A Vila e a Estrada Urbanização e implicações físico...

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1 A Vila e a Estrada Urbanização e implicações físico-ambientais e culturais em Tamoios, Cabo Frio, RJ. Pedro de Moraes Calvente Arquiteto e Urbanista, Mestre em Arquitetura e Urbanismo pela UFF-RJ (2008) [email protected] Maria de Lourdes Pinto Machado Costa Doutora em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (1998), professora e pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da UFF-RJ. [email protected] Resumo Este trabalho traduz parte das investigações e resultados parciais de Dissertação de Mestrado defendida, ao mostrar as bases do processo de ocupação urbana desordenada em Tamoios, segundo Distrito do Município de Cabo Frio, Região dos Lagos, Estado do Rio de Janeiro. Seu desenvolvimento foi realizado com o intuito de melhor compreender os impactos e as implicações ocorridos na região, para averiguar os reflexos sobre a Região dos Lagos e a instância local, com foco no Distrito de Tamoios e ênfase na vertente paisagem natural. Neste sentido, constatou-se a trajetória das transformações na Vila de Tamoios, passando pela consideração de um breve histórico da ocupação, contextualizado em função da evolução de processo produtivo também em seu entorno, com inserção dos rebatimentos sócio-ambientais na atualidade, inclusive na principal Rodovia que dá acesso à Vila, em tempo de extração mineral do petróleo em águas abertas, na Bacia de Campos, Macaé, Rio das Ostras, Barra de São João e Cabo Frio, relacionado, da mesma forma, à correspondente transformação nas duas escalas de análise – a microrregional e a local. Palavras-chave Urbanização – Meio Ambiente – Zona Costeira - Tamoios – Cabo Frio (RJ)

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A Vila e a Estrada Urbanização e implicações físico-ambientais e culturais em Tamoios,

Cabo Frio, RJ.

Pedro de Moraes Calvente

Arquiteto e Urbanista, Mestre em Arquitetura e Urbanismo pela UFF-RJ (2008) [email protected]

Maria de Lourdes Pinto Machado Costa

Doutora em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (1998), professora e pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da UFF-RJ.

[email protected]

Resumo Este trabalho traduz parte das investigações e resultados parciais de Dissertação de Mestrado

defendida, ao mostrar as bases do processo de ocupação urbana desordenada em Tamoios,

segundo Distrito do Município de Cabo Frio, Região dos Lagos, Estado do Rio de Janeiro. Seu

desenvolvimento foi realizado com o intuito de melhor compreender os impactos e as implicações

ocorridos na região, para averiguar os reflexos sobre a Região dos Lagos e a instância local, com

foco no Distrito de Tamoios e ênfase na vertente paisagem natural. Neste sentido, constatou-se a

trajetória das transformações na Vila de Tamoios, passando pela consideração de um breve

histórico da ocupação, contextualizado em função da evolução de processo produtivo também em

seu entorno, com inserção dos rebatimentos sócio-ambientais na atualidade, inclusive na principal

Rodovia que dá acesso à Vila, em tempo de extração mineral do petróleo em águas abertas, na

Bacia de Campos, Macaé, Rio das Ostras, Barra de São João e Cabo Frio, relacionado, da

mesma forma, à correspondente transformação nas duas escalas de análise – a microrregional e

a local.

Palavras-chave

Urbanização – Meio Ambiente – Zona Costeira - Tamoios – Cabo Frio (RJ)

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1. INTRODUÇÃO

Aborda-se neste texto o processo de ocupação urbana desordenada na Vila de Tamoios, no

Município de Cabo Frio, na Região dos Lagos, com análise fundamentada em duas escalas,

microrregional e local, contemplando um quadro conceitual com foco na relação urbano-ambiental.

O trabalho evidencia a origem do agenciamento do lugar, em que a interação existente entre a

vasta riqueza natural da Microrregião assinalada e o que se depreende da ação do homem em

relação à Vila no que pode ser constatada.

Na metodologia destacam-se, num primeiro momento, as características relativas ao meio

ambiente na Microrregião de estudo. Em seguida é apresentado um conjunto de informações

sobre a Vila de Tamoios, no que se refere à origem de seu agenciamento, cultura e recursos

naturais. Por último, introduz-se discussão sobre a interação microrregional e local do ponto de

vista físico-ambiental.

Tamoios é o segundo Distrito do Município de Cabo Frio. A Vila de Tamoios se encontra situada à

fronteira norte de sua Zona Costeira e representa uma aglomeração urbana ao longo da Rodovia

Amaral Peixoto, no trecho entre o final da reserva de Marinha (próxima à entrada de Armação dos

Búzios) e o Rio São João (Ver figura 2 e 8), cuja gestão de recursos hídricos vem sendo

amplamente trabalhada pelo Comitê de Bacia do Rio São João, pela APA do Rio São João e pelo

Consórcio Intermunicipal Lagos São João.

A região de estudo, apresentada na figura 1 foi delimitada no curso da investigação, pela

constatação de uma realidade que se impõe, em relação à divisão oficial estadual de regiões de

governo. A união dos municípios de Macaé, Rio das Ostras, Casimiro de Abreu, Silva Jardim,

Araruama, São Pedro da Aldeia, Arraial do Cabo, Cabo Frio e Armação dos Búzios completam

uma região que se une pelas características ambientais e culturais, e também econômicas, por

força da presença de indústrias diversificadas ao longo do trecho que têm como única ligação a

Rodovia Amaral Peixoto (RJ 106). O turismo e/ou veraneio também aparecem como atividades

importantes na área.

