AMBIENTE TÉRMICO DO PEDESTRE - fipai.org.br 05(02) 02.pdf · a formação de ilhas térmicas...

8
Minerva, 5(2): 121-127 AMBIENTE TÉRMICO DO PEDESTRE Léa Cristina Lucas de Souza Camila Pereira Postigo Departamento de Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo,Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação,Av. Luis Edmundo Carrijo Coube, 14-01, CEP 17033-360, Bauru, SP, Brasil, e-mail: [email protected] Camila Mayumi Nakata Elisangela Cristina Sorano Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação, Programa de Pós-Graduação em Desenho Industrial, Universidade Estadual Paulista, Av. Luis Edmundo Carrijo Coube, 14-01, CEP 17033-360, Bauru, SP, Brasil , e-mails: [email protected]; [email protected] Resumo Esta pesquisa avaliou a influência do ambiente urbano sobre a temperatura do ar na escala do pedestre, identificando a formação de ilhas térmicas (calor e frescor) em um bairro residencial. A metodologia englobou três etapas principais: levantamento de dados térmicos, incorporação dos dados em um Sistema de Informações Geográficas e modelagem da ilha de calor por meio de Redes Neurais Artificiais (RNA). Adotando-se um raio de abrangência de 100 m a partir de pontos de referência, foram identificadas características urbanas e tomadas temperaturas do ar durante o período de verão. Simultaneamente, foram registradas as temperaturas da área rural, permitindo mapear o desenvolvimento horário das ilhas térmicas. Os resultados indicaram diversidade no grau de importância das variáveis, de acordo com o horário de análise, sendo a orientação, a massa construída e a vegetação os elementos mais influentes no ambiente térmico do pedestre. Palavras-chave: ilha de calor, ilhas de frescor, redes neurais artificiais. Introdução As alterações da paisagem natural e substituição pelo ambiente construído ocasionam forte mudança no balanço de energia, modificando o conforto térmico, a qualidade do ar e o impacto meteorológico (Monteiro & Mendonça, 2003). Uma das conseqüências dessas alterações é a formação de ilhas de calor urbana, ou seja, ocorrência de maior temperatura do ar sobre as cidades do que em suas periferias. O balanço total de radiação entre a área urbana e rural é uma das principais causas da ilha de calor, em virtude da baixa taxa de resfriamento durante a noite. A formação da ilha de calor é resultado de vários aspectos da urbanização, como a poluição do ar, que gera aumento da radiação de ondas longas emitidas pela atmosfera, o calor antropogênico (desprendido no processo de combustão), as superfícies impermeáveis (aumento do calor sensível), as propriedades térmicas das superfícies (aumento da admitância térmica das superfícies e materiais construtivos, ampliando o calor acumulado durante o dia e desprendido durante a noite) e a geometria das superfícies, que causam o aumento da absorção de ondas longas em conseqüência da retenção entre as edificações, da diminuição da perda de calor por turbulência causada pela estagnação entre as edificações e da diminuição da perda da radiação por ondas longas do espaço entre edificações através da redução da área de céu visível (Oke, 1981). Enquanto o ambiente construído incrementa o acúmulo de calor, a vegetação pode atuar como amenizadora da temperatura do ar. A sombra oferecida pelas árvores reduz a temperatura do ar, além de diminuir o consumo de energia ao longo do período mais quente do dia, protegendo ambientes da insolação indesejada (Mascaró, 2005). É, portanto, um elemento urbano que pode criar ilhas de frescor. Considerando a vegetação e os edifícios como atributos que influenciam o microclima de uma cidade, a formação horária de ilhas de calor e de frescor foi caracterizada para uma situação de verão em um bairro residencial na cidade de Bauru, SP. Utilizando-se as potencialidades de um Sistema de Informações Geográficas (SIG) e a geração de modelos de Redes Neurais Artificiais

Transcript of AMBIENTE TÉRMICO DO PEDESTRE - fipai.org.br 05(02) 02.pdf · a formação de ilhas térmicas...

