Escavadeira e Mão Hidráulica. Kawana- Monique -Roseli Junho 2013
AMECIP, Monique Menezes, 29 Junho
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III Congreso Internacional de Ciencia Poltica
Associacin Mexicana de Ciencias Polticas
Instituies de Auditoria Superior: uma anlise comparada
entre Brasil e Mxico
Por: Monique Menezes1
Ygor Rafael Leite2
Guadalajara, Julho de 2015
1 Doutora e Mestre em Cincia Poltica em Cincia Poltica pelo Instituto Universitrio de Pesquisa do Rio de Janeiro (IUPERJ). Durante o doutorado foi contemplada com uma bolsa sanduche na University of California, San Diego - UCSD sob orientao do professor Mathew McCubbins. Atualmente professora do Programa de Mestrado e da graduao em Cincia Poltica da UFPI. 2 Graudado em Cincias Sociais pela Universidade Federal do Piau. Atualmente, aluno do programa de mestrado em Cincia Poltica da UFPI.
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Resumo
O presente artigo tem por objetivo analisar a accountability horizontal a partir da anlise das
Instituies de Fiscalizao Superior IFS do Brasil e do Mxico. Esses rgos atuam no controle da
burocracia do Executivo em conjunto com o Poder Legislativo, entretanto, costumam ser
negligenciado pela literatura de Cincia Poltica. Em geral, os acadmicos enfatizam apenas a funo
estritamente legislativa do parlamento, deixando de lado a importncia do seu papel fiscalizador.
Mais especificamente, o estudo analisar o desenho institucional e o desempenho das instituies de
controle externo do Brasil e do Mxico. A questo de fundo neste caso : Em que medida as
instituies de fiscalizao contribuem para a qualidade da democracia?
Palavras chaves: accountability horizontal, democracia e instituies.
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1 Introduo
Entre 1974 e 1990 o mundo passou pelo o que Huntington (1991) denominou a terceira
onda de democratizao. Ao fim da dcada de 1990 observamos que a democracia
representativa prevaleceu sobre outras formas alternativas de governo, na maior parte do
mundo. Em uma pesquisa com 192 pases realizada pela Freedom House (2005), 62% das
naes foram classificadas como democracias. Como argumentado por Alonso, Keane e
Merkel (2011: 2), essa juno entre representao e democracia foi conveniente para
melhorar a legitimidade e a efetividade dos governos. Isto por que a democracia
representativa consiste em um tipo de governo no qual os eleitores escolhem, entre no
mnimo dois concorrentes, seus representantes e so livres para alterarem suas
preferncias nas eleies seguintes, de acordo com os seus interesses. Este processo implica
em uma delegao de tarefas que os cidados realizam para os governos representativos,
escolhidos por eleies regulares.
No entanto, as anlises comparadas realizadas mostram que o novo regime bastante
diferente entre os pases. Embora a existncia de eleio livre e justa seja a pea
fundamental para a caracterizao da democracia, o regime tambm deve assegurar o
primado da lei, o respeito aos direitos dos cidados, o controle e a fiscalizao dos
governantes e da sua burocracia. Neste sentido, a literatura atual tem focado no mais na
abordagem democracia x ditadura, e sim na qualidade do regime democrtico (Diamond e
Morlino, 2004; ODonnell, 2004, Moiss, 2008, entre outros).
Nesta literatura, destaca-se o trabalho realizado por Diamond e Morlino (2005) que
conceituam e analisam a qualidade da democracia representativa. Neste linha de
argumentao, a qualidade do regime democrtico consiste em um governo que prov aos
seus cidados: alto grau de liberdade, igualdade poltica, controle popular sobre as polticas
pblicas, instituies estveis e lcitas e polticas que sejam legitimadas pelos eleitores
(Diamond e Morlino, 2005: xi).
Seguindo o modelo analtico dos autores, a qualidade da democracia apresenta um conceito
multidimensional, no qual a accountability dos agentes pblicos fundamental. Destaca-se
que em um regime no qual os cidados delegam poderes aos seus representantes, a
fiscalizao do eleitor no suficiente, faz-se necessrio instituies de controle que possam
controlar constantemente, os atos dos gestores. Deste modo, os ocupantes de cargos
pblicos, sejam eles eleitos ou burocratas, devem ter seu poder contrabalanceado por
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instituies de controle dentro do Estado, cuja misso seja monitorar, fiscalizar e punir
aes que sejam consideradas ilegais. Essa ao dentro do Estado foi denominada por
ODonnell (1994) de accountability horizontal.
Neste contexto, o escopo deste artigo analisar o controle externo do poder Legislativo
exercido pelas Instituies de Fiscalizao Superior no Brasil e no Mxico. Mais
especificamente, o estudo analisar o desenho institucional e o desempenho das
instituies de controle externo dos pases selecionados. A questo de fundo neste caso :
Em que medida as instituies de fiscalizao superior contribuem para a qualidade da
democracia?
A metodologia selecionada para esta anlise de cunho qualitativo. A primeira tcnica
escolhida foi a anlise comparativa qualitativa, este tipo de enfoque permite ao pesquisador
realizar anlises comparadas, estabelecendo relaes entorno dos casos analisados e o
modelo terico utilizado. O segundo procedimento utilizado foi a anlise documental,
especificamente, a de discurso. A anlise de discurso tem como ponto central a busca do
conhecimento de uma realidade por detrs do texto, por meio de um estudo crtico do
documento.
Por fim, o artigo est dividido cinco partes, considerando esta introduo e a concluso. Na
prxima seo apresentamos uma breve discusso sobre a qualidade da democracia. Em
seguida analisamos a relao entre a accountability horizontal e a qualidade da democracia.
Para, finalmente, expormos o estudo comparado do controle externo nos pases
selecionados.
2 Qualidade da Democracia
A consolidao do processo de democratizao iniciado na dcada de 1970 do sculo
passado modificou a ateno dos pesquisadores, que antes estavam preocupados em
explicar o processo de transio democrtica. Atualmente, a literatura tem se concentrado
em explicar a variao existente entre as instituies democrticas de distintos pases. Como
argumentado por Hagopian (2005), enquanto algumas naes da Amrica Latina como
Colmbia e Venezuela tm apresentado uma certa eroso em seus regimes democrticos
com desrespeitos aos direitos civis e polticos e medidas populistas, outros pases mostram-
se estveis democracias. O que explicaria essas diferenas entre os pases da regio?
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A qualidade da democracia em pases como Costa Rica e Uruguai tem sido apontada como
varivel chave desta estabilidade. Em outras palavras, a qualidade das instituies que
resultaram do processo de redemocratizao do sculo passado afeta diretamente o grau da
qualidade da democracia representativa atual nos diversos pases.
Na definio minimalista o regime democrtico representativo composto por: a. sufrgio
universal da populao adulta; b. eleies sistemticas, livres, competitivas e justas; c. mais
de um partido competindo; e. fontes alternativas de eleies. Esta viso do regime
democrtico, inaugurada por Schumpeter (1950) tem como principal crtica o fato de
concentra-se no processo eleitoral e conferir pouca ou nenhuma ateno ao que ocorre nas
demais instituies democrticas como o Judicirio, as instituies de controle externo, a
polcia, dentre outras. Dahl (1971) complementa o conceito, acrescentando a necessidade
de assegurar a contestao do pblica e a participao efetiva dos cidados, de modo que
possam participar da escolha dos representantes e que eles prprios tambm possam
competir por cargos pblicos. Alm disso, o autor tambm inclui a obrigao da
responsividade contnua dos governantes para com a sociedade.
Como argumentado por Moiss (2008, p. 66), o processo de democratizao garante,
especialmente, a igualdade perante a lei e os direito de participao e representao no
regime democrtico. Contudo, outros princpios relacionados boa governana do regime
transparncia, responsabilizao e a universalizao so etapas complementares que se
consolidam junto com o novo regime poltico. Em funo disso, observa-se na anlise
comparada entre os pases que o avano de cada uma dessas etapas avana de forma
gradual. Da que se coloca a questo da qualidade da democracia, no sentido de
verificarmos como as diferentes dimenses do regime representativo se desenvolveram nos
distintos pases.
A definio sobre a qualidade da democracia apresentada por Diamond e Morlino (2005)
tem sido a mais difundida pelos estudiosos do tema, para a operacionalizao e medio do
que seria uma boa democracia. Os autores iniciam o argumento considerando que uma
democracia com qualidade seria aquela que provesse aos seus cidados um alto grau de
liberdade, igualdade poltica e controle popular sobre as polticas pblicas e com
governantes que atuem de forma legtima, de acordo com a lei (p. xi). A partir desta
definio, os autores identificam oito dimenses, segundo a qual a qualidade da democracia
pode variar. As cinco primeiras, so caracterizadas como procedimentais, a saber: o primado
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da lei, participao poltica, a competio poltica e a accountability horizontal e vertical. O
ponto central dessas dimenses consiste no fato de que em uma democracia, as instncias
participativas devem ir alm da disputa eleitoral, com a participao de uma sociedade civil
ativa e mobilizada que participe das decises pblicas.