3

Figura 1 (CALVENTE, P., 2008, pg21).

Figura 2 (CALVENTE, P., 2008, pg22).

4

2. UMA VISÃO DOS CONCEITOS

Sob o ponto de vista da relação do meio ambiente físico com o homem, os ecossistemas trazem

as referências das comunidades, populações e espécies, na tentativa de gerar um equilíbrio

biológico, apesar da ação de fatores abióticos. Ao contrariar os limites de crescimento

populacional e os fatores bióticos e abióticos, o homem quer encontrar na racionalidade soluções

plausíveis de sobrevivência, tentando adaptar a natureza às suas necessidades.

É nesse processo que surgem desigualdades quanto ao equilíbrio biológico presentes nos

ecossistemas naturais e nos ecossistemas em que o homem se insere - os ecossistemas urbanos.

“Segundo Lucrecia D’Alessio Ferrara (1999), a ecologia urbana analisa o esforço que o homem

faz para encontrar as condições adequadas para sua sobrevivência física, social, cultural,

econômica e política. Para a autora “nesta interação, a natureza apresenta-se como realidade

ambiental transformada e adaptada às necessidades humanas”. FERRARA afirma que “os

ecossistemas urbanos se caracterizam pelo processo intenso de transformação e completa

instabilidade” (FERRARA, 1999, apud CALVENTE, P., 2008, pg3).

Já os impactos no meio ambiente são entendidos como quaisquer alterações das propriedades

físicas, químicas ou biológicas, causadas de forma direta ou indireta por ações (públicas ou

privadas) e atividades humanas. (DELPHIM, 1997)

Na contramão do processo de fragmentação dos tecidos urbanos estão os Corredores Biológicos.

A Fundação CIDE (2001), através do Índice de Qualidade dos Municípios (IQM) - Verde, o

apresenta como: “um conceito relativamente novo na área da Biologia de Conservação, criado em

resposta à fragmentação inexorável dos habitats naturais que ocorre no mundo inteiro.” (CIDE,

2001, apud CALVENTE, P., 2008, pg12).

Em verdade, a fragmentação de grandes áreas de floresta isola as populações de plantas e

animais, que outrora eram contíguas, em áreas segregadas. Com suas populações reduzidas e

restritas, devido à separação dos fragmentos do habitat original, tais organismos são mais

susceptíveis à extinção, devido a fatores como erosão genética e modificações no meio ambiente.

Os corredores biológicos, conforme os especialistas colocam (também conhecidos como

corredores ecológicos ou de biodiversidade) são implantados para impedir essa fragmentação,

com o intuito de aumentar a conectividade entre os habitats e os ecossistemas em várias escalas.

Os corredores chamam a atenção de técnicos, proprietários de terras e cientistas porque eles

mantêm ou restauram essa conectividade, minada pela fragmentação.

De acordo com os pesquisadores da Fundação CIDE, os corredores são mais do que meras áreas

lineares protegidas, ligando freqüentemente o habitat semi-natural através de paisagens

5 dominadas pelas atividades humanas. Segundo eles, os corredores biológicos, fornecem uma

ferramenta essencial para a conservação de grande dimensão, como estratégia prática para

restaurar a conectividade de paisagens.

Como conseqüência benéfica à aplicação dos corredores, estes são assim apresentados:

1. Em relação à diversidade biológica, os corredores ressaltam a dispersão entre as populações de fauna e flora isoladas, facilitam as migrações de longa distância, dão refúgio a essas populações em ambientes adversos e permitem a colonização de habitats novos e secundários.

2. Com relação aos recursos hídricos, os corredores contribuem para amenizar as enchentes e melhorar a qualidade da água.

3. No setor agrícola e florestal, servem como quebra-ventos para as culturas, pastos e animais; ajudam a reduzir a erosão do solo pelo vento e pela água; contribuem para a manutenção dos níveis e qualidade da água no solo; e fornecem fontes, por exemplo, para produtos tanto madeireiros quanto não-madeireiros.

4. Os corredores visam aos aspectos relacionados ao lazer e à estética, delimitando áreas apropriadas para caça, pesca, caminhadas em trilhas e acampamentos, educação ambiental, observação da vida selvagem e da natureza.

5. Finalmente, com relação às mudanças climáticas, os corredores poderiam fornecer caminhos para a redistribuição das populações de espécies com limitada habilidade de dispersão.

Dependendo da escala, os corredores têm objetivos, configurações e estratégias de

implementação distintas. Uma tendência crescente é planejar corredores sobre áreas imensas,

quase continentais, tais como o Corredor Mesoamericano e o Corredor Yellowstone/Yukon.

Embora corredores nesta escala possam ser úteis para o planejamento de longo prazo, eles têm

pouca utilidade na definição de objetivos alcançáveis no curto e médio prazo, ou no planejamento

de estratégias práticas de implantação para alcançar esses objetivos. Planejar e implantar

corredores de paisagem em escala menor, com base em critérios claros e prioridades realizáveis,

aumenta as chances de sucesso. Um dos instrumentos que podem servir de apoio a sua

proposição é o Plano Diretor de Desenvolvimento Local.

Segundo BARROS (2007) as zonas costeiras são espaços geográficos que acumularam, ao longo

do tempo, em seu processo histórico, usos (territórios ocupados) e inter-relações, conflitantes e

complementares, gerando um elenco de técnicas e objetos correspondentes aos respectivos usos.

É nesse espaço que está marcada a intencionalidade ou a ação da sociedade, sendo a infra-

estrutura organizacional o lugar onde ocorrerá a união indissociável entre os sistemas de ações e

os sistemas objetos, segundo Santos (2002).

