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Revista da Escola da Magistratura do TRF da 4ª Região n. 4 159 A responsabilidade tributária de grupos econômicos na execução fiscal Anderson Barg Juiz Federal, Especialista em Direito Processual Civil Resumo A responsabilidade tributária e a posição dos integrantes de grupo econômico, legímo e de fato, em sede de execução fiscal, tendo em vista a possibilidade de redirecionamento da execução com o objevo de angir bens e direitos dos devedores. Palavras-chave: Execução fiscal. Legimidade passiva. Responsabilidade tributária. Grupo econômico. Sumário: Introdução. 1 Legimidade passiva na execução fiscal. 2 Su- jeição passiva em matéria tributária. 3 Responsabilidade tributária e redire- cionamento da execução fiscal. 4 Responsabilidade dos integrantes de grupo econômico. Conclusão. Referências bibliográficas. Introdução A cobrança dos créditos, tributários e não tributários, da Fazenda Pública rege-se pelo procedimento previsto na Lei nº 6.830/80 (Lei de Execução Fiscal), que traz, em seu bojo, a possibilidade de redirecionamento da execução em face dos responsáveis pelo pagamento do crédito tributário, notadamente nas hipóteses de dissolução irregular da pessoa jurídica devedora principal do tributo. Diante dessa permissão, diversas situações surgem no curso das execuções fiscais que tramitam no Judiciário, algumas delas envolvendo a formação de grupos econômicos, especialmente quando estabelecidos com o propósito de dificultar ou até mesmo frustrar a realização do crédito tributário, mediante a ocultação de bens e direitos, e mesmo pessoas sicas que poderiam/deveriam responder pela dívida. O presente estudo, portanto, pretende avaliar as hipóteses e as respecvas consequências da caracterização da responsabilidade tributária de pessoas jurídicas e sicas componentes de grupos econômicos, legímos e de fato, na cobrança dos créditos tributários em sede de execução fiscal.

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Revista da Escola da Magistratura do TRF da 4ª Região n. 4 159

A responsabilidade tributária de grupos econômicos na execução fiscal

Anderson BargJuiz Federal, Especialista em Direito Processual Civil

Resumo

A responsabilidade tributária e a posição dos integrantes de grupo econômico, legítimo e de fato, em sede de execução fiscal, tendo em vista a possibilidade de redirecionamento da execução com o objetivo de atingir bens e direitos dos devedores.

Palavras-chave: Execução fiscal. Legitimidade passiva. Responsabilidade tributária. Grupo econômico.

Sumário: Introdução. 1 Legitimidade passiva na execução fiscal. 2 Su-jeição passiva em matéria tributária. 3 Responsabilidade tributária e redire-cionamento da execução fiscal. 4 Responsabilidade dos integrantes de grupo econômico. Conclusão. Referências bibliográficas.

Introdução

A cobrança dos créditos, tributários e não tributários, da Fazenda Pública rege-se pelo procedimento previsto na Lei nº 6.830/80 (Lei de Execução Fiscal), que traz, em seu bojo, a possibilidade de redirecionamento da execução em face dos responsáveis pelo pagamento do crédito tributário, notadamente nas hipóteses de dissolução irregular da pessoa jurídica devedora principal do tributo.

Diante dessa permissão, diversas situações surgem no curso das execuções fiscais que tramitam no Judiciário, algumas delas envolvendo a formação de grupos econômicos, especialmente quando estabelecidos com o propósito de dificultar ou até mesmo frustrar a realização do crédito tributário, mediante a ocultação de bens e direitos, e mesmo pessoas físicas que poderiam/deveriam responder pela dívida.

O presente estudo, portanto, pretende avaliar as hipóteses e as respectivas consequências da caracterização da responsabilidade tributária de pessoas jurídicas e físicas componentes de grupos econômicos, legítimos e de fato, na cobrança dos créditos tributários em sede de execução fiscal.

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1 Legitimidade passiva na execução fiscal

Nos termos do que preceitua o art. 3º do Código de Processo Civil, “para propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade”. Quando se trata da execução dos créditos tributários da Fazenda Pública, o art. 4º da Lei de Execução Fiscal (Lei nº 6.830/80) estabelece:

Art. 4º A execução fiscal poderá ser promovida contra:I – o devedor;II – o fiador;III – o espólio;IV – a massa;V – o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não,

de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito privado; eVI – os sucessores a qualquer título.§ 1º Ressalvado o disposto no art. 31, o síndico, o comissário, o

liquidante, o inventariante e o administrador, nos casos de falência, concordata, liquidação, inventário, insolvência ou concurso de credores, se, antes de garantidos os créditos da Fazenda Pública, alienarem ou derem em garantia quaisquer dos bens administrados, respondem, solidariamente, pelo valor desses bens.

§ 2º À Dívida Ativa da Fazenda Pública, de qualquer natureza, aplicam-se as normas relativas à responsabilidade prevista na legislação tributária, civil e comercial.

§ 3º Os responsáveis, inclusive as pessoas indicadas no § 1º deste artigo, poderão nomear bens livres e desembaraçados do devedor, tantos quantos bastem para pagar a dívida. Os bens dos responsáveis ficarão, porém, sujeitos à execução, se os do devedor forem insuficientes à satisfação da dívida.

§ 4º Aplica-se à Dívida Ativa da Fazenda Pública de natureza não tributária o disposto nos artigos 186 e 188 a 192 do Código Tributário Nacional.

Da determinação legal extrai-se que não apenas o devedor principal e seus garantidores, mas também todos aqueles que a lei tributária define como responsáveis pelo pagamento do crédito tributário podem figurar no polo passivo de ação de execução dos créditos da Fazenda Pública.

É necessário, portanto, delimitar, à luz do Código Tributário Nacional, quem são as pessoas habilitadas a estarem em juízo no polo passivo da execução dos créditos da Fazenda Pública, notadamente – e para os fins do presente estudo – em relação aos créditos tributários da Fazenda Pública, no que diz respeito à responsabilidade de terceiros.

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2 Sujeição passiva em matéria tributária

Antes de qualquer discussão a respeito do tema, é imperioso revisitar as noções básicas da obrigação tributária, como seus elementos constituintes.

Na definição do Código Tributário Nacional, “tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada” (art. 3º).

Machado (2013, p. 56-62), analisando o conceito legal de tributo, extrai seus diversos elementos:

(a) Toda prestação pecuniária. Cuida-se de prestação tendente a assegurar ao Estado os meios financeiros de que necessita para a consecução de seus objetivos, por isso que é de natureza pecuniária. (...)

(b) Compulsória. Pode parecer desnecessário qualificar-se a prestação tributária como compulsória. Não é assim, todavia. Embora todas as prestações jurídicas sejam, em princípio, obrigatórias, a compulsoriedade da prestação tributária caracteriza-se pela ausência do elemento vontade no suporte fático da incidência da norma de tributação. O dever de pagar tributos nasce independentemente da vontade.

Não se diga, pois, que a prestação tributária é compulsória porque o pagamento do tributo é obrigatório. A distinção essencial há de ser vista no momento do nascimento da obrigação, e não no momento de seu adimplemento. Por isso é que se explica a clássica divisão das obrigações jurídicas em legais, ou ex lege, e contratuais, ou decorrentes da vontade.