Page 1: AMBIENTE TÉRMICO DO PEDESTRE - fipai.org.br 05(02) 02.pdf · a formação de ilhas térmicas (calor e frescor) em um bairro residencial. A metodologia englobou três etapas principais:

Minerva, 5(2): 121-127

AMBIENTE TÉRMICO DO PEDESTRE 121

AMBIENTE TÉRMICODO PEDESTRE

Léa Cristina Lucas de SouzaCamila Pereira Postigo

Departamento de Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo,Universidade Estadual Paulista,Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação,Av. Luis Edmundo

Carrijo Coube, 14-01, CEP 17033-360, Bauru, SP, Brasil, e-mail: [email protected]

Camila Mayumi NakataElisangela Cristina Sorano

Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação, Programa de Pós-Graduação em Desenho Industrial,Universidade Estadual Paulista, Av. Luis Edmundo Carrijo Coube, 14-01, CEP 17033-360,

Bauru, SP, Brasil , e-mails: [email protected]; [email protected]

ResumoEsta pesquisa avaliou a influência do ambiente urbano sobre a temperatura do ar na escala do pedestre, identificandoa formação de ilhas térmicas (calor e frescor) em um bairro residencial. A metodologia englobou três etapas principais:levantamento de dados térmicos, incorporação dos dados em um Sistema de Informações Geográficas e modelagemda ilha de calor por meio de Redes Neurais Artificiais (RNA). Adotando-se um raio de abrangência de 100 m a partirde pontos de referência, foram identificadas características urbanas e tomadas temperaturas do ar durante o períodode verão. Simultaneamente, foram registradas as temperaturas da área rural, permitindo mapear o desenvolvimentohorário das ilhas térmicas. Os resultados indicaram diversidade no grau de importância das variáveis, de acordo como horário de análise, sendo a orientação, a massa construída e a vegetação os elementos mais influentes no ambientetérmico do pedestre.

Palavras-chave: ilha de calor, ilhas de frescor, redes neurais artificiais.

IntroduçãoAs alterações da paisagem natural e substituição

pelo ambiente construído ocasionam forte mudança nobalanço de energia, modificando o conforto térmico, aqualidade do ar e o impacto meteorológico (Monteiro &Mendonça, 2003). Uma das conseqüências dessas alteraçõesé a formação de ilhas de calor urbana, ou seja, ocorrênciade maior temperatura do ar sobre as cidades do que emsuas periferias.

O balanço total de radiação entre a área urbana erural é uma das principais causas da ilha de calor, emvirtude da baixa taxa de resfriamento durante a noite. Aformação da ilha de calor é resultado de vários aspectosda urbanização, como a poluição do ar, que gera aumentoda radiação de ondas longas emitidas pela atmosfera, ocalor antropogênico (desprendido no processo decombustão), as superfícies impermeáveis (aumento docalor sensível), as propriedades térmicas das superfícies(aumento da admitância térmica das superfícies e materiaisconstrutivos, ampliando o calor acumulado durante o diae desprendido durante a noite) e a geometria das superfícies,

que causam o aumento da absorção de ondas longas emconseqüência da retenção entre as edificações, da diminuiçãoda perda de calor por turbulência causada pela estagnaçãoentre as edificações e da diminuição da perda da radiaçãopor ondas longas do espaço entre edificações através daredução da área de céu visível (Oke, 1981).

Enquanto o ambiente construído incrementa oacúmulo de calor, a vegetação pode atuar como amenizadorada temperatura do ar. A sombra oferecida pelas árvoresreduz a temperatura do ar, além de diminuir o consumode energia ao longo do período mais quente do dia,protegendo ambientes da insolação indesejada (Mascaró,2005). É, portanto, um elemento urbano que pode criarilhas de frescor.

Considerando a vegetação e os edifícios comoatributos que influenciam o microclima de uma cidade,a formação horária de ilhas de calor e de frescor foicaracterizada para uma situação de verão em um bairroresidencial na cidade de Bauru, SP. Utilizando-se aspotencialidades de um Sistema de Informações Geográficas(SIG) e a geração de modelos de Redes Neurais Artificiais

Page 2: AMBIENTE TÉRMICO DO PEDESTRE - fipai.org.br 05(02) 02.pdf · a formação de ilhas térmicas (calor e frescor) em um bairro residencial. A metodologia englobou três etapas principais:

Minerva, 5(2): 121-127

122 SOUZA ET AL.

(RNA), uma análise térmica da área permitiu verificartendências e extrair informações diretamente aplicáveisao planejamento urbano.

