A Reforma Do Direito Probatório No Processo Civil Brasileiro - Parte III

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    A REFORMA DO DIREITO PROBATRIO NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO -TERCEIRA PARTE

    Anteprojeto do Grupo de Pesquisa "Observatrio das Reformas Processuais" Faculdade de Direitoda Universidade do Estado do Rio de Janeiro

    Revista de Processo | vol. 242 2015 | p. 91 - 164 | Abr / 2015DTR\2015\3697

    Cintia Regina GuedesMestre em Direito Processual pela Uerj. Professora da Fesudeperj. Defensora Pblica.

    Marcela Kohlbach de FariaMestre em Direito Processual pela Uerj. Advogada.

    Odilon Romano NetoMestre e Doutorando em Direito Processual pela Uerj. Juiz Federal.

    Diogo Assumpo Rezende de Almeida

    Doutor e Mestre em Direito Processual pela Uerj. Professor da FGV/Rio. Pesquisador Visitante daUniversidade de Cambridge (Inglaterra) e da Universit Paris I Sorbonne (Frana). Advogado.

    Paula Bezerra de MenezesMestre em Direito Processual pela Uerj. Advogada.

    Andre Vasconcelos RoqueMestre e Doutorando em Direito Processual pela Uerj. Professor Convidado da UFJF e da Unit.Advogado.

    Jos Aurlio de AraujoMestre e Doutorando em Direito Processual pela Uerj. Professor Substituto da Uerj. DefensorPblico.

    Baltazar Jos Vasconcelos RodriguesMestre em Direito Processual pela Uerj. Procurador do Estado.

    Jos Quirino BisnetoMestrando em Direito Processual pela Uerj. Advogado.

    Iorio Siqueira DAlessandri FortiMestre em Direito Processual pela Uerj. Juiz Federal.

    Marcella Mascarenhas NardelliMestre em Polticas Pblicas e Processo pela Uniflu. Doutoranda em Direito Processual pela Uerj.Professora Assistente da UFJF.

    rea do Direito:Civil; ProcessualResumo:Relatrio final da pesquisa sobre a reforma do direito probatrio do grupo de pesquisa"Observatrio das Reformas Processuais", da Faculdade de Direito da Universidade do Estado doRio de Janeiro, acompanhado de anteprojeto de lei e contribuies externas recebidas durante adiscusso pblica.

    Palavras-chave: Anteprojeto - Reforma - Direito probatrio - Processo Civil brasileiro.Abstract:Final report about the reform of the evidence law in the Brazilian Civil Procedure context,derived from the work developed by the research group "Procedure Reforms Observatory", at the LawFaculty of Rio de Janeiro State University, with a legislative proposal and external contributions of thepublic discussion.

    Keywords: Legislative proposal - Reform - Evidence Law - Brazilian Civil Procedure.

    Sumrio:

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    - Ttulo IIProvas em espcie - Ttulo IIIDisposies Finais e Transitrias

    Recebido em: 08.09.2014

    Aprovado em: 15.10.2014

    CONTEDO:

    JUSTIFICATIVAS

    Ttulo II Provas em espcie

    Captulo I Depoimento pessoal e confisso: IORIO SIQUEIRA DALESSANDRI FORTI EMARCELLA MASCARENHAS NARDELLI

    Captulo II Da Prova Documental: BALTAZAR JOS VASCONCELOS RODRIGUES E JOSQUIRINO BISNETO

    Captulo III Da Prova Testemunhal: ANDRE VASCONCELOS ROQUE E JOS AURLIO DEARAUJO

    Captulo IV Da Prova Pericial: DIOGO ASSUMPO REZENDE DE ALMEIDA E PAULABEZERRA DE MENEZES

    Captulo V Da Inspeo Judicial: ODILON ROMANO NETO

    Ttulo III Disposies Finais e Transitrias: CINTIA REGINA GUEDES E MARCELA KOHLBACHDE FARIATtulo II Provas em espcie

    Captulo I Depoimento pessoal e confisso

    1. Dos depoimentos das partes.O anteprojeto consagra a prestao do depoimento pessoal sempreem contraditrio (arts. 57 e 58, em ateno ao art. 5., LV, da CF/1988, e inspirado pelo art. 117 doCPC da Itlia), prevendo a possibilidade de depoimento por incapazes, representantes, assistentes(art. 57, 2., inspirado pelo art. 553, 2, do CPC de Portugal), bem como por qualquer empregado oufuncionrio, scio ou associado, integrante ou representante de pessoa jurdica ou entidadedespersonalizada, incluindo as entidades pblicas (art. 57, 3., inspirado pelo art. 406 do CPC daArgentina e art. 309 do CPC da Espanha).

    preservada a regra hoje vigente, segundo a qual o depoimento pessoal das partes pode serdeterminado de ofcio pelo juiz (art. 342 do CPC, art. 57, 2., do anteprojeto) e requerido por outraspartes (art. 343, caput, do CPC, art. 57, caput, do anteprojeto); o art. 58 do anteprojeto inova aopermitir que o requerimento de depoimento seja feito pelos litisconsortes e pela prpria parte quepretende depor. Com isto, o depoimento deixa de ser uma mera oportunidade de provocar a

    confisso e, iluminado pela garantia do contraditrio participativo, adquire nova dimenso como meiode defesa1 e oportunidade de dilogo direto dos prprios litigantes com o julgador2 para clarificar oalcance da pretenso deduzida em juzo, os fatos e circunstncias a serem investigados, e aspessoas que podem contribuir para o deslinde da controvrsia.

    O art. 59 do anteprojeto, inspirado nos arts. 302 do CPC da Espanha e 411 do CPC da Argentina,determina que as perguntas sejam formuladas em sentido afirmativo, com clareza e preciso, semincorporar valoraes ou qualificaes. A resposta, diretamente ao juiz, dever se dar, comopreveem o art. 561 do CPC de Portugal e o art. 305 do CPC da Espanha, de forma clara e precisas perguntas (permitida a formulao de outros comentrios pertinentes), mantida no mais a regrado art. 346 do CPC.

    O art. 60 do anteprojeto preserva a regra do caputdo art. 344 do CPC, segundo a qual as partessero ouvidas na ordem e forma prescritas para a inquirio de testemunhas.3 Em regra, asperguntas devem ser formuladas pelos advogados; se houver a concordncia destes e do depoente,

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    e desde que autorizado pelo juiz, as prprias partes podero formular perguntas diretamente.Prev-se o poder do juiz de fiscalizar de ofcio a admissibilidade das perguntas, sem prejuzo dapossibilidade de as partes e seus advogados deduzirem sua oposio. Como forma de intensificar aparticipao das partes em contraditrio, abandona-se o texto do pargrafo nico do art. 344 do CPCpara estabelecer, por inspirao dos arts. 189 e 190 do CPC da Frana, que o depoimento daspartes deve ser prestado, em regra, na presena das demais, a menos que as circunstncias exijama prestao separadamente e na presena dos peritos e assistentes tcnicos e confrontadas entresi ou com as testemunhas.

    O art. 61 do anteprojeto incorpora o texto aprovado na Cmara dos Deputados para o art. 392, 3.,do PL 8.046/2010 (Novo Cdigo de Processo Civil),4 de modo a contemplar a colheita do depoimentopessoal por meio de videoconferncia ou outro recurso tecnolgico de transmisso de sons eimagens em tempo real, e acresce regra que faculta ao advogado do depoente fazer-se presente no

    juzo deprecante ou no deprecado.

    O art. 62 do anteprojeto, em consonncia com o art. 343 e 345 do CPC, permite que se presumamverdadeiros (e no confessados) os fatos alegados contra a parte chamada a depor, casoinjustificadamente no comparea audincia, desde que tenha constado do mandado de intimaoadvertncia a respeito dessa consequncia; o mesmo ocorrer caso a parte deixe de responder, sem

    motivo justificado, ao que lhe for perguntado, ou empregar evasivas. A presuno (relativa) deveracidade, nos termos do anteprojeto, no equivale confisso, e, portanto, deve ser avaliada pelojulgador em conjunto com as outras provas. Por oportuno, o 2., inspirado pelo art. 557 do CPC dePortugal, autoriza o juiz a verificar a veracidade da alegao da parte que deixar de compareceralegando estar enferma.

    A regra do art. 347 do CPC transferida, com adaptaes, da seo do depoimento das partes parao captulo que trata da privacidade e da no autoincriminao como limites probatrios (Captulo Vdo Ttulo I).

    2. Da confisso.O art. 63 do anteprojeto acrescenta requisitos declarao confessria prevista noart. 348 do CPC: a admisso da veracidade de um fato por uma parte s constitui confisso emsentido estrito, com todas as suas consequncias, quando for voluntria, inequvoca e orientada pelaconscincia de que o reconhecimento prejudicial ao seu interesse e favorvel ao adversrio. O

    pargrafo nico previne mal entendidos ao dispor claramente que A confisso no abrange aqualificao jurdica nem os efeitos legais decorrentes do fato confessado, e no constitui rennciaao prprio direito nem reconhecimento do direito do adversrio.

    O art. 64 do anteprojeto exige, para a confisso judicial, a assinatura da prpria parte ou derepresentante com poder especfico; as declaraes orais, mesmo que reduzidas a termo, s valerocomo confisso se o juiz alertar o declarante a respeito das consequncias, tudo a reafirmar ocarter voluntrio, inequvoco e consciente da admisso da veracidade de fatos desfavorveis.

    O art. 65 do anteprojeto no mais equipara a confisso extrajudicial judicial. Mantm-se a regravigente, segundo a qual a confisso extrajudicial feita oralmente no eficaz nos casos em que a leiexija prova literal, mas, para os demais casos, a confisso extrajudicial ser livremente apreciadapelo juiz, constituindo inovao em relao ao art. 353 do CPC, que atualmente atribui foraprobatria plena confisso feita por escrito dirigido parte contrria.5

    O art. 66 do anteprojeto compila as regras dos arts. 213 do CC/2002 e 350 e 351 do CPC, e passa aautorizar a confisso de um cnjuge sobre fatos desfavorveis referentes a direitos reais sobre bensimveis, independentemente da concordncia do outro, quando adotado o regime de separaoabsoluta de bens.

    A regra do art. 352 do CPC substituda, no art. 16 do anteprojeto, pela possibilidade de retrataode todas as declaraes das partes at deciso final da causa nas instncias ordinrias, sedecorrerem de erro de fato ou vcio de vontade, da inobservncia dos requisitos estabelecidos nestalei ou se, por qualquer outro motivo, no violarem direito adquirido da parte contrria, a suaexpectativa legtima ou a boa f. Aps a deciso nas instncias ordinrias, a retratao poder serobjeto de ao autnoma ou de ao rescisria, desde que preenchidos os respectivospressupostos.