BARROS (2007) coloca ainda que as relações atuais da sociedade na zona costeira

estabeleceram um conceito de valor formado por um mercado imobiliário, em face da escassez e

da disponibilidade para usos futuros. Seus espaços são qualificados como raros, de localização

privilegiada, finitos e relativamente escassos, dotados de especificidades e vantagens locacionais

(MORAES, 1999, apud BARROS, 2007). Dessa forma, são marcados atualmente por uma

6 apropriação sócio-cultural que os identifica como local de veraneio e lazer por excelência, quando

bem preservados. As dimensões das áreas utilizadas pelos empreendimentos na zona costeira

estarão diretamente relacionadas ao seu retorno, vide exemplos dos complexos portuários e

turísticos. Submetidos a uma lógica mercantil, o valor dos espaços costeiros é bem mais elevado

do que os da hinterlândia, o que acaba por condicionar a sua apropriação e os seus usos

(Moraes, 1999, apud BARROS, 2007).

BARROS (2007) segue afirmando que para gerenciar as novas ações sobre os espaços costeiros

deve ser construída uma nova racionalidade ambiental, para este sistema. O gerenciamento da

zona costeira deverá ser articulado em um corpo complexo (MORIN, 2003a), integrando e

interrelacionando os diversos saberes: ecológico, social, cultural, econômico, psicológico, popular

etc., de modo a criar, como sugere LEFF (2000), para as questões ambientais, uma

metalinguagem interdisciplinar.

3. A QUESTÃO AMBIENTAL NA MICRORREGIÃO DE ESTUDO

O IQM Verde mencionado revela que diversos estudos vêm sendo iniciados no Estado do Rio de

Janeiro e em outras áreas da Mata Atlântica, através de programas como o PROBIO, do

Ministério do Meio Ambiente, para investigar a estrutura e a dinâmica da paisagem, as

comunidades biológicas existentes nesses fragmentos e sua relação com os diferentes tipos de

uso da terra. O documento traz consigo a informação de que a fragilidade dos fragmentos

florestais está relacionada com a sua origem, forma, tamanho e grau de isolamento, e com o tipo

de uso no seu entorno. Apesar de existirem poucos resultados conclusivos, fortes evidências

apontam para a importância do histórico de uso e do grau de isolamento. Tendo em vista a sua

importância na manutenção de um mínimo de área natural em diversos municípios do Estado,

conservar parte do estoque original de biodiversidade, fundamental para o sucesso de estratégias

de manejo e restauração dos ecossistemas florestais, é imprescindível visando um esforço

integrado de pesquisa e conservação desses fragmentos. Por esta razão, a Fundação CIDE

apresenta ainda uma outra medida que vem sendo discutida: o estabelecimento de corredores

ecológicos conectando esses fragmentos, de modo a possibilitar um maior fluxo de genes e

espécies, diminuindo o risco de extinções e aumentando a sua diversidade em médio prazo.

(CIDE. IQM-Verde, 2001)

Segundo informações deste documento, o estado do Rio de Janeiro representa uma porção

especial na Floresta Atlântica. Mesmo que esta floresta seja uma área bastante extensa, de difícil

conservação (mais de 1 milhão de km2), é importante salientar que a maior parte dela já foi

destruída.

No tocante aos pássaros, MANNE et al. (1999) mostram que o Estado tem, com larga margem,

mais aves ameaçadas, se comparada a qualquer outro lugar na Floresta Atlântica e, por extensão,

7 nas Américas. Parte da explicação é que o Rio de Janeiro tem também mais espécies de aves,

devendo-se esperar, portanto, que contenha as mais ameaçadas.

A principal razão para essa pluralidade especial de espécies está na variedade de topografia e

clima que ele abriga. Múltiplas cadeias de montanhas cortam seu território, criando uma complexa

série de zonas bioclimáticas. Em poucas dezenas de quilômetros, pode-se viajar de uma floresta

úmida para uma floresta de neblina e campos de altitude e, depois, cruzar a montanha para áreas

secas, onde cactos pontuam a paisagem.

Dadas as condições gerais da Floresta Atlântica, o trabalho ambiental situa o Rio de Janeiro em

relativa boa posição. Cerca de 18% do Estado (incluindo as matas secundárias em estágio

avançado de regeneração) permanecem florestados, em situação muito melhor do que a maioria

das outras regiões. Segundo o estudo, a maior parte desta floresta ocorre em três áreas,

indicadas na Figura 3. Duas delas, o Eixo Central e a Serra do Mar, são fragmentos grandes e

razoavelmente contínuos. Já a do Município do Rio de Janeiro está repartida em três fragmentos

principais, cada um circundado por áreas urbanas densamente ocupadas.

“A distribuição da floresta tende para altas elevações, usualmente áreas inacessíveis (em cores

azul e verde na figura 4). Não é um padrão surpreendente, pois isto acontece em áreas

desflorestadas no mundo inteiro. Surpreendente é a quantidade de floresta remanescente que

existe nas terras baixas (em cor vermelha na mesma figura), especialmente quando se considera

a grande densidade demográfica na região”.(CIDE, 2000)

Mas de acordo com as análises técnicas do documento, grande parte da floresta das terras baixas

estende-se por uma estreita faixa ao longo da fronteira sul do Eixo Central (figura 4). Referindo-se

à região de estudo do trabalho (figura 1), esta faixa de floresta é altamente fragmentada. Algumas

florestas das terras baixas (Tamoios) mantêm conexão entre si apenas através da floresta mais

elevada. Outras estão completamente isoladas.

