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ALGORITMOS DE CÁLCULO COM AS QUATRO OPERAÇÕES E SEUS SIGNIFICADOS PARA OS LICENCIANDOS EM MATEMÁTICA Helena Alessandra Scavazza Leme Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – UEMS e-mail: [email protected] Há cinco anos venho acumulando experiência como professora de um curso de formação de professores de matemática e tenho notado, a cada ano, quando proponho a resolução de alguns algoritmos envolvendo as quatro operações, que nossos acadêmicos cada vez mais sabem apenas (e algumas vezes não sabem) resolver mecanicamente esses algoritmos, mas não entendem - talvez porque nunca lhes foi devidamente ensinado - o processo das técnicas envolvidas nesses algoritmos. Tentarei ser mais clara. Normalmente tenho de 20 a 30 acadêmicos(as) cursando a disciplina de Prática de Ensino na 3ª série de um curso noturno de licenciatura em matemática oferecido na Unidade de Glória de Dourados da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. A cada ano começando com uma nova turma, sempre proponho que os acadêmicos em grupos de 3 a 4 integrantes resolvam operações simples do tipo: 54 + 89 ; 921 – 498 ; 18 x 12 ; 1000 – 999 ; 251 – 346; 25 x 20; 313 ÷ 2; 5 ÷ 4; 642 ÷ 6; entre outras. Como esses acadêmicos serão futuros professores de matemática é importante que saibam corretamente como efetuar algoritmos com as quatro operações para que tenham bases sólidas de conhecimento que proporcione um entender e dar sentido àquilo que procurarem ensinar, independente se estarão ou não utilizando uma calculadora. Como bem colocado por Medeiros (2003, p.20): Um dos argumentos contra o uso da calculadora é de que esta inibe o raciocínio dos alunos. Entretanto, ao fazer contas com os algoritmos habituais também não há raciocínio, há uma repetição de procedimentos que, na maioria das vezes, o aluno decora sem entender o significado. Portanto, o problema não é usar ou não a calculadora, mas trabalhar os cálculos sem compreensão, sem dar o significado aos mesmos para o aluno. Nas atividades desenvolvidas em sala de aula, depois que os grupos resolviam as operações, propunha que um dos representantes de cada grupo viesse até o quadro para

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ALGORITMOS DE CÁLCULO COM AS QUATRO OPERAÇÕES E SEUS

SIGNIFICADOS PARA OS LICENCIANDOS EM MATEMÁTICA

Helena Alessandra Scavazza Leme

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – UEMS

e-mail: [email protected]

Há cinco anos venho acumulando experiência como professora de um curso de

formação de professores de matemática e tenho notado, a cada ano, quando proponho a

resolução de alguns algoritmos envolvendo as quatro operações, que nossos acadêmicos

cada vez mais sabem apenas (e algumas vezes não sabem) resolver mecanicamente

esses algoritmos, mas não entendem - talvez porque nunca lhes foi devidamente

ensinado - o processo das técnicas envolvidas nesses algoritmos. Tentarei ser mais clara.

Normalmente tenho de 20 a 30 acadêmicos(as) cursando a disciplina de Prática de

Ensino na 3ª série de um curso noturno de licenciatura em matemática oferecido na

Unidade de Glória de Dourados da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. A

cada ano começando com uma nova turma, sempre proponho que os acadêmicos em

grupos de 3 a 4 integrantes resolvam operações simples do tipo: 54 + 89 ; 921 – 498 ; 18

x 12 ; 1000 – 999 ; 251 – 346; 25 x 20; 313 ÷ 2; 5 ÷ 4; 642 ÷ 6; entre outras.

Como esses acadêmicos serão futuros professores de matemática é importante

que saibam corretamente como efetuar algoritmos com as quatro operações para que

tenham bases sólidas de conhecimento que proporcione um entender e dar sentido

àquilo que procurarem ensinar, independente se estarão ou não utilizando uma

calculadora. Como bem colocado por Medeiros (2003, p.20):

Um dos argumentos contra o uso da calculadora é de que esta inibe o raciocínio dos alunos. Entretanto, ao fazer contas com os algoritmos habituais também não há raciocínio, há uma repetição de procedimentos que, na maioria das vezes, o aluno decora sem entender o significado. Portanto, o problema não é usar ou não a calculadora, mas trabalhar os cálculos sem compreensão, sem dar o significado aos mesmos para o aluno.

