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Page 1: A RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO PENAL · Web viewA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO PENAL E DA PRISÃO PROVISÓRIA Hélio Soares Junior SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO. 2 DA CUSTÓDIA CAUTELAR

A RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO PENAL E DA PRISÃO PROVISÓRIA

Hélio Soares Junior1

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO. 2 DA CUSTÓDIA CAUTELAR E DA FALTA DE FIXAÇÃO DE

UM PRAZO PARA A DURAÇÃO DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. 3 PRINCÍPIO DA

RAZOABILIDADE. 4 SÚMULAS DO STJ E O EXCESSO DE PRAZO. 5

PRAZO PARA AS PRISÕES CAUTELARES E O PRAZO JURISPRUDENCIAL DE

81 DIAS. 6 APLICAÇÃO DO ART. 5°, INCISO LXXVIII DA CONSTITUIÇÃO

FEDERAL PARA A ABSOLVIÇÃO DE ACUSADOS. 7 EXCESSO PRAZAL E A

ANTECIPAÇÃO EXECUTÓRIA DA SANÇÃO PENAL. 8 PRAZO DE 120 DIAS DE

DURAÇÃO DA PRISÃO PROVISÓRIA: APLICAÇÃO DO ART. 8° DA LEI

9.034/95. 9 CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.

.

1. Introdução.

Para a discussão da presente temática parece sumamente relevante uma

incursão pelo estudo de posições jurisprudenciais, incluindo a "regra dos 81 dias" e as

questionáveis súmulas do Superior Tribunal de Justiça acerca do tema.

A proposta do presente artigo é procurar responder quanto tempo deve

durar o processo penal e a prisão cautelar preventiva, fazendo uma leitura do art. 5º,

inciso LXXVIII da Lex Mater.

De conteúdo eminentemente prático, não se pretende um trabalho de

cunho exaustivo, apesar de preocupar-se com a discussão de posições doutrinárias

indispensáveis para a compreensão do tema. Busca-se aliar teoria e prática, focando no

dia a dia dos operadores do Direito na seara criminal.

2. Da custódia cautelar e da falta de fixação de um prazo para a duração da

instrução criminal.

1 Bacharelando em Direito pela Universidade Salvador – UNIFACS e estagiário do Ministério Público Federal.

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A prisão provisória dos cidadãos deve ser de caráter excepcional,

consoante a Magna Carta. Quando for cabível a prisão cautelar, esta deve durar um

lapso razoável, para que não se converta numa antecipação de pena.

A propósito, sobre o assunto, Luigi Ferrajoli (2002, p. 443) acentua: “para Hobbes, a prisão preventiva não é uma pena mas um ‘ato de hostilidade’ contra o cidadão, de modo que ‘qualquer dano que faça um homem sofrer, com prisão ou constrição antes que sua causa seja ouvida, além ou acima do necessário para assegurar sua custódia, é contrário à lei da natureza’. Para Beccaria, ‘sendo a privação da liberdade uma pena, não pode preceder a sentença senão quando assim exigir a necessidade’: precisamente, a ‘custódia de um cidadão até que seja julgado culpado, ... deve durar o menor tempo e deve ser o menos dura possível’ e ‘não pode ser senão o necessário para impedir a fuga ou não ocultar a prova do crime’. Para Voltaire, ‘o modo pelo qual em muitos Estados se prende cautelarmente um homem assemelha-se muito a um assalto de bandidos’. Analogamente, Diderot, Filangieri, Condorcet, Pagano, Bentham, Constant, Lauzé Di Peret e Carrara denunciam com força a ‘atrocidade’, a ‘barbárie’, a ‘injustiça’ e a ‘imoralidade’ da prisão preventiva, exigindo sua limitação, tanto na duração como nos pressupostos, aos casos de ‘estrita necessidade’ do processo”.