As outras duas dimenses apresentadas pelos autores referem-se ao contedo da
democracia, so elas: primeiro, o respeito pelas liberdades civis e os direitos polticos e,
segundo, a progressiva igualdade poltica. Essas duas dimenses normativas assegurariam a
legitimidade do regime, sob o qual foram constitudas as representaes e os valores dos
indivduos em uma dada sociedade (Moiss, 2008). Por fim, a dimenso da responsividade
dos governantes, no qual se verifica em que medida as polticas pblicas atendem s
demandas e s preferncias dos cidados.
A partir dessa definio, bons resultados dessas dimenses resultaria em uma boa qualidade
da democracia. Seguindo a argumentao de Diamond e Morlino (2005, p. xiv a xxxi ), cada
uma das oito dimenses podem ser detalhadas da seguinte forma:
1. O primado da Lei uma boa democracia deve apresentar leis claras, universais,
publicamente conhecidas, estveis e devem ser aplicadas a todos,
independentemente, do posicionamento social dos indivduos na sociedade.
(ODonnell, 2005, p. 4). Em outras palavras, a lei deve ser igual para todos os
cidados.
2. Participao o regime democrtico deve garantir um alto grau de participao dos
cidados nas eleies e nas decises pblicas. Os indivduos devem participar de
forma ampla, alm do voto necessitam se fazer representados em conselhos
deliberativos, plebiscitos, associaes, etc. Um exemplo so as instituies
participativas criadas a partir da Constituio de 1988 no Brasil. Destacam-se os
conselhos municipais obrigatrios para reas importantes como a sade e a
educao e o oramento popular existente em vrias cidades brasileiras.
3. Competio para ser considerada uma democracia, o regime poltico precisa
garantir eleies livres e regulares, alm da competio entre dois ou mais partidos.
No entanto, os regimes variam bastante no seu grau de competitividade e na
abertura da arena poltica para novas foras polticas e sociais. De forma ampla, esta
dimenso inclui tambm o desenho do sistema eleitoral, considerando que a
representao proporcional resultaria em uma melhor democracia, na medida em
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que expande o acesso das diferentes foras sociais arena poltica e permite a
representao de grupos minoritrios no parlamento, tais como mulheres, grupos
tnicos, ativistas ambientais, etc. Como discutido por Liphart (2003), o sistema
eleitoral proporcional apresenta um modelo decisrio mais democrtico, na medida
em que a deciso negociada incluindo diferentes grupos sociais no parlamento.
4. Accountability vertical esta dimenso garante que os polticos eleitos devem
responder por suas aes aos cidados. Dimond e Morlino (2005) destacam trs
caractersticas da accountability vertical: informaes, justificativas e punio. A
publicidade das informaes sobre as aes do governo e da burocracia so
fundamentais para que os polticos realizem aes responsveis e que as mesmas
cheguem de forma clara ao eleitor. O governo tambm deve justificar suas aes
aos cidados, como forma de explicar os motivos para tomada de determinadas
decises. Por fim, o cidado deve ser capaz de punir ou recompensar os polticos, de
acordo com as informaes e justificativas apresentadas sobre suas aes ao longo
de um dado perodo. A principal forma de punio ou recompensa o voto, no qual
um poltico bem avaliado pode ser reeleito ou, em caso de uma m avaliao,
punido com a perda do mandato.
5. Liberdade em um regime democrtico esta dimenso deve ser avaliada a partir de
trs direitos: civil, poltico e social. O direito civil estaria relacionado liberdade de
forma ampla: expresso, associao, pensamento, informao, religiosa, formao
de sindicatos e partidos, etc. Diamond e Morlino (2005) tambm destacam a
existncia dos direitos econmicos, que no inclui apenas a propriedade privada,
mas tambm o emprego e a barganha coletiva por melhores salrios. Em segundo
lugar, o direito poltico engloba a ao poltica plena votar e ser votado para
cargos pblicos, bem como organizar-se politicamente atravs de partidos e outras
associaes. So esses direitos que possibilitam a participao e a competio
poltica e, consequentemente, a accountability vertical. Destaca-se, ainda, que uma
boa democracia deve garantir que a escolha dos eleitores seja secreta, de forma a
evitar coeres ou ameaas. Por fim, o direito social est relacionado a um patamar
mnimo de igualdade entre os cidados, de modo a garantir a capacidade de
reivindicao dos demais direitos relacionando-se, assim, s polticas de bem-estar
social.
6. Igualdade esta dimenso fundamental para a qualidade da democracia, na
medida em que para o funcionamento das dimenses citadas acima se faz
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necessrio um patamar mnimo de equidade. Uma boa democracia deve garantir
que todos cidados e grupos sociais possuam os mesmos direitos e proteo legal,
impedindo a discriminao de grupos minoritrios como gnero, etnia, religio,
orientao poltica e sexual ou por qualquer outra condio externa.
7. Responsividade est relacionada ao atendimento do governo e da burocracia s
demandas e expectativas dos cidados. A responsividade significa que os polticos
eleitos e as instituies esto respondendo de forma plena aos anseios dos
indivduos, atravs de polticas pblicas direcionadas, tanto economia, quanto
rea social. Esta dimenso amplamente relacionada accountability vertical e
horizontal, competio e participao.
8. Accountability horizontal para a qualidade da democracia tambm se faz
necessrio que os polticos eleitos e a sua burocracia respondam por suas aes
instituies de controle e fiscalizao, existentes dentro do Estado, que possuam
poder legal para impor sanes aos atos ilegais. As relaes de accountability
horizontal, em oposio vertical, ocorre dentro do Estado atravs do
monitoramento e da investigao realizada por instituies como: comisses
parlamentares, corte constitucional, instituies de combate corrupo,
instituies de fiscalizao superior, tribunal eleitoral independente, dentre outras.
Contudo, sua caracterstica crucial a possibilidade de impor sanes aos polticos e
aos burocratas que apresentem um comportamento margem da lei.
Este artigo enfatiza a anlise da qualidade da democracia luz da accountability horizontal,
especificamente, atravs da anlise do controle externo exercido pelas Instituies de
Fiscalizao Superior dos pases selecionados: Brasil e Mxico. Deste modo, a prxima seo
apresenta uma anlise mais detalhada do tema para em seguida discutimos os resultados
empricos do trabalho.
3 Accountability Horizontal e Qualidade da Democracia
O termo accountability tem sido amplamente debatido pela literatura de cincia poltica,
apresentando grande centralidade na discusso sobre democracia representativa. No
entanto, sua definio nem sempre apresentada de forma clara e objetiva, tendo em vista
a amplitude do seu conceito, que nos permite aplic-lo em diferentes contextos de anlise.
De forma ampla, accountability existe quando h uma relao em que as tarefas e
resultados da ao de um indivduo ou de uma instituio esto sujeitas superviso de
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outro indivduo ou instituio. Neste artigo, utilizamos a definio apresentada por Pelizzo e
Stapenshurst (2013), que especificam a accountability a partir de dois estgios, a saber:
responsabilizao (answerability) e aplicao de normas (enforcement). Nas palavras dos
autores: Answerability means having the obligation to answer questions regarding
decisions and/or actions. (...) Enforcement, by contrast, suggest that the public or the
institution responsible for the accountability can sanction the offending party or remedy the
contravening behavior. (pg, 2). Este conceito pode ser ainda mais especfico, a partir da
classificao do tipo da accountability: horizontal, vertical ou social. A nfase deste artigo
recai sobre a accountability horizontal, definida na seo anterior.
As Instituies de Fiscalizao Superior IFSs so classificadas como uma ferramenta da
accountability horizontal. A fiscalizao e o monitoramento da burocracia e dos polticos por
outras agncias de Estado consiste em um elemento fundamental para a qualidade da
democracia representativa, uma vez que a delegao de poderes inevitvel neste regime
(Kiewiet e McCubbins, 1991; Przeworski, 2003). Alm da delegao dos eleitores para os
polticos durante o perodo eleitoral, temos uma cadeia de delegao dentro do Estado. Em
regimes presidencialistas, como ocorre na maioria dos pases da Amrica Latina, o
presidente delega poderes aos seus ministros e burocracia, ao mesmo tempo, o Congresso
incumbe, internamente, funes s suas comisses especializadas e, externamente,
burocracia. Este processo inclui um complexo de relaes hierrquicas, no qual as
Instituies de Fiscalizao Superior monitoram e fiscalizam as aes, dos polticos eleitos e
da burocracia.
