A NULIDADE DOS CONTRATOS TEMPORÁRIOS E A NÃO INCIDÊNCIA DE...

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A NULIDADE DOS CONTRATOS TEMPORÁRIOS E A NÃO INCIDÊNCIA DE FGTS PEDRO SOBRINO PORTO VIRGOLINO PROCURADOR DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO ENDEREÇO ELETRÔNICO: [email protected]

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A NULIDADE DOS CONTRATOS TEMPORÁRIOS E A NÃO

INCIDÊNCIA DE FGTS

PEDRO SOBRINO PORTO VIRGOLINO

PROCURADOR DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

ENDEREÇO ELETRÔNICO: [email protected]

Introdução

O objetivo deste artigo é definir se os servidores temporários contratados pela Administração

Pública mediante vínculo precário fazem jus a receber FGTS em se tratando de contratação

realizada fora do permissivo constitucional contido no inciso IX do art. 37 da CF.

A Constituição Federal no seu artigo 37, inciso IX, dispõe sobre a possibilidade de

contratação em caráter temporário de servidor com o fim de suprir “a necessidade temporária

de excepcional interesse público”, excepcionando a regra geral da exigência de concurso público

para o ingresso no serviço público (inciso II do mesmo artigo).

Com certa frequência tem aflorado no Judiciário Capixaba demandas propostas por

contratados a título precário, onde se pleiteai o pagamento por parte do Estado de FGTS.

Como fundamento, as ações invocam que a contratação foi realizada fora da hipótese descrita

no inciso IX do art. 37 da CF, o que acarretaria a nulidade dos vínculos firmados com a

administração, pois a atividade seria inerente a cargo efetivo a ser preenchido por concurso

público, na forma dos incisos II e III do art. 37 da CF. Ainda segundo aqueles que demandam

contra o Estado, a consequência da nulidade do vínculo seria o direito do contratado receber

FGTS, com espeque no art. 19-A da Lei nº 8.036/90.

Inicialmente, as ações eram movidas na Justiça Trabalhista, onde, com amparo no enunciado

363 do TST, os juízes estavam a conferir aos autores destas ações o direito ao depósito do

FGTS. Todavia, o STF passou a se manifestar pela incompetência da Justiça trabalhista

apreciar estas causas, determinando o envio dos autos à justiça comum estadual.

Desde a chegada da matéria na Justiça Capixaba, decisões contrastantes já foram proferidas.

Algumas delas conferindo o direito ao depósito do FGTS1, outras negando tal direito2. O

1 APELAÇÃO CÍVEL Nº 2934-33.2009.8.08.0028 RELATORA : DESª. SUBSTITUTA MARIANNE JÚDICE DE MATTOS RECORRENTE : ESTADO DO ESPÍRITO SANTO ADVOGADO : ALEXANDRE DALLA BERNARDINA RECORRIDO : ROSANIA MARIA MELO SILVA MAGISTRADO : ELIANA FERRARI SIVIERO ACÓRDÃO EMENTA. ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO TEMPORÁRIO. NULIDADE. FGTS. DIREITO AO RECEBIMENTO. 1. A declaração de nulidade do contrato de trabalho temporário firmado pelo Estado sem concurso público, após o advento da Constituição Federal de 1988, fora das hipóteses legais excepcionais da referida contratação, gera ao trabalhador o direito à percepção dos valores relativos aos depósitos de FGTS pelo período trabalhado. Precedentes do STJ e do STF (julgamento de repercussão geral). Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Desembargadores da QUARTA CÂMARA do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, à unanimidade, negar provimento ao recurso e julgar prejudicada a remessa necessária. Vitória (ES), Desembargador Presidente

ponto de dissenso e cerne da questão levantada nestes julgados é se ao contrato temporário,

que representa vínculo jurídico de natureza administrativa, deve ou não ser aplicado o

disposto no art. 19-A da Lei nº 8.036/90, em razão do disposto no art. 15, §2º da mesma lei e

também pelo que determina a CF.

Desembargadora Substituta MARIANNE JÚDICE DE MATTOS Relatora (TJES, Classe: Reexame Necessário, 28090029340, Relator: SAMUEL MEIRA BRASIL JUNIOR - Relator Substituto : MARIANNE JUDICE DE MATTOS, Órgão julgador: QUARTA CÂMARA CÍVEL , Data de Julgamento: 20/05/2013, Data da Publicação no Diário: 29/05/2013) Em igual sentido: ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. SUCESSIVAS RENOVAÇÕES. NULIDADE DO VÍNCULO. FGTS. DIREITO AO RECEBIMENTO. MULTA DE 40%. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. PAGAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A norma trabalhista do FGTS (art. 19-A, da Lei nº 8.036/90) é aplicável aos contratos temporários declarados nulos, conforme artigo 37, § 2º, da CF. Precedentes do STJ, em especial, RESp nº 1.110.848/RN, submetido à sistemática dos recursos repetitivos. 2. O reconhecimento da nulidade do contrato temporário, por violação ao artigo 37, inciso II, da CF, confere ao trabalhador o direito ao recebimento dos valores correspondentes ao FGTS, sem, entretanto, ensejar o pagamento da multa prevista no artigo 18, §§ 1º e 2º, da Lei 8.036/90. Inteligência do artigo 19-A, da Lei 8.036/90. 3. Recurso parcialmente provido. (TJES, Classe: Apelação, 38090001108, Relator: MAURÍLIO ALMEIDA DE ABREU - Relator Substituto : JORGE HENRIQUE VALLE DOS SANTOS, Órgão julgador: QUARTA CÂMARA CÍVEL , Data de Julgamento: 22/04/2013, Data da Publicação no Diário: 02/05/2013) 2 REMESSA NECESSÁRIA e APELAÇÕES CÍVEIS nº 0009059-04.2010.8.08.0021 REMTE. : MM. JUIZ DE DIREITO DA VARA DOS FEITOS DA FAZENDA PÚBLICA DE GUARAPARI/ES APTE./APDO. : MUNICÍPIO DE GUARAPARI APTE./APDO. : LUZIMARA MATOS RIBEIRO e OUTROS JUIZ : DR. UBIRAJARA PAIXÃO PINHEIRO RELATORA : DESª. ELIANA JUNQUEIRA MUNHÓS FERREIRA A C Ó R D à O EMENTA : REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÕES CÍVEIS. PRELIMINAR. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO INTERPOSTO PELO MUNICÍPIO DE GUARAPARI. NÃO RATIFICAÇÃO APÓS JULGAMENTO DOS EMBARGOS. NULIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO TEMPORÁRIO. AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE E AGENTE DE COMBATE ÀS ENDEMIAS. LEGISLAÇÃO FEDERAL ESPECÍFICA. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA SOMENTE É ADMITIDA EM CASO DE COMBATE A SURTO ENDÊMICO. DIREITO AO RECEBIMENTO DE VALORES REFERENTES AO FGTS. VERBAS RESCISÓRIAS INDEVIDAS. MUNICÍPIO É ISENTO AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS. 1) Preliminar ex officio. Não foram ratificadas as razões da apelação cível interposta pelo Município de Guarapari após a rejeição dos embargos de declaração opostos pela parte autora. Não conhecimento do recurso em razão da decisão proferida no Incidente de Uniformização de Jurisprudência nº 11.09.0010833. 2) A Lei Municipal nº 2.535/05, embora anterior à edição da Emenda Constitucional nº 51, de 14 de fevereiro de 2006, que acrescentou os §§4º e 5º ao art. 198, encerrou manifesta afronta ao arcabouço constitucional e legislativo federal, promulgando lei que autoriza a contratação temporária, à margem das situações excepcionais admitidas no art. 37, inciso IX e art. 16 da Lei Federal nº 11.350. 3) O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em recente julgamento do RE nº 596.478, reputou constitucional o disposto no art. 19-A da Lei nº 8.036/90 que assegura o direito ao FGTS ao trabalhador cujo contrato de trabalho seja declarado nulo por ofensa ao princípio do concurso público. 4) Não é reconhecido a estes, entretanto, o direito à percepção de verbas rescisórias trabalhistas, haja vista constituírem parte do sistema garantido e exclusivo do regime celetista. Afinal, ainda que reconhecida a nulidade da contratação, não se pode admitir que se transmude o seu regime para o trabalhista, a fim de lhes garantir as verbas pleiteadas, em total desconformidade com a normatização regente. 5) A sentença merece retoque no que se refere à condenação do Município ao pagamento das custas processuais, porquanto isento do pagamento, nos termos do art. 1º da Lei Estadual nº 9.900/12. ACORDA a Egrégia Quarta Câmara Cível, em conformidade da ata e notas taquigráficas da sessão, que integram este julgado, à unanimidade, (a) não conhecer do recurso interposto pelo Município de Guarapari; (b) conhecer e negar provimento ao recurso de apelação interposto por Luzimara Matos Ribeiro e outros e (c) conhecer da remessa necessária para reformar em parte a sentença, nos termos do voto da relatora. Vitória-ES, 22 de abril de 2013. DESEMBARGADOR PRESIDENTE DESEMBARGADORA RELATORA (TJES, Classe: Apelação / Reexame Necessário , 21100090592, Relator : ELIANA JUNQUEIRA MUNHOS FERREIRA, Órgão julgador: QUARTA CÂMARA CÍVEL , Data de Julgamento: 22/04/2013, Data da Publicação no Diário: 30/04/2013)