    O anteprojeto intencionalmente suprime a regra da indivisibilidade da confisso consagrada pelo art.

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    354 do CPC: em seu lugar, o art. 67, prestigiando o aspecto voluntrio da confisso como atojurdico, impe a interpretao restritiva da declarao confessria, sendo vedado extrair daadmisso de certos fatos ou circunstncias a veracidade de outros que no tenham sidoexpressamente confessados, ainda que entre eles haja indissocivel correlao.

    O art. 68 do anteprojeto, inspirado no art. 361 do Cdigo Civil de Portugal, esclarece que todo oreconhecimento de fatos desfavorveis que no seja admitido como confisso tem valor comoelemento probatrio a ser livremente apreciado pelo juiz.

    3. A discusso pblica do anteprojeto. Aps a publicao do anteprojeto, as observaes crticas aocaptulo do depoimento pessoal e da confisso restringiram-se a dois pontos especficos.

    Tanto Flvio Luiz Yarshell quanto Eduardo Cambi consideraram que, no contexto da priorizao peloanteprojeto do princpio dispositivo, incoerente a previso de que o juiz d incio s perguntas,tanto na fase de oitiva das testemunhas quanto no momento do depoimento pessoal. Ambosponderaram que o juiz apenas deveria se pronunciar tal como hoje ocorre no processo penal aps as perguntas das partes, de forma supletiva, para no assumir a postura de inquisidor, bemcomo para evitar que ele formule perguntas para tentar conduzir as respostas de modo a corroborara verso dos fatos que lhe pareceu mais convincente, pois o magistrado no o nico destinatrio

    das provas.O outro ponto diz respeito s perguntas feitas pelas partes. Eduardo Cambi sugeriu a potencializaodo dilogo pela ampliao da possibilidade de as partes formularem perguntas, diretamente ou pormeio dos seus advogados, cabendo ao juiz a atuao supletiva, como mediador, para que o debatemantenha bom nvel e seja proveitoso ao processo. Flvio Luiz Yarshell, por outro lado, opinoucontrariamente formulao direta de perguntas pelas partes (considerou til a intermediao porparte dos advogados, para minimizar o risco de acirramento dos nimos, de bate-boca) econtrariamente possibilidade de requerimento de litisconsortes por ocupantes do mesmo poloprocessual.

    Submetidas as sugestes a debate, os integrantes do Grupo de Pesquisa optaram por manterinalterada a redao dos textos normativos, pois o anteprojeto tem fundamento no princpiodispositivo tanto quanto no princpio da busca da verdade, que exige a iniciativa do juiz, dentro doslimites postos pela norma para cada um dos meios de prova.

    Como a funo primeira do depoimento pessoal no mais a obteno de confisso, e sim aclarificao decorrente da fala do depoente, atribui-se ao juiz o incio desse momento processual deinstaurao de uma instncia de dilogo esclarecedor. Partindo da premissa de que o juiz cumpre odever de ler os autos e de preparar-se para a audincia, as suas perguntas tendem a ser maisobjetivas, pertinentes, desprovidas de agressividade intimidatria e descomprometidas com umaviso parcial dos fatos, tudo no sentido de contribuir para que o depoente seja mais participativo epara que o ato seja eficiente e clere.

    Se verdade que o juiz s vezes comparece audincia com alguma inclinao em favor de umadas verses dos fatos apresentadas no processo (ou mesmo por uma terceira verso), por outrolado, em razo de seu dever de imparcialidade, no tem compromisso com a defesa ou prevalncia

    de qualquer das verses sustentadas; se as partes fossem as primeiras a perguntar, seria maior orisco de o depoente ver-se bombardeado por questionamentos que inibissem sua fala e conduzissemas respostas.

    O incio das perguntas pelo juiz tambm tem o aspecto positivo de que tanto as partes quanto osseus advogados no sabem o que ser perguntado e isto evita perguntas e respostas previamentecombinadas. A oportunidade de que as partes perguntem depois lhes permite elucidar pontos-chaveque no tenham sido suficientemente aclarados nas respostas anteriores; se o juiz fosse o ltimo aperguntar, haveria o risco de trazer tona novas questes sem que as partes pudessem tornar aexplorar o assunto.

    O art. 60, 2., do anteprojeto contempla permisso a que as perguntas sejam feitas diretamentepelas partes, sem intermediao de advogado, no como regra geral, e sim como oportunidadereservada para as ocasies em que o advogado considerar adequado, dependendo ainda da

    autorizao do juiz e da concordncia do depoente, mantido o poder do magistrado de intervir para

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    evitar agresses, intimidaes e constrangimentos. A medida inspirada na experincia dosJuizados, em que as partes no esto necessariamente assistidas por um advogado (o que acarreta, claro, o risco de se sentirem oprimidas pelo juiz, dado o desnvel de conhecimento tcnico entreelas e o magistrado) e, assim, acabam por se comunicar diretamente uma com a outra: os aspectospositivos dessa prtica devem ser aproveitados nos processos em geral, nos casos em que os

    prprios advogados no conversaram prvia e adequadamente com os seus clientes, de modo quefranquear a palavra diretamente ao autor e ao ru poder mostrar-se produtivo.Captulo II Da Prova Documental

    1. Introduo. A prova documental foi um dos meios de prova mais extensamente regulamentadospelo anteprojeto. Sua disciplina conta com 30 artigos comeando no art. 69 e indo at o art. 98 dodiploma e divide-se em trs sees distintas: Disposies Gerais, Da declarao de falsidade e,por ltimo, Da Exibio de Documento ou Coisa e Fornecimento de Informaes ou Reprodues.

    2. Conceito de documento. Entre as inovaes promovidas no mbito da prova documental, aprimeira a se destacar a tentativa de traar um conceito para o documento objeto deste meio deprova (art. 69), a exemplo do que ocorre na legislao lusitana que trata sobre o tema. 6

    A definio proposta optou por expandir e adequar aos dias atuais a concepo tradicional apontadapela clssica doutrina de Amaral Santos,7 na qual o documento representa objeto fsico queconserva de modo permanente e inaltervel o registro de um fato.

    Destacam-se as seguintes inovaes no conceito proposto pelo anteprojeto: 1 Tratarexpressamente da hiptese de documento eletrnico buscando assim sintonizar-se com omovimento de informatizao do processo, que se torna cada vez mais uma realidade em nossopas;8 2 Mitigar a rgida ideia de inalterabilidade do documento, passando a existir apenas anecessidade de estabilidade do contedo nele representado; e 3 Ampliar aquilo que pode serobjeto de registro por um documento, abandonando a restrio do conceito tradicional para abrangercomo objeto de registro pessoas, coisas ou fatos da vida humana.

    Com base neste novo conceito de documento, optou-se por incluir expressamente na disciplina daprova documental os registros mecnicos ou digitais de quaisquer fatos ou coisas que se enquadrem

    na definio proposta, eliminando definitivamente a dvida existente na doutrina quanto ao meio deprova que regulava sua produo no processo. Tais registros podero ter sua autenticidadeimpugnada por meio da arguio de falsidade documental, podendo ainda a parte alegar a falsidadesem requerer a declarao incidental (art. 71, pargrafo nico).9

    O mesmo tratamento foi conferido aos extratos digitais de bancos de dados pblicos e privados.Ressalva-se, entretanto, a exigncia especial feita ao emitente desses extratos, que dever atestar,sob as penas da lei, que as informaes conferem com o que consta na origem (art. 69, pargrafonico).

    3. Documento pblico. Quanto ao documento pblico e sua eficcia, o anteprojeto introduz duassignificativas mudanas em seu tratamento com relao ao Cdigo de Processo Civil de 1973, com oobjetivo de aprimorar a disciplina da sua fora probante no processo.

    Com o intuito de eliminar definitivamente a nefasta possibilidade de que documentos pblicosacarretassem na presuno absoluta daquilo que pretendem provar, optou-se por admitir de maneiraexpressa a produo de contraprova ao documento pblico (art. 70, in fine). Tal disposio tem ointuito de consolidar definitivamente em nosso ordenamento jurdico o princpio da livre valorao daprova, um dos pilares ideolgicos do anteprojeto, afastando-se de uma vez por todas do regime daprova legal e da possibilidade de tarifao das provas, que existiam, ainda que de maneira residual,na disciplina da prova documental no CPC/1973.

    Por essa mesma razo, determinou-se expressamente que os juzos pessoais emitidos pelo agentepblico e a fora probatria do documento particular fossem livremente apreciados pelo juiz da causa(art. 70, 2. e 5.).10 J os juzos tcnicos emitidos pelo servidor no exerccio de sua funodevero ser confirmados, caso haja interesse, por meio da produo de prova pericial. Tal regra um reflexo da opo feita pelo anteprojeto por tratar com maior rigor os requisitos formais para

    produo da prova tcnica de natureza pericial, possibilitando assim que o juiz e as partes exeramum melhor controle sobre esse tipo de prova (vide os requisitos do laudo pericial no art. 134).

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    Quanto caracterizao da f pblica, as inovaes trazidas conferem um tratamento bem maisminucioso do que o antigo tratamento conferido pelo CPC/1973. O anteprojeto determina que devamser preenchidas alternativamente duas condies de eficcia fora probante do documento pblico:ou o documento deve ser expedido por servidor pblico que se encontre no regular exerccio de suafuno com a observncia das formalidades exigidas pela lei; ou ento o documento deve ser

    elaborado por oficial pblico no limite de suas atribuies ao qual a lei tenha expressamenteatribudo f pblica (art. 70, 1.).11

    Ainda com relao ao documento pblico, o anteprojeto inovou na disciplina da ata notarial,passando a restringir a eficcia da f pblica nas atas notariais lavradas com escopo de substituiroutros meios de prova como, por exemplo, o testemunhal.12

    No pode o escrivo presenciar um fato da vida comum ocorrido fora do cartrio com intuito de lavrarata notarial, pois estaramos transformando o testemunho do escrivo em um meio anmalo deprova com valor superior ao da prova testemunhal. O notrio no pode ser utilizado como umatestemunha mais valiosa que as outras, sob pena de caracterizar-se a burla ao sistema da livreconvico motivada do magistrado.

    Para ilidir tal desvirtuamento, o anteprojeto passou a exigir dois pressupostos que devem ser

    alternativamente preenchidos pela ata notarial (art. 70, 3.): atestar declaraes de conhecimentoou de vontade; ou, ser lavrada a requerimento consensual de todos os participantes do ato.

    4. Documento particular. O tratamento conferido ao documento particular tambm foi objeto demodificaes em relao ao CPC/1973. A primeira modificao relevante diz respeito definio dodocumento particular.

    O anteprojeto, em seu art. 70, 4., optou por definir expressamente como sendo documentosparticulares todos aqueles que no preencherem as condies exigidas para os documentospblicos.13 Esta definio residual teve como objetivo reforar a graduao da fora probanteexistente entre o documento pblico e o particular.