Como apresentado por Pelizzo e Stapenshurst (2014), as IFSs realizam auditorias
financeiras, conformidade (legal) e performance. Muitas dessas instituies constituem-se
rgos auxiliares ao Poder Legislativo, ajudando no controle externo deste poder sobre o
Executivo. Em funo disso, os autores argumentam que a relao entre as IFSs e o
Legislativo , frequentemente, simbitica. O Legislativo depende da instituio de controle
externo para obter informaes confiveis, enquanto o rgo depende do Congresso para
expor em um frum democrtico os resultados de suas auditorias, recomendaes e
sanes (Pelizzo e Stapenshurst, 2014: 49). Entretanto, existem situaes em que esta
proximidade no ocorre e que a fiscalizao superior acontece de forma isolada dos
parlamentares. O que de um lado aumenta a autonomia da instituio, mas reduz sua
legitimidade democrtica, especialmente, para a realizao de sanes.
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Do ponto de vista da qualidade da democracia na Amrica Latina, um dos principais desafios
a efetividade dos mecanismos de accountability do horizontal. A percepo a de que os
polticos no esto devidamente sujeitos s agncias de controle (Barreda, 2010). O
resultado deste dficit seria uma disseminao de prticas corruptas e arbitrrias, sem a
devida punio dos agentes pblicos na regio. Entretanto, as anlises mais gerais tm
mostrado que a qualidade da democracia na regio apresenta avanos significativos
(Hagoppian, 2005).
Neste contexto, a efetividade do controle externo exercido pelas Instituies de Fiscalizao
Superior possui um papel crucial para a accountability horizontal e, consequentemente, para
um aumento da qualidade da democracia na regio. De acordo com Dimond e Morlino
(2005), para a sua efetividade, o desenho institucional do controle externo deve possuir
iniciativa para monitorar e fiscalizar as aes dos polticos eleitos e de toda a burocracia.
Alm disso, se faz necessrio que a instituio possua ramificaes locais para avaliar as
aes dos gestores pblicos em todas as instncias administrativas do pas estados e
municpios. As investigaes devem ser realizadas de forma aleatria, mas com um
percentual significativo de auditorias, sobre o total de instituies passveis de fiscalizao.
A credibilidade de uma possvel punio tambm apresenta um papel importante na
efetividade da accountability horizontal. O principal problema das instituies de controle
consiste na inabilidade em aplicar as normas e as regras para todos. Como veremos nas
prximas sees, o Brasil possui uma instituio de controle externo com mais de cem anos
de existncia e institucionalmente bem estruturada. No entanto, em 2015 ser a primeira
vez que um Presidente da Repblica precisar explicar sua contabilidade ao Tribunal de
Contas Unio - TCU. At o presente momento, todos os Presidentes tiveram suas contas
aprovadas pelo TCU sem maiores problemas, mesmo quando havia indcios de
irregularidades.
A existncia de um sistema de diferentes agncias de accountability horizontal tambm
contribui para o bom funcionamento desta dimenso no regime democrtico. Como citado
por Diamond e Morlino (2005) e ODonnell (1998), uma rede de instituies de
accountability horizontal interagindo umas com as outras aumenta a capacidade e a
efetividade do controle. Nesta interao, a participao do Judicirio essencial. Para
ODonnell (1998), um Judicirio profissionalizado, com um oramento condizente com as
suas atribuies e dotado de autonomia em relao ao Executivo e ao Legislativo pode
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contribuir para a efetividade da accountability horizontal. Nas palavras do autor: a
accountability horizontal efetiva no o produto de agncias isoladas, mas de redes de
agncias que tm em seu cume, por que ali que o sistema constitucional se fecha mediante
decises ltimas, tribunais (incluindo os demais elevados) comprometidos com essa
accountability. (1998, p. 43).
Por fim, a literatura tambm destaca a necessidade de uma legislao que permita o amplo
acesso s informaes sobre as aes dos polticos e da burocracia. Quanto mais as aes
forem expostas e transparentes, maiores sero as chances de inibir atos de corrupo. Os
cidados, e no apenas as instituies de controle, devem possuir o direito de receberem
informaes sobre todas as aes do governo. O ideal que todos os dados sobre
contratos, oramento, pessoal, salrios, etc. sejam disponibilizadas na Internet.
Na seo seguinte analisamos a accountability horizontal no Brasil e no Mxico, a partir das
instituies de controle externo. Nossa hiptese a de que esses rgos contribuem para a
qualidade da democracia, uma vez que apresentam como principal misso inibir possveis
aes ilegais da burocracia e dos polticos eleitos, possibilitando o amadurecimento das
instituies republicanas.
4 Anlise Comparada Brasil e Mxico
Nesta seo analisamos os pases selecionados para o estudo da accountability horizontal,
Mxico e Brasil, atravs da anlise das Instituies de Fiscalizao Superior, responsvel pelo
controle externo nos dois pases. A seleo dos dois pases justifica-se pela importncia
econmica e social que ambos representam no contexto da Amrica Latina.
Como destacado por Pessanha (2009), as Instituies de Fiscalizao Superior assumiram
historicamente dois desenhos institucionais, a saber: o de tribunal de contas Brasil e o de
auditor geral. Em geral, os tribunais so constitudos por um colegiado com algum grau de
autonomia em relao administrao pblica e ao Legislativo. Sua principal caracterstica
o exerccio do controle jurisdicional, julgando as contas e imputando responsabilizao para
as irregularidades praticadas pelo agentes pblicos. Como magistrados, o colegiado possui
estabilidade garantida em lei, em muitos casos h o instituto da vitaliciedade, garantindo
autonomia nas decises. Como a indicao costuma ser realizada pelo parlamento, a
estabilidade reduz a influncia poltica da indicao.
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Nos pases de origem anglo-sax, com destaque para Inglaterra e Estados Unidos, o auxlio
ao Congresso para a fiscalizao da administrao pblica realizado pelo modelo de
auditor geral. Os exemplos mais conhecidos deste desenho institucional so o britnico
National Audit Office NAO e o americano Goverment Accountability Office GAO. As
principais diferenas em relao ao modelo de tribunal de contas a inexistncia de um
colegiado para a tomada deciso, que fica a cargo do Auditor Geral e uma maior
aproximao do Parlamento, se comparado com a estrutura do tribunal. Ressalta-se, ainda,
que h pases como o caso argentino que existe um Conselho de Contas. O modelo
praticamente, o mesmo de auditor geral, entretanto, no topo da instituio existe um
colegiado de auditores. Os auditores, em geral, possuem um mandato fixo que pode ser
estendido ou no. Uma caracterstica marcante neste desenho a concentrao de poder
no auditor.
A tradio institucional inicial da Amrica Latina foi a de tribunal de contas, mas ao longo do
sculo XX alguns pases migraram para o modelo de auditor geral. O Brasil uma das
excees da regio com o Tribunal de Contas da Unio criado ainda no sculo XIX. A
instituio passou por algumas mudanas ao longos dos anos expandindo,
significativamente, sua atuao aps a redemocratizao ocorrida na dcada de 1980. J no
Mxico temos a Auditora Superior de la Federacin ASF, com um desenho institucional de
auditor geral. A instituio bem mais recente, foi criada em 2000 em substituio a
Contadura Mayor de Hacienda.
A tabela a seguir apresenta um resumo do desenho institucional dos dois pases. Como
podemos observar o modelo dos dois pases bastante distinto. O TCU dirigido por um
rgo colegiado, formado por 9 ministros, enquanto o Mxico possui um controlador geral
no topo da ASF. Destacamos, ainda, o poder de sano do TCU que pode impor multas e
realizar determinaes, enquanto a ASF pode apenas realizar recomendaes. O
ressarcimento aos cofres pblicos no Mxico depende da atuao de outras instituies,
limitando bastante o trabalho de controle externo no pas.
Em seguida, analisamos de forma mais detalhada a efetividade das ASF e do TCU e a
contribuio das instituies de controle externo qualidade da democracia. O estudo ser
realizado a partir da anlise das seguintes variveis:
Autonomia nesta varivel verificaremos o grau de autonomia da instituio para a
realizao do controle externo.
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Desempenho da instituio esta varivel ser medida a partir da anlise do
mandato dos rgos de controle externo.