MetodologiaPara desenvolvimento deste estudo são destacadas

três principais etapas metodológicas:i. Levantamento de dados térmicos.ii. Incorporação de dados em um SIG e mapeamento

térmico da área de estudo.iii.Desenvolvimento de modelos de RNA.

Levantamento dos dados térmicosA área de estudo delimitada situa-se na cidade de

Bauru, no interior paulista, implantada geograficamenteentre as coordenadas 22º15’ e 22º24’ de latitude Sul, 48º57’e 49º08’ de longitude Oeste e entre 500 e 630 m de altitude.Nessa área urbana foi selecionado um bairro residencial,dando, assim, continuidade a vários estudos já desenvolvidospelas autoras nessa mesma fração.

Para a configuração do ambiente térmico do pedestrena área de estudo, foi promovido um levantamento dedados tomado a partir de 40 pontos de referência. Paracada ponto foram registradas temperaturas do ar edeterminadas as características urbanas do local, incluindo:a orientação de vias, a massa construída, o fator de visão

do céu e a porcentagem e densidade de vegetação. Astemperaturas do ar foram registradas através da instalaçãode data-loggers marca Hobo Pro, com precisão de 0,1ºCe programação para leitura horária. Os aparelhos foraminstalados em postes de luz a 2 m de altura e os dias demedições correspondem a dias típicos para as estaçõesde verão, tomados em janeiro de 2006, com céu claro ebaixa velocidade do ar (abaixo de 2 m/s). A Figura 1mostra a área de estudo, os respectivos pontos de referênciae a localização de árvores implantadas ao longo das vias.

Simultaneamente às medições térmicas urbanas,foram acessadas as temperaturas horárias rurais registradase disponibilizadas pelo Instituto de Pesquisas Meteorológicas(IPMET) da UNESP-Bauru. Esse procedimento permitiuestabelecer as diferenças térmicas entre os pontos dereferência na área urbana e a estação meteorológica naárea rural. Assim, obteve-se a tendência das magnitudesdas ilhas de calor ou frescor urbanas para a época dasmedições realizadas.

Incorporação de dados a um SIGEm uma etapa de estudo anterior realizada por Leme

(2004/2005) e Pedrotti (2004/2005) para a mesma áreade estudo, foi construída uma base de dados em um SIG,utilizando-se para isso o software ArcView-GIS da ESRI(Environmental Systems Research Institute).

Figura 1 Área de estudo, pontos de referência e localização de árvores.

NAv. N

açõesU

nidas

Av. O

távioP

inheiroB

rizola

EdificaçãoÁrvoresData-loggers

Legenda:

Page 3: AMBIENTE TÉRMICO DO PEDESTRE - fipai.org.br 05(02) 02.pdf · a formação de ilhas térmicas (calor e frescor) em um bairro residencial. A metodologia englobou três etapas principais:

Minerva, 5(2): 121-127

AMBIENTE TÉRMICO DO PEDESTRE 123

A altura de cada uma das edificações do bairro foiestimada visualmente e incorporada como atributo dospolígonos representativos das edificações no ambienteSIG. Utilizando-se aquele banco de dados, foi possívelaplicar a extensão 3DSkyView, incorporada ao ArcView,para determinação dos fatores de visão do céu (FVC)em cada ponto estudado.

O FVC representa uma estimativa da área visíveldo céu a partir de um ponto de observação na malha urbana,sendo definido como a razão entre a radiação total recebidapor uma superfície plana e aquela recebida por todo oambiente radiante. É, portanto, um parâmetro adimensionalda quantidade de céu visível em um ponto. Dessa forma,a área resulta de limites impostos pelos elementos urbanose suas inter-relações. O fator de visão do céu é uma dasprincipais responsáveis pelas ilhas de calor urbana, porqueo resfriamento das superfícies terrestres é proporcionalà área de céu visível a partir dessa superfície.