    Outrossim, ressalvou-se que os documentos produzidos por agentes pblicos em desconformidadecom os requisitos exigidos pela lei devem ser considerados como particulares.14

    A prova da autenticidade do documento particular tambm foi minuciosamente regulada (arts. 72 a75), buscando uma disciplina muito mais rigorosa do que a conferida pelo CPC/1973.

    A regra trazida pelo anteprojeto que a assinatura aposta no documento particular prova suaautenticidade, salvo naqueles casos em que se tem por costume no assinar determinado tipo dedocumento como, por exemplo, os extratos bancrios de contas correntes ou de contas deinvestimento. Caso seja impugnada ou haja dvida quanto veracidade da assinatura, incumbequele que apresentou o documento fazer a prova da veracidade questionada.

    5. Certides e Reprodues.Com evidente intuito desburocratizante, a regra do art. 76 permitiu queas certides e reprodues substitussem os documentos originais sem que nenhuma formalidadeincua para tal substituio seja exigida. A ideia do mandamento legal em comento facilitar aomximo a utilizao da prova no processo, permitindo parte sua produo sem a necessidade dedisponibilizao do documento original num primeiro momento.

    Como mecanismo de controle para o uso destas certides e reprodues, o anteprojeto previu apossibilidade de que sua conferncia com os originais seja realizada em juzo caso haja algumadvida, sendo que tal situao poder ocorrer a partir de requerimento da parte contrria ou atmesmo por determinao do prprio juiz da causa.

    Por derradeiro, no caso de suspeita da falsidade da reproduo ou certido apresentada ou porqualquer outro motivo relevante, poder o juiz determinar o depsito do documento original emcartrio. Para assegurar o cumprimento desta obrigao, impe-se parte a preservao, ao menos,por dois anos, contados a partir do final do processo, dos originais dos documentos produzidos porcpia.

    6. Produo da prova documental. A produo da prova documental se sujeita ao regime geral deproduo de provas trazido pelo art. 20 do anteprojeto. Desta forma, possvel que a parte junte

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    documento aos autos a qualquer tempo.

    A maior flexibilidade para a produo de qualquer meio de prova no curso do processo demonstra oclaro compromisso do anteprojeto com a ideia de busca da verdade. Ressaltamos tambm que orespeito aos princpios da boa-f e da celeridade serviu de baliza para a mudana promovida.Buscou-se ao mximo ilidir a ideia de um processo cheio de precluses, evitando-se um injusto

    julgamento com base exclusivamente na aplicao das regras de distribuio do nus probatrio.

    7. Da Declarao de Falsidade. O anteprojeto preservou a existncia dos dois tipos distintos defalsidade j previstos no CPC/1973.15 O primeiro tipo recai sobre o prprio documento e sua origem a falsidade do documento prevista no inciso I do 1. do art. 83 , enquanto que o segundo recaisobre o contedo do documento que, embora verdadeiro, tenha sofrido alterao hipteseapontada pelo art. 83, 1., II.

    A possibilidade de que esses tipos de falsidade recaiam sobre a reproduo e o registro tambmest prevista expressamente pelo caputdo art. 84. Trata-se, em qualquer caso, da falsidade materiale no da falsidade ideolgica, que ocorre quando o documento verdadeiro contm afirmaoinverdica.16

    A regra prevista no art. 394 do CPC/1973, que prev a suspenso do processo aps o oferecimentodo incidente de falsidade, foi eliminada.17 Eliminou-se tambm o limite temporal para que a partepleiteie a declarao de falsidade. De acordo com o anteprojeto, as partes podero propor adeclarao de falsidade durante todo o curso processo em qualquer grau de jurisdio, sendo queem nenhuma hiptese o julgamento da causa ser suspenso para apreciao da arguio.Buscou-se com esta combinao afastar as precluses desnecessrias do processo e privilegiar aceleridade, sem prejudicar a marcha processual.

    Ao contrrio do CPC/1973, que permite que a falsidade seja declarada nos autos do processosomente at o termino da instruo probatria,18 o anteprojeto optou por permitir que o pedido dedeclarao de falsidade seja decidido nos prprios autos do processo, sem a necessidade de serautuado em apenso, contanto que a declarao de falsidade seja proposta na contestao ou noprazo de quinze dias aps a intimao da juntada do documento (art. 84, pargrafo nico). Sempreque transcorridos esses prazos, a arguio ser autuada em separado para no prejudicar a marcha

    normal do processo.Outra mudana levada a efeito pelo anteprojeto a possibilidade de que a partes impugnem aautenticidade da prova documental sem pleitear a declarao incidental da sua falsidade, com intuitoto somente de influir na livre apreciao da prova pelo juiz (art. 83, 2.).

    8. Exibio de documento ou coisa e fornecimento de informaes ou reprodues. A disciplina dorequerimento de exibio de documento ou coisa, seja ele judicial ou extrajudicial, 19 tambm foiobjeto de significativas mudanas. O anteprojeto buscou tornar mais efetivo o acesso s informaesem poder da parte contrria ou terceiro, evitando sempre que possvel o julgamento com base nasregras do nus de produo de prova.

    Em primeiro lugar, devemos destacar a ampliao do objeto do incidente de exibio. Passou a serpossvel utiliz-lo para o fornecimento de informaes e de reprodues que estejam em poder da

    parte contrria (art. 89), sendo necessrio que o requerente indique as circunstncias em que sefunda para afirmar que o documento, a coisa, a informao ou a reproduo existe e se acha empoder da parte contrria (art. 90, I).

    Com o intuito de conferir celeridade ao incidente de exibio, o anteprojeto optou por permitir que aintimao do requerido fosse feita na pessoa de seu representante judicial, salvo se este for defensorpblico ou advogado dativo, ou estiver o requerido assistido por curador especial (art. 91).20

    Noutro giro, o prazo para que o requerido apresente a resposta ao requerimento de exibio ou oprprio documento pleiteado passou a ser de dez dias.21 Tambm foi atribuda ao juiz a possibilidadede alterar o referido prazo em duas circunstncias apontadas pelo pargrafo nico do art. 91. Soelas: (a) quando o requerente comprovar urgncia para exibio do documento; ou (b) quando orequerido demonstrar a complexibilidade ou dificuldade para obteno do documento.

    Outrossim, o descumprimento da ordem de exibio foi severamente sancionado pelo anteprojeto.

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    Enquanto o CPC/1973 contenta-se em presumir como verdadeiros os fatos que o requerentepretendia provar com o documento, criando uma regra de julgamento que acaba por prejudicar aefetiva apurao dos fatos,22 o anteprojeto (art. 93, IV) optou por permitir a aplicao de quaisquermedidas sub-rogatrias ou coercitivas que pudessem desestimular ao mximo a no apresentaoilegtima do documento. Privilegiou-se a busca da verdade, permitindo que ocorra apenas em ltima

    hiptese a presuno de veracidade do fato que se pretenda provar com o documento omitido.Por derradeiro, o anteprojeto optou por submeter expressamente o poder pblico ao regime deexibio de documentos ou coisas (arts. 94 e 98). Todavia, no deixou de inovar, prevendo que oservidor ou funcionrio diretamente responsvel pela no apresentao do documento sejaresponsabilizado com a aplicao de multa pecuniria (art. 98, 1.). Buscou-se com isso coibir oabuso de prerrogativas e a desdia dos servidores pblicos, estimulando sua colaborao com a

    justia.Captulo III Da Prova Testemunhal

    1. Aspectos gerais.No captulo da prova testemunhal, o anteprojeto procura seguir as linhas mestrasdefinidas na parte geral e, sobretudo o princpio insculpido no art. 19, que reduz as causas deinadmissibilidade deste meio de prova, remetendo a avaliao de sua credibilidade para o livre

    convencimento exercitado sobre o conjunto probatrio.Procura desburocratizar a sua produo, bem como estimular alternativas mais cleres e menosdispendiosas que a sua inquirio presencial, como as declaraes escritas ou gravadas (art. 114).Aboliu-se no anteprojeto, ainda, qualquer limitao numrica s testemunhas que podem serarroladas pelas partes, por se tratar de critrio artificial, incapaz de assegurar s partes apossibilidade de produzir todas as provas que possam demonstrar a procedncia das suaspostulaes, de acordo com a diretriz estabelecida no art. 9..

    2. Pessoas que podem depor como testemunha. O art. 99 identifica de forma abrangente aquelesque podem depor como testemunha, ratificando o princpio medieval de que nemo testis in causapropria.23

    O dispositivo ressalta exemplificativamente que rbitros, conciliadores, mediadores, peritos, terceiros

    intervenientes, rgo do Ministrio Pblico, escrivo, oficial de justia ou outros auxiliares podemdepor sobre os fatos de que tiveram conhecimento ao longo de suas atuaes no processo ou foradele, deixando a avaliao do comprometimento ou no da credibilidade do depoimento para a fasedecisria. Com isso, deixa-se de suprimir um conjunto de provas orais que surgem habitualmente noprocesso, e que so costumeiramente indeferidas in liminesob o argumento de uma preconcebida epreconceituosa parcialidade.

    O oficial de justia, por exemplo, pode muito bem depor acerca de um ato de violao posse,cometido por uma parte contra a outra, que tenha presenciado no decorrer de uma diligncia deverificao, aproveitando-se valoroso elemento probatrio sem qualquer comprometimento de suaimparcialidade.

    O pargrafo nico, no entanto, exclui dos rbitros, dos conciliadores e dos mediadores a

    possibilidade de depor sobre o objeto material das formas de resoluo alternativa do conflito da qualparticiparam. Busca-se preservar a efetividade e a confiabilidade destes meios, permitindo, por outrolado, o depoimento acerca do procedimento e de demais questes processuais.

    O anteprojeto reafirma, atravs da norma do art. 100, a orientao de s permitir o depoimentodaqueles terceiros que mantiveram contato com os fatos atravs de seus sentidos e que estavam emcondies de perceb-los e de transmiti-los no momento de sua ocorrncia ou da produo da prova.24

    3. Princpio da ampla admissibilidade da prova testemunhal e a remessa de sua avaliao para oconjunto probatrio.Ao contrrio do sistema atual, que prev causas de inadmissibilidade da provatestemunhal como a incapacidade, o impedimento e a suspeio, o anteprojeto segue o princpio daampla admissibilidade da prova (art. 19), deixando ao livre convencimento a valorao decredibilidade, fidelidade e utilidade da prova quando o juiz estiver diante do conjunto probatrio.

    Assim, seguindo o processo evolutivo de outros ordenamentos estrangeiros,25 o anteprojeto exclui as

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    hipteses de impedimento e suspeio como causas que impossibilitam a produo do testemunho epermite a oitiva de incapazes como testemunhas, quando o juiz evidenciar que possuemdiscernimento necessrio para dizer a verdade e quando o testemunho no for capaz de gerar riscos sua integridade psicolgica (art. 101).