Tabela 1 Desenho Institucional das Instituies de Fiscalizao Superior Brasil e Mxico
Pas Brasil Mxico Nome da IFS Tribunal de Contas da Unio - TCU Audtoria Superior de la Federacin - ASF Clusula Constitucional Constituio de 1988, arts. 71 a 75 Reforma Const. 1999 arts. 73, 74, 78 e 79 Lei Orgnica Lei Orgnica do Tribunal de Contas da Unio de 1992,
Lei 8.443. Reglamento Interior de la Auditora Superior de la Federacin de 2001 e atualizada em 2013.
Tipo de IFS Tribunal de Contas Auditor Geral Criao 1890 2000 Estrutura Decisria Colegiada (9) Ministros Monocrtica (1) Auditor Geral Indicao do(s) Lder(es)
Legislativo (6) e Executivo (3), sendo somente 1 Ministro de livre escolha do Presidente. Os outros dois so selecionados a partir de uma lista elaborada pelo TCU. Todos devem ser aprovados pelo Senado
Controlador Geral e o Subcontrolador pelo Poder Legislativo.
Mandato Vitalcio Oito anos, sendo permitida uma reconduo Controle ex-ante No No Vnculo Auxiliar ao Poder Legislativo, mas na prtica atua com
ampla autonomia Vinculado ao Poder Legislativo (h autonomia tcnica e de gesto).
Poder de sano legal Sim. Aplicao de multas, ressarcimento de recursos pblicos, indisponibilidade dos bens, recomendar ou determinar mudanas para aperfeioar uma poltica pblica, ilegibilidade etc.
No. Depende de outras instituies para impor sanes. Realiza recomendaes e depende de outros rgos como o Ministrio Pblico para imputar sanes
Recursos das Decises Sim. Judicirio Sim. Judicirio Jurisdio Todos as instituies relacionadas ao governo central,
agncias reguladoras, servios privatizados, etc Todos as instituies relacionadas ao governo central, agncias reguladoras, servios privatizados, etc
Independncia financeira
Sim Sim
Prestao de Contas Poder Legislativo Comisso do Legislativo Tipo de Fiscalizao Auditorias financeira, regularidade e desempenho. Auditorias financeira, regularidade e
desempenho. Contas do Presidente da Repblica
Fiscaliza e emite parecer Fiscaliza e emite parecer
Fonte: Elaborao prpria
4.1 Autonomia As instituies de controle externo na Amrica Latina apresentam variadas formas de
desenho institucional e diferentes graus de autonomia. No modelo de auditor geral, o rgo
de controle externo possui maior dependncia do Poder Legislativo, enquanto o desenho de
tribunal de contas h uma maior autonomia. Contudo, os desenhos das instituies so
bastante diversificados, h casos em que o rgo de controle possui autonomia
constitucional que garante ampla autonomia em relao aos trs Poderes, como no caso dos
rgos chileno, peruano e colombiano.
O debate em torno do grau de autonomia do controle externo em relao aos
representantes eleitos, especificamente, ao Poder Legislativo objeto de discusso na
literatura especializada (Melo, 2007; Menezes 2010; Arckeman, 2011; Perez, 2011, entre
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outros). Apesar da necessidade de algum grau de autonomia tcnica esses rgos precisam
prestar contas ao Legislativo. A literatura especializada tem observado que a autonomia
varia bastante (Menezes, 2015), de acordo com as regras do desenho institucional. A
independncia total do controle externo no desejvel (Pelizzo e Stapenhurst (2014), uma
vez que em regimes democrticos todos os rgos devem responder aos polticos eleitos, a
partir de eleies limpas e justas. Contudo, um trabalho com autonomia para selecionar
auditorias e aplicar sanes importante para a credibilidade do controle externo e,
consequentemente, sua efetividade. Considerando este contexto, a autonomia analisada a
partir das seguintes caractersticas institucionais:
a) Acesso informao: O controle externo deve ter acesso aos documentos de todos
os rgos sujeitos fiscalizao;
b) Mandato dos lderes: Quanto maior o tempo de mandato dos lderes, maior a sua
independncia;
c) Seleo dos lderes: Os procedimentos de escolha dos lderes devem seguir normas
claras e objetivos;
d) Estabilidade do mandato: O mandato, a forma de seleo e a remoo dos lderes
da instituio de fiscalizao superior devem ser garantidas constitucionalmente,
garantindo a estabilidade do desenho institucional. Constituies so mais difceis
de mudar, quando comparadas s leis ordinrias;
e) Salrios: Quanto maior a remunerao dos lderes e dos demais auditores, melhor
ser a atrao de bons quadros para a instituio de controle;
f) Oramento: Quanto maior oramento, maior a possibilidade de treinamento,
aplicao de bons mtodos de auditoria e capacitao tcnica (Blume e Voigt, 2007:
9)
Acesso informao
A anlise comparada dos pases selecionados a partir das caractersticas descritas acima
mostra algumas convergncias. Tanto no Brasil quanto no Mxico, foi possvel observar na
legislao acesso o livre s informaes, por parte do controle externo.
Art. 2 Para desempenho de sua competncia o Tribunal receber, em cada exerccio, o rol de responsveis e suas alteraes, e outros documentos ou informaes que considerar necessrios, na forma estabelecida no Regimento Interno. (Lei N 8.443 - 1992, Brasil).
Art.15 X. (...) La Auditora Superior de la Federacin tendr acceso a la informacin que las disposiciones legales consideren como de carcter reservado,
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confidencial o que deba mantenerse en secreto, cuando est relacionada directamente con la captacin, recaudacin, administracin, manejo, custodia, ejercicio, aplicacin de los ingresos y egresos federales y la deuda pblica, estando obligada a mantener la misma reserva o secreca, hasta en tanto no se derive de su revisin el fincamiento de responsabilidades. (Ley de Fiscalizacin y Rendicin de Cuentas de la Federacin -2009, Mxico)
No caso do Brasil, a Lei de Responsabilidade Fiscal n 101 de 2000 e a Lei de Acesso
Informao n 12.527 de 2011 foram fundamentais para aumentar o grau de transparncia
das contas pblicas. Embora o acesso informao j estivesse previsto na Constituio de
1988, somente em 2011 houve uma normatizao. No que se refere Lei de
Responsabilidade Fiscal brasileira, sua regulamentao auxilia o TCU na anlise das contas
pblicas.
No Mxico tambm h uma norma legal que garante transparncia gesto pblica, criada
em 2002 e denominada Ley Federal de Transparencia y Acceso a la Informacin Pblica
Gubernamental. Seus objetivos so proporcionar acesso seguro de todas s informaes no
mbito dos Poderes, rgos de autonomia constitucional ou legal autnomos e de qualquer
outra entidade da Federao.
Mandato dos Lderes
No que se refere ao mandato, a literatura entende que quanto maior o perodo frente do
controle externo, maior ser a autonomia dos seus lderes. A Constituio brasileira garante
aos ministros que compe o Tribunal de Contas da Unio (TCU) as mesmas prerrogativas
dadas aos ministros do Superior Tribunal de Justia, incluindo as questes ao tempo de
mandato, ambos possuem vitaliciedade no cargo. Depois de nomeado ministro, s possvel
a perda desse cargo em caso de sentena judicial transida em julgado, ou seja, mesmo
sendo um rgo auxiliar ao Poder Legislativo, os membros do TCU s podem perder o cargo
por meio de uma deciso do Poder Judicirio.
No caso mexicano, o Auditor Superior de la Federacin ocupa o cargo por um perodo de
oito anos, podendo ser reconduzido mais uma vez ao cargo, o que limita seu mandato a 16
anos. Blume e Voigt (2007) argumentam que quando h possibilidade de reconduo,
aumentam as chances da instituio de controle externo trabalhar em funo dos interesses
daqueles que possuem o poder de renovao do mandato, em detrimento do interesse
pblico. Assim, o ideal seria um longo mandato como ocorre no Government Accountability
Office GAO dos Estados Unidos, no qual o controlador indicado para exercer sua funo
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por um perodo de 15 anos, sem prorrogaes. Diferente do caso brasileiro, quem possui
legitimidade para julgar e, se necessrio, destituir o auditor o Poder Legislativo,
representado pela Cmara de Deputados, com a votao de dois teros (2/3) dos membros
presentes na casa.
Seleo dos Lderes
O procedimento da escolha dos lderes uma ferramenta institucional relevante, pois o
processo de escolha deve ser transparente e idneo. Quando a indicao recai em ex-
membros do governo para ocupar cargos de auditores ou de ministros, o controle externo
perde sua essncia, j que eles sero nomeados para fiscalizar possveis aes de um
governo ao qual fizeram parte. No Brasil, o colegiado de Ministros composto em sua
maioria por ex-congressistas. O efeito da politizao, no entanto, minimizado ao longo dos
anos com o estatuto da vitaliciedade (Menezes, 2013). Neste caso, temos uma composio
de tcnicos e ex-polticos que representam maiorias passadas do Congresso Nacional.