O professor Rogério Lauria Tucci desde 1993 já ensinava sobre a

necessidade de fixação de um prazo para o término da instrução criminal, quando o

Paciente encontrar-se preso:

“À falta de uma definição legal precisa sobre os prazos de duração da prisão cautelar e de encerramento do processo comum, e considerando que, por razões de ordem pública, convém, aos sujeitos processuais, o rápido desfecho da ação penal, principalmente ao Paciente preso em virtude da excepcionalidade do título que sacrifica a sua liberdade, incumbiu-se a jurisprudência de estabelecer um parâmetro temporal para tentar equilibrar, de forma justa, as duas situações, e tomou por base a seqüência das atividades processuais a serem realizadas nos limites de tempo estabelecidos no Código de Processo Penal, concluindo que o desfecho do processo comum em que o Paciente estivesse preso cautelarmente  deveria ocorrer em 81 dias, com a entrega da prestação jurisdicional. Essa construção decorre do necessário respeito à garantia constitucional do devido processo legal (CF, art. 5°, inciso LIV), que tem como um dos seus significados “o direito ao processo sem dilações indevidas”, como corolário do processo legal, assegurado ao membro da comunhão social por norma de aplicação imediata.” (1993, p. 105/106)

3. Princípio da Razoabilidade.

Sabe-se que em relação ao excesso prazal, a jurisprudência dominante é

no sentido de ser aplicado o denominado principio da razoabilidade, segundo o qual, na

análise daquele, devem ser levados em conta diversos fatores, a exemplo da

complexidade da causa, número de réus, expedição de precatórias etc.

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A razoabilidade na duração do processo, muito antes da Emenda

Constitucional n° 45/2004, foi extraída das normas da Convenção Americana de

Direitos Humanos, também conhecida como Pacto de San José da Costa Rica, do qual o

Brasil é signatário (Decreto Legislativo n° 27/92), que assegura, no art.8°:

Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável por um juiz ou tribunal, independente e imparcial estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer natureza.

Trata-se de norma de aplicação imediata, por força do que dispõe o art.

5º, §§ 1º e 2º, da Constituição Federal:Art. 5º (...)

§ 1º - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.

§ 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

Para juristas de escol, a garantia da razoável duração do processo já

estava positivada na Constituição desde a sua promulgação. Vale trazer à colação as

sábias palavras de Alexandre de Moraes:A EC nº 45/04 (Reforma do Judiciário) assegurou a todos, no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. Essas previsões – razoável duração do processo e celeridade processual -, em nosso entender, já estavam contempladas no texto constitucional, seja na consagração do devido processo legal, seja na previsão do princípio da eficiência aplicável à Administração Pública (CF, art. 37, caput). (, 2005, p. 94.)

Com a promulgação da Emenda Constitucional n°45, de 08/12/2004, a

celeridade e duração razoável do processo passaram a ser determinações constitucionais

expressas (art. 5°, inciso LXXVIII), verbis:

A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. (Inciso acrescentado pela Emenda Constitucional n° 45, de 08.12.2004, DOU 31.12.2004).

Grandiosa é a lição de Humberto Theodoro Júnior acerca da razoável

duração do processo:

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“trata-se de uma aproximação com o ideal do processo justo que entre os constitucionalistas contemporâneos funciona como um aprimoramento da garantia do devido processo legal. Para merecer essa nomen iuris, a prestação jurisdicional, além de atender aos requisitos tradicionais – juiz natural, forma legal, contraditório e julgamento segundo a lei – têm de proporcionar à parte um resultado compatível com a efetividade e a presteza”. (2005, p. 37. )

Aury Lopes Jr assim discorre sobre a celeridade processual:O direito a um processo sem dilações indevidas (ou de ser julgado num prazo razoável) é "jovem direito fundamental", ainda pendente de definições e mesmo de reconhecimento por parte dos tribunais brasileiros, em geral bastante tímidos na recepção de novos (e também de "velhos") direitos fundamentais, mas que já vem sendo objeto de preocupações há bastante tempo por parte do Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH), e dos sistemas processuais europeus. (2004, p. 219-245)

Paulo Rangel, com sua peculiar maestria, afirma:

“A regra é inócua. Não diz nada. Não diz o que é prazo razoável de um processo. Trata-se de uma norma programática. Não possui instrumentalidade efetiva. Achar que um processo foi feito para andar rápido é ingenuidade de quem não conhece o sistema judicial brasileiro. (...) É necessário o tempo para que haja reflexão sobre os fatos.”(2005, p. 45)

Socorremo-nos mais uma vez de Aury Lopes Júnior:

“Em síntese, o art. 5°, LXXVIII, da Constituição – incluído pela Emenda Constitucional n. 45 – adotou a doutrina do não prazo, fazendo como que exista uma indefinição de critérios e conceitos. Nessa vagueza, cremos que quatro deverão ser os referenciais adotados pelos Tribunais brasileiros, a exemplo do que já acontece nos TEDH e na CADH: - complexidade do caso; - atividade processual do interessado (imputado), que obviamente não poderá se beneficiar de sua própria demora; a conduta das autoridades judiciárias como um todo (polícia, Ministério Público, juízes, servidores, etc.); princípio da proporcionalidade. Ainda não é o modelo mais adequado, mas enquanto não se tem claros limites temporais por parte da legislação interna, já representa uma grande evolução.”(LOPES; p. 115/116)

O legislador foi omisso, ao não fixar qual seria o prazo considerado

razoável para a duração de um processo criminal.