Fato é que a questão, de tão tormentosa - ao menos aqui no ES-, foi remetida ao Pleno do

tribunal, para, em incidente de uniformização de jurisprudência, por uma pá de cal neste

conflito. Este incidente foi suspenso, pois a corte local optou por aguardar a manifestação do

STF, para, enfim, ser firmada uma orientação do órgão máximo do Judiciário.

Até aonde foi possível pesquisar, o STF ainda não se pronunciou sobre a questão em si. Na

verdade, constatou-se que as decisões da justiça capixaba têm se valido, equivocadamente, de

precedentes do Pretório Excelso, que, embora tangenciem assunto correlato, não tratam

propriamente da matéria. Vê-se o desvirtuamento do que restou decidido no Recurso

Extraordinário nº 596.478 (adiante melhor comentado), onde foi reconhecida a

constitucionalidade do art. 19-A da Lei nº 8.036/90.

No seio do STJ já foram proferidas decisões tanto conferindo como negando o direito ao

FGTS em demandas promovidas por servidor temporário. Um destes precedentes, inclusive, é

proveniente de recurso especial movido contra acórdão do TJES. (AgRg no AgRg no REsp

1291647/ES), no qual o STJ reformou decisão da corte estadual que negara o pagamento do

FGTS. Mas, dita decisão não representa entendimento uniforme da Corte Federal, que possui

julgados em sentido contrário.

A solução desta controvérsia deve ser tratada em dois campos (1) na interpretação dos

dispositivos da Lei nº 8.036/90 e (2) na (in)compatibilidade constitucional de o servidor

temporário receber FTGS. Frisa-se que este artigo não tem a finalidade de avaliar a

constitucionalidade do art. 19-A da Lei 8036, mas apenas sua aplicabilidade aos servidores

temporários.

1- Da inaplicabilidade da Lei 8036/90 aos servidores temporários

O FGTS é conceituado por Sérgio Pinto Martins como

“[...] um depósito bancário vinculado, pecuniário, compulsório, realizado pelo empregador em favor do trabalhador, visando formar uma espécie de poupança para este, que poderá ser sacada nas hipóteses previstas em lei.” (p. MARTINS, 2006. p.27).

Foi originalmente previsto na Lei nº 5.107 como opção à estabilidade de emprego decenal

contida no inciso XII do art. 157 da Carta de 1946, dada, talvez, a inoperabilidade em

concreto da citada estabilidade, muito pouco atingida à época pela maior parte dos

empregados brasileiros, que, eram muitas vezes, despedidos antes de prestados dez anos de

serviço.

Pelo regime jurídico do FGTS, ao empregador cabia pagar percentual mensal que compunha o

fundo do empregado a ser utilizado, como regra, na hipótese de demissão, ao qual se acrescia

multa por conta também do empregador.3 Nas palavras de Sérgio Pinto Martins,

“[...] o objetivo principal do FGTS foi o de proporcionar a dispensa por parte do empregador, inclusive do empregado público, tendo o empregador de pagar apenas uma indenização sobre os depósitos, liberando-os para o saque. Assim, a empresa não tinha mais de arcar com a estabilidade do empregado, que, para ser despedido provocava ônus muito maior, pois só poderia ser dispensado mediante inquérito para apuração de falta grave, e, no caso este não apurasse a falta, o empregado retornaria ao serviço, ou teria direito a indenização em dobro do período trabalhado, o que era muito oneroso para a empresa.” (MARTINS, 2006, p. 11).

O regime alternativo de opção entre estabilidade ou FGTS foi recepcionado expressamente

pelo inciso XIII do art. 158 da CF de 1967. Norma esta repetida no inciso XIII do art. 165 da

Emenda Constitucional nº 1/69.

A Carta de 1988 regulou o FGTS no artigo 7º, inciso III, dentre o rol de direitos do

trabalhador urbano e rural. Foi o fim do regime alternativo, ressalvando-se a estabilidade

apenas aos trabalhadores que já a tinham adquirido até 05.10.1988. Hoje o FGTS é regido

pela Lei nº 8.036.

A indenização para despedida arbitrária ou sem justa causa, até que seja editada a lei

complementar referida no inciso I do art. 7º da CF, por determinação do art. 10, I do ADCT,

fica limitada a quatro vezes o percentual fixado no art. 6º, caput e §1º da Lei nº 5.107.

Para os servidores públicos regidos por regime jurídico de direito administrativo não foi

previsto FGTS (art. 39, §2º do CF), ficando assegurada a estabilidade aos nomeados a cargo

de provimento efetivo, na forma do art. 41 da CF.

3 “A finalidade da instituição do FTGS foi proporcionar reserva de numerário ao empregado para quando fosse dispensado da empresa, podendo inclusive sacar o FGTS em outras hipóteses na lei. Ao mesmo tampo, pretendia-se, com os recursos arrecadados, financiar a aquisição de imóveis pelo Sistema Financeiro da Habitação e até mesmo incrementar a indústria da construção civil.” (MARTINS, 2006, p. 11)

Dado característico do FGTS é que ele é relativo a relações jurídicas de natureza trabalhista,

tanto por sua roupagem constitucional, que o prevê como direito do empregado, como por seu

regramento infraconstitucional. Seu fato gerador é uma relação de emprego.

O artigo 15, caput, da Lei nº 8.036 define que o contribuinte do FGTS é o empregador, a

quem compete efetuar os depósitos mensais correspondentes a 8% da remuneração paga ou

devida ao trabalhador. Portanto, a nota de destaque do FGTS é sua vinculação à relação de

trabalho formada de um lado pelo empregador e do outro pelo trabalhador.