Segundo o mesmo estudo, isto é preocupante, por duas razões: a primeira é que certas aves da

Floresta Atlântica são migrantes de altitude, isto é, elas passam diferentes épocas do ano em

diferentes elevações. Para essas espécies é essencial que haja floresta nas terras baixas e nas

elevações mais altas, assim como um caminho para o deslocamento entre elas. Outra razão é que

algumas aves vivem apenas nas terras baixas, especialmente as espécies ameaçadas. Para

estas, a conexão através de elevações mais altas pode ser de nenhuma valia. Pois elas vão se

mover apenas através das terras baixas.

É importante salientar que estas características não são exclusivas para aves, e as soluções para

seus problemas são provavelmente similares àquelas necessárias para a conservação de outros

animais.

8 Segundo o documento, impedir a extinção de aves, e igualmente a de muitos outros organismos,

requer grandes áreas de floresta. Estas florestas necessitam atravessar gradientes de altitude ao

mesmo tempo em que também mantêm conexões através das terras baixas.

As informações técnicas apresentam a região do entorno de Tamoios, nos municípios de Macaé,

Casimiro de Abreu e Silva Jardim (figuras 1 e 3), na qual se poderia restaurar a conectividade na

floresta e reduzir as possibilidades de extinção. A Reserva Biológica (REBIO) União (Macaé) e a

REBIO Poço das Antas (Silva Jardim) são reservas com proteção relativamente boa. Cada uma é

um fragmento florestal de terra baixa, com cerca de 3.000 ha e próxima a fragmentos florestais

maiores. Morro de São João (Casimiro de Abreu), uma intrusão alcalina, tem 1.500 ha e é

desprotegido, embora alguns dos proprietários de terra estejam considerando o estabelecimento

de reservas privadas (RPPNs).

Figura 3 - REBIO União e REBIO Poço das Antas são reservas biológicas relativamente bem protegidas. Morro de São João é uma intrusão alcalina e permanece florestado devido à sua topografia rugosa. Uma faixa de 20 ha de pasto (círculo vermelho) separa a REBIO União de áreas maiores de floresta nas proximidades. A rodovia BR-101 separa Poço das Antas da floresta próxima. Terra agrícola circunda o Morro de São João. Veja Figura 4, para uma visão mais ampla da região. (Fonte: IQM – Verde 2001 apud CALVENTE, P., 2008, pg51).

Segundo os especialistas da área, a REBIO União (Macaé) possui 17 aves oficialmente

ameaçadas (BERGALLO et al., 2000), a maior concentração que este autor conhece nas

Américas. Ela não tem conexão com floresta de maior altitude. A mais próxima está no limite de

uma faixa de 20 ha de pasto, ressaltada com um círculo na Figura 3. A área pertence a uma única

família de fazendeiros e tem uma pequena estrada de terra, facilmente cruzada pela maioria da

fauna selvagem. Reflorestar esta área restauraria a conectividade da mais importante reserva de

aves das Américas.

9 Para os estudiosos, a REBIO Poço das Antas, localizada em Silva Jardim, é o caso mais difícil.

Sua conexão mais próxima com fragmentos maiores de floresta implica cruzar uma das rodovias

mais importantes do Brasil, a BR-101. Remover a rodovia não é uma opção viável; contorná-la,

também não. Reflorestar até as margens da rodovia pode propiciar o deslocamento de algumas

espécies entre Poço das Antas e a floresta ao norte. Contudo, a faixa da rodovia pode, ainda

assim, ser larga demais para algumas espécies, e o tráfego de automóveis certamente causará

mortalidade. Florestas próximas a rodovias também causam problemas práticos de queda de

árvores ou galhos na pista. Isso se não forem suspensas como a rodovia verde em SP.

O Morro de São João, situado em Casimiro de Abreu é outro caso difícil, segundo os cientistas.

Terras agrícolas circundam a floresta e ele é muito mais isolado do que REBIO União ou REBIO

Poço das Antas. Reconectar este fragmento de floresta vai exigir restauração extensiva da

paisagem do entorno. Uma possibilidade seria um corredor de floresta ao longo do rio São João,

ao sul. Isto restauraria a conectividade com um fragmento de floresta a oeste, ao mesmo tempo

em que melhoraria a qualidade da água do rio.

Figura 4 - Cinco ‘mini-corredores’ delineados para aumentar a conectividade entre diversos habitats no Cordão de Mata. A elipse magenta representa (sem precisão) a área de estudo. Mas serve para que se possa ter uma compreensão sobre o entorno imediato a Vila de Tamoios. Fonte: IQM – Verde 2001 apud CALVENTE, P., 2008, pg53.

Identificadas pelos cientistas da Fundação CIDE (IQM Verde, 2000) descobriu-se que as possíveis

áreas para serem reflorestadas na Floresta Atlântica, fazem parte da microrregião de estudo do

distrito de Tamoios (ver figura 4). Continuando suas investigações, os pesquisadores ambientais

10 comprovam de que forma estas áreas devem ser reflorestadas expondo um conceito de corredor

ecológico, ou de biodiversidade.

Segundo aqueles, o conceito de corredor de biodiversidade já é consagrado no Brasil, onde está

sendo implantada uma série de corredores, abrangendo seus principais ecossistemas: Mata

Atlântica, Cerrado, Pantanal e Amazônia. No Rio de Janeiro, o Instituto Estadual de Florestas está

empenhado na implantação de um “corredor ecológico” (ou biológico) na Região Serrana,

localizado entre os Parques Estaduais dos Três Picos e do Desengano. O corredor biológico

tratado neste texto, denominado “Cordão de Mata”, procura interligar remanescentes florestais da

Região Serrana e do Norte Fluminense, envolvendo diversas iniciativas em várias escalas.