H requisitos a serem obedecidos na seleo dos ministros brasileiros conforme o art. 79 da
Constituio Federal. Entre eles esto: ser brasileiro, ter mais de 35 anos e menos de 75
anos, idoneidade moral e reputao ilibada, notrios conhecimentos jurdicos, contbeis,
econmicos e financeiros ou de administrao pblica, mais de dez anos de exerccio de
funo ou de efetiva atividade profissional.
Dos nove (9) Ministros do Tribunal de Contas da Unio trs (3) so escolhidos pelo
Presidente da Repblica, com aprovao do Senado Federal, sendo dois alternadamente
dentre auditores e membros do Ministrio Pblico junto ao Tribunal, indicados em lista
trplice pelo Tribunal, segundo os critrios de antiguidade e merecimento. Os outros seis so
nomeados livremente pelo Congresso Nacional.
A escolha do Auditor Geral no Mxico acontece por meio de uma chamada pblica realiza
pela Comisin de Vigilancia de la Cmara de Diputados. Com os nomes dos candidatos
prontos, realizada uma sabatina com os postulantes ao cargo, alguns nomes so indicados
para serem apreciado pelo poder Legislativo. Para se inscrever os candidatos precisam
seguir os mesmos requisitos que os membros do Tribunal Superior mexicano, que so:
Ser um cidado mexicano por nascimento, no pleno exerccio dos seus direitos civis
e polticos.
Ter pelo menos 35 anos de idade na data da designao;
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Gozar de boa reputao e no ter sido condenado por um crime punvel pena de
mais de um ano de priso; mas se trata de roubo, fraude, falsificao, abuso de
confiana e que fere gravemente o seu bom nome no conceito pblico,
desqualificado para o cargo, independente do perodo da pena.
Ter residido no pas durante os dois anos anteriores data da nomeao
No ter sido secretrio de Estado, o Procurador Geral da Repblica, Senador,
Deputado Federal, o governador de qualquer Estado ou Chefe de Governo da Cidade
do Mxico durante o ano anterior ao dia de sua nomeao.
interessante observarmos que os requisitos so semelhantes nos dois pases. Destacamos
o ltimo requisito da ASF que consiste no fato do candidato no ter ocupado um cargo
poltico, especificamente, na Cidade do Mxico. Esta pr-condio tem por objetivo
minimizar o efeito poltico sobre a seleo do auditor, considerando que a ocupao prvia
de um cargo importante capital do pas poderia afetar a atuao do auditor geral.
Estabilidade do Mandato
De acordo com Blume e Voigt (2007) quanto maior a estabilidade dos lderes em seus
cargos, maior ser a autonomia da instituio de controle externo. Esta estabilidade deve
ser garantida em lei. Os ministros da Corte de Contas brasileira possuem essa garantia, uma
vez que a o processo de nomeao e remoo esto garantidos na Constituio de 1988, Art.
73. Destaca-se que a alterao da Constituio brasileira requer maioria qualificada nas duas
casas, Senado e Cmara dos Deputados, em dois turnos.
O Art. 73 da Constituio apresenta as garantias dos ministros dos ministros do TCU, so
elas: vitaliciedade (no podendo perder o cargo seno por sentena judicial transitada em
julgado), inamovibilidade, aposentadoria integral, entre outros. Assim, observamos uma
ampla estabilidade do mandato para o Brasil permitindo, em tese, um trabalho bastante
autnomo.
No Mxico a nomeao e remoo do Controlador tambm consta no texto constitucional
do pas. Na Constituio mexicana h um captulo inteiro que aborda situaes de
julgamento poltico para destituio de cargos importantes, entre eles o controlador geral
da ASF. Assim, o Controlador pode ser destitudo do cargo se violar as normas dos servidores
pblicos constantes no Ttulo Quarto da Constituio Mexicana. O julgamento poltico se d
pela Cmara dos Deputados, com votao mnima de dois teros dos membros.
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As pesquisas realizadas para este artigo no localizaram informaes sobre auditores que
tenham sido destitudos do cargo em funo de um julgamento da Cmara dos Deputados.
No entanto, quando comparado ao cenrio brasileiro, podemos argumentar que a
estabilidade do mandato dos ministros do TCU maior do que do auditor geral da ASF, uma
vez que no primeiro caso h mais dificuldades para destituio.
Remunerao
A remunerao dos lderes do corpo funcional a quinta caracterstica citada pela literatura
para compor a varivel de autonomia. O argumento refere-se, sobretudo, ao salrio dos
auditores e ministros das instituies de controle. Quanto maior este valor, maiores so as
chances de atrair bons quadros para a direo e o corpo tcnico da instituio.
Uma anlise comparada dos salrios nos permite observar que os Ministros do TCU e o
Auditor Geral da ASF recebem um valor acima dos demais lderes de outros pases da
Amrica Latina, com uma mdia de $ 15 mil dlares por ms. Ao analisarmos os valores
pagos no Chile, Costa Rica e Argentina, observamos que os vencimentos variam entre $ 10 e
$ 12 mil dlares. Deve-se destacar que os Ministros brasileiros recebem acima do limite
permitido em lei para os servidores pblicos deste pas, o que denomina-se de super
salrios. A consulta realizada mostra que um dos ministros ativos chega a receber $ 23,000
por ms3. Este dado interessante, pois o TCU o responsvel por determinar o corte de
vencimentos que estejam acima do valor mximo legal, inclusive de funcionrios do poder
Legislativo.
Tabela 2 Salrio dos Controladores/Ministros (2015)
Pas Valor Mdio $ Argentina 12,891.51 Brasil 15,098.27 Chile 11,962.38 Costa Rica 11,106.904 Mxico 15.243.100
Fonte: Elaborao dos autores Atualizado em Junho de 2015 3 Os salrios de todos os servidores do TCU podem ser consultados no site da instituio. ltima consulta realizada em 31 de Maio de 2015. https://contas.tcu.gov.br/consultaRemuneracaoWeb/web/externo/consultaRemuneracao/consultarRemuneracao.xhtml 4 Consulta realizada em 13 de Junho de 2015. https://cgrfiles.cgr.go.cr/publico/jaguar/Documentos/cgr/transparencia/R-DC-038-2015.pdf
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Se consideramos as exigncias formais do cargo de liderana de uma entidade de
fiscalizao superior, seja do ponto de vista da experincia exigida, seja da responsabilidade
do cargo, os salrios oferecidos no so to atrativos quando comparados ao mercado
privado. Um profissional com a experincia necessria para ocupar o cargo de Controlador
Geral ou Ministro de uma Corte de Contas pode atingir remuneraes mais elevadas das
descritas acima. Entretanto, o prestgio e a influncia poltica do cargo faz com que ele
torne-se atrativo. Soma se a isto, o fato de que h casos, como no Brasil, que alm da
remunerao o ministro recebe diversos benefcios como auxlio moradia, carro com
motorista, telefone celular ilimitado, quotas de passagens areas e dirias, etc. Neste
sentido, consideramos que o status do cargo representa sua maior atratividade, em
detrimento do salrio.
Oramento da Instituio
O oramento da instituio de controle externo um importante indicador para sua
efetividade. A qualificao e o treinamento dos funcionrios permitem agncia aplicar
mtodos modernos de auditorias e ampliar a amostra de auditorias.
Ao logo de sua reestruturao, a ASF vem ganhando cada vez mais espao na transparncia
da gesto pblica, pois com o passar dos anos tem melhorado seu corpo tcnico e inovado
com auditorias cada vez mais especficas. Contudo, esses avanos no so maiores devido
deficincia oramentria. De um modo geral, a ASF recebe do poder Executivo um
oramento inferior ao solicitado inicialmente, o que compromete o desempenho do rgo.
J o TCU no apresenta problemas com o seu oramento. No Brasil, em geral, o poder
Executivo costuma focar os cortes oramentrios em instituies subordinadas Presidncia
da Repblica, deixando os poderes Legislativo e Judicirio livres das presses oramentrias.
O resultado desta diferena entre as instituies pode ser observado na tabela a seguir. A
tabela apresenta o oramento anual da ASF e do TCU em milhes de dlares. O oramento
do TCU cinco vezes superior ao da ASF, embora seja possvel observar um aumento
significativo do valor destinado ASF nos ltimos anos.