(...)(c) Em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir. A prestação

tributária é pecuniária, isto é, seu conteúdo é expresso em moeda. O Direito brasileiro não admite a instituição de tributo em natureza, vale dizer, expresso em unidade de bens diversos do dinheiro, ou em unidade de serviços. Em outras palavras, nosso Direito desconhece os tributos in natura e in labore.

(d) Que não constitua sanção de ato ilícito. O tributo distingue-se da penalidade exatamente porque esta tem como hipótese de incidência um ato ilícito, enquanto na hipótese de incidência do tributo é sempre algo lícito.

(...)Quando se diz que o tributo não constitui sanção de ato ilícito,

isso quer dizer que a lei não pode incluir na hipótese de incidência tributária o elemento ilicitude. Não pode estabelecer como necessária

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e suficiente à ocorrência da obrigação de pagar um tributo uma situação que não seja lícita. Se o faz, não está instituindo um tributo, mas uma penalidade. Todavia, um fato gerador de tributo pode ocorrer em circunstâncias ilícitas, mas essas circunstâncias são estranhas à hipótese de incidência do tributo, e por isso mesmo irrelevantes do ponto de vista tributário.

(...)(e) Instituída em lei. Só a lei pode instituir o tributo. Isso decorre

do princípio da legalidade, prevalente no Estado de Direito. Nenhum tributo será exigido sem que a lei o estabeleça, conforme assegura o art. 150, I, da CF.

(...)Instituir um tributo não é apenas dizer que ele fica criado, ou

instituído. Sua criação depende da definição da hipótese ou hipóteses em que ele será devido, vale dizer, da definição da hipótese de incidência, dos sujeitos da obrigação correspondente, e ainda da indicação precisa dos elementos necessários ao conhecimento do valor a ser pago, vale dizer, da base de cálculo e da alíquota, bem como do prazo respectivo.

(...)(f) Cobrada mediante atividade administrativa plenamente

vinculada. (...)Atividade vinculada é aquela em cujo desempenho a autoridade

administrativa não goza de liberdade para apreciar a conveniência nem a oportunidade de agir. A lei não estabelece apenas um fim a ser alcançado, a forma a ser observada e a competência da autoridade para agir. Estabelece, além disso, o momento, vale dizer, o quando agir, e o conteúdo mesmo da atividade. Não deixa margem à apreciação da autoridade, que fica inteiramente vinculada ao comando legal.

Dizendo o Código Tributário Nacional que o tributo há de ser cobrado mediante atividade administrativa plenamente vinculada, quer significar que a autoridade administrativa não pode preencher com seu juízo pessoal, subjetivo, o campo de indeterminação normativa, buscando realizar em cada caso a finalidade da lei. Esta deve ser minudente, prefigurando com rigor e objetividade os pressupostos para a prática dos atos e o conteúdo que estes devem ter.

Ainda, a instituição do tributo não apenas deve ser estabelecida por lei, mas esta deve descrever todos os elementos necessários à delimitação dos aspectos constituintes da obrigação tributária. Novamente, na lição de Hugo de Brito Machado (2013): “importante é saber que, segundo o princípio da legalidade, todos os elementos necessários a que se saiba quem deve, a quem deve, quanto deve e quando deve pagar residem na lei, em sentido

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estrito”. São os critérios ou aspectos pessoal, material, espacial, quantitativo e temporal da hipótese de incidência tributária.

Quanto ao critério ou aspecto material, Machado (2013) leciona tratar-se da situação de fato geralmente indicada na lei pela referência a seu aspecto nuclear ou material. É a situação de fato descrita na lei e cuja caracterização faz nascer o vínculo jurídico, albergando o dever de pagar o tributo.

O critério ou aspecto espacial corresponde, nas palavras de Paulsen (2010), ao território no qual, ocorrida a situação descrita no aspecto material, surge a obrigação tributária.

O critério ou aspecto temporal está assim indicado nos ensinamentos de Carvalho (2005, p. 904-905):

Compreendemos o critério temporal da hipótese tributária como o grupo de indicações, contidas no suposto da regra, que nos oferecem elementos para saber, com exatidão, em que preciso instante acontece o fato descrito, passando a existir o liame jurídico que amarra devedor e credor, em função de um objeto – o pagamento de certa prestação pecuniária.

Critério ou aspecto quantitativo da hipótese de incidência diz respeito ao montante da obrigação tributária, sendo que a lei pode, simplesmente, estabelecer um valor fixo, determinar a aplicação de uma alíquota sobre determinada base de cálculo ou utilizar-se do enquadramento em tabelas (PAULSEN, 2010).

Aspecto ou critério pessoal diz respeito à definição dos sujeitos ativo e passivo da relação tributária, estando disciplinado, respectivamente, nos artigos 119 e 121 e seguintes do CTN.

No que se refere à sujeição passiva, o Código Tributário Nacional estabelece, em seu artigo 121, que o sujeito passivo da obrigação tributária principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade tributária, sendo adotada a noção de responsabilidade tributária em sentido amplo, podendo ser classificado como:

– contribuinte: quando possui relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador; trata-se da figura do sujeito passivo direto;

– responsável: quando, não classificado como contribuinte, tem sua obrigação determinada expressamente pela lei; é o sujeito passivo indireto.

Carvalho (2005, p. 305) conceitua os sujeitos passivos da relação tributária:

Sujeito passivo da relação jurídica tributária é a pessoa – sujeito

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de direitos – física ou jurídica, privada ou pública, de quem se exige o cumprimento da prestação: pecuniária, nos nexos obrigacionais; e insuscetível de avaliação patrimonial, nas relações que veiculam meros deveres instrumentais ou formais.

É no critério pessoal do consequente da regra-matriz de incidência que colhemos elementos informadores para determinação do sujeito passivo.

Machado (2013) também destaca que o sujeito passivo da obrigação tributária pode ser direto e indireto:

O sujeito passivo direto (ou contribuinte) é aquele que tem relação de fato com o fato tributável, que é na verdade uma manifestação de sua capacidade contributiva. (...)

Por conveniência da administração tributária, a lei pode atribuir o dever de pagar o tributo a outra pessoa, que não tenha relação de fato com o fato tributável, eliminando, ou não, esse dever do contribuinte. Surge, nesse caso, o sujeito passivo indireto. O sujeito passivo indireto é aquele que, sem ter relação direta de fato com o fato tributável, está, por força de lei, obrigado ao pagamento do tributo.

Essa vinculação do sujeito passivo indireto pode dar-se por transferência e por substituição. Diz-se que há transferência quando existe legalmente o sujeito passivo direto (contribuinte) e mesmo assim o legislador, sem ignorá-lo, atribui também a outrem o dever de pagar o tributo, tendo em vista eventos posteriores ao surgimento da obrigação tributária. Diz-se que há substituição quando o legislador, ao definir a hipótese de incidência tributária, coloca desde logo como sujeito passivo da relação tributária que surgirá de sua ocorrência alguém que está a ela diretamente relacionado, embora o fato seja indicador de capacidade contributiva de outros, aos quais, em princípio, poderia ser atribuído o dever de pagar, e que, por suportarem, em princípio, o ônus financeiro do tributo, são geralmente denominados contribuintes de fato.

