ADAPTAÇÃO MEMÓRIAS

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MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS CENA I BRÁS N - Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver, dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas. Tira o algodão do nariz, bate o pó da roupa: BRÁS N - Alum tempo !esitei se devia abrir estas memórias pelo princ"pio ou pelo fim, se colocaria em primeiro luar o meu nascimento ou a min!a morte. Bom, vamos de acordo com as min!as lembranças.  Brás N senta-se na poltr ona. Entra V irg ília# BRÁS N - Anda visitando os defuntos$ BRÁS N - %á$ BRÁS N - N&o sei se fa' bem. ( doente ) um solteir&o e a casa n&o tem sen!oras... BRÁS N - *á de vir aqui passar uns dias, mas n&o pode ser antes de sábado. Virgília sai de cena. CENA II BRÁS N - +i"lia voltou dois dias depois com seu nico fil!o, que por sua ve', aos cinco anos, fora cmplice de nosso amor. N!on! era um bac!arel, nico fil!o d e seu casamento. +i eram untos, dois dias depois, e confesso que, ao v/-los ali, na min!a alcova, fui tomado de um acan!amento que nem me permitiu corresponder loo 0s  palavras afáveis do rapa'. +i r"lia afirmando ser apenas uma m an!a min!a, sorriu o fil!o. 1u creio que tamb)m sorri e tudo acabou bem. +ir"lia estava serena e rison!a, tin!a o aspecto das vidas imaculadas e eu, eu... Bem2 1u me peruntava o que diriam de nós os avi3es, se Buffon tivesse nascido avi&o... 1ra meu del"rio que começava.  Brás de costas, mostra ndo estar com mal estar . BRÁS N - 4uan do de repente m e transformo em um barb eiro c! in/s, b oudo, destro e com capric!os de mandarim, mas aora me sinto a Suma 5eolóica de S&o 5omás, impressa num volume, estava imóvel e vi c!ear um !ipopótamo, eu, á na f orma !umana, cavalava, cavalava em um !ipopótamo que me levava ao fim dos tempos, lá num campo muito branco, apareceu uma mul!er toda poderosa, peruntei quem era... BRÁS N - +ivo$  andora, agre ssi!amente o pega pel os cabelos e aponta para a plat"ia. BRÁS N - N&o, n&o......n&o......n& &&ooooo......

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MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS

CENA I

BRÁS N  - Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver, dedico como

saudosalembrança estas memórias póstumas.

Tira o algodão do nariz, bate o pó da roupa:

BRÁS N  - Alum tempo !esitei se devia abrir estas memórias pelo princ"pio ou pelo fim,se

colocaria em primeiro luar o meu nascimento ou a min!a morte. Bom, vamos deacordo com as min!as lembranças.

 Brás N senta-se na poltrona. Entra Virgília#

BRÁS N  - Anda visitando os defuntos$

BRÁS N  - %á$

BRÁS N  - N&o sei se fa' bem. ( doente ) um solteir&o e a casa n&o tem sen!oras...

BRÁS N  - *á de vir aqui passar uns dias, mas n&o pode ser antes de sábado.

Virgília sai de cena.

CENA II

BRÁS N  - +i"lia voltou dois dias depois com seu nico fil!o, que por sua ve', aos cincoanos, fora cmplice de nosso amor. N!on! era um bac!arel, nico fil!o de seu

casamento. +ieram untos, dois dias depois, e confesso que, ao v/-los ali, na min!aalcova, fui tomado de um acan!amento que nem me permitiu corresponder loo 0s palavras afáveis do rapa'. +ir"lia afirmando ser apenas uma man!a min!a, sorriu ofil!o. 1u creio que tamb)m sorri e tudo acabou bem. +ir"lia estava serena e rison!a,tin!a o aspecto das vidas imaculadas e eu, eu... Bem2 1u me peruntava o que diriamde nós os avi3es, se Buffon tivesse nascido avi&o... 1ra meu del"rio que começava.

 Brás de costas, mostrando estar com mal estar.

BRÁS N - 4uando de repente me transformo em um barbeiro c!in/s, boudo, destro ecomcapric!os de mandarim, mas aora me sinto a Suma 5eolóica de S&o 5omás,

impressa num volume, estava imóvel e vi c!ear um !ipopótamo, eu, á na forma!umana, cavalava, cavalava em um !ipopótamo que me levava ao fim dos tempos,lá num campo muito branco, apareceu uma mul!er toda poderosa, peruntei quemera...

BRÁS N - +ivo$

 andora, agressi!amente o pega pelos cabelos e aponta para a plat"ia.

BRÁS N - N&o, n&o......n&o......n&&&ooooo......

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#ai andora. ausa.BRÁS N - 6!eou num ponto em que tudo a min!a volta aumentava e diminu"aSucessivamente, at) o !ipopótamo em que vim montado diminu"a e diminuiu tantoque notei que era meu ato. Sult&o brincando com uma bolin!a de papel.