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Tabela 3 Oramento Anual das Instituies de Fiscalizao Superior (em milhes de dlares) 5
Ano
2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Brasil - TCU 469,018 503,668 562,821 424,405 430,415 445,563 484,024 520,800
Mxico- ASF --- --- 66,129 83,707 96,86 103,025 108,962 120,005
Fonte: Elaborao prpria
A tabela a seguir apresenta um detalhamento da evoluo do oramento da Corte de Contas
brasileira nos ltimos cinco anos. interessante destacar que o percentual do oramento do
TCU em relao ao oramento total da Unio, manteve-se estvel nos ltimos cinco anos.
Contudo, observamos um aumento real na dotao da instituio no ano de 2013, com uma
elevao de 8,6% em relao ao perodo anterior.
Tabela 4 Evoluo do Oramento do TCU - Brasil (em milhes de reais)6
Ano % em relao ao oramento da Unio
Aumento do Oramento
Execuo oramentria
2010 0,07 ---- 99,28 2011 0,06 1,5 99,43 2012 0,07 3,4 97,32 2013 0,07 8,6 99,04 2014 0,07 7,6 99,41
Fonte: Elaborao prpria Destacamos, por fim, a execuo oramentria do TCU, que dentre os cinco anos analisados
em quatro ficou acima de 99%. Este resultado significa que no h cortes ou restries no
oramento previsto no incio de cada ano, permitindo ao tribunal executar as atividades
previstas para o perodo. No Brasil a burocracia vinculada ao poder Executivo sofre bastante
com o contingenciamento oramentrio fixado pelo governo ao longo do ano, muitas
instituies conseguem executar apenas metade do valor previsto, inicialmente (Menezes,
2015, p. 113).
ndice de Autonomia do TCU e da ASF Com base na anlise documental realizada sobre a autonomia do TCU e da ASF, elaboramos
um ndice de autonomia para comparao das duas instituies. O objetivo deste indicador
apresentar um resumo das dimenses que formam a varivel de autonomia.
A anlise foi realizada a partir da tcnica Qualitative Comparative Analysis QCA. Este
procedimento de pesquisa analisa objetos em que as observaes possuem natureza
qualitativa e podem ser separadas em grupos com caractersticas distintivas e permitem
associaes sistemticas por meio de testes lgicos (Ragin 2009). Por ser qualitativa, a QCA
permite a anlise de fenmenos derivados de conceitos abstratos (Sandes, 2014; Berg- 5 Valores atualizados em Junho 2015. 6 No foram encontradas informaes sobre a execuo financeira anual da ASF.
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Schlosser, 2012), como o caso da autonomia e do desempenho das Instituies de
Fiscalizao Superior.
Dentre as tcnicas de QCA optamos por utilizar a anlise Fuzzy-set (fs-QCA), no qual
recomendada para fenmenos com grande complexidade. Em resumo, a tcnica permite a
possibilidade de classificar casos em situaes intermedirias, evidenciando que existem
diferentes situaes para a classificao de uma determinada varivel. O teste baseia-se na
localizao dos casos, associando o elemento de um caso x a um nmero em um intervalo
de 0 a 1. Por exemplo, em uma anlise sobre grau de democratizao podemos encontrar
pases com escores prximo a 1, elevado grau de democracia, enquanto outros com 0,5,
mdio grau e democracia.
A tabela a seguir apresenta as condies para composio do ndice de Autonomia para as
Instituies de Fiscalizao Superior. Cada uma das condies descritas na tabela sero
confrontadas com os resultados apresentados acima, para em seguida classificarmos o TCU
e a ASF, quanto a sua autonomia.
O valor do ndice representa uma medida de reproduo da autonomia da instituio de
accountability horizontal. O ndice aditivo e varia de 0 a 1, sendo que 1 representa o
mximo de autonomia possvel e 0 que a instituio no possui qualquer grau de autonomia.
Tabela 5 Condies para Composio do ndice de Autonomia das IFSs
Condies Descrio Valores Observaes
1 Acesso total informao 0,15 Quando h total acesso informao o total computado ser 0,20
2 Acesso parcial informao 0,05
3 Mandato vitalcio 0,10 Quando o mandato for vitalcio o total computado ser 0,20
4 Mandato sem reconduo 0,05
5 Mandato com reconduo 0,05
6 Seleo dos lderes - indicao tcnica 0,20 Quando as indicaes forem totalmente tcnica, o total computado ser de 0,20
7 Seleo dos lderes - parcialmente tcnica
0,05
8 Estabilidade do mandato - Julgamento judicirio
0,20
9 Oramento - sem contingenciamento 0,15 Quando no h contingenciamento o total computado ser de 0,20.
10 Oramento contingenciamento parcial 0,05
Autonomia Total 1,00
Fonte: Elaborao prpria.
Os dados da tabela abaixo mostram que o TCU brasileiro apresenta um elevado grau de
autonomia, com 0,85, quando comparado a sua congnere mexicana, a ASF que alcanou o
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valor de 0,50. Este resultado nos permite concluir que o TCU possui um amplo grau de
autonomia em suas aes. J ASF mostrou uma autonomia intermediria, apresentando
algumas limitaes s condies apresentadas na tabela 5.
Analisando detalhadamente as variveis que compem o ndice de autonomia, observamos
que tanto o TCU, quanto a ASF possuem amplo acesso s informaes das instituies
auditadas, em funo disso ambas obtiveram escore mximo. A segunda varivel, referente
ao mandato dos lderes, refere-se ao tempo em que o auditor ou ministro permanece no
cargo para o exerccio do mandato. O TCU obteve o valor mximo, tendo em vista que seus
ministros so beneficiados pelo instituto da vitaliciedade, ou seja, continuam no cargo at a
idade mxima para aposentadoria. Enquanto no Mxico o mandato de oito anos, sendo
ainda permitida uma reconduo. Como mencionado, a literatura aponta que um mandato
curto com a possibilidade de reconduo pode limitar a atuao do ente fiscalizador, tendo
em vista o desejo de continuidade no cargo de liderana da instituio. (Blume e Voigt,
2007).
Tabela 6 ndice de Autonomia ASF e TCU
Pas Acesso informao Mandato dos
lderes Seleo dos
lderes Estabilidade do mandato Oramento ndice
Brasil - TCU 0,20 0,20 0,05 0,20 0,20 0,85
Mxico - ASF 0,20 0,05 0,20 0,00 0,05 0,50
Fonte: Elaborao prpria. No que se refere ao processo de seleo dos lderes, o TCU obteve a pontuao mnima, j
que dois teros dos ministros so escolhidos pelo Congresso Nacional. E, em geral, essa
escolha realizada entre os prprios parlamentares (Menezes, 2015). J no Mxico, o
processo de seleo do auditor geral realizado atravs de uma chamada pblica. E o atual
auditor geral apresenta ampla competncia tcnica para ocupar o cargo, em funo disso
optamos por atribuirmos a pontuao mxima para ASF nesta varivel.
Para a estabilidade do mandato observamos que a legislao brasileira garante aos Ministros
a inamovibilidade, ou seja, a perda do cargo ocorrer somente em caso de sentena julgada
e transitada no Judicirio, caso o lder cometa alguma infrao penal. Por outro lado, no
Mxico o auditor poder ser destitudo do cargo em caso de violao de normas dos
servidores pblicos e o julgamento poltico, sendo realizado pela Cmara dos Deputados.
Consideramos que este fator enfraquece a autonomia da instituio.
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23
Por fim, a varivel de oramento mostra que o TCU no possui problemas de
contingenciamento financeiro. Ao contrrio, a instituio tem apresentado um aumento
anual do seu oramento e consegue executar mais de 99% do valor previsto no incio de
cada ano.
No foram levantadas informaes sobre o contingenciamento da ASF. No entanto, nossa
anlise documental mostrou que h uma discrepncia entre o oramento apresentado pelo
rgo de controle externo e o liberado pelo Executivo, limitando a autonomia da ASF.
4.2 Desempenho O desempenho das instituies de controle externo para a transparncia e a accountability
podem variar significativamente de acordo com o desenho da instituio superior de
controle. Em funo disto, esta subseo analisa o mandato dos rgos de controle externo,
utilizando este conceito como uma proxy de desempenho. Um mandato mais amplo no
significa necessariamente maior desempenho, ao contrrio, a instituio pode possuir tantas
atribuies que pode acabar se perdendo no seu principal objetivo. Neste sentido,
analisamos o mandato e a sua capacidade de implementao dos objetivos institucionais.