Estudiosos constatam que a habilidade para trabalhar em diferentes escalas é uma característica

essencial em relação aos corredores biológicos, pois orienta seus executores a direcionarem os

recursos disponíveis para áreas prioritárias, sem perder a perspectiva da visão macro da

paisagem do entorno dessas áreas. De fato, segundo os especialistas, é essa característica que

distingue a metodologia de corredores biológicos das iniciativas de conservação que a

precederam, as quais tendiam a focar áreas específicas protegidas, ignorando a paisagem maior

da qual eram partes integrantes.

Apresenta-se, contudo, como uma solução mais viável de ser executada, pois considera a

realidade urbana que é pujante, conforme este trabalho tem demonstrado.

Como iniciativa do poder público em conjunto às sociedades civis organizadas, para uma gestão

administrativa eficiente dos recursos hídricos, em 8 de janeiro de 1997 a Lei 9.433 instituiu a

Política Nacional de Recursos Hídricos e criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de

Recursos Hídricos, permanecendo o Código de Águas (Decreto 24.643, de 10 de julho de 1934)

como a lei de direito da água no Brasil. Esta lei define cinco instrumentos para implementação da

Política Nacional de Recursos Hídricos:

• “planos de recursos hídricos; • outorga dos direitos de uso dos recursos hídricos; • cobrança pelo uso de recursos hídricos; • enquadramento dos corpos d’água em classes de uso; • Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos”.

(http://www.lagossaojoao.org.br/ em 03//09/2010)

Por fim, ressalta-se que a lei estabeleceu um arranjo institucional criando novos tipos de

organização para a gestão compartilhada do uso da água, quais sejam:

• “Conselho Nacional de Recursos Hídricos; • Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos; • Comitês de Bacias Hidrográficas; • órgãos dos poderes públicos federal, estaduais e municipais, cujas competências se

relacionem com a gestão de recursos hídricos; • Agências de Água”. (http://www.lagossaojoao.org.br/ em 03//09/2010)

11 Em Tamoios tal iniciativa se verifica na criação das instancias conectadas com referencia ao Rio

São João, somadas às REBIOS, APA e Consorcio Lagos São João, que promovem dialogo entre

si e o poder público democraticamente.

Uma vez estabelecido sistema organizacional dos Recursos Hídricos observa-se que sua

implantação sugere adequações de trato estratégico administrativo ainda não resolvidos que são

passiveis de discussão.

Um exemplo seria o conflito entre administrações de uma mesma região por instâncias

segregadas. A criação de uma agencia reguladora de recursos Hídricos que se delimita

geograficamente em geral pela Bacia do rio que a comporta se confronta com os limites

fronteiriços municipais. Em termos legislativos, em alguns casos, essa característica não ajuda em

sua aplicação e fiscalização criando espaço para a informalidade se instalar onde problemáticas

sociais aumentam as distancias entre uma convivência pacifica e integrada urbano ambiental.

Na prática tal questão, observamos, gera uma reflexão sobre a resolução de conflitos como

invasão de áreas ambientalmente protegidas como no caso da APA do Rio São João.

4. A VILA DE TAMOIOS

O Município de Cabo Frio foi fundado em 1615 e localiza-se a sudeste da zona costeira do Estado

do Rio de Janeiro, na Microrregião Lagos. Atualmente tal município tem como limites o Oceano

Atlântico e os Municípios de São Pedro da Aldeia, Araruama, Arraial do Cabo, Armação dos

Búzios e Casimiro de Abreu (Ver figura 1).

O município hoje tem uma área total de 410,6 km² 1 (IBGE/Censo Demográfico 2000)

correspondentes a 8,1% da área da Região das Baixadas Litorâneas (segundo registro do Projeto

Orla, 2002).

De acordo com o Censo de 2000, Cabo Frio tem uma população de 126.828 habitantes,

correspondente a 22,6% do contingente da Região das Baixadas Litorâneas. Entretanto, nos

períodos de veraneio e feriados, essa população sofre um acréscimo significativo, chegando a 700

mil habitantes. Com isso, agrava-se uma série de problemas decorrentes da insuficiência de

equipamentos urbanos e da infra-estrutura deficiente (escassez de água, incapacidade da rede de

esgoto, excesso de lixo, deterioração das praias). (Dados da Secretaria Estadual de

Desenvolvimento Econômico e Turismo – SEDET, 2002)

A densidade demográfica é de 308,9 habitantes por km2 em Cabo Frio e de 110,6 habitantes por

km2 na região. O município apresentou uma taxa média geométrica de crescimento, no período de

1991 a 2000, de 5,81% ao ano, ao passo que na região é demonstrado 4,12% e 1,28% no Estado.

Sua taxa de urbanização corresponde a 83,8% da população, enquanto na Região das Baixadas

Litorâneas tal taxa corresponde a 85,9% (Ver Projeto Orla, 2002).

1 Deste total 295,48 km² pertencem ao distrito de Tamoios (IBGE- Censo 2000)

12 O crescimento populacional de Cabo Frio de 1991 até 2000 foi de 49% (valor absoluto de 84.915

hab. em 1991 e 126.826 hab. em 2000) comparado ao crescimento de 264% em Tamoios (valor

absoluto de 5.835 hab. em 1991 e 21.237 hab. em 2000) e 51,7% na Microrregião dos Lagos

(valor absoluto de 252.167 hab. em 1991 e 382.498 hab. em 2000) (CALVENTE Pedro, 2008,

p.91).