São, portanto, as hipóteses de responsabilidade solidária e substituição, tratadas pelo CTN nos arts. 124 e 128, respectivamente:

Art. 124. São solidariamente obrigados:I – as pessoas que tenham interesse comum na situação que

constitua o fato gerador da obrigação principal;II – as pessoas expressamente designadas por lei.

Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste Capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo

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a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação.

É esclarecedora, no ponto, a lição de Cassone (2006):

Pela simples leitura, percebe-se que a lei pode excluir o contribuinte do pagamento do tributo, para atribuir essa responsabilidade a uma terceira pessoa, desde que vinculada ao fato gerador. “Terceira” (art. 121, II), porque primeira pessoa é o Fisco (art. 119) e segunda pessoa é o contribuinte (art. 121, I). Pode reunir a qualidade de terceira pessoa de conformidade com o que dispuser a lei de imposição tributária: o pagador, o doador, o adquirente, o transportador, o armazenador, o depositário, o consignatário etc.

Assim, a teor do art. 128 do CTN, responsabilidade tributária por substituição ocorre quando, em virtude de disposição expressa em lei, a obrigação tributária surge desde logo contra uma pessoa diferente daquela que esteja em relação econômica com o ato, fato ou situação tributados. Nessa hipótese, é a própria lei que substitui o sujeito passivo direto pelo sujeito passivo indireto.

Não obstante, Paulsen (2010, p. 923) apresenta classificação mais detalhada dos sujeitos passivos da obrigação tributária:

1. Contribuinte: aquele que realiza o fato gerador e que, portanto, é indicado pelo legislador para contribuir em face da sua capacidade contributiva.

2. Terceiros:2.1. Substituto: o terceiro que, em face de pressuposto de

fato específico, é obrigado a apurar o tributo devido e a efetuar seu pagamento em caráter definitivo, em lugar do contribuinte, normalmente mediante retenção e recolhimento, restando o contribuinte dispensado de efetuar a apuração e o pagamento do tributo, sendo que, em lugar disso, o contribuinte simplesmente suporta a retenção (exemplo de substituto: a instituição financeira relativamente ao imposto de renda devido sobre aplicações financeiras).

2.2. Retentor de pagamento por conta: o terceiro que, em face de pressuposto de fato específico, é obrigado a efetuar a retenção de valores do contribuinte e seu recolhimento antecipado por conta de tributo que será posteriormente apurado pelo contribuinte, o qual, deduzindo as retenções, verificará a existência de saldo a pagar ou de valores a repetir, efetuando o acerto de contas (exemplo de retentor: o empregador relativamente aos pagamentos feitos aos seus empregados).

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2.3. Responsável: o terceiro que, em face de pressuposto de fato específico, responde com seu próprio patrimônio no caso de inadimplemento do contribuinte, substituto ou retentor (exemplo de responsável: o sócio-gerente que deixa de zelar pelo recolhimento de valores retidos e que, por isso, responde pessoalmente no instante da inadimplência).

No que concerne à legitimidade passiva para a execução fiscal, na forma prescrita no art. 4º da LEF, o sujeito passivo da obrigação tributária encontra-se, portanto, revestido da condição de devedor.

3 Responsabilidade tributária e redirecionamento da execução fiscal

Diversamente, há outras situações que também implicam a sujeição passiva em sede de execução fiscal, que são as hipóteses contidas nos incisos II a VI do art. 4º da LEF. De todas elas, indubitavelmente, de maior relevo é a figura do responsável tributário (inciso V).

Nesse ponto, Paulsen (2010) esclarece:

Embora o chamamento a contribuir para as despesas públicas se dê em face do contribuinte, que realiza a hipótese de incidência e tem nela revelada sua capacidade contributiva, a necessidade de assegurar e facilitar a tributação faz com que o legislador tenha que impor obrigações formais e materiais a terceiros, de modo que estes participem dos atos de arrecadação ou que simplesmente respondam pela satisfação do crédito tributário. Em nota ao art. 121 do CTN, expusemos a classificação dos sujeitos passivos.

(...)Quanto aos pressupostos ou hipóteses de incidência de

responsabilidade tributária, os dispositivos do CTN estabelecem responsabilidade tendo em conta:

– interesse comum: a) do interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal (art. 124, I); não se trata, aqui, de pluralidade de contribuintes, mas da responsabilização de um terceiro, como no caso da responsabilidade do comprador no momento da aquisição de mercadoria mediante “meia nota”, evidenciado seu interesse comum ao do vendedor (contribuinte do ICMS) no subfaturamento com vista à evasão tributária, ou no caso de cometimento de ilícito pelo sócio, em que a responsabilidade seria sua pessoal, mas em que a operação foi feita em benefício da sociedade, atraindo a responsabilidade solidária desta;

– sucessão: b) da sucessão, seja na aquisição de imóvel, na aquisição ou na remição de bens em geral, no falecimento, na fusão, na transformação, na incorporação ou na cisão de empresas, seja na

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aquisição de estabelecimento comercial ou de fundo de comércio (arts. 130, 131, 132 e 133); nesse caso, cuida-se de responsabilidade pelo pagamento que deveria ter sido feito no passado pelo contribuinte e não foi, restando a dívida em aberto por ocasião da sucessão, ainda que a formalização do crédito (normalmente pela lavratura de auto de infração) venha a ocorrer posteriormente (art. 129);

– inexistência da prova de recolhimento de tributos pelos tabeliães e escrivães: c) do descumprimento, pelos tabeliães e escrivães, do dever de zelar pelo recolhimento dos tributos quanto aos atos em que atuem (art. 134);

– representação: d) dos atos de representação ou omissões na representação, pelos pais, tutores e curadores, administradores de bens, inventariantes, síndico e comissão e pelos sócios de sociedades de pessoas, a que o CTN se refere como “terceiros” (art. 134);

– extrapolação dos poderes de representação: e) da prática de atos com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos pelos representantes já arrolados no art. 134, pelos mandatários, prepostos e empregados, ou pelos diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado (art. 135);

– posição de fonte pagadora: f) da posição de fonte pagadora de renda ou proventos do responsável pela retenção e pelo recolhimento do imposto respectivo (art. 45, parágrafo único);

– expedição indevida de certidões negativas: g) do dolo ou da fraude na expedição de certidão negativa de débitos pelo servidor responsável (art. 208 do CTN).

No que se refere às obrigações tributárias resultantes de atos praticados com infração de lei, contrato social ou estatutos, o art. 135 do CTN atribui a responsabilidade:

I – às pessoas referidas no artigo 134;II – aos mandatários, prepostos e empregados;III – aos diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de

direito privado.Nessas situações, o dispositivo literalmente exclui a responsabilidade

da pessoa jurídica, que é desconsiderada, para atribuir a responsabilidade à pessoa física que cometeu o ato em infração à lei, ao contrato social ou aos estatutos. Isso porque, no entendimento de Cassone (2006),

se aquelas pessoas praticaram atos com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos, não será correto penalizar a sociedade e, em consequência, os demais sócios (em Limitada) ou acionistas (em Sociedade Anônima) por ato doloso e ilegal cometido por outrem – devendo, por isso, responder pessoalmente pelos

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excessos não autorizados.

Diversamente, Machado (2013, p. 166) entende que a responsabilidade das pessoas indicadas no art. 135 do CTN não exclui a responsabilidade do contribuinte:

(...) A lei diz que são pessoalmente responsáveis, mas não diz que sejam os únicos. A exclusão da responsabilidade, a nosso ver, teria de ser expressa.

Com efeito, a responsabilidade do contribuinte decorre de sua condição de sujeito passivo direto da relação obrigacional tributária. Independe de disposição legal que expressamente a estabeleça. Assim, tratando-se de responsabilidade inerente à própria condição de contribuinte, não é razoável admitir-se que desapareça sem que a lei o diga expressamente.

Ademais, o citado autor assim leciona acerca do alcance da norma que atribui a responsabilidade a terceiros:

Questão de grande relevância em matéria de responsabilidade tributária consiste em determinar o alcance do art. 135, III, do CTN e, assim, saber em que circunstâncias os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado respondem pelos créditos tributários dos quais sejam estas contribuintes. É claro que, tratando-se de sociedades nas quais a lei específica não limita a responsabilidade dos sócios, não há qualquer dificuldade. Entretanto, nas sociedades por quotas de responsabilidade limitada e nas sociedades anônimas, a questão é tormentosa.

(...)Destaque-se desde logo que a simples condição de sócio não

implica responsabilidade tributária. O que gera a responsabilidade, nos termos do art. 135, III, do CTN, é a condição de administrador de bens alheios. Por isso a lei fala em diretores, gerentes ou representantes. Não em sócios. Assim, se o sócio não é diretor, nem gerente, isto é, se não pratica atos de administração da sociedade, responsabilidade não tem pelos débitos tributários desta.

Também não basta ser diretor, ou gerente, ou representante. É preciso que o crédito tributário em questão resulte de ato praticado com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos. Estabelecer quando se caracteriza o excesso de poderes, ou a infração da lei, do contrato ou do estatuto, é questão ainda a carecer de esclarecimentos.

(...)É importante notar que a responsabilidade dos sócios-gerentes,

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dos diretores e dos administradores de sociedades, nos termos do art. 135, III, do CTN, é por obrigações resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos. Poder-se-ia, assim, sustentar que a obrigação pela qual respondem há de ser resultante de atos irregularmente praticados. O próprio nascimento da obrigação tributária já teria de ser em decorrência de atos irregulares, mas tal posição levaria a excluir-se a responsabilidade em exame toda vez que os atos irregulares, violadores da lei ou do estatuto, fossem posteriores à ocorrência do fato gerador do tributo. Operar-se-ia, assim, injustificável redução no alcance da regra jurídica em estudo. (p. 163-165)

É certo, ademais, conforme a lição de Theodoro Júnior (2004), que

as hipóteses de responsabilidade tributária definidas pelo art. 135 do Código Tributário Nacional, pelas próprias palavras da lei, não se fundam no mero inadimplemento da sociedade contribuinte, mas na conduta dolosa especificamente apontada pelo próprio legislador, que vem a ser a ocorrência de um fato gerador de tributo praticado com excesso de poder, infração da lei ou violação do contrato social, por parte do gestor da pessoa jurídica.

Melo Filho (2013) também aponta esse entendimento:

Observe-se que o enunciado normativo permite ao intérprete, em uma primeira análise gramatical, entender que a responsabilidade das pessoas elencadas no art. 135 somente abrangeria os créditos tributários cujas respectivas obrigações fossem resultado direto dos atos praticados com excesso de poderes ou infração a lei, contrato social ou estatutos. Em outras palavras, a norma somente autorizaria a responsabilidade do infrator em relação aos fatos geradores originados diretamente do ato ilícito praticado. Como consequência, na prática, não existiria responsabilidade dos sócios nos casos de dissolução irregular da sociedade, pois, da dissolução irregular (ato ilícito), não resultará, regra geral, nenhuma obrigação tributária específica (salvo eventual descumprimento de obrigação tributária acessória), e, depois de dissolvida, obviamente a sociedade deixará de praticar fatos geradores.

(...)Observe-se que, acatada a tese, depois da ocorrência do fato

gerador, o sócio com poderes de gerência poderia praticar quaisquer atos ilícitos, como distribuições de lucros ilícitos ou fictícios (inclusive, até a insolvência fraudulenta da sociedade), confusão patrimonial, utilização fraudulenta da personalidade jurídica, etc., sem que a ele fosse imputada qualquer espécie de responsabilidade tributária.

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Trata-se, portanto, de tese que conduz a uma conclusão absurda: a possibilidade de os sócios praticarem atos fraudulentos ou ilícitos sem qualquer consequência ou sanção tributária, desde que os tenham praticado depois dos fatos geradores dos tributos, estabelecendo-se um amplo salvo conduto para fraudes e atos irregulares dos administradores, que não poderiam ser, nada obstante suas condutas ilícitas, responsabilizados pelas dívidas tributárias.

E, mais adiante, conclui, amparado no julgamento do RE nº 562.276/PR, pelo STF:

Conforme restou esclarecido no precedente, o pressuposto de fato ou hipótese de incidência da norma de responsabilidade do artigo 135, III, do CTN é a prática de atos, por quem esteja na gestão ou na representação da sociedade, com excesso de poder ou infração a lei, contrato social ou estatutos, que tenham implicado o surgimento ou o inadimplemento de obrigações tributárias. É exatamente a tese dominante, que imputa responsabilidade a terceiro, o sócio, pelos atos ilícitos dos quais decorra o surgimento da obrigação tributária ou o inadimplemento do crédito dela resultante.

De outro lado, não é requisito da responsabilidade e do redirecionamento da execução fiscal a indicação do nome do codevedor na Certidão de Dívida Ativa.

Todavia, é consenso que a responsabilidade, nas hipóteses do art. 135, III, do CTN, só pode ser atribuída ao sócio-gerente, ao diretor ou ao administrador que tenha praticado o ato que dá azo à responsabilização, afastando a responsabilidade dos demais que dele não participaram.

Igualmente, entende-se que a dissolução irregular da sociedade caracteriza ato de infração à lei, capaz de legitimar a responsabilização dos sócios-administradores pelos créditos tributários, como já assentou Melo Filho (2013):

A dissolução irregular da sociedade envolve a prática de uma série de atos irregulares e ilegais, pois os sócios não podem simplesmente abandonar a empresa, devendo seguir um conjunto de normas legais impositivas disciplinadoras da extinção da personalidade jurídica. É o descumprimento dessas normas legais a justificativa para aplicação do art. 135 do CTN.

A extinção da personalidade jurídica deve seguir um trâmite legal rígido e formal, que tem como um dos seus objetivos principais resguardar interesses de terceiros, credores da pessoa jurídica. Os artigos 1.033 a 1.035 do CC regulam as hipóteses de dissolução das sociedades civis e empresariais. Havendo causa de dissolução da

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sociedade, compete aos administradores iniciar o procedimento legal de liquidação, com a nomeação de um liquidante, conforme artigo 1.036 do CC.

Paulsen (2005) também segue esse entendimento:

Ainda é predominante o entendimento no sentido de que a dis-solução irregular estabelece a presunção de que o patrimônio da so-ciedade tenha sido dissipado em prejuízo dos credores, dentre eles o credor preferencial (o próprio Fisco), e que, em razão disso, enseja o redirecionamento da execução, cabendo aos sócios-gerentes/dire-tores/administradores, em embargos, a demonstração de que não agiram com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.

Tal posição foi, inclusive, sufragada pelo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, expresso na Súmula 435: “Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente”.

4 Responsabilidade dos integrantes de grupo econômico

É de se destacar, portanto, que em todas as hipóteses de responsabilização previstas no art. 135, III, do CTN há um ponto comum, representado pelo abuso do direito, na utilização da pessoa jurídica como meio de frustrar o adimplemento das obrigações tributárias. Como afirmou Theodoro Júnior (2004), “a presunção que se extrai do comum da vida e da sistemática seguida pelo CTN é a de que o abuso de gestão deve sempre ser imputado aos sócios que se acham investidos na administração da sociedade, e não a todos indistintamente”.

Dados esses conceitos, questiona-se qual o enquadramento da responsabilidade tributária quando se caracteriza a formação de grupo econômico.

No tocante à caracterização de grupo econômico, questão dificultosa e, por vezes, trabalhosa, diz respeito à comprovação da presença de grupo econômico, interligado pelo quadro societário e pela atividade empresarial. O art. 2º, § 2º, da CLT caracteriza o grupo econômico pela união de uma ou mais empresas, com distintas personalidades jurídicas, sob direção ou administração de uma delas:

Art. 2º Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

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(...)§ 2º Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma

delas, personalidade jurídica própria, estiver sob a direção, o controle ou a administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.

O grupo econômico, assim, é formado quando duas ou mais pessoas jurídicas estão sob o controle, a direção ou a administração de uma delas. As pessoas que formam o grupo, apesar de juridicamente independentes, possuem uma mesma unidade de direção, o que implica interesses comuns. Há, desse modo, vinculação entre as empresas.

Na lição de Coelho (1997, p. 203), “a associação de esforços empresariais entre sociedades, para realização de atividades comuns, pode resultar em três diferentes situações: os grupos de fato, os de direito e os consórcios”.

Segundo Requião (1995, p. 217):

São grupos de fato as sociedades que mantêm, entre si, laços empresariais por meio de participação acionária, sem necessidade de se organizarem juridicamente. Relacionam-se segundo o regime legal de sociedades isoladas, sob a forma de coligadas, controladoras e controladas, no sentido de não terem necessidade de maior estrutura organizacional.

Assim, o grupo econômico poderá formar-se sob uma situação de fato ou de direito, atraindo a responsabilidade pelas dívidas tributárias de suas coligadas.

Com efeito, o art. 124 do CTN assim dispõe:

Art. 124. São solidariamente obrigadas:(...)II – as pessoas expressamente designadas por lei.

Já a Lei nº 8.212/91 estabelece:

Art. 30. A arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social obedecem às seguintes normas, observado o disposto em regulamento:

(...)IX – as empresas que integram grupo econômico de qualquer

natureza respondem entre si, solidariamente, pelas obrigações decorrentes desta lei.

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Com relação ao tema, é importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça, em recentes julgados, vem abrandando os limites da responsabilidade tributária em se tratando de pessoas jurídicas componentes de grupos econômicos, assentando a necessidade de demonstração de interesses negociais comuns – não bastando, portanto, a mera coligação. Nesse sentido:

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ISS. EXECUÇÃO FISCAL. LEGITIMIDADE PASSIVA. EMPRESAS DO MESMO GRUPO ECONÔMICO. SOLIDARIEDADE. INEXISTÊNCIA. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA.

1. A solidariedade passiva ocorre quando, em uma relação jurídico-tributária composta de duas ou mais pessoas caracterizadas como contribuintes, cada uma delas está obrigada pelo pagamento integral da dívida. Ad exemplum, no caso de duas ou mais pessoas serem proprietárias de um mesmo imóvel urbano, haveria uma pluralidade de contribuintes solidários quanto ao adimplemento do IPTU, uma vez que a situação de fato – a copropriedade – é-lhes comum.

2. A Lei Complementar 116/03, definindo o sujeito passivo da regra-matriz de incidência tributária do ISS, assim dispõe: “Art. 5º Contribuinte é o prestador do serviço”.

6. Deveras, o instituto da solidariedade vem previsto no art. 124 do CTN, verbis: “Art. 124. São solidariamente obrigadas: I – as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal; II – as pessoas expressamente designadas por lei”.

7. Conquanto a expressão “interesse comum” encarte um conceito indeterminado, é mister proceder-se a uma interpretação sistemática das normas tributárias, de modo a alcançar a ratio essendi do referido dispositivo legal. Nesse diapasão, tem-se que o interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal implica que as pessoas solidariamente obrigadas sejam sujeitos da relação jurídica que deu azo à ocorrência do fato imponível. Isso porque feriria a lógica jurídico-tributária a integração, no polo passivo da relação jurídica, de alguém que não tenha tido qualquer participação na ocorrência do fato gerador da obrigação.

8. Segundo doutrina abalizada, in verbis: “(...) o interesse comum dos participantes no acontecimento factual não representa um dado satisfatório para a definição do vínculo da solidariedade. Em nenhuma dessas circunstâncias cogitou o legislador desse elo que aproxima os participantes do fato, o que ratifica a precariedade do método preconizado pelo inc. I do art. 124 do Código. Vale, sim, para situações em que não haja bilateralidade no seio do fato tributado, como, por exemplo, na incidência do IPTU, em que duas ou mais pessoas são proprietárias do mesmo imóvel. Tratando-se, porém, de ocorrências

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em que o fato se consubstancie pela presença de pessoas em posições contrapostas, com objetivos antagônicos, a solidariedade vai instalar-se entre sujeitos que estiveram no mesmo polo da relação, se e somente se for esse o lado escolhido pela lei para receber o impacto jurídico da exação. É o que se dá no imposto de transmissão de imóveis, quando dois ou mais são os compradores; no ICMS, sempre que dois ou mais forem os comerciantes vendedores; no ISS, toda vez que dois ou mais sujeitos prestarem um único serviço ao mesmo tomador” (CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 8. ed. Saraiva, 1996. p. 220).

9. Dessarte, a situação que evidencia a solidariedade, quanto ao ISS, é a existência de duas ou mais pessoas na condição de prestadoras de apenas um único serviço para o mesmo tomador, integrando, desse modo, o polo passivo da relação. Forçoso é concluir, portanto, que o interesse qualificado pela lei não há de ser o interesse econômico no resultado ou no proveito da situação que constitui o fato gerador da obrigação principal, mas o interesse jurídico, vinculado à atuação comum ou conjunta na situação que constitui o fato imponível.

10. “Para se caracterizar responsabilidade solidária em matéria tributária entre duas empresas pertencentes ao mesmo conglomerado financeiro, é imprescindível que ambas realizem conjuntamente a situação configuradora do fato gerador, sendo irrelevante a mera participação no resultado dos eventuais lucros auferidos pela outra empresa coligada ou do mesmo grupo econômico” (REsp 834044/RS, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 11.11.2008, DJe 15.12.2008).

11. In casu, verifica-se que o Banco Safra S/A não integra o polo passivo da execução, tão somente pela presunção de solidariedade decorrente do fato de pertencer ao mesmo grupo econômico da empresa Safra Leasing S/A Arrendamento Mercantil. Há que se considerar, necessariamente, que são pessoas jurídicas distintas e que referido banco não ostenta a condição de contribuinte, uma vez que a prestação de serviço decorrente de operações de leasing deu-se entre o tomador e a empresa arrendadora.

12. O art. 535 do CPC resta incólume se o tribunal de origem, embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.

13. Recurso especial parcialmente provido, para excluir do polo passivo da execução o Banco Safra S/A. (REsp 884.845/SC, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 05.02.2009, DJe 18.02.2009)

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Em outra oportunidade, o STJ confirmou o mesmo entendimento, como ilustra o acórdão proferido no Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.422.631/PE:

TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. FORMAÇÃO DE GRUPO ECONÔMICO. INDISPONIBILIDADE DE BENS. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.

1. Nos termos da jurisprudência pacífica do STJ, existe responsabilidade tributária solidária entre empresas de um mesmo grupo econômico apenas quando ambas realizem conjuntamente a situação configuradora do fato gerador, não bastando o mero interesse econômico na consecução de referida situação.

2. Hipótese em que o tribunal de origem, com base no conjunto probatório, reconheceu a prática de atividades comuns entre as empresas integrantes do grupo econômico, de forma a reconhecer a responsabilidade tributária solidária e, consequentemente, justificar a legitimidade passiva. Logo, a modificação do julgado requer o reexame de fatos e provas, o que é vedado ao STJ, por esbarrar no óbice da Súmula 7/STJ. Precedentes. Agravo regimental improvido. (Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 10.03.2015, DJe 13.03.2015)

Contudo, como já mencionado linhas acima, o direito não acolhe as hipóteses de abuso de direito. Relativamente à responsabilidade tributária, não se admite que, mediante atos de nítida ocultação de bens e direitos, se utilize abusivamente da personalidade jurídica para frustrar o pagamento de créditos tributários. É o que ocorre quando há a caracterização de grupos econômicos de fato que são utilizados como mecanismo para a frustração do cumprimento das obrigações tributárias, sendo instrumento de evasão patrimonial e ocultação de bens, com o propósito de afastar sujeitos da responsabilidade que, normalmente, estariam obrigados a assumir em relação à obrigação tributária.

Nessas situações, em que há nítido abuso da utilização da personalidade jurídica, a necessidade de demonstração de interesse comum no negócio jurídico que origina o crédito tributário acaba por impedir que se alcancem bens e direitos que, não fossem os negócios jurídicos simulados, estariam abrangidos pela responsabilidade patrimonial do sujeito passivo da obrigação tributária – devedor principal do crédito fiscal. A adoção de tal entendimento acabaria – contrariando toda a lógica do sistema legal tributário – validando a utilização espúria e abusiva da personalidade jurídica, em detrimento dos legítimos interesses do credor.

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Para tais hipóteses, o ordenamento jurídico também aponta a solução aplicável. Trata-se do instituto da desconsideração da personalidade jurídica.

Com efeito, no que se refere à desconsideração da personalidade jurídica, a situação mais comum é aquela em que a pessoa física opera uma pessoa jurídica, mas coloca como patrimônio pessoal os valores ilicitamente desviados da pessoa jurídica. Nesse caso, desconsidera-se a existência da pessoa jurídica para se alcançarem os bens da pessoa física que a controla. Trata-se da responsabilização pessoal dos sócios ou administradores pelos abusos cometidos pela pessoa jurídica. Desconsidera-se a individualidade jurídica e patrimonial da empresa para que os bens particulares dos sócios ou administradores respondam pelos débitos contraídos em nome da pessoa jurídica.

Uma outra situação envolve a criação de uma pessoa jurídica apenas para receber bens da pessoa física que, por vários motivos, não pode possuir bens em seu próprio nome. Nesse contexto, desconsidera-se a existência da pessoa jurídica, como entidade autônoma, para se alcançarem os bens que a pessoa física controladora indevidamente transferiu ao patrimônio da pessoa jurídica. Desconsidera-se a individualidade jurídica e patrimonial da empresa para que seu patrimônio responda pelas dívidas de seu controlador.

A doutrina da desconsideração da personalidade jurídica tem origem na jurisprudência inglesa (Salomon x Salomon & Co., House of Lords, 1897) e norte-americana, sendo conhecida por disregard doctrine ou disregard of legal entity. Foi posteriormente desenvolvida pelos juristas alemães, ficando conhecida como Durchgriff, que basicamente significa “penetração na pessoa jurídica”.

Levantar o véu da pessoa jurídica, penetrar na pessoa jurídica ou desconsiderá-la traduz uma reação do ordenamento jurídico e da jurisprudência contra a utilização abusiva da personalidade jurídica para atingir fins ilícitos em benefício de pessoas físicas.

A jurisprudência brasileira há muito vem desconsiderando a personalidade jurídica para capturar bens de pessoas físicas acobertados pelo manto da ficção jurídica.

Em acórdão célebre do Tribunal de Justiça de São Paulo, o Desembargador Edgar de Moura Bittencourt assinalou que a “assertiva de que a sociedade não se confunde com a pessoa dos sócios é um princípio jurídico, mas não pode ser um tabu a entravar a própria ação do Estado, na realização de perfeita e boa justiça, que outra não é a atitude do juiz procurando esclarecer os fatos para ajustá-los ao direito” (RT 238/393). No mesmo sentido, outro acórdão considerado referência na matéria foi da

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lavra do então Desembargador Athos Gusmão Carneiro, sobre caso em que havia uma “sociedade realmente fictícia, em que o sócio-gerente era dono de 99,2% do capital, sendo os restantes 0,8% de sua mãe e de um concunhado”, ficando evidenciado que a pessoa jurídica “merece ser desconsiderada quando a sociedade é apenas um alter ego de seu controlador” (TJ/RS, Ap. 583018577, 1ª C., julgada em 08.05.1984, rel. Des. Athos Gusmão Carneiro, RT 592/172).

O Supremo Tribunal Federal, igualmente, não admitiu o abuso de personalidade jurídica para fraudar direitos de terceiros:

Personalidade jurídica. Possível desconsiderar-se a personalidade da pessoa jurídica sob controle absoluto da pessoa física, se ambas em conluio para fraude a direito de terceiros. – Aplicação da teoria inglesa e norte-americana da disregard of legal entity, surgida no direito mercantil, mas aplicável igualmente no civil como no tributário. (STF – RE 94.066-9 – RJ, relator Ministro Clóvis Ramalhete, DJU de 2 de abril de 1985, p. 2885)

Diversos comandos normativos autorizam essa desconsideração no Direito brasileiro, entre os quais o art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei nº 5.452/43 (Consolidação das Leis do Trabalho); o art. 28 da Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor); o art. 18 da Lei nº 8.884/94 (Lei de Defesa da Concorrência); implicitamente, o art. 160 da Lei nº 3.071/1916 (antigo Código Civil brasileiro); e o art. 50 da Lei nº 10.406/2002 (Código Civil brasileiro).

Artigo 50 da Lei nº 10.406/2002:

Art. 50. Em caso de abuso de personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

Artigo 18 da Lei nº 8.884/94:

Art. 18. A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver, da parte deste, abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação de estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.

A desconsideração da personalidade jurídica pode ser aplicada,

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inclusive, para atingir empresa pertencente ao mesmo grupo, quando evidente que a estrutura desta é meramente formal. Nesse sentido é o voto do Ministro Luis Felipe Salomão no REsp 1071643/DF, Quarta Turma, julgado em 02.04.2009, DJe 13.04.2009:

5.2. Em relação à alegação de que a desconsideração da personalidade jurídica somente poderia atingir os sócios da executada, e não outra empresa, tal tese não comporta acolhimento. Esta Corte se manifestou em diversas ocasiões no sentido de ser possível atingir, com a desconsideração da personalidade jurídica, empresa pertencente ao mesmo grupo, quando evidente que a estrutura deste é meramente formal.

Nesse sentido, confira-se:“Processo civil. Recurso ordinário em mandado de segurança.

Falência. Grupo de sociedades. Estrutura meramente formal. Administração sob unidade gerencial, laboral e patrimonial. Desconsideração da personalidade jurídica da falida. Extensão do decreto falencial a outra sociedade do grupo. Possibilidade. Terceiros alcançados pelos efeitos da falência. Legitimidade recursal.

– Pertencendo a falida a grupo de sociedades sob o mesmo controle e com estrutura meramente formal, o que ocorre quando as diversas pessoas jurídicas do grupo exercem suas atividades sob unidade gerencial, laboral e patrimonial, é legitima a desconsideração da personalidade jurídica da falida para que os efeitos do decreto falencial alcancem as demais sociedades do grupo.

– Impedir a desconsideração da personalidade jurídica nessa hipótese implicaria prestigiar a fraude à lei ou contra credores.

– A aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica dispensa a propositura de ação autônoma para tal. Verificados os pressupostos de sua incidência, poderá o juiz, incidentemente e no próprio processo de execução (singular ou coletiva), levantar o véu da personalidade jurídica para que o ato de expropriação atinja terceiros envolvidos, de forma a impedir a concretização de fraude à lei ou contra terceiros.

– Os terceiros alcançados pela desconsideração da personalidade jurídica da falida estão legitimados a interpor, perante o próprio juízo falimentar, os recursos tidos por cabíveis, visando à defesa de seus direitos.” (RMS 12.872/SP, rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 24.06.2002, DJ 16.12.2002, p. 306)

No mesmo sentido de admitir a responsabilidade solidária no caso de formação de grupo econômico, com intuito de fraudar o Fisco, são os seguintes julgados:

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EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. ILEGITIMIDADE DOS SÓCIOS-GERENTES/FRAUDE À EXECUÇÃO. BLINDAGEM PATRIMONIAL. REGULARIDADE DA CDA. SEBRAE. SENAI. SESC. SAT. INCRA. SELIC. UFIR. HONORÁRIOS. 1. MR Felippe é parte legítima para os embargos à execução, pois fora incluído inicialmente no polo passivo da execução. Se obteve a exclusão passiva da execução por via dos presentes embargos, isso não o descaracteriza como ilegitimado de início. 2. Se comprovada fraude à execução, ou ainda outra espécie de ardil contra os credores, mantém-se a constrição e o redirecionamento. 3. No caso dos autos, ressai que os bens de propriedade dos executados foram incorporados ao patrimônio de sucessivas empresas, que ou alteraram seu nome, ou pertencem a terceiro ou fazem parte do capital social de empresa criada com recursos da própria Irmãos Felippe ou seus sócios Jaber e Rubens Felippe, mantida, contudo, a comunhão de vontades. 4. A transferência de bens entre as empresas, que pertencem, em última análise, ao mesmo núcleo familiar Felippe, não pode impedir a satisfação de credores, salvaguardando o patrimônio do alienante, protegendo-o de eventual expropriação para satisfação de dívidas ou em execução fiscal. Essa conduta é tipificada de blindagem ou proteção patrimonial, servindo para proteger numerário pertencente ao grupo familiar Felippe, de sorte a tornar seus bens inatingíveis pelas penhoras necessárias para garantir as execuções fiscais. 5. Em sendo simuladas as transferências, estando os executados até hoje, ainda que de forma indireta, na titularidade dos imóveis, são elas ineficazes, mantida a penhora. 6. A legislação aplicável é o artigo 124, II, do CTN, combinado com o artigo 30, IX, da Lei nº 8.212/91, que admitem a responsabilidade solidária por dívida fiscal entre componentes do mesmo grupo econômico. 7. Exsurge como equivocada a exclusão de MR Felippe do polo passivo da execução, contra o qual o feito fora redirecionado, devendo ser provida remessa oficial para reincluí-lo, revigorando a decisão prolatada nos autos de execução fiscal, com base nos artigos 124, II, do CTN e 30, IX, da Lei nº 8.212/91. A manutenção da penhora do imóvel sob a matrícula 8.153 é corolário do reconhecimento do grupo empresarial. (...) (TRF4, AC nº 2003.70.11.004710-5, 1ª Turma, Juíza Federal Cláudia Cristina Cristofani, D.E. 27.09.2010)

TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. RESPONSABILI-DADE TRIBUTÁRIA. ARTIGO 30, IX, DA LEI Nº 8.212/91. GRUPO ECONÔ-MICO. CONFIGURAÇÃO. O art. 146, III, a, da CF não exige lei comple-mentar para dispor sobre novos casos de responsabilidade tributária, além do que sequer diz respeito a contribuições, restringindo-se à indi-cação dos contribuintes possíveis dos impostos nominais. Configurada a hipótese do art. 30, IV, da Lei 8.212/91, que diz que “as empresas que integram grupo econômico de qualquer natureza respondem entre si,

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solidariamente, pelas obrigações”, porquanto restou evidenciado que se trata de empresas que atuam no mesmo endereço, com sócios ou mandatários em comum, no mesmo ramo de confecções, que há ad-missão e demissão de empregados com sucessiva admissão em uma das demais empresas, deixando contribuições impagas, dentre outros fatos que revelam a unidade de atuação empresarial. Não conheci-mento do argumento da decadência trazido pelo autor em apelação, sendo que o art. 267, § 3º, do CPC admite tal conhecimento quando matéria de defesa. (TRF4, AC nº 2003.70.01.001616-0, 2ª Turma, Juiz Leandro Paulsen, D.J.U. 18.01.2006)

PROCESSO CIVIL – RECURSO ESPECIAL EM AUTOS DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – RETENÇÃO LEGAL – AFASTAMENTO – DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO E FALTA DE PREQUESTIONAMENTO – SÚMULAS 284 E 356 DO STF – PROCESSO EXECUTIVO – PEDIDO DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DA EMPRESA EXECUTADA – POSSIBILIDADE – DISPENSÁVEL O AJUIZAMENTO DE AÇÃO AUTÔNOMA. 1 – (...) 4 – Esta Corte Superior tem decidido pela possibilidade da aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica nos próprios autos da ação de execução, sendo desnecessária a propositura de ação autônoma (RMS nº 16.274/SP, rel. Ministra Nancy Andrighi, DJ de 02.08.2004; AgRg no REsp nº 798.095/SP, rel. Ministro Felix Fischer, DJ de 01.08.2006; REsp nº 767.021/RJ, rel. Ministro José Delgado, DJ de 12.09.2005). 5 – Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, provido para determinar a análise do pedido de desconsideração da personalidade jurídica da empresa executada no curso do processo executivo. (REsp 331.478/RJ, rel. Ministro Jorge Scartezzini, Quarta Turma, julgado em 24.10.2006, DJ 20.11.2006, p. 310)

PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, OBSCURIDADE, CONTRADIÇÃO OU FALTA DE MOTIVAÇÃO NO ACÓRDÃO A QUO. EXECUÇÃO FISCAL. ALIENAÇÃO DE IMÓVEL. DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA. GRUPO DE SOCIEDADES COM ESTRUTURA MERAMENTE FORMAL. PRECEDENTE. 1. (...). 3. “A desconsideração da pessoa jurídica, mesmo no caso de grupos econômicos, deve ser reconhecida em situações excepcionais, em que se visualiza confusão de patrimônio, fraudes, abuso de direito e má-fé com prejuízo a credores. No caso sub judice, impedir a desconsideração da personalidade jurídica da agravante implicaria possível fraude aos credores. Separação societária de índole apenas formal legitima a irradiação dos efeitos ao patrimônio da agravante com vistas a garantir a execução fiscal da empresa que se encontra sob o controle de mesmo grupo econômico” (acórdão a quo). 4. “Pertencendo a

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falida a grupo de sociedades sob o mesmo controle e com estrutura meramente formal, o que ocorre quando diversas pessoas jurídicas do grupo exercem suas atividades sob unidade gerencial, laboral e patrimonial, é legítima a desconsideração da personalidade jurídica da falida para que os efeitos do decreto falencial alcancem as demais sociedades do grupo. Impedir a desconsideração da personalidade jurídica nesta hipótese implicaria prestigiar a fraude à lei ou contra credores. A aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica dispensa a propositura de ação autônoma para tal. Verificados os pressupostos de sua incidência, poderá o juiz, incidentemente no próprio processo de execução (singular ou coletiva), levantar o véu da personalidade jurídica para que o ato de expropriação atinja terceiros envolvidos, de forma a impedir a concretização de fraude à lei ou contra terceiros” (RMS nº 12872/SP, rel Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, DJ de 16.12.2002). 5. Recurso não provido. (REsp 767021/RJ, rel. Ministro José Delgado, Primeira Turma, julgado em 16.08.2005, DJ 12.09.2005, p. 258)

Nessa linha, quando presente grupo econômico formado apenas com o propósito de burlar a incidência das normas de responsabilidade patrimonial, aplica-se a doutrina da desconsideração da personalidade jurídica, pois ocorre o abuso dessa personalidade, mediante a confusão patrimonial, aproveitando-se um mesmo grupo de pessoas da criação de sucessivas pessoas jurídicas a fim de manterem a exploração das suas atividades e lesarem credores, no caso o Fisco. Atingem-se, assim, os particulares constituintes das pessoas jurídicas componentes do grupo econômico.

Tais pessoas, físicas e jurídicas, portanto, sujeitam-se à responsabilidade solidária que advém dos mandamentos legais acima analisados, previstos nos artigos 134 e seguintes do Código Tributário Nacional, com especial destaque para o que dispõe o art. 137 do CTN:

Art. 137. A responsabilidade é pessoal ao agente:I – quanto às infrações conceituadas por lei como crimes

ou contravenções, salvo quando praticadas no exercício regular de administração, mandato, função, cargo ou emprego, ou no cumprimento de ordem expressa emitida por quem de direito;

II – quanto às infrações em cuja definição o dolo específico do agente seja elementar;

III – quanto às infrações que decorram direta e exclusivamente de dolo específico:

a) das pessoas referidas no artigo 134, contra aquelas por quem respondem;

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b) dos mandatários, prepostos ou empregados, contra seus mandantes, preponentes ou empregadores;

c) dos diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado, contra estas.

A conduta abusiva por parte do contribuinte desencadeia a possibi-lidade de serem pessoalmente responsabilizados os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado. Ou seja: os gestores da empresa, responsáveis pela condução do negócio empresarial, quando tenham praticado atos com excesso de poder ou infração a lei, contrato so-cial ou estatuto, poderão responder pelos créditos tributários devidos pela pessoa jurídica.

Nesse sentido são os seguintes julgados:

EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. INTEMPESTIVIDADE. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. ILEGITIMIDADE PARA FIGURAR NO FEITO EXECUTIVO. PRESCRIÇÃO. (...) 3. A legislação comercial afasta a responsabilidade objetiva do sócio ou administrador, merecendo interpretação sistemática o art. 135, III, do CTN, que trata da responsabilidade tributária subsidiária. 4. Para que a execução seja redirecionada contra o sócio-gerente ou diretor, com fulcro no art. 135, III, do CTN, deve o exequente comprovar que o não recolhimento do tributo resultou da atuação dolosa ou culposa dessas pessoas, que, com o seu procedimento, causaram violação à lei, ao contrato ou ao estatuto. (...) (TRF4, 2004.71.08.005477-6/RS, rel. Joel Ilan Paciorniki, Primeira Turma, 06.04.2011)

AÇÃO ORDINÁRIA. TRIBUTÁRIO. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO-GERENTE. O mero inadimplemento do tributo não caracteriza infração legal. Apenas a atuação das pessoas elencadas nos incisos do art. 135 do CTN com dolo, excesso de poderes ou infração a lei, contrato social ou estatutos efetivamente possibilitaria a responsabilização do sócio sem poderes de gestão. (TRF4, AC 2004.71.00.045572-4/RS, rel. Álvaro Eduardo Junqueira, Primeira Turma, D.E 07.04.2011)

Conclusão

Diante do que se verificou no presente estudo, a legitimação passiva para a execução fiscal também recai sobre o responsável tributário.

Dentre as hipóteses de responsabilidade tributária, a mais frequente se relaciona à dissolução irregular da sociedade, mas há outras hipóteses, como a confusão patrimonial. Requisito essencial para a caracterização da responsabilidade tributária é a demonstração da prática de atos em infração à lei, ao contrato social ou aos estatutos. Todavia, não há necessidade de

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vinculação dos atos ilícitos motivadores da responsabilidade tributária com os fatos que deram origem à própria obrigação tributária, contanto que se demonstre que a prática dos atos ilícitos pelo terceiro possa acarretar o inadimplemento ou a frustração da cobrança do crédito tributário.

No que respeita aos grupos econômicos, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou-se no sentido de ser necessária a presença do interesse econômico comum na atividade que deu origem ao crédito tributário. Contudo, nas hipóteses de criação de grupos econômicos de forma fraudulenta – notadamente nos grupos econômicos de fato, no mais das vezes com o propósito de iludir a fiscalização e a responsabilização patrimonial pelo crédito tributário –, caracteriza-se a situação de responsabilidade por infração à lei, ao contrato social ou aos estatutos, na forma do art. 135, III, do CTN, permitindo que todos os integrantes do grupo econômico tenham seu patrimônio atingido pela execução do crédito tributário, de forma a coibir a utilização abusiva da personalidade jurídica, com a ocultação de bens e direitos, bem assim das próprias pessoas físicas responsáveis pelo adimplemento do crédito tributário.

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