O §1º do art. 15 da lei em comento, diz que por empregador se entende

[...]a pessoa física ou a pessoa jurídica de direito privado ou de direito público, da administração pública direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que admitir trabalhadores a seu serviço, bem assim aquele que, regido por legislação especial, encontrar-se nessa condição ou figurar como fornecedor ou tomador de mão-de-obra, independente da responsabilidade solidária e/ou subsidiária a que eventualmente venha obrigar-se.

Logo, empregador é aquele que, nos moldes do §1º em questão, admite trabalhador a seu

serviço ou a quem, por lei especial, encontrar-se nessa condição, etc. Por seu turno, o §2º do

mesmo artigo diz que trabalhador é “[...] toda pessoa física que prestar serviços a empregador,

a locador ou tomador de mão-de-obra, excluídos os eventuais, os autônomos e os servidores

públicos civis e militares sujeitos a regime jurídico próprio.” Portanto, a própria lei 8036

excetua do conceito de trabalhador, para os fins nela definidos (vide caput), os eventuais,

autônomos e servidores públicos civis e militares sujeitos a regime jurídico próprio. Vale a

reprodução do caput e dos dois primeiros parágrafos:

Art. 15. Para os fins previstos nesta lei, todos os empregadores ficam obrigados a depositar, até o dia 7 (sete) de cada mês, em conta bancária vinculada, a importância correspondente a 8 (oito) por cento da remuneração paga ou devida, no mês anterior, a cada trabalhador, incluídas na remuneração as parcelas de que tratam os arts. 457 e 458 da CLT e a gratificação de Natal a que se refere a Lei nº 4.090, de 13 de julho de 1962, com as modificações da Lei nº 4.749, de 12 de agosto de 1965. § 1º Entende-se por empregador a pessoa física ou a pessoa jurídica de direito privado ou de direito público, da administração pública direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que admitir trabalhadores a seu serviço, bem assim aquele que, regido por legislação especial, encontrar-se nessa condição ou figurar como fornecedor ou tomador de mão-de-obra, independente da responsabilidade solidária e/ou subsidiária a que eventualmente venha obrigar-se.

§ 2º Considera-se trabalhador toda pessoa física que prestar serviços a empregador, a locador ou tomador de mão-de-obra, excluídos os eventuais, os autônomos e os servidores públicos civis e militares sujeitos a regime jurídico próprio.

Logo, nos termos do art. 15, § 2º da Lei nº 8.036/90, não é considerado trabalhador a pessoa

física que possui vínculo jurídico estatutário com a administração pública.

Por seu turno, à luz do art. 19-A da Lei 8036/90, o FGTS somente é devido em caso de

nulidade de contrato de trabalho (regime celetista) firmado em desrespeito aos ditames

constitucionais do concurso público. O dispositivo não se aplica ao servidor contratado sob o

regime próprio de natureza administrativa. Basta ver que o dispositivo se refere à conta

vinculada do “trabalhador”, cujo significado é definido no §2º do art. 15, e também à

“contrato de trabalho”.

Art. 19-A. É devido o depósito do FGTS na conta vinculada do trabalhador cujo contrato de trabalho seja declarado nulo nas hipóteses previstas no art. 37, § 2o, da Constituição Federal, quando mantido o direito ao salário. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001) Parágrafo único. O saldo existente em conta vinculada, oriundo de contrato declarado nulo até 28 de julho de 2001, nas condições do caput, que não tenha sido levantado até essa data, será liberado ao trabalhador a partir do mês de agosto de 2002. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001)

Ocorre que o vínculo jurídico formado no contrato temporário é de natureza administrativa e

não trabalhista (MEIRELLES, 2004 p. 393). Os servidores temporários são

“[...] contratados por tempo determinado para atendimento a necessidade temporária de excepcional interesse público, segundo comando do inc. IX do art. 37 da Constituição Federal, submetidos ao regime jurídico administrativo especial estabelecido por lei de cada ente.” (MELO, 2009, p. 48).

Cabe a cada ente da federação regular, por lei, as regras disciplinadoras da contratação de

servidores temporários (CARVALHO FILHO, 2005, p. 469) (MELLO, 2004, p. 260).

A existência de vício na constituição da relação jurídico administrativa, seja ele qual for, não

a converte em vínculo trabalhista. Assim, a eventual burla à exigência de concurso público

não transmuda a natureza da relação de direito administrativo.

Nota-se que a contratação temporária segue regime jurídico próprio distinto daquele afeto aos

servidores efetivos. Nada impedindo, por óbvio, a adoção de algumas regras e benefícios

deste último regime- quando compatíveis-, desde que de forma expressa na lei que regular o

regime de contratação temporária. O que, mesmo assim, não os tornam regimes equivalentes.

Acrescente-se que, com o julgamento pelo STF da cautelar na ADI 2135, voltou a vigorar o

regime jurídico único dos servidores públicos da Administração direta, autárquica e

fundacional, não havendo espaço para a contratação pelo regime celestista.

No caso, a nulidade do contrato temporário se fia na ausência das hipóteses reguladas no

inciso IX do art. 37, da CF, que excepciona a necessidade de concurso público. Daí se

extraindo que a atividade deveria ser realizada por servidor investido em cargo efetivo, via

concurso público.

Logo, é incoerente e inaceitável que o servidor temporário, mesmo que contratado

irregularmente, receba benefício ao qual o servidor regularmente concursado não faria jus.

Ora, fosse regular a contratação temporária, o contratado não teria direito a FGTS. Por que,

então, ter este direito quando contratado irregularmente? O certo é que aquele que foi

contratado em caráter precário fora das hipóteses constitucionais não pode receber mais do

que quem prestou concurso público para exercer aquela atividade ou também de quem prestou

serviço temporário amparado no permissivo constitucional.

Pela redação do art. 19-A, o direito aos depósitos do FGTS não é consequência da nulidade do

contrato firmado com a Administração. Na verdade, o que o dispositivo faz é garantir ao

servidor o recebimento dos depósitos do FGTS efetuados apesar da nulidade da contratação

sem concurso público.

Pressupõe a norma em tela que, fosse válido o contrato, o FGTS seria devido como efeito

normal da contratação. E, por isso, na hipótese de invalidade do vínculo contratual, por falta

de concurso público, a norma visa preservar os efeitos provenientes da relação jurídica,

mesmo que nula4. Resguardou-se o direito ao FGTS contra a declaração de nulidade do

contrato.

4 Comentando os efeitos da nulidade do contrato de trabalho por falta de concurso público, Estêvão Mallet destaca que ao servidor devem ser assegurados os direitos conferidos por lei aos que são contratados regularmente, ressalvados aqueles diretamente ligados à extinção do vínculo e à sua não continuidade. (SOARES coord, 2005 p. 88) Logo, a premissa firmada por Mallet é a de preservar os efeitos naturais do contrato e não inovar estes efeitos, mediante a distinção do plano da validade e do plano da eficácia.

Coisa diversa é quando, desde sua origem, a relação jurídica formada não enseja o pagamento

do FGTS. Neste caso, a lei não quis – e se quisesse não poderia – criar um direito outrora

inexistente, cujo fato gerador seria a declaração de nulidade da contratação.

Ao se interpretar o art. 19-A da Lei 8036 deve-se ter em mente qual o momento histórico em

que o dispositivo foi acrescido à Lei. No caso, à época havia o entendimento jurisprudencial

fixado no STF e no TST no sentido de que a falta de concurso público, por força do §2º do

art. 37 da CF, acarretava a nulidade do vínculo firmado entre o servidor e a Administração, e,

por isso, o ato não produzia efeitos, ressalvado apenas o recebimento da remuneração devida

pelo serviço prestado, para evitar enriquecimento ilícito do Poder Público.