CENA IIIBRÁS N - Bom, o meu del"rio começou em presença de +ir"lia, que foi o meu rande

 pecadoda uventude7 n&o !á uventude sem meninice. 8ois ), na min!a inf9ncia querida, euostava de bater nos escravos, escondia os c!ap)us das visitas, dava belisc3es nasmatronas, brincadeiras do anin!o que eu fui, por)m, o que eu n&o ostava eraintrias entre adultos, amava os meus padrin!os, principalmente os ricos. 1spiavatudo, desde namoros 0s fraque'as dos outros.

 ausa.

BRÁS N - :embro-me de um antar em min!a casa, comemorávamos a primeira queda de Napole&o. 1u tin!a nove anos. 6omo se fosse ontem, lembro-me de ver um certosen!or eruer-se, casaca, uma esmeralda no dedo. ( ;r. +ilaça, !omem t&o dado,casado, al)m de pleitear com poetas, discreteava com duquesas2 <a acumulandoadetivo sobre adetivo. 1 a sobremesa$... Ninu)m á pensava em comer. 1u queriaaquela compota de doce. 8edi, implorei. =ui retirado da mesa por uma escrava. (losador retardou a compota e dera causa da min!a e>clus&o. 8ensei, irei me vinar.8assei a seui-lo pelo resto da tarde. +i-o conversar com ;. 1us)bia#

 Entram $. Eus"bia, $r. Vila%a e logo depois, os seguindo Brás ersonagem.

BRÁS N ? sentando na poltrona ao lado de Brás  @ - 5odos ol!aram pasmos dos dois

 pombin!os. <sto me custou um pu>&o de orel!a de meu pai, mas no outro dia at) riuda situaç&o, me deu beios e me c!amou de breeiro2 Breeiro2... e me fe' concluir que a correç&o ) necessária 0s vistas dos outros C uma simples formalidade. Sim2Sim, meu pai adorava-me. Din!a m&e era uma sen!ora fraca, de pouco c)rebro emuito coraç&o, sinceramente piedosa, caseira, apesar de bonita, modesta, temente 0strovoadas e ao marido. ;a colaboraç&o dessas duas criaturas nasceu a min!aeducaç&o# incompleta, viciosa e neativa. ;esta terra e deste estrume nasceu esta...flor2

CENA IV

BRÁS N - ?recuando ao &undo do palco@ 6resci7 de'essete anos2 %usto por uma damaespan!ola fui me interessar. Darcela... linda Darcela2 ?com sarcasmo@ Doça demuitos favores e ami'ades...

 Brás N se dirige para 'arcela (ue está no mancebo.

BRÁS N ?a)udando 'arcela a colocar o *ale e os sapatos@- <sso começou quando certodiaum tio meu me levou a casa dessa cortes&. ;epois peruntou-me se tin!a ostado da

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moça....

BRAS N# - Nossa pai>&o teve duas fases# a fase consular na qual eu dividi Darcela comEavier e a imperial onde o universo era meu, porFem n&o era de raça. =oi preciso din!eiro

 para inventá-lo. 8rimeiro e>plorei as laruesas de meu pai, ele dava-me tudo o que

l!e pedia, sem repreens&o, sem demora, sem frie'a. ;i'ia a todos que era rapa' assimcomo ele o fora tamb)m. Das tal e>tremo foi o abuso que ele restriniu um pouco asfraque'as, depois mais, depois mais. 1nt&o recorri a min!a m&e e indu'i-a a desviar aluma coisa, 0s escondidas. 1ra pouco. Gtili'ei um ultimo recurso, entrei a sacar sobre a !erança do meu pai, tomando empr)stimos com usura.

BRAS N# 1u aradeci com os ol!os midos. Assim foi que um dia, como eu l!e n&o pudessedar certo colar que ela vira num oal!eiro, advertiu-me que era um simples raceo eque nosso amor n&o precisava de t&o vular est"mulo. No dia seuinte levei-l!e ocolar que !avia recusado.

BRAS 8# 8ara te lembrares de mim quando nos separarmos.

BRÁS N# Darcela sorriu e ficou... Deu pai tendo ci/ncia das min!as aç3es ac!ou quee>cedia0s raivas de um capric!o uvenil.

BRÁS N# ?narrador C pai@# vai cursar uma universidade em 6oimbra, quero-te para!omems)rio e n&o para arruador e atuno2.

 Brás se espanta...

BRÁS N# ?narrador C pai@# Hatuno sim sen!or. N&o ) outra coisa um fil!o que fa' isto... I

assim que um moço deve 'elar o nome dos seus$

BRÁS N# 1stava furioso, eu o ouvi calado. Ruminava a id)ia de levar Darcela comio, fuifalar com ela... Darcela ouviu-me com os ol!os no ar. ;isse-me que n&o podia ir para a1uropa.

