionais, que conduziram o paciente/cliente para uma perda de função e/ou
incapacidade. Ambos possuem linguagem (terminologia) pré-estabelecida.
A ausência de terminologia (linguagem) consistente para registro das ações da clínica
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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também contribui para difundir as confusões conceituais no campo. Uma terminologia
vaga e/ou imprecisa que é empregada nos registros de um processo de intervenção
terapêutica (por exemplo, de um prontuário) por si só potencializa uma ausência de
evidência das reais possibilidades e condições de saúde do paciente/cliente. A
apropriação de terminologia conceitual adequada e o seu uso no cotidiano do processo
de terapia ocupacional, que inclui avaliação, intervenção e revisão da intervenção,
comprovam o raciocínio clínico sobre o envolvimento do cliente em ocupações. O
raciocínio clínico permite que o terapeuta identifique:
“(...) as múltiplas demandas, habilidades e potencial de significados da
atividade e” (...) “obtenha conhecimento mais aprofundado sobre a relação entre os aspectos do domínio que afetam o desempenho e
aqueles que podem apoiar as intervenções e os resultados centrados no
cliente” (AOTA, 2008, p. 646-647)
Tanto para os procedimentos de registro, quanto para a comunicação entre os pares (por
exemplo, membros de uma equipe), a terminologia precisa e coerente impõe
colaboração que divide informações, avaliações, metas e intervenções e que ajuda no
alcance dos objetivos propostos (CAVALCANTI e GALVÃO, 2007). Para isso a
elaboração de um plano estratégico, um plano de tratamento, é de extremo efeito,
orienta as ações e as estratégias a serem implementadas, facilitando a construção dessa
estrutura.
Segundo Sauron e Oliveira (2003), na terapia ocupacional em reabilitação física, como
ciência aplicada à deficiência física, não existe mais espaço para expressões como “bom
desenvolvimento”, “mais ou menos forte”, “boa sensibilidade”, “bastante
independente”, “família parece adequada”. Essa preocupação em apresentar linguagem
adequada e precisa (terminologia consistente) em relação ao que avaliar, sustenta a
relevância da utilização de critérios que constituem elementos para a elaboração de um
Plano de Tratamento delineado com metas, objetivos e estratégias que permitam
desfechos desejados.
Como bem afirma Nunes (2008), a avaliação é parte da relação de formação de vínculo
entre o terapeuta ocupacional e o cliente. Inclui medidas, mas não se esgota nelas.
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Segundo a autora, a medida quantifica determinada habilidade, mas é a avaliação que
informa o valor que a medida tem para a pessoa em seu contexto.
Os dados que são coletados e documentados em uma avaliação permitem que o
terapeuta ocupacional revise a informação, identifique a funcionalidade e as limitações
do paciente/cliente, bem como suas necessidades, a ponto de desenvolver hipóteses, que
identificarão os problemas e as preocupações que subsidiarão o Plano de Tratamento
(AOTA, 2008).
Dessa forma a importância de o aluno saber como avaliar, o que avaliar e a
complexidade do processo implica ações que possam subsidiar a tomada de decisões,
“empoderando” o aluno-terapeuta em seu processo de aprendizagem de como lidar com
as diversas clientelas. A avaliação, parte do processo de terapia ocupacional, ocupa um
espaço essencial na formação dos alunos e é destaque na estratégia de ensino da prática.
Assim, a coleta e a reunião de informações sobre dados de prontuário, conversas com a
equipe multiprofissional e família, aplicação de instrumentos, construção da história de
vida e observação do cliente fornecem dados que reúnem uma quantidade considerável
de informações que precisam ser sistematizadas e definidas enquanto metas, objetivos e
opções de tratamento. Nesse sentido, é importante fornecer ao aluno estratégias que
possibilitem a ele estabelecer suas condutas ao longo da prática em disfunção física.
À medida que habilidades especiais vão sendo constituídas, a tomada de decisões
clínicas para a resolução de problemas pode-se afirmar que antecede o conhecimento de
métodos e técnicas de reabilitação, que podem ser pretendidos ou utilizados, de acordo
com os objetivos propostos, por exemplo, se o tratamento for reabilitador ou adaptativo.
Isso se justifica, em parte, pela habilidade de elaborar um Plano de Tratamento e
estratégia que contemple sistematicamente as ações a serem desenvolvidas junto aos
pacientes/clientes.
Segundo Pedretti e Early (2004), o Plano de Tratamento é conceituado como a proposta
ou elaboração de um plano terapêutico, descrito como o centro da prática da terapia
ocupacional e como questão central do ensino na terapia ocupacional. Para as autoras,
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esse plano se embasa nas prioridades do cliente, em uma análise crítica de seus déficits
de desempenho, investigados por avaliações iniciais, e nas circunstâncias peculiares a
cada cliente. Esse planejamento somente se torna possível a partir de uma avaliação
cuidadosa, na qual foram revistos, analisados e resumidos os dados diversos como
exames, seleção de modelos, identificação de metas e objetivos e escolha de métodos de
tratamento.
Em serviços de referência/excelência no Brasil, como grandes hospitais e renomados
centros de reabilitação, as avaliações que subsidiam a elaboração de um Plano de
Tratamento têm sido uma preocupação recorrente. À medida que serviços são
implementados torna-se necessário, nesses espaços institucionais, criar meios de
evidenciar e de responder às demandas apresentadas com comprovação da efetividade
da prática da terapia ocupacional, ao mesmo tempo em que se demonstra a necessidade
de manutenção desse serviço aos clientes e às instituições a eles pertencentes.
A prática baseada em evidência (PBE), tendência mundial na sistematização da atuação
profissional, é a forma de comprovar a partir do uso da evidência científica o melhor
tratamento endereçado aos clientes, assim como a maneira ideal para justificar a
importância de determinadas profissões da área da saúde em relação ao seu efeito
(MANCINI, 2007). Logo, a prática em disfunção física na graduação em Terapia
Ocupacional deve enfocar as questões de desempenho do aluno para possibilitar-lhe
programar com competência a reabilitação de forma sistematizada.
A partir das necessidades levantadas, este relato de experiência tem por objetivo
apresentar as implicações de um Plano de Tratamento como estratégia de ensino-
aprendizagem de alunos de Terapia Ocupacional, em dois cursos de formação superior
brasileiros, no campo da disfunção física.
MÉTODO
Um Plano de Tratamento foi elaborado a partir de referenciais da área de disfunção
física em terapia ocupacional e testado com alunos do curso de graduação em Terapia
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Ocupacional da Universidade Federal de São Carlos, da Unidade Educacional de Prática
Supervisionada em Terapia Ocupacional V - Disfunção Física e Sensorial, que
contempla o ciclo do adulto e do idoso.
Particularmente, os alunos da UFSCar utilizaram o Plano de Tratamento para
demonstrar a estrutura da prática da terapia ocupacional, que incluiu as áreas de
atuação, bem como o processo (avaliação, intervenção e resultados).
Fig.1: Modelo de Plano de Tratamento
O Plano de Tratamento utilizado foi baseado nos referenciais de Pedretti e Early (2004).
O modelo utilizado está ilustrado na Figura 1.
Um Plano de Tratamento também foi implementado e desenvolvido junto ao campo
prático de ensino – Estágio Profissionalizante, área de concentração Reabilitação Física,
ciclo da infância e adolescência, da Universidade Federal do Triângulo Mineiro. Os
alunos após o encerramento da avaliação, que incluiu o emprego de teste específico,
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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delinearam metas e traçaram objetivos. Findada essa fase, as estratégias de intervenção
foram selecionadas e registradas para que o processo de intervenção terapêutico fosse
iniciado. Utilizou-se formulário pautado livre, ao invés do modelo sistematizado.
Mediante a aplicação de um roteiro de entrevista com questões sobre a utilização do
Plano de Tratamento, foram coletados dados acerca das opiniões dos alunos sobre a
utilização do plano (em formato do modelo ou em formulário livre), analisadas
qualitativamente em categorias, de acordo com a análise temática do conteúdo, proposta
por Bardin (2009).
Como procedimentos éticos, a identidade dos alunos foi mantida, sendo apenas
identificados por meio de siglas referentes a sujeitos (S) e sua respectiva instituição de
origem, visto que o relato abordava a experiência interinstitucional de duas
universidades federais. Os alunos assinaram um Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLS) autorizando a publicação dos relatos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados da experiência de utilização do Plano de Tratamento foram analisados a
partir do autorrelato dos alunos e divididos em três categorias: 1) Os benefícios do
plano de tratamento, 2) A aplicabilidade do Plano de Tratamento e 3) As adequações do
Plano de Tratamento.
1) Os benefícios do Plano de Tratamento
A partir do autorrelato dos alunos, a importância da utilização do Plano de Tratamento
foi identificada como estratégia para orientar a prática a ser implementada e nortear o
raciocínio clínico, processo cognitivo desenvolvido a partir da experiência prática dos
terapeutas ocupacionais e, em um escopo maior, um meio de visualização do tratamento
como um procedimento amplo e abrangente:
“Na prática terapêutica ocupacional, o Plano de Tratamento se torna um
potente guia para o profissional terapeuta ocupacional ao facilitar a
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visualização de objetivos (de curto e longo prazos), metas, prioridades e
condutas a serem tomadas. Nesse sentido, tal plano é capaz de nortear o
raciocínio clínico e a tomada de decisões do terapeuta ocupacional,
objetivando favorecer o processo de tratamento como um todo” (S1, UFSCar).
“O plano de intervenção é necessário para sistematizar e orientar a prática do
terapeuta ocupacional, uma vez que, após a avaliação, nele estão contidas as
informações necessárias para que se alcancem os objetivos estabelecidos para
cada cliente”(S8, UFTM).
O excerto a seguir, também permite a discussão do Plano de Tratamento como
estratégia de organização dos alunos acerca dos procedimentos, tempo viável para as
ações e segurança quanto aos objetivos traçados, o que de uma forma ou de outra é
essencial para que o aluno possa desenvolver a prática de forma sistematizada:
“O plano de tratamento tem uma importância na organização interna do
terapeuta ocupacional e permite que ele possa enxergar com clareza o que de
fato pode realizar com o paciente em um espaço de tempo determinado.” (S2,
UFSCar)
[O plano de tratamento] “Direciona o foco de atuação à necessidade do
cliente, trazido pelo mesmo, sob um determinado período de tempo estipulado.
Somado a isso, este serve como forma de orientar o profissional acerca da
evolução do cliente, denotando em intervalos de tempo a necessidade de
reajustes, caso seja necessário.” (S2, UFTM)
Frente à demanda de serviços de saúde, públicos ou privados, observa-se crescente solicitação
para a comprovação dos benefícios prestados, indicadores de melhora, uniformidade e clareza
do profissional inclusive diante de uma equipe, assim como uma reflexão sobre os resultados
terapêuticos, que implica revisão de objetivos, decisão de alta ou mesmo indicação para outros
tipos de terapias. Isso remete a pensar que o raciocínio clínico e o planejamento do tratamento
são habilidades essenciais, comuns aos profissionais da área da saúde. Esses aspectos estão
ilustrados, a partir do discurso dos alunos e demonstram o seu nível de reflexão, possibilitado a
partir da experiência como alunos-terapeutas no planejamento do serviço prestado.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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“Estabelecer um objetivo durante o tratamento, o que facilita o raciocínio
clínico identificando as principais demandas a serem trabalhadas. Além disso,
colabora na observação dos resultados, se foram atingidos ou não de acordo
com o tempo determinado.” (S3, UFSCar)
“Acho que o “Plano de Tratamento” é fundamental para a prática terapêutica
ocupacional assim como qualquer outra profissão que envolva um processo de
vários atendimentos, onde os objetivos e conduta devem estar esclarecidos e
bem definidos. Principalmente para os iniciantes na prática profissional este
tipo de instrumento é de grande valia, pois norteia as atitudes do terapeuta.”
(S4, UFSCar)
“Acredito que o „Plano de Tratamento‟ é um instrumento capaz de auxiliar na
determinação de objetivos e prioridades do tratamento, e na visualização do
período de tempo que se alcançou esses. Deste modo, na prática do terapeuta
ocupacional, o „Plano de Tratamento‟ proporciona a observação e,
consequente, reflexão do processo terapêutico, ou seja, a partir desse
instrumento é possível mensurar o período de tempo disponibilizado para
alcançar os objetivos e discutir a maneira como foram alcançados (p. ex., como
foi o processo e o envolvimento do paciente). Pode-se afirmar ainda que o
„Plano de Tratamento‟ auxilia o terapeuta ocupacional a expor e explicar a
uma equipe multi ou interdisciplinar os objetivos e resultados de sua
intervenção.” (S.5, UFSCar)
2) A aplicabilidade do Plano de Tratamento
Cabe destacar que o uso do termo “aplicabilidade” do Plano de Tratamento, em
detrimento da palavra “aplicação” foi necessário, uma vez que sua utilização com os
alunos foi de caráter experimental. Dessa forma, após a utilização do Plano de
Tratamento, foi fundamental arguir os alunos sobre o processo de utilização e a
adequação dele na prática supervisionada em disfunção física (adulto/infância).
A experiência de utilização foi reportada pelos alunos sob uma perspectiva ampliada em
relação ao processo de ensino-aprendizagem. Foi motivadora e significativa para os
alunos a experiência de planejar estratégias de tratamento e de pensar a terapia
ocupacional aplicada às disfunções físicas com base em evidências coletadas.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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A utilização incorporou fundamentos da terapia centrada no cliente, ao enfocar
prioridades da pessoa e aquilo que é significativo para ela, a despeito de existirem
medidas testadas previamente, que informaram sobre o desempenho ocupacional, por
exemplo, na área de disfunção física - adulto/idoso (curso de Terapia Ocupacional da
UFSCar): a Medida de Independência Funcional- MIF, o Índice de Barthel, a Medida
Canadense de Terapia Ocupacional-MCDO, a Lista de Identificação de Papéis
Ocupacionais (Role Checklist) e as escalas de coma como a Rancho Los Amigos, dentre
outros utilizados na prática supervisionada; e na área de disfunção física - infância
(curso de Terapia Ocupacional da UFTM): o Inventário de Avaliação Pediátrica de
Incapacidade (PEDI), a Avaliação da Extremidade Superior do Hospital de Shriners -
SHUEE (Shriners Hospital Upper Extremity Evaluation) e o Perfil Sensorial (Sensory
Profile).
Desse modo, percebeu-se que os alunos alcançaram o sentido da palavra avaliação
como um processo amplo que permite a tomada de decisões clínicas, a partir de um
planejamento sistematizado que considera o cliente como foco das escolhas. Embora
reúna uma quantidade de informações consideráveis a respeito do tratamento, o Plano
de Tratamento mostrou-se como de fácil utilização pelos alunos.
“Utilizar o modelo do Plano de Tratamento para traçar os objetivos de curto e
longo prazo, bem como estabelecer prioridades e condutas constituiu um
potente facilitador ao disparar nas estagiárias as primeiras experiências de
raciocínio clínico na área de Disfunção Física. Além disso, ele favoreceu uma
visualização ampliada em relação às demandas priorizadas pela paciente, bem
como os objetivos a serem delimitados. É importante destacar que a estrutura
do plano é bastante clara e seu preenchimento pode ser feito com bastante
facilidade”. (S1, UFSCar)
“No plano de intervenção do estágio profissionalizante do 8 período continha
os dados obtidos nas avaliações padronizadas utilizadas, os objetivos a curto,
médio e longo prazo estabelecidos para com os clientes, as estratégias de
intervenção e as abordagens utilizadas”. (S9, UFTM)
É comum, entre os alunos, ao pensar na prática da terapia ocupacional em disfunção
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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física, associá-la com a aprendizagem de métodos como o neuroevolutivo (Ex: Bobath,
Kabat, Brunnstrom, dentre outros). A não satisfação diante desses conteúdos pode gerar
insegurança quanto ao que fazer com os clientes que apresentam disfunções de origem
neurológica central, clientela atendida pelos alunos no estágio. Porém, o conhecimento
sobre a estrutura da prática (as áreas de atuação e como atuar nelas para a avaliação,
intervenção e resultados) é uma aprendizagem que permite ao aluno raciocinar sobre
quaisquer campos em que deseje atuar e, no caso específico da disfunção física, decidir
quais métodos, técnicas e recursos irá utilizar para alcançar os objetivos em conjunto
com o cliente, conforme se vê nos discursos a seguir:
“No meu caso, traçar um plano de tratamento ficou um pouco confuso no
início, devido à minha falta de prática. No entanto, ao traçarmos um plano com
objetivos que vão de encontro com as necessidades e/ou interesses do paciente,
permitiu o estabelecimento de um vínculo entre nós estagiárias e o paciente.
Além disso, fica muito mais fácil a auto-organização e pensar em formas de
atuação.” (S2, UFSCar)
“Foi importante estabelecer e diferenciar metas „a longo prazo‟ e metas „a
curto prazo‟, um exercício para refletir sobre o tempo necessário para atingir
os objetivos do tratamento. Vejo que com o uso do plano de tratamento, o
mesmo fica mais objetivo e claro, obtendo uma maior eficácia, sem correr o
risco de perder o foco da intervenção. Sendo importante também para uma
melhor compreensão e acompanhamento do supervisor do estágio.” (S3,
UFSCar)
Na medida em que os alunos encontram estratégias que lhes permitam visualizar um
processo, a priori desconhecido, as sensações de angústia e ansiedade, conforme aponta
o aluno S4, podem ser reduzidas. Fica claro que a compreensão do aluno sobre o que
poderá desenvolver permite a ele buscar o conhecimento necessário para o
planejamento das intervenções e de qual(is) meta(s), objetivo(s), medida(s) e método(s)
poderá fazer uso. Os discursos a seguir sustentam esse raciocínio:
“Como já disse acima me ajudou muito a ter claro quais objetivos pretendia
atingir e de que forma deveria agir (condutas). Foi fundamental para o início
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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de minha prática profissional, me auxiliando a ter mais calma e diminuir
minhas angustias.” (S4, UFSCar)
“Após a coleta da história de vida e clínica e as avaliações (p. ex., MIF), o
„Plano de Tratamento‟ ajudou a visualizar os objetivos a curto e a longo prazo
nos atendimentos com a paciente. A partir de uma abordagem ativa da paciente
no seu tratamento e do „Plano de Tratamento‟, foi possível estabelecer
prioridades e planejamento das sessões (p. ex., análise da atividade e
objetivos). Além disso, o „Plano de Tratamento‟ possibilitou a percepção dos
ganhos e importância do processo terapêutico ocupacional. Por exemplo,
inicialmente, definimos e elegemos prioridades do tratamento, conforme
alcançávamos as metas colocávamos a data; assim, foi possível observar os
avanços do tratamento dentro de um determinado tempo.” (S5, UFSCar)
“O mesmo deve ser objetivo e coerente ao desejo do cliente, e devem-se incluir
os objetivos a serem alcançados num intervalo de tempo (objetivos a curto,
médio e longo prazo) e de acordo com as necessidades do cliente. E
acrescentando-se a isso, as estratégias a serem utilizadas”. (S9, UFTM)
A clareza relatada pelos alunos sobre o processo da terapia ocupacional permite dialogar
com o que afirma Pedretti e Early (2004), ao discutirem ser importante a redação do
Plano de Tratamento. Segundo os autores, a redação deve apresentar “objetivos
específicos de maneira ordenada e sequencial, que ficarão claros para o terapeuta” (p.
50). Além disto, eles destacam uma evidência de que terapeutas que realizam a
elaboração do plano de forma intuitiva e não escrita, tendem a encontrar dificuldades
para justificar as razões para o trabalho que realizam. Assim, um Plano de Tratamento
escrito e organizado permite mensurar o progresso de um cliente e a eficácia do plano
elaborado.
3) Sobre as adequações ao Plano De Tratamento
Para os alunos da UFTM, que utilizaram um Plano de Tratamento em formulário
pautado, foi-lhes apresentado nesse relato o modelo dessa produção e percebe-se que o
reconhecimento da objetividade e sistematização das informações ganha destaque na
interpretação do acadêmico, que pontua a importância desse tipo de documentação para
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o desenvolvimento da terapêutica.
“Ele é bastante objetivo e contempla o que o TO deve buscar durante o
tratamento de determinado cliente, embora sejam precisas adaptações se ele
for utilizado com uma demanda diferente daquela que necessita de reabilitação
física.” (S8, UFTM)
Trata-se de um plano de intervenção objetivo e sucinto, o qual oferece uma
estrita evolução dos objetivos a serem alcançados. Isto proporciona ao
profissional um acompanhamento mais apurado da evolução do cliente. (S9,
UFTM)
Por fim, os alunos que utilizaram ao longo do semestre o Plano de Tratamento aqui
apresentado, apontaram sugestões sobre a utilização do Plano de Tratamento como
estratégia de ensino no campo da prática em disfunção física, uma delas corresponde à
disposição do plano e sua estrutura.
“Sugeriria apenas um aprimoramento na estrutura do Plano, por exemplo,
acrescentando uma coluna para a categoria das “Condutas” ao invés de
reservar um espaço ao final do plano.” (S1, UFSCar)
“Acho que o plano de tratamento necessita de muita seriedade e respeito pelo
paciente, que pode muitas vezes não aderir ao que era proposto. Para isso, a
dupla deve estar muito atenta aos movimentos deste paciente, e também
desenvolver a habilidade de pensar estratégias e intervenções durante toda a
trajetória dos atendimentos.” (S2, UFSCar)
“Penso ser relevante a continuidade do uso do „Plano de Tratamento‟ pelos
estudantes na unidade educacional, tanto para a aprendizagem dos alunos
quanto para o aprimoramento desse instrumento, pois com o uso surgirão
questionamentos relevantes para a prática e para o aperfeiçoamento do
instrumento.” (S5, UFSCar)
“O plano de intervenção não pode ser algo extenso, com muita revisão de
literatura, porque pressupõem-se que, para elaborá-lo, o terapeuta ocupacional
já sabe sobre o assunto em questão. Nele devem conter informações relevantes
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obtidas no processo de avaliação, as metas que o terapeuta pretende alcançar,
as abordagens utilizadas o modo como o TO fará para atingir seus
objetivos”.(S8, UFTM)
A partir do discurso de S2, observa-se a necessidade de maior ênfase na escolha de objetivos
centrados no cliente. Essa experiência possibilitou aos alunos o pensar no sentido da terapia
ocupacional e da importância do foco nas necessidades do cliente e não do terapeuta que propõe
o tratamento.
As adequações sugeridas por S1 apontam, ainda, que é necessário estimular o aluno a pensar
sobre o processo da terapia ocupacional e que talvez o desejo expresso de escolher opções pré-
determinadas de métodos e técnicas de intervenção ainda reflete uma necessidade de
amadurecimento profissional, uma vez que o espaço “em branco” existe propositalmente para
que o aluno tenha a possibilidade de raciocinar e escolher a melhor intervenção em conjunto
com o cliente. Dessa forma, o espaço aberto para descrever a(s) conduta(s) tem por objetivo
avaliar a capacidade de planejamento do aluno e visualizar as relações que ele faz para alcançar
os objetivos propostos no Plano de Tratamento.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Plano de Tratamento e sua utilização pelos alunos foram identificados como
importante estratégia de ensino-aprendizagem na prática em disfunção física. Os alunos
reportaram que seu uso foi importante para a organização, planejamento, segurança em
relação ao processo da terapia ocupacional, visualização e demonstração dos objetivos.
A clareza das informações registradas facilita o processo de implementação da
intervenção e garante o reconhecimento das ações do profissional frente aos demais
profissionais.
Dada a ênfase no desempenho dos alunos para avaliar, intervir e demonstrar resultados
da intervenção, a utilização do Plano de Tratamento tem aplicação pertinente para o
processo de ensino-aprendizagem dos alunos na graduação em Terapia Ocupacional, no
campo da disfunção física.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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ATIVIDADES DE EXTENSÃO NO CURSO DE TERAPIA OCUPACIONAL:
INVENTÁRIO DE POTÊNCIA E OFICINA DE AÇÃO
FERNANDA CRISTINA MARQUETTI1
ROBERTO TYKANORI KINOSHITA2
RESUMO
Introdução: Este projeto oferece oportunidade de aprendizagem dos conceitos
articulados no módulo de ensino “A Ação como precursora do pensamento no humano”
do curso de Terapia Ocupacional, em ações práticas na comunidade. Abordamos a
questão do cotidiano como constituinte do bem-estar do sujeito no seu território.
Justificativa: Nessa atividade de extensão buscamos verificar como o processo da ação
precede o pensamento e as consequências dessa concepção no conhecimento do
humano, na formação dos alunos e na contribuição de novas tecnologias na TO, no
município de Santos. Objetivos: Contribuir com a rede de saúde mental de Santos,
propor formas de conhecimento do cotidiano de usuários de Saúde Mental baseadas no
“Inventário da Potência” que se descolem das tradicionais avaliações e oferecer um
processo de intervenção grupal aos usuários de Saúde Mental com recursos terapêuticos
baseados nas categorias conceituais elaboradas no referido módulo de ensino.
Metodologia: As estratégias dessa atividade de extensão estão baseadas em dois
momentos. Primeiro o conhecimento do potencial e dificuldades dos usuários com um
instrumento de avaliação específico da Terapia Ocupacional, o “Inventário de
Potência”. Na etapa seguinte uma intervenção grupal com recursos terapêuticos: a
“Oficina de Ação”. Os recursos terapêuticos são baseados na recuperação da potência,
na coordenação de ação e emoção do sujeito com seu grupo, na reconstrução de suas
cadeias operatórias do cotidiano, na ampliação de seu campo operatório, na
incorporação de ações/gestos/corpo exteriorizados e nas formas de sensibilidade
corpórea. Resultados: em processo.
PALAVRAS-CHAVE: Inventário, Avaliação, Ação Humana.
1 Prof.ª Dr.ª do Departamento de Ciências da Saúde, Universidade Federal de São Paulo, campus Baixada
Santista [email protected] 2 Prof. Dr. do Departamento de Ciências da Saúde, Universidade Federal de São Paulo, campus Baixada
Santista.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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INTRODUÇÃO
A natureza acadêmica deste projeto está baseada em atividades de extensão com alunos
do curso de Terapia Ocupacional, referentes a práticas de saúde mental oferecidas à
comunidade dos usuários da rede de Saúde Mental do Município de Santos. Este projeto
ofereceu oportunidade de aprendizagem dos conceitos e teorias articulados no módulo
de ensino “A Ação como precursora do pensamento no humano” do curso de Terapia
Ocupacional em ações práticas na comunidade. Nesse processo de ensino e extensão
abordamos a questão do cotidiano e suas cadeias operatórias como constituintes do
bem-estar do sujeito no seu território.
Esta proposta de atividade de extensão está relacionada ao módulo de ensino construído
especificamente para o curso de Terapia Ocupacional da UNIFESP/BS e ao projeto de
pesquisa na mesma linha de trabalho. Portanto, estamos articulando ensino, pesquisa e
extensão.
O projeto relaciona-se com a população do Município de Santos via unidades de saúde
do SUS, ONGs e outras que conformam a rede de Saúde Mental na cidade. Sabemos
que o Município de Santos é um marco na área de Saúde Mental desde a Reforma
Psiquiátrica ocorrida nos anos 80 e que a construção de um novo modelo de saúde
mental na cidade colocou-a como polo de referência conceitual na organização das
redes de saúde mental no Brasil e no mundo. Desde lá muitas alterações ocorreram na
organização dos serviços de saúde (SUS) e de assistência social (SUAS) no município.
Atualmente, encontramos no município um quadro bastante alterado e com deficiências
nesses serviços. Esperamos com este projeto poder contribuir na discussão da rede de
serviços de Saúde Mental do município propondo novas estratégias e alternativas
terapêuticas, estimular profissionais dos serviços de saúde diante dessas novas
tecnologias em discussão e construção na universidade, e também contribuir com a
oferta de serviços alternativos e substitutivos na rede de Saúde Mental.
Nosso projeto de extensão baseia-se em “Inventário de Potência e Oficinas de Ação”
oferecidos aos usuários da rede de Saúde Mental do município de Santos. Para alcançar
a articulação entre universidade e comunidade contamos com o gradual relacionamento
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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estabelecido nos últimos quatro anos entre a universidade e os profissionais do SUS e
SUAS que, atualmente, já são nossos parceiros em estágios e outras atividades
acadêmicas.
A proposta deste projeto de extensão surgiu dentro de um contexto mais amplo com a
construção do módulo “A ação como precursora do pensamento no humano” no
processo de aprendizagem do curso de graduação de Terapia Ocupacional da
UNIFESP/BS. Este módulo de ensino foi elaborado desde a primeira turma do curso de
Terapia Ocupacional da UNIFESP/BS, sendo até o momento ministrado para quatro
turmas de 30 alunos. Neste módulo buscou-se compreender como o processo da ação
precede o pensamento e as consequências desta concepção no conhecimento do
humano. Assim, compreender como a construção da mente ocorre pelo fazer/ação na
interação sociocultural foi um dos objetivos principais deste módulo de ensino.
Também discutimos como os aspectos da ação/fazer foram relegados ao segundo plano
no pensamento científico atual.
Justifica-se este processo de ensino, pesquisa e extensão porque compreende como a
ação/atividade pode ser produtora de pensamento e porque discute as relações entre a
ação e a construção do código simbólico da linguagem, aspectos fundamentais para a
formação do terapeuta ocupacional, visto que o eixo identitário da profissão está
centrado na ação e nas atividades. Procuramos construir uma matriz teórica particular e
específica para a Terapia Ocupacional que desse suporte e referencial a esta prática
profissional. Exemplificamos este processo no campo da saúde mental, objeto deste
projeto de extensão. Geralmente fazemos uma leitura psicológica das práticas da
Terapia Ocupacional, ou seja, observamos e analisamos uma sessão terapêutica
baseados em pressupostos de outra área de conhecimento e a partir dessa leitura
organizamos nossas intervenções. Neste referencial próprio que buscamos construir
objetivamos fazer uma leitura das práticas de TO a partir do conhecimento da própria
ação e sua importância na constituição do humano e suas relações com o outro. Para
tanto estabelecemos algumas diretrizes no processo:
1. Baseamos nossa construção da matriz teórica em autores que privilegiam o estudo da
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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ação: Maturana (2001) e Varela (2001). A Teoria da Enação desses autores sustenta
uma abordagem monista do homem, segundo a qual o sujeito se constitui a partir da sua
história de coordenações (de ações) e (de emoções) na interação com os outros e não a
partir de uma mente transcendental a priori. Neste processo de ensino mostramos como,
tanto na filogênese como na ontogênese, os processos históricos de interação do corpo
ao seu meio geram as condições para a emergência dos modos de viver humano, que
incluem a cultura e a linguagem.