Assim, como, há época, muitas contratações eram realizadas pela Administração Pública, sem

a realização de concurso público, algumas até mesmo anteriores à CF de 1988, em havendo o

reconhecimento da nulidade do vínculo, os depósitos de FGTS realizados – realizados porque

as contratações eram feitas pelo regime celetista- eram devolvidos ao empregador, no caso, o

Poder Público.

Visando compensar estes servidores, foi publicada medida provisória incluindo a redação do

art. 19-A à lei 8036, para, além da remuneração, assegurar o recebimento por parte do

empregado do FGTS depositado ao longo do contrato.

Logo, fica claro não ter sido o intuito da lei ampliar as hipóteses de recebimento de FGTS

para além das relações de natureza trabalhista. Até mesmo porque, acaso este fosse o objetivo,

a norma seria forçosamente inconstitucional, pois, como dito, o regime de FGTS não se

coaduna com o regime jurídico próprio dos servidores públicos. E, diga-se mais, norma

federal não pode intervir em matéria de competência exclusiva de cada ente federativo, a

quem compete regular seu regime funcional específico.

Diga-se ainda que o vínculo dos servidores temporários com a administração é, regra geral,

desfeito pelo decurso do tempo e não por declaração de nulidade da contratação. Na maioria

esmagadora das ações propostas por este motivo, os autores, cujo período do contrato já

findou, buscam incidentalmente o reconhecimento judicial de que não deveria ter havido a

contratação, para daí extrair o fundamento do pedido de FGTS. Logo, nestes casos, o fim da

relação funcional deu-se pelo decurso do tempo e não em razão da nulidade do vínculo. Fica,

mais ainda, caracterizada a incompatibilidade entre a redação do art. 19-A da Lei 8036 e a

situação dos servidores temporários.

Apesar da literalidade da lei 8036 e, ainda, da necessidade de sua compatibilização com a CF,

persiste controvérsia tanto no seio do Tribunal Capixaba como no próprio STJ a respeito do

pagamento de FGTS a servidor temporário.

De modo geral, as decisões que conferem ao servidor temporário o direito ao FGTS se fiam

no julgamento proferido pelo STF que reconheceu a constitucionalidade do art. 19-A da Lei

8036 (RE 596478) e no precedente oriundo do RESP 1335115 proferido pelo STJ, do qual se

originou a súmula 466 do STJ. Todavia, há um claro equívoco na aplicação destes

precedentes, pois, nenhum dos dois casos se referia a servidores temporários, havendo

elementos de distinção que os tornam insuficientes para embasar a concessão do direito ao

FGTS no caso ora em análise.

2- Os precedentes do STF, em especial, o RE 596478

O RE 596478 do STF é oriundo de demanda originalmente proposta na justiça do trabalho, na

qual servidor público contratado pelo regime da CLT e cujo vínculo com a administração fora

declarado nulo, pleiteava o recebimento dos depósitos de FGTS efetuados pelo Estado de

Roraima ao longo da contratação.

O TST aplicou o entendimento encampado no seu enunciado nº 363, amparado no art. 19-A

da Lei 8036, segundo o qual:

A contratação de servidor público, após a CF/1988, sem prévia aprovação em concurso público, encontra óbice no respectivo art. 37, II e § 2º, somente lhe conferindo direito ao pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o valor da hora do salário mínimo, e dos valores referentes aos depósitos do FGTS.

Foi interposto recurso extraordinário ao STF, onde se alegou, naquilo que é importante, a

inconstitucionalidade do art. 19-A da Lei 8036, ao argumento de que, sendo nula a

contratação por força do art. 37, §2º da CF, ela não poderia produzir efeitos, no que incluía o

direito ao FGTS, cabendo ao servidor apenas receber a remuneração pelo serviço prestado.

Portanto, a lei não poderia estabelecer direitos decorrentes de relação jurídica

constitucionalmente nula, sob pena de violar o dispositivo constitucional em comento.5 O

STF negou provimento ao recurso extraordinário, para reconhecer a constitucionalidade do

art. 19-A da Lei em questão. Segue ementa do acórdão:

EMENTA Recurso extraordinário. Direito Administrativo. Contrato nulo. Efeitos. Recolhimento do FGTS. Artigo 19-A da Lei nº 8.036/90. Constitucionalidade. 1. É constitucional o art. 19-A da Lei nº 8.036/90, o qual dispõe ser devido o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na conta de trabalhador cujo contrato com a Administração Pública seja declarado nulo por ausência de prévia aprovação em concurso público, desde que mantido o seu direito ao salário. 2. Mesmo quando reconhecida a nulidade da contratação do empregado público, nos termos do art. 37, § 2º, da Constituição Federal, subsiste o direito do trabalhador ao depósito do FGTS quando reconhecido ser devido o salário pelos serviços prestados. 3. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento. (RE 596478, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 13/06/2012, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-040 DIVULG 28-02-2013 PUBLIC 01-03-2013 EMENT VOL-02679-01 PP-00068)

A discussão no Pretório Excelso foi travada em duas frentes. A tese vencida, que reconhecia a

inconstitucionalidade do art. 19-A da Lei 8036, valeu-se como principal fundamento da

jurisprudência anterior do próprio STF que não admitia a produção de efeitos do vínculo

declarado nulo, dado o art. 37, §2º da CF, apenas ressalvando o pagamento da remuneração,

para evitar enriquecimento ilícito. Em sentido contrário, a orientação prevalente encabeçada

pelo voto condutor da divergência da lavra do Ministro Dias Toffoli, considerou que, apesar

da nulidade, é admissível a produção de efeitos secundários do vínculo jurídico firmado com a

5 A dimensão da controvérsia levada ao crivo do STF na ocasião é traçada no relatório do acórdão que julgou o recurso extraordinário, cujo trecho é transcrito na íntegra: “A questão diz respeito à discussão da constitucionalidade do art. 19-A da Lei 8.036/90, acrescido pela MP RE 596.478/RR 2.164-41, que assegura direito ao FGTS à pessoa que tenha sido contratada sem concurso público. O recorrente aponta, primeiramente, violação aos arts. 5º , XXXV, LIV e LV, e 93, IX, da Constituição, por entender que houve negativa de jurisdição. Também aponta ofensa ao art. 37, II, e § 2°, da Constituição. Entende que, uma vez reconhecida a nulidade do contrato de trabalho realizado sem concurso público, nenhum efeito jurídico dele poderia ser extraído, somente sendo devida indenização pelo trabalho prestado em montante limitado ao do salário em sentido estrito. Frisa que não se pode "adquirir direitos em ofensa a norma constitucional cogente", razão pela qual se imporia o reconhecimento da inconstitucionalidade do art. 19-A da Lei 8.036/90, acrescido pela MP 2.164-41. Ainda discorre sobre a ausência de relevância e urgência para a edição da MP 2.164-41, incompatível com a determinação de liberação de recursos apenas um ano após a sua edição. Diz também da irretroatividade determinada em confronto com o art. 5º , XXXVI, da Constituição, considerando-se o contrato de trabalho como ato jurídico perfeito. Ademais, o ato nulo não produz efeitos e, nula a obrigação principal, também nulas são as acessórias, vedando-se apenas o enriquecimento sem causa. Também defende a natureza tributária do FGTS, invocando a ADI 2.556 e apontando ofensa aos arts. 146, 149 e 150 da Constituição. Pede o provimento para que seja reconhecida violação ao art. 5º , XXXV, LIV e LV, e 93, IX, da CF e anulado o acórdão proferido ou, sucessivamente, que seja dado provimento ao recurso com fundamento no art. 37, caput, inciso II e § 2º , da Constituição, determinando-se a liberação de eventuais valores de FGTS ao próprio Estado de Roraima.”