Para Aury Lopes Jr:A demora na prestação jurisdicional constitui um dos mais antigos problemas da Administração da Justiça. [...]Os principais fundamentos de uma célere tramitação do processo, sem atropelo das garantias fundamentais, é claro, estão calcados no respeito à dignidade do acusado, no interesse probatório, no interesse coletivo no correto funcionamento das instituições, e na própria confiança na capacidade da Justiça de resolver os assuntos que a ela são levados, no prazo legalmente considerado como adequado e razoável (grifo nosso). (LOPES JR, Aury, op. cit., p. 225-226.)

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Sobreleva ressaltar que o denominado critério da razoabilidade é um

método de interpretação, inerente ao devido processo legal, e também ao direito a um

julgamento sem dilações indevidas, não se confundindo com a exigência de que a lei

deve ser razoável e proporcional (DELMANTO, 2001, p. 405).

4. Súmulas do STJ e o excesso de prazo.

O Egrégio Superior Tribunal de Justiça consolidou seu entendimento

através de súmulas, as quais procuram afastar em certas hipóteses o argumento de haver

excesso de prazo no processo criminal, in verbis: Com a pronúncia resta superado o alegado constrangimento ilegal por excesso de prazo na instrução (Súmula nº 21-STJ).

"Encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de constrangimento ilegal por excesso de prazo." (Súmula n° 52 – STJ)

Não há constrangimento ilegal por excesso de prazo se a demora, em feito complexo, decorre de requerimentos da própria defesa (Súmula nº 64-STJ).

A aplicação dessas súmulas não pode ser absoluta, uma vez que todos os

acusados têm o direito, de matriz constitucional, à finalização do processo dentro de um

prazo razoável, não devendo aguardar presos, indefinidamente, a conclusão da instrução

criminal, com vistas ao devido processo legal.

Diante desta situação, o Supremo Tribunal Federal não deixou passar ao

largo essa discussão. Em inúmeros arestos, o Maximus Praetorium afirmou o direito

constitucional a um processo sem dilações indevidas.

Trago à colação alguns arestos do Altissimus Praetorium:EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE PRAZO NÃO ATRIBUÍDO AO RÉU. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO. PRECEDENTES. HABEAS CORPUS CONCEDIDO PARA REVOGAR A PRISÃO PREVENTIVA DO PACIENTE. 1. A jurisprudência deste Supremo Tribunal firmou o entendimento de que a prisão por sentença de pronúncia sujeita-se ao limite da razoabilidade, não se permitindo o seu prolongamento por tempo indefinido. A demora injustificada para encerramento do processo criminal, sem justificativa plausível ou sem que se possam atribuir ao Réu as razões para o retardamento daquele fim, ofende princípios constitucionais, sendo de se enfatizar o da dignidade da pessoa humana e o da razoável duração do processo (art. 5º, inc. III e LXXVIII, da Constituição da República). A forma de punição para quem quer que seja haverá de ser aquela definida legalmente, sendo a mora judicial, enquanto preso o Réu ainda não condenado, uma forma de punição sem respeito ao princípio do devido processo legal. 3. Habeas corpus concedido. (HC 87721 / PE. Órgão Julgador: Primeira Turma. Relatora: Ministra Carmen Lúcia. Julgado em 15 de agosto de 2006. Publicação: 07 de dezembro de 2006, p. 00052).

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EMENTA: Prisão por pronúncia: excesso de prazo, não atribuível à Defesa, dado o decurso de mais de cinco anos da pronúncia, sem previsão de julgamento pelo Tribunal do Júri, e que excede o limite da razoabilidade: deferimento de liberdade provisória ao paciente: extensão aos co-réus que se encontram em situação de todo assimilável. (HC 90022 / SP. Órgão Julgador: Primeira Turma. Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Julgado em 13 de fevereiro de 2007. Publicação: 09 de março de 2007, p. 00043).

EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE PRAZO. SENTENÇA DE PRONÚNCIA. PREJUDICIALIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. Evidenciado que a prisão preventiva do paciente perdura por mais de dois anos e cinco meses, sem que a defesa tenha concorrido para esse excesso de prazo, a decisão pela prejudicialidade da impetração, face à superveniência da sentença de pronúncia, traduz situação expressiva de constrangimento ilegal. Ordem concedida. (HC 86980 / SP. Órgão Julgador: Segunda Turma. Relator: Ministro Eros Grau. Julgado em 15 de agosto de 2006. Publicação: 27 de outubro de 2006, p. 00063).

“O encerramento da instrução criminal supera o excesso de prazo para a prisão processual que antes dele se tenha verificado, mas não elide o que acaso se caracterize pelo posterior e injustificado retardamento do término do processo.”(RHC 71.954/PA, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - grifei)

EMENTA: Habeas Corpus. 2. Decreto de custódia cautelar. 3. Alegação de excesso de prazo. 4. Demora superior a um ano, não provocada pela própria defesa e exclusivamente imputável ao aparelho judiciário e a seus órgãos auxiliares. 5. Precedentes. 6. Ordem concedida. (HC 87164 / RJ; Rel. Min. GILMAR MENDES; publicado no DJ 29-09-2006 PP-00067 e no EMENT VOL-02249-09 PP-01647)

“Prisão por pronúncia: duração que, embora não delimitada em lei, sujeita-se ao limite da razoabilidade (...).” (HC 83.977/RJ, Rel. p/ o acórdão Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - grifei)

O Colendo Superior Tribunal de Justiça, atualmente, em algumas

decisões, vem flexibilizando a aplicação das súmulas linhas acima referidas, sempre o

fazendo com supedâneo no inciso LXXVIII do art. 5º da Constituição Federal, inserido

pela Emenda Constitucional 45/2005:PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. 1. DECRETO DE PRISÃO PREVENTIVA. INIDONEIDADE DA FUNDAMENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA. INDICAÇÃO DE ELEMENTOS CONCRETOS A JUSTIFICAR A PRISÃO. 2. EXCESSO DE PRAZO. DILIGÊNCIAS COMPLEMENTARES REQUERIDAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. MAIS DE UM ANO PARA CUMPRIMENTO. FLEXIBILIZAÇÃO DO TEOR DA SÚMULA Nº52. GARANTIA DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO. RECURSO PROVIDO. 1. Não padece de ilegalidade o decreto prisional lastreado em elementos concretos a aconselhar a medida. 2. Ainda que encerrada a instrução, é possível reconhecer o excesso de prazo, diante da garantia da razoável duração do processo, prevista no artigo 5º, inciso LXXVIII da Constituição. Reinterpretação da Súmula nº 52 à luz do novo dispositivo. 3. Recurso provido.(RHC 20566 / BA; rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA; Órgão Julgador T6 - SEXTA TURMA; publicado no DJ 25.06.2007 p. 300)

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5. Prazo jurisprudencial de 81 dias para as prisões cautelares.

Antiga jurisprudência pátria estabeleceu o prazo de 81 dias para a

conclusão da instrução criminal, como se vê dos arestos abaixo coligidos:Habeas Corpus. Processo Penal. Excesso de prazo. Constrangimento ilegal. O prazo para encerramento da instrução criminal conta-se separadamente. Precedentes. A demora na formação da culpa, excedendo os 81 dias, sem motivo dado pela defesa, caracteriza constrangimento ilegal. Habeas deferido.” (JSTF 268/285)

“PROCESSUAL PENAL. AÇÃO PENAL. PRISÃO PROCESSUAL. DEMORA NO JULGAMENTO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. A jurisprudência pretoriana, interpretando sistematicamente as normas que informam o processo penal pertinentes ao sumário de culpa, construiu o entendimento de que, estando o Réu preso, deve a instrução criminal ser encerrada no prazo máximo de 81 dias, configurando o constrangimento ilegal o excesso de prazo, susceptível de correção por via de habeas-corpus. Mesmo com o encerramento do sumário, perdura o constrangimento ilegal se ocorre injustificável demora no julgamento do feito, estando os Réus submetidos à prisão processual. Habeas-corpus concedido”. (HC 8371/RJ – 1998/0098832-7 – DJ 20.09.1999 – Relator para acórdão Ministro Vicente Leal – 6ª Turma) (grifos nossos).

Este entendimento pretoriano é totalmente incompatível com a

necessidade de uma melhor apuração de crimes graves, nos quais há vários acusados,

com expedição de cartas precatórias, bem como os de grande complexidade, os quais

demandam perícias demoradas, oitiva de muitas testemunhas, com acareações,

instauração de incidentes (insanidade mental, dependência toxicológica, falsidade

documental) etc.