Foram ainda catalogadas as árvores existentes naárea de estudo: um total de 827 unidades, correspondendoà área de “cobertura verde” do bairro. Essas árvores foramclassificadas, segundo suas características físicas, em: altura,diâmetro de copa, densidade da folhagem e forma. Paraanálise da influência térmica dessas árvores adotou-seum raio de abrangência de 100 m, dentro do qual foiestimada a porcentagem de vegetação e massa construída.Os atributos de vegetação e massa construída foramagregados à base de dados no SIG, juntando-se aos defator de visão do céu e de orientação das vias.

Os dados térmicos foram tratados, determinando-se as diferenças médias horárias encontradas para cadaponto no verão. Também incorporados ao SIG e utilizandosuas ferramentas de interpolação de dados, foram criadosos mapas térmicos horários para a área de estudo no verão.

Desenvolvimento de Modelos de Redes Neurais Artificiais(RNA)

Os dados numéricos dos atributos térmicos e deurbanização foram também aplicados no desenvolvimentode modelos de RNA, para modelagem da ilha de calorna fração urbana de estudo.

Para o desenvolvimento dos modelos de RNAs foiempregado o software EasyNN Plus, desenvolvido porStephen Wolstenholme. Esse procedimento é constituídode duas etapas. A primeira se refere ao desenvolvimentodo modelo de previsão e à determinação do grau deimportância das variáveis. A segunda etapa consiste emtestes de verificação do melhor modelo, simulando ocruzamento entre as variáveis, o que proporciona uma análisedas suas influências sobre o parâmetro de saída (neste caso,a formação de ilhas de calor). Silva et al. (2004) apresentamo procedimento detalhado para uso das RNAs.

As redes neurais compreendem etapas de treinamento,validação e teste. Para a etapa de treinamento e validação,são utilizados dados reais coletados, para que o softwarepossa identificar padrões do que acontece na realidade

e consiga, assim, gerar o modelo. Tanto variáveis de entradaquanto variáveis de saída para a fase de treinamento evalidação correspondem a dados reais. A partir dotreinamento, um padrão é identificado pelo software. Paracada uma dessas três etapas os dados foram separadosna seguinte proporção: 50% para treinamento, 25% paravalidação e 25% para teste. Dessa forma, na fase de teste,pode-se inserir dados que não foram geradores do modelo,mas que servem de parâmetro para verificar a confiabilidadedos resultados gerados pelo modelo. Assim, após o teste,dados reais podem ser comparados com dados simulados,examinando-se sua relação.

No caso do modelo térmico, para a variável de “saída”na fase de treinamento e validação foram utilizados osvalores de ilha de calor, ou seja, diferenças de temperaturasdo ar entre a área rural e os pontos da área urbana. Asvariáveis de “entrada” para a fase de treinamento e validaçãoforam: FVC, porcentagem edificada, porcentagem deterrenos vazios, porcentagem de área de vegetação, massaconstruída e orientação das vias. O objetivo nesse casofoi estabelecer um modelo que apresentasse variáveiscomumente utilizáveis no planejamento urbano.

Para os horários mais significativos da formaçãode ilhas de calor foram escolhidos os modelos de melhordesempenho. O melhor desempenho do modelo foi dadopela verificação do menor erro relativo e maior coeficientede determinação quando comparados dados reais e dadossimulados.

ResultadosA formação horária de ilhas de calor e ilhas de frescor

no verão revelou o comportamento mapeado na Figura2. Nos horários da manhã, entre 5 h e 6 h, ocorreram asmenores magnitudes de ilhas de calor, com médias de1,6oC. Entre 7 h e 11 h foram registradas ilhas de frescorem alguns pontos, podendo atingir –2,3oC. Entre 15 e17 h, a formação de ilhas de calor alcançou valores médiosde 4,5oC, podendo em alguns pontos atingir 8,9oC. Às19 h, as maiores médias noturnas de formação de ilhasde calor foram registradas com magnitude média de 4,5oC.

Os modelos de melhor desempenho apresentaramas seguintes características:i. O modelo para as 5 h, erro relativo de 7% e coeficiente

de determinação de 0,85.ii. O modelo para as 16 h, erro relativo de 9% e coeficiente

de determinação de 0,92.iii.O modelo para as 19h, erro relativo de 6% e coeficiente

de determinação de 0,87.