Administração, podendo o legislador conferir, neste caso, o direito ao recebimento dos

depósitos do FGTS.

Segue reprodução de trecho do voto da Ministra Ellen Gracie, que relatou o recurso e

inaugurou o debate, onde fica destacado que a nulidade da investidura impede o surgimento

dos direitos trabalhistas6:

“[...] 6. Considerando o entendimento deste Tribunal no sentido de que a nulidade da investidura impede o surgimento dos direitos trabalhistas, deve-se concluir que, nessas circunstâncias, não há direito do empregado aos depósitos em conta vinculada a título de FGTS. Isso porque o fundo de garantia do tempo de serviço não se confunde com a mera contraprestação estrita pelo trabalho prestado. Figura no art. 7º , inciso III, da Constituição, isto sim, como um dos direitos fundamentais sociais ao lado de outros como o da proteção contra a despedida arbitrária ou sem justa causa, o segurodesemprego, o décimo terceiro salário e o aviso prévio. Os depósitos em conta vinculada constituem direito trabalhista autônomo, que surgiu como uma alternativa à estabilidade no emprego (daí a possibilidade originária de opção pelo seu regime - Lei 5.107/66), posteriormente consolidou-se como direito de qualquer empregado e, finalmente, foi alçado à condição de direito fundamental social. Reconhecida a nulidade do vínculo, resta automaticamente afastada a obrigação de recolhimento da contribuição ao FGTS pelo Estado relativamente às investiduras nulas. 7. O art. 9º da Medida MP 2.164-41/91, ao acrescentar o art. 19-A à Lei 8:036/90, contemplou com o FGTS o empregado investido em cargo público por ato nulo, verbis: "Art. 19-A. E devido o depósito do FGTS na conta vinculada do trabalhador cujo contrato de trabalho seja declarado nulo nas hipóteses previstas no art. 37, § 2º, da Constituição Federal, quando mantido o direito ao salário. Parágrafo único. O saldo existente em conta vinculada, oriundo de contrato declarado nulo até 28 de julho de 2001, nas condições do caput,

6 Com fundamentos muito semelhantes, a Ministra Carmen Lúcia acompanhou a Relatora Ministra Ellen Gracie. Vale a reprodução de parte de sua manifestação: “Em primeiro lugar, porque a Constituição, no § 2º, diz que os atos são nulos.Entendo perfeitamente a preocupação quantos aos efeitos, mas este é um efeito criado por uma norma, no caso por uma medida provisória. Acho que o parecer do Ministério Público foi extremamente feliz ao dizer que quando se pode criar um, pode-se criar outros. Esse é o raciocínio. Não estou discutindo outras fórmulas, nem outras parcelas, mas apenas essa. Também não me impressiona, nem um pouco, afirmar que poderia tirar efeito de atos nulos. Podem sim, os que sejam compatíveis com a Constituição. [...] Em segundo lugar, se o fundo de garantia veio para dar uma estabilidade, ou para compensar por uma estabilidade, o raciocínio, a meu ver, some, com a devida vênia, Ministro Carlos, por uma razão simplérrima: jamais haverá estabilidade de servidor que não é concursado, porque conta-se, para estabilização do servidor, não para contratos de trabalho na iniciativa privada, aquele que não tiver feito o concurso. São três anos após o concurso e depois de ter passado por um processo, que todos nós sabemos que contratado nenhum a título precário passa, que é exatamente o de saber se ele pode se estabilizar. Em terceiro lugar, porque o próprio Supremo Tribunal retomou a norma originária que se continha antes da Emenda Constitucional nº 19, e, portanto, afastou a possibilidade até mesmo de se ter regime celetista no serviço público enquanto não julgarmos o mérito daquela ADI. Então, pelas razões expostas brilhantemente pela Ministra Relatora, que estão coerentes com a jurisprudência até agora harmonizada no Tribunal, acho que não apenas garante o princípio da dignidade da pessoa humana, porque aquele que trabalhou não pode ser equiparado a um trabalhador escravo, e não será, porque a força de trabalho que ele empregou fica sem dano. Daí o pagamento pelo trabalho feito. Nem há o enriquecimento ilícito nem há descumprimento dos direitos fundamentais, tanto do ser humano quanto do ser humano na sua condição social de trabalhador.”

que não tenha sido levantado até essa data, será liberado ao trabalhador a partir do mês de agosto de 2002." Ao atribuir efeitos a uma relação trabalhista considerada nula de pleno direito por força do art. 37, inciso II e § 2o da Constituição, acabou por afastar, ao menos em parte, tal nulidade. 8. Note-se que o conhecimento e o cumprimento da Constituição é dever de todos, tanto das autoridades como dos particulares. Na investidura em emprego público sem concurso, ambos incorrem em violação à Constituição, devendo suportar os ônus de tal conduta, dentre as quais a nulidade do ato. Também o legislador deve ater-se à Constituição, abstendo-se de reconhecer direito que a prescrição constitucional de nulidade da investidura em emprego público sem prévio concurso afasta. 9. Ante todo o exposto, dou provimento ao recurso do Estado de Roraima, reconhecendo a inconstitucionalidade do art. 19-A da Lei 8.036/90, acrescido pelo 9º da Medida Provisória 2.164-41/91, por violação ao art. 37, II e § 2o, da Constituição, com o que resta improcedente a reclamatória trabalhista.

O Ministro Gilmar Mendes abriu a divergência para dizer que não reconhecer o direito ao

FGTS seria onerar em demasia a parte mais fraca. Também afirmou que se admite a

preservação de efeitos fáticos do contrato de trabalho, mesmo quando nulo. O ministro Dias

Toffoli, durante o debate oral, e já iniciado seu voto disse que a nulidade não apaga todas as

consequências da relação estabelecida. Uma coisa seria proibir a contratação outra coisa seria

proibir os efeitos residuais da contratação.

Essa nulidade não acarreta invalidez total de todos os atos, pois os atos praticados por esse trabalhador são aproveitados, isto é, a nulidade não apaga todas as consequências da relação estabelecida. A própria administração reconhece a validez dos atos praticados, ou seja, essa nulidade, com o devido respeito, não tem caráter absoluto a ponto de desconhecer qualquer vantagem ou qualquer direito que, eventualmente, possa ser reconhecido com bases noutros princípios constitucionais, como, por exemplo, a dignidade do trabalho, etc. [...] Exatamente. A pergunta que eu faço: uma coisa é proibir a contratação sem concurso público; outra coisa é proibir os efeitos residuais de um fato existente, e é existente juridicamente, embora inválido. É existente!