Nas atividades desenvolvidas em sala de aula, depois que os grupos resolviam as

operações, propunha que um dos representantes de cada grupo viesse até o quadro para

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que juntos discutíssemos o algoritmo utilizado e os procedimentos de como aquele

grupo havia realizado a operação proposta. Foi importante a resolução em grupo uma

vez que essa dinâmica facilitou a troca de concepções entre os estudantes,

oportunizando a transposição das dificuldades encontradas na tarefa desenvolvida. A

importância dos trabalhos em conjunto em sala de aula está vinculada ao pressuposto de

que a aprendizagem está vinculada “... como um processo que sempre inclui relações

entre indivíduos.” (Oliveira, 1995, p.56). As atividades desenvolvidas em grupo

proporcionam oportunidade de trabalho em conjunto entre os alunos e estes com o

professor. Segundo Leme (1997, p.141), “os debates, gerados nos grupos, fazem com

que idéias e raciocínios matemáticos sejam planejados e desenvolvidos a partir dos

questionamentos e pontos de vistas distintos”, oferecendo oportunidade para que todos

possam se envolver no trabalho proposto.

Sendo assim, escolhia-se um acadêmico por grupo, que ia ao quadro resolver

determinada operação, começava então a questioná-lo, e aos outros, sobre os porquês de

cada procedimento de cálculo que havia sido utilizado para a resolução. Tomemos um

exemplo para melhor elucidação de como ocorria a dinâmica.

Uma aluna estava no quadro e calculou 54 + 89, resolvendo da seguinte maneira: 1 1 654 + 89 ____

743

Ao ser indagada a respeito do número 1 em cima do 5 e do outro 1 em cima do

6, não soube explicar o que significava, apenas salientou que sempre somava daquele

modo e aprendera a fazer desse jeito, com o “vai um”. Uma discussão (discussão no

sentido de refletir sobre o problema) se instaurou na sala e percebi que muitos sabiam o

sentido daqueles números 1. Mas alguns alunos que utilizam nos seus métodos de

cálculos o processo do “vai um” e “empresta um” geralmente não sabiam o que isso

significava. O fato de que nesse processo de cálculo estamos posicionando

adequadamente o resultado da soma, passava desapercebido para esses alunos que

apenas pareciam dominar a técnica mecanicamente sem compreendê-la. Fizemos então

juntos a operação de adição explicando passo a passo seus fundamentos: somamos as 4

unidades com as 9 e obtemos 13, que é composto de 1 dezena e 3 unidades. Deixamos o

3 na posição das unidades e esse “vai um” é a dezena que estamos transportando para

sua posição, novamente quando somamos na posição seguinte 1 + 5 + 8, estamos

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somando as dezenas, ficamos então com 14 dezenas, ou seja, 140 = 100 + 40 e então

deixamos as 4 dezenas na sua posição e transportamos 1 centena para a posição

seguinte que somada a 6 resulta 7 centenas.

Esse processo “oculto” no algoritmo era desconhecido de alguns alunos que

realizam-no apenas como uma técnica mecânica. Esse exemplo quando abordado com

os alunos sempre nos levou a mostrar que na verdade quando somamos o fazemos com

base nas posições das unidades, dezenas, centenas, etc, de cada número; assim somar

654 com 89 significa ter que somar as unidades: 4 + 9 = 13, somar as dezenas: 80 + 50

= 130 e acrescentar o resultado obtido à centena: 600, ou seja, 13 + 130 + 600 = 743.

Lembrei-os que este último era um dos processos geralmente utilizados quando fazemos

cálculo mental para somar, uma vez que facilita e agiliza o raciocínio.

Tenho notado que esse processo de descodificar o algoritmo, que até então era

resolvido de maneira mecânica, leva os alunos a descobrirem por si próprios, fazendo-os

perceberem o significado do que antes era apenas “decoreba” de procedimentos.

Explorei também com eles somas que geralmente não são as mais usadas “no

papel” mas que podem facilitar o cálculo mental e não podem ser ignoradas pelo

professor caso seu aluno prefira esse método para as suas resoluções:

25 + 19 ___ 30 14 ____ 44

Tentei fazer com que eles percebessem que o que ocorreu nessa resolução foi

primeiro completar o 25 para chegar em 30, o que resulta de uma diferença de 5

unidades que foram retiradas do 19, ficando com 14 e a subseqüente soma das parcelas

30 e 14, resultando 44.