    Deve-se observar que a norma no autoriza a oitiva de criana, de adolescente ou de incapaz

    perante outro profissional como psiclogo ou assistente social , o que subtrai em absoluto aimediatidade e a eficcia deste meio de prova, transformando a prova testemunhal em mera provadocumental.

    Como forma de preservar a integridade do incapaz, que pode se sentir intimidado ao depor peranteum juiz, as partes do processo e os advogados, permite-se que sua oitiva seja realizada porvideoconferncia dirigida pelo juiz (art. 101, 2. a 5.), em sala prpria, na sede do juzo da causa,a se dar, em qualquer caso, na presena de um funcionrio do juzo, que ficar responsvel porassegurar a incomunicabilidade da testemunha e a observncia da regra prevista no art. 113, 3.;identificar outras pessoas presentes na sala em que se realizar a inquirio do incapaz e indicar aocorrncia de gravao do depoimento na sala em que foi colhido, sem prejuzo de qualquer outracircunstncia relevante, que dever, sempre que possvel, ser submetida em tempo real ao juiz dacausa (art. 101, 4.) e constar do prprio termo de audincia. Como o depoimento previsto nesse

    dispositivo se realiza no juzo da causa, no se exigem todos os requisitos prprios da inquirio porcarta mediante videoconferncia (art. 115), em relao ao qual se remete ao item 12 da presentejustificativa.

    Coisa diversa a percia psicolgica realizada sobreo incapaz destinatrio de medida protetiva ouparte em ao de destituio de poder familiar ou de alienao parental, por exemplo, quando, semprejuzo da oitiva da criana ou do adolescente, o juiz ou as partes pretendam provar fatos ou danosatravs deste meio de prova (arts. 101, 7. e 8. e 130). O 8. do dispositivo, adotando em partea orientao prevista na Recomendao 33, de 23.11.2010, do Conselho Nacional de Justia, preva criao de ambientes adequados nos foros, que favoream a realizao da prova e minoremeventuais prejuzos ao incapaz.

    4. Deveres das testemunhas. A norma do art. 102 concentra os deveres das testemunhas, semtrat-los de maneira esparsa como a legislao atual faz nos arts. 412 e 415 do CPC. A penalidade

    pelo descumprimento do dever de comparecer encontra-se no 9. do art. 108 do anteprojeto:conduo coercitiva e condenao ao pagamento das despesas pelo atraso.

    A regulao projetada difere em substncia do sistema atual quando no mais prev a advertnciasolene testemunha de que o descumprimento do seu dever de veracidade pode sujeit-la a sanocriminal (atual pargrafo nico do art. 415 do CPC).

    A testemunha, na compreenso do anteprojeto, no pode depor sob a ameaa de ver-seresponsabilizada criminalmente, o que retira a espontaneidade necessria ao pleno desenvolvimentodo ato.26

    5. Rol de testemunhas.Dispe o art. 103 do anteprojeto que o rol de testemunhas conter todos osdados necessrios sua precisa identificao. Entre tais dados, so relacionados, em carterexemplificativo, o nome, a profisso, o estado civil, a idade, o nmero do cadastro de pessoa fsica edo registro de identidade e o endereo da residncia e do local de trabalho. Nada impede, porm,que outros dados pessoais sejam fornecidos, com vistas a assegurar que a testemunha sejaidentificada de forma precisa.

    Revela-se comum, na prtica, que as partes no tenham conhecimento de todos esses dadospessoais, razo pela qual foi abandonada a orientao do art. 407 do CPC vigente, o qual estipula,sem qualquer ressalva, que o rol deve conter o nome, a profisso, a residncia e o local de trabalhode todas as testemunhas. Como no poderia deixar de ser, muitas vezes o rol no apresenta, narealidade do foro, todas essas informaes e o anteprojeto se rende a tal circunstncia.

    O art. 104 representa a expresso especial do princpio constante do art. 10 do anteprojeto, queadmite que as partes possam propor e produzir todas as provas que possam demonstrar aprocedncia de suas alegaes. Assim, no deve o juiz indeferir o depoimento de determinada

    testemunha apenas por entender que a prova apresenta reduzida probabilidade de xito, porceleridade processual ou por consider-lo desnecessrio formao de seu convencimento. No

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    juzo de admissibilidade deve sempre prevalecer o critrio da tolerncia. Se, da perspectiva da parterequerente e de suas alegaes, a prova testemunhal revelar-se potencialmente til, dever o juizadmitir a sua produo, deixando para valor-la no momento processual prprio.

    O art. 105 contempla pequeno acrscimo em relao ao art. 409 do atual CPC, aplicando tambm ao

    membro do Ministrio Pblico que atuar como parte a regra do inc. II, qual seja, sua excluso do rolde testemunha na hiptese em que nada souber sobre fatos que possam influir na deciso. Oobjetivo dessa alterao consiste em evitar que o membro do Parquetvenha a ser arrolado pelaoutra parte sem motivo, apenas para criar impedimento sua atuao.

    6. Inquirio fora da sede do juzo. No art. 107 do anteprojeto, que relaciona todas as testemunhasque possuem a prerrogativa de serem inquiridas em sua residncia ou onde exercem a sua funo,em vez do local da sede do juzo, as nicas modificaes substanciais em relao legislaovigente constam de seus 2. e 3.. Aludidos pargrafos disciplinam o que ocorrer, caso aautoridade no se manifeste sobre o dia, hora e local em que ser inquirida ou, ainda, quando nocomparecer, injustificadamente, sesso por ela mesma agendada. Essas regras j se encontramna ltima verso do projeto do novo Cdigo de Processo Civil, em trmite na Cmara dosDeputados, e foram transplantadas para este anteprojeto.27

    7. Intimao das testemunhas. O art. 108 revela importante alterao, em que se procuradesburocratizar o procedimento atual de intimao das testemunhas mediante mandado a serexpedido pelo cartrio, o que se tem revelado uma causa frequente de adiamento de audincias eatraso processual. De acordo com referido dispositivo, caber ao advogado, em regra, intimar atestemunha que arrolou do local, do dia e do horrio da audincia designada, independentemente deinterveno do juzo.

    Tal orientao j se encontra contemplada em parte na verso atual do projeto do novo Cdigo deProcesso Civil.28 Entretanto, considerou-se importante prever garantias mnimas que assegurassem(a) a adequao da intimao a ser realizada pelo advogado; (b) a adaptao da norma aocalendrio estabelecido na audincia preliminar regulada na parte geral do anteprojeto; (c) acompatibilidade da norma com a regra geral de que no se poder desistir da oitiva de testemunhascujo depoimento j tenha sido admitido, para que a falta de intimao, pelo advogado que a arrolou,

    no venha a ser utilizada como uma forma de burlar o disposto no art. 21 do anteprojeto.Quanto primeira exigncia, para assegurar que a intimao a ser realizada pelo advogado sejaadequada aos fins a que se prope, estabelece ocaputque a testemunha dever ser informada compreciso dos fatos sobre os quais ir depor. Ainda nesse sentido, para assegurar certa padronizaoe transmitir s testemunhas credibilidade e seriedade na intimao, prev o 1. que ela dever serrealizada mediante formulrio elaborado de acordo com modelo aprovado pelo Conselho Nacional deJustia.

    importante, em qualquer caso, que a intimao seja recebida pessoalmente pela testemunha.Previu-se, assim, no art. 108, 2., que ela seja realizada por carta com aviso de recebimento emmo prpria. Nada impede, porm, que o advogado entregue em mos a intimao, desde quecomprove o seu recebimento pela testemunha por qualquer meio idneo, o que compreende,evidentemente, o protocolo de recebimento da intimao assinado diretamente pela testemunha.

    Para proporcionar compatibilidade da nova regra com o calendrio estabelecido na audinciapreliminar, o art. 108, 2., determina ainda que a juntada aos autos da prova da intimao datestemunha dever ser providenciada pelo advogado no prazo ajustado no calendrio. De todomodo, caso tal prazo no tenha sido definido na audincia preliminar, dispe o 3. que a juntadadever ser realizada com antecedncia mnima de trs dias da data da audincia em que atestemunha ser ouvida.

    Evidentemente, haver casos em que a intimao da testemunha diretamente pelo advogado noser possvel, seja porque ela se recusa a receber espontaneamente tal comunicao, seja porque aparte no assistida por advogado, seja por se tratar de servidor pblico, militar ou autoridade, ou,ainda, porque sua oitiva decorre da iniciativa probatria do juiz. Tais hipteses esto disciplinadas no 6., casos em que a intimao ser realizada mediante mandado a ser expedido pelo juzo. Paraassegurar, entretanto, que tais testemunhas tambm tenham cincia prvia dos fatos sobre os quaisiro depor, prev o 7. que o mandado de intimao ser instrudo com tal informao, cabendo ao

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    juiz indicar tais fatos, caso tenha determinado sua oitiva de ofcio.

    O descumprimento das regras concernentes intimao das testemunhas deve proporcionar algumaconsequncia negativa parte interessada. Estipular, no entanto, que tal desobedinciasimplesmente acarretaria a perda da prova, sem qualquer ressalva, poderia abrir as portas para que

    se contornasse a regra prevista no art. 21 do anteprojeto, segundo a qual no se admite adesistncia de prova j admitida. Assim, estabelecem os 4. e 5. que o no comparecimento datestemunha que a parte havia se comprometido a levar, assim como a inobservncia s regraspropostas para a sua intimao, podero ser interpretadas como desistncia de sua oitiva,observada sempre a iniciativa probatria do juiz e as restries disciplinadas na parte geral doanteprojeto para a desistncia de prova j deferida.

    O art. 109 tambm introduz alterao relevante. Na realidade do foro, caso uma das testemunhasno tenha sido intimada e nem comparea, ainda que todas as demais estejam presentes, pode aaudincia ser adiada, em homenagem ao princpio da unidade da audincia (arts. 453 e 455 doCdigo em vigor).

    Considera-se, porm, que tal prtica extremamente prejudicial celeridade e efetividade doprocesso. Muitas vezes, o depoimento das testemunhas que j tiverem sido intimadas pode revelar a

    desnecessidade de intimao da testemunha ainda no localizada. Alm disso, o dever decomparecimento em nova data de todas as testemunhas j intimadas anteriormente, alm dedesnecessariamente oneroso para estas, pode contribuir para o descrdito do Poder Judicirio.

    Adota-se no anteprojeto, assim, a mesma orientao que se encontra no Cdigo de Processo Civilportugus,29 de maneira que a ausncia de testemunha, em regra, no constitui motivo para adiar aproduo das demais provas na audincia, ressalvadas situaes excepcionais, como, por exemplo,a quebra do encadeamento lgico que eventualmente possa decorrer da alterao na ordem dosdepoimentos proposta pela parte interessada. Tal circunstncia, no entanto, dever serespecificamente justificada pelo juiz.