Deve-se ressaltar, da mesma forma, que a custódia cautelar, a despeito do

sempre alegado excesso prazal, quando prolongar-se em razão de sua primordial

necessidade, deve ser analisada sob a égide do princípio da proporcionalidade, e não sob

o frio cálculo que jurisprudencialmente instituiu o prazo de 81 dias para encerramento

da instrução criminal.

O referido prazo não é absoluto e depende de vários fatores, é uma

construção jurisprudencial, mas o fato de o processo não terminar neste prazo não

significa que todos os presos tenham de ser liberados, não tendo tal circunstância

passado despercebida ao Superior Tribunal de Justiça. Seguem julgados acerca da

matéria:“PROCESSUAL PENAL. SUMÁRIO DE CULPA. PRAZO. EXCESSO. RAZOABILIDADE. “HABEAS-CORPUS”. CONTRANGIMENTO. – A construção jurisprudencial que estabeleceu o prazo de 81 dias para a

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formação do sumário de culpa na hipótese de réu submetido a prisão processual deve ser concebida sem rigor, sendo admissível o excesso de tempo em circunstâncias razoavelmente justificadas. – Recurso ordinário desprovido”. (STJ – RHC 6486/RJ)

“Na verificação de eventual excesso de prazo na formação da culpa vigora o princípio da razoabilidade”. (STJ – HC 6834/AP)

Deve-se ter em conta que para se aferir a razoabilidade da duração da

prisão provisória faz-se imprescindível a aplicação do princípio da proporcionalidade.

Nesse sentido é a doutrina abalizada de Aury Lopes Júnior e Gustavo

Henrique Badaró (2006, p. 56/57):A natureza do delito e a pena a ele cominada, enquanto critérios de razoabilidade de duração do processo, representam, em essência, o critério da proporcionalidade. Processos que tenham por objeto delitos mais graves e, consequentemente, apenados mais severamente, poderão durar mais tempo do que outros feitos por delitos de pequena gravidade. Todavia, embora o critério da proporcionalidade seja fundamental, na ponderação da duração do processo em relação ao binômio 'natureza do delito – pena cominada', não poderá ser aceito , de forma isolada, como índice de razoabilidade. Levado ao extremo, delitos apenados com prisão perpétua teriam como razoável um processo que durasse toda a vida.

Quando o excesso de prazo for justificado e não for irrazoável, sendo o

processo impulsionado devidamente, não chega a se configurar constrangimento ilegal.

Não basta a simples ultrapassagem de prazos legais para que a prisão seja considerada

ilícita, porquanto a realização do processo criminal não é um singelo raciocínio de

lógica formal.

6. Aplicação do art. 5º, inciso LXXVIII da Constituição Federal para a absolvição

de acusados.

Os Desembargadores integrantes da Sexta Câmara Criminal do Tribunal

de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, à unanimidade, deram provimento à

apelação de n° 70019476498 e absolveram um acusado, com fundamento no art. 5º,

LXXVIII, da Constituição Federal e com base no artigo 386, VI, do Código de Processo

Penal.

O tempo transcorrido, muitas vezes, como considerado neste acórdão

revolucionário, fere de morte a razoabilidade na duração do processo, influindo,

destarte, na solução final. Verbis:

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EMENTA:  ROUBO. TRANSCURSO DE MAIS DE SEIS ANOS ENTRE O FATO E A SENTENÇA. PROCESSO SIMPLES, SEM COMPLEXIDADE. ABSOLVIÇÃO. 1. O tempo transcorrido, no caso em tela, sepulta qualquer razoabilidade na duração do processo e influi na solução final. Fato e denúncia ocorridos há quase sete anos. O processo, entre o recebimento da denúncia e a sentença demorou mais de cinco anos. Somente a intimação do Ministério Público da sentença condenatória tardou quase de cinco meses. Aplicação do artigo 5º, LXXVIII. Processo sem complexidade a justificar a demora estatal. 2. Vítima e réu conhecidos; réu que pede perdão à vítima, já na fase policial; réu, vítima e testemunha que não mais lembram dos fatos. 3. Absolvição decretada. RECURSO DEFENSIVO PROVIDO. (Apelação Crime Nº 70019476498, Sexta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nereu José Giacomolli, Julgado em 14/06/2007)

Para LOPES Jr. e BADARÓ, quando ocorrer excesso de prazo

irrazoável, a melhor solução compensatória à violação do direito a um processo sem

dilações indevidas seria a extinção do feito, como no suso comentado acórdão:“(...) a extinção do feito é a solução mais adequada, em termos processuais, na medida em que, reconhecida a ilegitimidade do poder punitivo pela própria desídia do Estado, o processo deve findar. Sua continuação, além do prazo razoável, não é mais legítimo e vulnera o Princípio da Legalidade, fundante do estado de Direito, que exige limites precisos, absolutos e categóricos – incluindo-se o limite temporal – ao exercício do poder penal estatal” (2006, p. 123 a 126).