Com relação à subtração, surgiram nas experiências vivenciadas, dois processos

de cálculos utilizados pelos acadêmicos, são eles:

I) 8 1

9 2 1 - 4 9 8 _______

4 2 3

Os alunos que utilizavam esse algoritmo explicaram o procedimento da seguinte

maneira: “como não podemos de 1 unidade retirar 8, tiramos das 2 dezenas uma delas o

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que nos fornece 10 unidade que unidas a primeira unidade ficam 11 unidades, tirando as

8 resulta em 3 unidades. Na dezena do primeiro número somente restam 1 dezena pois a

outra foi transformada em unidades, assim de 1 dezena não conseguimos retirar 9,

repetimos o processo anterior, agora com as centenas.”

O outro modo que os alunos utilizavam para a subtração é o esquema do

“empresta um” e “cai um” ou “escorrega um”, como eles mesmos costumam dizer ao

efetuar o processo:

II) 9 12 11 - 14 19 8 ___________

4 2 3

Esse processo foi efetuado e relatado pelos alunos da seguinte maneira: “1

menos 8 não é possível, então ‘emprestamos 1’ e ficamos com 11 que retirado 8 dá 3,

como emprestamos 1 ele ‘cai’ para junto do 9 ficando 10, 2 menos 10 não é possível,

então ‘emprestamos 1’ e ficamos com 12 que tirado de 10 fica 2, o 1 ‘emprestado’ ‘cai’

para junto do quatro ficando 5 e 9 menos 5 dá 4.”

Na classe surgiu toda uma discussão sobre os dois processos, os que utilizavam

o primeiro explicaram para os demais e os que utilizavam o segundo fizeram o mesmo,

assim sempre havia o debate sobre as etapas, singularidades e dificuldade de cada um

deles, gerando trocas de experiências entre os alunos.

Quanto ao processo de multiplicação, geralmente a resolução apareceu de uma

das duas maneiras colocadas abaixo: 18 18 x 12 x 12 ______ _______

36 36 18 18+ ____ _____

216 216

Quando perguntei o significado do sinal + embaixo do 6 ou o espaço vazio sobre

o mesmo número, os dois alunos que estavam no quadro resolvendo a multiplicação,

cada um com sua técnica, não souberam responder, então realizei a mesma conta,

colocando-a da seguinte maneira no quadro:

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5

18 x 12 ______

36 180 ____

216

E então perguntei se também estava correto fazer daquele jeito e apenas

responderam que o resultado era o mesmo, então começamos a verificar o que era igual

e o que era diferente nos três procedimentos. Decompomos o número 12 (10 + 2) e

verificamos que o 36 era proveniente da multiplicação: 2 x 18 e que o 180 era 10 x 18 e

assim eles foram percebendo que a ‘casa vazia’ ou o sinal ‘+’ era um artifício para que a

casa da dezena se mantivesse, pois quando realizamos o algoritmo costumamos

multiplicar apenas o número 1(nesse caso) que na verdade é 1 dezena e não 1 unidade.

A partir da decomposição do 12 em 10 + 2 também conseguimos evidenciar a

propriedade associativa da multiplicação:

18 x 12 = 18 x (10+2) = 18 x 10 + 18 x 2 = 180 + 36 = 216

Expliquei aos alunos que, na verdade, colocar o sinal de + ou o espaço vazio é

um procedimento incorreto na técnica operatória, uma vez que ela deve ser baseada na

propriedade enunciada acima, conforme Carvalho (1994). Mas, percebi que para os

alunos não é fácil abandonar uma prática que foi utilizada por eles ao longo de anos de

escolarização.

Pedi então que realizassem 251 x 346:

251 251 x 346 x 346 _________ _________

1506 1506 1004+ 1004 753++ 753 _______ _______ 86846 86846

E então cada grupo foi incumbido de explicar as ‘casas vazias’ ou os sinais de

‘+’, conforme a técnica utilizada, e as respostas vieram desta vez através da

decomposição, ou seja:

346 = 300 + 40 + 6

251 x 346 = 251x (300 + 40 + 6)

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6

251 x 6 = 1.506

251 x 40 = 10.040 (I)

251 x 300 = 75.300 (II)

Explicação dada pelos alunos:

(I) no algoritmo fazemos apenas 4 x 251, o que na verdade são 4 dezenas, então

o primeiro sinal (ou a casa vazia) ocupa o espaço do zero da multiplicação

pela dezena;

(II) no algoritmo fazemos apenas 3 x 251, o que na verdade são 3 centenas, então

os outros dois sinais (ou as duas outras casas vazias) substituem o lugar dos

dois zeros da multiplicação pela centena .