Considerando esses horários da manhã, tarde e noite,a variável massa construída, vegetação, orientação e fatorde visão do céu assumiram, para os melhores modelosdesenvolvidos, as importâncias relativas apontadas na Tabela1. Ressalta-se que para a tabela em questão foram incluídasapenas as variáveis do modelo que são objeto do estudoora proposto.

Page 4: AMBIENTE TÉRMICO DO PEDESTRE - fipai.org.br 05(02) 02.pdf · a formação de ilhas térmicas (calor e frescor) em um bairro residencial. A metodologia englobou três etapas principais:

Minerva, 5(2): 121-127

124 SOUZA ET AL.

Para cada horário há um comportamento específicodas variáveis. A fim de embasar as discussões a seremdestacadas nos horários de maior relevância de cada variável,verificaram-se o comportamento da massa construída eo fator de visão do céu no modelo, em função das orientaçõesestudadas. As Figuras 3 e 4 mostram esses resultados.

Apenas como exemplo da grande variação dessecomportamento ao longo do dia, na Figura 5 é apresentadoo gráfico da variação da ilha de calor às 5 h da manhãem função do fator de visão do céu.

Para o estudo da influência da vegetação no horárioem que essa variável é mais relevante, a Figura 6 indicao resultado alcançado.

Com a importância assumida pela vegetação, outromodelo foi criado, de forma que a densidade da vegetaçãotambém fosse considerada como uma de suas variáveis.Ao se verificar o comportamento da densidade de vegetaçãonesse novo modelo, obteve-se o resultado apresentadona Figura 7.

Análises e DiscussõesNa formação de ilhas de calor apresentada na Figura

2, observa-se a grande variabilidade em sua distribuiçãoespacial e magnitude.

O horário das 6 h da manhã indica homogeneidadena grandeza da ilha por toda a área estudada, e a partirdesse horário manifestam-se as maiores diferenciaçõesno aquecimento e resfriamento das superfícies, pelasdiferenças de acesso solar. No período da manhã, entre7 h e 11 h, algumas áreas continuam se resfriando, podendoinclusive atingir temperaturas mais baixas do que a rural,uma vez que seu acesso solar é reduzido pela presençade edificações.

Quando o sol atinge sua maior altura, às 12 h, todasas áreas apresentam temperaturas mais altas que a rural,com maior acúmulo entre 15 h e 16 h. Até as 18 h, ocalor acumulado se dissipa por toda a área, tendendo ase tornar homogêneo.

Figura 2 Formação horária de ilhas de calor e frescor no verão para o bairro em estudo – baseado em dados de janeiro de 2006.

0 h 1 h 2 h 3 h 4 h 5 h 6 h 7 h

8 h 9 h 10 h 11 h 12 h 13 h 14 h 15 h

16 h 17 h 18 h 19 h 20 h 21 h 22 h 23 h

N–3-0 ºC

0-2 ºC

2-4 ºC

4-6 ºC

Variável Modelo para 5 h Modelo para 16 h Modelo para 19 h

Massa construída 18% 20% 11%

% vegetação 16% 14% 20%

Fator de visão do céu 12% 16% 12%

Orientação 16% 10% 17%

Tabela 1 Importância das variáveis nos modelos em função do horário.

Page 5: AMBIENTE TÉRMICO DO PEDESTRE - fipai.org.br 05(02) 02.pdf · a formação de ilhas térmicas (calor e frescor) em um bairro residencial. A metodologia englobou três etapas principais:

Minerva, 5(2): 121-127

AMBIENTE TÉRMICO DO PEDESTRE 125

Ilha de calor às 16 h em função da massa construída

0

2

4

6

8

1.203,21 3.000 5.000 7.000 9.000 11.753,5

Massa construídaIlh

a(º

C)

NE-SO

NO-SE

Figura 3 Comportamento da variável massa construída no modelo das 16 h.

Ilha de calor às 16 h em função do FVC

0

1

2

3

4

5

6

7

8

0,55 0,65 0,75 0,85 0,9 0,95

FVC

Ilha

(ºC

)

NE-SO

NO-SE

Ilha 5 h em função do FVC

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

3,5

0,55 0,65 0,75 0,85 0,9 0,95

FVC

Ilha

(ºC

)

NE-SO

NO-SE

Figura 4 Comportamento da variável fator de visão do céu às 16 h.