Realmente, revela-se acertada a decisão do Tribunal de Justiça do Rio

Grande do Sul, haja vista a dilatada extensão temporal entre o fato delituoso e a

sentença.

É cediço que a Carta Magna não fixou prazos para a duração de um

processo, nem tampouco normas infraconstitucionais o fizeram, desta maneira, ficou ao

prudente critério do julgador, em cada caso concreto, a definição do que seria um prazo

razoável num feito criminal.

7. Excesso prazal e a antecipação executória da sanção penal

A prisão cautelar por tempo excessivo, muitas vezes nem estando

preenchidos os requisitos da prisão preventiva, é um mal. Outras vezes, retira-se a

liberdade de um indivíduo, apossando-se do seu tempo, apenas pela gravidade abstrata

do delito que lhe é imputado. O mais repugnante é que em demasiadas ocasiões esse

apossamento é ilícito e, sempre, dolorosamente sempre, não se pode voltar ao estado

primordial.

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A lição de Afrânio Silva Jardim é bastante ilustrativa quanto ao tema em

comento:

“não pode restar a menor dúvida de que a prisão em nosso direito tem a natureza acauteladora, destinada a assegurar a eficácia da decisão a ser prolatada afinal, bem como a possibilitar regular instrução probatória. Trata-se de tutelar os meios e os fins do processo de conhecimento e, por isso mesmo, de tutela da tutela” (1995, p. 360.)

A prisão preventiva não pode, em tempo algum, fazer as vezes de uma

prisão definitiva, com reconhecimento antecipado da culpa, pois não há nela um juízo

de culpabilidade.

8. Prazo de 120 dias de duração da prisão provisória: aplicação do art. 8° da Lei

9.034/95

O art. 8° da Lei de n° 9.034/95 estabelece que “o prazo para

encerramento da instrução criminal, nos processos por crime de que trata esta Lei, será

de 81 (oitenta e um) dias, quando o réu estiver preso, e de 120 (cento e vinte) dias,

quando solto”. Em face disto surgiram dois entendimentos quanto à aplicação desta

regra. Alguns juristas aduzem que em razão de a Lei 9.034/95 ser uma norma especial

ela só deveria ser aplicada nas hipóteses de crimes praticados por organizações

criminosas. Outra corrente entende que ela deve ser aplicada como regra geral, isto é,

aos crimes não previstos na referida legislação.

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios vem entendendo

pela inaplicabilidade do art. 8° da Lei 9.034/95 a processos criminais atinentes aos

crimes em geral:Habeas corpus. Tráfico de entorpecentes. Prisão preventiva. Liberdade provisória. Excesso de prazo. Instrução criminal encerrada.1. Liberdade provisória somente se concede a quem é preso em flagrante (par. ún. do art. 310 do CPP). 2. O encerramento da instrução criminal em oitenta e um dias, previsto no art. 8º da Lei nº 9.034/95, somente é aplicável aos processos relativos a crimes praticados por organizações criminosas. 3. "Encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de constrangimento ilegal por excesso de prazo" (enunciado nº 52 da súmula do STJ).(20070020067952HBC, Relator GETULIO PINHEIRO, 2ª Turma Criminal, julgado em 05/07/2007, DJ 25/07/2007 p. 130)

Daiana Delamar Agostinho, Dario Alexandre Nóbrega, Leandro Gornicki

Nunes, Paolo Alessandro Farris e Roberto Gonçalves de Freitas (2007, p. 20) assim se

pronunciam:

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Dispõe em seu art. 8º (com redação dada pela Lei nº 9.303/96) que o prazo para encerramento da instrução será de 81 dias, quando o réu estiver preso, e de 120 dias, quando solto. Em face do art. 8º, da Lei nº 9.034/95, pode-se afirmar que a omissão do Código de Processo Penal, no que tange ao prazo rígido para encerramento da instrução criminal, está superada. Por força do referido dispositivo legal, independentemente dos motivos que vierem a dar ensejo à inobservância do prazo de 120 dias para encerramento da instrução criminal, deverá o réu ser colocado em liberdade. Torna-se despicienda qualquer discussão em torno do prazo de 81 dias, assim como buscar justificativa à manutenção do acusado no ergástulo quando extrapolado o lapso temporal máximo (120 dias) previsto para as hipóteses de réu solto.