Desse modo deduziram e verificaram a utilidade e o significado do sinal ‘+’ e da

‘casa vazia’ e pareceram conseguir estender o conceito para a multiplicação de números

com a posição da unidade, dezena, centena de milhar e os outros subseqüentes.

Depois de todas as discussões sobre os métodos que eles utilizavam para os

cálculos de multiplicação lembrei que esses não eram os únicos e que existiam outros e

como futuros professores de matemática, antes de acharem que um aluno efetuou algo

incorretamente, convinha analisar a situação e mesmo questioná-lo sobre como efetuou

o procedimento. E exemplifiquei a situação. “Se um aluno aparecesse com o seguinte

resultado para a multiplicação 25 x 20”:

25 x 20 _____ 400 100

_____ 500

“Eles iriam considerar tal procedimento correto ou não?” Após a análise da

resolução por cada grupo, chegaram à conclusão de que o procedimento utilizado foi o

da decomposição do 25 em 20 e 5 e a conseqüente multiplicação de cada parcela por 20

e que o procedimento, embora diferente dos usualmente trabalhados, estava correto.

Com a operação da divisão as dúvidas e dificuldades foram ainda maiores. Vou

tomar como exemplo apenas as experiências que obtive de divisões entre números

inteiros, pois não teria como abordar aqui todas as situações vivenciadas.

Pedi que eles realizassem algumas divisões procurando explicar, entre seus pares

no grupo, cada etapa do procedimento que utilizavam. Divisões simples tais como: 313

÷ 2; 5 ÷ 4; 30 ÷ 8; 647 ÷ 6; 503 ÷ 5.

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Na divisão 313 ÷ 2 o problema não foi em resolver a operação, mas em como

explicar o aparecimento do 0 (zero) junto ao número 1 e a vírgula após o número 6, no

algoritmo que utilizavam:

3 1 3 |_2__ 1 1 156,5

1 3 10 0

Como eles não sabiam o porquê daquele procedimento de colocar um zero e a

vírgula e depois de algumas discussões sobre o impasse do problema, um dos alunos

teve a idéia de tentar resolver decompondo o 313. Talvez isso ocorreu porque eles

perceberam que com o processo de multiplicação o procedimento foi muito útil. Assim

resolveram:

313 = 300 + 10 + 3

300 ÷ 2 = 150

10 ÷ 2 = 5

3 ÷ 2 = 1,5

e assim, 150 + 5 + 1,5 = 156,5

Começaram então a se questionar sobre o resultado 1,5 proveniente da divisão

de 3 por 2. Como 3 = 2 + 1, teriam 2 ÷ 2 =1 e 1 ÷ 2 = 0,5 e assim começaram a tentar

entender o que acontecia no algoritmo. Precisei ajudá-los a perceber que quando

colocavam o zero junto ao número 1 na verdade estavam pegando aquele inteiro e

fracionando-o em décimos, por isso o resultado precisaria da vírgula, para indicar a

parte decimal que caberia para a divisão por 2 no quociente. Assim, 1 inteiro ficaria

dividido em 10 partes equivalendo cada uma a 0,1; e dividindo essas 10 partes decimais

por 2 ficaria com 5 partes de 0,1 ou seja, 0,5. Toda essa explicação foi realizada

utilizando esquemas na lousa representando os inteiros e as partes decimais envolvidas

no processo.

Já na divisão de 5 por 4, além de eles trabalharem com os décimos teriam que

associar o mesmo raciocínio, agora com os centésimos.

5 |_4__ 1 0 1,25

20 0

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Muitos até perceberam como poderiam fazer, mas a maioria precisou de ajuda

quando foram fracionar o 2 (dois décimos) que ficaria com partes em centésimos (20 x

0,01) um aluno questionou o fato de que a primeira vez que colocamos o zero junto com

o número 1 colocamos a vírgula no quociente, ele sabia que não existiam números

decimais com mais do que uma vírgula, mas como justificar que não era necessária a

segunda vírgula, se um de seus alunos viesse a questioná-lo? Repassei a pergunta para a

classe para verificar o que os outros responderiam e o argumento utilizado, depois de

terem analisado a situação, foi que da primeira vez era necessário pois teríamos que

separar a parte inteira da parte decimal do resultado (quociente), mais depois sempre

que necessário os números colocados posteriormente já estariam na parte decimal do

resultado (como décimos, centésimos, milésimos, ...) e assim uma segunda vírgula não

era necessária.

Na operação:

6 4 2 |_6__ 0 4 2 1 0 7

0 ↑

O problema foi como explicar o “aparecimento” do zero no quociente. Alguns

grupos não fizeram a conta corretamente colocando como resultado 17 e não 107,

perguntei a estes grupos se aquele resultado fazia sentido, uma vez que 17 x 6 não

ultrapassaria 120, fazendo uma simples estimativa. Observado e percebido esse erro

cometido voltamos ao nosso problema inicial que era explicar o zero no quociente.

Como já haviam feito anteriormente, alguns alunos passaram a decompor o 642 (600 +

40 + 2) e notaram que 600 ÷ 6 = 100 e que 40 ÷ 6 não teriam um número exato de

dezenas para a divisão, mas se juntassem com o 2, teriam 42 unidades e conseguiriam

fazer a divisão chegando no resultado de 7 unidades, portanto a posição da dezena

deveria ficar vazia uma vez que as 4 dezenas foram transformadas em 40 unidades que

juntamente com mais 2 unidades resultaria em 7 na divisão. Assim aquele zero

significava a ausência na posição da dezena. Nesse problema foi necessário que

resolvêssemos mais alguns outros semelhantes para que os alunos com dúvidas

pudessem superá-las.

Para que eles conhecessem outros procedimentos com cálculos resolvi mostrar

como poderíamos proceder numa divisão por tentativa: 537 ÷ 3. Começamos as

tentativas colocando no quociente 100, ficando com o resto 237, sugeriu-se depois o

número 40, que multiplicado por 3 forneceria 120, tirado de 237 ainda teríamos 117

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como resto, outra sugestão foi o 30, resultando 90 que retirado de 117 restaria 27 o que

fecharia o cálculo se colocássemos no quociente o 9. O último procedimento foi a soma

de todos os valores (100 + 40 + 30 + 9) que resultou no quociente 179.

- 5 3 7 |__3__ 3 0 0 100

_____ 40 + - 2 3 7 30 1 2 0 9 _____ ____ - 1 1 7 179 9 0 ______ - 0 2 7 2 7 ______ 0

Resolvi aqui esse cálculo pelo procedimento longo pois alguns dos alunos

sabiam como fazê-lo e esse método foi abordado com toda a sala. Com respeito ao

processo por tentativa, o interessante foi que eles notaram que podiam se libertar de

qualquer procedimento rígido e irem tentando até que conseguissem chegar numa

resposta mais aproximada.

Ao longo de toda a experiência, discutindo com os acadêmicos as técnicas

operatórias das quatro operações, notei que eles sempre me questionavam sobre qual a

técnica mais adequada que deveriam utilizar ou ensinar em suas aulas como professores.

Tentei fazer com que entendessem que eles iriam se deparar com procedimentos

diversificados de cálculo em sala de aula e não deveriam escolher um único em

detrimento dos outros. O importante é respeitar a opção de cada aluno, pois ele é que irá

optar pelo método que julgar mais fácil, mesmo que seja o mais trabalhoso do ponto de

vista do professor, ou seja, o aluno deve ter acesso a diferentes técnicas para poder,

inclusive, fazer comparações, mas a escolha por uma dependerá de seus próprios

procedimentos mentais. A função do professor é a de verificar se o algoritmo utilizado

por seus alunos é coerente, tendo como base as características do sistema de numeração

decimal, inclusive abordando o significado de cada procedimento utilizado na técnica.

Poderia aqui discorrer ainda sobre tantos outros casos que foram discutidos e

analisados junto com os acadêmicos nas aulas de prática de ensino, contudo creio que já

forneci uma visão geral de como alguns deles “aprenderam” a fazer seus cálculos

durante todos os anos de suas vidas escolares, quais as dificuldades mais comuns e

alguns dos procedimentos de resolução implementados por eles durante as aulas.

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O quadro geral da situação abordada aqui me leva a crer que nesses longos anos

de escolaridade (foram no mínimo 8 no ensino fundamental, 3 no ensino médio e 2 no

ensino superior) lhes foi tirado o direito de “pensar sobre” o que estavam fazendo,

refletir sobre o seu conhecimento. Apenas lhes foi pedido a repetição do que é uma

técnica mecânica para a resolução dessas operações, técnica essa que por ser mecânica é

muito fácil de ser esquecida ou confundida, como pude verificar ao longo do trabalho

desenvolvido. Esses alunos muitas vezes não foram levados a perguntar, por exemplo,

“por que temos que abaixar esse zero?” ou “por que o sinal de ‘+’ aparece no

algoritmo?”. Imagino que talvez alguns deles nesses anos possam ter feito essas

perguntas aos professores, mas também estes provavelmente não tenham sabido

responder, assim como aqueles alunos enquanto futuros professores de matemática,

também não o souberam.

E quanto a tantas outras questões – ‘simples’ diriam os matemáticos – mas sem

respostas convenientemente exploradas ficam sem respostas para nossos alunos?

Parece que em nossos cursos de formação de professores, assim como em todas

as fases de escolarização, não estamos deixando nossos alunos fazerem e re-

descobrirem por si próprios conceitos matemáticos, mas apenas copiando a matemática

que lhes é imposta, não apenas porque não sabem o porquê de alguns algoritmos, pois

se assim fosse seria mais simples resolver o problema, mas porque não os deixamos

muitas vezes pensar sobre o que estão fazendo e tentando aprender.

O aluno é treinado a adotar certos procedimentos, os quais o levarão à

resposta esperada pelo professor. Esta prática educacional, embasada em

modelos, repetições e utilização de regras, treina e conduz a uma

aprendizagem mecânica, provocando, no aluno, a sensação de

incapacidade, quando se depara em situações não treinadas em sala de aula.

(Fonseca, 1997, p.19)

Os conteúdos são despejados aos montes e questões básicas ficam esquecidas ou

delegadas a segundo plano. Os alunos de licenciatura muitas vezes provam as condições

para que um conjunto seja um Grupo, mas não sabem o significado do sinal ‘+’ que

colocam num simples algoritmo de multiplicação. E o conhecimento de Grupo é

relativamente novo para um acadêmico de matemática comparado ao algoritmo de

multiplicação que ele realiza desde as primeiras séries da escolarização.

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Não estamos afirmando com isso que não se deva ensinar conteúdos importantes

de álgebra e análise ou que eles não sejam importantes para a formação do futuro

professor de matemática, apenas afirmamos que há uma disparidade nessa situação.

Concordamos com Pavanello (2003, p.9), quando ressalta que:

Para que possa levar os estudantes a aprender Matemática, para que

se esteja em condições de lhes proporcionar experiências enriquecedoras e

significativas com ela, é evidente que o professor precisa de conhecimentos

que lhe permitam executar com êxito sua tarefa, dentre as quais não pode

deixar de ser mencionado um conhecimento abrangente e profundo dos

conteúdos que serão abordados em sala de aula.

A qualidade daquilo que nosso acadêmico ensinará estará vinculado à visão

geral que ele, enquanto professor, tem de todo o conhecimento que procurará fazer com

que seus alunos aprendam. Para que possa executar sua tarefa com êxito, um dos

pressupostos necessários, é que consiga proporcionar a seus alunos experiências que

sejam significativas e isso só é possível quando ele mesmo tem domínio sobre essas

experiências.

Durante o processo de ensino aprendizado é necessário que os licenciandos em

matemática reflitam sobre o que estão fazendo para que o que estão aprendendo seja

significativo, o conhecimento de determinado conceito matemático deve ser

evidenciado para que a técnica utilizada seja proveniente deste e se origine com bases

sólidas no conceito apreendido pelo acadêmico.

Palavras Chaves: quatro operações, algoritmos, licenciatura em matemática.

Referências Bibliográficas

CARVALHO, Dione Lucchesi de. Metodologia do ensino da Matemática. São Paulo:

Cortez, 1994.

FONSECA, Solange. Metodologia de Ensino: Matemática. Belo Horizonte: Editora

Lê, 1997.

LEME, Helena Alessandra Scavazza. Matemática Financeira através de atividades

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