2. Também, baseados em Leroi-Gourhan (1965), estudamos os conceitos de cadeias
operatórias no cotidiano e sua articulação com o campo da Terapia Ocupacional e como
os fundamentos básicos corporais (as formas de sensibilidade) podem ser determinantes
na organização do pensamento e do afeto do sujeito. Também, seguindo a abordagem
deste autor reconhecemos como os aspectos da ação/fazer foram exteriorizados pelo
homem ao longo dos séculos e discutimos as consequências deste processo para o
humano.
A final do processo de aprendizagem, os alunos do curso de Terapia Ocupacional
puderam compreender como o sentido do sujeito individual e da vida humana coletiva é
construído a partir do cotidiano e suas ações e não pelo pensamento. E, assim, conhecer
a concepção da “ação precedendo o pensamento” e como esta interfere na construção do
conhecimento do sujeito e nas consequentes práticas de Terapia Ocupacional.
No momento, propomos este projeto de extensão a quatro alunos do curso de Terapia
Ocupacional, com o objetivo de construir um processo de avaliação, conhecimento e
intervenção grupal a partir destes pressupostos teóricos com práticas de Terapia
Ocupacional na área de Saúde Mental com uma população de usuários. Assim, além de
construir este eixo de ensino-aprendizagem para o curso de Terapia Ocupacional, nosso
propósito é solidificar nosso grupo e oferecer atividades baseadas neste processo à
população de usuários de Saúde Mental junto com os alunos do curso.
Tal projeto tem sua importância, pois a construção de uma matriz teórica específica para
a Terapia Ocupacional contribui para a consolidação da identidade profissional e agora
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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se torna necessário transpor esta forma de conhecimento elaborada no curso de
graduação de Terapia Ocupacional da UNIFESP/BS para projetos na comunidade que
possam oferecer assistência à população.
OBJETIVOS
O objetivo geral é estimular a articulação entre ensino, pesquisa e extensão com os
alunos da UNIFESP/BS. E os específico: contribuir com ações na Rede de Saúde
Mental do Município de Santos; propor formas de avaliação/conhecimento do cotidiano
dos usuários de Saúde Mental baseadas no “Inventário da Potência” que se descolem
das tradicionais avaliações psicológicas e/ou psiquiátricas; oferecer um processo de
intervenção grupal aos usuários de Saúde Mental com técnicas e recursos terapêuticos
da Terapia Ocupacional, baseado nas categorias conceituais elaboradas no módulo do
curso de Terapia Ocupacional, constituindo-se num modelo terapêutico baseado na
“Ação Humana”.
MATERIAIS E MÉTODOS
Na área de saúde mental na Terapia Ocupacional temos avaliações baseadas em
anamneses e exames psíquicos utilizados pela psiquiatria/psicologia. Tais avaliações
são permeadas por algumas questões que se supõem mais específicas, com o objetivo de
explorar como os sintomas se mostram na vida cotidiana do sujeito. Portanto, não há
uma avaliação própria, baseada na Ação Humana e suas possíveis alterações nos
processos de adoecimento psíquico.
O mesmo ocorre com as formas de intervenção terapêutica na área de Terapia
Ocupacional em saúde mental. Ou seja, temos grupos e atendimentos individuais
baseados no uso de atividades que é o marco específico da intervenção terapêutica
ocupacional, mas tais procedimentos terapêuticos geralmente têm leituras psicológicas.
Assim, faz-se uma leitura psicológica e interpretativa do uso de atividades, sendo o foco
dirigido para a simbolização das atividades e do seu processo de construção. Entretanto,
as possibilidades terapêuticas da própria “Ação Humana” se tornam secundárias e ficam
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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relegadas para um segundo plano ou nem sequer são observadas.
Por isso, visando construir uma forma de atenção em Terapia Ocupacional alternativa às
formas usuais na área de Saúde Mental, temos como estratégias desta atividade de
extensão uma proposta de intervenção em saúde mental baseada em dois momentos:
1. Conhecimento do potencial e dificuldades dos usuários com um instrumento de
avaliação específico da Terapia Ocupacional baseado na matriz teórica do módulo
“Ação como precursora do pensamento no humano”, denominada “Inventário de
Potência”: nesse processo pretendemos identificar as potencialidades do sujeito na vida
cotidiana e suas possíveis dificuldades.
Na primeira parte do projeto propomos aos usuários uma forma de avaliação específica
para a Terapia Ocupacional baseada na matriz teórica estudada. Ao invés da avaliação
do paciente de Terapia Ocupacional no formato tradicional da área de saúde mental
(abordando aspectos psicológicos do sujeito no seu histórico de vida e o seu exame
psíquico) propomos a construção de um inventário da ação e potência do sujeito. Pois,
se damos ênfase e atribuímos importância à ação na constituição do humano, torna-se
coerente avaliar o sujeito nessa mesma vertente. Este modelo de avaliação para Terapia
Ocupacional como “Inventário da Potência” do sujeito frente ao mundo comporta:
avaliação dos processos de coordenação de ação e emoção do sujeito com o mundo;
avaliação das cadeias operatórias e suas eventuais rupturas e reconstruções; avaliação
dos planos de exteriorização do corpo e ação do sujeito e suas consequências
(harmônicas ou desarmônicas); avaliação das formas de sensibilidade corpórea e suas
determinações na organização do pensamento e afeto do sujeito, etc. O estudo desses
conceitos numa avaliação terapêutica está baseado no pressuposto de que, mais
importante que a avaliação de sinais e sintomas do sujeito, é a avaliação de como o
sujeito se coordena pelo mundo com suas ações e emoções. Ou seja, propomos a
avaliação da potência do sujeito e como este se coloca frente ao mundo com suas
peculiaridades.
2. No segundo momento, a consolidação deste projeto de extensão se articula na
seguinte estratégia: um processo de intervenção grupal com técnicas e recursos
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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terapêuticos da Terapia Ocupacional baseados na matriz teórica da “Ação como
precursora do pensamento no humano”. Denominamos tais procedimentos como:
“Oficina de Ação” na qual objetivamos resgatar as potencialidades perdidas na vida
cotidiana.
A construção desta Oficina está baseada nas mesmas categorias conceituais do módulo
de ensino, com os processos terapêuticos ocupacionais em saúde mental. Vamos
elaborar recursos terapêuticos baseados na recuperação da potência, na coordenação de
ação e emoção do sujeito com seu grupo social, na reconstrução ou adaptação de suas
cadeias operatórias do cotidiano, na incorporação de ações/gestos/corpo que,
gradativamente, foram exteriorizados e como os fundamentos básicos do corpo e suas
formas de sensibilidade são instrumentos nos processos terapêuticos.
Os usuários de Saúde Mental serão convidados para participação deste projeto dentro do
amplo conjunto de usuários da área de Saúde Mental (independente de diagnósticos
específicos). Eles serão encontrados por meio das indicações de profissionais da área da
saúde mental, de ONGs que também atuam nesta área, de organização de familiares da
Saúde Mental, grupos de usuários da saúde mental e outros a partir das diversas
possibilidades do Município de Santos e Municípios da Baixada Santista.
O desenvolvimento das atividades será articulado em dois espaços: no território dos
usuários e no Laboratório de Atividade e Recursos Terapêuticos (ART) do curso de
Terapia Ocupacional da UNIFESP. Quanto ao território temos como proposta que os
alunos envolvidos façam um processo de abordagem no “trajeto”, na rua dos usuários.
Ou seja, os alunos irão acompanhar o “percurso” entre o local de saída dos usuários
(equipamento de saúde ou residência) até o local das avaliações e intervenções grupais.
Com esta estratégia temos o objetivo de cuidar da questão da adesão dos usuários da
área de saúde mental nas abordagens terapêuticas e conhecer e auxiliar nas suas cadeias
operatórias de circulação no território.
No espaço do Laboratório de ART vamos desenvolver as avaliações e intervenções
grupais, pois neste local dispomos dos meios específicos para desenvolver tais
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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atividades. Também temos como objetivo ampliar a rede de apoio e contato dos
usuários de saúde mental incluindo a universidade.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
No momento, estamos no início da implantação do projeto de extensão (iniciado em
agosto de 2010) e, portanto, não podemos apresentar resultados consolidados. Mas,
apontamos o caminho que estamos trilhando.
Desde o início da Reforma Psiquiátrica no Brasil nos anos 80 temos como objetivo a
gradual extinção dos manicômios no Brasil e a sua substituição por equipamentos
alternativos e substitutivos numa Rede de Saúde Mental na comunidade. A crítica aos
hospitais psiquiátricos está solidamente fundamentada nas evidências de que os
nomeados “doentes mentais” em tratamento neles atingiram situações de exclusão
absoluta da sociedade. Desde então serviços e práticas alternativas ao manicômio, que
contribuam para um efetivo tratamento que resulte num processo inclusivo dos usuários
da saúde mental na sociedade, têm sido o norte das práticas em saúde mental. Este
projeto de extensão se coaduna com esta política de atenção à saúde mental que
preconiza a inclusão como meta fundamental. Como dissemos anteriormente, propomos
a criação de instrumento de avaliação e oficinas terapêuticas baseadas na potencialidade
dos sujeitos e não em seus sintomas e diagnósticos. Nossa avaliação terapêutica e
oficinas estão baseadas no pressuposto de “que mais importante que os sinais e sintomas
do sujeito são as formas como ele se coordena pelo mundo com suas ações e emoções”.
Portanto, consideramos que nossa contribuição neste aspecto se dá na medida em que
estimulamos a construção de perspectivas de saúde mental inclusivas na comunidade e
articuladas com a rede de saúde do município.
O acompanhamento deste projeto de extensão será executado diretamente, ou seja, os
professores responsáveis estarão presentes em todas as suas etapas, que são: contato
com a rede se serviços de saúde mental do Município de Santos, planejamento e
organização das atividades e a realização das atividades propriamente ditas. Além deste
acompanhamento direto dos alunos “extensionistas” e orientação de tais atividades,
periodicamente haverá um grupo de supervisão com todos os alunos, professores
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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envolvidos no projeto e o professor convidado para o papel de supervisor.
A equipe de trabalho do projeto envolve uma professora do eixo específico do curso de
Terapia Ocupacional como coordenadora, um professor convidado do mesmo eixo
específico como supervisor e quatro alunos do curso. As atividades a serem
desenvolvidas pelos alunos são descritas a seguir:
1) Contato com a rede se serviços de saúde mental do município de Santos para divulgar
o projeto de extensão e convidar os usuários dos serviços para a participação nas
atividades;
2) Planejamento e organização das atividades a serem desenvolvidas para a avaliação no
Inventário de Potência e na Oficina de Ação;
3) Atividade Percurso: acompanhar o “trajeto” entre o local de saída dos usuários
(equipamento de saúde ou residência) até o local das avaliações e intervenções grupais,
conhecendo o cotidiano da rua destes sujeitos;
4) Aplicação do Inventário de Potência a todos os usuários participantes do projeto de
extensão;
5) Desenvolvimento da Oficina de Ação com os usuários de Saúde Mental;
6) Elaboração de relatórios contínuos sobre o processo do projeto de extensão.
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Horizonte: Ed. Expressa Artes Gráficas, 1993.
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SPINOZA, B. Ética. Belo Horizonte: Autêntica editora, 2009.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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A EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA COMO ESTRATÉGIA DE FORMAÇÃO NA
GRADUAÇÃO: A EXPERIÊNCIA DO PROJETO CAIXA DE HISTÓRIAS1
MARIA PAULA PANÚNCIO PINTO2
RESUMO
Introdução: O Projeto de Extensão Caixa de Histórias envolve acadêmicos de Terapia
Ocupacional em atividades com crianças/adolescentes institucionalizados, integrando
universidade-comunidade, possibilitando a formação profissional para atender as
demandas de crianças hospitalizadas ou abrigadas em instituição para vítimas de
violência doméstica. Justificativa: A institucionalização na infância configura-se como
experiência potencialmente traumática afastando a criança de suas rotinas. Histórias
infantis favorecem o exercício do faz-de-conta e do brincar, além de possibilitar contato
com conflitos e enfrentamento da realidade. A contação de histórias emerge como
possibilidade de modificar o cotidiano da institucionalização, produzindo uma realidade
própria e singular, configurando-se como importante recurso terapêutico. Objetivo:
Descrever a experiência do Projeto Caixa de Histórias do ponto de vista dos estudantes
(contribuições para sua formação). Materiais e método: Análise documental dos
relatórios por meio de análise de conteúdo temático, com abordagem quali-quantitativa.
Resultados: Do ponto de vista dos estudantes, o projeto contribui para sua formação na
graduação pelo contato com a prática desde o primeiro semestre, envolvendo o
conhecimento da rotina de instituições, o contato com equipes e a integração com a
comunidade. Foram citadas outras contribuições: desenvolvimento de habilidades para
lidar com crianças e equipe; desenvolvimento de raciocínio clínico; apoio oferecido pela
capacitação e pelas supervisões semanais. Discussão: Resultados reafirmam a
importância de apresentar aos estudantes atividades que promovam o vínculo teoria e
prática desde o primeiro período como ferramenta de estimular sua autonomia e sua
capacidade para solução de problemas, além de sua inserção na realidade da
comunidade onde a Universidade está inserida.
PALAVRAS-CHAVE: Criança, Institucionalização, Recursos em Saúde, Métodos,
Prática Profissional, Extensão Comunitária.
1 Este trabalho recebeu apoio do Programa Aprender com Cultura e Extensão – Universidade de São Paulo - USP. 2 Prof.ª Dr.ª do Curso de Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da
Universidade São Paulo. [email protected]
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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INTRODUÇÃO
A situação colocada pelo ingresso na Universidade pressupõe uma visão diferente sobre
o que é estudar: no contexto da educação universitária “aprender” ganha um novo
significado, pois teoricamente o estudante escolheu uma carreira e ao deixar a
Universidade será um profissional, com compromissos e responsabilidades assumidos
frente à sociedade (PANÚNCIO-PINTO; PFEIFER, 2009; SEVERINO, 2007). Além
disso, há algum tempo se discute que a Universidade não deve mais ser pensada como
mera formadora de mão-de-obra, passando a assumir o compromisso com a comunidade
na qual está inserida, com respostas às necessidades e solução de problemas concretos
da sociedade (FERRARI, 1999).
A pesquisa e o ensino foram, por muito tempo, os principais eixos de prioridade nas
universidades, e o eixo “cultura e extensão” ficava relegado a um plano de menor
importância. Entretanto mudanças na forma de compreender a inserção da universidade
no mundo real têm colocado a cultura e a extensão em lugar de igual importância frente
aos outros dois eixos.
Considera-se que as ações de cultura e extensão respondem às exigências das
sociedades contemporâneas, e as ações de extensão desempenham papel fundamental
devido ao significado público que carregam. Caracterizam-se por sua complexidade,
envolvendo atividades essenciais de atendimento público como a clínica, os cursos de
especialização, convênios, desenvolvimento e ensino. Devido a essa diversificação é
fundamental aprofundar e expandir a relação da universidade com a sociedade (USP,
2010).
A Universidade de São Paulo-USP, através da Pró Reitoria de Cultura e Extensão
desenvolve, desde o ano de 2008, o Programa Aprender com Cultura e Extensão. Sua
finalidade é fomentar tais ações por meio de atividades do corpo discente, contribuindo
com sua formação no campo da extensão universitária. O Programa integra a política de
apoio à permanência e formação estudantil da USP, através da concessão de bolsas para
apoiar estudantes regularmente matriculados na graduação a desenvolverem projetos
com temáticas voltadas aos desafios das realidades intra e extrauniversidade (USP,
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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2010).
A presente investigação foi desenvolvida no contexto do Laboratório de Ensino e
Pesquisa em Terapia Ocupacional, Infância e Adolescência - LEPTOI, que tem
engendrado esforços através das ações de suas coordenadoras para integrar o social à
clínica, a partir de duas linhas de pesquisa: (1) Desempenho ocupacional de crianças e
adolescentes em diferentes contextos e (2) Formação profissional, linha na qual se
enquadra este estudo.
Atualmente são desenvolvidos a partir do LEPTOI dois projetos de extensão
homologados pelo Programa Aprender com Cultura e Extensão-USP: o “Projeto Caixa
de Histórias” e o “Projeto Cuidando do Cuidador”.
Tais projetos contam com a participação de alunos bolsistas e de estudantes voluntários,
que participam semestralmente de suas ações, envolvendo-se a partir de seu primeiro
semestre na graduação (Quadro 1: Bolsistas e voluntários dos projetos de extensão do
LEPTOI),
Projeto Ano Bolsistas Voluntários
Caixa de Histórias 2008/2009 01 02
Caixa de Histórias 2009/2010 01 11
Caixa de Histórias 2010/2011 01 16
Cuidando do cuidador 2009/2010 00 08
Cuidando do cuidador 2010/2011 02 12
Total de estudantes
envolvidos
05 49
Quadro 1: Bolsistas e voluntários dos projetos de extensão do LEPTOI (atual)
O PROJETO CAIXA DE HISTÓRIAS
O “Projeto Caixa de Histórias” iniciou suas atividades, como ação de cultura e extensão
universitária em 2005, inicialmente com atividades nas enfermarias pediátricas do
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HCFMRP Campus e Unidade de Emergência. Em 2008 passou a ser desenvolvido
também em um abrigo para crianças vítimas de violência doméstica, abandono e
negligência e, em 2009, ampliou ainda mais sua área de atuação, passando a abranger
também os Ambulatórios Pediátricos e o Centro Integrado de Reabilitação - CIR, do
Hospital Estadual de Ribeirão Preto-HERibeirão.
A finalidade principal é envolver acadêmicos do curso de Terapia Ocupacional (TO) em
atividades voltadas para o atendimento de crianças e adolescentes institucionalizados
levando a uma integração universidade-comunidade que responda, de um lado, às
demandas de formação profissional na área de TO na Infância e Adolescência e, de
outro, às necessidades das crianças e adolescentes alvos de políticas de proteção
especial, seja por questões de saúde (aquelas hospitalizadas ou em atendimento
ambulatorial em serviços de alta e média complexidade), seja por questões sociais e
pessoais (aquelas abrigadas em instituição de proteção para vítimas de violência
doméstica, abandono e negligência). Dessa forma, os objetivos do projeto envolvem
dois segmentos, ou seja, os acadêmicos e aqueles referentes à população alvo.
Quanto aos acadêmicos, o Projeto pretende: (1) favorecer o aprofundamento dos
conhecimentos dos graduandos de TO na área da Infância e adolescência; (2) promover
o contato deles com a realidade da comunidade onde a Universidade está inserida e seu
compromisso com a solução dos problemas por ela enfrentados; (3) proporcionar o
contato com crianças e adolescentes institucionalizados ou em tratamento de longo
termo, seja em ambiente hospitalar, ambulatorial ou asilar; (4) favorecer o contato com
a instituição hospitalar e asilar e com os profissionais de saúde, assistência social e
educação, capacitando os estudantes para a atuação em equipes multi e
interprofissionais; (5) utilizar instrumental específico da terapia ocupacional; (6)
estimular a criatividade e a manipulação de materiais diversos na intervenção junto à
população-alvo; (7) ampliar os conhecimentos sobre desenvolvimento humano e as
possibilidades de intervenção do terapeuta ocupacional e (8) promover o
desenvolvimento de habilidades para: interagir com crianças e adolescentes em situação
de risco pessoal e social; comunicar-se com pais e cuidadores; identificar necessidades e
atuar, intervindo para responder a elas;
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Quanto à população-alvo (crianças e adolescentes institucionalizados/ hospitalizados)
são objetivos do projeto: (1) possibilitar o contato com histórias infanto-juvenis, como
recurso facilitador de seu desenvolvimento cognitivo e sócio-afetivo; (2) oferecer
alternativas de enfrentamento para a situação de institucionalização ou tratamento de
longo termo; (3) criar condições para elaboração e ressignificação do cotidiano
transformado pelos eventos adversos de vida (hospitalização, seguimento ambulatorial
de longo termo, abrigo em instituição).
A participação no projeto envolve uma dinâmica de atividades que incluem uma
capacitação inicial de 33 horas, com aulas teóricas e oficinas, abordando conteúdo
teórico como “Desenvolvimento infantil”, “A criança em situação de risco
institucionalizada, vitimizada”, “A importância das histórias no desenvolvimento
infantil”, “Áreas de desempenho ocupacional: a infância e o brincar”, “A criança
hospitalizada”, “Recursos terapêuticos em Terapia Ocupacional: atividades e grupos”,
“O cuidador precisa de cuidados”. Para o desenvolvimento de habilidades práticas são
oferecidas “Oficina de confecção de bonecos”, “Oficina de musicalização infantil” e
“Oficina de confecção das Caixas de Histórias”. Ao longo da capacitação, visando às
atividades de extensão junto à população-alvo, são configuradas duplas que escolhem
uma história infanto-juvenil por vez, a partir da qual é construída a caixa de história,
contendo os personagens e elementos que ilustram o ato de contar. Após a escolha da
história inicia-se a confecção dos personagens e demais elementos da história,
priorizando materiais de baixo custo e durabilidade.
A construção da caixa revela-se tão essencial quanto o ato de contar, já que o contador
terá que ser preparado para a importante tarefa. Para que a história atinja seu objetivo, a
construção da caixa deve ser cuidadosa, de forma a facilitar que as crianças elaborem,
ao seu modo, conteúdos que a auxiliem no enfrentamento da situação vivida (PFEIFER
et al., 2006a). O processo de construção da caixa se inicia pela escolha da história, pela
empatia dos contadores com o conteúdo e sua posterior adaptação, levando em conta o
tempo de duração (que não pode ser muito longo em função do público-alvo) para que
essa história seja contada e que valores sejam possíveis de transmitir (PFEIFER et al,
2006b).
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Ao final da capacitação as caixas de histórias estão prontas e têm início as atividades de
contação das histórias nos respectivos locais. Após as histórias serem contadas, as
crianças e adolescentes manipulam os personagens e os elementos, por isso estes
precisam ser seguros e de fácil higienização. Muitas vezes precisam ser confeccionados
novamente, pois, durante a exploração do material, pode ocorrer o descolamento de
ornamentos, quebra de engrenagens etc. (PFEIFER et al., 2006a). O processo de
exploração dos materiais possibilita a interação social entre as crianças, adolescentes,
graduandos de terapia ocupacional e cuidadores.
Ao final da contação e exploração das caixas, uma atividade previamente analisada e
que tem relação ao tema da história é oferecida às crianças e adolescentes para ser
executada, a maioria delas resultando em um produto final.
Ao longo de todo o processo estudantes participam de uma capacitação continuada,
realizada em supervisões semanais, que oferecem apoio e orientação para situações
concretas envolvendo o desenvolvimento das ações do projeto nos locais definidos. Os
graduandos são levados a refletir sobre a ação, pois durante as práticas de contar história
junto a crianças e adolescentes institucionalizados, diversas situações problemáticas
emergem e, diante disso, torna-se importante a solução de problemas. As atividades de
contação são registradas em relatórios de acordo com roteiro (participantes, história,
dificuldades encontradas, impressões e contribuições para a formação). Os acadêmicos
devem postar no ambiente virtual de ensino aprendizagem TelEduc seus relatos das
atividades realizadas para que todos os envolvidos tenham acesso, garantindo, assim, o
registro formal e sistemático.
O Projeto assenta-se em conhecimento produzido sobre as influências do
contexto/eventos de vida sobre o desenvolvimento humano (BALTES, 1983, 1987);
sobre a hospitalização/institucionalização de crianças e adolescentes (PFEIFER;
MITRE, 2008; ZOGAIB, 2005; MITRE; GOMES, 2004; ARPINI, 2001); sobre a
importância do brincar (AOTA, 2008; PARHAM; PRIMEAU, 2002; KNOX, 2002) e
dos contos de fadas/histórias para o desenvolvimento infantil (BETTELHEIM, 2006;
GOUVEIA, 2003).
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
268
OBJETIVO
Este estudo buscou descrever a experiência do Projeto Caixa de Histórias do ponto de
vista dos estudantes, ao ampliar sua compreensão sobre as contribuições para sua
formação ao longo da graduação.
MATERIAIS E MÉTODOS
Foi feita uma análise documental dos relatórios a partir da análise de conteúdo temático,
com abordagem quali-quantitativa. Foram analisados 14 relatos, recortando-se o item do
relatório no qual se pedia para o estudante comentar livremente sobre as contribuições
do Projeto “Caixa” para sua formação. A partir do material bruto (recorte dos trechos
selecionados deste item específico) foram identificadas categorias empíricas,
representando temas gerais, apresentadas a partir das falas que as originaram.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A análise temática de conteúdo permitiu a identificação de 4 categorias empíricas, que
estão descritas nos quadros 2, 3 e 4, bem como as falas que as originaram a partir da
categoria/ núcleo temático identificado.
A referência que compõe o núcleo temático presente em 10 dos 14 depoimentos
(71.4%) refere-se à contribuição de permitir o contato com a prática profissional
(Quadro 2) desde o início da graduação.
O reconhecimento por parte dos estudantes da importância de se envolverem em
atividades práticas desde o início da graduação chama a atenção, sobretudo, pela
referência a “sentir-se mais próximo da profissão”. Os equívocos que cercam a
compreensão da TO como profissão se manifestam em disciplinas do primeiro semestre,
como aquelas introdutórias à história e aos elementos caracterizadores da profissão,
como pode ser visto na fala a seguir: “... acredito que todas nós entramos com uma
idéia muito vaga sobre o que é TO”.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
269
studo desenvolvido com 90 alunos e ex-alunos de TO, por Panúncio-Pinto, Freitas e
Cardinal (2009) mostrou que, entre os motivos mais frequentes que justificam a escolha
por cursar TO, aparecem justificativas que apontam para a “motivação intrínseca”, o
que nem sempre corresponde a uma real compreensão da profissão (“sentir prazer em
ajudar aos outros”, por exemplo, foi justificativa presente para 70% dos sujeitos). Além
disso, uma proporção significativa de sujeitos alegaram ter escolhido o curso por não ter
conseguido entrar em outro na sua primeira escolha (20%). Junte-se a isso o fato de que
apenas uma minoria (13.3%) tinha conhecimento sobre a profissão ao ingressar no
curso.
Tal situação aponta para um demanda importante de acolhimento aos alunos
ingressantes, com ênfase no esclarecimento sobre a profissão e o curso. A partir dos
depoimentos dos estudantes sobre sua participação no “Projeto Caixa de História”,
pode-se pensar que o envolvimento em atividades de extensão que permitem uma
aproximação da profissão, através do desenvolvimento de atividades junto à
comunidade, configura-se como uma estratégia interessante.
Categoria Referências
Contato com a
prática
profissional desde
o início da
graduação
“... percebi na prática a importância do brincar.”
“... iniciei os primeiros contatos com crianças.”
“... aprendi a conhecer a rotina da enfermarias.”
“... me envolvi em atividades voltadas para o atendimento das crianças.”
“... compreendi na prática o que é a intervenção do T.O. com crianças
hospitalizadas”
“... comecei a compreender na prática questões clínicas das crianças.”
“... entendi na prática o valor terapêutico das histórias infantis...vendo as mudanças de comportamento e humor das crianças.”
“... pude perceber o quanto uma atividade lúdica é importante no contexto do hospital.”
“... me senti mais perto da minha profissão e ganhei experiência.”
“... preparou o caminho para os estágios aproximando da atuação
profissional e seus instrumentos.”
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
270
Quadro 2: Categoria empírica 1
As referências que compõem o núcleo temático desenvolvimento de habilidades
específicas foram identificadas em 7 dos 14 depoimentos (50%) e, tanto quanto o
núcleo temático desenvolvimento de raciocínio clínico, identificado em 6 dos 14
depoimentos (42.8%), envolve ganhos para a formação dos estudantes que estão
diretamente relacionados com a possibilidade de contato com a prática profissional o
mais cedo possível ao longo da graduação (Quadro 3).
Categoria Referências
Desenvolvimento de habilidades
específicas
“interagir com crianças, equipe, cuidadores”
“desenvolver estratégias de intervenção”
“dominar técnicas de atividades”
“desenvolver e aprimorar criatividade”
“adaptar atividade”
“solucionar problemas”
“estabelecer vínculo com crianças, equipe, cuidadores”
Desenvolvimento de raciocínio
clínico
“pensar uma estrutura lógica para cada contação, dependendo do local, público, etc.”
“integrar aspectos da criança, da sua condição, do contexto”
“definir objetivos e as estratégias próprias”
“planejar de acordo com objetivos definidos a partir do conhecimento das crianças”
“pensar a atividade como recurso terapêutico”
Quadro 3: Categorias empíricas 2 e 3
Em geral, estudantes sentem-se inseguros, amedrontados e ansiosos antes de iniciarem
seus primeiros contatos com a população-alvo de sua atuação profissional. Nesse
sentido, o estudo de Panúncio-Pinto, Freitas e Cardinal (2009) verificou que os
estudantes identificam como pontos negativos do curso avaliado por eles: “poucas
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
271
matérias específicas de TO no início do curso” e “pouca prática clínica antes dos
estágios”. É possível perceber a importância de oferecer aos estudantes oportunidades
de entrarem em contato com especificidades da profissão escolhida o quanto antes, ao
longo de sua graduação. Em um momento em que diversos cursos de graduação estão
revendo seus Projetos Político-Pedagógicos e a lógica de seus currículos, a necessidade
de retomar esforços para integrar teoria e prática parece ser um ponto importante a ser
considerado.
Contudo, a apresentação do campo aos estudantes logo no início de sua vida acadêmica
certamente demanda alguns cuidados, acompanhamento e preparo. A importância disso
pode ser vista no último núcleo temático: apoio da supervisões/capacitação, que foi
identificado em 4 depoimentos (28,5%), demonstrando a importância do acolhimento e
apoio que o contato inicial com o campo de atuação requer (Quadro 4) .
Categoria Referências
Apoio das
supervisões/capacitação
“... permitiram a partir das trocas... refletir sobre a ação.”
“... aspectos teóricos e práticos abordados permitiram
caminhar com segurança nas atividades práticas de contação.”
“... ter a segurança de colocar dúvidas, ser ouvido e
orientado.”
“... muito importante o espaço para falar dos sentimentos... compartilhar...”