A aplicação da referida norma aos crimes não previstos na Lei nº 9.034/95 encontra esteio nos princípios da isonomia, da proporcionalidade, e na analogia (CPP, art. 3º). Ora, se a Lei nº 9.034/95 trata de crimes complexos perpetrados por uma dita “criminalidade organizada” ? segundo os idealizadores da “obra prima” ? e o prazo máximo para encerramento da instrução (em se tratando de réu solto) é de 120 dias, nada mais justo e isonômico (CR/88, art. 5o) que se aplique tal limite de tempo aos casos relacionados com os crimes (ditos) comuns.

Antonio Scarance Fernandes (1995, p. 3) defende a aplicação de tal

dispositivo a todos os processos por analogia:A última questão deve ter resposta positiva. Falta no CPP a previsão de um prazo máximo de prisão. Assim, admissível que, por interpretação analógica, aplique-se a norma a todos os processos, suprindo-se a lacuna.Ademais, é solução razoável, pois, se em qualquer crime, porque resultante de quadrilha ou bando, poderá o tempo de prisão ser regulado por esse prazo de cento e oitenta dias, porque o mesmo delito deveria, quando não derivado de quadrilha ou bando – e por isso, em princípio, menos grave – ser objeto de prazo superior.Enfim, o tempo de prisão passa agora a ter um prazo máximo de cento e oitenta dias, o que representa orientação significativa no sistema brasileiro.A lei, que parecia à primeira vista, trazer maior rigor quanto ao tempo permitido de prisão, acabará representando vantagem aos réus que, antes, não tinham a garantia de um prazo máximo de prisão, mas de um marco de oitenta e um dias, a partir do qual era verificada a ocorrência de constrangimento ilegal em cada caso concreto.Agora, mantido esse prazo mínimo, há um prazo máximo, aplicável a todos os crimes, por analogia.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul já decidiu favoravelmente à

observância do limite máximo de 120 dias previsto no art. 8° da Lei nº 9.034/95 para a

prisão provisória. Veja-se:

EMENTA:  PRISÃO PROVISÓRIA. PRAZO PARA O ENCERRAMENTO DO PROCESSO. PREVISÃO EM LEI ESPECIAL QUE DEVE SER APLICADA A TODOS OS CASOS. O art. 8º da Lei 9.034/95, ao estabelecer o prazo de cento e vinte dias para o encerramento dos processos, fixou o tempo máximo de prisão provisória para todas as hipóteses (art. 648, II, CPP). Ou seja, o prazo de oitenta e um dias continua sendo um marco, para se avaliar eventual constrangimento ilegal. E o cento e vinte dias passam a ser o limite máximo, quando não mais se admitirá qualquer excesso, ficando o Juiz impedido de justificar o atraso, ainda que em razão de situações especiais. A situação em julgamento se enquadra na hipótese, uma vez que o paciente está detido a mais de oito meses, ultrapassando, inclusive, o prazo

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mais dilatado admitido, ou seja, de cento e oitenta dias. Ademais, o atraso na conclusão do procedimento com relação ao paciente se deve à erronia do juizado. DECISÃO: Habeas-corpus concedido. Unânime. (Habeas Corpus Nº 70015566607, Sétima Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sylvio Baptista Neto, Julgado em 29/06/2006)

O art. 3o do Código de Processo Penal diz que “a lei processual penal

admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos

princípios gerais de direito”.

A analogia é um recurso utilizado no processo de integração do direito,

utilizado para suprir as lacunas legais.