Vale a transcrição de outra passagem do voto do Ministro Dias Tofolli.7

7 O Ministro Cezar Peluso apresentou fundamento semelhante, conforme seguinte passagem: ”A nulidade afirmada na norma constitucional está resguardada. Daí, a meu ver, com o devido respeito, em princípio, não há violação à norma constitucional que prevê a nulidade. Aqui se trata de decidir outra questão: se um ato nulo pode gerar algum efeito. Isto, sim. Afirmar se um ato nulo pode gerar ou não algum efeito não diz respeito a essa norma constitucional, mas à teoria geral do direito, para saber se todo ato nulo não produz nenhum efeito, ou há atos nulos que produzem efeito. Isso não faz parte da norma constitucional ora impugnada, faz parte de uma questão teórica que pertence à teoria geral do direito.” Também proferiu voto semelhante o ministro Ayres Britto, que aderiu aos argumentos do Ministro Dias Toffoli para destacar que o FGTS possui caráter indenizatório, já que veio para compensar a perda de um direito do trabalhador, que era o direito à estabilidade. Assim, o fundamento para o pagamento para os dias trabalhados seria o mesmo que justificaria o pagamento do FGTS ao trabalhador. Segue trecho do seu voto:”Isso é fato, sob a alegação de que pagar os dias trabalhos era justo a título não de salário, mas de indenização. Ora, uma parte da doutrina diz que o FGTS tem caráter indenizatório, por quê? Porque ele veio para compensar a perda de um direito do trabalhador, que era o direito à estabilidade, que dava direito à indenização. O trabalhador estável, demitido sem justa causa, ganhava indenização. Veio o FGTS com esse caráter compensatório, substitutivo da estabilidade. Então, parece-me que a razão que nos leva a decidir pelo pagamento dos dias trabalhados é a mesma razão que nos leva a decidir pelo

Senhor Presidente, concluindo, eu só gostaria de dar ênfase que nós estamos aqui tratando de efeitos residuais de um fato jurídico que existiu. Nulo? Inválido? Sim, mas todo fato nulo pode manter efeitos residuais.Podemos citar vários. O Ministro Gilmar Mendes trouxe teoria a respeito. Casamento putativo. Na época em que havia no passado discriminação entre filhos, o casamento era declarado nulo e os filhos continuavam sendo considerados legítimos. Inclusive na Teoria do Direito Civil é reconhecido, para muitos casos nulos, os efeitos residuais, por quê? Porque aquilo se inseriu no plano da existência. Eu aprendi com o falecido e saudoso Professor Antônio Junqueira de Azevedo, da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, já no primeiro ano de faculdade, a distinção entre os planos da existência, da validade e da eficácia. Reconhecer efeitos jurídicos residuais a ato nulo é algo que diz respeito aos efeitos residuais do nulo no plano da existência jurídica. E é possível fazê-lo. Pode o intérprete, o estado-juiz fazê-lo ao interpretar o caso concreto? Pode. A pergunta posta nessa ação, nesse recurso extraordinário, é se o pode fazer o legislador. O legislador pode dizer de um fato residual, de um ato declarado nulo? Eu não vejo nesse caso concreto - e não estou a julgar outro, pedindo vênia àqueles que possam entender de maneira contrária -, a eventual repercussão desse caso em outras situações concretas... eu estou a julgar o caso em que o legislador fez uma avaliação - dentro, penso, do seu poder normativo - a respeito de casos que, não tenham dúvidas, são casos a priori, consequências do que a Constituição de 1988 trouxe, em boa hora, que é a necessidade do concurso público para o provimento dos cargos nos órgãos públicos e no Estado. Nesse sentido, Senhor Presidente, penso que não estamos aqui a julgar a necessidade ou desnecessidade de concurso público, porque esse tema é pacificado na Corte. Na Constituição e na Corte é pacificada a sua aplicação. Estamos a julgar se o artigo 19-A é compatível ou não com a Constituição. Eu não vejo, de maneira nenhuma, que ele afronte o § 2º do art. 37 da Constituição Federal. Entendo que este Tribunal tem levado em consideração essa necessidade de se garantir a fatos nulos, mas existentes juridicamente, os seus efeitos. Tanto é que, na ação direta que eu já mencionei, do Estado de Minas Gerais, foram dados efeitos prospectivos - como em alguns outros casos -; enquanto não se faz o concurso público, mantêm-se - até para a prestação dos serviços públicos, muitos essenciais - aqueles servidores contratados de maneira irregular, nula.

Por outro lado, foi destacado ao longo da discussão, conforme se extrai de manifestação da

lavra do Ministro Gilmar Mendes que a regra contida no art. 19-A da Lei 8036 vinha para

solucionar uma situação à época dos fatos existente, mas que, em razão da instituição do

regime jurídico único dos servidores públicos e do regime de contratação temporária, a norma

passaria a ser de pouca valia e aplicação para situações futuras.

Por outro lado, em termos institucionais hoje, ou temos o regime estatutário, em que a seleção terá quer ser por concurso público, ou teremos um sistema de seleção dos chamados empregos, aí, por prazo determinado. Então me parece que essas hipóteses serão cada vez mais raras, mas elas ocorreram. Por isso, o legislador se preocupou em dar pelo menos essa garantia básica, garantia mínima a esse trabalhador que teve essa relação fática. Parece-me que é essa a questão. Na verdade, eu vou acompanhar o voto do Ministro Dias Toffoli.

pagamento do FGTS, até porque o Estado já desembolsou, já depositou esse dinheiro do FGTS. Ele constituiu um fundo em favor do trabalhador, o dinheiro já foi desembolsado.”

Além de se tratar de um placar apertado, vê-se que o acórdão que julgou o recurso

extraordinário se limitou a discutir a compatibilidade do art. 19-A com a CF, em especial,

com o §2 do art. 37, que diz ser nulo o vínculo funcional firmado com ofensa à regra do

concurso público. Concluiu-se, por maioria, que, mesmo nulo, o contrato pode produzir

efeitos residuais, e que assegurar os depósitos de FGTS ao servidor cujo contrato foi

declarado nulo seria privilegiar o lado mais fraco da relação. Foi sustentado pelo voto

condutor do Ministro Dias Toffoli que a norma visava assegurar uma situação transitória

decorrente da compatibiilização das contratações com as exigências da CF de 1988.

No acórdão, não se decidiu se o servidor temporário, que possui regime jurídico específico,

faz jus a receber o FGTS8, quando seu contrato é declarado nulo, nem tão-pouco é possível

extrair tal conclusão da ratio decidendi do julgado. Não é demais lembrar que o recurso

extraordinário foi interposto contra decisão do TST, onde se discutia a nulidade de vínculo

firmado com a Administração regido pelo regime da CLT, onde inclusive houvera efetivos

depósitos de FGTS ao longo do tempo pelo Estado contratante. Portanto, sequer foi cogitada a

aplicação do dispositivo legal para os casos de nulidade de relação jurídica de natureza

administrativa firmada entre o particular e o Poder Público. Também não foi dito se servidor

público com regime próprio poderia receber FGTS. Muito ao contrário, em todo o momento,

o acórdão alude à manutenção dos efeitos residuais próprios de contrato de trabalho. Ora, é

possível extrair do julgado que somente os efeitos regulares que o vínculo produziria

poderiam ser mantidos, de maneira a não se admitir que a declaração de nulidade produza

novos efeitos, não previstos originalmente na relação jurídica. Além disso, o próprio Ministro

Dias Toffoli, responsável pelo voto condutor, afirma que a norma veio para sanar situação

passageira, pois, conforme também dito pelo Ministro Gilmar Mendes, com o

restabelecimento do regime jurídico único e as contratações precárias sob regime jurídico

próprio, a norma viria a perder sua serventia.

Cita-se também a propositura de ação de inconstitucionalidade pelo Estado de Alagoas em

relação ao art. 19-A e 20 da lei 8036. O autor da ação sustenta que o dispositivo viola a

Constituição Federal, ao conferir efeitos a ato declarado nulo pela Lei Maior, e também por

impor obrigação de caráter retroativo. Saliente-se que não é objetivo deste artigo analisar a

8 Embora suscitado no voto do Ministro Joaquim Barbosa sobre a impossibilidade de servidor ocupante de cargo receber FGTS a questão não foi objeto de discussão propriamente dita e não envolveu a análise de seus pares sobre a constitucionalidade do art. 19-A, podendo ser tratada apenas como obter dicta.

constitucionalidade da norma em comento, mas apenas sua compatibilidade com o regime

jurídico administrativo que regula os contratos temporários firmados pelo servidor público.

Em relação aos servidores temporários que pleiteiam o pagamento do FGTS, as decisões do

STF (ao menos aquelas disponibilizadas em seu site) se limitam a definir a justiça competente

para julgar as demandas. Nestes casos, o STF já firmou orientação que não cabe à justiça

trabalhista julgar a matéria, por se tratar de vínculo de natureza administrativa, o qual não é

alterado, mesmo em caso de eventual nulidade9. Todavia, o STF não adentrou na análise do

9Neste sentido: EMENTA Agravo regimental na medida cautelar na reclamação – Administrativo e Processual Civil – Ação civil pública – Vínculo entre servidor e o poder público – Contratação temporária - ADI nº 3.395/DF-MC – Cabimento da reclamação – Incompetência da Justiça do Trabalho. 1. A reclamação é meio hábil para conservar a autoridade do Supremo Tribunal Federal e a eficácia de suas decisões e súmulas vinculantes. Não se reveste de caráter primário ou se transforma em sucedâneo recursal quando é utilizada para confrontar decisões de juízos e tribunais que afrontam o conteúdo do acórdão do STF na ADI nº 3.395/DF-MC. 2. Compete à Justiça comum pronunciar-se sobre a existência, a validade e a eficácia das relações entre servidores e o poder público fundadas em vínculo jurídico-administrativo. É irrelevante a argumentação de que o contrato é temporário ou precário, ainda que haja sido extrapolado seu prazo inicial, bem assim se o liame decorre de ocupação de cargo comissionado ou função gratificada. 3. Não descaracteriza a competência da Justiça comum, em tais dissídios, o fato de se requerer verbas rescisórias, FGTS e outros encargos de natureza símile, dada a prevalência da questão de fundo, que diz respeito à própria natureza da relação jurídico-administrativa, posto que desvirtuada ou submetida a vícios de origem, como fraude, simulação ou ausência de concurso público. Nesse último caso, ultrapassa o limite da competência do STF a investigação sobre o conteúdo dessa causa de pedir específica. 4. Agravo regimental provido e, por efeito da instrumentalidade de formas e da economia processual, reclamação julgada procedente, declarando-se a competência da Justiça comum. (Rcl 4069 MC-AgR, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 10/11/2010, DJe-107 DIVULG 03-06-2011 PUBLIC 06-06-2011 EMENT VOL-02537-01 PP-00019) E, ainda: EMENTA AGRAVO REGIMENTAL NA RECLAMAÇÃO - ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL - DISSÍDIO ENTRE SERVIDORES E O PODER PÚBLICO - ADI nº 3.395/DF-MC - CABIMENTO DA RECLAMAÇÃO - INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. 1. A reclamação é meio hábil para conservar a autoridade do Supremo Tribunal Federal e a eficácia de suas decisões. Não se reveste de caráter primário ou se transforma em sucedâneo recursal quando é utilizada para confrontar decisões de juízos e tribunais que afrontam o conteúdo do acórdão do STF na ADI nº 3.395/DF-MC. 2. Compete à Justiça comum pronunciar-se sobre a existência, a validade e a eficácia das relações entre servidores e o poder público fundadas em vínculo jurídico-administrativo. É irrelevante a argumentação de que o contrato é temporário ou precário, ainda que haja sido extrapolado seu prazo inicial, bem assim se o liame decorre de ocupação de cargo comissionado ou função gratificada. 3. Não descaracteriza a competência da Justiça comum, em tais dissídios, o fato de se requerer verbas rescisórias, FGTS e outros encargos de natureza símile, dada a prevalência da questão de fundo, que diz respeito à própria natureza da relação jurídico-administrativa, posto que desvirtuada ou submetida a vícios de origem, como fraude, simulação ou ausência de concurso público. Nesse último caso, ultrapassa o limite da competência do STF a investigação sobre o conteúdo dessa causa de pedir específica. 4. A circunstância de se tratar de relação jurídica nascida de lei local, anterior ou posterior à Constituição de 1988, não tem efeito sobre a cognição da causa pela Justiça comum. 5. Agravo regimental não provido. (Rcl 7633 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 23/06/2010, DJe-173 DIVULG 16-09-2010 PUBLIC 17-09-2010 EMENT VOL-02415-02 PP-00268) Também: EMENTA: CONSTITUCIONAL. RECLAMAÇÃO. MEDIDA LIMINAR NA ADI 3.357. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SERVIDORES PÚBLICOS. REGIME TEMPORÁRIO. JUSTIÇA DO TRABALHO. INCOMPETÊNCIA. 1. No julgamento da ADI 3.395-MC, este Supremo Tribunal suspendeu toda e qualquer interpretação do inciso I do artigo 114 da CF (na redação da EC 45/2004) que inserisse, na competência da Justiça do Trabalho, a apreciação de causas instauradas entre o Poder Público e seus servidores, a ele vinculados

mérito das ações, declarando competir ao juízo competente, pela via própria, avaliar se há ou

não direito ao recebimento de FGTS. As razões adotadas pelos precedentes do STF para

por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo. 2. Contratações temporárias que se deram com fundamento na Lei amazonense nº 2.607/00, que minudenciou o regime jurídico aplicável às partes figurantes do contrato. Caracterização de vínculo jurídico-administrativo entre contratante e contratados. 3. Procedência do pedido. 4. Agravo regimental prejudicado. (Rcl 5381, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2008, DJe-147 DIVULG 07-08-2008 PUBLIC 08-08-2008 EMENT VOL-02327-01 PP-00136 RTJ VOL-00209-03 PP-01084) Também: EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECLAMAÇÃO. DEFINIÇÃO DO ALCANCE MATERIAL DA DECISÃO LIMINAR PROFERIDA NA ADI-MC N° 3.395/DF. 2. O disposto no art. 114, I, da Constituição da República, não abrange as causas instauradas entre o Poder Público e servidor que lhe seja vinculado por relação jurídico-estatutária, entendida esta como a relação de cunho jurídico-administrativo originada de investidura em cargo efetivo ou em cargo em comissão. Tais premissas são suficientes para que este Supremo Tribunal Federal, em sede de reclamação, verifique se determinado ato judicial confirmador da competência da Justiça do Trabalho afronta sua decisão cautelar proferida na ADI 3.395/DF. 3. A investidura do servidor em cargo em comissão define esse caráter jurídico-administrativo da relação de trabalho. 4. Não compete ao Supremo Tribunal Federal, no âmbito estreito de cognição próprio da reclamação constitucional, analisar a regularidade constitucional e legal das investiduras em cargos efetivos ou comissionados ou das contratações temporárias realizadas pelo Poder Público. 5. Agravo regimental desprovido, à unanimidade, nos termos do voto do Relator. (Rcl 4785 MC-AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 17/12/2007, DJe-047 DIVULG 13-03-2008 PUBLIC 14-03-2008 EMENT VOL-02311-01 PP-00090 RTJ VOL-00203-03 PP-01005) Também: EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA REGIDA POR LEGISLAÇÃO LOCAL ANTERIOR À CF/88. COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO DA CAUSA. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. QUESTÃO RELEVANTE DO PONTO DE VISTA SOCIAL E JURÍDICO QUE ULTRAPASSA O INTERESSE SUBJETIVO DA CAUSA. (RE 573202 RG, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, julgado em 20/03/2008, DJe-065 DIVULG 10-04-2008 PUBLIC 11-04-2008 EMENT VOL-02314-08 PP-01678 RDECTRAB v. 17, n. 186, 2010, p. 194-197 ) EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. REGIME ESPECIAL. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA REGIDA POR LEGISLAÇÃO LOCAL ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO DE 1988, EDITADA COM BASE NO ART. 106 DA CONSTITUIÇÃO DE 1967. ACÓRDÃO QUE RECONHECEU A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I - Ao reconhecer a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a reclamação trabalhista, o acórdão recorrido divergiu de pacífica orientação jurisprudencial deste Supremo Tribunal Federal. II - Compete à Justiça Comum processar e julgar causas instauradas entre o Poder Público e seus servidores submetidos a regime especial disciplinado por lei local editada antes da Constituição Republicana de 1988, com fundamento no art. 106 da Constituição de 1967, na redação que lhe deu a Emenda Constitucional no 1/69, ou no art. 37, IX, da Constituição de 1988. III - Recurso Extraordinário conhecido e provido.(RE 573202, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 21/08/2008, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-232 DIVULG 04-12-2008 PUBLIC 05-12-2008 EMENT VOL-02344-05 PP-00968 LEXSTF v. 30, n. 360, 2008, p. 209-245) De relevante aponta-se trecho do voto do Ministro relator Ricardo Lewandowski: “Os servidores temporários não estão vinculados a um cargo ou emprego público, como explica Maria Sylvia Zanella di Pietro, mas exercem determinada função, por prazo certo, para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. O seu vínculo com o Estado reveste-se, pois de nítido cunho administrativo, [...] contrariamente ao que endente a recorrente e ao que decidiu o Tribunal a quo, a mera prorrogação do prazo de contratação da servidora temporária em comento não tem o condão de transmudar o vínculo administrativo que esta mantinha com o Estado do Amazonas em relação de natureza trabalhista. A prorrogação do contrato nessas circunstâncias, seja ela expressa ou tácita, em que se opera a mudança do prazo de vigência deste, de temporário para indeterminado, pode até ensejar nulidade ou caracterizar ato de improbidade, com todas as consequência que isso acarreta, por ofensa aos princípios e regras que disciplinam a contratação desse tipo de servidores, mas não altera, peço vênia para insistir, a natureza jurídica do vínculo de cunho administrativo que se estabeleceu originalmente.”