    8. Contradita.O art. 111 disciplina as providncias iniciais na inquirio da testemunha, que deverde incio ser qualificada. A testemunha dever, ainda, informar se possui qualquer relao com aspartes, interesse no objeto do processo ou qualquer outro fato ou circunstncia que possa influenciara credibilidade de seu depoimento.

    Nos termos do 1. do art. 111, a parte poder contraditar a testemunha para arguir qualquer dashipteses previstas nos arts. 100 e 101 do anteprojeto ou, ainda, qualquer fato ou circunstncia quepossa comprometer a credibilidade do depoimento.

    No primeiro caso, se acolhida a contradita, o juiz aplicar o estabelecido nos dispositivos pertinentes.No segundo caso, o juiz tomar o depoimento mesmo reconhecendo o motivo que possa determinara falta de credibilidade do depoimento, avaliando a prova de acordo com os critrios prpriosestabelecidos na parte geral. Ao contrrio do que ocorre hoje, portanto, a testemunha que, porexemplo, tiver relao com qualquer das partes ou interesse no resultado do processo no serdispensada, vez que o anteprojeto se orienta pelo critrio de que no devem ser impostas restries admissibilidade das provas com fundamento na suspeita da sua falta de credibilidade, em

    homenagem busca da verdade necessria ao exame e deciso da causa.30

    Nesse caso, portanto,a contradita poder ser utilizada apenas para chamar a ateno do juiz para circunstncias quepossam comprometer a credibilidade da testemunha, mas no para impedir seu depoimento.

    9. Colheita do depoimento. No art. 112, est previsto que a testemunha ser advertida de seu deverde dizer a verdade no incio da inquirio. O anteprojeto no mais prev, como j exposto, aadvertncia da possvel incidncia da sano penal para o descumprimento desse dever, nem ocompromisso formal da testemunha, com o objetivo de preservar a espontaneidade de seudepoimento. Ainda assim, para preservar a seriedade da prova testemunhal, dever o juiz destacar aimportncia do depoimento para a administrao da justia.

    O anteprojeto disciplina, em seu art. 113, como ser colhido o depoimento da testemunha.Debateu-se na elaborao do anteprojeto a convenincia em se adotar o sistema da crossexamination, em que incumbiria diretamente aos advogados formularem as perguntas testemunha,

    independentemente da interveno do juiz, ao contrrio do que ocorre no Cdigo de Processo Civil

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    em vigor. Destaque-se que, no mbito do Cdigo de Processo Penal, a Lei 11.690/2008 implementoutal sistema,31 tambm contemplado na ltima verso do projeto do novo Cdigo de Processo Civil.32

    Considerou-se, aps anlise das diversas alternativas existentes, prefervel manter o sistema atual,na linha da orientao dos Princpios de Processo Civil Transnacional aprovados pelo ALI/Unidroit,importante iniciativa destinada a incentivar a compatibilizao de regras processuais no mbito dos

    pases dacivil lawe dacommon law. De acordo com o princpio 16.4,33 a colheita do depoimento dastestemunhas deve observar os costumes do foro, evidenciando tratar-se de matria em que questesculturais possuem grande relevncia.34 Alm disso, importante destacar que o sistema da crossexamination poderia, na prtica, se transformar em um fator potencializador de desigualdade daspartes no processo. Aqueles que, eventualmente, tivessem condies de contratar advogados maiscapacitados poderiam se beneficiar em um modelo que permitisse abordagem mais incisiva dastestemunhas.

    Xavier Abel Lluch alinha vrios motivos que justificam a conduo da inquirio pelo juiz.35 Se setratar de menor de idade ou incapaz, ou ainda, no sistema do anteprojeto, de testemunha suspeita,essa conduo necessria para que o juiz possa decidir se deve levar adiante a tomada do seudepoimento ou em que medida pode confiar nas suas declaraes. Por outro lado, a conduo pelo

    juiz assegura que as perguntas se ajustem aos parmetros de pertinncia em relao aos fatos que

    se pretende apurar, s condies pessoais de cultura e de informao da testemunha e ainda aprotegendo de qualquer influncia momentnea que possa por em risco a confiabilidade das suasdeclaraes.

    Na fase de discusso pblica do anteprojeto, Flvio Luiz Yarshell e Eduardo Cambi sugeriram, emsuas palestras, a adoo do sistema da cross examination,por ser mais compatvel com o princpiodispositivo, reduzindo a esfera de atuao do juiz na instruo do processo e evitando que se torneum inquisidor. Aps novas discusses, concluiu-se que no seria conveniente a adoo do sistemada cross examination, porque, sem prejuzo de todos os argumentos acima expostos, dentro doambiente cultural brasileiro, seria importante evitar que o advogado conduzisse a testemunha noincio da audincia, influenciando todos os demais atos ali praticados. Ainda que o advogado possatentar faz-lo, dentro do modelo adotado, aps a inquirio pelo juiz, sua influncia sobre o restanteda audincia ser significativamente reduzida, uma vez que o magistrado j dever ter delimitado asquestes a serem objeto de discusso.

    Considerou-se, ainda, que a manuteno do sistema atual de inquirio no seria incompatvel comas garantias processuais, uma vez que no se abriu mo do direito dos advogados formularem suasperguntas testemunha, para a hiptese de a inquirio do juiz no ter sido suficiente, sob aperspectiva da parte, para demonstrar a procedncia de sua postulao, nos termos do art. 10. Talmodelo tambm no colide com o princpio dispositivo, que continua a vigorar, como regra geral,especialmente nas causas sobre direitos disponveis, o que no significa que o juiz deva ser inerte,permanecendo alheio atividade probatria das partes. Note-se, ainda, que a iniciativa quanto prova testemunhal permanece nas mos das partes, a quem, em regra, incumbir arrolar astestemunhas (arts. 49, 3. e 103) e delimitar os fatos relevantes sobre os quais preferencialmenteir depor (art. 108).

    O art. 113 consiste em uma adaptao a essa diretriz da norma correspondente na ltima verso do

    projeto do novo Cdigo de Processo Civil (art. 466), na qual se procurou reforar o dever deobjetividade, clareza e preciso das perguntas a serem formuladas testemunha (art. 113, 2.),bem como a possibilidade de consulta, pelo depoente, a notas breves (art. 113, 3.).

    Acrescentou-se, ainda, um 1. ao art. 113 para permitir expressamente aos advogados consultareminformaes durante a inquirio, inclusive por meio eletrnico, admitindo-se tambm a participaode auxiliares cuja identidade dever ser revelada a todos na audincia , providncia bastante tilespecialmente em situaes em que, ocasionalmente, o depoimento da testemunha envolver oconhecimento de fatos tcnico-cientficos.

    10. Depoimento escrito ou gravado. O art. 114 incorpora tendncia verificada em diversos pases,36

    no sentido de permitir a substituio da oitiva da testemunha por declarao escrita ou mesmogravada por qualquer recurso de registro de sons ou de sons e imagens, providncia clere, menosdispendiosa e, muitas vezes, de convenincia das partes, dos advogados e do Poder Judicirio.

    Entendeu-se conveniente permitir a substituio em qualquer caso, no se reproduzindo asrestries encontradas, por exemplo, na legislao portuguesa (na qual se limitou tal substituio

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    impossibilidade ou grave dificuldade de comparecimento da testemunha em juzo).37

    A testemunha, ao prestar uma declarao formal, deve estar plenamente ciente de que o escrito serutilizado em juzo. Alm disso, a substituio da oitiva em juzo por uma declarao escrita ougravada no descaracteriza a prova testemunhal, de modo que o depoente deve, ainda assim,observar o dever de veracidade e declarar todas as circunstncias que possam influenciar a

    credibilidade de seu depoimento (art. 111). Para assegurar o cumprimento de tais exigncias,considerou-se importante estipular no art. 114, 1., do anteprojeto a previso de modelos deformulrios para a declarao escrita da testemunha, a serem aprovados pelo Conselho Nacional deJustia.38

    Mesmo nos casos de substituio da oitiva por declarao escrita ou gravada, fica ressalvada ainquirio presencial, caso determinada pelo juiz ou requerida por qualquer das partes (art. 114, 2.). Tal previso, que encontra equivalente em outros ordenamentos jurdicos,39 pressupe que ocontato direto com a testemunha e a apreciao de algumas circunstncias especficas, como seutom de voz ou sua expresso corporal, podem ser fatores importantes para a adequada valorao dodepoimento.

    A propsito, o art. 116 , em larga medida, reproduo do art. 418 do atual Cdigo de Processo Civil,com o acrscimo do inc. II, que visa a permitir que o juiz possa ordenar a inquirio presencial dastestemunhas que tenham apresentado declaraes escritas ou gravadas, reforando o disposto noart. 114, 2., do anteprojeto.

    11. Inquirio conjunta. Ainda sobre o art. 116 do anteprojeto, seu inc. III representa uma novadisciplina para a vetusta hiptese de acareao, cabvel, nos termos do art. 418, II, do atual Cdigode Processo Civil, quando divergirem as declaraes de duas ou mais testemunhas sobre fatodeterminado.

    A prtica do foro tem demonstrado que, submetidas as testemunhas a um procedimento formal deacareao, dificilmente so dirimidas as divergncias, na medida em que as pessoas acareadas, atpor certo instinto de defesa, aferram-se rigidamente s suas declaraes iniciais. Assim, parapreservar a espontaneidade de suas declaraes e alargar as hipteses em que duas ou maistestemunhas possam depor em conjunto, complementando e esclarecendo fatos divergentes ou que

    possam ter se escondido na memria, o anteprojeto prope, no lugar da acareao, a possibilidadede inquirio conjunta, sempre que se entender conveniente tal providncia.

    12. Videoconferncia. O art. 115 disciplina a inquirio das testemunhas ouvidas por carta,referindo-se videoconferncia ou qualquer outro recurso de transmisso de sons e imagens emtempo real. Embora o ideal fosse que a inquirio se realizasse durante a audincia de instruo e

    julgamento no juzo de origem, preservando a concentrao dos atos processuais na prova oral epermitindo que o juiz da causa aprecie de imediato qualquer ocorrncia relevante durante ainquirio (art. 115, 4.), o anteprojeto reconhece a eventual dificuldade de compatibilizao daspautas dos juzos envolvidos na diligncia.

    O art. 115, 1. do anteprojeto determina que, sempre que possvel, a testemunha ouvida por carta mesmo nos casos de videoconferncia ou de transmisso em tempo real deponha no juzo deorigem perante o juiz do local, a fim de preservar a disciplina e a solenidade em sua oitiva.40 Odispositivo, porm, no contempla tal exigncia em todo e qualquer caso, novamente se rendendo sdificuldades prticas em conciliar os horrios de funcionamento dos juzos envolvidos, em especialquando esto envolvidas diferentes organizaes judicirias.

    Para preservar um mnimo de solenidade e de confiabilidade no depoimento da testemunha por cartana presena de um funcionrio do juzo, sem que o juiz do local esteja presente, o art. 115, 2.,estabelece que dever ser elaborado termo escrito e circunstanciado, a ser remetido ao juzo deorigem, em que devero constar necessariamente a identificao do funcionrio que supervisionou ainquirio e que ficar responsvel pela exatido das informaes; a explicitao dos motivos pelosquais no foi possvel a inquirio na presena de um juiz sem o que corre-se o receio de que arecomendao do 1. torne-se letra morta na prtica ; a identificao das testemunhas, com aobservncia dos requisitos do art. 111; a indicao dos horrios de incio e de encerramento dainstruo; a indicao de que a testemunha foi advertida expressamente de seu dever de dizer a

    verdade e de que foi observada sua incomunicabilidade, bem como a regra do art. 113, 3.; aidentificao de outras pessoas presentes durante a inquirio e, por fim, a indicao de que o

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    depoimento da testemunha foi gravado por qualquer das partes. Admite-se ainda, nos termos do 3., que o funcionrio faa constar no termo qualquer outra circunstncia relevante.

    O art. 115, 4., dispe que, havendo qualquer ocorrncia, sempre que possvel, o funcionriodever submeter tal circunstncia de imediato e em tempo real ao juiz da causa, o que naturalmente

    s ser possvel nos casos de inquirio por videoconferncia ou outro recurso tecnolgico detransmisso de sons e imagens em tempo real. No sendo possvel a imediata submisso ao juiz dacausa, restar ao funcionrio valer-se do pargrafo anterior e fazer constar do termo escrito talocorrncia.

    Por fim, o 5. explicita que a inquirio da testemunha por carta dever, ainda que no sejapossvel a utilizao de videoconferncia ou qualquer outro recurso de transmisso de sons eimagens em tempo real, ser obrigatoriamente registrada mediante gravao ou outro tipo de registrode sons ou de sons e imagens, sem prejuzo de sua reduo a termo (art. 55, capute 1.). Assimcomo em qualquer outra audincia, as partes podero gravar o depoimento da testemunha ouvidapor carta, comunicando tal circunstncia a todos que participarem do ato (depoente, demais partespresentes, juiz da causa no juzo de origem, se estiver acompanhando a inquirio e, ainda, ao juizou funcionrio que presenciar a inquirio).

    13. Pagamento das despesas da testemunha. No art. 117, introduziu-se pequena alterao emrelao ao art. 419, caput, do CPC atual, para prever que, em qualquer caso, o pagamento pleiteadopela testemunha da despesa para comparecer audincia deve ser efetuado pela parte que aarrolou imediatamente, evitando que a testemunha tenha de novamente dirigir-se sede do juzo oua outro local para ser ressarcida.

    14. Inquirio perante rgo colegiado.A ltima inovao no captulo est no art. 119, que disciplinaa produo da prova testemunhal em processo, recurso ou incidente de competncia de rgocolegiado. Previu-se, em homenagem oralidade e imediao dos julgadores com as provas aserem por eles apreciadas, que a testemunha dever preferencialmente ser ouvida perante todos osque participaro do julgamento, evitando-se a expedio de carta de ordem para que ela seja ouvidaperante rgos jurisdicionais inferiores. No curso da oitiva, incumbir ao relator presidir a inquirio,sem prejuzo da possibilidade de os demais componentes do colegiado formularem perguntas para

    esclarecer ou complementar o depoimento. Aplicam-se, no que couber, as demais disposiescontidas no captulo da prova testemunhal.Captulo IV Da Prova Pericial

    1. Antecedentes.Nosso interesse no tema prova pericial teve origem em casos em que atuamos.Por diversas vezes, deparamos com a resistncia dos peritos em fundamentar seu laudo, emexplicitar a fonte do seu conhecimento, o seu mtodo de trabalho, em informar se h aceitaodaquele conhecimento pela doutrina majoritria na rea especfica e at mesmo em indicar os casosem que atuaram, para fins de controle de sua aptido e do laudo, para o exerccio da ampla defesa edo contraditrio qualitativo. No raro solicitar, sem xito, o curriculum vitaedesses profissionais deconfiana do juzo nos respectivos cartrios em que atuam. Quando o advogado se dedica a exercero controle efetivo das atividades do perito, certamente, pode encontrar muitas dificuldades.

    A partir de alguns resultados prticos positivos decorrentes do exerccio do controle da prova pericial,dos estudos crticos de Leonardo Greco e de vrios colegas por ele orientados no mesmo tema,vimo-nos motivados a entrar para esse grupo, que desafia os mtodos quantitativos, comuns na eratecnolgico-industrial, para dar lugar aos qualitativos. Da vieram os estudos dos materiais de pontaem Direito Probatrio, sejam eles originrios da comunidade cientfica da common lawou dacivil law,41 que resultaram tambm nas nossas dissertaes de mestrado concludas na Universidade doEstado do Rio de Janeiro,42 das quais tomamos a liberdade de extrair trechos que alimentam esta

    justificativa.

    A nossa pesquisa girou em torno de alguns temas principais, como a escolha do perito, o controle dacincia, e, por consequncia, da prova pericial, com questionamentos sobre sua admissibilidade,produo e valorao.

    Algumas premissas orientaram as alteraes propostas para a prova pericial. A primeira que no

    se admite mais afirmar que o juiz seja o nico destinatrio das provas. s partes tambm so

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    destinadas as provas, que tm o carter demonstrativo dos fatos alegados. Isso significa dizer queessas personagens devem ter a mais ampla possibilidade de participar da produo da provapericial, bem como de influenciar e controlar o seu resultado, visando o mais apropriadoesclarecimento dos fatos, cuja apreciao dependa de conhecimentos cientficos, tcnicos ouespecializados.

    A segunda premissa a de que a prova pericial no est isenta de erros. Essa afirmativa propiciouum avano muito grande em matria de prova pericial, porque foi a partir dela que a doutrinaempregou esforos no mapeamento desses erros e ofereceu novos recursos e possibilidades para oseu descortino e controle, desde a fase da admissibilidade, passando pela da produo davalorao.

    Se de um lado a nova diretriz proposta pelo anteprojeto para a reformulao do Direito Probatriobrasileiro a de viabilizar a produo mais livre de provas que possam contribuir para a corretadefinio dos fatos e a mais justa soluo da causa, de outro, tentamos controlar as variveissuscetveis de induzir o julgador em erro quando da apreciao do resultado da prova pericial.43

    2. Generalidades. Segundo Moacyr Amaral Santos44 o objeto da prova o prprio fato, que pode serprovado por declaraes das partes, documentos ou depoimentos de testemunhas. Para conhec-lo,

    o juiz deveria entrar em contato direto com a coisa, ou com pessoas, quando estas constituam aprova material do fato. No obstante, h situaes em que o juiz no conseguir compreender o fato,por lhe faltarem conhecimentos tcnicos ou especiais, tornando esse contato direto incuo. possvel que o contato seja vlido para a constatao do estado da coisa ou pessoa, mas que eledependa de umexpertpara saber da causa daquele estado.

    Como no se espera do julgador conhecimento que fuja do ramo da cincia jurdica, ou que a pessoade conhecimento mdio45 no possua, utiliza-se da prova pericial para fornecer ao magistrado oconhecimento til verificao do fato litigioso.

    A prova pericial um meio de prova indireta,46 produzida por um ou mais peritos e introduzida pormeio destes no processo. um procedimento probatrio que possibilita chegar ao fato que se provaa partir de outro participante, ou outros, mediante um processo inferencial.47

    O perito pode realizar toda sorte de exame pericial, que inclui o exame propriamente dito, a vistoria,o arbitramento e a avaliao. Ele ser responsvel por constatar, perceber e certificar-se dos fatos,levando-os ao conhecimento do juiz.

    No so quaisquer fatos que ficaro a cargo de exame pelo perito, mas sim aqueles que so objetoda percia e que fogem do conhecimento comum esperado do juiz.

    Michele Taruffo lembra bem que nem os juzes, nem os jurados, so oniscientes e que todos ossistemas processuais se utilizam de alguma forma do perito.48 Neil Andrews49 tambm se refere necessidade da percia no processo civil, porque nenhum juiz onisciente e no podemos exigirdos juzes que tenham conhecimento de cada ramo da cincia, das artes e dos mistrios de todas asprofisses, atribuindo esses termos a J.A. Jolowicz (trad. livre).

    Conforme Lus Fernando Manzano50 a prova pericial seria uma prova atpica, porque o cdigo e asleis no disporiam sobre os detalhes procedimentais do rito probatrio, ou seja, so silentes quanto confiabilidade do princpio cientfico, tcnica e mtodo aplicveis. Segundo o autor, da se justificariaa preocupao quanto ao seu emprego no processo.

    A prova pericial deve reconstruir fielmente os fatos para a obteno da verdade. Ocorre que dessareconstruo faro parte pessoas estranhas ao processo, presumidamente, isentas e possuidoras desaber especfico, que so os peritos.

    Na doutrina local os debates mais profundos com relao prova pericial so enriquecidos com asreflexes de Leonardo Greco, Flavio Mirza Maduro, Diogo Assumpo Rezende de Almeida, SamirJos Caetano Martins, Lus Fernando Manzano.51

    Conforme Greco observa em suas Instituies,52 na busca da verdade objetiva, devem-se aproximar

    os mtodos de investigao processual dos mtodos da cincia, pois aquela deve ser to confivelquanto a que investigada nas universidades, laboratrios e centros de pesquisa. Alis, se tratarmos

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    o direito como cincia, o uso do mtodo cientfico indispensvel. Wigmore j identificava isso atmesmo no plano das reformas processuais. As solues adequadas demandam a adoo da rgidaanlise cientfica.53 Por outro lado, no se olvida de que o processo tem um contedo prtico, queenvolve o gerenciamento da resoluo do conflito, em prazo razovel, que corre o risco de afastar omtodo processual do cientfico no conflito concreto.

    Greco54 tambm defende o aperfeioamento do sistema ptrio da prova pericial para que o peritodemonstre a sua aptido para revelar o conhecimento cientfico, tcnico ou especializado, necessriopara a deciso judicial; para que ao juiz sejam oferecidas as informaes a verificar se o mtodoempregado na percia acatado pela cincia, pelas regras geralmente aceitas na especialidadetcnica ou profissional e, em sendo o caso polmico na cincia, as alternativas cientficas ou tcnicassugeridas e o seu grau de confiabilidade. Por fim as partes devem atuar para o esclarecimento daverdade, obrigando o juiz a utilizar meios e critrios reconhecidos pela cincia para resolver asdvidas e divergncias entre as opinies apresentadas.

    Nas palavras de Leonardo Greco,55 no direito positivo brasileiro vigente, o perito a pessoa fsicacapaz, isenta, idnea, portadora de conhecimentos cientficos, tcnicos ou especializados e daconfiana do juiz. Ele um sujeito imparcial do processo e tem o dever de colaborar com a justia,assim como o tm todos os demais cidados (CPC, art. 339).

    Mas ser que os peritos adotam fielmente o compromisso com a busca da verdade? Ser querealmente tm saber cientfico confivel? Ser que so capacitados a atuar em juzo? Ser queagem com a responsabilidade necessria em se tratando de direitos de terceiros?

    Essas questes sempre existiram. No ordenamento jurdico ptrio possvel verificar que apreocupao com a percia constante, haja vista diversas reformas havidas na matria e na medidaem que o legislador garantiu expressamente a liberdade de o juiz adotar ou no o resultado do laudopericial (atual art. 436 do CPC), dependendo das demais provas carreadas aos autos.

    O problema em geral da percia, observado em diversos ordenamentos,56 que a funo do perito auxiliar o juzo e no julgar a matria, mas o que acontece no caso concreto pode ser exatamente ocontrrio. Dada a falta de conhecimentos tcnicos e cientficos do juiz, pode-se acabar acolhendo olaudo pericial como nica verdade, no passando a capacidade do juiz de valorar livremente a prova

    pericial de mera fico.Como a percia um meio de prova que objetiva suprir o conhecimento dos juzes e das partes emmatrias cientficas, tcnicas e especializadas, necessrio garantir a confiabilidade da prova paraque seu resultado exprima o enunciado racionalmente aceito como verdadeiro naquela reaespecfica do saber humano. Afinal, o valor da prova pericial depender da confiabilidade do mtodoutilizado e da competncia do perito57 e preciso que esses requisitos se evidenciem claramenteperante o juiz e as partes para que estes, como destinatrios das provas, possam avaliar os seusresultados.

    Busca-se intensificar a relao do processo com a cincia, a fim de que essa contribua noaperfeioamento da descoberta da verdade que obtida judicialmente. Somente com a corretautilizao de teorias e mtodos comprovadamente cientficos que a cincia fornecer subsdios revelao da verdade dos fatos, sem que falsas teorias impeam que a tutela jurisdicional sejaefetivamente prestada parte, cuja pretenso est acobertada pelas normas de direito material.

    Nosso anteprojeto cria procedimentos que visam eliminar ou, ao menos, diminuir riscos de erro naproduo da prova pericial, resgatando a conscincia de que ela no infalvel, alertando sobre apluralidade do conhecimento cientfico58 e propiciando uma mudana cultural, que garanta aosenvolvidos o controle efetivo.

    Isso se concretiza com a escolha criteriosa dos peritos (arts. 121 e 122 1.), com a possibilidade deescolha de mais de um perito (art. 123, art. 135) e com a ampla possibilidade de juntada de estudostcnicos ou cientficos, elaborados por profissionais que atendam aos mesmos requisitos decapacidade, idoneidade e iseno do perito do juzo, de forma mais flexvel, sem quenecessariamente estejam cadastrados no Tribunal (art. 122, 2..). Essa flexibilidade necessria,porque muitos profissionais de ponta, cujos conhecimentos sero teis para a clarificao dos fatos,

    no necessariamente sero vinculados s listas dos Tribunais.

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    Na etapa final de reviso do anteprojeto, aps as discusses pblicas, acrescentamos que apossibilidade da nomeao de dois ou mais peritos tambm se adequa s hipteses em que aproduo da prova pericial demanda a atuao de equipe multidisciplinar (art. 135, 2. parte).

    O controle dos laudos e estudos tcnicos ou cientficos possvel atravs da nomeao dos peritos

    pelas partes, ou de assistentes tcnicos nomeados para auxiliar a parte contratante (art. 122, 3. e4., 129, VIII).

    A percia desempenhada por rgos tcnicos ou cientficos, com ou sem personalidade jurdica, uma necessidade da vida contempornea, j que esses dispem, em geral, de toda umainfraestrutura para a produo da prova, especialmente, na rea cientfica, que demanda a utilizaode laboratrios. No entanto, necessrio que as partes conheam a identidade da pessoa fsica queir realizar o trabalho, para, igualmente, testar sua idoneidade e credibilidade, o que se prev no art.121, 8., 9. e 10.

    Quando as partes trouxerem provas produzidas no procedimento probatrio extrajudicial, ouapresentarem materiais elucidativos considerados suficientes pelo juiz, este poder dispensar aproduo da prova pericial (art. 133).

    3. O perito.A funo do perito da mxima importncia e, como regra, ele deve processualizar, emlinguagem mais simples, questes complexas que fogem do conhecimento comum. Essa linguagemno dispensa a fundamentao lgica e nem a demonstrao de como ele chegou queladeterminada concluso.

    O perito tem amplos poderes de investigao, conforme dispe o art. 429 do CPC (mantido noanteprojeto art. 134 3.), o que, aliado aos conhecimentos especiais que possui, tende, noinconsciente coletivo, a fazer com que a prova receba peso maior do que aquele dado s outrasprovas produzidas e carreadas aos autos.

    A doutrina sempre teve a preocupao de destacar que o perito um auxiliar da justia e no umsubstituto do juiz, ressaltando que o laudo no deveria ser uma sentena, mas fonte de informaopara o juiz.59

    Arruda Alvim defende que h de se ter em mente que o juiz sendo o peritus peritorum, mesmocarecendo de conhecimentos cientficos, poder, ainda assim, sobrepor sua deciso ao laudo epareceres, de acordo com a liberdade inerente funo jurisdicional, de que o juiz no pode abdicar.60

    A atuao do perito, cuja legitimidade hoje se presume a partir de critrios muito simples, no infalvel, por isso, to importante o seu controle. Os requisitos atuais exigidos para a qualificaodo perito (Cdigo vigente, art. 145 1.) afiguram-se insuficientes para o adequado controle sobre otrabalho realizado. No se prestigia a qualidade do saber, bastando o diploma de nvel universitrio einscrio no rgo profissional.

    Quem vai a juzo espera que seus pedidos sejam analisados por um juiz, que dialogue com as partesinteressadas, que escute todas as queixas e que motive detalhadamente suas decises. Esseprocesso concretiza a legitimidade do juiz. Por isso, indispensvel tambm que se desenvolva odilogo do juiz com o perito, assistentes tcnicos e partes, seja atravs da elaborao de quesitos,ou com realizao de audincias para esclarecimentos orais (art. 435 do CPC) e no apenas com aadoo burocrtica do resultado do laudo, sem uma motivao racional para as partes.61

    Alguns ordenamentos jurdicos ainda buscam o aprimoramento do instituto para garantir alegitimidade da prova e para que ela represente mais do que um procedimento burocrtico no cursodo processo.

    Como nossa cultura ainda est muito ligada noo de que as provas so destinadas ao juzo,estamos tentando mud-la da seguinte forma:

    De fato, h resistncia dos peritos em fornecer seu curriculum vitaepara provar seu expertise, emapresentar a fonte doutrinria que baseou o laudo e em apresentar a listagem de casos em que

    atuaram.

    62

    Como se torna um nus excessivo parte a busca por documentos que provem oexpertisee extremamente difcil a obteno da relao de casos em que os peritos designados

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    atuaram, esses dados devem estar disponveis publicamente (art. 121, 5. e 6.).

    Tambm previsto o dever de colaborao dos peritos para exibio de documento ou coisa queesteja em seu poder e praticar o ato que lhe for determinado (art. 7., I a IV), ficando a lei deorganizao judiciria encarregada de instituir regras para a admisso de provas em poder deterceiros, cuja produo possa entrar em conflito com direitos fundamentais ou com o segredo de

    Estado (arts. 22 e 24).

    Muitas vezes h m escolha do perito. Carla Rodrigues Arajo de Castro63 entende que a nomeaodo perito no ordenamento brasileiro, que pressupe um mnimo de conhecimento sobre a matria emexame, exclusivamente pelo juiz, pode ser prejudicial, porque as partes, curiosas e mais dedicadas aresolver os problemas que as afligem, muitas vezes esto mais aptas a identificar o perito maiscapacitado para a produo da prova do que o juiz.64

    Nossa soluo orientar a parte a indicar, quando do requerimento da produo da prova, sob penade rejeio, o respectivo objeto, enunciando as questes de fato que pretende ver esclarecidas, bemcomo especificar a rea do saber tcnico, cientfico ou especializado de que o perito deva terconhecimento (art. 127).

    Afinal, como mencionou Moacyr Amaral Santos,65 uma vez reconhecida a necessidade dainterveno do perito observa Carnelutti cogita-se, em segundo lugar, da sua eleio, isto , dedesignar a pessoa idnea por suas qualidades intelectuais e morais e por sua posio, para exercera funo, questo essa pouco discutida, e, alis, na realidade pouco discutvel, conquanto muitodelicada e grave. No h necessidade de advertir que o xito da percia depende, antes de tudo esobretudo, da escolha do perito, a qual muitas vzes procedida sem ponderao pelos juzes, maispreocupados em aproveitar a ocasio para conceder lucro aos solicitantes do que pr the right manin the right place. Moacyr Amaral Santos arremata: A observao do processualista italiano,mostrando a importncia da pessoa do perito no bom resultado da percia e reclamando, por isso,tenha aquela qualidades intelectuais e morais (sic) que a faam idnea e apta para o exerccio dafuno pericial, traduz precisamente o esprito do direito de considerar perito quem tenha especialcompetncia para o desempenho dos altos e delicados misteres que lhe so atribudos.

    Por isso, nossa preocupao em prever a avaliao da comprovada capacidade e idoneidade das

    pessoas e rgos mediante critrios objetivos previamente conhecidos, bem como a sua renovaoperidica (no mnimo a cada trinio), que incluir a avaliao do desempenho do perito no trinioanterior (art. 121 2., 3. e 4.), visando testar a capacidade do perito.

    O cadastro e essas avaliaes visam melhorar o plantel de peritos e uniformizar a qualidade dosservios prestados por eles, bem como sua distribuio equitativa (art. 121, capute 5.), alm dedar publicidade s informaes, a exemplo do que foi feito na Frana e Itlia. As listas geradas peloscadastros facilitaro o acesso das partes qualificao do perito e a possibilidade de controlar aescolha eficazmente.

    Se no houver perito capacitado no cadastro, possvel que a nomeao recaia sobre profissionalou rgo tcnico ou cientfico de notria especializao na matria objeto da percia (art. 121, caput).Nessa hiptese, ao nomeado ser concedido prazo de cinco dias para a apresentao de seucurrculo, da comprovao de suas especializaes e relao de casos semelhantes em que atuou(art. 129, 3.).

    O perito tambm pode se escusar do encargo e ser recusado pelas partes (art. 124, caput, 1., 2.e 3.).

    Para evitar que os assistentes tcnicos, capazes de questionar os mtodos utilizados, averiguar efiscalizar equipamento e material empregados e discutir as concluses do laudo, suprindo eventualprejuzo, por via do contraditrio, tenham sua funo esvaziada, porque os pareceres atualmentepouco influenciam o juiz, o art. 18, 3., vem reforar a obrigatoriedade de motivao expressa do

    juiz das razes pelas quais desprezou as provas contrrias.

    Visamos reforar tambm os mecanismos de controle da prova no anteprojeto com a garantia departicipao forte das partes na produo da prova pericial, franqueando a cada uma das partes apossibilidade de nomear seu prprio perito (art. 122, 1.), a preencher os mesmos requisitos doperito do juiz, o que reflete a tendncia do direito moderno de assegurar as garantias do devido

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    processo legal.

    A introduo do perito da parte mais uma ferramenta til para o exerccio pleno do contraditriocom qualidade, que visa fomentar a cultura da motivao da sentena sob a tica desses debates.Isso compatvel com ideia de que a cincia plural.

    A ideia superar o modelo autoritrio e permitir o controle do perito por seus prprios pares.

    Mais uma demonstrao da superao do autoritarismo a possibilidade de escolha em comumacordo do perito ou dos peritos pelas partes (art. 123), com todas as suas garantias, seja do controlepelo juiz (art. 123, 1., segunda parte), seja das partes (art. 123, 2.) que tm o seu direito impugnao preservado.

    A realizao da percia consensual visa a otimizao da produo da prova, seguindo o princpio dacooperao das partes, principalmente, nas reas de conhecimento que j esto sedimentadas elivres de questes polmicas.66

    J se sabe que apenas o contraditrio no suficiente para o controle de teses opostas e que necessrio investir os julgadores de poderes investigativos,67 que, no conceito do nosso trabalho,

    devem ser subsidirios.Nessa linha, quando requerida de ofcio, deve haver a formulaoa prioridos quesitos pelo juiz (art.129,caput), para que as partes entendam a necessidade da produo da prova.

    Sistemas mais equilibrados e propcios ao acerto de decises seriam aqueles que conseguissemconciliar na medida certa o exerccio do contraditrio e o poder do julgador de gesto do processo.

    Segundo Devis Echanda, na busca da verdade indispensvel conceder ao juiz poderesinquisitrios para a produo de provas que considere teis formao de sua convico e garantira sua liberdade para valorar as provas produzidas. A concesso de poderes to amplos no gratuita e pressupe a formao de um juiz mais preparado intelectualmente, a sua honestidade, aobrigao de motivar a sentena com fundamentao adequada e o bom desempenho dos tribunaissuperiores, como rgos que revisam o acerto das decises dos juzes a quo.68

    Pretende-se atingir esse equilbrio com uma espcie de cross-examinationou debate franco entre aspartes a testar a fora dos diversos argumentos, inclusive entre peritos das partes e o perito do juzo,assistentes tcnicos, ou consultores (art. 129, IX e X c/c art. 132, art. 54, I, art. 60, 5., e art. 137).69

    Est prevista ainda a possibilidade de nova percia nos arts. 140 e 141.

    As impugnaes aos peritos tambm esto garantidas na forma do art. 129, II.

    4. Fora probante do laudo pericial no Brasil. O legislador, com base no art. 436 do CPC,expressamente, no quis conferir ao laudo um valor probante maior do que o das outras provasproduzidas. O sistema das provas legais, adotado a partir do sculo XIV, em que as provas tinhamum valor pr-fixado em lei, a que o juiz ficava atrelado,70 foi superado. Mantivemos esseentendimento no art. 139, capute pargrafo nico. No obstante, a deciso que acolher ou afastar olaudo pericial, ser fundamentada e observar se o mtodo de produo da prova (art. 134) foi bem

    executado.O acrscimo do pargrafo nico no art. 139 foi formulado aps os debates pblicos, especialmente,fomentados por Eduardo Cambi em sua palestra de 07.05.2014, na UERJ, ocasio em que eledestacou a necessidade de tornar o controle judicial do laudo mais efetivo. Ele fez referncia aoscritrios de controle adotados por Luigi Lombardo,71 a saber, o juiz deveria verificar (a) se o peritolevou em considerao a realidade emprica; (b) se os mtodos ou regras cientficas utilizadasencontram respaldo na comunidade cientfica; (c) se tais mtodos ou regras foram bem aplicados nocaso concreto; (d) se na formao da prova pericial foi observado o contraditrio; (e) se o resultadoda percia est em consonncia com as demais provas produzidas nos autos.

    Trabalhamos essa questo e chegamos concluso de que esses critrios j estavam incorporadosaos requisitos intrnsecos ao mtodo de produo do laudo (art. 134) e que devem balizar e viabilizaro controle, no s pelas partes no contraditrio, mas pela fundamentao analtica da sentena (art.18).

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    Entretanto, concordamos com Eduardo Cambi que o controle da percia deva ser mais efetivo e, porisso, reforamos os elementos que devem integrar a motivao da sentena na valorao do laudopericial, com a incluso da seguinte norma, na forma de pargrafo nico do art. 139: Na deciso emque apreciar a prova pericial (art. 18), o juiz observar, sob pena de nulidade, se foram preenchidosos requisitos do art. 134, se foram corretamente aplicados os mtodos adotados e expor os motivos

    que o levaram a aceitar ou a deixar de aceitar as concluses do laudo.Nosso sistema, de acordo com a leitura do art. 131 do CPC, o da persuaso racional em que o juizaprecia livremente a prova, o que significa que ele sopesar as provas colhidas, apreci-las-,demonstrar o desenvolvimento de seu raciocnio para dali extrair a verdade e ao final indicar nasentena os motivos que o levaram a formar seu convencimento.72 Ele no seguir regraspr-estabelecidas que atribuam valor qualitativo s provas.

    Conforme Manzano73 o laudo pericial um dos elementos de prova que o juiz valora para atingir oresultado da prova. No tem valor definitivo, mas relativo.

    Na prtica, no entanto, o panorama muda. A valorao do conjunto probatrio quando um dos meiosde prova a percia, tende a fazer a balana pesar mais para esta.

    Leonardo Greco74

    destaca a grande fora persuasiva da prova pericial no direito brasileiro, amparadano seu presumvel carter cientfico, tcnico e especializado, cujo valor muito difundido nassociedades ocidentais, sob influncia do iluminismo. A ideia dos iluministas era suprimir a liberdadedo juiz na valorao da prova e reduzi-la quase a uma operao matemtica como forma de evitararbtrios. Segundo o autor, dificilmente o juiz deixa de reconhecer a verdade revelada pela provapericial, porque ele, magistrado, no ou no se presume ser portador dos conhecimentosprprios do perito. Neste ponto, reside o maior risco da prova pericial, que justamente o detransformar o perito em juiz.75

    Diogo Assumpo Rezende de Almeida,76 na mesma linha, fundamenta a tendncia de maiorvalorao da prova pericial com base na confiana que o juiz deposita no perito, indicado por ele, ena falta de requisitos objetivos a serem preenchidos durante a produo da prova pericial paraverificao da qualidade cientfica e tcnica do resultado.

    Flvio Mirza Maduro entende que o ofcio judicante transferido para o perito, porque seu laudo,consequncia da prova pericial/cientfica ininteligvel. O resultado que o juiz acaba acatando aopinio do perito integralmente.77

    A falta de exigncia da boa delimitao do objeto da prova, da justificativa de sua realizao e daindicao das qualidades que se esperam do expert do causa produo automatizada eburocrtica da prova, que deve ser evitada. Por isso, buscou-se robustecer a fundamentao dapropositura da prova pericial, do seu juzo de admissibilidade e da sua valorao. A sentena nopode servir apenas homologao do resultado da percia, competindo ao juiz a anlise crtica dosfundamentos tcnico-cientficos trazidos ao processo, inclusive pelos peritos das partes, por seusassistentes, ou por via de estudos tcnicos.

    A exigncia de delimitao do objeto da percia um instrumento que auxilia o controle das

    atividades e de atuao do perito, bem como dos valores dos honorrios a serem estimados.Nossa proposta reverter um quadro de possvel burocratizao na produo da prova pericial, decomodismo do juiz frente ao resultado da prova pericial e do receio das partes com represlias do

    juzo e dos peritos, quando do controle da produo da prova, a partir da aproximao do debate dosinteressados, j mencionado acima, e com regras sobre o contedo do laudo pericial.

    A parte que requerer a prova dever indicar, sob pena de rejeio, o respectivo objeto, enunciandoas questes de fato que pretender ver esclarecidas atravs da diligncia, bem como especificar area do saber tcnico, cientfico ou especializado de que o perito deve ter conhecimento (art. 127 c/cart. 49, 3., e art. 53, II). A parte contrria ir se manifestar (art. 128) e em seguida o juiz, emdeciso fundamentada, definir o objeto, propor e deferir os quesitos que considere teis apurao da verdade, seguindo um calendrio proposto para o desenvolvimento do trabalho, quegaranta a boa marcha do processo, evitando o eventual perecimento do objeto ou demoras

    injustificveis na produo da prova e a atuao responsvel dos peritos, equiparados aosfuncionrios pblicos para fins penais (art. 124 c/c 129, 6.).

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    A deficincia ou culpa dos peritos punvel com a reduo ou revogao da remuneraoinicialmente arbitrada (art. 129 5.), com as sanes previstas no art. 7., 1.. Alm disso, o peritopode responder pelos danos que causar parte, estando sujeito inabilitao de dois a cinco anos,para atuar em outras percias, bem como imediata excluso do seu nome do cadastro do tribunal(art. 125). Para garantir a ampla defesa do perito, o controle do seu exerccio profissional ser de

    competncia do rgo fiscalizador da respectiva profisso (art. 125, 1.). Quando da inabilitao, osmotivos ficaro registrados no histrico do profissional ou rgo tcnico ou cientfico no cadastro dotribunal (art. 125, 2.). Previmos a possibilidade de substituio do perito, no art. 131, caso nocumpra o encargo, ocasio em que ainda o juiz comunicar a ocorrncia corporao profissionalrespectiva e sero restitudos os valores recebidos pelo trabalho no realizado, sob pena de o peritoficar sujeito inabilitao (art. 131, 1.). Para que a parte no seja prejudicada indevidamente,acrescentamos o 2. que dispe: No ocorrendo a restituio voluntria de que trata o 1., aparte