Figura 5 Comportamento da variável fator de visão do céu às 5 h.

Ilha de calor às 19 h em função da % de vegetação

0

2

4

6

8

0,98 2 4 5 6 7,41

Vegetação (%)

NE-SO

NO-SE

Ilha

(ºC

)

Figura 6 Comportamento da variável porcentagem de vegetação no modelo das 19 h.

Page 6: AMBIENTE TÉRMICO DO PEDESTRE - fipai.org.br 05(02) 02.pdf · a formação de ilhas térmicas (calor e frescor) em um bairro residencial. A metodologia englobou três etapas principais:

Minerva, 5(2): 121-127

126 SOUZA ET AL.

A partir das 19 h, com o pôr-do-sol, a perda deradiação de ondas longas pelas superfícies urbanas levaà formação de ilhas de calor noturnas com valores médiosmais altos.

Nesse horário observa-se que as áreas que seaqueceram mais rapidamente durante o período da manhãsão as mesmas que iniciam o processo de resfriamentomais rapidamente. Isso aponta para a influência do maioracesso solar durante o dia e maior visibilidade do céudurante a noite, que se caracteriza pelo maior valor defator de visão do céu.

Para os modelos desenvolvidos, as variáveis estudadastornaram-se mais importantes para o horário das 16 edas 19 h. A massa construída e a vegetação foram asvariáveis que mais se destacaram.

Observou-se que a orientação NO-SE de vias tendeua apresentar ilhas de calor com valores mais baixos doque as da orientação NE-SO. Aqui também a influênciado acesso solar é o elemento determinante dessecomportamento (Figura 8).

Quanto à massa construída, o resultado encontradopara as 16 h é uma das discussões mais importantes dapesquisa. Verificou-se redução de até 3oC na temperaturado ar com o aumento da massa construída. Em geral, osestudos de ilha de calor concentram-se no desenvolvimentonoturno da ilha, horário em que o aumento da massaconstruída contribui para a maior formação do fenômeno.No entanto, para os dados aqui registrados, a magnitudeda ilha noturna igualou-se ao da ilha diurna.

Como a maior quantidade de massa construída émuitas vezes representada por edifícios mais altos, porvezes, durante o dia, esses podem também servir deprotetores solares para a área do pedestre. Esse fato éreforçado ainda mais pela Figura 4, que também indicaque o maior fator de visão do céu às 16 h está relacionadoao aumento da ilha de calor, uma vez que o acesso solaré maior.

Destaca-se, aqui, que não foram estudados FVCmenores do que 0,55, uma vez que a área de estudo nãoapresentava pontos com essa característica.

IC 15 h x densidade vegetação

5,8

6

6,2

6,4

6,6

6,8

7

7,2

7,4

40 50 60 70 80

Densidade vegetação

IC1

5h

NE-SO

NO-SE

Figura 7 Comportamento da variável densidade da vegetação no novo modelo para 15 h.

N

NO

SO

SE

NE

Sol Nascente

Sol Poente

Figura 8 Acesso solar e orientação das vias.

Page 7: AMBIENTE TÉRMICO DO PEDESTRE - fipai.org.br 05(02) 02.pdf · a formação de ilhas térmicas (calor e frescor) em um bairro residencial. A metodologia englobou três etapas principais:

Minerva, 5(2): 121-127

AMBIENTE TÉRMICO DO PEDESTRE 127

Por outro lado, ao se analisar a Figura 5, observa-se que para a orientação NO-SE às 5 h ocorre reduçãosignificativa na ilha de calor com o aumento do FVC,enquanto para a orientação NE-SO a ilha permanecepraticamente estável com o aumento da FVC. Ocomportamento é, portanto, variável e de difícilgeneralização.

O estudo aponta que é necessário pesquisar os limitespara o quais o aumento da massa construída ou diminuiçãodo FVC pode ser aproveitado em benefício do clima edas condições térmicas do pedestre durante o dia, semque isso represente aumento de ilhas noturnas de calor.Quando retomado o gráfico da Figura 3, por exemplo,observa-se que para a orientação NO-SE o aumento damassa construída é mais significativo na redução da ilhade calor até atingir 6.000 m3, ponto a partir do qual acurva representativa daquela orientação tende a se manterconstante. A partir desse ponto, não há diminuiçãosignificativa da ilha de calor diurna. Ressalta-se anecessidade de verificar a tendência para todos os horários,a fim de que sejam estabelecidas diretrizes de planejamentoadequadas às condições térmicas dos diversos climas elocais.