Quadro 4: Categoria empírica 4
Em estudo sobre as percepções dos estudantes de diferentes cursos de graduação sobre
as práticas em saúde mental, Freitas e Kebbe (2010) discutem que o contato inicial com
as práticas pode ser ansiogênico e gerar sentimentos ambivalentes. A figura do
professor-supervisor assume lugar de destaque, como guia nesse momento. A relação
com o supervisor pode suscitar tanto sentimentos negativos (insegurança, medo de
receber críticas), quanto positivos (segurança, apoio, acolhimento). Tal situação pode
ser amenizada dependendo da postura do docente-supervisor. Na visão dos alunos, a
relação é positiva se houver educação, paciência, escuta e esclarecimento. Por outro
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
272
lado, é negativa se o supervisor demonstrar excessiva preocupação com a técnica e
impaciência no momento de ensinar. Importante perceber que um contexto de
supervisão difere daquele de uma aula expositiva formal. São medidas simples que
alteram o princípio da relação: sentar em círculo, não ter uma ordem prévia de temas ou
assuntos, mas trabalhar a partir do conteúdo que emergiu nas práticas, tom de conversa
e não de “aula”, postura dialógica, acolhimento às dúvidas e angústias. Além disso, ao
longo das práticas do Projeto “Caixa” os estudantes sempre são acompanhados por um
profissional terapeuta ocupacional do setor onde as atividades acontecem. São marcas
de possibilidades de alterar a relação professor-aluno a partir da prática extensionista.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir dos resultados apresentados, emergem dois pontos principais: (1) a inserção
gradativa e orientada de práticas desde o inicio da graduação através da extensão
universitária promove a aproximação dos estudantes com o campo de atuação e
especificidades da profissão; (2) a prática extensionista proporciona um modelo
diferente da relação professor-aluno, que permite ampliar as trocas, o diálogo na
constituição de um verdadeiro processo de ensinagem (mão dupla, reciprocidade,
aproximação).
Os resultados reafirmam a importância de apresentar aos estudantes atividades que
promovam o vínculo teoria-prática desde o primeiro período como ferramenta de
estimular sua autonomia e sua capacidade para solução de problemas, além de sua
inserção na realidade da comunidade onde a Universidade está contextualizada.
Igualmente importante parece ser a aproximação com a profissão e suas especificidades.
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Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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CARTOGRAFIAS FEMININAS: A CONSTITUIÇÃO DE UM GRUPO DE
MULHERES NA ZONA NOROESTE-SANTOS Flavia Liberman1
Viviane Maximino2
Maria Fernanda Frutuoso3
Beatriz de Carvalho Teixeira4
RESUMO
Introdução e justificativa: O Plano Nacional de Extensão Universitária define a
Extensão como processo educativo, cultural e científico que viabiliza a relação
transformadora entre universidade e sociedade. De acordo com esse princípio, ações
extensionistas desenvolvidas no Campus Baixada Santista possibilitam novas imersões
do processo formativo da Universidade, aproximando os estudantes da realidade local e
regional da área de abrangência da Universidade e constituindo campo para a
construção de conhecimentos. Este trabalho constitui-se em uma proposta onde se
realizam ações de cuidado junto às mulheres por meio de intervenção interprofissional e
criação de um grupo em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) em Santos. O quadro
geral da saúde no país, a circulação das mulheres nestes serviços, as políticas voltadas à
Saúde da Mulher colocam este espaço como lócus privilegiado para a implantação de
estratégias de rastreamento e intervenção. Objetivos: Acompanhar e constituir um grupo
de mulheres em UBS em composição com outras ações territoriais. Potencializar a
participação cotidiana das mulheres na gestão local e no controle das condições que
podem interferir na sua saúde e da coletividade onde vivem e trabalham. Metodologia:
Realização de grupo de mulheres, atendimentos individuais, articulação com Projetos
realizados no território, composição com outras ações realizadas na UBS, estudos
teórico sobre temas relacionados ao processo grupal e à abordagem territorial.
Conclusão: as diferentes ações realizadas na UBS apresentam-se como potentes
dispositivos de cuidado, oferecendo oportunidades de dialogo e reflexão interdisciplinar
em consonância como Projeto Pedagógico da Baixada Santista e as atuais diretrizes
políticas de saúde.
1 Prof.ª Dr.ª do curso de Terapia Ocupacional do Departamento de Ciências da Saúde, Universidade
Federal de São Paulo, campus Baixada Santista [email protected] 2 Prof.ª Dr.ª do curso de Terapia Ocupacional do Departamento de Ciências da Saúde, Universidade
Federal de São Paulo, campus Baixada Santista 3 Prof.ª Dr.ª do Departamento de Ciências da Saúde, Universidade Federal de São Paulo, campus Baixada
Santista 4 Terapeuta Ocupacional do Centro de Atenção Psicossocial – Álcool e Drogas da Prefeitura Municipal de
São Jose dos Campos.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
276
PALAVRAS-CHAVE: Mulheres, Dispositivo Grupal, Atenção Básica.
INTRODUÇÃO
A discussão intensa, nos últimos anos, sobre a experiência em serviços de saúde
específicos ao cuidado a mulheres ainda não promoveu mudanças significativas em
muitas estruturas. As características que justificam a implantação de modelos de
serviços só para mulheres evidenciam a necessidade de um olhar particularizado dos
profissionais que atendem a este público.
As desigualdades sociais afetam especialmente as mulheres no mundo em
desenvolvimento, com reflexos sobre a sua saúde e sobre os indicadores de saúde
reprodutiva (MANSANO, 2004). Segundo a Lei Orgânica da Assistência Social, os
objetivos das políticas de Assistência Social são a proteção à família, à infância, à
adolescência e à velhice carentes; a promoção da integração ao mercado de trabalho; a
habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiências e sua integração à
comunidade (MELLO, 2006).
O trabalho tem sido incorporado ao cotidiano das mulheres, levando-as a realizar dupla
jornada e conciliar múltiplos papéis. As últimas pesquisas realizadas pelo IBGE (Censo
2000) mostram que 29,2% dos lares são mantidos por mulheres. A maior parte da
população (81,2%) mora em regiões urbanas. Esse censo indicou um excedente de
2.647.140 mulheres, superando o número total de homens da população.
Paradoxalmente associados à informação sobre as tendências de rejuvenescimento e
feminização dos chefes de família (MELLO, 2006) encontram-se ainda valores sobre a
redução de salário pago a mulheres, a opinião de que a mulher abra mão do emprego a
favor da criação dos filhos, índices sobre a violência à mulher, baixa escolaridade e a
perspectiva de vida funcional em declínio em relação ao aumento da expectativa de
vida.
Este estudo aponta para uma população silenciosa de mulheres que procura espaços de
cuidado em Serviços de Saúde ligados ao Sistema Único de Saúde (SUS),
particularmente em atendimento de atenção básica à saúde, como Unidade Básica. O
aspecto para a organização desse fluxo assistencial se justifica pelas condições sociais e
ambientais, como também por uma carência de vínculos sociais, afetivos e de trocas que
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
277
são elementos constituintes das situações de vulnerabilidade em que se encontram.
Os serviços de Saúde têm se apresentado como resposta às necessidades da população,
necessitando, porém, de um maior investimento na ampliação, constituição de suas
práticas cotidianas e reflexão sobre elas. Dentro da rede de Atenção à Saúde, as
Unidades Básicas são lócus privilegiado para identificar e atuar sobre diferentes
problemáticas que se apresentam em uma determinada região. Portanto ações nesse
equipamento podem prevenir o agravamento da situação de risco e vulnerabilidade e a
promoção da saúde social.
Além dessa ação e pensando que as ações devem ser pensadas e realizadas em um
território e não apenas em um equipamento em particular, foram ampliadas as ações por
meio de diferentes práticas que serão explicitadas adiante.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Mulheres e Vulnerabilidade
O verbo vulnerar tem o significado de ofender, ferir e melindrar e é adaptado do termo
latino vulnificus que significa “que fere ou pode ferir”. É um termo que faz parte do
vocabulário acadêmico como também da sociedade civil, sendo usado sob vários pontos
de vista e significados (TEDESCO e LIBERMAN, 2008).
Tomando como referencial o conceitos de Ayres (AYRES et al., 2003) sobre
vulnerabilidade, pode-se dizer que, no Brasil, o modelo de vulnerabilidade está
conformado por três planos interdependentes de determinação e, consequentemente, de
apreensão da maior ou da menor vulnerabilidade do indivíduo e da coletividade.
Pautado pela problemática específica da AIDS, o olhar do autor fornece parâmetros para
reflexão sobre o conceito de vulnerabilidade aplicado agora às mulheres, população
alvo de nossa pesquisa.
Para o autor é necessário compreender o comportamento pessoal ou vulnerabilidade
individual articulada ao contexto social ou vulnerabilidade social e os programas de
atenção existentes, ou vulnerabilidade programática.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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O significado do termo vulnerabilidade, nesse caso, refere-se à chance de exposição das
pessoas ao adoecimento, como resultante de um conjunto de aspectos que ainda que se
refiram imediatamente ao indivíduo, o recoloca na perspectiva da dupla-face, ou seja, o
indivíduo e sua relação com o coletivo.
No trabalho citado, o indivíduo não prescinde do coletivo: há relação intrínseca entre
eles. Além disso, o autor propõe que a interpretação da vulnerabilidade incorpore,
necessariamente, o contexto como lócus de vulnerabilidade, o que pode acarretar maior
suscetibilidade à infecção e ao adoecimento e, de modo inseparável, à maior ou menor
disponibilidade de recursos de todas as ordens para a proteção das pessoas contra as
enfermidades (AYRES et al., 2003).
O marco conceitual que o autor propõe difere de outros autores, pois não enfatiza
excessivamente a vulnerabilidade à determinação individual. A unidade analítica está
constituída no indivíduo-coletivo. Nessa perspectiva, propõe a sua operacionalização
através: da Vulnerabilidade Individual que se refere ao grau e à qualidade da
informação que os indivíduos dispõem sobre os problemas de saúde, sua elaboração e
aplicação na prática; da Vulnerabilidade Social que avalia a obtenção das informações,
o acesso aos meios de comunicação, a disponibilidade de recursos cognitivos e
materiais, o poder de participar de decisões políticas e em instituições; da
Vulnerabilidade Programática, que consiste na avaliação dos programas para responder
ao controle de enfermidades, além do grau e qualidade de compromisso das instituições,
dos recursos, da gerência e do monitoramento dos programas nos diferentes níveis de
atenção (AYRES et al., 2003).
Todas as problemáticas que envolvem as mulheres buscam a sua compreensão a partir
desses parâmetros que não se restringem a uma focalização apenas nos sintomas
observados, mas no entendimento e, portanto, nas ações na vida das mulheres
protagonistas de nossa pesquisa.
Neste estudo as concepções sobre vulnerabilidade exigem um olhar especializado. A
vulnerabilidade e a capacidade são lados de um mesmo processo, pois a primeira está
intimamente relacionada à capacidade de luta e de recuperação que o indivíduo pode
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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apresentar, potencializando ou diminuindo a vulnerabilidade. A capacidade de luta e
recuperação é entendida nos pressupostos da Terapia Ocupacional como a capacidade
de adaptação ativa do sujeito mediante o desenvolvimento de suas habilidades e
potencialidades.
Panorama geral da problemática das mulheres
Estudos epidemiológicos apontam para a prevalência de riscos para as mulheres, tanto
no que se refere a alguns transtornos mentais menores, como ansiedade e depressão,
assim como para quadros de maior complexidade como transtornos alimentares,
gravidade no uso e abuso de substâncias químicas, risco e tentativa de suicídio.
(TUONO et al., 2007).
Esses dados em seus diferentes aspectos mostram a complexidade na qual estão
inscritas as mulheres. Em um breve olhar sobre as pesquisas já realizadas fica clara a
necessidade de um maior aprofundamento para compreender o que se passa com as
mulheres e aquilo que podem fazer refletir e alterar em suas vidas.
Nos chamados grupos de mulheres, podemos dizer que há uma impossibilidade em se
generalizar as diferentes respostas que as mulheres constroem diante de diferentes
demandas, expectativas, desejos, necessidades ao longo de sua existência: questões
relacionadas ao corpo, às relações com filhos, cônjuges, com os processos de
amadurecimento, envelhecimento, questões ligadas ao trabalho doméstico e ao trabalho
fora de casa, lazer, atividades cotidianas e toda uma gama de problematizações que
emergem quando mulheres conversam e de fato podem ter uma escuta significativa.
Em um olhar voltado para a atenção primária à saúde, a tarefa de pensar atribuições
profissionais na perspectiva da promoção da saúde coloca desafios teóricos e
estratégicos na construção de novas práticas e de compromissos públicos em torno da
produção da saúde, uma vez que o conceito de promoção da saúde articula elementos da
concepção de saúde e combina ações desenvolvidas de forma conjunta por diferentes
setores do governo e da sociedade civil, para a melhoria das condições de vida e saúde,
promovendo a equidade e o desenvolvimento da cidadania. Ressalta-se que, hoje, a
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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organização do sistema de saúde pública brasileiro enfatiza a promoção de saúde em
resposta ao aumento da medicalização, à baixa eficácia dos serviços de saúde e aos altos
custos do setor.
A atenção básica de saúde é um espaço privilegiado para o desenvolvimento da
educação permanente em saúde e nutrição, com ações que, além de garantir a difusão de
informações, buscam viabilizar espaços para reflexão sobre os fatores individuais e
coletivos que influenciam as práticas em saúde na comunidade na qual está inserido o
serviço, promovendo a autonomia de escolha no cotidiano (MS, 2006).
Recentemente, no Brasil, o Ministério da Saúde por meio do Pacto pela Vida pactua
com os gestores as prioridades de atenção à saúde para o país, incluindo a saúde do
idoso, redução da mortalidade materna e infantil, promoção da saúde com ênfase na
prática de atividade física regular e alimentação saudável e fortalecimento da atenção
básica visando a alcançar maior efetividade, eficiência e qualidade de cuidado em
função das necessidades de saúde da população e na busca da equidade social
(BRASIL, 2006).
Conhecidamente, existem inúmeros desafios nos cenários de práticas profissionais na
atualidade considerando que, tradicionalmente, o modelo assistencial de saúde enfoca
práticas curativas com ênfase no diagnóstico e conduta terapêutica minimizando ações
de prevenção de doenças e promoção de saúde e com encarecimento dos serviços de
saúde e visão restrita do processo saúde-doença.
Por isso este projeto de extensão se propõe a contribuir nas ações já em andamento na
atenção primária à saúde da Região Noroeste de Santos por meio de um grupo de
mulheres e ações que se desdobram a partir de sua implantação e acompanhamento.
CONTEXTUALIZAÇÃO DO PROJETO: O PROJETO POLÍTICO
PEDAGÓGICO DA UNIFESP- BAIXADA SANTISTA
Comprometido com a formação de futuros fisioterapeutas, educadores físicos,
psicólogos, nutricionistas e terapeutas ocupacionais, o campus Baixada Santista assume
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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os seguintes objetivos gerais: formação de um profissional da área da saúde apto para o
trabalho em equipe interprofissional, com ênfase na integralidade no cuidado ao
paciente; formação técnico-científica e humana de excelência em uma área específica de
atuação profissional de saúde; formação científica, entendendo a pesquisa como
propulsora do ensino e da aprendizagem.
Para atingir esses objetivos, especialmente o desenvolvimento da competência para o
trabalho em equipe na perspectiva da integralidade no cuidado, este Projeto Pedagógico
assume como direcionador das ações os princípios da Educação Interprofissional.
A Educação Interprofissional é conceituada como uma proposta em que duas ou mais
profissões aprendem juntas sobre o trabalho conjunto e sobre as especificidades de cada
uma, na melhoria da qualidade no cuidado ao paciente. É considerado um estilo de
educação que prioriza o trabalho em equipe, a integração e a flexibilidade da força de
trabalho que deve ser alcançada com um amplo reconhecimento e respeito às
especificidades de cada profissão.
Assumir a educação interprofissional como direcionador deste projeto implica o
desenvolvimento de uma proposta formativa interdisciplinar e interprofissional,
rompendo com a estrutura tradicional centrada nas disciplinas e na formação específica
de determinado perfil profissional. Assim, todos os cursos têm um desenho curricular
direcionado por quatro eixos de formação que perpassam os anos de graduação. Em
cada um dos eixos, módulos aglutinando áreas temáticas afins constituem a proposta
curricular. Os quatro eixos são: Trabalho em Saúde; O Ser Humano em sua Dimensão
Biológica; O Ser Humano e sua Inserção Social; Aproximação a uma Prática Específica
em Saúde.
O eixo “O Ser Humano em sua Dimensão Biológica” se constitui de dois núcleos: um
núcleo comum de conhecimentos necessários para todos os cursos propostos (o
conhecimento biológico necessário a um profissional para atuação na área da saúde) e
um núcleo específico de aprofundamento a partir das necessidades de cada curso.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
282
O eixo “O Ser Humano e sua Inserção Social” tem como objetivos formar o aluno para:
compreender o surgimento das Ciências Humanas como área de conhecimento e sua
relação com a área da saúde; utilizar, teórica e metodologicamente, o instrumental das
diferentes áreas do conhecimento das Ciências Humanas na saúde.
O eixo “Trabalho em Saúde” tem como objetivos possibilitar ao estudante: compreender
as múltiplas dimensões envolvidas no processo saúde-doença e de produção de cuidado;
compreender a realidade da saúde e do sistema de saúde vigente em nosso país;
conhecer as diversas profissões e práticas de saúde; compreender o processo de trabalho
em saúde; e construir uma visão crítica sobre a produção do conhecimento em geral, do
conhecimento científico e do conhecimento na área da saúde.
Finalmente, o eixo “Aproximação a uma Prática Específica em Saúde” aborda os
conhecimentos específicos de cada uma das áreas de graduação: Educação Física,
Fisioterapia, Nutrição, Psicologia e Terapia Ocupacional.
Prevê-se uma articulação entre os quatro eixos propostos, orientados pela formação de
profissionais da saúde comprometidos com atuações consistentes, críticas e
potencialmente transformadoras da realidade social, mantendo a ênfase na educação
interprofissional, na interdisciplinaridade, no enfoque problematizador e na produção do
conhecimento.
O PROJETO DE EXTENSÃO
O Plano Nacional de Extensão Universitária define a Extensão como processo
educativo, cultural e científico que articula o ensino e a pesquisa de forma indissociável
e viabiliza a relação transformadora entre universidade e sociedade (Fórum de Pró-
Reitores de Extensão das Universidades Públicas Brasileiras, 2001).
De acordo com esse princípio, as ações extensionistas desenvolvidas no Campus
Baixada Santista possibilitam novas dimensões do processo formativo da Universidade,
aproximando os estudantes da realidade local e regional da área de abrangência da
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
283
Universidade e constituindo campo para projetos de pesquisa e construção de novos
conhecimentos (Projeto Político Pedagógico do Campus Baixada Santista da
Universidade Federal de São Paulo, 2006). Atualmente são desenvolvidos diversos
Projetos e dois Programas de Extensão (conjuntos de ações como projetos, cursos e
eventos, de caráter permanente).
Tomando como vertentes os objetivos do Projeto Pedagógico da UNIFESP-BS e da
potencialidade dos Projetos de Extensão como facilitadores para que a formação se
inscreva dentro do contato direto com a realidade, o Projeto de Extensão “Cartografias
Femininas” conta atualmente com 12 alunos de diferentes cursos (Terapia ocupacional,
Nutrição, Psicologia, Fisioterapia e Serviço Social) e diversos colaboradores docentes
do Campus e de outras instituições.
OBJETIVO GERAL E OBJETIVOS ESPECÍFICOS DO PROJETO DE
EXTENSÃO
Estabeleceu-se como objetivo geral implantar e acompanhar diferentes ações territoriais
junto às mulheres da Zona Noroeste da Baixada Santista e, como objetivos específicos:
realizar o rastreamento dos diferentes serviços e equipamentos da região; implantar
dispositivos que permitam a detecção de população silenciosa de mulheres em uma
comunidade que utiliza o Serviço de Saúde (SUS) e outros equipamentos (escolas,
centros de cultura, centros comunitários, organizações locais região); detectar as
mulheres em situação de vulnerabilidade para desenvolvimento de ações coletivas
(grupo de mulheres) e individuais (projetos específicos e voltados para cada caso);
conhecer e estabelecer aproximações com a população alvo; implantar dispositivos
grupais de apoio e especializados a mulheres da região; implantar o acompanhamento
individual quando necessário; tecer articulações entre os diferentes módulos de Ensino
realizados pelo Eixo- Trabalho em Saúde, promovendo maior continuidade das ações
realizadas em campo.
METODOLOGIA
Para atingir os objetivos propostos estão sendo realizadas as ações descritas a seguir.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
284
Algumas delas são realizadas pelo grupo de extensionistas e outras pelos alunos de
graduação no eixo “Trabalho em Saúde”.
- Divulgação do grupo de mulheres na região, na Unidade Básica Rádio Clube e
ainda em outros equipamentos de Saúde, educação e cultura da comunidade. Uma vez
ao mês será iniciada uma atividade junto a ONG Arte no Dique em uma Oficina de
percussão;
- Entrevistas com interessados;
- Anamnese com todos os participantes do grupo;
- Criação de roteiro para coleta de histórico dos participantes; utilização do
instrumental das Narrativas (utilizadas no Módulo do eixo “Trabalho em Saúde” com
alunos dos diferentes cursos ao longo do 1.º semestre do 2.º ano);
- Criação e utilização de roteiro de observação e acompanhamento do processo
grupal;
- Visitas domiciliares para identificação de mulheres que podem se beneficiar do
grupo;
- Atendimentos individuais com mulheres da região visando ao ingresso aos
grupos realizados na região e/ou realização de projetos singulares, de acordo com o
desejo e necessidade de cada caso em particular, se o ingresso aos grupos não for
possível;
- Realização de Grupo de Mulheres: frequência semanal de 2 horas por
encontro, com convite para a população de mulheres acima de 18 anos, residentes na
Zona Noroeste de Santos;
- Projetos individuais com participantes do Grupo de Mulheres para responder a
alguma demanda específica, a serem selecionados no próprio grupo, por
encaminhamento realizado por docentes que realizam outras práticas e projetos na
região, indicação realizada pelos membros da comunidade, entre outros;
- Rastreamento dos equipamentos da região (educação, cultura, lazer, saúde e
outros);
- Documentação do processo através de Diários realizados pelos alunos e
docentes envolvidos no projeto;
- Documentação em Vídeo e fotografia;
- Apresentação das produções realizadas pelo grupo em eventos científicos ou
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
285
outros.
DISCUSSÃO
A região noroeste da cidade de Santos caracteriza-se por ser um local heterogêneo que
recebeu um enorme contingente populacional advindo do movimento migratório que
ocorreu no país nos últimos cinquenta anos. Nesta região, um número significativo de
pessoas vive em situação de risco e vulnerabilidade social e de saúde, especialmente
pela presença de favelas, sendo a maior parte dos indivíduos moradores de palafitas
construídas sobre o Rio Bugre, sem acesso a saneamento e infraestrutura básica.
Este projeto é desenvolvido na Unidade Básica de Saúde Rádio Clube (UBS-RC),
localizada na região noroeste de Santos que apresenta outras quatro Unidades Básicas
de Saúde. Como existem outros Projetos de Extensão realizados na região, procura-se
tecer articulações visando potencializar seus efeitos e abrangência no território.
Algumas das atividades e ações são pensadas coletivamente através de reuniões e
propostas conjuntas envolvendo alunos, docentes e colaboradores.
Partindo de uma observação geral das mulheres da região e da avaliação das situações
vividas pelas mulheres alvo deste grupo, são realizados descritores das condições e
história de vida das mulheres da comunidade, para uma maior abrangência e eficácia da
atenção promovida. Avalia-se assim a necessidade de realizar entrevistas com as
participantes ao longo do processo para maior conhecimento e identificação de desejos
e necessidades.
As visitas domiciliares também servem para esse propósito, além de meio para
identificação das mulheres que podem se beneficiar das ações. Também são realizados
contatos permanentes com as Agentes de Saúde da região para construção de uma
proposta em parceria Universidade-comunidade. Adicionalmente, serão realizados
estudos e levantamento teórico sobre temas relacionados às ações e sobre as
problemáticas que emergem do processo grupal.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
286
Nessa direção o grupo de extensionistas tem organizado uma série de seminários a todos
os alunos interessados do Campus, abordando temáticas relacionadas ao estudo dos
dispositivos grupais, gênero, clínica, metodologias de ação, procedimentos, entre outras.
RESULTADOS
Este projeto tem se apresentado como uma oportunidade de ensino-aprendizagem, em
que docentes e alunos se relacionam, atuam e discutem diferentes ações junto a
mulheres da Zona Noroeste - Baixada Santista.
No último ano tem rastreado e atendido um número crescente de mulheres procurando
detectar suas demandas e necessidades. Com o avanço do projeto diferentes ações são
articuladas entre si e com outras intervenções realizadas pela UNIFESP na região.
Apresenta-se como um potente suporte para ações e acompanhamento da constituição
de um Grupo de Mulheres e outras ações territoriais. Articulando estudos teóricos e
diferentes práticas, possibilita o dialogo e reflexão interdisciplinar em consonância com
o Projeto Pedagógico da Baixada Santista.
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Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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TERAPIA OCUPACIONAL EM EQUOTERAPIA: UMA PROPOSTA DE
DISCIPLINA PARA O CURSO DE TERAPIA OCUPACIONAL DO CENTRO
UNIVERSITÁRIO FRANCISCANO - UNIFRA
DANIELA BOSQUEROLLI PRESTES1
DANIELA TONUS2
RESUMO
Introdução e justificativa: O Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional
reconheceu a equoterapia como recurso terapêutico, parte do programa de formação,
como disciplina curricular e projeto de extensão e pesquisa. Considerando as
importantes contribuições que o terapeuta ocupacional pode oferecer, salienta-se a
necessidade de disciplinas que ofereçam subsídios e conhecimento científico quanto ao
assunto, assim como projetos de pesquisa que comprovem sua eficácia. Por isso, em
2010 ofereceu-se aos acadêmicos de Terapia Ocupacional do Centro Universitário
Franciscano-UNIFRA, a disciplina optativa Terapia Ocupacional em Equoterapia, que
abordou assuntos teóricos, vivências e observações de atendimentos. Objetivos: Refletir
sobre a experiência; verificar a repercussão da disciplina entre os acadêmicos; fomentar
o interesse de futuros terapeutas ocupacionais a desenvolverem sua prática profissional
e estudos com equoterapia. Materiais e métodos: Este trabalho é um relato de
experiência baseado no modelo de pesquisa fenomenológico. Foram realizadas
descrições e análise reflexiva a partir de observações das pesquisadoras e de dados
coletados por meio de um questionário respondido pelos alunos expondo sua opinião.
Resultados: Os graduandos demonstraram satisfação com a proposta da disciplina,
curiosidade e interesse pela aplicação do método. Reconheceram a importante
contribuição que o profissional pode oferecer às equipes e experimentaram diferentes
ações do profissional na equoterapia. Discussão: O envolvimento dos acadêmicos com
a disciplina pode ser resultado do interesse pelo assunto, experiência, liberdade e
oportunidades proporcionadas. Considera-se que os objetivos propostos foram
alcançados, pois a experiência ofereceu aos acadêmicos subsídios, habilidades e
competências voltadas para a reflexão, análise crítica e atuação profissional na
equoterapia.
1 Prof.ª do curso de Terapia Ocupacional do Centro Universitário Franciscano – UNIFRA.
[email protected] 2 Prof.ª do curso de Terapia Ocupacional do Centro Universitário Franciscano – UNIFRA.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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PALAVRAS-CHAVE: Equoterapia, Terapia Ocupacional, Graduação.
INTRODUÇÃO
As demandas cotidianas exigem cada vez mais a formação de profissionais
competentes, que se atualizam constantemente e que estejam aptos a lidar com
mudanças frequentes, assim como inovações e situações inesperadas no ambiente de
trabalho e no dia-a-dia. Para tanto é necessário estimular durante a academia, atitudes,
habilidades e competências inerentes aos profissionais qualificados para o mercado de
trabalho competitivo e exigente. Dessa forma, o currículo do curso de Terapia
Ocupacional busca, por meio de suas disciplinas, oferecer ao acadêmico tais subsídios
para discussões, reflexões e práticas inovadoras.
A Equoterapia surgiu no Brasil na década de 80 e foi reconhecia em 9 de abril de 1997
pelo Conselho Federal de Medicina. De acordo com a Associação Nacional de
Equoterapia - ANDE-BRASIL (2010), é um método “[...] terapêutico e educacional que
utiliza o cavalo dentro de uma abordagem interdisciplinar, nas áreas de saúde, educação
e equitação, buscando o desenvolvimento biopsicossocial de pessoas com deficiência
e/ou com necessidades especiais”. Em 27 de março de 2008, o Conselho Federal de
Fisioterapia e Terapia Ocupacional (COFFITO, 2008) reconheceu-a por meio da
Resolução Nº 348 como recurso terapêutico da Terapia Ocupacional e da Fisioterapia.
A resolução autoriza o terapeuta ocupacional a aplicar seus princípios profissionais na
Equoterapia, baseando-se no diagnóstico cinético-ocupacional de acordo com a
Classificação Internacional de Funcionalidade e conforme os objetivos terapêuticos
específicos de sua atuação. Ainda, considerando as evidências científicas nacionais e
internacionais, o desenvolvimento técnico-científico e os resultados evidentes do
método no Brasil, foi reconhecida como parte do programa de formação em Terapia
Ocupacional, como disciplina curricular na forma de recurso terapêutico e como
projetos de extensão e pesquisa. Salienta-se, portanto, a necessidade de disciplinas que
ofereçam subsídios e conhecimento científico quanto a este recurso terapêutico, tanto
quanto o desenvolvimento de projetos de pesquisa que comprovem sua eficácia.
Existem poucas pesquisas ou materiais referentes à atuação da terapia ocupacional com
a equoterapia. Lima (2005) realizou uma pesquisa sobre a interdisciplinaridade no Mato
Grosso do Sul e verificou que havia cinco terapeutas ocupacionais trabalhando com
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
290
equoterapia, atuando como administradores e terapeutas ocupacionais. Eles
participavam da avaliação, orientação dos acadêmicos, adaptação de materiais e
reabilitação motora. Dois deles obtiveram informações superficiais sobre o método
durante as aulas na faculdade e dois participaram de estágios extracurriculares em
programa de extensão da universidade.
Tendo em vista as importantes contribuições que o terapeuta ocupacional pode ter para
com a equipe de Equoterapia e a necessidade de fomentar maior participação da
categoria na área, em 2010 a disciplina de “Terapia Ocupacional em Equoterapia” foi
elencada pelos acadêmicos do curso de Terapia Ocupacional do Centro Universitário
Franciscano-UNIFRA, em Santa Maria-RS como a disciplina optativa de férias. Em
razão da grande procura pela disciplina, entusiasmo e expectativa dos alunos frente à
oportunidade, este estudo teve como objetivos refletir sobre a nova experiência;
verificar a repercussão da disciplina entre os acadêmicos e fomentar o interesse de
futuros terapeutas ocupacionais a desenvolverem sua prática profissional e estudos com
Equoterapia.
MATERIAIS E MÉTODOS
A disciplina foi ofertada como optativa de férias, no período noturno, com carga horária
de 34h/a, distribuídas em nove dias úteis corridos do mês de julho de 2010. A proposta
pedagógica incluiu assuntos teóricos, vivências, observações de atendimentos e prática
com o cavalo. Um total de 40 acadêmicos do terceiro, quinto, sexto, sétimo e oitavo
semestres participaram, em conjunto, de todos os momentos e propostas da disciplina.
As aulas teóricas foram ministradas em sala de aula com auxílio de recursos áudio-
visuais; as vivências foram desenvolvidas no pátio da universidade e no laboratório de
Integração Sensorial; as observações de atendimento e prática com o cavalo
aconteceram no Centro de Equoterapia Equilíbrio, situado no Centro de Tradições
Gaúchas-CTG, Estância do Minuano, em Santa Maria-RS.
Para melhor retratar a experiência e possibilitar uma reflexão da proposta acadêmica, a
metodologia utilizada neste trabalho é um relato de experiência baseado no modelo de
pesquisa fenomenológico (HOLANDA, 2006), que envolve descrições e análise
reflexiva com o objetivo de criar um retrato da essência da experiência. Este método
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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constitui-se em uma abordagem descritiva, a partir da ideia de que os fatos falam por si,
atingindo o significado da experiência para as pessoas que a vivenciaram, presumindo
que elas são aptas a oferecer uma descrição compreensiva das situações vividas. A
coleta de dados ocorreu por meio de uma relação dialógica e os sentidos foram
construídos nessa relação.
Os dados foram descritos a partir da percepção das pesquisadoras que vivenciaram o
período no papel de professora/terapeuta ocupacional e coordenadora de curso/
terapeuta ocupacional. Adicionam-se às obervações das pesquisadoras, os dados
coletados por meio de um questionário respondido pelos alunos da disciplina, composto
por três questões abertas: aspectos positivos da disciplina, aspectos negativos da
disciplina e sugestões.
RESULTADOS
Desde o primeiro dia de aula, os alunos demonstraram interesse e curiosidade sobre o
assunto da disciplina. A sala de aula estava cheia, no início bastante silenciosa.
Contudo, no decorrer da noite, apesar de o conteúdo abordar aspectos históricos, os
menos tímidos iniciaram os questionamentos relacionados ao cavalo. No final da
primeira aula, evidenciaram expectativa para com o conteúdo da segunda aula: o cavalo.
No segundo dia, mesmo durante os dois primeiros períodos teóricos, a aula foi dinâmica
e participativa. A professora dramatizou imitando o cavalo e alguns alunos se
arriscaram a imitá-lo também para perceber o movimento do animal e as respostas
motoras que poderia desencadear. Os dois últimos períodos, correspondentes à prática,
foram bastante interativos, divertidos e enriquecedores. Brincando de jogo da memória
com os nomes de todos, puderam aproximar-se dos desconhecidos e iniciar uma nova
relação de coleguismo e trocas entre os acadêmicos de semestres diferentes. Ao
interagirem imitando o cavalo, inclusive sentindo o desconforto de ter um freio na boca
que, na prática, foi simulada com palitos de picolé e barbantes, os alunos pareceram se
despir de qualquer resquício de acanhamento e, de fato, experimentaram e vivenciaram
a atividade.
No terceiro dia, as dúvidas e anseios emergiram quando, divididos em grupos, tinham
que pensar em estratégias para solucionar desafios: dois alunos simularam ser
deficientes auditivos e dois, deficientes visuais. Cada grupo tinha que descobrir uma
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
292
forma de indicar ao colega “com deficiência” o percurso a ser percorrido no espaço
delimitado, conforme um roteiro pré-estabelecido. Pôde-se perceber, em três dos quatro
grupos, as dificuldades que tinham para realizar a tarefa, dificuldades que incluíram
planejamento adequado de estratégia, distribuição de tarefas intragrupo, organização da
execução e percepção das necessidades de pessoas com deficiência auditiva e
deficiência visual, bem como de condutas para com esses indivíduos.
O quarto, quinto e sexto dia contemplaram assuntos específicos da prática de terapia
ocupacional, incluindo princípios de reabilitação, condutas terapêuticas, papel do
profissional na equipe multidisciplinar, sua participação nos diferentes programas do
método, criação e adaptação de recursos terapêuticos (Figura 1) e análise ergonômica
para melhorar o atendimento, compreendendo o praticante e o terapeuta e o ambiente
físico onde é desenvolvida a terapia.
Figura 1. Aula prática com os recursos utilizados na Equoterapia, laboratório de Integração Sensorial
Esses dias foram intensamente produtivos, pois os alunos fizeram perguntas frequentes,
experimentaram manuseios (Figura 2 e 3), testaram hipóteses e se apropriaram da
criatividade para utilizar recursos comuns da prática clínica terapêutico-ocupacional no
setting equoterápico.
A proposta do sétimo dia foi associar o conteúdo dos dias anteriores à observação de
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
293
situações reais de atendimento e à vivência com o cavalo (Figura 4). Os acadêmicos
conheceram o Centro de Equoterapia, questionaram sobre a estrutura física,
metodologia de atendimento, procedimentos com o cavalo, entre outras dúvidas que
foram sanadas a partir da atividade executada. A maior indagação dos acadêmicos
esteve relacionada à ausência do profissional de terapia ocupacional na equipe, à
possibilidade de realizarem estágios no local e à probabilidade de participarem da
equipe após concluírem a graduação. No mesmo dia observaram o atendimento de duas
crianças com Síndrome de Down e uma adulta com hemiplegia em decorrência de um
acidente automobilístico. Fizeram suas considerações sobre a vivência e propuseram
contribuições com o intuito de enriquecer o atendimento.
Figura 2. Professora demonstrando manuseios e aplicação de recurso utilizados na equoterapia.
Figura 3. Alunas experimentando manuseios
para montar e apear do cavalo, no laboratório
de Integração Sensorial.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
294
Figura 4. Aula prática com o cavalo no Centro de Equoterapia Equilíbrio, Santa Maria, RS.
O oitavo dia compreendeu as apresentações dos estudos de caso propostos pela
professora no primeiro dia de aula. Os grupos demonstraram a necessidade da
intervenção do terapeuta ocupacional em cada caso apresentado, bem como as possíveis
contribuições em diferentes situações presentes na equoterapia.
O encerramento da disciplina aconteceu no nono dia, com uma conversa dirigida. Os
acadêmicos expuseram seus sentimentos e pensamentos sobre o método terapêutico e
sobre a disciplina. Os resultados corroboraram com o constatado pelas pesquisadoras,
conforme mostra a Tabela 1.
Tabela 1: Aspectos positivos, aspectos negativos e sugestões apontadas pelas
pesquisadoras e acadêmicos da disciplina optativa de férias: Terapia Ocupacional em
Equoterapia
Pesquisadoras Acadêmicos
- Poucas faltas nas aulas;
- Todos permaneciam até o final da
aula, mesmo com as noites muito
frias (a temperatura se aproximava
de 0º);
- Apenas uma aluna não participou
da visita ao Centro de Equoterapia;
- Aulas criativas, dinâmicas,
agradáveis e descontraídas, que
mantiveram os alunos atentos até o
final;
- Boa elaboração, administração e
didática das aulas;
- Conteúdo de fácil compreensão,
que desperta o interesse;
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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Aspectos
Positivos
- Envolvimento e participação nas
aulas teóricas e práticas;
- Cooperação entre colegas,
anteriormente desconhecidos.
- Visualização da necessidade,
aplicabilidade e benefícios da
Equoterapia como Recurso
terapêutico da TO para/ com os
pacientes;
- Professora atenciosa, dá liberdade e
condições para os alunos exporem
suas dúvidas e criticas;
- Compromisso, exigência e
experiência da professora no
assunto;
- Complementação entre prática e
teoria;
- Troca de experiência entre colegas
de diferentes níveis da formação.
Aspectos
Negativos
- Nivelamento heterogêneo de
conhecimento e prática devido à
oferta aos diferentes semestres do
curso;
- Desejo constante e, por vezes
arredios, dos alunos de “impor” a
presença da Terapia Ocupacional na
Equoterapia e nos diferentes
campos de atuação;
- Falta de conhecimento sobre
determinadas patologias, incluindo
nomenclaturas e prática, devido ao
fato de alguns alunos ainda estarem
iniciando o curso;
- Pouca aula prática;
- Carga-horária curta;
Sugestões
- Torná-la uma disciplina curricular;
- Oferecer em um determinado
semestre para homogeneizar
linguagem e conteúdo;
- Tornar uma disciplina curricular
ofertada no decorrer do semestre ou
como curso de extensão;
- Proporcionar estágios;
- Promover a interdisciplinaridade,
oferecendo a disciplina para outros
cursos de graduação;
- Realizar a análise de vídeos
disponíveis na internet para
visualizar mais atendimentos.
Parte do depoimento escrito, sem alterações, retirado da avaliação de R., cursando o 8º
semestre, evidenciou a postura crítica da acadêmica sobre o quanto a disciplina
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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influenciou sua formação, possibilitando reflexões acerca da prática e da teoria, da
postura profissional, da sua valorização no mercado de trabalho:
“O passeio na Estância do Minuano me trouxe uma visão mais clara do
que é um atendimento em Equoterapia., embora não tivesse a atuação
de uma T.O., deu pra ver a importância do tratamento e o quanto iria
acrescentar um profissional da nossa área e com isso me fez pensar que
realmente, nós só vamos ser valorizados quando mostrarmos o nosso
trabalho, e para que isso aconteça, tem que partir de nós, futuros
profissionais da área, em nos emprenharmos divulgando, através de
estágios e um trabalho sério, a importância e o diferencial da Terapia
Ocupacional.”
DISCUSSÃO
Rosa e Emmel (2001) estudaram diferentes papéis do terapeuta ocupacional enquanto
professor universitário e constataram que a atividade desse profissional está voltada
para dois eixos: professor e terapeuta. O papel docente exige do profissional a dupla
função, pois, ao mesmo tempo em que assume o paciente/cliente, deve atentar para as
demandas do discente. Dessa forma o profissional se torna um modelo em uma situação
real, possibilitando a instrumentalização e a construção da identidade profissional do
discente, instigando a construção ideológica da profissão, conduzindo o aluno a criar
um imaginário das perspectivas que nortearão sua prática profissional, construindo e
destruindo modelos e redefinindo o conhecimento.
As aulas foram desenvolvidas por meio de um conjunto de ações que mesclaram
constantemente a teoria e a prática, possibilitando maior entendimento e aprofundando
os conteúdos estudados. A exposição da experiência e do conhecimento teórico da
professora sobre o assunto foi calcada nos papéis definidos por Rosa e Emmel (2001),
como facilitadores e provocadores do conhecimento. O professor é uma referência
profissional, um mediador que promove a dúvida, o questionamento e a curiosidade.
Seu domínio de códigos e conhecimentos científicos é interpretado, experimentado e
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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utilizado pelos alunos, direcionando as descobertas e disponibilidades para novos
pensamentos. O aluno aprende a aprender, busca a experimentação, revê conceitos e
constrói outras técnicas, na crença de que não existe nada pronto e acabado.
Provavelmente, a organização da disciplina segundo uma lógica de conteúdo (história,
definições, fundamentos técnico-científicos e aplicação prática), a disponibilidade
prévia do cronograma, material bibliográfico de referência e bibliografia complementar
contribuíram para tornar o curto período da disciplina mais produtivo. Isso permitiu
àqueles acadêmicos mais interessados e com tempo disponível, ler e elencar as dúvidas
para, então, no momento da aula, refletir sobre o assunto, assimilar o estudado ou
formular perguntas que pudessem esclarecer seus questionamentos.
Por meio de vídeos, exposição teórica e vivências, os acadêmicos visualizaram e
experimentaram a atuação do terapeuta ocupacional nos quatro programas do método:
Hipoterapia; Educação/Reeducação; Pré-esportivo; Prática Esportiva Paraequestre. Em
todos eles, a ação do terapeuta ocupacional está voltada para o aumento da função,
promoção da independência e autonomia do praticante. Para tal, o profissional participa
do planejamento de intervenção junto com a equipe, criando e selecionando atividades,
recursos terapêuticos e adaptações ou dispositivos de tecnologia assistiva que
contribuam para atingir os objetivos de tratamento e facilitem a atuação da equipe
multidisciplinar (PRESTES, 2010). Essa visão sobre a prática do terapeuta ocupacional
em meio a uma equipe multidisciplinar, e algumas até mesmo interdisciplinares,
favorece a percepção do papel profissional, no seu espaço de trabalho, sobre o
relacionamento com a equipe, limites e dificuldades de situações concretas e de
relacionamentos inerentes à situação de trabalho.
Prestes (2010) descreve a participação do terapeuta ocupacional nos Centros de
Equoterapia, cuja atuação começa já no processo de avaliação do praticante. Acrescenta
que essa avaliação deve ser contínua devido à rapidez de resposta adquirida na
equoterapia, e deve sempre ser acompanhada de análises da atividade. Ainda, o
profissional contribui no início do tratamento, pois em certas situações são necessárias
alternativas, estratégias e adaptações que promovam o processo de aproximação do
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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indivíduo ao cavalo. Os acadêmicos da disciplina conheceram, por meio de recursos
audiovisuais, instrumentos avaliativos protocolados e validados no Brasil, que podem
ser utilizados para avaliar o praticante de equoterapia e também como instrumentos de
pesquisa científica. Além disso, foram-lhes mostrados instrumentos usuais de centros de
equoterapia que abrangem os interesses pertinentes à área de formação.
Houve oportunidade para explorar a gama de funções que o profissional pode exercer
nos diferentes programas, no momento em que alunos tiveram que planejar atividades,
escolher materiais de equitação e cavalo apropriado, indicar ou criar adaptações para
diferentes casos: criança com quadriplegia espástica; criança com autismo e retardo
mental moderado; criança com Síndrome de Moebius e hipotonia global; criança com
distúrbio de aprendizagem; criança com distúrbio de comportamento; e adulto com
hemiplegia e comprometimento de componentes emocionais. Em outros momentos,
puderam experimentar técnicas de reabilitação e manuseios aplicáveis na situação
equoterápica. Puderam manusear equipamentos básicos de montaria e recursos
complementares tanto na situação real do centro de equoterapia quanto em simulações
no laboratório. Acredita-se que a constante exposição de casos clínicos vivenciados pela
professora, a discussão proporcionada pelos estudos de casos reais e a observação de
diferentes atendimentos no centro de equoterapia tenham colaborado para ilustrar e
reafirmar a importância e formas de intervenção junto ao paciente/praticante de
equoterapia. Rosa e Emmel (2001) referem que a aprendizagem no campo da saúde,
quando contextualizado, envolve um terceiro elemento: o paciente, que se torna um
referencial, um instrumento diferencial provocador da aprendizagem.
A aplicação prática, quase diária durante a disciplina, possibilitou aos alunos viverem,
experimentarem situações concretas de trabalho que possivelmente ocorrerão após a
graduação. Rosa e Emmel (2001) explicam que essa oportunidade favorecerá a
percepção e reflexão do discente sobre sua ação, sobre seu papel profissional. Valeu-se
do exposto por Marcolino e Mizukami (2008), que falam da crença de que o
conhecimento demonstrado no dia-a-dia é um conhecimento implícito, pois o
profissional sabe que sabe, no entanto não consegue explicar o que sabe. Por isso, o
profissional precisa refletir sobre sua ação para descobrir se está coerente com suas
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
299
crenças e compreensões pessoais, redefinir seus significados e produzir novos
conhecimentos. Partindo dessas reflexões, após cada prática, os alunos tiveram espaço
para esclarecer dúvidas, retificar ou ratificar suas ideias, pensar em alternativas e
experimentá-las. Supõe-se que essa conduta tenha contribuído para que se sentissem à
vontade em expor suas dificuldades, dúvidas e desejos e pudessem refletir sobre sua
ação.
Além disso, os mais experientes puderam compartilhar com os colegas seus
conhecimentos e os menos experientes, instigar a aplicação prática dos que sabiam bem
como fomentar nestes a ideia de reproduzir, demonstrar o que já haviam aprendido.
Percebe-se aqui que um dos pontos negativos levantados pelas pesquisadoras e alunos
do terceiro semestre – linguagem e profundidade de conteúdo que se adequassem aos
diferentes níveis de formação – teve resultados positivos perante os alunos, ou seja, a
troca de experiência entre eles. Esses dados ratificam o pensamento de Pacheco (2006),
ao afirmar que a atuação do professor deve avançar no sentido de desenvolver a
autonomia, estimular a criatividade, a cooperação e a partilha.
Foi possível perceber que as sugestões das pesquisadoras e alunos estão relacionadas
principalmente à carga horária da disciplina e às peculiaridades de uma disciplina de
caráter intensivo, como as optativas de férias. O curto espaço de tempo para a
quantidade de conteúdo torna evidente a necessidade de promover a disciplina de uma
forma mais distribuída e em tempo maior. Além disso, apesar de o curso ser noturno e
por esse motivo, de certa forma, dificultar a oferta de mais práticas, pois os centros de
equoterapia funcionam no período matutino e vespertino, os alunos demonstraram
disponibilidade em participar da visita proposta. A transformação dessa experiência em
uma disciplina curricular ou projeto de extensão com estágios poderá incentivar o
desenvolvimento de mais pesquisas e estudos sobre o assunto, contribuindo para o
crescimento e fortalecimento da equoterapia enquanto recurso terapêutico-ocupacional e
colaborando para o aumento da participação dos terapeutas ocupacionais nas equipes.
Pacheco (2006) fundamenta essa evidência, quando em seu estudo demonstrou que o
novo perfil de professores de Terapia Ocupacional se reflete na formação, pois com os
programas de extensão e pesquisa, os alunos se sentem estimulados e comprometidos
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
300
com o seu processo de construção profissional e com as responsabilidades de se
tornarem transformadores sociais.
Encerra-se este estudo considerando que a disciplina foi bem aceita, superando as
expectativas dos alunos e pesquisadoras. Os aspectos positivos e negativos e as
sugestões apontadas tanto pelos acadêmicos quanto pelas pesquisadoras apresentaram
relação e servem como fonte de referência para melhorar propostas futuras.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDE-Brasil. Associação Nacional de Equoterapia. Princípios e fundamentos. Brasília.
Disponível em: www.equoterapia.org. Acesso em 20 ago 2010.
COFFITO. Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia ocupacional. Legislação/
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Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
301
PERFIL PROFISSIONAL DO EGRESSO DO CURSO DE TERAPIA
OCUPACIONAL DA UNIVERSIDADE PRESIDENTE ANTÔNIO CARLOS -
CONSELHEIRO LAFAIETE-MG
ÉRIKA RENATA TREVISAN1
DANIELA TONIZZA DE ALMEIDA2
RESUMO
O curso de Terapia Ocupacional da Universidade Presidente Antônio Carlos (UNIPAC)
- Campus Lafaiete iniciou-se em fevereiro de 2002 já tendo formado até 2009 oito
turmas, num total de 195 terapeutas ocupacionais. No entanto, desde fevereiro de 2007
não se constituem novas turmas. Para conhecer a realidade profissional desses egressos
foi realizado um levantamento estatístico utilizando como instrumento de coleta de
dados um questionário estruturado. O contato foi feito pelo correio eletrônico, redes de
relacionamento social e indicação de contatos. A pesquisa abordou o tempo de
formação do egresso, o momento em que começou a trabalhar como terapeuta
ocupacional e em que área, as influências que considera importantes em sua vida
profissional e na área em que atua, a população alvo de suas intervenções, suas metas
acadêmicas e profissionais, assim como, sua faixa salarial. Os resultados mostraram que
96% dos egressos que responderam à pesquisa estão inseridos no mercado de trabalho
em diversas regiões do Brasil e a maioria trabalha em mais de uma área, sendo as áreas
mais comuns as de Reabilitação Física e Desenvolvimento Infantil. Relataram estar
realizados com a profissão, embora se queixassem da falta de reconhecimento e
apontassem a necessidade de aprimoramento profissional para garantir a qualidade da
assistência. Verificou-se, assim, que o curso atende ao perfil do egresso estabelecido
pelas Diretrizes Curriculares ao formar terapeutas ocupacionais com perfil generalista,
aptos para trabalhar em qualquer tipo de serviço de saúde, com capacidade de
comunicação, trabalho em equipe e busca permanente de educação continuada.
PALAVRAS-CHAVE: Terapia ocupacional, Ensino, Egresso.
INTRODUÇÃO
1 Prof.ª do Curso de Terapia Ocupacional da Universidade Presidente Antonio Carlos.
[email protected] 2 Prof.ª do Curso de Terapia Ocupacional da Universidade Presidente Antonio Carlos.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
302
A Terapia Ocupacional é uma profissão da área da Saúde, regulamentada pelo Decreto
Lei 938/69 e Lei 6.316/75. De acordo com o Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia
Ocupacional (2010) trata-se de uma área do conhecimento voltada aos estudos, à
prevenção e ao tratamento de indivíduos portadores de alterações cognitivas, afetivas,
perceptivas e psicomotoras, decorrentes ou não de distúrbios genéticos, traumáticos
e/ou de doenças adquiridas. A intervenção terapêutico-ocupacional é realizada pela
sistematização e utilização da atividade humana como base de desenvolvimento de
projetos terapêuticos específicos.
O curso de Terapia Ocupacional da Universidade Presidente Antônio Carlos – Campus
Conselheiro Lafaiete – MG (UNIPAC – Lafaiete) foi criado em fevereiro de 2002 com
base nas Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de Terapia Ocupacional
(Conselho Nacional de Educação, 2002), idealizado para que o graduado adquirisse e
desenvolvesse as competências e habilidades necessárias para o exercício profissional.
Sendo assim, os objetivos gerais do curso foram assim definidos:
Oferecer condições, através da teoria associada à prática, para que o egresso seja
capaz de desenvolver o exercício das competências e habilidades gerais, tais
como, atenção à saúde, tomada de decisões, comunicação, liderança,
administração, gerenciamento e educação continuada permanente;
Formar um profissional generalista, humanista, crítico e reflexivo, apto para o
exercício de competências e habilidades gerais e específicas, em consonância
com as políticas sociais;
Criar condição para a formação de profissionais com sólido embasamento
teórico-prático, preparados para atuar em locais diversos, acompanhar o
dinamismo da sociedade e dos serviços de saúde e com capacidade para detectar
os problemas associados às populações alvo e estabelecer metas e condutas para
resolvê-los;
Preparar o egresso para trabalhar em equipe com profissionais da saúde, da
educação e outros, buscando ações interdisciplinares para o cuidado integral do
ser humano;
O perfil do profissional que se quer formar se refere a um conjunto de traços
características e diferenciadores da profissão, e está vinculado ao delineamento dado
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
303
pelos participantes dessa formação que são: docentes, profissionais, associações e outras
instâncias organizativas e/ou representativas desses profissionais, considerando o
momento histórico e cultural (DE CARLO, 2009).
Esboçar um perfil profissional que se quer formar, num curso de graduação, faz parte da tarefa educacional e está, necessariamente,
vinculado à delimitação de fronteiras, convergência de áreas e de
conhecimentos, hierarquias constituídas na produção de saberes, e à legitimação de práticas. Portanto, o perfil está relacionado à história
de como se institui um conhecimento e o poder dos agentes no
processo de demarcação de seu território (DE CARLO, 2009, p. 1).
O aluno graduado pelo curso de Terapia Ocupacional da UNIPAC Lafaiete deve
conhecer os fundamentos históricos, filosóficos e metodológicos da profissão e seus
diferentes modelos, técnicas e estratégias de intervenção.
Tem uma formação para atuar a partir de uma visão humanista, crítica e reflexiva, com
base no rigor científico e intelectual. Dessa forma, deve desenvolver habilidades e
competências terapêuticas fundamentadas nos recursos técnicos e conceituais da
profissão, correlacionando-as aos diferentes níveis de atenção à saúde (promoção,
prevenção, tratamento e reabilitação) e aos diversos contextos socioculturais da
população atendida.
O Projeto Pedagógico do Curso de Terapia Ocupacional da Universidade Presidente
Antônio Carlos de Conselheiro Lafaiete se pauta pela oferta de ensino de graduação
com qualidade, buscando articular ensino, pesquisa e extensão como princípio norteador
da formação acadêmico-profissional dos seus discentes. Nesse sentido, busca destacar-
se pela implementação de práticas didático-pedagógicas inovadoras pela utilização de
laboratórios, modernos e por uma matriz curricular que contempla conteúdos e métodos
que confiram uma significativa formação científica ao acadêmico, visando a uma
adequada preparação profissional para o mercado de trabalho.
Considera-se que a atuação profissional do terapeuta ocupacional está vinculada às
áreas de saúde, educação e campo social, seja através da contratação direta pela
administração pública, seja através de incentivos à contratação de profissionais por
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
304
entidades privadas conveniadas com o Sistema Único de Saúde (SUS), seja em
empresas privadas ou do terceiro setor.
O município de Conselheiro Lafaiete tem algumas características que incentivaram a
criação do curso em 2002, dentre elas: carência de profissionais para atendimento à
população com necessidades especiais, proximidade de grandes centros consumidores e
produtores de conhecimento, baixo custo de vida, apoio de instituições municipais,
ausência de serviços de Terapia Ocupacional e de Reabilitação em geral, em toda a
região do Alto Paraopeba.
Entretanto, ainda que já tenha formado 195 terapeutas ocupacionais no período
compreendido entre 2005 e 2009, atualmente o curso está em vias de extinção devido à
baixa procura nos últimos vestibulares. A primeira turma de concluintes se deu em
dezembro de 2005. Até o momento, oito turmas do curso de Terapia Ocupacional já
foram formadas, mas está em curso apenas uma turma no oitavo período.
Este estudo buscou conhecer o perfil profissional do egresso do curso de Terapia
Ocupacional da UNIPAC - Lafaiete. Para tanto, investigou-se a área de atuação,
população alvo da assistência, bem como os fatores que contribuíram para a inserção na
área, o tempo demandado para o ingresso no mercado de trabalho, o salário, a formação
continuada, a meta acadêmica, características do local de trabalho e perspectivas
profissionais.
A relevância do estudo consiste em ampliar o conhecimento sobre as características
dessa categoria profissional, além de contribuir, como mais um instrumento de
avaliação institucional, para avaliar se as atividades desenvolvidas para a formação,
assim como o currículo, estão atendendo ao perfil do egresso instituído pelas Diretrizes
Curriculares Nacionais. Espera-se ainda contribuir para a compreensão da diminuição
expressiva da procura pelo curso.
METODOLOGIA
Este estudo caracterizou-se como um levantamento estatístico, cujo instrumento
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
305
utilizado para a coleta de dados foi um questionário estruturado, elaborado pelas autoras
com base nos objetivos do estudo, composto de dez itens objetivos e uma questão
aberta. Dos 195 terapeutas ocupacionais formados foram contatados 115 pelo correio
eletrônico ou rede social na internet. A escolha do método justifica-se pela dificuldade
de acessar pessoalmente todos os egressos, uma vez que estão distribuídos
geograficamente em várias regiões do país. O convite na rede social consistia na
solicitação do envio do e-mail para as pesquisadoras. Em seguida, enviou-se um Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) juntamente com o questionário. O TCLE
alertava em seu texto que a resposta ao email com o questionário respondido significava
o aceite das condições de participante da pesquisa. Responderam ao convite 44
egressos, o que representou 22, 05% da população total egressos.
A análise dos dados foi realizada por meio da construção de histogramas ou tabelas de
distribuição de frequência. Os resultados foram discutidos com base nas Diretrizes
Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Terapia Ocupacional.
RESULTADOS
A primeira pergunta do questionário referia-se ao ano em que o egresso concluiu o
curso de Terapia Ocupacional na UNIPAC Lafaiete, de acordo com o gráfico.