A abalizada lição de Carlos Maximiliano (2002, p.253) é esclarecedora a

respeito da analogia. Veja-se:Esta se baseia na presunção de que duas coisas que têm entre si um certo número de pontos de semelhança, possa, consequentemente assemelhar-se quanto a um outro mais. Se entre a hipótese conhecida e a nova a semelhança se encontra em circunstância que se deve reconhecer como essencial, isto é, como aquela da qual dependem todas as consequências merecedoras de apreço na questão discutida; ou, por outra, se a circunstância comum aos dois casos, com as consequências que da mesma decorrem, é a causa principal de todos os efeitos; o argumento adquire força de uma indução rigorosa

Acerca dos requisitos para a aplicação da analogia, valiosa é a lição de

Damásio de Jesus (2006, p. 51), a saber:Para que seja permitido o recurso à analogia exige-se a concorrência dos seguintes requisitos:1°) que o fato considerado não tenha sido regulado pelo legislador;2.° este, no entanto, regulou situação que oferece relação de coincidência, de identidade com o caso não regulado;3.°) o ponto comum às duas situações ( a regulada e a não prevista) constitui o ponto determinante na implantação do princípio referente à situação considerada pelo julgador (Asuá).

Não há qualquer óbice à aplicação analógica do art. 8° da Lei de

n° 9.034/95 aos processos criminais referentes a crimes comuns. A sua aplicação

configuraria uma analogia em bonam partem, ou seja, mais benéfica aos acusados.

O uso da analogia no caso em comento visa a dar máxima

efetividade aos comandos constitucionais e aos direitos fundamentais, em especial ao

princípio da presunção de inocência.

9. Conclusão

Como a Justiça não opera com a celeridade que dela se espera, rapidez

ainda mais necessária quando se trata da liberdade da pessoa humana, muitos terminam

por cumprir integralmente suas penas antes mesmo de condenados.

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O tempo de prisão cautelar dilatado é deletério para toda a sociedade,

uma vez que um indivíduo que pode ser inocentado estará sofrendo danos morais e

físicos, além de perder o emprego e ficar longe da família e dos amigos, o que poderá

gerar conseqüências irreversíveis àquele que for absolvido, haja vista que o tempo em

que passar na prisão não lhe será devolvido.

Uma resposta processual célere tem inúmeras vantagens. A saber: facilita

a produção (colheita) de provas, antes que elas desapareçam ou que as testemunhas

esqueçam dos fatos, aumenta a confiança da população no Poder Judiciário, e diminui

consideravelmente a sensação de impunidade, entre outros benefícios incomensuráveis.

É indispensável uma urgente reforma legislativa para que se estipule a

duração do processo penal, tendo como ponto basilar a duração das prisões cautelares,

entrementes, sem olvidar das situações anômalas, as quais, evidentemente, podem

ocorrer. Ressalte-se que a duração do processo não pode ser tão rápida a ponto de

cercear o direito à ampla defesa, ao contraditório e ao devido processo legal (art. 5º,

LIV, CF/88).

Ademais, há de se dar relevo que a duração prolongada da prisão

provisória afronta princípios constitucionais, especialmente, o da dignidade da pessoa

humana (art. 1º, III, CF/88), a presunção de inocência (art. 5º, LVII, CF/88) e razoável

duração do processo (art. 5º, LXXVIII, CF/88).

É tão absurdo o que acontece, hodiernamente, que se pode afirmar que o

excesso de prazo para a conclusão de um processo criminal é um verdadeiro mal da

justiça humana.

O processo não deve durar tanto, como se vê com uma freqüência

indesejada, nem tão pouco, como a regra dos 81 dias, haja vista ser necessária uma

avaliação casuística, a qual engloba o princípio da razoabilidade.

O mal reside na falta de uma lei que estabeleça claramente os prazos e os

motivos para a dilação do processo ou para a prisão cautelar. Caso os prazos fossem

fixados, evitar-se-ia este desconchavo que acontece iterativamente.

O réu/indiciado, que está preso em razão de uma prisão ante tempus, tem

direito público subjetivo de ser julgado num prazo razoável e, quando configurado

excesso irrazoável na duração desta prisão, não pode permanecer exposto a tal situação

de evidente abuso, ainda que o crime supostamente praticado seja considerado como

hediondo ou a este equiparado, para que, efetivamente, haja a mais lídima Justiça.

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Faz-se necessária a imediata fixação de um prazo máximo de duração das

prisões cautelares e do processo criminal, para que a norma insculpida no texto

constitucional tenha completa efetividade. Portanto, deve o legislador pátrio estabelecer

os referidos prazos, com critérios objetivos e razoáveis.

A solução mais adequada para que as prisões provisórias não se estendam

por prazo excessivo é que enquanto não estabelecido o prazo de duração da prisão ante

tempus deve-se aplicar analogicamente o art. 8° da Lei 9.034/95, sendo fixado como

prazo máximo de duração da prisão provisória 120 dias, dando-se máxima efetividade

aos direitos consagrados na Constituição Federal.

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