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'Meio diploma': ilusão na faculdade
Certificados podem induzir aluno a pensar que terá mais de uma profissão durante o curso,
mas alguns não têm valor no mercado de trabalho
Isis Brum
Universidades particulares da capital estão oferecendo certificações profissionais sem validade
no mercado de trabalho. O “diploma intermediário” é oferecido aos estudantes logo no primeiro
ano de curso, mas não é reconhecido pelo Ministério da Educação (MEC) - que pretende
acabar com esse modelo de ensino - e nem pelos órgãos de classe ou mercado de trabalho.
Mas também não há lei que os proíba.
Amparadas por resoluções do Conselho Nacional de Educação (CNE), órgão ligado ao MEC, a
Uninove e a Uniban dão as certificações ao longo do curso regular - inclusive diplomação
superior - e oferecem pós-graduação lato sensu (especialização) para quem ainda não concluiu
a graduação. Isso acontece porque o setor privado goza de ampla autonomia.
Segundo nota da Secretaria de Ensino Superior (Sesu), “as universidades e centros
universitários têm autonomia para criar cursos, independente de autorização do MEC”, com
exceção de Medicina, Direito, Psicologia e Odontologia. É necessário apenas pedir o
reconhecimento à Sesu.
Embora não sejam ilegais, os certificados não permitem que o universitário atue como
profissional da área antes de concluir a graduação, como imagina a universitária Cecília
Carvalho, de 33 anos, matriculada no 4º ano de Fisioterapia da Uninove Barra Funda, na zona
oeste da capital. Depois de 2 anos e meio de estudo, ela pode requerer a diplomação superior
em “Cuidados Geriátricos Domiciliares”, dado pela instituição.
Cecília acredita que, com esse diploma, poderá recomendar e aplicar exercícios físicos e
respiratórios em idosos que não se movem ou tenham mobilidade reduzida. Mas o Conselho
Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional de São Paulo (Crefito) afirma que essa prática
configura crime.
“É exercício ilegal da profissão”, diz o presidente da entidade, Gil Lúcio Almeida. “Apenas o
fisioterapeuta com diploma de graduação reconhecido pelo MEC e inscrito no Crefito-SP pode
tratar de pacientes”, diz Almeida. Com esse certificado oferecido pelas instituições, o aluno
pode cuidar da higiene pessoal ou fazer companhia ao idoso. “Não mais que isso.”
Na Uniban, o aluno que conclui o 1º ano do mesmo curso recebe o certificado de
Massoterapeuta. No 3º, diplomação superior em Acupuntura. Para o Crefito, somente o
fisioterapeuta formado pode exercer essas funções. “Os formados com esses certificados não
são fiscalizados pelo Estado e colocam a vida da população em risco”, prossegue o presidente
da entidade. “Já que o governo admite a existência desses cursos, deveria, então, criar uma
forma de fiscalizar essas pessoas e proteger a população, pois cabe ao Estado socorrer a vida
em sua plenitude”, defende o fisioterapeuta.
Os diplomas intermediários também são oferecidos aos estudantes de Enfermagem,
Odontologia, Psicologia, Educação Física, Engenharia, Direito, Jornalismo, Publicidade e
Propaganda, para citar alguns exemplos. Ambas as universidades garantem aos alunos que as
certificações aceleram a entrada deles no mercado de trabalho, mas não deixam claro quais
são os limites para a atuação e nem que muitas das funções certificadas podem ser
executadas por pessoas sem nenhuma formação superior.
Na opinião do vice-presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa (Anped),
João Ferreira de Oliveira, os cursos de curta duração são uma jogada de marketing das
particulares. “São mais uma estratégia de mercado para atrair o aluno do que para o trabalho”,
afirma Oliveira.
Pós-graduação
Na Uniban e na Uninove, o estudante poderá também concluir a graduação junto com a pós-
graduação lato sensu, que é o curso de aperfeiçoamento profissional.
Isso é possível porque o Conselho Nacional de Educação estabeleceu, em 2007, que os cursos
de especialização poderiam ser feitos por qualquer pessoa com diplomação superior - um dos
certificados dados pelas duas instituições durante a formação regular.
A resolução do órgão é a única justificativa da Uninove para a oferta de cursos com
certificações intermediárias e chance de se fazer graduação e pós simultaneamente. Em nota,
a universidade informa que a formação executiva - título dado ao curso de formação rápida e
sequenciada - “é um programa voltado ao aluno que pretende inserir-se mais rapidamente no
mercado de trabalho”. Apesar de ser procurada para entrevista, ninguém retornou ao JT.
A Uniban disse que “certifica habilidades adquiridas” e que isso “garante diferencial ao seu
aluno no mercado de trabalho (leia entrevista abaixo).
FORMAÇÃO
Os cursos superiores oferecidos podem ser de graduação (bacharelado, licenciatura e
tecnológico) ou sequenciais
Os sequenciais estão divididos em formação específica (confere diploma ao final do curso) e
complementação, em que o aluno opta por fazer somente algumas disciplinas e recebe apenas
um certificado
O diploma do sequencial específico qualifica o aluno para uma função e não para uma
profissão
O estudante com diplomação sequencial não pode fazer pós-graduação stricto sensu
(mestrado e doutorado) e não pode prestar concurso público, assim como o tecnólogo
Os certificados dados pelos cursos sequenciais não são irregulares, mas também não são
reconhecidos pelo Ministério da Educação e pelas entidades de classe
CERTIFICADOS
ENFERMAGEM
Reconhecido: formar bacharel (graduação) e técnico (nível médio) para prestar assistência
diretamente ao paciente
Sem reconhecimento: certificado em agente comunitário da saúde, atendimento em home care,
visita domiciliar e saúde comunitária e da família, não autoriza o aluno a cuidar diretamente do
paciente e algumas funções nem necessitam de formação superior
ODONTOLOGIA
Reconhecido: formar cirurgião dentista, que só trabalha com inscrição no Conselho Regional de
Odontologia
Sem reconhecimento: certificado em instrumentação odontológica, que significa conhecimento
dos objetos usados em um procedimento dentário pelo dentista. Pode ser auxiliar do
profissional. A especialização em Odontologia só pode ser cursada pelo aluno que concluiu a
graduação e obteve registro no CRO antes da data de matrícula da pós-graduação.
DIREITO
Reconhecido: formar bacharel em Direito. Para atuar como advogado é preciso inscrição na
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)
Sem reconhecimento: certificado em redação normativa e técnicas legislativas. Mostra que o
estudante conhece leis e pode exercer função de nível médio, como assistente de parlamentar
no Poder Legislativo, por exemplo
JORNALISMO
Reconhecido: formar bacharel e, apesar de não ser mais obrigatório, é preciso ser graduado
para trabalhar em jornais impressos, revistas, emissoras de TV, internet e assessoria de
imprensa
Sem reconhecimento: certificado em pesquisa jornalística, assistência de comunicação e
comunicação empresarial. Não existe função de pesquisador em jornalismo nas redações dos
jornais, por exemplo