0
2
4
6
8
10
12
ano de conclusão do curso
2005
2006
2007
2008
2009
Gráfico 1: Ano de conclusão do curso
Foi abordado quanto tempo aproximado, após a formatura, o egresso se inseriu no
mercado de Trabalho, como descrito no Gráfico 2:
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
306
0
5
10
15 1 mês
3 meses
6 meses
1 ano
mais de um ano
não trabalha
Gráfico 2: Tempo médio para inserção no mercado de trabalho
Na questão sobre o local de trabalho, considerando o tipo de empresa em que o egresso
estava inserido, treze participantes da pesquisa responderam que estar inseridos em mais
de um local, conforme aparece no Gráfico 3:
0
5
10
15
20 empresa privada
serviço público municipal
serviço público estadual
serviço público federal
terceiro setor
autônomo
Gráfico 3: Local de trabalho
Investigou-se também se a área de atuação profissional era uma área desejada, da
preferência do egresso ou não, de acordo com o descrito no Gráfico 4:
0
5
10
15
2 0
2 5
área de preferência
área de pouco interesse
área de nenhum interesse
área desconhecida
Gráfico 4: Interesse inicial pela área de atuação
Ao ser questionado a respeito da área de atuação, oito participantes responderam que
atuavam em duas áreas diferentes e cinco relataram atuar em três áreas distintas de
atuação do terapeuta ocupacional, sendo as áreas mais acolhidas pelo egresso da
UNIPAC Lafaiete a do desenvolvimento infantil e da reabilitação física, de acordo com
o demonstrado no Gráfico 5:
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
307
0
2
4
6
8
10
12
14
16Reabilitação Física
Saúde Mental
Hospitalar
Desenvolvimento Infantil
Saúde e Trabalho
Educação
Geriatria
Outros (equoterapia, Neurologia, INSS,
docência de curso técnico, Atenção Básica)Docência do Ensino supoerior
não exerce
Gráfico 5: Área de atuação
Quanto aos fatores que contribuíram para o ingresso no mercado de trabalho e,
principalmente, a área de atuação profissional, os resultados demonstram que a
oportunidade de trabalho que apareceu na época e a experiência de estágio foram os
fatores mais relevantes, como aparece no Gráfico 6:
0
2
4
6
8
10
12
14
16experiência de estágio
oportunidade de trabalho queapareceu na época
influência de um professor
essa área tem maior reconhecimentosocial
sempre quis trabalhar na área, desdeantes da graduação
influÊncia da família
influÊncia de amigos
rede social na internet
outro fator: aprovação em concursopúblico
Gráfico 6: Fatores que contribuíram para o ingresso na área de atuação em que trabalha
A população alvo predominante nas intervenções do terapeuta ocupacional formado
pela UNIPAC Lafaiete distribuiu-se entre crianças e adultos de forma muito
equilibrada, como mostra o Gráfico 7:
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
308
0
5
10
15
2 0
2 5criança
adolescente
adulto
idoso
Gráfico 7: População alvo da assistência
Todos os participantes da pesquisa apresentaram metas e projetos de continuação dos
estudos em cursos de pós-graduação lato e stricto sensu, como aparece no Gráfico 8:
0
5
10
15cursos de aprimoramento
curso de especialização
mestrado
doutorado
não pretendo investir na formação acadêmica
Gráfico 8: Metas acadêmicas
Além das metas acadêmicas, as perspectivas profissionais também aparecem de forma
muito positiva. Em uma questão dissertativa, todos os participantes da pesquisa
demonstraram interesse por um ou mais projetos para a carreira, os quais foram
agrupados de acordo com os temas, conforme mostra o Gráfico 9:
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10satisfação e reconhecimento pessoal eprofissionalaprimoramento e especialização na áreade atuaçãoconcurso público
Pós-graduaçaõ Stritu senso
investir em consultório particular
Docência
qualidade profissional para melhoria daassistênciatrabalhar em uma única área
ingressar em outra área
ingressar no mercado de trabalho
já se sente realizado(a)
Gráfico 9: Metas profissionais
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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A faixa salarial dos egressos do curso de Terapia Ocupacional da UNIPAC Lafaiete
também foi abordada, entretanto, somente 19 participantes da pesquisa responderam a
esse item, como mostra o Gráfico 10:
0
2
4
6
8
10
12até 1 salário mínimo
entre 1 e 2 salários mínimos
entre 3 e 5 sálários mínimos
entre 5 e 7 salários mínimos
entre 7 e 9 sálarios mínimos
mais de 9 salários mínimos
Gráfico 10: Faixa salarial
Outra questão dissertativa que indagava a respeito da formação na pós-graduação em
andamento ou concluída pelos egressos do curso de Terapia Ocupacional, está exposta
na Tabela 1:
CURSO INSTITUIÇÃO DE
ENSINO
EGRESSOS
Especialização em Terapia Ocupacional Aplicada
Neurologia
Atlântica Educacional 1
Desenvolvimento Humano UFJF 1
Especialização em Terapia Ocupacional com ênfase em
Desenvolvimento Infantil
UFMG 7
Especialização em Reabilitação de Membros Superiores FCMMG 7
Especialização em Saúde Mental de Criança e Adolescente FCMMG 1
Especialização em Atendimento Integral à família Universidade Veiga de
Almeida
1
Especialização em Anatomia Humana e Biomecânica Universidade Castelo
Branco
1
Especialização em Neonatologia em Terapia Ocupacional Estácio de Sá e Sofia
Feldman
1
Especialização em Terapia Ocupacional com ênfase em
Saúde e Trabalho
UFMG 4
Especialização em Terapia de Mão UFSCar 1
Especialização em Terapia Ocupacional com ênfase em Geriatria
UFMG 4
Especialização em Terapia de Mão Centro de Ensino
Inspirar Curitiba
1
Mestrado em Educação UFSC 1
Especialização em Neuropsicologia FUMEC 1
Tabela 1: Pós-graduação em andamento ou finalizada
DISCUSSÃO
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
310
A partir dos resultados, observa-se que houve uma expressiva inserção dos egressos no
mercado de trabalho, independente do ano em que se formaram, sendo que 91% dos
egressos que responderam ao questionário estão inseridos no mercado de trabalho.
Entretanto estabeleceu-se uma preocupação, ou seja, se houve uma tendência maior em
participar da pesquisa apenas os que estavam inseridos no mercado de trabalho.
Essa inserção se deu de diferentes formas e em diversas áreas de atuação. Verificou-se
ainda que uma grande parte (29,54%) dos egressos trabalhava em mais de uma área, o
que sugere que a formação generalista possibilita maior flexibilidade para atuar em
diferentes contextos.
A formação continuada aparece de forma significativa como sendo uma preocupação e
meta dos profissionais formados por esse curso. Todos os egressos tinham como meta o
aperfeiçoamento técnico em cursos de pós-graduação lato e stricto sensu, assim como
perspectivas profissionais relacionadas ao desejo de melhorar a qualidade da assistência
prestada, a atualização profissional, a satisfação e o reconhecimento social, entre outras
possibilidades.
Outro aspecto a ser ressaltado é a inserção em instituições públicas, desenvolvendo
trabalho em equipe e em alguns casos, coordenando as equipes, o que atende ao
objetivo de uma formação em consonância com as políticas públicas de saúde, educação
e do campo social.
Dentre aqueles que ainda não estavam inseridos no mercado de trabalho, destacam-se os
que estavam cursando, já haviam cursado ou desejavam fazer curso de especialização e
tinham como meta a inserção no mercado.
Considera-se ainda que a variável tempo de formação não mostrou interferência no
tempo médio para inserção no mercado de trabalho, nos salários ou escolha da área.
Nenhum dos sujeitos afirmou o desejo de abandonar a profissão, embora nem sempre
estivessem atuando na área de maior interesse. Outro fator relevante a ser destacado é o
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
311
interesse pela área de atuação e busca de aperfeiçoamento em desenvolvimento infantil
e reabilitação de membros superiores, duas áreas que se desenvolveram visivelmente
mais que as outras na região. Uma hipótese que surge é que no curso de Terapia
Ocupacional da UNIPAC Lafaiete essas áreas tinham destaque, tanto na formatação do
currículo como nas atividades de estágio realizadas em várias instituições do município
e da região. As experiências de estágio mostram-se como fator que contribui de forma
relevante na maioria dos casos para definir a área de atuação, assim como as
oportunidades de trabalho.
Não foi mencionada preocupação com a melhoria do retorno financeiro, embora a busca
de maior reconhecimento e satisfação apareça em grande parte dos questionários como
meta profissional.
O valor que mais apareceu como faixa salarial foi de três a cinco salários mínimos.
Aqueles que ganhavam mais estavam inseridos em mais de um trabalho ou estavam
trabalhando na região Sul ou Nordeste do país. Especula-se que o excedente de mão-de-
obra na região forçou a média salarial para baixo, o que pode ser um dos fatores que
desmotivou a procura pelo curso. Embora se considere que ainda há um vasto campo de
trabalho a ser explorado, principalmente nas áreas social, hospitalar e de saúde e
trabalho nas instituições públicas e privadas da região, esbarra-se no poder público e
interesses corporativistas que dificultam a inserção do profissional.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A formação do Terapeuta Ocupacional visa oferecer ao profissional conhecimentos
requeridos para o exercício de competências e habilidades que são definidas pelas
Diretrizes Curriculares Nacionais. De acordo com os resultados do estudo, os egressos
do curso de Terapia Ocupacional atendiam a essas solicitações ao demonstrar que
possuem aptidão para desenvolver ações de prevenção, promoção, proteção e
reabilitação da saúde, tanto em nível individual quanto coletivo, de forma integrada e
contínua com o sistema de saúde, social e educacional nas diversas etapas do ciclo vital.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
312
Possuem capacidade para avaliar, sistematizar e decidir as condutas mais adequadas,
baseadas em evidências científicas, mantendo a confidencialidade das informações na
interação com outros profissionais de saúde e o público em geral. Descreveram estar
inseridos no trabalho em equipe multiprofissional, alguns assumiram posições de
liderança, o que envolve compromisso, responsabilidade, empatia, habilidade para
tomada de decisões.
A educação permanente aparece de forma repetitiva e concisa nos questionários
respondidos pelos egressos, relacionado-a com a formação e a prática profissional.
Dessa forma, o perfil do egresso formado pelo curso de Terapia Ocupacional da
UNIPAC Lafaiete atende ao preconizado pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para
os cursos de Terapia Ocupacional. O profissional apresenta formação que foca a
fundamentação teórica e conhecimento sólido, além das atividades de cunho prático
fundamentais para integrar equipes de saúde. A estrutura curricular abrange conteúdos
das ciências psicológicas, sociológicas, biológicas e ocupacionais.
O terapeuta ocupacional egresso do curso da UNIPAC Lafaiete consegue articular o
conhecimento das ocupações humanas, que são todas as atividades ligadas ao
autocuidado, trabalho e lazer, com as perspectivas e demandas tanto individuais, como
coletivas nas diversas etapas do ciclo vital e nos diferentes níveis e áreas de atenção à
saúde.
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Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
314
PROGRAMA DE EDUCAÇÃO PELO TRABALHO PARA SAÚDE (PET-
SAÚDE) COMO FACILITADOR PARA IMPLEMENTAÇÃO DE
METODOLOGIAS ATIVAS NO CURSO DE GRADUAÇÃO EM TERAPIA
OCUPACIONAL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
DERIVAN BRITO DA SILVA1
REGINA CÉLIA TITOTTO CASTANHARO2
RITA APARECIDA BERNARDI PEREIRA3
ALESSANDRO RODRIGO PEDROSO TOMASI1
RESUMO
Introdução e justificativa: O PET-SAÚDE é uma parceria entre o Ministério da Saúde
e o Ministério da Educação. Ele visa ao aperfeiçoamento e especialização dos serviços
de Atenção Básica em Saúde e tem como fio condutor a integração ensino, serviço e
comunidade. Docentes da graduação em Terapia Ocupacional da UFPR têm buscado
inovações em seus procedimentos didáticos para transcender ao método tradicional de
ensino. Justifica-se este trabalho pela necessidade de divulgação de experiências de
reorientação na formação em Terapia Ocupacional. Objetivo: Divulgar experiências na
implementação de metodologias ativas em disciplinas da graduação em Terapia
Ocupacional a partir do PET-SAÚDE. Materiais e Métodos: Os docentes responsáveis
pela disciplina de Terapia Ocupacional Aplicada à Atenção Básica, monitores,
preceptores e tutores articularam-se aos docentes das disciplinas de Terapia
Ocupacional Aplicada à Saúde Mental, à Neurologia, à Ortopedia e à Saúde do
Trabalhador. Foi utilizada a Metodologia da Problematização com as cinco etapas do
Arco de Maguerez: Observação da Realidade; Identificação dos Problemas/Pontos-
Chave; Teorização; Hipóteses de Solução - Planejamento; Aplicação - Execução da
Ação. Resultados e Discussão. Foram e estão sendo realizadas atividades de ensino,
extensão e pesquisas em Unidades de Saúde da Família. Nessas atividades articulam-se
conhecimentos relativos ao Sistema Único de Saúde e ao processo de avaliação e
intervenção em Terapia Ocupacional. Observou-se que, ao mesmo tempo em que o
PET-SAÚDE propicia a implementação de metodologias ativas, estas facilitam o
desenvolvimento das ações previstas nesse programa. O PET-SAÚDE e as
metodologias ativas favorecem a formação generalista/holística com práticas formativas
1 Prof. Ms. do Curso de Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Paraná – UFPR [email protected] 2 Prof.ª mestranda do Curso de Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Paraná – UFPR 3 Prof.ª Ms. do Curso de Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Paraná – UFPR
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contextualizadas e reflexivas.
PALAVRAS-CHAVE: Terapia Ocupacional, Educação Profissionalizante, Programas
Governamentais, Atenção Básica à Saúde; Educação em Saúde; Prospecto para
Educação de Pacientes.
INTRODUÇÃO
As metodologias de ensino-aprendizagem têm sido tema de debates entre docentes,
estudantes, gestores da educação e pesquisadores que se ocupam da investigação acerca
do processo de formação profissional. As conclusões desses debates apontam para a
necessidade de transcender ao modelo tradicional de ensino. Nessa perspectiva surgem
as metodologias ativas como um caminho a ser explorado e trilhado em sua diversidade
teórica e prática.
O processo de formação de terapeutas ocupacionais no Brasil teve seu início em 1957.
O primeiro curso de Terapia Ocupacional foi instalado na Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo em uma concepção dominante de profissão paramédica. Em
1964 o curso foi regulamentado e em 1969 foi reconhecido como de nível superior. A
partir da oficialização da profissão em 1971, foram criados cursos de graduação que,
atualmente, têm duração de quatro a cinco anos (MEDEIROS, 2003).
Desde a criação dos primeiros cursos de formação de terapeutas ocupacionais,
coordenadores de cursos, professores, estudantes e demais envolvidos nesse processo
formativo vêm efetivando as transformações necessárias à formação crítica e reflexiva.
Nesse cenário, surgiram as críticas ao modelo tradicional de ensino – paradigma
flexneriano – que, conforme Abreu (2009) influenciou a formação médica no Brasil.
Acreditamos que tal modelo também influenciou o processo formativo em Terapia
Ocupacional. Como exemplo dessa influência, podemos citar a criação de disciplinas na
estrutura curricular de cursos de graduação que denotam uma dependência das
especialidades médicas para aplicabilidade da especificidade da profissão, levando a
concepções acerca da intervenção do terapeuta ocupacional vinculada apenas às ações
de tratamento e/ou reabilitação de disfunções/patologias.
1 Prof. Esp. do Curso de Terapia Ocupacional da Universidade Federal do Paraná – UFPR
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Nas últimas décadas, os formadores de terapeutas ocupacionais aceitaram o desafio de
transcender ao modelo de formação centrada no modelo biomédico. Assim, entre outros
aspectos, as estratégias de ensino têm ocupado o centro de debates em eventos que
envolvem docentes, estudantes, gestores da educação. Como resultado desses debates
têm sido propostas inovações no processo de formação profissional em Terapia
Ocupacional.
Docentes do curso de graduação em Terapia Ocupacional da Universidade Federal do
Paraná (UFPR), em busca de inovações em seus procedimentos didáticos para
transcender ao método tradicional de ensino, aderiram ao Programa de Educação pelo
Trabalho para Saúde (PET-Saúde). Este programa é uma parceria do Ministério da
Saúde e do Ministério da Educação que visa ao aperfeiçoamento e especialização dos
serviços de Atenção Básica em Saúde tendo como fio condutor a integração ensino,
serviço e comunidade (BRASIL, 2008) para o aperfeiçoamento da Estratégia de Saúde
da Família1. Justifica-se este trabalho pela necessidade de divulgação de experiências de
reorientação na formação em Terapia Ocupacional.
Seu objetivo é divulgar experiências na implementação de metodologias ativas em
disciplinas do curso de graduação em Terapia Ocupacional da UFPR, a partir do PET-
Saúde.
MATERIAIS E MÉTODOS
Os docentes responsáveis pela disciplina de Terapia Ocupacional Aplicada à Atenção
Básica, monitores, preceptores e tutores se articularam com os docentes das disciplinas
de Terapia Ocupacional Aplicada à Saúde Mental, à Neurologia, à Ortopedia e à Saúde
1 É uma estratégia direcionada a reorientar o modelo assistencial a partir da atenção básica à saúde com
oferta de assistência integral às necessidades de saúde da população adscrita. Nesse sentido, elege a
família e seu espaço social como núcleo básico da abordagem no atendimento à saúde, busca humanizar
as práticas em saúde e contribuir com o reconhecimento da saúde como direito de cidadania e estimular a
organização da população para efetivação do controle social. O objetivo dessa estratégia é fortalecer a
atenção básica como primeiro nível de atenção à saúde no SUS e ampliação do acesso, construindo um
cuidado centrado no modelo de promoção à saúde, sem prejuízo das ações inerentes à prevenção,
assistência e reabilitação (BRASIL, 2009).
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do Trabalhador para o planejamento de ações pedagógicas e assistenciais preconizadas
pelo PET-Saúde.
Durante a organização e execução das atividades pedagógicas e assistenciais foi
utilizada a Metodologia da Problematização com as cinco etapas do Método do Arco de
Maguerez: Observação da Realidade; Identificação dos Problemas-Pontos-chaves;
Teorização; Hipóteses de Solução – Planejamento; Aplicação – Execução da Ação
(BERBEL, 1998; MORAES; BERBEL, 2006; MITRE et al., 2008). Em suma, as ações
das disciplinas de Terapia Ocupacional Aplicada ocorreram da seguinte forma:
Na primeira etapa – Observação da Realidade –, os estudantes foram a campo para
desenvolver ações de reconhecimento e mapeamento da área de abrangência da Unidade
Municipal de Saúde (UMS); na segunda etapa – Identificação dos Problemas-Pontos-
Chaves –, monitores, estudantes e docentes retornaram à sala de aula a fim de
identificar quais os problemas existentes e quais eram os mais relevantes – demandas;
na terceira etapa – Teorização – em sequência às discussões, os estudantes, separados
em subgrupos, recorreram à bibliografia disponível, buscando referenciais teóricos para
as demandas observadas em campo; na quarta etapa – Hipóteses de Solução –
Planejamento –, a partir das demandas observadas e da composição do referencial
teórico, monitores, estudantes e docentes reuniram-se novamente em sala de aula e
propuseram hipóteses de solução para os problemas apresentados. Essas hipóteses
foram discutidas e aprimoradas, com sugestões dos docentes e dos outros subgrupos de
estudantes da turma, compondo uma apresentação em formato de seminário para
socialização da produção do conhecimento; na quinta etapa – Aplicação - Execução da
Ação –, monitores, preceptores, tutora, estudantes e docentes retornaram ao território e
executaram as ações. Posteriormente, em sala de aula, foram apresentadas, em forma de
seminário, a implementação das ações e como elas poderiam ter seus resultados
avaliados.
As ações pedagógicas e assistenciais foram planejadas e implementadas tendo como
território a ser problematizado uma UMS de Curitiba e uma UMS do município de
Colombo – Região Metropolitana de Curitiba-PR.
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Atualmente, a rede própria municipal de saúde de Curitiba é composta por nove
Distritos Sanitários contendo 133 Equipamentos de Saúde, sendo 51 Unidades Básicas
de Saúde, 52 Unidades Básicas com Estratégia de Saúde da Família, 11 Unidades de
Saúde Complexas, 9 Centros de Atendimento Psicossocial - CAPS, 8 Centros
Municipais de Urgências Médicas - CMUMs, um Hospital geral e maternidade (Centro
Médico Comunitário Bairro Novo) e um Laboratório de Análises Clínicas. Existem
ainda 135 equipes de Saúde da Família, 1.097 Agentes Comunitários e um corpo
funcional com 6.394 servidores (CURITIBA, 2009). A Secretaria Municipal de Saúde
(SMS) de Curitiba apresenta também um sistema abrangente de informação, em todos
os serviços do SUS, o que inclui os sistemas informatizados de exigência nacional e,
nos serviços próprios, o prontuário eletrônico (CURITIBA, 2009).
A Unidade Municipal de Saúde (UMS) pertencente ao município de Curitiba está
organizada para atuar de acordo com Estratégia de Saúde da Família. Esta USF tem 10
anos de conquistas nas propostas da estratégia da saúde da família. O território é da
responsabilidade de 4 (quatro) equipes de saúde da família ampliadas (inclui equipe de
saúde bucal), contando com 13 microáreas. Esta UMS conta com apoio de profissionais
do Núcleo de Apoio à Atenção Primária de Saúde (NAAPS)1. Observam-se no território
desta UMS contextos de vulnerabilidade social, incidência de Transtornos Mentais e
Dependência Química, Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) e Diabetes Mellitus (DM).
Ressalta-se que esta unidade possui um grande número de idosos com condições de
saúde características do processo de envelhecimento, como por exemplo, demência tipo
Alzheimer.
Até o presente momento o profissional de Terapia Ocupacional se insere na UMS
através de Convênio da UFPR com a Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba, para o
desenvolvimento de atividades pedagógicas e assistenciais (docente/supervisor). Desde
2008 recebe estudantes do curso de Terapia Ocupacional da UFPR na disciplina de
Estágio Supervisionado em Terapia Ocupacional, nas modalidades de observação e de
1 Estes núcleos foram criados pela Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba e são similares aos Núcleos
de Apoio à Saúde da Família (NASF) propostos pelo Ministério da Saúde, diferenciando-se por oferecer
suporte às Unidades Básicas de Saúde que não atuam no contexto da Estratégia de Saúde da Família.
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prática. A partir da adesão do curso de graduação em Terapia ocupacional da UFPR ao
PET-Saúde, a UMS passou a receber estudantes do referido curso de graduação
matriculados em outras disciplinas que não relacionadas a estágios profissionalizantes
para o desenvolvimento de atividades de ensino, pesquisa e extensão relacionadas à
Atenção Básica à Saúde no contexto da Estratégia de Saúde da Família.
Outro município que efetivou parceria com a UFPR para o desenvolvimento das ações
do PET-Saúde é o de Colombo-PR. A rede de Atenção Básica à Saúde conta com 20
UMS (PARANÁ, 2009). Foi selecionada para receber as ações do PET-Saúde a UMS
Jardim das Graças que está organizada para atuar de acordo com Estratégia de Saúde da
Família. Além dos profissionais que compõem as equipes de saúde da família, esta
UMS conta com o apoio de profissionais da área de psicologia, farmácia e nutrição.
Desenvolve, entre outras, ações de saúde relativas aos seguintes programas: o Programa
de Hipertensão Arterial Sistêmica (Hiperdia), Saúde Materno-Infantil (Puericultura),
Planejamento Familiar. O município está em fase de implantação dos Núcleos de Apoio
à Saúde da Família.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram realizadas atividades de ensino, extensão e pesquisa em Unidades de Saúde da
Família, tanto na UMS do município de Curitiba quanto na de Colombo-PR. Nessas
atividades articularam-se conhecimentos relativos ao Sistema Único de Saúde e ao
Processo de Avaliação e Intervenção em Terapia Ocupacional das disciplinas
envolvidas, em diferentes cenários da atuação profissional inseridos na Atenção Básica
à Saúde. Para operacionalização das atividades foram selecionados os estudantes do 5º
período do curso (1º semestre/2009) que no 2º semestre/2009 estariam no 6º período.
Essa turma foi dividida em dois grupos de 15 estudantes, cada um direcionado para o
desenvolvimento das atividades em um dos municípios.
No município de Curitiba no primeiro semestre de 2009, por meio das disciplinas de
Terapia Ocupacional Aplicada à Saúde Mental, à Ortopedia e Reumatologia e à
Neurologia, estudantes e professores realizaram ações de reconhecimento do território
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de uma das áreas de atuação da Equipe de Saúde da Família da UMS, problematizaram
as demandas observadas no território e um dos pontos críticos identificados foi a
necessidade de ações interdisciplinares junto às Agentes Comunitárias de Saúde (ACS).
Este ponto crítico apontava para a falta de compreensão de demandas para o Serviço de
Terapia Ocupacional e, consequentemente, dificuldades na realização de
encaminhamentos de usuários ao serviço. Tal problemática foi objeto de estudo em sala
de aula, contando com a participação da tutora, monitores, alunos não-bolsistas,
docentes e demais estudantes envolvidos nas três disciplinas.
O grupo de estudantes foi dividido em três subgrupos temáticos de acordo com as
disciplinas envolvidas. Cada grupo ficou responsável pelas ações a serem desenvolvidas
no território. Após a estruturação das ações, elas foram apresentadas ao grupo de ACS
da UMS como forma de levá-lo a compreender as demandas do território que possuíam
articulação com o serviço de Terapia Ocupacional e facilitar futuros encaminhamentos
de usuários a esse serviço. Houve participação ativa das ACS no processo desenvolvido
e os estudantes puderam observar as necessidades imediatas do território.
No segundo semestre de 2009, por meio da aplicação, pelas monitoras, tutora e
preceptora do PET-Saúde, de um questionário para identificação do perfil
epidemiológico da área, foram identificadas demandas de sobrecarga de trabalho no
desempenho ocupacional de cuidadores de idosos e crianças, idosos com risco de
acidentes domiciliares (quedas) e a dificuldade no gerenciamento da saúde por parte de
usuários com agravos à saúde decorrentes da Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) e
Diabetes Mellitus (DM) e também sobrecarga no desempenho ocupacional das ACS
causada pela rotina de trabalho.
Essas demandas foram problematizadas junto às disciplinas de Terapia Ocupacional
Aplicada à Saúde Coletiva e à Saúde do Trabalhador. O mesmo grupo de estudantes
retornou ao mesmo território sendo organizado em quatro subgrupos que, juntamente
com as monitora do PET-Saúde, realizaram visitas domiciliares específicas aos
domicílios dos usuários previamente identificados. Foram realizadas entrevistas
semiestruturadas, os dados foram analisados e com base neles foram programadas as
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ações. No retorno novamente ao território os estudantes realizaram as ações que
incluíram: ação educativa para a prevenção de quedas em idosos no domicílio,
orientação a cuidadores de crianças e idosos (sobrecarga da rotina dos cuidadores),
orientações para o gerenciamento da saúde e hábitos saudáveis para usuários com HAS
e DM.
Vale ressaltar que a disciplina de Terapia Ocupacional Aplicada à Saúde do Trabalhador
deu continuidade às ações com as ACS, porém voltadas para as demandas de sobrecarga
no desempenho ocupacional dessas profissionais, utilizando o Protocolo SF 36, que
avalia a qualidade de vida. Após aplicação e análise dos dados do Protocolo SF 36,
foram realizadas orientações de adequações posturais, bem como para a realização de
exercícios de relaxamento.
Como produção científica no ano de 2009, o PET-Saúde Curitiba apresentou dois
trabalhos em formato Pôster no Encontro de Atividades Formativas (ENAF) da UFPR.
Em 2010 o trabalho resultante das ações dos estudantes foi apresentado no IV
Congresso Paranaense de Terapia Ocupacional em forma de apresentação oral e pôster
(pesquisa das monitoras e alunas não-bolsistas). Esta pesquisa também foi apresentada
no Seminário da Secretaria de Gestão do Trabalho e Educação em Saúde. Essas
produções científicas também foram aprovadas para apresentação em formato pôster no
ENAF-2010 da UFPR.
No município de Colombo-PR as ações foram desenvolvidas pelos estudantes,
docentes, preceptora e tutora do PET-Saúde na UMS Jardim das Graças. No primeiro
semestre de 2009 os estudantes desenvolveram ações sob supervisão dos docentes das
disciplinas de Terapia Ocupacional Aplicada à Neurologia, à Ortopedia e Reumatologia
e à Saúde Mental. Inicialmente as monitoras e preceptora investigaram quais eram as
demandas do território e juntamente com o docente responsável pela disciplina Terapia
Ocupacional Aplicada à Saúde Coletiva, buscaram problematizar essas demandas junto
aos estudantes e docentes das disciplinas de Terapia Ocupacional Aplicada acima
relacionadas.
O grupo de estudantes foi dividido em três subgrupos temáticos. O acesso de usuários
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com problemas de locomoção (quadros neurológicos) à UMS Jardim das Graças,
problemas ortopédicos e reumatológicos (dores articulares) e transtorno mental
(abordagem do ACS) foram os objetos de estudo de monitores, preceptor, estudantes e
docentes para elaboração de ações a serem executadas no território. Nas aulas das
disciplinas destinadas ao PET-Saúde, os atores envolvidos planejaram essas ações e
cada subgrupo apresentou-as para todos os envolvidos. As ações envolveram: visita
domiciliar acompanhada por ACS, ações de educação em saúde para usuários com
queixas de dores articulares com a participação dos ACS e roda de conversa com ACS
com os temas “O que é transtorno mental? O que posso fazer? Qual a contribuição do
terapeuta ocupacional na Atenção Básica à Saúde-comunidade?”
No segundo semestre de 2009, as ações desenvolvidas foram relacionadas às disciplinas
de Terapia Ocupacional aplicada à Saúde Coletiva e à Saúde do Trabalhador. Nessas
ações, os mesmos estudantes, sob supervisão dos docentes responsáveis pelas
disciplinas, realizaram visita ao território da UMS Jardim das Graças na qual, com o
auxílio das monitoras do PET-Saúde, reconheceram como problemática do território a
falta de adesão dos usuários com transtornos mentais aos serviços de saúde ofertados
pela UMS1 e o processo de trabalho das Agentes Comunitárias de Saúde (ACS)
2.
Em sala de aula, após discussões, monitores, estudantes e docentes, propuseram duas
ações diferenciadas, como hipóteses de solução. A primeira ação se deu junto à equipe
da UMS, em formato de Roda de Conversa, que ocorreu com data e hora previamente
marcadas. A ação abordou o tema “Acolhimento” e teve como produtos principais o
enriquecimento teórico da equipe em relação ao tema e a elaboração e construção de um
cartaz, que foi fixado na parede da UMS. A segunda ação se deu junto aos usuários com
transtornos mentais da área de abrangência da UMS. Foram elaborados materiais
informativos sobre os programas disponíveis na Unidade e um ímã de geladeira
contendo os telefones da UMS e da Ouvidoria do SUS.
Quanto às ações da Disciplina de Terapia Ocupacional Aplicada à Saúde do
1 Ação desenvolvida pela Disciplina de Terapia Ocupacional aplicada à Saúde Coletiva. 2 Ação desenvolvida pela Disciplina de Terapia Ocupacional aplicada à Saúde do Trabalhador.
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Trabalhador, estudantes acompanhados das docentes responsáveis pela disciplina e das
monitoras, aplicaram junto aos ACS o Protocolo de Avaliação SF-36. Posteriormente,
retornaram ao território a fim de orientar esses profissionais sobre sua qualidade de
vida.
Quanto às atividades de extensão desenvolvidas pelas monitoras do PET-Saúde no
município de Colombo por meio da permanência semanal no campo de atuação, as
monitoras bolsistas e não-bolsistas oportunizaram a organização e implementação de
ações das disciplinas envolvidas no Programa, bem como o desenvolvimento de ações
junto à equipe da UMS Jardim das Graças, no sentido de contribuir na organização do
processo de trabalho. Há que se ressaltar que essas ações, além de incrementar o leque
teórico das monitoras para uma atuação mais eficaz no contexto da Atenção Básica à
Saúde, promoveram o reconhecimento da Terapia Ocupacional e, consequentemente, do
terapeuta ocupacional como uma profissão/um profissional de extrema relevância para
as práticas de saúde nesse contexto, o que pode ser concretamente observado com a
contratação de duas ex-monitoras do Programa para a prestação de serviços em
equipamentos de saúde (Centro de Atenção Psicossocial) da Prefeitura Municipal de
Colombo.
Como fruto do trabalho desenvolvido, a produção científica correspondente ao período
gerou a publicação de trabalhos no XI Congresso de Terapia Ocupacional na forma de
pôsteres e apresentação oral, no IV Congresso Paranaense de Terapia Ocupacional na
forma de pôsteres e apresentação oral e no 9.° Congresso da Rede Unida, na forma de
pôsteres, palestrante em roda de conversa e publicação de um trabalho completo. Além
dos trabalhos apresentados em eventos científicos estão em andamento duas pesquisas
(Trabalho de Conclusão de Curso) e elaboração da apresentação de trabalho enviado e
aprovado para o Evento de Iniciação Científica (EVINCI-2010) da UFPR.
No 1° semestre de 2010, devido à finalização do prazo de um ano previsto no edital do
PET-Saúde, as ações foram direcionadas no sentido de finalizar o que se havia proposto
para a vigência 2009-2010. Visto que o PET-Saúde terá continuidade, também nesse
mesmo semestre ocorreu uma sensibilização dos estudantes do curso de graduação em
Terapia Ocupacional da UFPR para participarem do programa. Como exemplo dessa
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sensibilização tem-se a ação realizada durante a Disciplina de Terapia Ocupacional
Aplicada à Saúde Mental, no sentido de expor e debater os desafios e possibilidades
propostos pelo Programa, em um novo período de vigência (2010-2012) e estruturação
do cronograma de atividades.
A partir das experiências relatadas e de achados na literatura, percebe-se uma
convergência para a necessidade de levar os estudantes a utilizarem estratégias de
resolução de problemas do cotidiano profissional. As discussões em torno das
metodologias de ensino baseada em problemas se constituem em temas de debates.
Muitas vezes as discussões levam a contradições que geram resistências para se avançar
no planejamento e implementação de procedimentos didáticos que realmente tornem o
processo ensino-aprendizagem desafiador, reflexivo e significativo para os atores
envolvidos.
Nesse sentido, Zanotto e De Rose (2003) investigaram na literatura as metodologias de
ensino com foco na resolução de problemas ou problematização e concluíram que tais
metodologias estão calcadas no trinômio problema-explicação-solução. Ou seja,
independente de fases, etapas e passos, nessas metodologias o estudante “deve
relacionar três momentos ou movimentos: identificação de um problema, busca de
fatores explicativos e proposição de solução ou soluções” (ZANOTTO e DE ROSE,
2003. Para essas autoras a diferença entre essas metodologias está no papel que cada
uma atribui ao sujeito que realiza a ação. Assim, dos princípios e características que
devem estar presentes em propostas de formação voltadas para a ação de problematizar,
apontadas por elas, destacamos: ênfase no aprender a problematizar – problema-
explicação-solução; ênfase no sujeito ativo; ter a noção de problema tomada no sentido
da reflexão filosófica (não sei/preciso saber); considerar a práxis (realidade de quem
problematiza); a aquisição de estratégias de aprendizagem (contexto real); visar à
mudança conceitual.
Durante as experiências do PET-Saúde observamos que guiar o processo ensino-
aprendizagem a partir da problematização facilitou o desenvolvimento de habilidades
para a atuação no contexto da Atenção Básica à Saúde, de acordo com as necessidades,
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potencialidades e limitações tanto do território (comunidade e serviço de saúde) em
questão quanto da Instituição Superior de Ensino (estudantes, monitores, docentes e
tutores).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nota-se que os atores do processo de formação em Terapia Ocupacional aceitaram e se
engajaram em estratégias de ensino que visam transcender o modelo de formação
centrada no modelo biomédico. Nota-se que, transcender ao modelo biomédico no
processo formativo, entre outros aspectos, implica no mínimo uma (re)estruturação
curricular e metodológica capaz de caracterizar o terapeuta ocupacional como
profissional da saúde com autonomia em seu processo de intervenção no campo da
saúde, educação e social, como preconizado pelas Diretrizes Curriculares Nacionais dos
Cursos de Graduação em Terapia Ocupacional. Essa (re)estruturação também deve
apontar estratégias para a formação de profissionais capazes de responder à demanda
social por assistência multidimensional (de saúde, de educação e social) da população
brasileira. Entendendo que esse processo formativo e de (re)conhecimento do terapeuta
ocupacional não está isento do embate epistemológico e social, visto se constituir em
uma intervenção social com base em valorações acerca do homem, da sociedade e do
processo saúde/doença (MEDEIROS, 2003).
Observou-se que, ao mesmo tempo em que o PET-Saúde propicia a implementação de
metodologias ativas, elas facilitam o desenvolvimento das ações previstas neste
programa. O PET-Saúde e as metodologias ativas favorecem a formação
generalista/holística com práticas formativas contextualizadas e reflexivas.
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ativas: necessidades pedagógicas do Professores e da estrutura das escolas. 2009.105 p.
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de uma experiência de formação contínua Educação e Pesquisa. Revista Educação e
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CONTRIBUIÇÃO DA MOSTRA DAS PROFISSÕES PARA O ONHECIMENTO
SOBRE TERAPIA OCUPACIONAL PARA ESTUDANTES DO ENSINO
MÉDIO1
ALESSANDRA C. DE PAOLI2
BÁRBARA G. SALLES2
DIEGO E.R.G. ALMEIDA3
FLORA P. GUERRA2
ISABELLA F. SILVEIRA3
MAÍRA P. SANTOS4
NATHÁLIA G.C. ARAÚJO3
PAOLA M.R. OLIVEIRA3
PRISCILA A.C. VALADÃO3
WALTER L.T. ALVES3
RÚBIA M. PYLÓ2
MÁRCIA BASTOS REZENDE5
RESUMO
A UFMG promove anualmente a “Mostra das Profissões”, para receber estudantes do
ensino médio da capital e de várias partes do estado para informá-los sobre os cursos e
profissões em uma Sala Interativa e promovendo palestras. A Sala Interativa do curso
de Terapia Ocupacional é preparada com pôsteres informativos, equipamentos e
recursos comumente utilizados nas intervenções terapêuticas. Estudantes de graduação
recebem os visitantes apresentando o material ali exposto. A escolha profissional é uma
das decisões mais importantes na vida do indivíduo. Para facilitar, o jovem deve ser
informado sobre a realidade profissional, o mercado de trabalho e o curso de graduação
de seu interesse. O objetivo deste trabalho foi verificar se a Sala Interativa contribui
para o conhecimento sobre Terapia Ocupacional. 10% dos visitantes da Sala Interativa
foram convidados a responder um questionário estruturado construído pelos
pesquisadores. A pesquisa foi aprovada pelo COEP-UFMG. Aderiram ao estudo
1 Pesquisa apoiada pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC), Secretaria de Educação Superior
(SESu) no Programa de Educação Tutorial (PET). 2 Ex-bolsistas do MEC/SESu no PET-Terapia Ocupacional, graduadas em Terapia Ocupacional, UFMG. 3 Bolsistas do MEC/SESu no PET-Terapia Ocupacional, graduandos em Terapia Ocupacional, UFMG. 4 Ex-bolsistas do MEC/SESu no PET-Terapia Ocupacional, graduandas em Terapia Ocupacional, UFMG. 5 Profª Drª do Departamento de Terapia Ocupacional da UFMG e tutora do PET - Terapia Ocupacional
(PET – TO) na UFMG, bolsista MEC/SESu [email protected].
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
328
voluntariamente 33% dos convidados e assinaram o TCLE. Destes, 36% avaliaram seu
conhecimento sobre a Terapia Ocupacional como “muito pouco”, antes da sua
participação na sala interativa e 55% avaliaram-no como “muito bom” depois de sua
participação. A maioria absoluta dos entrevistados informou que os recursos utilizados
colaboraram “muito” para a construção do conhecimento sobre a profissão. E
destacaram o “contato com os estudantes do curso” (81%). Os resultados mostram que a
visita à Sala Interativa favorece a construção do conhecimento sobre a Terapia
Ocupacional e que os recursos utilizados nesse espaço atingem os objetivos da Mostra
de Profissões.
PALAVRAS-CHAVE: Escolha de Profissão, Terapia Ocupacional, Graduação.
INTRODUÇÃO
A escolha profissional é uma das decisões mais importantes que o indivíduo deve tomar
na adolescência, podendo estar associada, de diversas maneiras, ao desenvolvimento da
identidade pessoal. O fim do Ensino Médio intensifica a busca dos jovens por uma
carreira, pois este é o momento de ingresso na Universidade e/ou no mercado de
trabalho e existe uma grande expectativa para a definição da escolha profissional
(SANTOS, 2005; SPARTA e GOMES, 2005; TUPINAMBÁ, 2005). Tal escolha pode
gerar ansiedade e angústia que transcendem a própria pessoa, por envolver interesses,
aspirações e medos, exigências familiares, sociais e do mercado de trabalho (SILVA,
NOCE e ANDRADE, 2003; MARTINS, 2008).
Um dos fatores críticos para a decisão consiste no autoconhecimento e no conhecimento
das profissões, e em outros fatores referentes à habilidade individual para a realização
de escolhas (HIRSCHI & LÄGE 2008). É essencial, para facilitar sua escolha
profissional, que o jovem possa ter acesso ao máximo de informações possíveis sobre a
realidade profissional, o mercado de trabalho e os cursos de graduação de seu interesse
(MARTINS, 2008). Dessa forma, para auxiliar nesse processo, os estudantes buscam se
informar em diversas fontes, como: publicações do governo, eventos informativos na
escola, sites da internet e universidades, em especial nos dias em que elas promovem
uma mostra de seus cursos (ALLOWAY et al., 2004).
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
329
Entretanto, os estudos nacionais têm mostrado um padrão pobre de exploração por parte
dos jovens acerca do mundo do trabalho e sobre si próprios, com busca pouco
sistemática de informações. Estudo brasileiro com estudantes de baixa renda confirma
esta constatação, revelando que a maior parte dos participantes do estudo aponta ter
pouca informação sobre “o processo de escolha” (46,7%), “as profissões” (46,7%), “a
vida universitária” (51,7%), “o ensino superior” (51,7%) e “o mercado de trabalho”
(43,3%). Tal carência de informação pode levar a uma escolha não pautada por um
projeto profissional consistente, baseada em informações estereotipadas do senso
comum. Já, quanto ao “vestibular”, uma parte significativa dos estudantes deste estudo
relatou ter quantidade suficiente de informação (41,7%). Esta discrepância parece
revelar uma tendência que vem sendo discutida na literatura nacional, de que a
preparação para o vestibular tem se tornado mais relevante do que a construção do
projeto profissional (SPARTA, BARDAGI E ANDRADE, 2005), o que reforça a
necessidade de orientação dos jovens sobre as possibilidades de trabalho. Pesquisa feita
em 2003 com universitários que já haviam cursado metade do curso de graduação
mostrou que 66,3% dos motivos de insatisfação apontados pelos estudantes estavam
relacionados ao mercado e às condições do curso de graduação. As autoras consideram
que essas pessoas talvez estivessem mal informadas a respeito do curso escolhido e suas
possibilidades, ou estivessem depositando expectativas irreais na formação recebida ou
no mercado de trabalho (BARDAGI, LASSANCE e PARADISO, 2003), o que ressalta
novamente a importância da informação para a escolha profissional.
Considerando os aspectos citados, que apontam para a relevância da escolha
profissional para a vida das pessoas, destaca-se o papel social das instituições de ensino
ao fornecer subsídios para facilitar a realização dessa escolha pelos indivíduos.
Considerando estes aspectos, diversas universidades promovem um evento que leva os
estudantes do Ensino Médio para o ambiente universitário, informando-os sobre os
diversos cursos e profissões. A Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-
MG), por exemplo, realiza a “PUC Aberta” anualmente, que se mostrou como uma ação
efetiva. Uma pesquisa realizada indicou que houve 85,97% de alcance de expectativas e
82,27% de contribuição do programa para a decisão da escolha profissional
(CAMARGO, 2005).
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
330
Em 2004, a Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD) e a Comissão Permanente de
Vestibular (COPEVE) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) criaram a
Mostra de Profissões com o objetivo de contribuir para que a escolha profissional do
estudante fosse mais consciente e segura e ainda “ampliar sua visão e perspectivas em
relação à universidade e aos diversos campos profissionais”. Entre as atividades atuais
oferecidas na Mostra estão as Salas Interativas, local onde os estudantes têm um
contato mais direto e prolongado com professores e graduandos dos cursos, por meio de
atividades interativas e demonstrações sobre as possibilidades dos cursos e profissões.
Desde 2008, os discentes do Programa de Educação Tutorial (PET) da Terapia
Ocupacional (TO) participam da Mostra de Profissões da UFMG, fazendo uma parceria
com o Colegiado de graduação do curso na Sala Interativa. O PET-TO ajuda na escolha
da fundamentação teórica que sustenta as ações nesse espaço, colabora com o
treinamento de outros alunos bolsistas e voluntários, colabora com a montagem da Sala
Interativa e participa da recepção aos visitantes oferecendo as informações solicitadas.
As estratégias incluem a apresentação de mural com fotografias, demonstrando
intervenções de Terapia Ocupacional, painéis explicativos com textos explicitando as
diretrizes, conceitos da profissão e áreas de atuação, contato com estudantes do curso,
vivências nas quais o estudante é convidado a realizar atividades que simulem a perda
de alguma habilidade física ou sensorial, para vivenciar as dificuldades de pessoas
incapacitadas, além da exposição de utensílios adaptados ou desenvolvidos para auxiliar
pessoas com dificuldades em realizar suas atividades do cotidiano.
Algumas dessas atividades foram incorporadas à sala a partir da edição da Mostra das
Profissões UFMG 2008, com o objetivo de esclarecer/informar melhor os indivíduos
sobre a profissão, auxiliando assim na escolha profissional. Como ocorre em workshops
de orientação vocacional realizados na Austrália e nos Estados Unidos, mais do que
utilizar uma metodologia didática, procura-se enfatizar atividades experimentais que
envolvam os estudantes. Como aponta a pesquisa de Buikstra, Eley e Hindmarsh
(2007), esses workshops têm se mostrado ferramentas capazes de influenciar a escolha
dos estudantes, provendo informação suficiente para levar a um planejamento mais
informado e realista sobre o futuro.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
331
Entretanto a questão é: Seriam essas estratégias eficazes para o esclarecimento sobre a
profissão para os visitantes da Mostra de Profissões na Sala Interativa? Este estudo,
então, pretende avaliar se a Mostra das Profissões da UFMG contribui para a construção
do conhecimento sobre Terapia Ocupacional para os estudantes do Ensino Médio.
METODOLOGIA
A amostra contou com estudantes do Ensino Médio provindos de escolas públicas ou
particulares e estudantes de cursos pré-vestibulares, que visitaram a Sala Interativa da
Terapia Ocupacional na Mostra das Profissões da UFMG. A coleta de dados ocorreu
durante o evento, em abril de 2010, durante todo o período aberto à visitação.
A escolha dos participantes da pesquisa baseou-se no seguinte critério: a cada dez
visitantes que saíssem da Sala Interativa de Terapia Ocupacional, o décimo seria
convidado a responder de forma voluntária o questionário elaborado pelos
pesquisadores. Essa estratégia tornou possível a participação de pelo menos 10% dos
visitantes da Sala Interativa de Terapia Ocupacional da Mostra das Profissões da
UFMG. Todos os participantes preencheram o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE). Caso o participante fosse menor de 18 anos, recebia também o
TCLE para ser entregue a seus pais ou responsáveis, juntamente com um envelope
selado, solicitando que o participante o enviasse aos pesquisadores pelo correio,
assinado pelos pais ou responsáveis.
Caso o décimo visitante convidado não preenchesse os critérios de inclusão, o mesmo
seria descartado e o próximo visitante a deixar a Sala Interativa seria convidado a
participar da pesquisa.
Utilizou-se um questionário com sete questões estruturadas, construído pelos
pesquisadores, cujas respostas foram graduadas em cinco pontos. Esse questionário
objetivou averiguar o conhecimento dos estudantes a respeito da Terapia Ocupacional
após a visita à Sala Interativa, além de avaliar os recursos utilizados nessa sala para
viabilizar a transmissão do conhecimento acerca da profissão. A análise de dados foi
descritiva.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
332
RESULTADOS
A Sala Interativa de Terapia Ocupacional contou com cerca de 1.280 visitantes, durante
três dias. Destes, 128 (10%) foram convidados a preencherem o questionário, dos quais
114 (89%) aceitaram participar voluntariamente da pesquisa e assinaram o TCLE,
havendo 14 (11%) recusas (Gráfico 1). A maior parte dos questionários respondidos foi
inutilizada (72) devido à falta do retorno do TCLE assinado pelos pais ou responsáveis.
Dentre os voluntários, apenas 4% consideravam seu conhecimento sobre Terapia
Ocupacional antes de participarem da Sala Interativa “muito bom”. A maior parte
considerava seu conhecimento como “nenhum” (26%) ou “muito pouco” (36%). Após
sua participação, 55% dos estudantes passaram a considerar como ”muito bom” seu
conhecimento sobre Terapia Ocupacional e nenhum dos participantes apontou que seu
conhecimento tivesse sido “nenhum” ou “muito pouco”.
Foi solicitado que os entrevistados avaliassem os diversos recursos disponíveis na Sala
Interativa (TABELA 1).
Recursos Objetivo
Mural de fotos Apresentar através de imagens fotográficas as possibilidades de
intervenção em Terapia Ocupacional relacionadas às áreas de
desempenho: trabalho, escola, brincar, lazer, participação social,
atividades de vida diária e atividades instrumentais de vida diária
Painéis explicativos Sintetizar aspectos relativos às áreas de desempenho ocupacional
Contato com estudantes
Possibilitar o diálogo com estudantes do curso, voluntários ou
bolsistas que apresentam o curso de graduação e a aspectos
Gráfico 1: Descrição da amostra
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
333
práticos da profissão
Vivências
Convidar os participantes a experienciar a simulação de algum
tipo de disfunção motora ou sensorial realizando uma tarefa
simples da rotina diária como, por exemplo, vestir uma camisa
sem o apoio de um dos membros superiores.
Exposição de
equipamentos adaptados e
tecnologia assistiva
Expor equipamentos adaptados e de tecnologia assistiva como
um dos recursos utilizados na atuação do terapeuta ocupacional,
recursos estes que podem ser manipulados pelos visitantes
Quanto ao mural de fotos, 95% dos entrevistados avaliaram esse recurso. Destes, 41% e
47% apontaram que a colaboração desse recurso na construção de seu conhecimento
sobre a profissão foi “considerável” ou “muito” respectivamente. Percebe-se que
recursos visuais acompanhados de exemplos práticos são capazes de ilustrar
fidedignamente o dia-a-dia da profissão. Os painéis explicativos foram avaliados por
88% dos entrevistados e a maior parte deles (45%) analisou sua contribuição como
“considerável”. Além disso, este foi o único recurso que alguns visitantes (5%)
consideraram “não colaborar” para o entendimento da profissão. O contato com os
estudantes do curso foi conceituado como “bom” por 81% dos entrevistados e apenas
2% não tiveram esse contato. As vivências não foram experienciadas por 17% dos
entrevistados, no entanto, dentre os participantes, 62% avaliaram como “muito”
significativas para a construção do seu conhecimento sobre a profissão e apenas 4% da
amostra considerou esse recurso pouco relevante. A exposição de equipamentos
adaptados e de tecnologia assistiva foi considerada “muito” significativa para o
entendimento relacionado à terapia ocupacional por 65% dos entrevistados, sendo esse
recurso avaliado por 98% dos participantes.
DISCUSSÃO
De acordo com os resultados, percebe-se que a maior parte dos participantes da Sala
Interativa respondeu que seu conhecimento prévio sobre a Terapia Ocupacional era
muito pouco. Este fato pode ser explicado pela recente história da Terapia Ocupacional
no Brasil, visto ser uma profissão que surgiu no pós-segunda guerra, reconhecida como
de nível superior em 1969. No ano de 2001 havia apenas 29 escolas de formação em
Terapia Ocupacional no país (MOREIRA, 2008), além de ser uma profissão ainda
Tabela 1: Recursos da sala interativa
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
334
pouco divulgada e com poucas produções científicas, quando comparada a outra
profissões. Entretanto é importante ressaltar que o crescimento em todos esses aspectos
é evidente dentro da profissão, pois de acordo com os estudos de Oliver (2008), no
período de 2001 a 2007, houve 68% de aumento no número de professores e alunos
inseridos em grupos de pesquisa dentro da Terapia Ocupacional. Além disso, nesse
mesmo estudo, percebeu-se maior número de artigos publicados em periódicos
nacionais, sendo 41,7% em periódicos classificados como nacional B e 4,6% como
nacional A. Os artigos em periódicos de circulação internacional representaram 21,7%,
sendo 15,5% internacional C, 3,1% internacional B e 3,1% como internacional A.
Quanto ao conhecimento, após participar da Sala Interativa de Terapia Ocupacional,
verificou-se que 55% dos entrevistados apontaram que seu conhecimento sobre a
profissão passou a ser muito bom. Este dado demonstra que as estratégias utilizadas na
Sala Interativa contribuem para informar uma pequena maioria dos entrevistados.
Os recursos disponíveis nessa Sala também foram muito bem avaliados pelos
participantes da pesquisa. Quanto ao mural de fotos, que expressava as áreas de atuação
da Terapia Ocupacional, as respostas mais frequentes foram que o mural contribuiu para
o conhecimento da profissão “consideravelmente” ou “muito”. Acredita-se que recursos
visuais acompanhados de exemplos práticos são capazes de ilustrar fidedignamente o
dia-a-dia da profissão, pois a imagem é um recurso que permite a permanência temporal
do registro de algo, mesmo quando esse algo não está mais presente (PINTO, 2000).
Outro recurso disponível na Sala Interativa foram os painéis explicativos. Nesse
aspecto, a maioria dos participantes (45%) também classificou como uma ferramenta
considerável para o conhecimento da profissão. Entretanto este recurso foi avaliado
também por uma pequena parte (5%) como “não colaborou” para seu conhecimento
para a profissão. Esse fato talvez possa ser explicado pela quantidade de texto e
informações contidas nos cartazes, aliadas também à ansiedade que acompanha os
visitantes que querem participar do maior número de Salas Interativas, o que às vezes
pode prejudicar o detalhamento em cada visita.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
335
Na Sala Interativa é fundamental a presença de estudantes do curso para auxiliar os
visitantes a entender melhor a profissão. Essa importância foi corroborada pela
porcentagem elevada (81%) de respostas que apontaram ser essa interação com os
estudantes uma ferramenta “considerável” para o conhecimento da profissão. Acredita-
se que esse contato é essencial, no sentido de que os estudantes que participam da Sala
Interativa estão cursando diversos períodos do curso, o que pode contribuir para
fornecer diferentes visões sobre ele.
Um dos resultados mais significativos deste estudo foi em relação às vivências
disponíveis na Sala Interativa. Esse recurso foi apontado pela maioria (62%) dos
participantes como um recurso “muito significativo” para o conhecimento da profissão.
Isso mostra que as vivências possibilitam aos estudantes experimentar situações de
limitações que algumas pessoas vivem no dia-a-dia com as quais o terapeuta
ocupacional vai trabalhar para minimizar os impactos causados no seu cotidiano. Esse
contato, aliado às explicações dos estudantes sobre como o terapeuta ocupacional atua
em cada caso hipotético, mostra-se, portanto, efetivo para explicar aos visitantes da Sala
Interativa a atuação da Terapia Ocupacional.
Os equipamentos adaptados e tecnologia assistiva que podem ser utilizados por
terapeutas ocupacionais, expostos na Sala Interativa, também foram considerados como
muito significativos para o conhecimento da Terapia Ocupacional, uma vez que os
visitantes também podiam manusear, experimentar e ouvir a explicação dos estudantes
de Terapia Ocupacional sobre a função de cada um deles.
CONCLUSÃO
Mediante o exposto, os resultados sugerem que a presença da Sala Interativa de Terapia
Ocupacional na Mostra de Profissões da UFMG, com todos seus recursos, favorece a
construção do conhecimento sobre a Terapia Ocupacional. É necessário ainda destacar
que a presença dos alunos divulgando o curso para os candidatos é muito importante,
pois facilita uma escolha orientada da profissão pelo estudante. Dessa forma sugere-se
investir no treinamento e incentivo dos graduandos a fim de contribuir para maior
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
336
divulgação da Terapia Ocupacional.
Os resultados desta pesquisa poderão favorecer o planejamento das ações nas próximas
edições da Mostra de Profissões da UFMG, reforçando atividades realizadas ou
propondo alterações naquelas que não se mostraram efetivas. As vivências como
recurso informativo poderão continuar a ser utilizadas, em vista da relevância destacada
pelos visitantes da Sala Interativa, associadas à interação com os graduandos.
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Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
338
CONTRIBUIÇÕES DAS AÇÕES DO PET-TO PARA A FORMAÇÃO
ACADÊMICA AMPLA EM TERAPIA OCUPACIONAL SEGUNDO A
PERCEPÇÃO DO CORPO DOCENTE1
ANA K. BAPTISTA2
ALESSANDRA C. DE PAOLI3
FLORA P. GUERRA3
ISABELLA F. SILVEIRA4
MAÍRA P. SANTOS2
PAOLA M.R. OLIVEIRA4
DIEGO E.R.G. ALMEIDA4
BÁRBARA G. SALLES3
PRISCILA A.C. VALADÃO4
MARIANA L.G. SINGULANI3
MARINA PINTO-COELHO2
POLLYANNE M.L. ALCÂNTARA2
MÁRCIA B. REZENDE5
RESUMO
O Programa de Educação Tutorial da Terapia Ocupacional (PET-TO) da Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG), implantado em 2007, é o primeiro desse curso no
país. O PET-TO tem, dentre os seus objetivos, a mobilização do corpo discente para a
participação mais efetiva nas iniciativas políticas, sociais e técnico-científicas,
contribuindo para a formação do profissional com visão crítica de serviços de educação
e saúde nos quais ele está inserido. O MEC (2009) preconiza que a inserção do grupo
PET no curso deve permitir que as capacidades aprendidas se multipliquem para os
graduandos, modificando e ampliando a perspectiva educacional de toda a comunidade.
O objetivo deste estudo é verificar e discutir se, na percepção do corpo discente, as
ações do PET-TO contribuem para a formação acadêmica mais ampla em Terapia
Ocupacional dos estudantes inseridos neste curso. Para tanto, foi aplicado aos
1 Pesquisa apoiada pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC), Secretaria de Educação Superior
(SESu) no Programa de Educação Tutorial (PET). 2 Ex-bolsistas do MEC/SESu no PET-Terapia Ocupacional, graduandas em Terapia Ocupacional –
UFMG 3 Ex-bolsistas do MEC/SESu no PET-Terapia Ocupacional, graduadas em Terapia Ocupacional – UFMG 4 Bolsistas do MEC/SESu no PET-Terapia Ocupacional, graduandos em Terapia Ocupacional – UFMG 5 Profª Drª do Departamento de Terapia Ocupacional da UFMG e tutora do PET - Terapia Ocupacional
(PET – TO) – UFMG, bolsista MEC/SESu. [email protected]
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
339
estudantes da graduação do primeiro ao décimo períodos um questionário estruturado.
Para a interpretação dos dados realizou-se análise descritiva. Dos 196 estudantes que
responderam ao questionário, a maioria (94%) afirmou conhecer o PET-TO, 85%
participavam de alguma ação promovida pelo programa e 97% consideravam que essas
ações contribuíam para uma ampla formação acadêmica. A partir dessa investigação, foi
possível verificar que a maioria do corpo discente conhece o programa, participa e
considera as ações oferecidas pelo PET-TO relevantes para a formação acadêmica e
profissional. Entretanto, a análise dos dados mostra também que algumas ações
precisam ser mais conhecidas, como, por exemplo, aquelas dirigidas para a divulgação
das iniciativas do programa.
PALAVRAS-CHAVE: Terapia Ocupacional, Graduação, Percepção.
INTRODUÇÃO
O Programa de Educação Tutorial (PET) está presente em diversas Instituições de
Ensino Superior (IES) brasileiras, tanto públicas quanto particulares, totalizando,
atualmente, 400 grupos em todo o país (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2006). Este
programa se baseia na tríade ensino, pesquisa e extensão, pilares básicos que sustentam
as Universidades.
Implantado como Programa Especial de Treinamento em 1979, o PET constitui-se
como uma modalidade acadêmica, baseada nos moldes de grupos tutoriais de
aprendizagem, que objetiva formar globalmente o estudante. Em dezembro de 1999, o
Programa teve sua gestão transferida para a Secretaria de Educação Superior - SESu/MEC,
ficando sob a responsabilidade do Departamento de Projetos Especiais de Modernização
e Qualificação do Ensino Superior - DEPEM. Desde então, as Universidades às quais se
vincula se responsabilizam por oferecer suporte administrativo aos grupos, desenvolver o
processo de acompanhamento institucional do Programa e garantir a autonomia desses
grupos. Em 2004, a sigla PET que significava Programa Especial de Treinamento teve o
nome alterado para Programa de Educação Tutorial (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO,
2006).
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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Dentre os objetivos dos grupos PET, de acordo com o Manual de Orientações Básicas-
PET de 2006, destaca-se a formação acadêmica de excelente nível, com a formação de
um profissional crítico e atuante, orientada pela cidadania e pela função social da
educação superior. Enfatiza-se ainda a melhoria do ensino de graduação por meio da
atuação de bolsistas como agentes multiplicadores, do desenvolvimento de ações que
procuram integrar o ensino, a pesquisa e a extensão e da interação do corpo de bolsistas
com os corpos docente e discente da instituição (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO,
2006).
A Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) tem, atualmente, dez grupos PET nas
áreas de ciências exatas, humanas e ciências da saúde. O grupo PET-Terapia
Ocupacional (PET-TO) foi implantado na UFMG em 2007, com o objetivo de
contribuir para a formação de um profissional crítico-reflexivo buscando promover uma
prática sustentada em evidências científicas. As atividades, que contemplam ações de
ensino, pesquisa e extensão no PET-TO, englobam pesquisas coletivas e individuais,
participação na Semana do Conhecimento, além da organização de seminários e
palestras de interesse da graduação e aulas semestrais ministradas para a graduação. Os
PETianos também oferecem plantões diários em forma de monitorias aos alunos de
graduação e pós-graduação (lato sensu), para trocas de informações e experiências.
Além disso participam, em parceria com o Colegiado de graduação, da recepção a
calouros e Mostra de Profissões e buscam interagir com os demais alunos do curso
através de sua webpage e do PET Inform@, que engloba a divulgação por e-mail, mural
e em sala de aula.
As ações do PET-TO têm como uma de suas finalidades contribuir para uma formação
mais ampla do corpo discente de Terapia Ocupacional da UFMG e para tanto realizou
em 2009 uma pesquisa com o objetivo de verificar se elas atingem seus objetivos
segundo a percepção dos docentes. Este estudo pode contribuir para a construção de
ações voltadas para consolidar a participação do corpo docente em parcerias com o
PET-TO.
METODOLOGIA
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
341
Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFMG (ETIC 302/09)
e todos os entrevistados assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Este
é um estudo descritivo e seus dados foram coletados no período de novembro a
dezembro de 2009 por meio de um questionário fechado e autoexplicativo, constituído
de 13 perguntas fechadas, que investigaram o conhecimento, a participação e a
avaliação dos entrevistados em relação às ações do PET-Terapia Ocupacional.
A amostra utilizada foi constituída por professores efetivos do Departamento de Terapia
Ocupacional (DTO) da UFMG. Dentre os 16 professores efetivos, 14 responderam ao
questionário, um não respondeu e o outro é professor-tutor do programa e, portanto, não
pôde ser entrevistado. A análise dos dados foi descritiva.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Este estudo é inovador e de grande relevância para a discussão acerca do programa de
educação tutorial, uma vez que há pouca informação disponível na literatura sobre o
tema.
Nesta pesquisa os resultados mostraram que, do total de docentes entrevistados, 87,5%
afirmaram conhecer o PET-TO. Uma das questões do estudo investigava se os docentes
participavam das ações organizadas pelo PET-TO e, quando a resposta era positiva,
investigava sobre a qualidade de cada ação na formação dos discentes, na sua
percepção. As ações abordadas foram: ministrando seminários, palestras e/ou cursos;
recebendo aula de PETianos; orientando PETianos em pesquisas; indicando monitoria e
participando em eventos como ouvinte.
Foi observado que 71,4% dos docentes já participaram de alguma ação promovida pelo
PET-TO (Figura 1). Este dado é bastante interessante se considerarmos que o corpo
docente de Terapia Ocupacional é composto por professores que atuam em diferentes
áreas: saúde mental, gerontologia, desenvolvimento infantil, saúde física e saúde do
trabalhador. Assim, a maior participação de vários docentes nas ações do PET-TO, tais
como orientar PETianos e ministrar palestras, diminui o risco de especialização dos
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
342
PETianos em áreas específicas, pois ampliam os campos de interesse coletivo e
aumentam o convívio entre os estudantes e professores. Para Martin (2005), o sucesso
do PET na graduação se deve ao aumento da interação com os departamentos
responsáveis pelo curso, que ocorre com atividades extracurriculares por ele
desenvolvidas ou apoiadas.
Figura1: Participação do corpo docente de alguma ação do PET-TO
Dentre os docentes que participaram de alguma das ações do PET-TO, 50% afirmaram
ter indicado a monitoria para seus alunos de graduação (Tabela 1). Uma possibilidade é
que a metade deles talvez não conheça essa ação e/ou os conteúdos abordados.
Acredita-se que a pouca divulgação influencie este resultado, conforme aponta a
literatura (DAU et al., 2009). Diante desse resultado, sugere-se uma melhor divulgação
por email, mural do PET, webpage, ofício de divulgação para os docentes e até mesmo
durante outras atividades propostas pelo grupo. Dentre os docentes que indicaram a
monitoria, 80% avaliaram como excelente a contribuição desta ação na formação do
corpo discente (Tabela 1).
Avaliação das ações
Ações do
PET-TO
Docentes
participantes
(%)
Excelente/
Boa (%)
Regular/
Ruim (%)
Não avaliou
(%)
Participando
em eventos
60 100 --- ---
Recebendo
aula
55,6 100 --- ---
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
343
Indicando
monitoria
50 80 --- 20
Ministrando
seminários
30 100 --- ---
Orientando
PETiano
22,2 67 --- 33
Tabela 1: Participação do corpo docente nas ações do PET-TO e avaliação dessas ações
Outra ação avaliada foi a participação de PETianos ministrando aulas para alunos da
graduação em parceria com os professores. Nessa ação, 55,6% dos docentes que
participaram de alguma ação do PET-TO receberam PETianos em sala de aula e todos
classificaram como excelente ou boa a contribuição desta ação para a formação dos
alunos do programa. De acordo com Tosta et al (2006), atividades de ensino propostas
pelo PET, como ministrar aula para a graduação, proporcionam aos alunos bolsistas não
só o aprofundamento em determinados conhecimentos, como também a possibilidade de
desenvolver habilidades e experiências pedagógicas no âmbito do curso e, assim,
permitir uma formação variada.
Na orientação de PETianos em pesquisas, 66,6% dos docentes afirmaram não participar
dessa ação. Um docente que já havia participado de alguma ação organizada pelo PET-
TO não respondeu a este item. Apenas 22,2% já orientaram ou orientam PETianos em
pesquisas (Tabela 1), dentre eles dois docentes avaliaram como boa ou excelente esta
ação para a formação dos alunos do PET-TO e um não avaliou. A pequena participação
dos professores pode ser devido à área de interesse específica de cada aluno do
programa. Para Tosta et al (2006), as pesquisas realizadas pelos PETianos estabelecem
uma ligação com o ensino. Como os grupos PET não se limitam a uma determinada
área de conhecimento, as pesquisas podem variar de acordo com o interesse de cada
integrante do grupo, podendo então abranger diversas áreas, o que evita o conhecimento
fragmentado, levando a uma formação mais completa e coesa. No caso do PET-TO, os
PETianos participam de pesquisas em grupo, voltadas para a avaliação de suas ações e
relacionadas ao projeto pedagógico do curso, e de pesquisas individuais, que variam o
tema de acordo com os interesses pessoais dentro das áreas de abrangência da Terapia
Ocupacional.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
344
Na participação de docentes ministrando palestras, seminários e/ou cursos, apenas 30%
afirmaram ter participado dessa ação, avaliando-a como boa ou excelente para a
formação do corpo discente (Tabela 1). A pequena contribuição nesta ação pode estar
associada ao fato de que os temas são selecionados de acordo com o interesse e
demanda de aprendizagem do grupo. Os docentes de terapia ocupacional da UFMG têm
excelente qualificação e apresentam diversas linhas de pesquisa, porém o objetivo do
PET-TO também é convidar outros profissionais qualificados que também têm uma
história de sucesso e ações inovadoras no mercado de trabalho da terapia ocupacional
ou profissionais que abordem temas de interesse do próprio grupo. Assim, o grupo tem
convidado terapeutas ocupacionais que estão ativos na clínica, que podem dar relatos de
sua prática atual, incentivando os discentes quanto às diversas formas de atuação e
sucesso na terapia ocupacional. Além disso, o PET-TO também tem convidado outros
profissionais, que não são terapeutas ocupacionais, mas que atuam ou estudam áreas
pouco abordadas na graduação e que sejam de interesse do grupo. Para uma maior
interação com os docentes, sugere-se a realização de pesquisas de interesse com os
graduandos a fim de selecionar temas relevantes.
No que diz respeito aos eventos realizados pelo PET-TO, 60% dos docentes relatam ter
participado desta ação como ouvintes e todos avaliam como excelente ou boa (Tabela 1)
a contribuição desta iniciativa para a formação dos alunos de graduação de Terapia
Ocupacional. A não participação de 40% pode ser atribuída ao fato de que os eventos
são direcionados e divulgados especialmente para os alunos da graduação. Diante dos
resultados, sugere-se uma divulgação também para o corpo docente e a busca de opinião
dos docentes sobre quais temas consideram relevantes para a formação acadêmica,
contribuindo com o grupo nesta escolha.
Quanto ao vínculo estabelecido entre os docentes e o PET-TO, 43% relataram como
forte ou médio esse vínculo, enquanto 57% avaliaram como fraco ou inexistente (Figura
2). Para que esta relação seja construída e/ou consolidada, propõe-se a elaboração de
ações conjuntas com o corpo docente e uma melhor divulgação das ações propostas pelo
PET-TO. Segundo uma pesquisa realizada por Martin (2005), quanto maior o
envolvimento entre PETianos e docentes melhor a percepção das atividades do grupo
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
345
como parte integrante do departamento, ou seja, o reconhecimento das ações do grupo
pelos docentes depende da relação estabelecida com o grupo. A CAPES, em uma
avaliação formal do PET-Enfermagem da USP de Ribeirão Preto, sugeriu que o grupo
trabalhasse ativamente para promover maior contato com o corpo docente, para que este
conhecesse o verdadeiro objetivo do Programa (CASSIANI; RICCI; SOUZA; 1998).
Esta sugestão vale para todos os grupos PET, com o objetivo de ter um maior
reconhecimento e apoio dos docentes e, assim, maior participação discente e docente
nas ações dos grupos, contribuindo para a formação de um profissional crítico-reflexivo.
Dentre as novas ações conjuntas entre o PET-TO e o corpo docente do propõe-se um
encontro entre discentes e docentes para que estes possam relatar sobre a sua trajetória
acadêmica, destacando seus projetos de pesquisa, ensino e extensão, incentivando os
estudantes a fazer parceria. Seria o projeto denominado “Minha Trajetória” inspirado na
ação do grupo PET - Educação Física e Lazer da UFMG, o “PET-Trajetórias”.
Figura 2: Vínculo dos docentes com o PET-TO
Figura 3: Frequência de participação do corpo docente nas atividades do PET-TO
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
346
Em relação à frequência de participação, observou-se que 64% dos professores
participam às vezes ou raramente das atividades promovidas pelo PET-TO e 21%
afirmam nunca ter participado (Figura 3). Supõe-se que isso acontece porque as ações
são destinadas aos alunos da graduação, os temas abordados são mais específicos e a
carga horária é pequena para maiores aprofundamentos. Se os temas fossem voltados
para a área de saúde pública e de fundamentação da prática, se fossem comuns às
diversas áreas de atuação da profissão, a participação dos docentes poderia ser maior.
Tal fato reforça uma das novas ações propostas pelo PET-TO, que seria uma pesquisa
de temas de interesse dos próprios docentes. Assim, com a aplicação de novas medidas
propostas pelo PET-TO junto ao Departamento, espera-se aumentar a participação do
corpo docente nas atividades do PET-TO.
Dentre os professores, 71,5% avaliam como ótima ou boa as ações desenvolvidas em
parceria com o Colegiado de Graduação de Terapia Ocupacional, como a Mostra de
Profissões e Recepção de Calouros. Balbachevsky (1998), em uma pesquisa realizada
com 60 grupos PET do Brasil, entrevistou 721 PETianos e 298 professores tutores ou
não e concluiu que quanto maior a presença do grupo PET junto aos docentes do
Departamento, maior a tendência em conferir ao PET a iniciativa pelas atividades que
ocorrem na graduação, pois este passa a ser visto como um grupo de dinamização da
vida acadêmica.
Dentre os docentes participantes da pesquisa, 92,8% afirmaram que a implantação do
PET-TO com todas as suas ações são relevantes para uma formação acadêmica mais
ampla para todos os estudantes da graduação. Apenas um participante não respondeu a
essa questão. Segundo Tosta el al (2006), o aluno bolsista tem o compromisso de ser um
agente multiplicador, difundir novas ideias e práticas entre os estudantes da graduação e
aperfeiçoar o desempenho global do curso, atuando na formação dos alunos da
graduação. Além disso, todos os professores responderam que as ações do PET-TO
contribuem para uma formação de estudantes mais capacitados quanto ao desempenho
acadêmico. Para Koltermann e Silva (sem data), a existência do PET em uma instituição
contribui para a melhoria da qualidade no processo ensino-aprendizagem e para a
integração entre os alunos e os docentes. Isso acontece porque o programa atua
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
347
diretamente nas atividades acadêmicas.
Já na formação de indivíduos mais capacitados ao desempenho profissional, 86% dos
docentes afirmaram que as ações do PET-TO contribuem, 7% afirmaram não contribuir
e 7% não responderam (Figura 4). Dantas (1995) afirma que “percebe o PET como um
programa formador de cidadãos e futuros profissionais com vocação para exercer
funções de liderança na sociedade, o que extrapola sua intenção original de formar
massa crítica para a reposição de quadros de pós-graduados do sistema de ensino
superior brasileiro”. Além disso, de acordo com Tosta et al (2006), as atividades
desenvolvidas pelos grupos PET possibilitam aos alunos vivenciarem experiências que
não se encontram em estruturas curriculares usuais, objetivando uma formação
acadêmica mais ampla, cooperando para que o aluno faça parte do mercado de trabalho
e tenha uma melhor qualificação como indivíduo e como membro da sociedade.
Figura4: Contribuição das ações do PET-TO para o desempenho profissional,
na percepção do corpo docente
CONCLUSÃO
Os resultados sugerem que, segundo a percepção dos docentes de Terapia Ocupacional
da UFMG, o Programa de Educação Tutorial contribui para a formação acadêmica dos
estudantes de graduação deste curso. Essa contribuição poderia ser maior e melhor se os
professores do Departamento de Terapia Ocupacional conhecessem mais e melhor as
propostas do MEC para a implantação de um Programa de Educação Tutorial e as ações
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
348
específicas do PET-TO. Dessa forma, eles saberiam o que o PET-TO pode ser um
parceiro e assim agregar estratégias para a graduação e poderiam então divulgar e
estimular a participação dos discentes nas ações. Outros fatores, além da desinformação,
podem justificar a pequena participação do corpo docente e devem ser pesquisados para
que possam ser desenvolvidas ações no sentido de fortalecer as parcerias. Sugere-se o
convite para a formação de novas parcerias com o corpo docente como forma de criar
uma interlocução mais estreita entre PETianos e docentes. Além disso, para divulgar
melhor suas ações para o corpo docente, o grupo PET-TO deverá buscar uma
contribuição deles na formulação de novas propostas ou reformulações das antigas,
promovendo espaços para discussões. Como forma de aproximação e formação de
vínculo entre o grupo PET-TO e o corpo docente foram propostas as seguintes ações:
maior participação de docentes em seminários como palestrantes; implantação do
projeto “Minha Trajetória”; pesquisa de interesse sobre temas de palestras e outros. A
partir dessas novas ações e discussões com o corpo docente, o PET-TO poderá
estabelecer uma relação construtiva e de parceria com os professores, beneficiando o
grupo, o corpo docente e discente, construindo estratégias que possam contribuir para a
melhoria da qualidade do curso e consequente formação de um profissional crítico e
reflexivo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BALBACHEVSKY, E. O programa especial de treinamento PET/CAPES e a graduação
no ensino superior brasileiro. Infocapes, v. 6, n. 2, p. 7-20, 1998.
CASSIANI, S.H.D.B.; RICCI, W.Z.; SOUZA, C.R. de. A experiência do programa
especial de treinamento na educação de estudantes de graduação em enfermagem.
Revista Latino-Americana de Enfermagem, v. 6, n. 1, p. 63-69, 1998.
DANTAS, F. O PET e a formação de lideranças acadêmicas e profissionais. Infocapes,
v.3, n. 1-2, p. 18-20, 1995.
DAU, E. et al. Vetor: Revista do Programa de Educação Tutorial da UFRJ. Intercom-
Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação - Exposição da
Pesquisa Experimental em Comunicação, 2009. Disponível em:
http://200.136.53.130:13580/cdrom/2009/intercom/sudeste/cd/expocom/EX14-0734-
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Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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KOLTERMANN, P.I.; SILVA, E.L.T. Educação Tutorial no Ensino Presencial: a
experiência do PET na UFMS. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/sesu/arquivos/pdf/PET/pet_texto_i.pdf. Acesso em 02 dez de
2009.
MARTIN, M.G.M.B., O Programa de Educação Tutorial – PET: formação ampla na
graduação. 2005. 96 p. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em
Educação, Universidade Federal do Paraná. Curitiba, PR.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, PET: Programa de Educação Tutorial. Manual de
Orientações Básicas. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12223&Ite
mid=480 Acesso em 15 mar 2010.
TOSTA, R. M. et al. Programa de educação tutorial (PET): uma alternativa para a
melhoria da graduação. Revista Psicol. Am. Lat, n.8, nov. p.0-0, 2006.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
350
CONTRIBUIÇÕES DAS AÇÕES DO PET-TO PARA A AMPLA FORMAÇÃO
ACADÊMICA EM TERAPIA OCUPACIONAL SEGUNDO A PERCEPÇÃO DO
CORPO DISCENTE1
POLLYANNE M.L. ALCÂNTARA2
ANA K. BAPTISTA2
ALESSANDRA C. DE PAOLI3
FLORA P. GUERRA3
ISABELLA F. SILVEIRA4
MAÍRA P. SANTOS2
PAOLA M. R. OLIVEIRA4
BÁRBARA G. SALLES3
PRISCILA A.C. VALADÃO4
MARINA PINTO-COELHO2
MARIANA L.G. SINGULANI3
DIEGO E.R.G. ALMEIDA4
MÁRCIA BASTOS REZENDE5
RESUMO
O Programa de Educação Tutorial da Terapia Ocupacional (PET-TO) da Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG), implantado em 2007, é o primeiro desse curso no
país. O PET-TO tem, dentre os seus objetivos, a mobilização do corpo discente para a
participação mais efetiva nas iniciativas políticas, sociais e técnico-científicas,
contribuindo para a formação do profissional com visão crítica de serviços de educação
e saúde nos quais ele está inserido. O MEC (2009) preconiza que a inserção do grupo
PET no curso deve permitir que as capacidades aprendidas se multipliquem para os
graduandos, modificando e ampliando a perspectiva educacional de toda a comunidade.
O objetivo deste estudo é verificar e discutir se, na percepção do corpo discente, as
ações do PET-TO contribuem para a formação acadêmica mais ampla em Terapia
Ocupacional dos estudantes inseridos neste curso. Para tanto, foi aplicado aos
estudantes da graduação do primeiro ao décimo períodos um questionário estruturado.
Para a interpretação dos dados realizou-se análise descritiva. Dos 196 estudantes que
1 Pesquisa apoiada pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC), Secretaria de Educação Superior
(SESu) no Programa de Educação Tutorial (PET). 2 Ex-bolsistas do MEC/SESu no PET-Terapia Ocupacional, graduandas em Terapia Ocupacional, UFMG 3 Ex-bolsistas do MEC/SESu no PET-Terapia Ocupacional, graduadas em Terapia Ocupacional, UFMG 4 Bolsistas do MEC/SESu no PET-Terapia Ocupacional, graduandos em Terapia Ocupacional, UFMG 5 Profª Drª do Departamento de Terapia Ocupacional da UFMG e tutora do PET - Terapia Ocupacional
(PET – TO) – UFMG, bolsista MEC/SESu.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
351
responderam ao questionário, a maioria (94%) afirmou conhecer o PET-TO, 85%
participavam de alguma ação promovida pelo programa e 97% consideravam que essas
ações contribuíam para uma ampla formação acadêmica. A partir dessa investigação, foi
possível verificar que a maioria do corpo discente conhece o programa, participa e
considera as ações oferecidas pelo PET-TO relevantes para a formação acadêmica e
profissional. Entretanto, a análise dos dados mostra também que algumas ações
precisam ser mais conhecidas, como, por exemplo, aquelas dirigidas para a divulgação
das iniciativas do programa.
PALAVRAS-CHAVE: Terapia Ocupacional, Graduação, Percepção.
INTRODUÇÃO
Ao ser admitido na Instituição de Ensino Superior (IES), o graduando pode experimentar
diferentes propostas metodológicas que possibilitam o desenvolvimento de capacidades
profissionais, crescente autonomia de escolhas, “criatividade, versatilidade,
flexibilidade, capacidade de relacionar-se, comunicar-se e resolver problemas”
(DAMASCENO, 2006). Para isso, a Universidade dispõe de programas
extracurriculares, que estimulam ações no ensino, pesquisa e extensão.
O Programa de Educação Tutorial (PET) gerenciado pela Secretaria de Ensino Superior
do Ministério da Educação (SESu-MEC), antes chamado Programa Especial de
Treinamento, foi criado no contexto acadêmico como um grupo tutorial a fim de
proporcionar aos integrantes aprendizagem ativa e relevante às suas necessidades bem
como às do curso em que estão inseridos. Tendo como eixos a integração do ensino,
pesquisa e extensão, o programa tem como proposta uma formação global, tanto do
aluno integrante do programa, quanto dos demais estudantes do curso. A missão do
tutor é estimular a aprendizagem ativa dos seus membros, por meio de vivências,
reflexões e discussões em um clima de informalidade e cooperação (DANTAS, 1995).
O programa conta também com alguns professores colaboradores, que orientam
trabalhos científicos e contribuem para a capacitação dos estudantes integrantes do PET,
que se tornam multiplicadores de conhecimento. Assim, a inserção do grupo no curso
permite que as capacidades aprendidas se disseminem para os outros estudantes,
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
352
modificando e ampliando a perspectiva educacional de toda a comunidade (MEC,
2009).
O PET é semelhante ao Programa de Iniciação Científica, à medida que permite ao
estudante acessar conteúdos além daqueles ofertados na grade curricular de seu curso.
Todavia, o diferencial está na abrangência do PET, ao extrapolar a pesquisa e
possibilitar ao estudante a vivência na extensão e no ensino. Balbachevsky (1997), em
pesquisa com 60 grupos PET concluiu que o estudante do PET tem uma probabilidade
maior de sucesso profissional, devido aos contatos acadêmicos e sociais realizados e
que esse sucesso não surge em função do tempo de atuação do grupo PET junto à IES
senão da proximidade do PET com o departamento de seu curso. Tais contatos
permitem uma dinâmica favorável ao crescimento do estudante, por meio do
mecanismo de retroalimentação, que lhe permite avaliar constantemente suas ações
(Balbachevsky, 1998).
O PET-Terapia Ocupacional (PET-TO), o primeiro deste curso no país, foi implantado
em 2007, tendo como objetivo a mobilização do corpo discente para a participação mais
efetiva nas iniciativas políticas, sociais e técnico-científicas. Nesse sentido, implantou
algumas ações, como: reuniões semanais, PET Seminários, PET Inform@, PET Pesquisa
e Monitorias, bem como aulas ministradas pelos bolsistas, também chamados de
PETianos, sob a supervisão de um docente. Rezende e Silva (2008) verificaram os
impactos das ações do PET-TO sob o ponto de vista dos bolsistas, no que diz respeito à
própria formação. Os resultados dessa pesquisa constataram um grande impulso no
engajamento dos bolsistas, que passaram a ter um envolvimento mais efetivo nas
atividades acadêmicas e um melhor desempenho na graduação. Além disso, os
participantes do PET-TO puderam desenvolver habilidades interpessoais devido às
atividades em grupo, bem como um senso de identidade em decorrência das funções
desempenhadas no programa.
As ações do PET-TO têm, dentre outras finalidades, contribuir para a formação mais
ampla do corpo discente do curso de Terapia Ocupacional da Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG). A formação mais (ou menos) ampla diz respeito aos conteúdos
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
353
suplementares ao processo de profissionalização e vivência acadêmica comum à grade
curricular. Com isso, esta pesquisa tem como objetivo verificar se na percepção dos
discentes há contribuição das ações do PET-TO para a graduação, considerando os
primeiros dois anos de atividade desse grupo (2007 a 2009).
MÉTODOS
A pesquisa foi realizada no segundo semestre de 2009. O projeto foi aprovado pelo
Comitê de Ética em Pesquisa (COEP) da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG) - ETIC 202/09. Para a realização da pesquisa foi utilizado um questionário
com 11 perguntas que foram respondidas pelos estudantes da graduação, do primeiro ao
décimo período, regularmente matriculados no curso de Terapia Ocupacional dessa
Universidade. O questionário utilizado continha perguntas binomiais e perguntas com
quatro respostas graduadas, direcionadas à avaliação das ações do PET.
Os Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e os questionários foram
distribuídos em salas de aula do Departamento de Terapia Ocupacional (DTO). Os
discentes foram informados sobre os objetivos e os procedimentos da pesquisa, e os que
aceitaram participar do estudo preencheram o TCLE e responderam ao questionário. Os
questionários foram respondidos em tempo médio de 15 minutos. Após a coleta,
realizou-se a análise descritiva dos dados.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O curso de Terapia Ocupacional da UFMG conta com cerca de 300 estudantes
regularmente matriculados. Destes, 196 preencheram o questionário, ou seja, 65,3% do
corpo discente. Considerando a parcela que respondeu ao questionário, constatou-se que
o PET-TO é conhecido por 94% dos estudantes do curso de graduação em Terapia
Ocupacional. Esse achado pode estar relacionado ao fato de o PET-TO prezar pela
contínua interação do aluno PETiano com os demais integrantes do corpo discente
através de suas ações, conforme preconiza Dantas (1995). O PETiano tem como metas
envolver-se de modo ativo com a comunidade acadêmica e contribuir para sua melhoria
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
354
e transformação por meio da interlocução permanente. Esta característica está em
consonância com os objetivos do Programa de Educação Tutorial em âmbito nacional,
no qual é proposta uma formação ampla e de qualidade para todos os estudantes (MEC,
2002). Dessa forma, estes resultados são muito positivos, indicando que o PET-TO
conseguiu em apenas dois anos uma ampla visibilidade entre os estudantes da
graduação.
Os estudantes que afirmaram não conhecer o PET-TO encontram-se concentrados
especialmente nos três períodos iniciais do curso (Fig.1), reduzindo de 22,6% no
primeiro período para 15,8% no segundo, 7,4% no terceiro, percentual bem próximo do
encontrado nos demais períodos.
Fig.1 – Distribuição dos estudantes que afirmaram não conhecer o PET-TO
nos períodos iniciais do curso
Os estudantes que não conhecem o programa ficam a maior parte do tempo fora da
Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional (local onde o PET-TO se
situa e desenvolve grande parte de suas ações), cursando disciplinas do ciclo básico em
outras unidades da Universidade, o que pode dificultar que os estudantes dos períodos
iniciais conheçam o programa e se envolvam com ele.
Espera-se que, com a implantação do novo currículo de graduação em Terapia
Ocupacional da UFMG, iniciado em 2010, seja ampliado o contato do estudante com
disciplinas mais aplicadas, favorecendo sua participação em atividades específicas da
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
355
profissão. Essa medida objetiva evitar a ruptura entre o Ciclo Básico e o Específico,
assim como a cisão entre teoria e prática (DRUMMOND, 2004). O que pode facilitar a
circulação do estudante pelos diferentes espaços da Universidade desde o início do
curso é um sistema articulado de aquisição de saberes que, paralelamente, vai permitir
alternativas de trajetórias e o acesso simultâneo a conhecimentos (DRUMMOND e
RODRIGUES, 2004).
Quanto à participação do corpo discente nas atividades realizadas pelo PET-TO, 85%
dos estudantes que responderam ao questionário afirmaram já ter participado de pelo
menos alguma ação desenvolvida pelo programa. Este dado mostra que a participação é
elevada, não havendo grande discrepância entre aqueles que conhecem e participam das
ações e os que não participam, uma vez que dentre os 94% dos estudantes que
conhecem o programa apenas 9% não participam das atividades desenvolvidas pelo
PET.
A análise da participação nas atividades do PET-TO, por período, também mostra que
há uma menor participação dos estudantes dos períodos iniciais do curso, especialmente
do primeiro e segundo períodos, com percentuais inferiores a 70% (Fig.2). Embora
esses percentuais não sejam tão baixos, diferem bastante dos demais períodos, nos quais
os índices de participação se encontram todos acima de 80%, chegando a 100% em
alguns deles (Fig.2).
Fig.2 - Distribuição por período dos alunos que já participaram de alguma
ação do PET-TO
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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Entre as diferentes ações que o PET-TO realiza, uma delas é a oferta de “Seminários e
Palestras”, cujos assuntos são sugeridos pelos próprios estudantes. A busca por esta
atividade pelos discentes é indicativa de que propostas alternativas podem contribuir
para a formação profissional ou acadêmica, tendo como referência as práticas sociais e
experiências profissionais extracurriculares (NÓVOA, 1995). Essa atividade procura
atender mais plenamente às necessidades do curso de graduação e/ou ampliar e
aprofundar os objetivos e os conteúdos programáticos que integram a grade curricular
(MEC, 2002). A participação dos estudantes nessa atividade é elevada, de modo que,
dentre os que responderam ao questionário, 57% já tinham participado de alguma
palestra ou seminário do PET-TO. A maioria avaliou essa atividade como excelente
(62%) em relação às contribuições para a sua formação acadêmica. A pesquisa de
interesse de temas realizada junto ao corpo discente, por meio da qual são levantados
temas que vão ao encontro de seus interesses, pode ter proporcionado a boa aceitação e
participação na atividade.
Outra atividade com grande participação (56%) são as aulas ministradas pelos PETianos
nas variadas áreas do conhecimento da Terapia Ocupacional. Esta atividade é realizada
por cada bolsista em uma disciplina de seu interesse em dois semestres consecutivos. A
colaboração e a parceria com o corpo docente do curso são fundamentais. A maior parte
dos estudantes que participou das aulas ministradas pelos PETianos (60%) avaliou essa
atividade como excelente quanto às contribuições para sua formação acadêmica,
confirmando a relevância e a pertinência desta ação. Esta atividade de ensino, além de
estimular a participação dos estudantes da graduação, instigando-os à descoberta de
novos conhecimentos, auxilia o estudante PETiano a treinar e avaliar o seu
desempenho, podendo melhorar a qualidade da transmissão de conhecimento a cada
semestre.
Outra ação é o “PET Inform@”, que engloba tanto um mural de informações como uma
webpage. O mural permanece em exposição contínua na escola com informações de
interesse de relevância acadêmica. A webpage é outro meio de comunicação do grupo.