O crescimento Imobiliário de Cabo Frio de 1991 até 2000 foi de 63,4% (valor absoluto de 22.520

domicílios em 1991 e 36.794 domicílios em 2000, denotando um aumento de 14.274 domicílios),

comparado ao crescimento de 312,7% em Tamoios (valor absoluto de 1.454 domicílios em 1991 e

6.000 domicílios em 2000 significando que dos 14.274 novos domicílios no Município de Cabo

Frio, 4.546 unidades domiciliares são de Tamoios) e 69,4% na Microrregião dos Lagos (valor

absoluto de 65.463 domicílios em 1991 e 110.868 domicílios em 2000, o que representa 45.405

novos domicílios na microrregião).

Os dados do Censo Demográfico de 2000 do IBGE comprovam que o crescimento Imobiliário de

Cabo Frio se aproxima de 31,43% (14.274 de 45.405 domicílios) do crescimento da Microrregião

dos Lagos. Demonstram ainda que o crescimento de Tamoios contribui com quase 31,85% (4.546

de 14.274 domicílios) para o crescimento de Cabo Frio e aproximadamente 10% ao crescimento

de Microrregião Lagos (4.546 de 45.405 domicílios). (CALVENTE Pedro, 2008, p.92).

Os principais acessos são a rodovia BR101, Via Lagos (trecho sob concessão), e a RJ 106,

Rodovia Amaral Peixoto. A mesma RJ-106 chega ao território de Cabo Frio na altura de Tamoios

e segue rumo norte para Barra de São João, distrito de Casimiro de Abreu. Há estradas no

sentido norte-sul, que dão acesso à Armação dos Búzios e Arraial do Cabo.

Neste trabalho, sempre que for mencionada a Vila de Tamoios esta designação referir-se-á

aglomeração urbana dispersa ao longo da Rodovia Amaral Peixoto, e não à toda extensão do

Segundo Distrito, que engloba as áreas rurais (ver figuras 2 e 8).

O Distrito de Tamoios tem fronteira com os municípios de Casimiro de Abreu, Silva Jardim,

Araruama, São Pedro da Aldeia e Armação dos Búzios. Possui uma aldeia de pescadores na foz

do rio São João, denominada Santo Antônio. Vem sofrendo, tal como Rio das Ostras e Búzios,

ação intensa de ocupação com finalidades turística e de veraneio, que vêm se agravando em

virtude de invasão e ocupação de lotes na área ao longo da Rodovia Amaral Peixoto (RJ 106).

O mesmo distrito possui histórico de ocupação agrária, configurado no zoneamento municipal

como solo rural até outubro de 2006, ratificado com a recente aprovação da lei de zoneamento,

produzida pelo atual Plano Diretor desenvolvido pela Fundação Getúlio Vargas, segundo a Sub-

Prefeitura do Segundo Distrito de Cabo Frio. Tamoios possui 295,48 quilômetros quadrados de

área (IBGE Censo Demográfico de 2000), que começa na Praia Rasa, divisa com Búzios, com 20

quilômetros confrontantes com o mar e mais 30 quilômetros confrontando-se com o Rio São João.

13 Tamoios está localizado dentro da região de atuação do Consorcio Ambiental Lagos São João

que atua na Macrorregião ambiental 4 (figura 6). Sua fronteira com o Município de Casimiro de

Abreu configura-se ambientalmente como a extremidade de uma região específica (figura 6) por

apresentar espécies de flora endêmicas dadas as condições de clima presentes. “O Departamento

de Botânica do Instituto Smithsonian, de Washington elegeu a “região de Cabo Frio”, com limites

assinalados na figura 6, como um dos centros de diversidade de plantas mais importantes da

América do Sul.” (http://www.riolagos.com.br/cilsj/)

Figura 6 Fonte: Área de atuação do Consorcio Intermunicipal Lagos São João Fonte: http://www.lagossaojoao.org.br/ em 03/2010

Como características ambientais relevantes a região apresenta uma notável diversidade climática,

variando do regime tropical ao semi-árido. A distribuição das chuvas na área exibe uma forte

variação espacial e temporal. Isto ocorre devido à ação combinada das mudanças das massas de

ar que pairam sobre a região ao longo do ano com as diversificadas características do meio

ambiente, das bacias e da zona costeira, em especial o relevo, associado ao fenômeno da

ressurgência marítima que ocorre nas costas de Cabo Frio e Arraial do Cabo. Durante o verão

predomina a massa de ar Continental Equatorial, enquanto no resto do ano prevalece a massa de

ar Tropical Atlântica. Frentes frias (Frentes Polares Atlânticas) freqüentemente passam pela

região, em especial durante a primavera.

Estima-se a existência de mais de seis centenas de espécies de árvores e arbustos nativos e mais

de três mil espécies de outras plantas como palmeiras, cipós, trepadeiras, bromélias, cactus,

14 orquídeas e uma infinidade de ervas, além de outro punhado de espécies de algas, liquens

musgos e samambaias.

Figura 7 Região Ambiental Específica Fonte: http://www.riolagos.com.br/cilsj/ em 8/2005, apud CALVENTE, P., 2008, pg57.