Para uma anlise do desempenho das instituies de controle externo e sua contribuio
para a qualidade da democracia a partir do aumento da transparncia e da accountability
analisamos as seguintes caractersticas institucionais:
a) Tipos de auditorias exercidas pela instituio de controle externo.
b) Mandatos realizadas ex ante ou ex post. A instituio que possui poder para realizar
auditorias ex ante podem prevenir desperdcios de dinheiro pblico.
c) Por fim, quando a instituio de controle externo possui competncia para impor
sanes sua atuao pode apresentar impactos diretos para o errio pblico. Alm
de representar um carter pedaggico, na medida em que a ameaa de ser punido
pode prevenir o mal uso do dinheiro pblico(Blume e Voigt, 2007: 8).
Tipos de Auditorias
A literatura aponta trs tipos bsicos de auditorias a serem executadas pelo controle
externo. Primeiro, a financeira cuja principal meta a avaliao da preciso das informaes
prestadas pelo rgo auditado. Segundo, a de regularidade no qual a auditoria confere se as
receitas e os gastos esto sendo autorizados de acordo com a norma legal. Este tipo de
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auditoria procura controlar a legalidade dos atos administrativos, analisando sua
conformidade com a legislao.
Terceiro, a auditoria de performance/desempenho onde verificada a eficcia e a eficincia
dos programas e polticas governamentais. A auditoria de performance/desempenho tem
como principais objetivos: avaliar o impacto de polticas pblicas, a efetividade de
programas governamentais, validar informaes prestadas pela organizao auditada,
avaliar a capacidade da organizao para cumprir sua misso, entre outras. Neste caso, o
controle externo avalia se o cidado recebe de fato os servios de acordo com os seus
interesses e demandas (World Bank, 2001; Blume e Voigit, 2007; Menezes, 2010),
verificando responsividade da burocracia e dos polticos eleitos.
O estudo comparado entre os pases mostram uma convergncia, no que se refere aos tipos
de auditorias exercidas pelas instituies de controle no Brasil e no Mxico. Em ambos, o
mandato para fiscalizao bastante amplo, englobando os trs tipos de auditorias
destacados pela literatura.
No Brasil o TCU realiza os trs tipos de auditorias descritos pela literatura: financeira,
regularidade e desempenho. Para isso, conta com cinco (5) instrumentos de fiscalizao, so
eles: levantamento, auditorias, inspeo, acompanhamento e monitoramento. Os
levantamentos so utilizados pela Corte de Contas para conhecer a organizao e o
funcionamento dos rgos da administrao pblica. a partir deste instrumento que o TCU
identifica as atividades que devem ser fiscalizadas. As auditorias procuram examinar a
legalidade e a legitimidade dos atos de gesto, bem como o desempenho dos rgos, dos
programas, dos projetos e das atividades governamentais. J as inspees so utilizadas pelo
Tribunal para complementar o processo de auditoria, neste tipo de fiscalizao os tcnicos
esclarecem dvidas e averiguam denncias. O acompanhamento examina, ao longo de um
dado perodo, a legalidade e a legitimidade dos atos de gesto e o desempenho das
instituies. Neste caso, o TCU pode realizar visitas tcnicas, participar de eventos
promovidos pela instituio, obter informaes atravs de publicaes oficiais, solicitar
documentos, etc. Por fim, o monitoramento usado pela Corte de Contas para verificar o
cumprimento de suas deliberaes e os respectivos resultados (Regimento Interno do TCU,
2012).
O mandato da instituio de controle externo do Mxico engloba trs tipos de auditorias:
regularidade, performance/desempenho e especiais. As auditorias de regularidade possuem
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como principal objetivo verificar a aplicao dos recursos pblicos, de acordo com os
programas aprovados pelo Legislativo e a norma legal. Este modelo de fiscalizao divide-se,
ainda, em dois grandes modelos: auditorias financeiras focada na norma; e auditorias de
obras pblicas que avalia o oramento das obras pblicas federais. A auditoria de
desempenho fiscaliza os programas e polticas pblicas. J as de carter especiais buscam
combinar aspectos do modelo de fiscalizao de regularidade e de desempenho.
De acordo com Melo (2009), a auditoria de regularidade mais comum entre os tribunais de
contas e constitui-se fator determinante para a inefetividade dos mesmos. Isto porque a
nfase exclusivamente legal, ou seja, na anlise do execuo de procedimentos. Este tipo
de auditoria, extremamente, legalista caracterstica de um modelo burocrtico
ultrapassado que no d conta de verificar as irregularidades que so mais facilmente
identificadas nas fiscalizaes in loco, especialmente, com a fiscalizao de desempenho.
A tabela a seguir apresenta o nmero anual de auditorias realizadas pela ASF e pelo TCU.
Como podemos observar h uma tendncia de aumento do nmero de auditorias realizadas
pela ASF, enquanto o TCU tem reduzido este montante. Os relatrios anuais de ambos os
rgos mostram que h uma preocupao no aperfeioamento das auditorias, com a
implementao de boas prticas advindas de outras instituies congneres. Esta a
principal justificativa do TCU para a reduo do nmero total de auditorias. A ideia a de
realizar um nmero menor, mas ao mesmo tempo elaborar trabalhos mais profundos,
especialmente, no que se refere s auditorias de desempenho.
Tabela 7 Nmero de Auditoria por Pas (Anual)7
Ano
2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013
Brasil 665 566 624 724 931 1.353 916
Mxico 962 * 945 1.031 1.103 1.163 1.403
Fonte: Elaborado pela autora * Informao no localizada
No caso do Mxico foi possvel separar as auditorias de desempenho das demais, conforme
apresentado no grfico a seguir. Como podemos observar a ASF aumentou de forma
significativa o nmero de auditorias de desempenho nos ltimos anos, apresentando um
salto de 43 auditorias em 2007 para 526 em 2013. Desta forma, podemos observar que a
instituio de controle mexicana tem seguido as recomendaes dos organismos
internacionais como a Organizao Internacional de Instituies de Fiscalizadoras Superiores 7 Os dados referem-se apenas as auditorias de fiscalizao. Existem outros processos nas instituies de controle externo que no foram includas nesta pesquisa.
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- INTOSAI8 de ampliar suas fiscalizaes no mbito do desempenho, em detrimento da
anlise da legalidade das aes.
Grfico 1 Nmero de Auditorias de Desempenho da ASF do Mxico (Anual)
O aumento significativo das auditorias se d a partir de 2011, segundo ano de mandato do
atual controlador da ASF. Nossa pesquisa mostrou que a partir de 2010, h um grande
aumento de denncias realizadas pela ASF, mais do que todos os anos anteriores. Alm
disso, em 2012 observamos uma elevao significativa das auditorias de desempenho. Como
argumentado por ODonnell (1998), existem indivduos que apresentam bons exemplos
frente de instituies de accountability horizontal e podem fazer a diferena para o
funcionamento dos rgos. Embora seja difcil estabelecer relaes causais, observamos
que o mandato do atual controlador tem disseminados melhores prticas na ASF.
Tipos de Controle Ex ante e Ex post
Instituies de controle externo que possuem poder para realizar auditorias ex ante podem
prevenir desperdcios de dinheiro pblico. Existem casos como no Chile e na Costa Rica que
as instituies podem agir previamente ao ato dos gestores, autorizando ou no suas aes,
de acordo com a interpretao legal do controle externo. Neste caso, Instituio de
Fiscalizao Superior funciona como um importante ator com o poder de veto no sistema
poltico do pas.
8 International Organization of Supreme Audit Institutions.
43 228 191 205
287 478 526
0 100 200 300 400 500 600
2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013
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No caso brasileiro o controle externo ex post, embora no exista nenhuma meno
especfica na legislao. H situaes em que a Corte de Contas pode atuar como um ator de
veto durante o processo de licitaes e contratos, ao constatar irregularidades como
superfaturamentos ou algum outro tipo de ilegalidade. No entanto, o TCU precisa aguardar
a deciso dos rgos para se manifestar, por exemplo, a publicao dos editais de licitao.
A mesma tendncia observada no Mxico. A legislao do pas prev que a ASF deve
realizar suas fiscalizaes somente no ano fiscal seguinte, sendo ainda mais restritiva a um
controle ex post do que no Brasil.
O poder de sano
Como destacado por ODonnell (1998) a capacidade de imputar sanes constitui-se na
caracterstica primordial da accountability horizontal. Sem a possibilidade de ameaar
efetivamente a burocracia e os polticos eleitos com uma penalidade, a fiscalizao perde
seu efeito pedaggico.