BRÁS N# ;erramei todo o desespero do meu coraç&o.

BRÁS N# 5ive "mpetos de a estranular, de a !umil!ar ao menos, subuando-a meus p)s.Das...

BRÁS N# 1ste romance com Darcela durou apenas on'e meses e quin'e contos de r)is.Deu

 pai, ao ver que eu iria falir, mandou-me estudar em 6oimbra. 1m 8ortual, o que fi'$6onseui me formar2 Das continuei sendo este mesmo modelo de inutilidade C eu áestou morto, n&o me importo com os comentários.

CENA V

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BRÁS N - Din!a m&e prestes a morrer, volto a c!amado de meu pai ao Brasil. Ainda tivealumas palavras com min!a m&e antes da morte. Dais tarde, papai me prop3e dois

 proetos# ser deputado e me casar com uma certa +ir"lia, fil!a do consel!eiro ;utra.*esitei mas aceitei. Antes fui fa'er uma visita na casa de ;. 1us)bia :embram-se de ;.1us)bia, ;r. +ilaça, a moita... 8ois bem, eis o fruto da moita# 1u/nia.

CENA VII

BRÁS N 8ois bem, desci de volta para casa, con!eci +ir"lia, mas a" apareceu :obo Neves,um !omem que n&o era mais esbelto que eu, nem mais eleante, nem mais simpático,e todavia foi quem arrebatou +ir"lia e a candidatura, dentro de poucas semanas,com um "mpeto verdadeiramente cesariano. Deu pai, penso que meu pai n&oauentou tal desenlace e talve' isso l!e complicou as ltimas dores. Dorreu quatromeses depois, dias após a visita de um ministro que l!e proporcionou um ltimosorriso. Din!a irm& e eu tivemos um pequeno desentendimento devido a !erançadei>ada por meu pai, mas loo fi'emos as pa'es. 5empos depois tive noticias de+ir"lia, por seu primo :u"s ;utra. =ui convidado para uma recepç&o na casa de:obo Neves, encontrei +ir"lia e trocamos alumas palavras.

BRÁS N - ( beio que ela me deu, tr/mula, coitadin!a, tr/mula de medo. Gniu-nos essenico

 beio.

CENA VIII

 En(uanto o Narrador &ala da poltrona e Brás saindo pensati!o, entra +uincas Borba.

BRÁS N - Saindo da c!ácara de :obo Neves, voltando para a casa, apro>imou-se um!omemalto, pálido de vestes limitadas.BRÁS N - 6onversamos por alum tempo, tempo suficiente para me pedir din!eiro.BRÁS N - 5rabal!ando.BRÁS N - (utro dia restitui-me o relóio, depois reencontrei-o, onde apresentou umafilosofiaque preava que tudo o que acontece na vida fa' parte de um quadro maior de

 preservaç&o da ess/ncia !umana. 1sta filosofia se c!amava *umanitismo.

CENA IX

 Entra +uincas BorbaCENA X

BRÁS N - 1 +ir"lia$2 A!2 Deus caros, n&o se esqueçam de +ir"lia. 8assamos a nosencontrar freqJentemente. At) que um dia desses a encontrei triste, abatida#BRÁS N - 8ois ), no dia seuinte encontrei +ir"lia7 me props que ao inv)s de fuirmos,

 poder"amos nos encontrar na casa que ;. 8lácida cuidava7 uma boa sen!ora quetrabal!ava para +ir"lia.

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CENA XI

BRÁS N - 8ois ), nosso romance acabaria daqui a aluns dias com a partida de +ir"lia para o

norte, acompan!ando seu marido que foi nomeado presidente da prov"ncia. Andeinamorando a sobrin!a do 6otrim, mas a menina morreu com KL anos. =ui deputado efrustrei-me ao tentar ser ministro. 1nt&o fundei, com 4uincas Borba, um ornal deoposiç&o.

 Brás N !ai se dirigindo ao cai*ão.

BRÁS N - 1nfim, foi um per"odo c!eio de perdas e decepç3es# morrem Darcela, o loucodoBorba, :obo Neves e encontro 1u/nia em um cortiço. Ao tentar inventar umemplasto que me traria fama, adoeço e morro aos M anos.

 Brás N entra no cai*ão e sentado diz:

BRÁS N - Na vida ainda sa" no lucro, pois, n&o tive fil!os, n&o transmiti a ninu)m oleadode nossa mis)ria.

 Brás N se deita.

CENA XII mordomo entra, &eca o cai*ão. epete os mo!imentos da

 primeira cena.

D(R;(D( Boa Noite2 ?ou outro cumprimento, dependendo do orário@.

 /pagam-se todos os &ocos.

CAI O PANO

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