Segundo Biólogos da UFRJ (ARAUJO, D.S.D. Análise florística e fitogeográfica das restingas do

Estado do Rio de Janeiro, UFRJ, 2000) a flora deste centro, que cobre parte da Macrorregião 4,

deve possuir entre 1500 e 2200 espécies. Cerca de 26 espécies de plantas são exclusivas da

região, ou seja, só nela vivem e em nenhum outro local no mundo, aí incluídas 6 árvores.

(Chrysophyllum januariensis, Duguetia rhizantha, Erythroxylum glazioui, Marlierea schottii, Rollinia

parviflora e Swartzia glazioviana). (http://www.riolagos.com.br/cilsj/)

Conforme mencionado, o trabalho da Fundação CIDE, o IQM Verde, demonstra uma série de

conceitos sobre a região estudada. Com relação à evolução do processo de adensamento urbano

em face de perda da vegetação local, podemos aproveitar também informações pertinentes.

De acordo com o mapa comparativo do uso do solo nos anos 1966-1969 e 2001 (figura 7), é

possível identificar a dimensão da perda da vegetação que é classificada como de restinga

(CALVENTE Pedro, 2008, p.58). Focando-se em Tamoios, identifica-se a substituição da mancha

verde ao longo da costa pela mancha rosa, demonstrando que a ocupação urbana ocorreu nesta

parte do território. Da mesma forma, ao compararmos a parte interior do Distrito pode-se observar

que apesar da cobertura arbórea ter sido visivelmente reduzida, em 1966-1969 é possível

identificar uma ocupação consolidada por práticas humanas, destinada a outros usos. Esta

15 observação evidencia um uso do solo específico, portanto um agenciamento daquela paisagem

pelas comunidades ali existentes.

Figura 7 - Fonte: Fundação CIDE, IQM-Verde, 2001 apud CALVENTE, P., 2008, pg59.

Pedro Calvente (2008) constata, ao analisar o Censo Demográfico de 2000 do IBGE, que o

crescimento urbano ocorreu acentuadamente entre os anos de 1991 e 2000. Continua o

pesquisador alertando que este fenômeno tende a continuar, dadas as características

apresentadas nos processos econômico, microrregional e local.

De acordo com a análise técnica da Fundação CIDE, considerando-se o total da área com

cobertura arbórea clímax e em diferentes estágios de regeneração, Cabo Frio apresentou

importante colocação dentre os municípios do Estado, onde ocorreram os maiores

desmatamentos. Técnicos analisam que o desmatamento no período concentrou-se nas Regiões

das Baixadas Litorâneas e Norte Fluminense. Continuam afirmando que ocorreu também um

desmatamento acentuado nos municípios localizados ao norte e a leste da Baía da Guanabara

(Niterói, São Gonçalo, Magé, Guapimirim e Itaboraí), evidenciando a expansão da Região

Metropolitana nesta direção, devido, provavelmente, à melhoria da infra-estrutura viária, como a

construção da ponte Rio-Niterói em 1973 (CALVENTE,P., 2008, pg.74), o que pode explicar

também o aumento da área desmatada em municípios da Região dos Lagos, como Cabo Frio e

Araruama.

16 Constata-se que o processo de ocupação da Vila de Tamoios se apresenta como uma

conformação de caráter urbano relativamente afastado do núcleo urbano central da cidade de

Cabo Frio, e se desenvolveu em meio a solo rural. Desta forma se integra a sistemas urbanos

complexos, representados pelas cidades de Cabo Frio, Barra de São João, Rio das Ostras e

Macaé, sempre através da rodovia Amaral Peixoto (RJ 106).

Nesse processo, é observada a transformação de uma área outrora rural, representada pelas

práticas agrícolas tradicionais locais, em uma área com crescente potencial de adensamento

urbano. A adoção de novos modos metropolitanos de vida e de consumo pode ser identificada

basicamente com a evolução do sistema informal de comércio, serviços e equipamentos urbanos,

como bares, supermercados, farmácias, acentuado número de igrejas, além de vida noturna ativa

em períodos de final de semana e férias.

Observa-se um crescimento do núcleo urbano linear, expandido ao longo da Rodovia Amaral

Peixoto (ver figuras 2 e 8), e não tentacular que seria um crescimento irradiado do núcleo original

com referência histórica de ocupação. Consta-se que a Vila se desenvolveu de uma forma

“orgânica”, isto é, que seu crescimento não foi previsto através de planejamento urbano.

Neste núcleo encontra-se visível a dispersão de uma demanda de serviços comuns em cidades

de grande porte, e que pode ser explicada pela expansão Metropolitana do Rio de Janeiro e das

cidades circunvizinhas, razão pela qual o novo contingente populacional veio a se instalar ali.

Promoveu a adoção de novas práticas culturais, o que tem gerado intensa modificação da

paisagem cultural.

Os fatores econômicos, cruciais nesse desenvolvimento, têm atuado não somente em função do

turismo, mas também devido ao crescimento do processo de exploração do Petróleo em todo

Norte-Fluminense.

As figuras 2 e 8 destacam na foto de satélite do Google de 2007, com “layers” sobre o

levantamento de campo, o panorama complexo que se apresenta na realidade urbano-ambiental

local. Uma ocupação urbana em processo de crescimento, sem planejamento, tendo como

entorno imediato áreas de interesse ambiental. Essa interação em escala ampliada denota

impacto relevante quanto à circulação viária intermunicipal, representada pela rodovia Amaral

Peixoto (RJ 106) ao longo do trecho destacado.