No caso do Mxico, a ASF no possui autonomia formal para impor sanes aos gestores
que comentem aes ilegais. O controle externo da ASF pode realizar apenas
recomendaes, cabendo Secretara de la Funcin Pblica punir administrativamente os
gestores. As denncias criminais devem ser encaminhadas ao Ministrio Pblico que deve
analisar e aceit-las ou no. Entre 1998 e 2012 foram realizadas 459 denncias apresentadas
pela ASF ao Ministrio Pblico e apenas 7 foram aceitas para iniciar um processo de
penalizao dos gestores pblicos. Este resultado mostra uma total inefetividade do
controle externo e compromete a credibilidade da ASF.
Ao contrrio do que ocorre na ASF, o TCU possui poderes legais para punir diretamente os
rgos sob jurisdio da instituio de controle externo. Entre os mecanismos institucionais
da Corte de Contas para impor sanes destacamos:
Multa proporcional ao valor do prejuzo causado aos cofres pblicos;
Ressarcimento do prejuzo aos cofres pblicos;
Decretar a indisponibilidade dos bens do responsvel pela irregularidade;
Recomendar mudanas para o aperfeioamento da poltica ou o cumprimento da
Lei;
Determinar mudanas para o aperfeioamento da poltica ou o cumprimento da Lei;
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Inabilitar o responsvel ao exerccio de cargo ou funo de confiana no mbito da
administrao pblica (Constituio Federal de 1988 e Lei Orgnica do TCU n
8.443/1992.
As determinaes do TCU devem ser apreciadas pelo rgo fiscalizado em um prazo mximo
de 90 dias, com riscos do responsvel citado no processo ser denunciado ao Ministrio
Pblico por improbidade administrativa. Entretanto, este prazo de (90) noventa dias no
fixo. Dependendo do processo pode ser estendido ou reduzido, a deciso fica a cargo do
ministro relator do caso. As partes interessadas tambm podem recorrer das decises no
prprio Tribunal ou no Judicirio.
Na fiscalizao dos contratos, o TCU ao verificar irregularidades dever comunicar ao
Congresso Nacional, a quem cabe sustao, quando so encontradas indcios de ilegalidade.
No entanto, se os poderes Legislativo e Executivo no se manifestarem em no mximo 90
dias o Tribunal decidir a respeito do contrato. Este dispositivo confere grande poder ao
tribunal para suspender obras suspeitas de irregularidades, o que ocorre frequentemente no
Brasil. Infelizmente, este tipo de ao do TCU muitas vezes vista de forma negativa pela
populao, na medida em que o Tribunal paralisa obras de infraestrutura que trariam
benefcios para uma dada localidade.
No que se refere a anlise das contas dos gestores, entre os anos de 2007 e 2014 mais de 10
mil gestores tiveram suas contas julgadas como irregulares. Entretanto, atualmente apenas
650 esto inelegveis, ou seja, no podem ocupar cargos pblicos. Muitos esto recorrendo
no prprio TCU ou no Judicirio. Deve-se destacar que mesmo recorrendo ao Judicirio, as
multas aplicadas pela Corte de Contas devem ser pagas. O grande problema no Brasil que,
embora o TCU encontre inmeras irregularidades nas contas pblicas, os gestores no so
presos. No mximo pagam as multas imputadas pelo tribunal, gerando uma sensao de
impunidade.
Deste modo, possvel observarmos nos rgos pblicos brasileiros uma certa temeridade
dos gestores em relao ao TCU. Entretanto, na prtica o que se observa que poucos
burocratas e polticos so condenados por gesto fraudulenta. A falta de coordenao entre
a Corte de Contas e o Judicirio um dos fatores que impede uma maior efetividade do
controle externo brasileiro. Por outro lado, a capacidade do TCU fiscalizar as obras pblicas e
contratos tem sido, relativamente, eficaz.
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ndice de Desempenho do TCU e da ASF Semelhante ao que realizamos para a varivel de autonomia, tambm desenvolvemos um
ndice de desempenho para analisarmos o TCU e a ASF. A anlise tambm foi realizada a
partir da tcnica Qualitative Comparative Analysis QCA. Deste modo, elaboramos um
indicador que resume as dimenses de desempenho selecionadas para este trabalho.
A tabela a seguir apresenta as condies para composio do ndice de Desempenho para as
Instituies de Fiscalizao Superior. Cada uma das condies descritas na tabela ser
confrontada com os resultados apresentados na anlise documental, para em seguida
classificarmos o TCU e a ASF, quanto ao seu desempenho. O valor do ndice representa uma
medida de reproduo do desempenho da instituio de accountability horizontal. O ndice
aditivo e varia de 0 a 1, sendo que 1 representa o mximo de desempenho possvel e 0 que
a instituio apresenta um desempenho bastante ruim.
Tabela 8 Condies para Composio do ndice de Autonomia das IFSs Condies Descrio Valores Observaes
1 Auditoria - financeira 0,10 A IFS que realizar as trs modalidades bsicas de auditorias computar 0,30 nesta dimenso
2 Auditoria - regularidade 0,10
3 Auditoria - performance 0,10
4 Possui mandato de controle ex ante e ex post
0,20 A IFS que possui mandato ex ante e ex post pontuar 0,30
5 Possui mandato ex post 0,10
6 Sanes efetivas 0,20 A IFS que apresentar sanes efetivas pontuar 0,40
7 Sanes parcialmente efetivas 0,15
8 Sanes com baixa efetividade 0,05
1,00
Fonte: Elaborao prpria.
A tabela a seguir apresenta o ndice de desempenho do TCU e da ASF. Como podemos
observar as duas instituies apresentaram um resultado intermedirio. Embora o TCU
tenha alcanado um escore superior com 0,60, enquanto o resultado da ASF ficou em
apenas 0,45.
Ao analisarmos detalhadamente a composio do indicador podemos verificar que, tanto a
ASF quanto o TCU obtiveram pontuao mxima na primeira dimenso que compe o
ndice. Isto por que as duas instituies realizam os trs tipos bsicos de auditorias indicados
pela literatura: financeira, regularidade e perfomance. Por outro lado, o escore do tipo de
mandato, referente ao poder da instituio de controle externo realizar auditorias ou
fiscalizaes ex post e ex ante foi de apenas 0,10, tendo em vista que tanto a instituio
brasileira, quanto a mexicana realizam apenas investigaes ex post.
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Tabela 9 ndice de Desempenho ASF e TCU
Instituio Tipos de Auditorias Tipo de Mandato Efetividade das Sanes ndice
Brasil - TCU 0,30 0,10 0,20 0,60
Mxico - ASF 0,30 0,10 0,05 0,45
Fonte: Elaborao dos autores
Last but not least, temos a dimenso de efetividade das sanes. Neste caso, podemos
observar que o TCU apresentou um performance intermediria, enquanto a ASF foi
classificada com uma baixa efetividade das sanes. Esta foi a principal distino entre as
instituies no ndice de desempenho. Apesar do TCU apresentar uma efetividade baixa em
suas sanes por falta de articulao com o poder Judicirio, a instituio possui poder para
impor algumas penalidades aos gestores pblicos de forma autnoma. Alm disso, o
Ministrio Pblico no Brasil trabalha de forma muito mais atuante e com maior parceria,
quando comparado ao Mxico.
5 Consideraes Finais
A anlise preliminar dos pases selecionados neste estudo mostrou a importncia do
desenho institucional para o funcionamento do controle externo. O rgo do Brasil
apresenta algumas limitaes em seu papel fiscalizador, exibindo resultados parciais em sua
misso, uma vez que consegue efetivar o controle no nvel administrativo, mas enfrenta
dificuldades em imputar sanes criminais. No Mxico observamos que a efetividade ainda
encontra-se bastante tmida, pois a ASF depende de outras instituies para impor sanes.
Retornando a questo inicial deste artigo: Em que medida as instituies de fiscalizao
contribuem para a qualidade da democracia? podemos concluir que o controle externo tem
muito a contribuir com a qualidade da democracia, atravs da ampliao da transparncia e
da accountability do funcionamento da burocracia. A eficincia do controle exercido pelas
Instituies de Fiscalizao Superior possibilita que as aes dos gestores pblicos sejam
avaliadas de forma transparente e que o interesse pblico e social se sobreponha ao
privado. No entanto, em ambos os pases verificamos algumas limitaes para a efetividade
deste controle.
Por fim, a anlise sugere que a efetividade da responsabilizao individual dos
agentes/gestores pblicos envolvidos em atos ilcitos no mbito judicial so fundamentais
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para que o controle externo no seja parcial. Em muitos casos, como ocorre no Brasil, h
barreiras institucionais para concretizar a punio individual. A imensido de recursos no
Judicirio e a falta de harmonia com o TCU dificulta de forma significativa a execuo da
pena. A mesma tendncia observada no Mxico. Neste sentido, deve-se pensar solues
institucionais de modo que essas instituies apresentem uma maior sintonia.
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