Quanto à contribuição da vegetação e sua capacidadede amenizar as temperaturas urbanas, este estudo apresentacaracterísticas muito específicas. A vegetação da área deestudo é representada apenas por árvores isoladasimplantadas ao longo da via. No entanto, o comportamentoapresentado na Figura 6 indica que a conformação dasárvores do local, apesar de auxiliar no resfriamento datemperatura e diminuição da ilha de calor durante o dia,também pode significar acúmulo de calor abaixo da copadas árvores durante a noite, pois ela funciona como barreiraà troca de calor entre as superfícies abaixo dela e o céu.Verificou-se também, pelo gráfico da Figura 7, que, durantea tarde, para o tipo de vegetação apresentado pela áreade estudo, a densidade da vegetação é ainda mais importantena ação de amenização climática do que a porcentagemarbórea.

Notou-se que, apesar de a vegetação influir nasmudanças de temperatura do ar, para o bairro estudado,as massas construídas foram mais significativas nadeterminação da condição térmica.

ConclusõesOs resultados desta pesquisa mostraram a importância

das características construtivas para o ambiente térmicodo pedestre no período de verão. A orientação, massaconstruída, fator de visão do céu e vegetação são elementosque têm papel significativo na formação de ilhas de calor,mas que variam em importância ao longo do dia.

Algumas conclusões aqui extraídas podem auxiliardiretamente no planejamento urbano. Orientações de viassobre o eixo NO-SE permitem temperaturas mais amenaspara o pedestre do que aquelas implantadas sobre o eixo

NE-SO. É necessário estabelecer um limite máximo parao aumento de massa construtiva e diminuição do fatorde visão do céu, sem intensificar a ilha de calor,aproveitando, porém, o próprio edifício para osombreamento diurno das áreas de pedestres. Concluiu-se ainda que o poder de amenização da temperatura pelavegetação, no caso de árvores isoladas implantadas aolongo das vias, depende mais da densidade da vegetaçãodo que da porcentagem de árvores no local, quandoconsiderado um raio de 100 m de influência arbórea.

Destaca-se, por fim, que a aplicação de RNA nessetipo de estudo assumiu papel primordial para que pudessemser desenvolvidos modelos e analisados os dados.

AgradecimentosAs autoras agradecem à FAPESP e ao CNPq pelos

diversos auxílios concedidos durante os anos de realizaçãodesta pesquisa.

Referências BibliográficasLEME, F. T. L. Influência do fator de visão do céu emum bairro residencial. Bauru: UNESP, 2004/2005.(Relatório Final de Pesquisa – Projeto CEU. PIBIC-CNPq.)

PEDROTTI, F. S. (2004/2005). Coleta e armazenamentode dados de consumo de energia. Bauru: UNESP, 2004/2005. (Relatório Final de Pesquisa – Projeto CEU. PIBIC-CNPq.)

MASCARÓ, L.; MASCARÓ, J. Vegetação urbana. PortoAlegre: Mais Quatro, 2005.

MONTEIRO, C. A. F.; MENDONÇA, F. Clima urbano.São Paulo: Contexto, 2003.

OKE, T. R. Canyon geometry and the nocturnal urbanheat island: comparison of scale model and fieldobservations. Journal of Climatology, v. 1, n. 1-4, p. 237-254, 1981.

SILVA, A. N. R.; RAMOS, R. A. R.; SOUZA, L. C. L.;RODRIGUES, D. S.; MENDES, J. F. G. SIG: umaplataforma para introdução de técnicas emergente noplanejamento urbano, regional e de transportes. São Carlos:Edição dos Autores, 2004.

WOLSTENHOLME, S. Disponível em: www.easynn.com.

Page 8: AMBIENTE TÉRMICO DO PEDESTRE - fipai.org.br 05(02) 02.pdf · a formação de ilhas térmicas (calor e frescor) em um bairro residencial. A metodologia englobou três etapas principais: