Adsorção de ibuprofeno e ácido clofíbrico em carvões activados · Patrick Leão Montalvão...
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Patrick Leo Montalvo Figueiredo Licenciatura em Engenharia Qumica e Bioqumica
Adsoro de ibuprofeno e cido clofbrico em carves activados
Dissertao para obteno do Grau de Mestre em Engenharia Qumica e Bioqumica
Orientadora: Ana Sofia Dias Mestre Homem, Doutora, FCUL
Co-orientadora: Isabel Maria de Figueiredo Ligeiro da Fonseca, Professora Doutora, FCT/UNL
Presidente: Prof. Doutora Ana Maria Martelo Ramos Arguente: Prof. Doutora Angela Maria Pereira Martins Nunes Vogais: Doutora Ana Sofia Dias Mestre Homem e Prof. Doutora Isabel Maria de Figueiredo Ligeiro da Fonseca
Maro 2012
Patrick Leo Montalvo Figueiredo Licenciatura em Engenharia Qumica e Bioqumica
Adsoro de ibuprofeno e cido clofbrico em carves activados
Dissertao para obteno do Grau de Mestre em Engenharia Qumica e Bioqumica
Orientadora: Ana Sofia Dias Mestre Homem, Doutora, FCUL
Co-orientadora: Isabel Maria de Figueiredo Ligeiro da Fonseca, Professora Doutora, FCT/UNL
Presidente: Prof. Doutora Ana Maria Martelo Ramos Arguente: Prof. Doutora Angela Maria Pereira Martins Nunes Vogais: Doutora Ana Sofia Dias Mestre Homem e Prof. Doutora Isabel Maria de Figueiredo Ligeiro da Fonseca
Maro 2012
A presente Dissertao foi realizada na
Faculdade de Cincias da Universidade de
Lisboa, no Grupo de Adsoro e Materiais
Adsorventes em parceria com o grupo de
Engenharia das Reaces (Departamento
de Qumica, REQUIMTE) da Faculdade de
Cincias e Tecnologias. Do presente
trabalho resultaram duas comunicaes em
painel aceites na Annual World Conference
on Carbon 2012 que se ir realizar em
Junho de 2012 em Cracvia, (Polnia).
COPYRIGHT
Autorizo os direitos de copyright da presente tese de mestrado, denominada Adsoro de
ibuprofeno e cido clofbrico em carves activados.
A Faculdade de Cincias e Tecnologia e a Universidade Nova de Lisboa tm o direito, perptuo
e sem limites geogrficos, de arquivar e publicar esta dissertao atravs de exemplares
impressos reproduzidos em papel ou de forma digital, ou por qualquer outro meio conhecido ou
que venha a ser inventado, e de a divulgar atravs de repositrios cientficos e de admitir a sua
cpia e distribuio com objectos educacionais ou de investigao, no comerciais, desde que
seja dado crdito ao autor e editor.
ix
Agradecimentos
Em primeiro lugar, agradeo a minha co-orientadora, professora doutora Isabel Fonseca, pela
oportunidade concedida de trabalhar em um tema to interessante como o abordado neste
trabalho. E quem sabe as futuras portas que me poder abrir nos prximos anos.
Quero deixar um especial agradecimento a minha orientadora, doutora Ana Mestre, que esteve
dia atrs dia ao meu lado, sempre com uma enorme dedicao e apoio ao longo destes meses de
trabalho. Principalmente evidenciar a sua extraordinria pacincia e os conhecimentos que me
pode transmitir nestes meses que foram to bem aproveitados e eficientes. Muito obrigado!
A professora doutora Ana Paula Carvalho um merecidssimo agradecimento pelo seu apoio,
tomada de deciso, e sua pacincia que me foi concedida na elaborao deste trabalho. Quero
dizer que aprendi muito consigo nestes rduos meses de trabalho, muito obrigado.
Quimitejo pelo fornecimento do carvo activado comercial com origem da casca de coco e a
Cordex pelo fornecimento do sisal, utilizado na preparao de outro carvo activado, ambos
essenciais para a realizao deste trabalho.
Un grande beso e abrazo a mi famlia espaola que estuvieron presentes durante este perodo
intensivo de mi tesis, por su apoyo e agradable compaia ya que me encuentro tan lejos de mi
razes y mi famlia.
Nada disso seria possvel sem o apoio de toda a minha famlia, seja financeiro, emocional e
educacional. Um especial agradecimento ao meu pai Dionis, a minha me Cristiane e ao meu
grande irmo que idolatro e amo tanto, Alessandro! Espero que o nosso futuro seja prximo um
do outro irmo! Ao meu irmozinho Gustavo pelas compridas e divertidas conversas no Skype
que fez possvel que a distancia entre eu e vocs todos no fosse to grande.
Por ltimo, y como seria obvio, tengo que agradecer a mi novia espaolita, Mara del Mar, que
estuvo a mi lado todo este tiempo, soportndome en los das ms estresantes, apoyndome
sicolgicamente y dndome fuerzas y ganas da tras da para concretizar este trabajo tan
importante en mi vida. Muito obrigado GOSTOSINHA! Comienza, aqu e ahora, nuestro grande
futuro como la mejor pareja de ingenieros qumicos que alguna vez podra haber existido.
Te amo!
No posso obrigatoriamente e de baixo de um chicote de agradecer a Maria pela realizao das
isotrmicas de adsoro de CO2 na caracterizao textural dos carves utilizados neste estudo.
Queria deixar uma dedicatria todos aqueles que no foram nomeados, mas que de alguma
forma me ajudaram nesta fase de minha vida. Em especial as minhas avs e a minha tia Timi
que estiveram para mim naqueles momentos que eu mais precisei.
x
A todos vocs, um grande abrao e um sincero obrigado, acredito que nada disso seria possvel
sem o vosso apoio, carinho e companheirismo!
MUITO OBRIGADO!
xi
Resumo
O presente trabalho consistiu no estudo da remoo de ibuprofeno e cido clofbrico em
solues aquosas por adsoro em carves activados. Os carves preparados laboratorialmente a
partir de resduos lignocelulsicos apresentaram desempenhos semelhantes aos do carvo
comercial, mostrando que os carves laboratoriais podem ser considerados como alternativas
para tratamentos de guas. O carvo obtido a partir das borras de caf mostrou ser o mais
adequado para a remoo do ibuprofeno (58%) enquanto que o obtido a partir de resduos da
cortia revelou ser to eficiente como o carvo comercial para a remoo do cido clofbrico
(73%).
Os resultados de adsoro do ibuprofeno e do cido clofbrico no carvo comercial e no carvo
obtido a partir de cortia mostraram que para concentraes elevadas
(> 50 mg L-1
) a adsoro do cido clofbrico sempre superior. Contudo, a concentraes
baixas a remoo dos dois compostos semelhante no carvo preparado a partir da cortia
enquanto no carvo comercial favorecida a adsoro do ibuprofeno.
O estudo da influncia da dureza da gua na adsoro do cido clofbrico no carvo comercial
mostrou uma interferncia significativa dos ies Ca2+
e Mg2+
no processo de adsoro,
aumentando a eficincia e diminuindo a velocidade de remoo. A mudana no mecanismo
observada, poder ser devido diminuio da energia de solvatao do cido clofbrico.
Para a anlise das isotrmicas foram aplicadas diversas equaes e modelos geralmente
utilizados em sistemas de adsoro em fase lquida. Realizaram-se ajustes no lineares tendo-se
avaliado vrias funes de erro, de forma a normalizar os graus de liberdade e permitir
comparar os resultados obtidos pelos vrios ajustes. Este um campo de trabalho actual que
deve continuar a ser explorado, pois crucial para o conhecimento do comportamento de
adsoro dos contaminantes nos carves.
Palavras-chave: Carves Activados, Ibuprofeno, cido Clofbrico, Adsoro em Fase
Lquida, Dureza da gua, Tratamento de guas, Ajustes de Equaes
xii
xiii
Abstract
The present work was focused on the removal of ibuprofen and clofibric acid in aqueous
solutions by adsorption on activated carbon. The lab-made carbons prepared from
lignocellulosic waste showed results similar to those marketed for water treatment also tested,
indicating that the laboratory carbons can be considered as alternatives for water treatment. The
spent-coffee-based carbon proved to be the most suitable for the removal of ibuprofen (58%)
while the cork based material was as effective as the commercial carbon for clofibric acid
removal (73%).
Ibuprofen and clofibric acid adsorption equilibrium results in the commercial and cork-based
carbons shown that for higher concentrations (>50 mg L-1
) clofibric acid adsorption is higher,
but at low concentrations in the commercial sample, the removal of ibuprofen is favored.
The study of the influence of water hardness in the adsorption of the commercial sample,
clofibric acid showed a significant interference of the ions Ca2+
and Mg2+
in the adsorption
process, increased the efficiency and decreasing the rate of removal.
In the analysis of various isotherms were applied different equations by non-linear adjustments.
Error functions were evaluated in order to standardize the degrees of freedom, allowing
comparing the results obtained by the models.
Key-words: Activated Carbons, Ibuprofen, Clofibric Acid, Liquid Phase Adsorption, Water
Hardness, Water Treatment, Equations Adjustments
xiv
xv
ndice
1. Introduo ............................................................................................................................. 1
1.1. Ibuprofeno ..................................................................................................................... 4
1.2. cido Clofbrico ............................................................................................................ 5
1.3. Sistemas de tratamento de guas ................................................................................... 8
1.4. Adsoro de contaminantes em fase lquida por carvo activado ............................... 11
1.5. Efeito da dureza da gua na adsoro de contaminantes por carvo activado ............ 14
2. Estudos de adsoro de ibuprofeno e de cido clofbrico em carves activados ................ 17
2.1. Cinticas de adsoro .................................................................................................. 17
2.1.1. Modelo cintico de pseudo-primeira ordem ........................................................ 18
2.1.2. Modelo cintico de pseudo-segunda ordem ........................................................ 19
2.2. Isotrmicas de adsoro .............................................................................................. 19
2.2.1. Isotrmica de Langmuir ...................................................................................... 23
2.2.2. Isotrmica de Freundlich ..................................................................................... 24
2.2.3. Isotrmica de Redlich-Peterson ........................................................................... 25
2.2.4. Isotrmica de Temkin .......................................................................................... 26
2.2.5. Isotrmica de Toth ............................................................................................... 26
2.2.6. Isotrmica Dubinin-Astakhov (DA) .................................................................... 26
3. Objectivos ........................................................................................................................... 29
4. Parte Experimental .............................................................................................................. 31
4.1. Ibuprofeno e cido clofbrico ...................................................................................... 31
4.2. Quantificao do ibuprofeno e cido clofbrico. ......................................................... 33
4.3. Carves activados ........................................................................................................ 34
4.4. Estudos cinticos ......................................................................................................... 34
4.5. Isotrmicas de adsoro .............................................................................................. 34
4.6. Influncia da dureza da gua no processo de adsoro ............................................... 35
4.6.1. Determinao da solubilidade ............................................................................. 35
5. Resultados e Discusso ....................................................................................................... 37
xvi
5.1. Caractersticas dos carves activados.......................................................................... 37
5.2. Adsoro de ibuprofeno .............................................................................................. 39
5.2.1. Estudo das cinticas de remoo de ibuprofeno .................................................. 39
5.2.2. Estudo das isotrmicas de adsoro de ibuprofeno ............................................. 43
5.3. Adsoro de cido clofbrico ....................................................................................... 53
5.3.1. Estudo das cinticas de remoo de cido clofbrico .......................................... 53
5.3.2. Estudo das isotrmicas de adsoro de cido clofbrico ..................................... 55
5.4. Influncia da dureza da gua no processo de adsoro do cido clofbrico ................ 61
5.4.1. Estudo da cintica de adsoro de cido clofbrico para diferentes durezas de
gua ..61
5.4.2. Estudo das isotrmicas para diferentes durezas de guas .................................... 64
6. Concluses .......................................................................................................................... 69
7. Perspectivas de trabalho futuro ........................................................................................... 71
8. Bibliografia ......................................................................................................................... 73
9. Anexos ................................................................................................................................. 79
9.1. Preparao das guas sintticas ................................................................................... 79
9.2. Tabelas dos ensaios de adsoro em fase lquida ........................................................ 80
9.2.1. Adsoro de ibuprofeno ...................................................................................... 80
9.2.1.1. Cinticas de adsoro .................................................................................. 80
9.2.1.2. Isotrmicas de adsoro............................................................................... 81
9.2.2. Adsoro de cido clofbrico em gua mili-Q ..................................................... 81
9.2.2.1. Cinticas de adsoro .................................................................................. 81
9.2.2.2. Isotrmicas de adsoro............................................................................... 82
9.2.3. Estudo do efeito da dureza da gua na adsoro de cido clofbrico pelo carvo
activado CP ......................................................................................................................... 82
9.2.3.1. Cinticas de adsoro .................................................................................. 82
9.2.3.2. Isotrmicas de adsoro............................................................................... 83
9.3. Rectas de calibrao para a determinao da quantidade de analito por
espectofotometria UV-vis. ...................................................................................................... 83
xvii
9.3.1. Ibuprofeno ........................................................................................................... 83
9.3.2. cido Clofbrico .................................................................................................. 84
9.3.2.1. gua mili-Q, 0 mg.L-1 de CaCO3 ................................................................ 84
9.3.2.2. gua moderadamente dura, 80 mg L-1 de CaCO3 ....................................... 85
9.3.2.3. gua dura, 200 mg L-1 de CaCO3................................................................ 86
9.4. Anlise ICP-MS .......................................................................................................... 87
9.5. Comunicaes aceites para a apresentao em painel na Annual World Conference on
Carbon 2012 na Cracvia, Polnia. ........................................................................................ 88
xviii
xix
ndice de figuras
Figura 1 - Esquema representativo das possveis fontes e caminhos para a presena de resduos
farmacuticos no meio ambiente aqutico (adaptado de (Thomas, 2002)) ................................... 2
Figura 2 - Estrutura molecular do ibuprofeno. .............................................................................. 4
Figura 3 - Estrutura molecular do cido clofbrico. ...................................................................... 5
Figura 4 - Representao esquemtica da estrutura porosa de um carvo activado. ................... 11
Figura 5 -Os seis tipos de isotrmicas de adsoro gs-slido de acordo com a classificao
IUPAC de 1985 (adaptada de Sing, Everett et al. (1985)) .......................................................... 20
Figura 6 - Os tipos mais comuns de isotrmicas de adsoro encontrados no sistema soluo
aquosa-carvo activado (adaptado de(Moreno-Castilla, 2004)). ................................................. 23
Figura 7 - Principais caracterstias fsico-qumicas do ibuprofeno cido e o sal sdico de
ibuprofeno (Sigma-Aldrich; Cho, Huang et al., 2011). ............................................................... 31
Figura 8 - Arranjo dos tomos do ibuprofeno no espao apresentando as distncias interatmicas
estimadas de acordo com a modelizao molecular realizada com o Gaussian 03 usando o
mtodo semi-emprico PM3 (Mestre, Pires et al., 2007). ............................................................ 32
Figura 9 - Diagrama de especiao do cido clofbrico (Whiteside, Hilal et al., 2006). ............. 33
Figura 10 Arranjo dos tomos do cido clofbrico no espao apresentando as distncias
interatmicas estimadas de acordo com a modelizao molecular realizada com o Gaussian 03
usando o mtodo semi-emprico PM3 ......................................................................................... 33
Figura 11 - Isotrmicas de adsoro de N2 a 196 C nos carves activados. Os smbolos vazios
e cheios representam, respectivamente, os pontos de adsoro e desadsoro (Mestre, 2009;
Mestre, Bexiga et al., 2011; Proena, 2011). .............................................................................. 37
Figura 12 Distribuio do tamanho de microporos dos carves activados, obtida de acordo
com o mtodo descrito por Pinto, Mestre et al. (2010), aplicado s isotrmicas de adsoro de
CO2 a 0 C. .................................................................................................................................. 38
Figura 13 - Resultados cinticos da adsoro de ibuprofeno a 30C (6 mg de carvo activado / 9
ml soluo [ibuprofeno] = 120 mg L-1
. ....................................................................................... 39
Figura 14 Eficincia de remoo do ibuprofeno versus volume de supermicroporos.............. 40
Figura 15 - Esquema representativo das cargas do ibuprofeno e dos carves activados utilizados
na adsoro do ibuprofeno. ......................................................................................................... 41
xx
Figura 16 - Isotrmicas de adsoro de ibuprofeno para os carves activados seleccionados, a 30
C apresentando o ajuste dos dados experimentais aos modelos de Langmuir (linha tracejada) e
Freundlich (linha slida). Para cada ponto experimental so apresentadas as barras de erro. .... 43
Figura 17 - Capacidade de adsoro do ibuprofeno na monocamada versus o volume de
supermicroporos. ......................................................................................................................... 46
Figura 18 - Isotrmicas de adsoro de ibuprofeno para os carves activados seleccionados, a 30
C apresentando o ajuste dos dados experimentais ao modelo de Redlich-Peterson (linha slida).
..................................................................................................................................................... 49
Figura 19 - Isotrmicas de adsoro de ibuprofeno para os carves activados seleccionados, a 30
C apresentando o ajuste dos dados experimentais ao modelo de Langmuir aplicado na sua
forma no linear (linha contnua) e linear, a partir da equao da Langmuir I (linha tracejada).
Para cada ponto experimental so apresentadas as barras de erro............................................... 51
Figura 20 - Isotrmicas de adsoro de ibuprofeno para os carves activados seleccionados, a 30
C apresentando o ajuste dos dados experimentais ao modelo de Freundlich aplicado na sua
forma no linear (linha contnua) e linear (linha tracejada). Para cada ponto experimental so
apresentadas as barras de erro. .................................................................................................... 52
Figura 21 - Resultados cinticos da adsoro de cido clofbrico a 30C (6 mg de carvo
activado / 9 ml soluo [cido clofbrico] = 120 mg L-1
. ............................................................ 53
Figura 22 - Comparao da eficincia de remoo na adsoro do ibuprofeno e cido clofbrico
no carvo activado CP e CAC. .................................................................................................... 55
Figura 23 - Isotrmicas de adsoro do cido clofbrico para os carves activados CAC e CP, a
30 C. Para cada ponto experimental so apresentadas as barras de erro. Apresenta-se tambm
os modelos que permitiram, obter os melhores ajustes (linha slida) para cada isotrmica:
Freundlich (CAC) e DA (CP). ..................................................................................................... 56
Figura 24 - Isotrmicas de adsoro de ibuprofeno (smbolos cheios) e cido clofbrico
(smbolos vazios) para os carves activados CAC e CP a 30 C apresentando o melhor ajuste
dos dados experimentais. A equao de Redlich-Peterson no caso do ibuprofeno, quer com o
carvo CAC quer com o CP e quanto ao cido clofbrico o melhor ajuste foi da equao de
Dubinin-Astakhov no caso do carvo CP e Freundlich no caso do carvo CAC. ....................... 60
Figura 25 Esquema representativo das cargas do ibuprofeno e cido clofbrico e dos carves
activados utilizados na adsoro destes....................................................................................... 60
Figura 26 - Resultados cinticos da adsoro de cido clofbrico a 30 C em guas de diferentes
durezas (6 mg de carvo activado (CP) / 9 ml soluo [cido clofbrico] = 120 mg L-1
). .......... 61
xxi
Figura 27 - Isotrmicas de adsoro do cido clofbrico pelo carvo activado CP, a 30 C. Para
cada ponto experimental so apresentadas as barras de erro. ...................................................... 64
Figura 28 - Recta de calibrao para a determinao da quantidade de cido clofbrico em
soluo......................................................................................................................................... 83
Figura 29 - Recta de calibrao quando o estudo feito com o comprimento de onda de 228nm
para a determinao da quantidade de cido clofbrico em soluo a partir de gua mili-Q. ..... 84
Figura 30 - Recta de calibrao quando o estudo feito com o comprimento de onda de 278nm
para a determinao da quantidade de cido clofbrico em soluo a partir de gua mili-Q. ..... 84
Figura 31 - Recta de calibrao quando o estudo realizado com o comprimento de onda de
228nm para a determinao da quantidade de cido clofbrico em soluo a partir de gua
moderadamente dura 80 mg L-1
CaCO3. ..................................................................................... 85
Figura 32 - Recta de calibrao quando o estudo realizado com o comprimento de onda de
278nm para a determinao da quantidade de cido clofbrico em soluo a partir de gua
moderadamente dura 80 mg L-1
CaCO3. ..................................................................................... 85
Figura 33 - Recta de calibrao quando o estudo realizado com o comprimento de onda de
228nm para a determinao da quantidade de cido clofbrico em soluo a partir de gua
moderadamente dura 200 mg L-1
CaCO3. ................................................................................... 86
Figura 34 - Recta de calibrao quando o estudo realizado com o comprimento de onda de
278nm para a determinao da quantidade de cido clofbrico em soluo a partir de gua
moderadamente dura 200 mg L-1
CaCO3. .................................................................................... 86
xxii
xxiii
ndice de tabelas
Tabela 1 - Consumo per capita em (mg.cap-1
.ano-1
) de PPCPs (adaptado de Carballa, Omil et al.
(2008)). A negrito indicado o composto farmacutico mais consumido em cada pas. ............. 3
Tabela 2 - Valores de concentrao de cido clofbrico detectado em diversos estudos no meio
ambiente, compilados por Schulman, Sargent et al. (2002). ......................................................... 6
Tabela 3 - Resultados do estudo ecotoxicolgico do cido clofbrico (Henschel, Wenzel et al.,
1997). ............................................................................................................................................ 7
Tabela 4 - Valores experimentais obtidos com bactria, rotfero, cladceros e peixes submetidos
a cido clofbrico (Ferrari, Paxeus et al., 2003). ........................................................................... 8
Tabela 5 - Processos de tratamento de gua de acordo com o nvel de tratamento (adaptado de
Helmer, Hespanhol et al. (1997)). ................................................................................................. 9
Tabela 6 - Graus de dureza da gua (adaptado de Weiner (2000)) ............................................. 14
Tabela 7 - Massas necessrias para a preparao das guas sintticas utilizadas neste trabalho. 35
Tabela 8 - Propriedades texturais dos carves activados estudados e valores de pH no ponto de
carga zero. ................................................................................................................................... 38
Tabela 9 - Coeficientes de correlao dos ajustes at o tempo de 6 horas, equao cintica de
pseudo-primeira e pseudo-segunda ordem, para a adsoro nos carves activados estudados. .. 39
Tabela 10 - Parmetros das cinticas de pseudo-segunda ordem da adsoro ibuprofeno para as
amostras de carves estudados. k2 a constante de velocidade de pseudo-segunda ordem, h a
velocidade de adsoro inicial, t1/2 o tempo de meia vida, qe,calc e Ce,calc so respectivamente, a
quantidade de ibuprofeno adsorvida e a concentrao que permanece em soluo no equilbrio,
ambas calculadas pelo modelo cintico de pseudo-segunda ordem, e re a eficincia de
remoo. ...................................................................................................................................... 40
Tabela 11 - Analise elementar dos carves activados em estudo. ............................................... 42
Tabela 12 - Parmetros das isotrmicas de Langmuir e de Freundlich para a adsoro de
ibuprofeno a 30C para as quatro amostras de carves estudados, coeficientes de correlao das
regresses lineares, R2, e anlise no linear do teste qui-quadrado,
2. Os valores a negrito
representam os melhores ajustes para cada carvo. .................................................................... 45
Tabela 13 - Parmetros das isotrmicas de Langmuir, Freundlich, Redlich-Peterson, Toth,
Temkin obtidos pelo ajuste no linear para a adsoro de ibuprofeno a 30C para as quatro
amostras de carves estudados, coeficientes de determinao ajustados ( 2), a anlise no linear
do teste qui-quadrado, 2, e o qui-quadrado reduzido,
2 reduzido. ............................................ 48
xxiv
Tabela 14 - Parmetros da isotrmica de Redlich-Peterson e os seus respectivos erros
percentuais obtidos na sua forma no linear para a adsoro de ibuprofeno a 30C para as quatro
amostras de carves estudados. ................................................................................................... 50
Tabela 15 - Coeficientes de correlao dos ajustes de pseudo-primeira e pseudo-segunda ordem,
para a adsoro nos dois carves activados estudados. ............................................................... 53
Tabela 16 - Parmetros das cinticas de adsoro de pseudo-segunda ordem do cido clofbrico
para as duas amostras de carves estudados. k2 a constante de velocidade de pseudo-segunda
ordem, h a velocidade de adsoro inicial, t1/2 o tempo de meia vida, qe,calc e Ce,calc so
respectivamente, a quantidade de cido clofbrico adsorvida e a que permanece em soluo no
equilbrio, ambas calculadas pelo modelo cintico de pseudo-segunda ordem, e re a eficincia
de remoo. ................................................................................................................................. 54
Tabela 17 - Relao da eficincia de remoo do cido clofbrico com o volume de
supermicroporos. ......................................................................................................................... 54
Tabela 18 - Parmetros das isotrmicas de Langmuir, Freundlich, Redlich-Peterson, Toth,
Temkin, DA, obtidos na sua forma no linear para a adsoro de cido clofbrico a 30C para as
duas amostras de carves estudados, coeficientes de determinao ajustados ( 2Ajustado), a anlise
no linear do teste qui-quadrado, 2, e o qui-quadrado reduzido (
2Reduzido). .............................. 58
Tabela 19 - Tipos de gua usadas como solvente e siglas como sero referidas ao longo do
presente trabalho. ........................................................................................................................ 61
Tabela 20 - Coeficientes de correlao dos ajustes das equaes cinticas de pseudo-primeira e
de pseudo-segunda ordem, para a adsoro de cido clofbrico a partir de guas com diferentes
graus de dureza no carvo CP. .................................................................................................... 62
Tabela 21 - Parmetros das cinticas de adsoro de pseudo-segunda ordem do cido clofbrico
a partir de guas com diferentes graus de dureza no carvo activado CP. k2 a constante de
velocidade de pseudo-segunda ordem, h a velocidade de adsoro inicial, t1/2 o tempo de
meia vida, qe,calc e Ce,calc so calculadas respectivamente, a quantidade de cido clofbrico
adsorvida e a que permanece em soluo no equilbrio, ambas pelo modelo cintico de pseudo-
segunda ordem, e re a eficincia de remoo. .......................................................................... 62
Tabela 22 - Solubilidade do cido clofbrico em gua com diferentes graus de dureza. ............ 63
Tabela 23 - Parmetros das isotrmicas de Langmuir, Freundlich, Redlich-Peterson, Toth,
Temkin, Dubinin-Astakhov obtidos pelo ajuste no linear para a adsoro de cido clofbrico a
partir de guas com diferentes graus de dureza a 30C no carvo activado CP, coeficientes de
determinao ajustados ( 2), a anlise no linear do teste qui-quadrado, 2, e o o qui-quadrado
reduzido, 2 reduzido. ................................................................................................................. 66
xxv
Tabela 24 - Anlise do erro associado a cada parmetro obtido na aplicao da equao de Toth,
de Redlich-Peterson e de Langmuir aos dados experimentais da isotrmica de adsoro do cido
clofbrico na gua moderadamente dura. .................................................................................... 67
Tabela 25 - Anlise do erro associado a cada parmetro obtido na aplicao da equao de
Freundlich aos dados experimentais da isotrmica de adsoro do cido clofbrico na gua dura.
..................................................................................................................................................... 67
Tabela 26 - Dados das cinticas de adsoro de ibuprofeno respectivamente no carvo CP,
CAC, CFAC e SAC a 30C para uma concentrao inicial constante de 120ppm. .................... 80
Tabela 27 Continuao dos dados das cinticas de adsoro de ibuprofeno respectivamente no
carvo CP, CAC, CFAC e SAC a 30C para uma concentrao inicial constante de 120ppm. .. 80
Tabela 28 - Dados das isotrmicas de adsoro de equilbrio de ibuprofeno respectivamente para
o CP, CAC, CFAC e SAC a 30C. .............................................................................................. 81
Tabela 29 - Dados das cinticas de adsoro de cido clofbrico respectivamente no carvo CP e
CAC a 30C para uma concentrao inicial constante de 120ppm e pH volta de 3. ................ 81
Tabela 30 - Dados das isotrmicas de adsoro de equilbrio de cido clofbrico respectivamente
para o CP e CAC a 30C e pH volta de 3. ................................................................................ 82
Tabela 31 - Dados das cinticas de adsoro de cido clofbrico para diferentes graus de dureza
de gua a 30C para uma concentrao inicial constante de 120ppm. Com pH=3 para 0 mg.L-1
de CaCO3, pH=2,8 para 80 mg.L-1
de CaCO3 e pH=2,6 para 200 mg.L-1
de CaCO3. ................. 82
Tabela 32 - Dados das isotrmicas de adsoro de equilbrio de cido clofbrico para diferentes
graus de dureza de gua a 30C. Com pH volta de 3 para 0 mg.L-1
de CaCO3, pH volta de 2,9
para 80 mg.L-1
de CaCO3 e pH volta de 2,7 para 200 mg.L-1
de CaCO3. ................................. 83
Tabela 33 Concentrao dos ies Ca2+
e Mg2+
obtidas pela anlise ICP-MS das diferentes
amostras utilizadas no estudo da influncia destes ies na adsoro do cido clofbrico. .......... 87
xxvi
xxvii
Glossrio de abreviaturas
WHO World Health Organization
EPA Environmental Protection Agency
IUPAC Unio Internacional de Qumica Pura e Aplicada (do acrnimo ingls para
International Union of Pure and Applied Chemistry)
DA DubininAstakhov
BET Brunauer, Emmet e Teller
PPCP Compostos Farmacuticos e de Higiene e Cuidado Pessoal (do acrnimo ingls para
Pharmaceutical and Personal Care Products)
ppm partes por milho
ppbs partes por bilio
ppts partes por trilio
PZC Ponto de Carga Zero (do acrnimo ingls para Point of Zero Charge)
CAC Chemical Abstracts Service
IBU Ibuprofeno
EC50 Concentrao efectiva em 50% (do acrnimo ingls para effective concentration)
NOEC Concentrao para a qual no se observaram efeitos (do acrnimo ingls para no
observed effect concentration)
LOEC Menor concentrao para a qual se observaram efeitos (do acrnimo ingls para
lowest observed effect concentration)
LOD Limite de Deteco (do acrnimo ingls para Limit of Detection)
CP Carvo activado obtido a partir da casca de coco
SAC Carvo activado obtido a partir do Sisal
CAC Carvo activado obtido a partir da cortia
CFAC Carvo activado obtido a partir da borra de caf
ICP Plasma Acoplado Indutivamente (do acrnimo ingls para Inductively coupled
plasma)
W gua mili-Q
W80 gua sinttica com dureza de 80 mg L-1
de equivalentes de CaCO3
W200 gua sinttica com dureza de 200 mg L-1
de equivalentes de CaCO3
xxviii
xxix
Glossrio de smbolos
qt Quantidade de soluto adsorvido no tempo t por massa de adsorvente
t Tempo
C0 Concentrao inicial de soluto
Ct Concentrao de soluto no tempo t
V Volume da soluo de adsorvvel
W Massa de carvo seco
kp1 Constante de velocidade de pseudoprimeira ordem
kp2 Constante de velocidade de pseudosegunda ordem
qe Quantidade de soluto adsorvido no equilbrio por massa de adsorvente
h Velocidade de adsoro inicial obtida pela equao cintica de pseudosegunda ordem
t1/2 Tempo de meia vida obtido pela equao cintica de pseudosegunda ordem
nads
Quantidade adsorvida presso p
p/p0 Presso relativa do adsortivo temperatura a que o ensaio realizado
T Temperatura
p0 Presso de saturao do adsortivo temperatura a que o ensaio realizado
qm Capacidade de adsoro na monocamada por massa de adsorvente
KL Constante de Langmuir
Ce Concentrao de equilbrio na soluo
H Variao da entalpia
KF Constante de Freundlich
nF Expoente de Freundlich
KR Constante da isotrmica de Redlich-Peterson
aR Constante da isotrmica de Redlich-Peterson
bR Expoente de Redlich-Peterson
b Constante de Temkin
a Constante da isotrmica de Temkin
k1 Constante da isotrmica de Toth
xxx
k2 Constante de Toth
nT Expoente de Toth
wads
Volume adsorvido temperatura T
w0 Espao total de adsoro nos microporos
A Potencial de adsoro da equao DA
nDA Parmetro da equao DA
E Energia caracterstica de adsoro
Expoente da isotrmica de Redlich-Peterson
Na Quantidade adsorvida
Nam Capacidade de adsoro na monocamada
AS Potencial termodinmico
ES Energia caracterstica de adsoro obtida pela equao DA
C* Concentrao de saturao da espcie adsorvida
Comprimento de onda correspondente a mxima absorvncia
m Massa do composto
ABET rea superficial especfica determinada pelo mtodo BET, rea superficial aparente
ou rea BET
Vtotal Volume poroso total (volume adsorvido a p/p0 = 0,95)
Vmeso Volume mesoporoso
V total Volume total de microporos estimado pelo mtodo s
V ultra Volume de ultramicroporos estimado pelo mtodo s
V super Volume de supermicroporos estimado pelo mtodo s
W0 N2 Volume microporoso obtido pela equao DR aplicada aos dados de adsoro de N2
a 196 C
W0 CO2 Volume microporoso obtido pela equao DR aplicada aos dados de adsoro de
CO2 a 0 C
pHPZC pH no ponto de carga zero
R2 Coeficiente de correlao
qe,calc A quantidade de soluto adsorvida, calculada pelo modelo cintico de pseudosegunda ordem
Ce,calc Concentrao de soluto que permanece em soluo no equilbrio calculada pelo
modelo cintico de pseudosegunda ordem
re Eficincia de remoo
xxxi
C/C0 Concentrao relativa de soluto em soluo
2 Anlise nolinear do teste quiquadrado
2
Reduzido Anlise nolinear do teste quiquadrado reduzido
2Ajustado Coeficiente de determinao ajustado
xxxii
1
1. Introduo
O aumento populacional, e consequentemente o aumento das actividades industriais, que se
verificou nas ltimas dcadas tem contribudo de forma significativa para o agravamento dos
problemas ambientais, principalmente no que respeita s guas superficiais e subterrneas.
Como consequncia, a legislao tornou-se cada vez mais restrita, e a fiscalizao mais rgida,
tendo resultado numa enorme expanso e modernizao das estaes de tratamento de guas
residuais nos pases industrializados (Helmer, Hespanhol et al., 1997).
Por outro lado, o desenvolvimento das tcnicas analticas para anlise de guas que se verificou
nos ltimos anos permitiu alertar para a presena de novos contaminantes potencialmente
perigosos, denominados globalmente como contaminantes emergentes. Como resultado, os
estudos revelaram a presena de, entre outros, aditivos de gasolina, produtos de desinfeco,
retardantes de chama, surfactantes e metabolitos de surfactantes, anti-spticos, compostos
farmacuticos como antibiticos, antidepressivos, compostos esterides, medicamentos para
tratamento de cancro, analgsicos, tranquilizantes, e compostos para reduo de colesterol
(Barcelo, 2003; Diamond, Latimer et al., 2011). Os contaminantes emergentes, so actualmente
alvo de estudos prioritrios nos principais organismos dedicados proteco da sade pblica e
meio ambiental, tais como a World Health Organization (WHO), a Environmental Protection
Agency (EPA) e a Comisso Europeia, pois sabe-se ainda muito pouco acerca do impacto destes
contaminantes no meio ambiente (Cunningham, Buzby et al., 2006).
Entre os contaminantes emergentes, dar-se- maior relevncia aos compostos farmacuticos e de
higiene e cuidado pessoal, os denominados PPCPs (do acrnimo ingls para Pharmaceutical
and Personal Care Products), visto que neste trabalho se procedeu ao estudo detalhado da
adsoro em carves activados de dois compostos deste grupo, nomeadamente o ibuprofeno e o
cido clofbrico. Na figura 1 apresentado um esquema com um resumo das possveis fontes e
caminhos para a presena de resduos de PPCPs no meio ambiente (Thomas, 2002).
A importncia dos estudos centrados na problemtica da deteco e remoo de PPCPs nas
guas foi evidenciada no estudo de reviso realizado por Daughton e Ternes (1999) onde se
mostrou que a quantidade de compostos farmacuticos e de higiene e cuidado pessoal que
entram anualmente no meio ambiente aproximadamente igual quantidade de pesticidas
utilizados em cada ano.
2
Figura 1 - Esquema representativo das possveis fontes e caminhos para a presena de resduos farmacuticos no
meio ambiente aqutico (adaptado de (Thomas, 2002))
A indstria farmacutica, os hospitais e as clnicas so obviamente fontes desta nova classe de
poluio aqutica, porm, uma contribuio significativa advm das guas residuais urbanas. As
pessoas, muitas vezes eliminam medicamentos no utilizados pelo sistema sanitrio, alm de
que, a urina e outros excrementos contm vrios medicamentos metabolizados de forma
incompleta. Estes compostos podem passar intactos pelos sistemas de tratamento de guas
convencionais, da serem encontrados em rios, lagos, mares e at mesmo nos aquferos. Alm
disso, os produtos farmacuticos no consumidos so muitas vezes descartados, acabando
directamente no lixo, terminando em aterros sanitrios, o que representa uma ameaa para as
guas subterrneas.
As actividades agrcolas e de criao animal tambm contribuem para a contaminao
emergente, os animais so uma fonte de entrada dos produtos farmacuticos no meio ambiente,
atravs da ingesto de hormonas, antibiticos e outros medicamentos veterinrios. Em
consequncia, o estrume dos animais acaba por conter vestgios de produtos farmacuticos.
Este, quando utilizado como adubo um outro meio de contaminao pois quando ocorre
lixiviao do solo com a chuva, estes contaminantes atingem os rios e podem mesmo chegar s
guas subterrneas.
Alm dos produtos farmacuticos, todos os compostos relacionados com a higiene pessoal
tambm tm aparecido em estudos de monitorizao da poluio aqutica. Geralmente esses
3
produtos so ingredientes activos ou conservantes usados em cosmticos, produtos de higiene
ou perfumes. Por exemplo, certas fragrncias usadas em muitos cosmticos, detergentes,
produtos de higiene e outros produtos de cuidados pessoais, tm suscitado preocupao entre a
comunidade cientfica devido sua persistncia e possveis impactos ambientais adversos.
Alguns pases tomaram j medidas para proibir a utilizao de alguns dos compostos desta
classe (Daughton e Ternes, 1999). Entre outros contaminantes, surgem por exemplo,
ingredientes dos protectores solares, que tm sido detectados em lagos e peixes.
A tabela 1 mostra o consumo anual per capita em (mg cap-1
ano-1
) de PPCPs seleccionados em
diversos pases (Carballa, Omil et al., 2008).
Tabela 1 - Consumo per capita em (mg.cap-1.ano-1) de PPCPs (adaptado de Carballa, Omil et al. (2008)). A negrito
indicado o composto farmacutico mais consumido em cada pas.
PPCP Austrlia
(1998)
ustria
(1997)
Finlndia
(1999)
Frana
(1998)
Alemanha
(2001)
Polnia
(2000)
Espanha
(2003)
Sucia
(2005)
Sua
(2000)
Carbamazepina 506.3 791.8 1019.2 601.7 946.6 1071.5 463.0 820.2 556.8
Diazepam 371.7 15.6 38.5 6.8 5.3 12.9 20.8 19.8 5.5
Citalopram n.d. n.d. n.d. n.d. n.d. n.d. 37.0 n.d. n.d.
Oxazepam n.d. n.d. n.d. n.d. n.d. n.d. 0.6 n.d. n.d.
Fluoxetina n.d. n.d. n.d. n.d. n.d. n.d. 97.2 n.d. n.d.
Ibuprofeno 720.6 837.0 11610.0 2841.0 1553.4 1517.5 6391.2 7864.3 2152.6
Naproxeno 1159.9 n.d. n.d. 646.2 n.d. n.d. 986.1 n.d. n.d.
Diclofenaco 222.8 767.9 153.8 254.7 594.7 540.9 747.7 375.9 532.5
Bezafibrato n.d. 559.3 115.4 589.7 315.5 21.4 92.6 66.7 215.6
Iopromida n.d. 673.3 n.d. 1254.7 1577.7 261.7 463.0 n.d. 1506.8
Sulfametoxazole n.d. 120.4 n.d. 382.9 571.4 828.7 294.0 160.4 352.3
Roxitromicina 190.1 47.5 76.9 159.0 75.2 53.0 9.3 1.6 20.4
Eritromicina 556.9 n.d. n.d. n.d. n.d. n.d. 187.5 n.d. n.d.
Trimetoprim 136.8 n.d. n.d. n.d. n.d. n.d. 85.6 n.d. n.d.
Metoprolol 313.5 n.d. n.d. n.d. 631.1 n.d. 53.2 n.d. n.d.
Sotalol 106.3 n.d. n.d. n.d. n.d. n.d. 16.2 n.d. n.d.
Etinilestradiol n.d. 0.50 0.02 n.d. 0.58 0.21 0.30 0.11 0.55
n.d. No detectado
Como esperado, o consumo mundial de compostos activos varia fortemente de pas para pas,
porm, de se notar que o anti-inflamatrio ibuprofeno, representado em negrito na tabela 1,
quase sempre o que apresenta o maior consumo per capita de entre todos os PPCPs estudados.
4
1.1. Ibuprofeno
O ibuprofeno (figura 2) um medicamento anti-inflamatrio no-esteride derivado do cido
propinico. O seu efeito teraputico funciona atravs da reduo de hormonas que causam
inflamao e dor. O ibuprofeno utilizado na teraputica de dores brandas e moderadas e em
condies inflamatrias tais como dor de cabea e enxaqueca, dor ps-operatria, dor de dentes,
clica menstrual, desordens musculosquelticas e articulares, espondilite anquilosa, osteoartrite
e artrite reumatide. um dos medicamentos mais consumidos no mundo como se pode alis,
verificar pelos resultados apresentados previamente na tabela 1. A ttulo de exemplo pode
referir-se que no Reino Unido um dos cinco medicamentos mais consumido, tendo uma
produo anual de vrias quilotoneladas (Sebastine e Wakeman, 2003).
Figura 2 - Estrutura molecular do ibuprofeno.
Apesar de existirem diferentes sais, steres e complexos, o ibuprofeno normalmente
administrado como uma mistura racmica de enantimeros (R) e (S). conhecido que o
ismero biologicamente activo o (S)-ibuprofeno. O enantimero (R)-ibuprofeno inactivo
(Davies, 1998; Lednicer, 2008; Liu, Wang et al., 2009), contudo pode ser convertido dentro do
organismo humano para a forma activa. No entanto, h estudos que revelam que a forma
inactiva do ibuprofeno (enantimero R) exibe toxicidade devido ao seu armazenamento no
tecido adiposo como um ster de glicerol hbrido, cujo os efeitos a longo prazo no so
conhecidos (Williams, Day et al., 1986).
Est bem documentado que sais de ibuprofeno, como o sal sdico de ibuprofeno, absorvido
mais rapidamente que as frmulas livres de ibuprofeno cido (Desjardins, Black et al., 2002;
Daniels, Reader et al., 2009), tendo sido igualmente demonstrado que quanto mais rpido o
ibuprofeno absorvido, mais rpido os seus efeito so notados (Black, Max et al., 2002;
Desjardins, Black et al., 2002). Isto acontece porque o sal rapidamente dissolvido no aparelho
gastrointestinal, levando a uma rpida absoro. Anlises farmacocinticas mostram que o
tempo para alcanar o pico de concentrao do sal sdico de ibuprofeno di-hidratado no plasma
de aproximadamente 30-40 minutos (Dewland, Reader et al., 2009), no entanto, para o
ibuprofeno cidoso necessrias 1-2 horas (Davies, 1998; Dewland, Reader et al., 2009).
5
1.2. cido Clofbrico
O cido clofbrico (figura 3) o metabolito e o princpio activo dos reguladores lipdicos
clofibrato, etofilina e do etofibrato, e tambm considerado um potencial desregulador
endcrino, uma vez que interfere com a sntese do colesterol (Stumpf, Ternes et al., 1999;
Pfluger e Dietrich, 2001). Estas substncias, denominadas de antidislipidmicos, actuam de
modo a reduzir a quantidade de lpidos, reduzindo a fraco de lipoprotena, bastante rica em
triglicridos.
Figura 3 - Estrutura molecular do cido clofbrico.
Os reguladores lipdicos clofibrato, etofilina e etofibrato so administrados por via oral e tm
uma absoro lenta no intestino, onde se ligam as protenas (cerca de 92 a 97% conseguem
estabelecer ligao). As doses teraputicas dos reguladores lipdicos so relativamente altas, de
1-2 g / dia e so usados por pacientes por longos perodos de tempo, s vezes ao longo da vida
(Buser, Muller et al., 1998). Alm do alto consumo, o cido clofbrico altamente resistente
degradao, tendo como consequncia um aumento da concentrao deste contaminante no
meio ambiente.
O cido clofbrico foi o primeiro contaminante da classe dos PPCPs detectado no meio
ambiente, em 1976 por Hignite e Azarnoff (Runnalls, Hala et al., 2007). Desde ento, vrios
estudos detectaram a sua presena em efluentes provenientes de estaes de tratamento de guas
residuais (ETARs) (Buser, Muller et al., 1998; Jones, Voulvoulis et al., 2001; Debska, Kot-
Wasik et al., 2004; Zorita, Martensson et al., 2009), mostrando que os processos actualmente
utilizados nas estaes de tratamento de gua no so eficazes para a eliminao de certos
PPCPs.
Na tabela 2 apresenta-se uma compilao dos resultados de vrios estudos que detectaram e
mediram concentraes do cido clofbrico no meio ambiente, de acordo com a matriz em que
foi encontrado (efluente de esgotos, guas superficiais, guas subterrneas e guas potveis). As
concentraes em negrito representam o nvel mximo detectado em cada meio.
6
Tabela 2 - Valores de concentrao de cido clofbrico detectado em diversos estudos no meio ambiente, compilados
por Schulman, Sargent et al. (2002).
Meio # de amostras Concentrao
detectada (ng L-1
) LOD (ng L
-1) Pas Ano
Efluentes de esgoto 7 2540-9740 140 EUA 1997
NA Acima de 4550 NA Alemanha 1997
NA ND-2050 250 Alemanha 1977
NA ND-1030 NA Alemanha 1977
5 420 1 Alemanha 1977
NA 450, 680 NA Alemanha 1988
49 360, 720, 1600* 50 Alemanha 1988
37 270, 660, 1560* 50 Alemanha 1996
NA 102 50 Brasil 1999
18 ND NA Canad 2000
gua superficial NA 18-222 1-10 Alemanha 1994
NA 180 5 Alemanha 1996
NA ND-1750 1 Alemanha 1997
NA 140-180 NA Alemanha 1997
NA ND-300 1 Alemanha 1997
10 ND 1 Alemanha 1997
NA 30 NA Itlia 1997
28 ND-875 NA Alemanha 1998
43 66, 210, 550* 10 Alemanha 1998
NA ND-9 NA Sua 1998
NA 90 10 Brasil 1999
NA ND 1,5 Itlia 2000
gua subterrnea NA 300-1600 NA EUA 1982
NA 4000 NA Alemanha 1997
17 70-7300 NA Alemanha 1997
3 ND 0,5 Alemanha 1997
18 ~50-2900 NA Alemanha 1997
gua potvel NA + NA Reino Unido 1981
NA 165 1-10 Alemanha 1994
NA 270 1 Alemanha 1996
25 1, 24, 70* 1 Alemanha 1996
3 ND 0,5 Alemanha 1997
NA ND-170 NA Alemanha 1997
NA ND-5,3 1,5 Itlia 2000
* Media, Percentil de 90 no mximo
LOD- Limite de deteco
"+" Identificao positiva, mas concentrao no quantificada
ND - No detectado
NA - No acessvel
7
Pelos resultados da tabela anterior constata-se que o cido clofbrico detectado em
concentraes mdias mais elevadas na Alemanha, onde o valor mximo detectado em gua
potvel foi de 270 ng L-1
(Heberer e Stan, 1997). Em consequncia da sua deteco e aparecer
frequentemente no meio ambiente, houve um crescente interesse da comunidade cientfica na
avaliao da toxicidade do cido clofbrico. Actualmente existe uma larga gama de testes
ecotoxicolgicos com o fim de analisar os efeitos de compostos com actividade biolgica sobre
certos organismos no meio ambiente. Henschel e colaboradores realizaram em 1977 um dos
estudos mais importantes no que diz respeito a testes de ecotoxicidade do cido clofbrico
(Henschel, Wenzel et al., 1997), sendo os seus resultados apresentados resumidamente na tabela
3.
Tabela 3 - Resultados do estudo ecotoxicolgico do cido clofbrico (Henschel, Wenzel et al., 1997).
Toxicidade Teste Espcie Tempo de
exposio Tcnicas de anlise EC50 (g L
-1)
Aguda
Bactrias V.fischeri 30 min Luminescncia 100000
Ciliados
(protozorios) T.pyriformis 48 h Crescimento 175000
Dafndeos
(crustceos) D.magna 48 h Mobilidade 106000
Embries de peixe D.rerio 48 h Mobilidade 86000
Crnica Algas P.subcapitata 96 h Crescimento 89000
In Vitro Clulas de peixes Clulas de BF-2 48 h citoxicidade/proliferao 14000
O termo EC50 (effective concentration 50%) definido como a concentrao de uma
determinada substncia txica que provoca uma resposta em 50% dos organismos presentes no
ensaio. Desta forma, quanto menor for o seu valor mais txica a substncia testada para
aqueles organismos. Assim, por exemplo, no caso do teste de inibio de luminescncia da V.
fisheri, o valor de EC50 corresponde concentrao que inibe a luminescncia de metade dos
organismos presentes no ensaio.
Foram realizados quatro testes agudos em bactrias, ciliados (protozorios), dafnideos
(crustceos) embries de peixe, um teste crnico em alga, e um teste in vitro em clulas de
peixe, demonstrando-se que a dose de cido clofbrico txica para metade das clulas de peixe
de 14 mg L-1
(Henschel, Wenzel et al., 1997).
Na tabela 4 apresentam-se os resultados de outro estudo de toxicidade do cido clofbrico
(Ferrari, Paxeus et al., 2003), que mostra que no caso da D.magna os valores de EC50 para a
toxicidade aguda so da mesma ordem de grandeza dos obtidos no estudo de Henschel e
colaboradores (1977). No entanto para a P. subcapitata, os valores de toxicidade crnica de
Ferrari denotam toxicidades a concentraes mais elevadas do que as observadas nos testes
realizados por Henschel e colaboradores.
8
Tabela 4 - Valores experimentais obtidos com bactria, rotfero, cladceros e peixes submetidos a cido clofbrico
(Ferrari, Paxeus et al., 2003).
Toxicidade Espcie Tempo de exposio Resultado (g L-1
)
Aguda
Microtox 30 min EC50 91827
D. magna 48 h EC50 >200000
C. dubia 48 h EC50 >200000
Crnica
P.subcapitata 96 h NOEC 75000
LOEC 150000
B. calyciflorus 48 h NOEC 246
LOEC 740
C. dubia 7 dias NOEC 640
LOEC 2560
D. rerio (ELS) 10 dias NOEC 70000
LOEC 140000
NOEC no observed effect concentration (Concentrao para a qual no se observaram efeitos)
LOEC lowest observed effect concentration (Menor concentrao para a qual se observaram efeitos)
1.3. Sistemas de tratamento de guas
A preocupao pela qualidade da gua, para os seus diversos usos, tem sido cada vez maior nas
ltimas dcadas, consequentemente os processos usados nas estaes de tratamento de guas
so cada vez mais diversificados. Na actualidade existe uma ampla gama de tecnologias de
tratamento de guas, cujos objectivos fundamentais consistem em adequar o tratamento para
que o seu consumo no provoque dano algum ao organismo humano, diminuir o impacto
ambiental das descargas de efluentes provenientes da agricultura, da indstria e da populao
em geral e gerar efluentes finais que cumpram os fluxos e concentraes de contaminantes
estipulados pela legislao em vigor (Klavarioti, Mantzavinos et al., 2009).
De acordo com a qualidade da gua na origem (caractersticas fsicas, qumicas e
microbiolgicas) implementado um sistema de tratamento de gua com uma srie de
processos e operaes unitrias. A ttulo exemplificativo, na tabela 5 so apresentadas algumas
das tecnologias de tratamento de guas agrupadas por fase de tratamento (Helmer, Hespanhol et
al., 1997).
9
Tabela 5 - Processos de tratamento de gua de acordo com o nvel de tratamento (adaptado de Helmer, Hespanhol et
al. (1997)).
Primrio Secundrio Tercirio Avanado
Gradeamento/Filtrao Lamas activado Nitrificao Tratamento qumico
Remoo de areia,
cascalho
Arejamento
prolongado Desnitrificao Osmose inversa
Sedimentao
primria Lagoa arejada Precipitao Qumica Electrodilise
Remoo de leo e
gorduras Filtro biolgico Desinfeco Adsoro com carvo
Equalizao do fluxo Tratamento biolgico Filtrao Troca inica selectiva
Neutralizao do pH Tratamento
anaerbico Oxidao Qumica Hiperfiltrao
Tanque Imhoff Filtrao anaerbica Remoo biolgica
de fsforo Oxidao
Triturao Lagoas de
estabilizao Aquacultura Desintoxicao
O desenho de cada uma das operaes depende do tipo de gua a tratar, das suas caractersticas,
do volume e da qualidade do efluente desejado, assim como da sua finalidade. As primeiras
etapas do tratamento s quais so submetidas as guas residuais, tem uma denominao genrica
de pr-tratamento, que inclui uma srie de operaes fsicas como gradeamento (para
eliminao das matrias de maior tamanho, remoo de areia e cascalho), sedimentao
primria, remoo de leo e gordura, e equalizao do fluxo. Na etapa posterior, denominada de
tratamento primrio, a gua fica em repouso nos tanques de sedimentao de grande rea.
Durante este processo separam-se as partculas de materiais inorgnicos e orgnicos que devido
ao seu tamanho escapam dos tratamentos anteriores. Quando a carga que chega ao tanque de
sedimentao elevada ou a natureza da gua a tratar assim o exige, podem acrescentar-se
produtos qumicos que favoream a formao de agregados de maior dimenso e sendo mais
eficaz a eliminao da matria em suspenso nesta etapa. Este ltimo tratamento obrigatrio
quando a gua a tratar contm metais ou algum composto txico podem inibir os processos
biolgicos de depurao posteriores.
Os slidos separados, lamas e lodos primrios so enviados para a linha de lamas, enquanto que
a gua chega ao que se considera a etapa mais importante do processo de depurao, que
tradicionalmente recebe o nome de tratamento secundrio. O funcionamento desta etapa
consiste em acelerar o processo biolgico que teria lugar na natureza, eliminando a matria
10
orgnica com o recurso a microorganismos. O processo mais habitual o sistema de lamas
activadas, que se leva a cabo em bioreactores fortemente arejados (tratamento aerbico)
mantendo a biomassa em suspenso. O objectivo conseguir uma boa separao da gua tratada
e da biomassa responsvel pela degradao dos contaminantes. Parte da biomassa retorna ao
bioreactor enquanto que o excesso purgado do sistema e submetido a tratamento na linha de
lamas.
Os sistemas de tratamento convencionais (primrio e secundrio) so contudo inadequados para
eliminar completamente a grande quantidade de contaminantes orgnicos e inorgnicos
presentes nas guas, j que, na sua maioria, no so compostos metabolizados pelos
microorganismos como fonte de carbono, podendo, at mesmo, inibir a actividade destes ou
produzir bioacumulao na cadeia trfica. Por isso, actualmente so requeridos tratamentos
mais efectivos para reduzir o potencial impacto ambiental dos efluentes e cumprir as legislaes
cada vez mais restritas. Por esta razo, para obter uma depurao eficaz da gua, necessrio
submete-la a tratamentos tercirios, que so mais especficos que os tratamentos primrios e
secundrios. De seguida so apresentados exemplos de tratamentos tercirios, alguns j
implementados em ETARs, e outros considerados apenas do ponto de vista acadmico e
escala laboratorial com guas sintticas:
Ozonizao (Ternes, Meisenheimer et al., 2002)
Lamas activadas (Amaral, Ginoris et al., 2008)
Adsoro em carvo activado para eliminao tanto de contaminantes orgnicos
(Carvalho, Gomes et al., 2004; Mestre, Pires et al., 2007; Mestre, Pinto et al., 2010;
Ruiz, Cabrita et al., 2010) como inorgnicos (Mohan e Singh, 2002; Babel e
Kurniawan, 2003).
Bioreactores de Membrana (Tchobanoglous, Burton et al., 2003)
Tratamento biolgico (Tchobanoglous, Burton et al., 2003)
Processos de oxidao qumica, tradicionais (cloro, dixido de cloro, ozono, etc.) e
avanados (ozonizao cataltica, processos fotoqumicos, etc.). (Ikehata, Naghashkar
et al., 2006; Klavarioti, Mantzavinos et al., 2009)
Osmose inversa (Tchobanoglous, Burton et al., 2003)
Actualmente a adsoro com carvo activado foi reconhecida pela U.S. Environmental
Protection Agency (EPA) com uma das melhores tecnologias disponveis para a eliminao de
compostos orgnicos e inorgnicos na gua. No tratamento de gua, o carvo activado actua
como adsorvente e tem o papel de melhorar a cor, o sabor e o cheiro, eliminar contaminantes
recalcitrantes como ibuprofeno e acido clofbrico, e reduzir a matria orgnica natural
(Environmental Protection Agency, 2001).
11
1.4. Adsoro de contaminantes em fase lquida por carvo
activado
O carvo activado um material com uma porosidade muito desenvolvida e consequentemente
com uma elevada rea superficial, podendo mesmo chegar aos 2000 m2g
-1 (Marsh e Rodrguez-
Reinoso, 2006). Estes slidos so constitudos na sua maioria por carbono, porm, para alm do
carbono, possuem heterotomos como o oxignio e, num menor grau, hidrognio, azoto e
enxofre, que j podem estar presentes na matria-prima ou ento so adicionados ao carvo
activado durante a sua preparao laboratorial. Estes tomos esto ligados superfcie do carvo
activado na forma de complexos superficiais ou grupos funcionais, que podem fornecer ao
carvo propriedades bsicas ou cidas.
A estrutura porosa dos carves activados apresenta poros com aberturas de diferentes dimenses
que, segundo a classificao da IUPAC (Sing, Everett et al., 1985), so classificados em trs
grandes grupos:
Microporos (dimenses inferiores a 2 nm)
Mesoporos (dimenses entre os 2 e os 50 nm)
Macroporos (dimenses superiores a 50 nm)
Estes grupos de poros so interligados de acordo com a representao esquemtica apresentada
na figura 4.
Figura 4 - Representao esquemtica da estrutura porosa de um carvo activado.
Os microporos constituem a parte principal da rea interna dos carves activados, so estes que
contribuem maioritariamente para a sua capacidade de adsoro. Os microporos podem ser
divididos em dois subgrupos, os ultramicroporos (poros com dimenses inferiores a 0.7nm) e os
supermicroporos (poros com dimenses compreendidas entre 0.7 e 2nm) (Marsh e Rodrguez-
Reinoso, 2006).
12
Os mesoporos permitem que o adsorvato atinja os microporos, sendo por este motivo
designados tambm por poros de transio. O mecanismo de adsoro observado nos mesoporos
diferente dos microporos, neste caso o adsorvato condensa por capilaridade.
Os macroporos apresentam uma baixa rea superficial, e o fenmeno de adsoro por
condensao capilar observado nos mesoporos j no possvel, sendo assim, estes atuam
apenas como poros transportadores, sendo responsveis pela velocidade de difuso das
molculas para os meso e microporos.
Nos diferentes processos de adsoro em fase lquida, as molculas ou tomos (absorvvel) so
fixadas (adsorvidas) na superfcie do carvo activado (adsorvente) por foras dispersivas ou
electrostticas e/ou ligaes qumicas. Deste modo, torna-se evidente a importncia do
conhecimento das propriedades fsicas e qumicas dos carves activados para compreender o
comportamento dos carves activados em processos de adsoro.
Uma das aplicaes mais importantes destes materiais como adsorventes de compostos
qumicos nocivos presentes nas estaes de tratamento de gua, constituindo um dos meios mais
eficazes para a remoo de uma vasta gama de contaminantes das guas residuais industriais e
urbanas. O carvo utilizado no tratamento de guas contaminadas pode ser utilizado em p, ou
na forma granular. Existe um nmero considervel de estudos que utilizam o carvo activado no
tratamento de efluentes, sobretudo na adsoro de metais (Babel e Kurniawan, 2003), corantes
(Crini, 2006), compostos fenlicos (Ahmaruzzaman, 2008) e desreguladores endcrinos
(Chang, Choo et al., 2009). No que diz respeito remoo de PPCPs por carves activados,
existem ainda relativamente poucos estudos, sendo portanto um tema de investigao bastante
actual e pertinente.
Dado os grandes volumes de guas residuais que tm que ser tratadas nas sociedades
industrializadas, e uma vez que as regulamentaes ambientais so cada vez mais rigorosas, de
extrema importncia desenvolver tecnologias de baixo custo para os processos de
descontaminao, mantendo a alta eficincia de remoo.
Os carves activados obtidos a partir de desperdcios da agricultura ou de subprodutos
industriais, isto , resduos, so boas alternativas a serem utilizadas na tecnologia de adsoro.
Neste estudo so utilizados materiais preparados a partir da cortia, sisal, borras de caf e casca
de coco.
O processamento da cortia um sector industrial de grande importncia em Portugal, visto que
o maior produtor e transformador mundial de cortia. O resduo mais importante do
processamento da cortia o "p de cortia", um termo usado para cobrir todos os resduos de
cortia compreendendo impurezas brutas da cortia, p, e partculas de cortia com menores
dimenses do que a permitida para granulao (geralmente inferior a 0.5 mm). A produo
13
anual de p de cortia por volta das 50 000 toneladas, o que corresponde a, em mdia, 25-30%
da cortia processada (Gil, 1997). Este material tem sido utilizado nos ltimos anos como
precursor de baixo custo e com baixo impacto ambiental, para preparao de carvo activado.
Os carves obtidos a partir da cortia tm elevada rea superficial especfica e bom desempenho
quando testados como adsorventes de compostos orgnicos volteis (Carvalho, Cardoso et al.,
2003; Carvalho, Gomes et al., 2004; Carvalho, Mestre et al., 2006), e tambm quando testados
como adsorventes de compostos farmacuticos em soluo aquosa, nomeadamente, de
ibuprofeno (Mestre, Pires et al., 2007), de cido clofbrico (Mestre, Pinto et al., 2010) e de
paracetamol (Mestre, Bexiga et al., 2011).
O sisal outro resduo, de origem industrial, que tambm tem sido utilizado como precursor
para a preparao de carves activados. Os carves activados obtidos a partir de sisal foram
estudados como adsorventes de contaminantes de guas, tendo sido obtidos bons resultados na
remoo do paracetamol e ibuprofeno em soluo aquosa (Mestre, Bexiga et al., 2011). O sisal
(Agave Sisalana) uma planta de origem mexicana, sendo o Brasil o seu maior produtor. uma
das fibras vegetais mais resistentes, e hoje em dia a sua utilizao principal como matria-
prima para a indstria de cordoaria. A fabricao de cordas produz resduos de sisal que podem
ser reciclados para a produo de cordas de pior qualidade, podem ser usados como combustvel
ou na preparao de fibras de carbono (Chen, Liu et al., 2005).
As borras de caf so um resduo produzido numa quantidade significativa pela sociedade
contempornea, sendo normalmente enviado para aterros sanitrios. Contudo, existem j alguns
estudos que avaliam as suas potencialidades como precursor para a preparao de carves
activados (Boonamnuayvitaya, Chaiya et al., 2004; Boonamnuayvitaya, Sae-ung et al., 2005;
Oliveira, Franca et al., 2008; Bandosz, Kante et al., 2012).
A casca de coco um resduo actualmente utilizado para a preparao de muitos dos carves
activados disponveis no mercado para tratamento de guas. Estes materiais podem ser obtidos
por activao trmica, como o caso do carvo comercial que se usou neste estudo para fins
comparativos. Os carves activados preparados a partir de casca de coco j tm sido utilizados
como adsorventes em fase lquida para, por exemplo, remoo do cido clofbrico (Mestre,
Pinto et al., 2010), de metais pesados (Babel e Kurniawan, 2003) e do 4-clorofenol (Kurniawan,
Lo et al., 2011).
14
1.5. Efeito da dureza da gua na adsoro de contaminantes por
carvo activado
Originalmente, a dureza da gua era medida pela capacidade da gua em precipitar sabo. Um
dos mtodos mais antigos na identificao da dureza da gua o simples teste de espuma: se o
sabo fizer muita espuma na gua, a gua mole, mas se caso contrrio, produzir pouca
espuma, a gua dura. Uma das principais vantagens em controlar a dureza da gua
econmica, dado que necessrio menos sabo nas limpezas domsticas e industriais, e reduz-
-se a formao de incrustaes nas tubagens e caldeiras. A quantificao da dureza da gua
tambm crucial no tratamento de gua por osmose inversa, sendo muitas vezes necessrio um
pr tratamento da gua, com o objectivo de reduzir a dureza da gua e evitar assim a formao
de incrustaes nas membranas. Por outro lado, uma grande desvantagem da gua mole, que
se torna mais corrosiva e agressiva, do que a gua dura, isto , a gua mole dissolve mais
facilmente ies metlicos nas canalizaes.
A dureza da gua para consumo humano geralmente expressa quantitativamente como uma
concentrao equivalente de carbonato de clcio, CaCO3, no entanto, a dureza uma
propriedade dos caties Ca2+
e Mg2+
. usual definir a dureza total como a soma das
concentraes dos ies clcio e magnsio em mg L-1
, ambas expressas como equivalentes de
carbonato de clcio. A dureza da gua normalmente calculada a partir de medies
independentes de clcio e magnsio. As concentraes de ies de clcio e magnsio so
convertidos em concentraes equivalentes de CaCO3 pela equao 1 (Weiner, 2000).
( ) Eq.1
O objectivo nas estaes de tratamento de gua obter uma gua com dureza total cerca de 70-
90 mg L-1
, a fim de reduzir os custos com compostos qumicos e a produo de lamas da
precipitao de Ca2+
e Mg2+
. As guas podem ser classificadas de acordo com o seu grau de
dureza tal como se apresenta na tabela 6.
Tabela 6 - Graus de dureza da gua (adaptado de Weiner (2000))
Grau de dureza mg L-1
CaCO3
Mole 200
Sabe-se que a dureza da gua pode afectar a adsoro de contaminantes pelo carvo activado,
isto deve-se ao facto de que a solubilidade do contaminante orgnico depender da concentrao
15
de sais presentes no meio (Breslow e Guo, 1990; Xie, Shiu et al., 1997), dado que quando a
concentrao dos sais aumenta, pode haver uma diminuio (fenmeno salting-out), ou um
aumento (fenmeno salting-in) na solubilidade do contaminante orgnico. Outro factor que
tambm afectado pela dureza da gua a fora inica do solvente. Esta fora controla as
interaces electrostticas atractivas ou repulsivas entre o adsorvente e adsorvato, podendo ser
reduzida quando se adicionam sais (ou seja, quando se altera a dureza da gua), produzindo
assim um efeito de blindagem da carga superficial.
16
17
2. Estudos de adsoro de ibuprofeno e de cido clofbrico em
carves activados
2.1. Cinticas de adsoro
Os adsorventes utilizados neste estudo para a remoo de ibuprofeno e de cido clofbrico so
slidos altamente porosos com uma elevada rea superficial, o que implica que o processo
global de adsoro envolva outras etapas para alm da adsoro propriamente dita. No processo
global de adsoro podem distinguir-se as seguintes etapas consecutivas:
Transferncia de massa; transporte externo do soluto desde a soluo at a superfcie
das partculas de adsorvente.
Difuso intra-particula; difuso desde a superfcie externa do adsorvente at os centros
activos de adsoro.
Adsoro; a fase final, onde as molculas so finalmente adsorvidas pela superfcie
dos poros do adsorvente.
O passo de transferncia de massa que ocorre na primeira fase do processo global de adsoro
pode ser explorado atravs do clculo da constante de velocidade da transferncia de massa
externa ( ). O seu valor pode ser obtido atravs do declive da linearizao dos instantes iniciais
do grfico de C/C0 vs tempo. Esta abordagem simples permite estimar a constante de velocidade
, que se baseia em modelos de resistncia (Walker e Weatherley, 1999).
Do ponto de vista cintico, a etapa de adsoro a mais rpida de todas as etapas do processo,
assumindose que o equilbrio atingido instantaneamente, de modo que se considera que a
quantidade de soluto adsorvido sobre a superfcie do poro est em equilbrio com a
concentrao de soluto em soluo. Nestas condies, o transporte externo e/ou a difuso intra-
-particula sero os factores limitantes, e consequentemente os responsveis pela velocidade
global do processo de adsoro.
Existem muitos factores que influenciam a capacidade de adsoro, nomeadamente, a
concentrao inicial do adsorvato, a temperatura a que decorre o processo, o valor do pH da
soluo, o tamanho de partcula, a quantidade do adsorvente, bem como a natureza do soluto.
Contudo um modelo cintico apenas traduz o efeito dos parmetros observveis sobre a
velocidade geral de adsoro (Ho, 2006).
A velocidade de adsoro do soluto no adsorvente descrita pela cintica de adsoro, cujo tipo
permite prever a velocidade a que cada poluente removido da soluo. O conhecimento da
velocidade do processo de adsoro fundamental para planificar os tratamentos de adsoro.
18
A quantidade de adsorvato adsorvido determinada a partir da equao 2:
Eq.2
onde a quantidade de adsorvato adsorvida no tempo t, a concentrao inicial de
adsorvato no tempo t, a concentrao de adsorvato no tempo t, V o volume de soluo de
adsorvato e W a massa de carvo activado utilizado.
Na bibliografia esto descritos muitos modelos que so utilizados para o estudo da cintica nos
processos de adsoro em fase lquida. Alguns destacam-se pela simplicidade e fcil
interpretao, como o caso do modelo cintico de pseudo-primeira ordem e do modelo
cintico de pseudo-segunda ordem, que se descrevem seguidamente.
2.1.1. Modelo cintico de pseudo-primeira ordem
O modelo cintico de pseudo-primeira ordem tem por base a adsoro de um soluto em fase
liquida num adsorvente slido, tendo sido proposto por Lagergren (1898) para a adsoro de
cido oxlico e malnico em carvo. Este modelo aplicado para um grande nmero de
sistemas slido-lquido, como ies metlicos, corantes e vrias substncias orgnicas em
sistemas aquosos e para vrios adsorventes (Ho, 2004).
A equao cintica de pseudo-primeira ordem considera que a fora motriz a diferena entre a
concentrao do soluto adsorvido no equilbrio e a concentrao do soluto adsorvido num
determinado tempo, de modo que a velocidade de adsoro determinada pela seguinte
expresso:
( ) Eq.3
onde kp1 a constante de velocidade de pseudo-primeira ordem (h-1
), qe e qt correspondem
respectivamente quantidade de soluto adsorvido (mg g-1
) no equilbrio e no tempo t. Ao
integrar a equao 3 para as condies limite qt=0 quando t=0 e qt=qt quando t=t e rearranjando-
-a de forma linearizada, obtm-se a equao 4:
( ) ( ) Eq.4
Assim, representando ( ) em funo de , obtm-se uma linha recta cujo declive e
ordenada na origem so utilizados para determinar os valores da constante de velocidade de
pseudo-primeira ordem, kp1 e a quantidade de soluto adsorvido no equilbrio, qe.
19
2.1.2. Modelo cintico de pseudo-segunda ordem
O modelo cintico de pseudo-segunda ordem foi proposto por Ho e McKay (1999). Neste
modelo a equao cintica considera que, tal como na equao de Lagergren, a fora motriz do
processo proporcional velocidade total de adsoro, mas neste caso ao quadrado da mesma.
A equao cintica de pseudosegunda ordem pode ser expressa pela equao 5:
( ) Eq.5
onde kp2 a constante de velocidade de pseudo-segunda ordem (g mg-1
h-1
), qe e qt correspondem
respectivamente quantidade de soluto adsorvido (mg g-1
) no equilbrio e no tempo t. Ao
integrar a equao 5 para as condies limite qt=0 quando t=0 e qt=qt quando t=t e rearranjando-
-a de forma linearizada, obtm-se a equao 6:
(
) Eq.6
Assim, representando
em funo de , obtm-se uma linha recta cujo declive e ordenada na
origem so utilizados para determinar os valores da constante de velocidade de pseudo-segunda
ordem, kp2 e a quantidade de soluto adsorvido no equilbrio, qe. O produto representa a
velocidade de adsoro inicial e, neste trabalho, ser designado por h. O tempo de meia vida,
t1/2, ou seja, o tempo necessrio para que metade da quantidade de adsorvato que ser adsorvido
no equilbrio fique na superfcie do adsorvente, muitas vezes usado para medir a velocidade de
adsoro e determinado pela equao 7:
Eq.7
Esta equao obtida pelo rearranjo da equao 6 considerando t=t1/2 quando qt=qe/2.
2.2. Isotrmicas de adsoro
A adsoro a acumulao de uma substncia numa interface e ocorre com todos os tipos de
interfaces: gs-slido, soluo-slido, soluo-gs, soluo-soluo. O material sobre o qual
ocorre a adsoro chama-se adsorvente, e a substncia adsorvida o adsorvato.
Considerando o caso de adsoro gs-slido, a isotrmica de adsoro (nads
= f(p/p0)T) obtida
quando se representa a variao da extenso da adsoro (nads
em mmol g1) em funo da
presso relativa (p/p0) do adsortivo a temperatura constante (p
0 a presso de saturao do
adsortivo). As isotrmicas de adsoro so extremamente teis, pois permitem obter
informaes sobre o mecanismo do processo de adsoro. Com o estudo das isotrmicas pode
20
avaliar-se a capacidade que os adsorventes tm para cada molcula, e identificar os diferentes
mecanismos de adsoro, permitindo assim escolher o slido mais adequado para cada
aplicao. Desta forma, essencial classificar os tipos de isotrmicas mais comuns para os
sistemas de adsoro.
Em 1940 Brunauer, Emmett e Teller fizeram uma pesquisa na literatura existente e classificaram
as isotrmicas de adsoro gs-slido em cinco tipos diferentes, que correspondem aos cinco
primeiros tipos da figura 5 (Brunauer, Deming et al., 1940). Em 1985 a comisso IUPAC
props uma modificao para esta classificao, adicionando um sexto tipo de isotrmica aos
cinco tipos de isotrmicas j existentes (Sing, Everett et al., 1985). Na figura 5 so
representados os seis tipos de isotrmicas de adsoro de acordo com a classificao da IUPAC,
sendo o tipo VI a isotrmica adicionada em 1985.
Figura 5 -Os seis tipos de isotrmicas de adsoro gs-slido de acordo com a classificao IUPAC de 1985
(adaptada de Sing, Everett et al. (1985))
A isotrmica tipo I, isotrmica de Langmuir, caracterstica de muitos adsorventes slidos
microporosos (larguras de poros abaixo de 2 nm), como o caso dos carves activados. A
adsoro acontece quimicamente ou fisicamente, estando impedida a adsoro em multicamada,
praticamente desde o incio, o que justifica o patamar que se estende at presso de saturao.
Estas isotrmicas so concavas em relao ao eixo das abcissas e os declives da parte inicial da
isotrmica (p/p0 < 0.05) so indicativos das dimenses da microporosidade. Com efeito, quanto
mais rectangular for a curva, mais estreitos so os microporos. O valor limite de quantidade
21
adsorvida depende essencialmente do volume dos microporos acessveis, correspondendo ao
completo preenchimento desse volume.
Os tipos II e III so caractersticos de materiais no porosos onde a interaco superfcie-
-adsorvato forte (tipo II) ou fraca (tipo III). No tipo II a isotrmica traduz um mecanismo de
adsoro em multicamada, sem restries. O ponto B, assinalado no incio da regio quase
linear, normalmente considerado indicativo do preenchimento da primeira camada e do incio
de formao da multicamada. No tipo III a isotrmica j no apresenta o ponto B, porque a
adsoro das molculas, em camadas superiores, se inicia antes da primeira camada estar
completamente preenchida. Tal acontece devido ao processo cooperativo de adsoro, isto ,
cada molcula j adsorvida ajuda na adsoro das prximas molculas devido as interaces
entre elas.
Os tipos IV e V ocorrem respectivamente para interaces superfcie-adsorvato forte e fraca,
quando o material mesoporoso (larguras de poros de 2 a 50 nm) e ocorre condensao capilar.
Estas isotrmicas podem apresentar um ciclo de histerese quando o mecanismo de
preenchimento dos mesoporos por condensao capilar, difere do mecanismo de desadsoro
dos mesmos.
O tipo VI ocorre para alguns materiais com foras superfcie-adsorvato relativamente fortes,
normalmente quando a temperatura est perto do ponto de fuso do adsorvente, esta isotrmica
corresponde a um mecanismo de adsoro de multicamada, em escada. Observa-se em slidos
no porosos, com superfcies muito uniformes. Cada camada adsorvida numa gama de
presses especfica, e graficamente cada patamar observado resulta do preenchimento de uma
destas camadas. O processo de adsoro diz-se cooperativo, porque a adsoro em cada camada
contribui para a adsoro das camadas seguintes atravs de interaces laterais das molculas
(Sing, Everett et al., 1985; Balbuena e Gubbins, 1993).
No caso da interface soluo-slido, o processo de adsoro ocorre com o enriquecimento do
soluto na superfcie do slido, com consequentemente diminuio da sua concentrao em
soluo. A medida que o soluto adsorvido pelo slido, a velocidade de adsoro diminui, at
que se atinge um equilbrio. Este equilbrio dinmico e caracterstico de cada sistema
adsorvente/soluo. Vrios factores afectam a adsoro, tais como a estrutura molecular, o
tamanho da partcula do material adsorvente, a solubilidade do soluto, o pH do meio, a fora
inica, e o tempo de contacto e a temperatura qual ocorre adsoro. Denomina-se por
isotrmica de adsoro de equilbrio em fase lquida a representao da quantidade de soluto
adsorvido por unidade de massa do adsorvente (qe) em funo da concentrao de soluto em
equilbrio (Ce), quando realizado a temperatura constante.
22
As principais diferenas entre adsoro gs-slido e lquido-slido so as seguintes (Moreno-
Castilla, 2004):
i. A soluo por definio um sistema de mais de um componente, assim, existem pelo
menos duas substncias que se podem adsorver. Para uma soluo diluda, a adsoro
de um tipo de molcula envolve a substituio de outra. Assim, a adsoro a partir de
uma soluo essencialmente uma processo de troca, e por isso as molculas so
adsorvidas no s porque so atradas pelos slidos, mas tambm porque a soluo pode
rejeit-las. Um exemplo tpico a ligao de molculas com pouco carcter polar em
adsorventes hidrofbicos nas solues aquosas, que uma ligao impulsionada
principalmente pela repulso gua.
ii. As isotrmicas num sistema lquido-slido podem evidenciar diferentes mecanismos de
adsoro das observadas num sistema gs-slido. No sistema lquido-slido tm que se
ter em conta as interaces laterais solvente-soluto, solvente-solvente e soluto-soluto.
iii. Adsoro em multicamada a partir de solues menos comum do que quando se trata
de adsoro de gases, devido s interaces das foras de blindagem na fase lquida.
As isotrmicas de adsoro em fase lquida so normalmente realizadas para determinar a
capacidade dos carves activados para adsorver uma molcula em particular. Constituem a
primeira informao experimental, a qual usada geralmente como uma ferramenta para
diferenciar carves activados e sendo assim, escolher a melhor opo para uma determinada
aplicao. A forma da isotrmica a primeira ferramenta experimental para diagnosticar a
natureza de um fenmeno especfico de adsoro, sendo importante classificar os tipos de
isotrmicas de acordo com o mecanismo de adsoro.
Existem muitos tipos de isotrmicas de adsoro em fase lquida, mas os que so geralmente
encontrados para adsoro em carves activados so os cinco tipos apresentados na figura 6.
23
Figura 6 - Os tipos mais comuns de isotrmicas de adsoro encontrados no sistema soluo aquosa-carvo activado
(adaptado de(Moreno-Castilla, 2004)).
As isotrmicas do tipo linear no so comuns na adsoro de carves mas so encontrados na
parte inicial de todas as isotrmicas em superfcies homogneas. A isotrmica de Langmuir, tipo
L, acontece frequentemente, mesmo quando as premissas da teoria de Langmuir no so
completamente satisfeitas. O tipo F, caracterstico de superfcies heterogneas, e
provavelmente o tipo mais comum. As isotrmicas do tipo H so caracterizadas por uma
inclinao inicial muito acentuada, seguida por um pseudo patamar. A isotrmica do tipo
sigmoidal obtida quando existe uma atraco moderada entre o adsorvato e o adsorvente, e
ocorre uma forte competio das molculas de solvente ou de outros adsorvatos pelos centros de
adsoro.
Para o estudo das isotrmicas de adsoro obtidas neste trabalho, aplicaram-se seis dos modelos
mais utilizados nos sistemas slido-lquido, o modelo de Langmuir (1918), o modelo de
Freundlich (1926), o modelo de Redlich-Peterson (1959), o modelo de Temkin (1940), o
modelo de Toth (Jossens, Prausnitz et al., 1978), e o modelo de Dubinin-Astakhov (DA) (1979).
2.2.1. Isotrmica de Langmuir
Mediante a aplicao do modelo de Langmuir pode estimar-se a capacidade de adsoro em
carves e o tipo de interaces adsorvato-adsorvente. Neste modelo, a atraco entre o
adsorvato e a superfcie do adsorvente baseia-se p