No site são disponibilizadas informações sobre o que é o PET, sobre a equipe do PET-
TO, as atividades desenvolvidas, agenda do grupo, notícias úteis, divulgação de
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
357
eventos, links de revistas nacionais e internacionais da área etc. No que se refere ao
mural, apesar de estar localizado em local de fácil acesso e visibilidade, a estratégia de
comunicação do PET Inform@ (mural) não foi convidativa à participação em outras
ações do PET. Isso reforça a necessidade de melhorias das estratégias de comunicação
que o PET-TO tem utilizado. O “PET Inform@” (mural) foi avaliado por 46% dos
estudantes como excelente e por 39% como razoável, considerando sua contribuição
para a formação acadêmica. Quanto a este aspecto, Balbachevsky (1998) reitera que
elaborar canais formais e informais de contato com o entorno institucional ou ainda
incrementar os já existentes são alternativas para o aumento da interação entre o PET e
a graduação.
A webpage apresentou 19% de participação dos estudantes, demonstrando que a página
do PET-TO ainda é pouco conhecida e utilizada pela graduação. Essa pequena
participação pode estar relacionada a pouca divulgação do site, indicando, mais uma
vez, a necessidade de se ampliar nele os espaços de interesse para os estudantes da
graduação, bem como buscar estratégias mais eficazes de divulgação. Esse resultado
pode ser também o reflexo da carência de profissionais especializados na Universidade.
Pode-se oferecer no site links úteis para a graduação, como vagas para estágios,
concursos, seleções de bolsas e links para publicações recentes em Terapia Ocupacional,
de forma a atrair mais a população-alvo.
O “Plantão PET” visa multiplicar os conhecimentos adquiridos em grupos de formação
ou de estudo para os demais estudantes da graduação. Essa atividade é realizada
diariamente em forma de plantões na própria sala do PET-TO. A porcentagem de
participação nessa atividade foi baixa, contando com apenas 23% dos estudantes.
Apesar da pequena adesão, 58% avaliaram a atividade como excelente quanto à suas
contribuições para a formação acadêmica. Diante desses resultados o PET-TO tem
desenvolvido novas estratégias para aumentar a participação dos estudantes, realizando
pesquisas de interesses sobre os assuntos que poderão ser abordados nos plantões, que
assim passarão a ser temáticos. É importante salientar que os estudantes da pós-
graduação da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional, embora
não façam parte da amostra desta pesquisa, são frequentes nesses plantões, o que mostra
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
358
que o PET-TO tem ampliado sua interação. Trata-se de uma interlocução bastante
enriquecedora para ambos os grupos, graduandos PETianos e pós-graduandos de
diversos estados da federação.
A “Recepção de Calouros” é feita a cada semestre para os estudantes que ingressam no
curso de Terapia Ocupacional. Esta ação, em parceria com o Colegiado de graduação,
consiste em dinâmicas de grupo e na apresentação da Universidade, enfatizando as
inúmeras possibilidades que ela oferece para que o graduando faça um curso
diferenciado, com acesso a diferentes modalidades de aprendizado. A atividade
“Recepção de Calouros” atingiu um baixo percentual de participação, alcançando
apenas 15% dos estudantes entrevistados. Justifica-se esse pelo fato de que a parceria
com o Colegiado foi realizada com o PET-TO apenas nos últimos quatro semestres, de
modo que dentre os dez períodos avaliados apenas quatro tiveram acesso a essa
atividade. Na avaliação qualitativa dessa atividade, dentre os estudantes que
participaram da “Recepção de Calouros”, 52% avaliaram essa atividade como excelente.
Ao serem questionados sobre a relevância do PET-TO em todas as suas ações para uma
formação acadêmica ampla, 95% do corpo discente considerou o programa relevante.
Quanto à contribuição das ações do PET-TO, 97% consideraram que o programa
contribui para uma formação de estudantes mais capacitados para o desempenho
acadêmico.
Como foi possível verificar, mais de 90% dos estudantes avaliam como excelentes as
ações do programa na contribuição para a sua formação acadêmica e profissional mais
ampla. Tal fato reforça que o PET-TO atende seu objetivo de estimular a melhoria do
ensino de graduação através da atuação dos bolsistas como agentes multiplicadores,
desenvolvendo e disseminando novas ideias, práticas, experiências pedagógicas e
atividades que estimulam a interlocução entre bolsistas e os corpos discente e docente
(MANUAL PET, 2002).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As práticas alternativas para a construção extracurricular propostas pelo PET-TO foram
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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reconhecidas pela sua relevância e contribuição à formação acadêmica, conforme a
percepção do corpo discente. Os resultados apresentados sugerem boa receptividade e
boa avaliação das ações.
Constatou-se que uma das barreiras para a participação dos estudantes em algumas
propostas do PET-TO (como o PET Inform@ e plantões) pode estar relacionada ao
acesso às informações acerca das ações que o grupo desenvolve. Em vista dos
resultados obtidos, reitera-se a importância do estabelecimento de meios de
comunicação mais viáveis para que os estudantes participem efetivamente das
atividades.
Apesar das dificuldades mencionadas, os resultados obtidos nessa pesquisa ultrapassam
as metas propostas no projeto inicial do PET-TO, pois o programa é dinâmico,
modificando estratégias de acordo com a demanda e o perfil dos bolsistas que o
integram. Como exemplo tem-se a participação dos estudantes nos “seminários e
palestras”, cuja expectativa no projeto inicial, apresentado em 2007, era uma meta de
participação em torno de 10% do corpo discente, chegando atualmente a quase 50%.
Os resultados desta pesquisa podem contribuir para a melhoria ou implantação de novas
ações do PET-TO, auxiliando em futuras frentes a serem propostas no planejamento de
suas ações. Metodologias utilizando a educação tutorial parecem contribuir para um
aprendizado diferenciado, entretanto poucos estudos são realizados neste campo.
Pesquisas assim manteriam o programa vivo além de aumentar a visibilidade do PET no
cenário acadêmico.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BALBACHEVSKY, E. O programa especial de treinamento PET/CAPES - e a
graduação no ensino superior brasileiro. Infocapes - Boletim Informativo, v. 6, n. 2, p. 6-
23, 1998.
BRASIL. Ministério da Educação. Manual de Orientações Básicas. Disponível em
www.mec.gov.br/sesu. Acesso em 02 dez 2009.
CASTRO, Cláudio de M. O PET visto por seu criador. Disponível em:
http://www.petma.ufsc.br/arquivos/palestra.mp3. Acesso em 02 dez 2009.
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DAMASCENO et al. O Programa de Educação Tutorial - PET: sob a ótica de bolsistas
iniciantes. Revista Mineira de Enfermagem, n.10, v. 2, p160-165, 2006.
DANTAS, F.O PET e a formação de lideranças acadêmicas e profissionais. Infocapes,
v.3, n. 1-2, p. 18-20, 1995.
DRUMMOND, A. F.; RODRIGUES, A. M. V. N. Os desafios. Revista de Terapia
Ocupacional da Universidade de São Paulo, v. 15, n. 3, p. 106-11, 2004.
DRUMOND, A. F. O cotidiano como foco. Revista da Universidade Federal de Minas
Gerais, ano 2, nº. 5, 2004.
Disponível em: http://www.ufmg.br/diversa/5/terapiaocupacional.htm. Acesso em 27 de
abr 2010.
MARTIN, M.G. M. B. O Programa de Educação Tutorial - PET: Formação Ampla na
Graduação. 2005, 108 p. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em
Educação, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR.
NÓVOA, A.(coord.). Vidas de professores. Lisboa: Porto Editora, 1992.
PROGRAMA DE EDUCAÇÃO TUTORIAL. Manual de Orientações Básicas -
PET/2006. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12228&Ite
mid=486 Acesso em 30 de mar 2009.
PROGRAMA DE EDUCAÇÃO TUTORIAL. Manual de orientações básicas -
PET/2002. Disponível em http://portal.mec.gov.br/sesu/arquivos/pdf/PETmanual.pdf.
Acesso em 23 de abr 2010.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
361
ENCONTRO DE PRECEPTORES: EDUCAÇÃO CONTINUADA E
EXTENSIVA
SAMIRA LIMA DA COSTA1
VIVIANE SANTALUCIA MAXIMINO2
RESUMO
Durante o estágio profissionalizante em Terapia Ocupacional os alunos inserem-se em
campos diversos de atuação, sendo recebidos por preceptores, terapeutas ocupacionais
da instituição anfitriã. Ali desenvolvem práticas profissionais sob orientação de seus
preceptores e supervisão de docentes da universidade. O período de estágio converge
para discussões acerca da formação tanto dos alunos quanto dos preceptores, acerca do
Projeto Político Pedagógico do Campus, fundamentado na lógica da equipe
interprofissional e das Diretrizes Curriculares Nacionais para as profissões da saúde.
Faz-se necessário o acompanhamento desses preceptores. Por esse motivo, temos
realizado encontros periódicos de preceptores, com o objetivo de potencializar a
proposta do campus e das diretrizes curriculares de forma reflexiva e formativa. Ao
mesmo tempo em que se formam continuamente, os preceptores podem se tornar
multiplicadores dessas reflexões, podendo estendê-las a seus serviços. Os encontros
abrangem todos os terapeutas ocupacionais que recebem alunos em campo de estágio,
além dos docentes que atuam como supervisores. Dos vinte e cinco preceptores e
supervisores, cerca de dezoito participam assiduamente dos encontros. A programação é
elaborada junto com os próprios preceptores, considerando questões mobilizadoras dos
campos de estágio e temas que querem debater (referentes ao estágio ou não). Os
encontros, segundo os preceptores, ajudam a identificar questões em comum entre os
campos de estágio e a diminuir a ansiedade e a solidão da preceptoria, além de
contribuir para a definição de formas de abordar casos e teorias com os alunos, sendo,
portanto, um potente espaço de formação e articulação.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Continuada, Visitas com Preceptor, Estágio Clínico, Terapia Ocupacional.
INTRODUÇÃO
1 Prof.ª Dr.ª do curso de Terapia Ocupacional do Departamento de Ciências da Saúde, Universidade
Federal de São Paulo, campus Baixada Santista [email protected] 2 Prof.ª Dr.ª do curso de Terapia Ocupacional do Departamento de Ciências da Saúde, Universidade
Federal de São Paulo, campus Baixada Santista
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
362
Os Estágios Supervisionados Profissionalizantes do curso de graduação em Terapia
Ocupacional da Universidade Federal de São Paulo, campus Baixada Santista, são
descritos como formação em serviço e ocorrem nos 7.º e 8.º termos do curso. Tiveram
início em 2008 e organizam-se em práticas em diversos serviços nas cidades de Santos e
São Paulo, em instituições públicas e privadas que atendem populações variadas
visando oferecer aos alunos oportunidades abrangentes de trabalho.
Tendo em vista que o curso está em implantação e ainda não tem seu corpo docente
completo e também compreendendo que a formação do aluno pode ser enriquecida com
o contato com profissionais não docentes, que vivem o dia-a-dia institucional,
escolhemos oferecer estágios tanto em serviços criados por professores quanto em
outros onde há terapeutas ocupacionais. Na cidade de Santos, os docentes implantaram
serviços nas áreas de educação, saúde do trabalhador, saúde do idoso e nas áreas social
e hospitalar. Os serviços conveniados atendem saúde mental, reabilitação e inclusão da
população adulta e infantil. Nas instituições parceiras, os alunos são acompanhados por
preceptores e/ou supervisores. Além disso, há encontros sistemáticos com docentes do
curso.
Compreendendo que uma das funções da universidade é contribuir para a educação
permanente de profissionais e que a prática real no mundo do trabalho traz problemas e
estratégias que constantemente nos fazem questionar o saber instituído, criamos um
espaço dedicado ao encontro entre esses saberes. (CECIM, 2005)
A discussão nacional sobre o novo perfil do profissional de saúde, que pauta o projeto
político-pedagógico do campus Baixada Santista baseando-o na formação
interprofissional, no trabalho em equipe e na atenção integral, coloca-nos a
responsabilidade de levar essa temática para os serviços através desses profissionais que
podem se tornar multiplicadores (BATISTA, 2004).
Além disso, ao receberem nossos alunos a partir de um olhar estrangeiro ao curso, os
supervisores e preceptores podem avaliar nossos alunos e apontar pontos fracos e fortes
da formação que estamos oferecendo.
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
363
Para oportunizar essa situação de troca criamos um dispositivo grupal denominado
Encontro de Supervisores e Preceptores dos Estágios Profissionalizantes em Terapia
Ocupacional da UNIFESP, Baixada Santista. (BENEVIDES, 2005, OLIVEIRA, 2010).
METODOLOGIA
Foram quatro Encontros de Supervisores e Preceptores dos Estágios Profissionalizantes
em Terapia Ocupacional, todos no campus da Baixada Santista. Os três primeiros foram
no ano de 2009, no início e no final do primeiro semestre, e no final do segundo
semestre, com os objetivos de iniciar o trabalho, avaliar o semestre e planejar o
seguinte. O IV Encontro foi em meados do primeiro semestre de 2010, data que já foi
resultado dos encontros anteriores. Os Encontros foram coordenados por docentes
responsáveis pelo estágio (coordenadores de estágio) e tiveram a duração de 6 horas
(um dia).
A dinâmica proposta incluiu discussão em pequenos grupos, apresentação e discussão
de documentos, tais como as diretrizes curriculares e trechos do projeto político-
pedagógico do curso, palestra sobre metodologias ativas etc. Na avaliação das
coordenadoras do Encontro, houve em todos eles boa participação dos convidados que
pareciam estar à vontade para falar. Nosso foco neste trabalho, porém, não foi a
dinâmica dos encontros, mas sim o conteúdo trabalhado.
Para os Encontros são convidados todos os terapeutas ocupacionais que trabalham com
os alunos em campo e/ou os supervisionam. O convite se estende a outros profissionais
que participam da formação mas, apenas no primeiro Encontro, tivemos essa presença.
Dos vinte e cinco preceptores e supervisores, cerca de dezoito participaram
assiduamente. Entre os supervisores docentes, tivemos uma adesão mais expressiva ao
longo do tempo, a partir da divulgação dos resultados que mostravam que a dinâmica do
evento não se restringia a “passar informações para os de fora”, ou verificar se “tudo
estava indo bem”, mas sim uma oportunidade de rever e aprofundar questões relativas à
formação que diziam respeito a todos os envolvidos.
Por isso, a programação dos Encontros é sempre elaborada junto com os próprios
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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participantes, considerando questões mobilizadoras dos campos de estágio e temas que
queiram debater .
Usamos os relatórios elaborados a cada Encontro como material de análise. Esses
relatórios foram escritos logo após o evento, a partir de notas tomadas pelas
coordenadoras. Eles foram enviados a todos os preceptores e supervisores, presentes e
ausentes como forma de coletivizar os resultados. Também foram úteis por que traziam
demandas que, ao serem registradas, não foram esquecidas.
Identificamos algumas categorias de questões, porém, como na discussão esses temas
surgiram da prática do preceptor/supervisor e portanto, imbricados, não trabalhamos as
categorias separadamente. Também não foi nossa intenção neste trabalho avançar em
discussões teórico-conceituais. Interessa-nos aqui descrever um dispositivo e seus
possíveis efeitos.
Identificamos sete grandes questões: questões organizacionais e legais ou como devem
funcionar os estágios; questões da relação interinstitucional ou como fazer parcerias;
questões pedagógicas ou como se da o processo ensino-aprendizagem; questões éticas
ou o que é certo e o que é errado; questões ideológicas ou como deve ser o profissional
que queremos formar; questões relacionais ou sobre o lugar do supervisor; questões
sobre a formação ou será que vocês (da universidade) estão fazendo o que deve ser
feito? Neste trabalho não apresentamos os conteúdos referentes às questões 1, 2 e 7.
Vamos focar as questões mais especificas sobre a formação.
O foco do primeiro Encontro foi a apresentação geral tanto do curso (Projeto Político-
Pedagógico – PPP – do campus, organização dos módulos e do estágio) quanto dos
locais de estágio. Não foi feito um relatório formal desse evento e consideramos que sua
importância está em inaugurar um espaço de trabalho coletivo. Nesse encontro ficaram
claras nossa intenção e a forma como gostaríamos de aproveitar a oportunidade com os
preceptores/supervisores.
O QUE SURGIU NOS ENCONTROS
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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Um dos primeiros temas foi o perfil desejado do aluno, o que remeteu à avaliação e às
expectativas que a universidade e os supervisores têm. Partindo dos itens descritos no
Roteiro de Avaliação, elaborado por nós e enviado aos supervisores no início do
estágio, esclarecemos e discriminamos diversos itens, como, por exemplo: para Postura
Pessoal e Profissional apontamos a importância da adequação ao contexto e tarefa, a
percepção da consequência de seus atos, o respeito à hierarquia e a percepção dos
diferentes graus de importância das atividades no estágio. Atitudes que demonstram
maturidade, tais como conter impulsos, elaborar emoções, discutir problemas de
maneira adequada e suportar frustração também foram citadas como necessárias. Além
disso apontamos o envolvimento, o interesse e a observação de critérios éticos como
fundamentais para o desenvolvimento profissional.
Quanto ao item Reflexão indicamos que ele se refere à qualidade das discussões e à
postura do aluno frente ao saber e ao aprendizado, como, por exemplo, se ele aceita
passivamente ou reflete, se discute e questiona de maneira produtiva a instituição e seus
métodos e se faz proposições. Também consideramos o domínio do conteúdo e a
autonomia na busca de informações, a capacidade de transferir os conteúdos de uma
situação a outra e a possibilidade de localizar o serviço em um contexto amplo,
percebendo as inter-relações, limites e possibilidades institucionais, refletindo com base
em dados epidemiológicos e embasados em conhecimento científico.
As habilidades para o trabalho em equipe foram consideradas como ponto forte dos
alunos pela maioria dos supervisores, que também elogiaram a ética, a responsabilidade,
a postura ativa na busca de informação e na criação de recursos para as intervenções.
Partindo dessa temática, no Encontro seguinte iniciamos com uma apresentação das
Diretrizes Curriculares para o curso de Terapia Ocupacional e conversamos sobre as
habilidades necessárias a todo profissional da saúde, que devem também ser
desenvolvidas na graduação. São elas:
Atenção à saúde – habilidades para trabalhar nos níveis preventivos e de promoção à
saúde, de proteção e reabilitação, desenvolvendo ações tanto individuais quanto
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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coletivas. A prática profissional deve integrar-se aos demais níveis de atenção e ser
ampla para compreender as diversas dimensões das ações em saúde. O profissional deve
oferecer serviços de qualidade seguindo padrões éticos e buscando a resolução dos
problemas que para ele se apresentem.
Tomada de decisões visando ao uso apropriado, à eficácia e ao melhor custo-efetividade
dos recursos humanos e materiais – capacidade para avaliar sistematizar e escolher as
condutas mais adequadas, baseadas em evidências científicas.
Comunicação: capacidade para comunicação verbal e não verbal, escrita e leitura,
domínio de ao menos uma língua estrangeira e de tecnologias da informação visando
tornar a comunicação acessível tanto para outros profissionais quanto para os
beneficiários das intervenções. Deve ser mantida a confidencialidade das informações a
ele confiadas.
Capacidade para assumir liderança visando ao bem-estar da comunidade: exige
compromisso, responsabilidade, empatia, além das habilidades descritas acima.
Habilidades de administração e gerenciamento: exigem iniciativa, empreendedorismo,
liderança.
Os profissionais devem ser capazes de aprender continuamente e desenvolver
responsabilidade e compromisso com esses aspectos de sua profissão. Devem também
comprometer-se com a formação de outros profissionais para que haja benefício mútuo
e melhora na oferta de serviços a sociedade.
A partir dessas questões os participantes foram convidados a relatar situações em que
essas habilidades eram estimuladas e desenvolvidas e suas dificuldades tanto em relação
a esses aspectos quanto em relação aos aspectos mais técnicos e específicos. Em geral
essas habilidades gerais parecem estar mais incorporadas do que as específicas. Os
supervisores relataram dificuldades nos seguintes aspectos: os alunos levantam as
demandas, mas não sabem o que fazer com essas informações; não sabem se colocam o
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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foco da intervenção na queixa ou nos desejos dos usuários; não conseguem
correlacionar as informações com as propostas de intervenção, têm raciocínio clínico
pouco desenvolvido; referem que não se lembram de conteúdos já vistos na graduação
ou que os conteúdos não foram estudados. Também têm dificuldades em correlacionar
os conteúdos vistos para uma situação com outra situação semelhante.
Na discussão fomos trabalhando qual é o perfil profissional que estamos esperando e
que utilizamos ao julgarmos o aluno e sua formação. Alguns supervisores, não docentes
e docentes, enfatizavam a necessidade dos conteúdos específicos enquanto outros
percebiam que as habilidades gerais permitiriam ao aluno progredir com autonomia. Ao
longo da discussão foi ficando claro que o desenvolvimento do raciocínio clínico e a
aquisição de todas as habilidades constituem um processo longo que estava apenas se
iniciando nessa etapa dos estágios. A questão que surgiu nesse momento foi sobre
estratégias para auxiliar os alunos nesse processo.
Esse conjunto de observações mostra-nos como é complexa a formação do terapeuta
ocupacional em geral e, mais especificamente, o desenvolvimento do raciocínio clínico.
É necessário desenvolver uma maneira de pensar que exige o resgate e a integração
entre conteúdos teóricos e práticos já vistos, a localização da situação atual e suas
demandas e a visualização de um caminho a seguir (MARCOLINO, 2009).
Os supervisores dizem também, em tom de crítica, que os alunos têm necessidade de
usar o profissional como modelo e que têm medo de arriscar. Conversamos sobre essa
forma de aprender e sobre o momento da formação em que se encontram os estagiários
e discutimos qual seria a postura do supervisor para auxiliar o aluno na construção desse
pensamento complexo. Os participantes questionaram sobre o nível de maturidade dos
alunos e a distância que há entre eles e os profissionais. Perguntaram-se: o que eles (os
alunos) podem?
A partir disso foram feitas sugestões concretas, tais como o envio de conteúdos
desenvolvidos nos módulos para saber o que oferecer e o que resgatar, a implementação
de exercícios, estudos de caso, estágios de observação. Também foi sugerido que alunos
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
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estagiários fizessem apresentação de casos para alunos do 3.º ano que estão nos
módulos teóricos. Essa última sugestão nos traz a imagem de um primeiro degrau, a
ideia de que o raciocínio do aluno do 4.º ano poderia ser quase que uma ponte para o
raciocínio do profissional mais experiente.
Outra estratégia proposta foi a escrita. Supervisores relataram como utilizavam o
material escritos pelos alunos. Relatórios ou diários de campo podem ser usados apenas
para registrar e prestar contas do que foi feito ou como espaço de elaboração na medida
em que sistematizam, criam a possibilidade de reflexão e de retorno ampliando a
comunicação entre aluno e supervisor.
Após essa conversa, os participantes retomam o assunto da avaliação do aluno e se
perguntam sobre a possibilidade de fazer uma avaliação mais processual. Reconhecem a
diferença entre os alunos e a dificuldade de saber o quanto cada um avançou no estágio.
Percebem também a complexidade da tarefa pedagógica.
Cada supervisor contou como fazia sua avaliação e quais estratégias utilizava, citando
diversos exemplos, tais como: estudos de caso com correção e devolutiva para que o
aluno pudesse ir completando, autoavaliação usando como base o roteiro, seguida de
discussão individual ou em grupo, incorporação da avaliação de outros terapeutas da
instituição que tivessem contato com os alunos, criação de um produto que podia ser a
organização de um evento, a elaboração de um artigo, uma palestra ou apresentação de
caso etc. Uma das supervisoras mostrou uma folha de avaliação na qual os alunos
avaliam o estágio e a supervisora ao final do processo.
Algumas conclusões importantes a que o grupo chegou foram que a avaliação deve ser
processual, os itens devem ser discutidos e exemplificados; é desejável discutirmos
mais qual é o perfil de profissional que se deseja formar; o aluno deve ser capaz de
contextualizar o que aprendeu e de buscar instrumentos; a avaliação deve ser ampla e
incluir aspectos tais como a relação com a equipe, com o paciente e com a teoria –
técnica; o aluno deve ser principalmente avaliado em relação a ele mesmo, ou seja, a
seu processo, desde que contemple o mínimo desejável.
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No último encontro, um dos principais temas foi a função de supervisor. Ao refletirem e
avaliarem como estavam vivendo essa função e que lugar ela ocupa no cotidiano
institucional, os presentes levantaram as seguintes questões:
- Como é ser supervisor? O que é ser supervisor? Qual é a formação necessária para
essa função? Como instrumentalizar o supervisor? Quanto o supervisor pode ou deve
colocar ao aluno suas próprias concepções? E se elas forem diferentes da concepção do
curso? O que a universidade espera do supervisor e vice-versa? Como saber sobre sua
eficiência como supervisor?
Os coordenadores do Encontro reiteraram a intenção de ampliar os espaços de formação
e a importância de produzir conhecimento a partir do que se faz e do que se é. A
aproximação com os cenários reais oferece essa oportunidade. Também foi ficando
clara a necessidade de maior contato entre a instituição de ensino e os supervisores, o
que possibilitaria que essas questões pudessem ser abordadas nas situações concretas do
dia-a-dia. Foi sugerida a criação de um espaço virtual onde colocar textos, eventos e que
permitisse a conversa entre supervisores. Também decidimos manter um encontro
semestral geral e outro menores, em Santos e em São Paulo, ou apenas reunindo pessoas
de uma determinada área.
Os supervisores não docentes relataram dificuldades em conciliar as demandas da
instituição e a organização do serviço com a atenção aos estagiários. Alguns se sentiram
em dívida com os alunos, divididos em suas diversas atribuições e na mistura de papéis,
por exemplo, como coordenadora de serviço e também ser supervisora, como ser
supervisora sem ser preceptora. Os supervisores docentes, por sua vez, relataram a
dificuldade de estar em uma instituição sem fazer parte efetiva dela, sem conhecer e
compreender as questões mais amplas que envolvem e atravessam a clínica.
Também ficaram em dúvida a respeito do quanto devem ser exigentes, tanto em termos
de conduta e atitudes gerais, tais como pontualidade, vestimenta, etc. quanto em termos
de conteúdos que talvez já devessem estar consolidados. Os supervisores relataram
diversas estratégias para lidar com essas dificuldades: elaborar manuais específicos e
entregar aos alunos, conversar logo no início sobre as regras gerais da instituição, ir
Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, 2010, v. 18, Suplemento Especial
370
trabalhando esses aspectos na medida em que vão surgindo para que o aluno
compreenda a partir da própria experiência e das consequências de seus atos etc.
Surgiram novas questões: Que distância devemos manter do estagiário? Como manter a
hierarquia? Colocando regras? Será que isso é necessário? Qual a diferença entre
hierarquia e autoridade, entre rigidez e distância e respeito? Como auxiliar o aluno a se
diferenciar do paciente quando a faixa etária é muito próxima? Como auxiliar o aluno a
encontrar um lugar confortável, uma boa distância? Como manter o lugar de supervisor
quando a idade é também próxima?
Os supervisores argumentam que essa última questão é relativa, pois depende de cada
caso e de cada local. O interessante é que o aluno consiga perceber o que cada caso
precisa, para que possa aprender como se comportar em outras situações. Alertam para
o risco de o supervisor usar a rigidez para se defender da insegurança frente a essas
questões ao invés de se abrir para o diálogo e para a construção conjunta.
Abordaram novamente o processo de aprendizagem: Como favorecer esse processo? O
que ensinar? Em que ponto do processo de amadurecimento está o aluno? Por que os
alunos dizem que não sabem, será que não foi ensinado ou não foi aprendido? O que
cabe à universidade e o que cabe ao supervisor? Até que ponto devemos rever o
conteúdo ou cobrar o que já foi visto? Qual é a profundidade necessária para um aluno
de graduação? Como não esquecer que ele está no início de sua formação e que,
portanto não poderá saber tanto quanto o profissional mais experiente? Como fazer uma
boa orientação de estudos com a diversidade de alunos?
Alguns supervisores relataram que, com o tempo, eles também estão conseguindo
aprender e avaliar o que funciona ou não. Indicam que a retomada de conteúdos quando
são efetivamente necessários para a compreensão do que os alunos estão vivendo traz
outro sentido ao aprender. Os supervisores também apontaram o risco de os alunos
colocarem a teoria entre eles e os pacientes, também impedindo, de outra maneira, o
aprendizado.
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Foi enfatizada a importância, para os alunos, de terem vários modelos e de viverem
diferenças entre a realidade da graduação e dos serviços, e o quanto isso era
enriquecedor para que, posteriormente pudessem se posicionar. As contradições e os
conflitos a que os próprios supervisores estão expostos nos seus locais de trabalho
também compõem o aprendizado. Argumentam que o conteúdo será adquirido com a
prática e que é importante conhecer como funciona o serviço, o que é ser terapeuta e
como aprender.
Os supervisores ainda enfatizaram a necessidade de diálogo com a instituição de ensino
e de feedback dos alunos para que possam se ver no processo. No entanto, tanto
supervisores quanto docentes vivem situações de conflito e de busca de estratégias, pois
não há respostas prontas para essas questões. Há uma ilusão de que a academia sabe
como ensinar, mas isso é uma questão de todos.
Consideramos que essa conclusão foi o grande ganho desses encontros, tanto para o
corpo docente quanto para os supervisores, pois apenas a partir da possibilidade de fazer
perguntas e de trabalhar as respostas é que conseguimos tratar a questão da formação
considerando sua complexidade.
O retorno de alguns temas nos vários Encontros sugere o aprendizado em espiral
(PICHON-RIVIERE, 1975) com a possibilidade de aprofundamento dos temas e
exposição pessoal dos participantes e seus referenciais, sugerindo maior integração
entre o discurso manifesto e o latente. O dispositivo grupal coordenado de forma a dar
espaço para a fala e dúvidas de todos os participantes parece ter oferecido a
possibilidade de pensamento e elaboração, de revisão de imagem e idéias já
consolidadas, de aprendizado e construção coletiva de conhecimento.
Os participantes relataram também que a oportunidade de expor dúvidas os ajudam a
identificar questões em comum entre os diversos campos de estágio, a diminuir a
ansiedade e a solidão da preceptoria/supervisão, além de contribuir para a definição de
formas de abordar casos e teorias com os alunos, sendo, portanto, um potente espaço de
formação e articulação.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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RIBEIRO, E. C.; MOTTA, J. I. J. Educação permanente como estratégia na
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