5. CONSIDERAÇÕES DE NATUREZA URBANO-AMBIENTAIS

A ocupação na Vila de Tamoios tem sua concentração ao longo da Rodovia Amaral Peixoto (RJ

106), no trecho após a Reserva de Marinha e o Rio São João. As figuras 2 e 8, apresentam as

informações coletadas em campo e organizadas em foto de satélite conseguida através do Google

Earth, em 2007. Ao examiná-la, percebe-se o aglomerado urbano, destacando-se inicialmente o

contraste entre três áreas: as ambientais protegidas (APA do Rio São João, RPPN Parque da

17 Preguiça, Reserva da Marinha), a composta por uma malha urbana densamente ocupada e a

Rodovia Intermunicipal Amaral Peixoto (RJ 106).

Pela perspectiva microrregional, no tópico 3 (pg. 6 a pg. 11) constatamos que a Vila de Tamoios

se localiza na extremidade que se conecta com o mar de um importante sistema natural único. Tal

sistema conecta áreas de altitude diversas, através de bacias hidrográficas e abriga diversas

espécies de fauna migratórias de altitude e flora endêmicas, da Mata Atlântica, algumas em

processo de extinção, representado pela fundação CIDE no IQM verde.

Tais características ambientais Microrregionais se somam no tópico 4 (pg. 11 a pg. 16) ao fato da

Vila de Tamoios fazer parte também de outro sistema ambiental internacionalmente catalogado e

divulgado como um hot spot2, que abriga diversidade climática, pluvial, de relevo e principalmente

ampla variedades de espécies de fauna e flora catalogados (DAVIS, S.D., 1997. Disponível em:

http://www.nmnh.si.edu/botany/projects/cpd/. Acesso em: fevereiro de 2007).

O adensamento urbano constatado na Vila contrasta com tais características indo de encontro às

iniciativas de preservação identificadas. Em meados de 1990 (CALVENTE Pedro, 2008) observa-

se um crescimento de características urbanas, com lotes sem registro, com ocupação acentuada

dentro dos mesmos, na área conhecida como “Chavão”, indicada nas figuras 2 e 8. Esta extensão

de terra, composta originalmente por fazendas produtoras rurais, encontra-se dentro da APA do

Rio São João. Observa-se que esta unidade tem crescido nos últimos anos de maneira acelerada,

causando certa apreensão por parte dos órgãos responsáveis pelas questões ambientais, como o

conselho da APA do Rio São João e o Comitê de Bacia deste Rio.

Paralelamente à atividade imobiliária, nota-se a atividade de extração ilegal de areia, no interior da

Vila de Tamoios. Essa atividade foi responsável pela formação das lagoas demonstradas na figura

8. Interessante observar que elas se comportam como limites naturais ao avanço do crescimento

urbano, incipiente naquela área. A proximidade da RPPN Parque da Preguiça que faz fronteira

com as mesmas fortalece a característica de preservação e integra naturalmente áreas com

vocações complementares, mas contrasta com a onda de ocupação ilegal constatada na Vila de

Tamoios.

Chama a atenção o loteamento Nova Califórnia, localizado no centro da figura 8. O início de suas

atividades, segundo CALVENTE, P. (2008), é descrito como sendo da mesma época da ocupação

do “Chavão”, muito embora a Prefeitura Municipal de Cabo Frio informe que sua aprovação se

deu na década de 1950.

2 O conceito Hotspot foi criado em 1988 pelo ecólogo inglês Norman Myers para resolver um dos maiores dilemas dos conservacionistas: quais as áreas mais importantes para preservar a biodiversidade na Terra. Ao observar que a biodiversidade não está igualmente distribuída no planeta, Myers procurou identificar quais as regiões que concentravam os mais altos níveis de biodiversidade e onde as ações de conservação seriam mais urgentes. Ele chamou essas regiões de Hotspots. É toda área prioritária para conservação, isto é, de alta biodiversidade e ameaçada no mais alto grau. É considerada Hotspot uma área com pelo menos 1.500 espécies endêmicas de plantas e que tenha perdido mais de 3/4 de sua vegetação original.

18 Sua localização traz luz à discussão sobre o avanço do processo de crescimento na Vila de

Tamoios. Dadas as características geográficas disponíveis, ao leste está o mar, ao norte o Rio

São João, ao sul e a oeste (localização do loteamento Nova Califórnia) se encontraria a

possibilidade de continuidade da urbanização.

Ao considerar a problemática de invasão de áreas ambientais protegidas, retoma-se a discussão

iniciada no capítulo 3. A realidade verificada na questão do “Chavão” (figura 8) observamos que

evidencia uma dificuldade de abordagem pelo poder público.

Realocar o contingente populacional acionando ações demolitórias exigiria um planejamento para

assentamento dessas famílias, no entanto, esta prática constata-se como sendo pouco popular.

CALVENTE, P. (2008) observa que as ações municipais atuais são basicamente concentradas em

projetos de alguns equipamentos urbanos como praças e pavimentação de algumas ruas.

Levanta-se a viabilidade de redimensionarem-se os limites municipais, reorganizando as fronteiras

de acordo com as bacias hidrográficas para aperfeiçoar o sistema facilitando a gestão e

administração das problemáticas urbano-ambientais. Contudo, compreende-se como um trabalho

realmente demorado em função da complexidade que o envolve.

Acredita-se que planejar os espaços ocupados e remanescentes no Distrito de Tamoios contribui

para a organização do território de forma racional, com base em uma política de desenvolvimento

que identifique as características vocacionais naturais sejam elas econômicas, ecológicas ou

culturais. Favorece também a manutenção de áreas ambientalmente protegidas e neste caso,

especialmente, contribui para manutenção da biodiversidade.

Figura 8. Fonte: CALVENTE, P., 2008, p.113

19 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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