declarar a incompetência da justiça trabalhista estão bem enumeradas no voto proferido pelo

Ministro Dias Toffoli, ao julgar a Reclamação 7857, conforme abaixo reproduzido10:

1. Compete à Justiça comum pronunciar-se sobre a existência, a validade e a eficácia das relações entre servidores e o poder público fundadas em vínculo jurídico-administrativo. “2. Apesar de ser da competência da Justiça do Trabalho reconhecer a existência de vínculo empregatício regido pela legislação trabalhista, não sendo lícito à Justiça comum fazê-lo, é da competência exclusiva desta o exame de questões relativas a vínculo jurídico-administrativo. 3. Antes de se tratar de um problema de direito trabalhista a questão deve ser resolvida no âmbito do direito administrativo, pois para o reconhecimento da relação trabalhista terá o juiz que decidir se teria havido vício na relação administrativa a descaracterizá-la” (Rcl nº 8.110/PI-AgR, Relator o Ministro Marco Aurélio, redatora do acórdão a Ministra Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 21/10/09, DJe-27 divulgado em 11/2/10, publicado em 12/2/10). No mesmo sentido: Rcl nº 5.924/CE-AgR, Relator o Ministro Eros Grau, Tribunal Pleno, julgado em 23/9/09, DJe-200 divulgado em 22/10/09, publicado em 23/10/09. 2. Não compete à Justiça do Trabalho o exame de litígios baseados em contratação temporária para exercício de função pública, ainda que com prazo excedido. “1. A Justiça do Trabalho não detém competência para processar e julgar causas que envolvam o Poder Público e servidores a ele vinculados, mesmo que por contrato temporário com prazo excedido, por se tratar de relação jurídico-administrativa” (Rcl nº 7.028/MG-AgR, Relatora a Ministra Ellen Gracie, Tribunal Pleno, julgado em 16/9/09, DJe-195 divulgado em 15/10/09, publicado em 16/10/09). Nesse sentido: “Prorrogação do prazo de vigência do contrato temporário não altera a natureza jurídica de cunho administrativo que se estabelece originalmente” (Rcl nº 4.824/MS-AgR, Relator o Ministro Menezes Direito, Tribunal Pleno, julgado em 2/4/09, DJe-79 divulgado em 29/4/09, publicado em 30/4/09). 3. É irrelevante a existência de pedidos fundados em verbas trabalhistas para descaracterizar a competência da Justiça comum. “Se, apesar de o pedido ser relativo a direitos trabalhistas, os autores da ação suscitam a descaracterização da contratação temporária ou do provimento comissionado, antes de se tratar de um problema de direito trabalhista a questão deve ser resolvida no âmbito do direito administrativo, pois para o reconhecimento da relação trabalhista terá o juiz que decidir se teria havido vício na relação administrativa a descaracterizá-la. 4. No caso, não há qualquer direito disciplinado pela legislação trabalhista a justificar a sua permanência na Justiça do Trabalho. 5. Precedentes: Reclamação 4.904, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, Plenário, DJe 17.10.2008 e Reclamações 4.489-AgR, 4.054 e 4.012, Plenário, DJe 21.11.2008, todos Redatora para o acórdão a Ministra Cármen Lúcia. 6. Agravo regimental a que se dá provimento e reclamação julgada procedente” (Rcl nº 7.208/ES-AgR, Relator o Ministro Marco Aurélio,

10 EMENTA Agravo regimental na reclamação. Administrativo e Processual Civil. Dissídio entre servidor e o poder público. ADI nº 3.395/DF-MC. Cabimento da reclamação. Incompetência da Justiça do Trabalho. 1. Por atribuição constitucional, presta-se a reclamação para preservar a competência do STF e garantir a autoridade das decisões deste Tribunal (art. 102, inciso I, alínea l, CF/88), bem como para resguardar a correta aplicação das súmulas vinculantes (art. 103-A, § 3º, CF/88). Não se reveste de caráter primário ou se transforma em sucedâneo recursal quando é utilizada para confrontar decisões de juízos e tribunais que afrontam o conteúdo do acórdão do STF na ADI nº 3.395/DF-MC. 2. Compete à Justiça comum pronunciar-se sobre a existência, a validade e a eficácia das relações entre servidores e o poder público fundadas em vínculo jurídico-administrativo. O problema relativo à publicação da lei local que institui o regime jurídico único dos servidores públicos ultrapassa os limites objetivos da espécie sob exame. 3. Não descaracteriza a competência da Justiça comum, em tais dissídios, o fato de se requererem verbas rescisórias, FGTS e outros encargos de natureza símile, dada a prevalência da questão de fundo, que diz respeito à própria natureza da relação jurídico-administrativa, ainda que desvirtuada ou submetida a vícios de origem. 4. Agravo regimental não provido.(Rcl 7857 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 06/02/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-040 DIVULG 28-02-2013 PUBLIC 01-03-2013)

redatora do acórdão a Ministra Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 16/9/09, DJe-223 divulgado em 26/11/09, publicado em 27/11/09). 4. O desvirtuamento da relação jurídico-administrativa não atrai a competência da Justiça do Trabalho. “1. Incompetência da Justiça Trabalhista para o processamento e o julgamento das causas que envolvam o Poder Público e servidores que sejam vinculados ele por relação jurídico-administrativa. 2. O eventual desvirtuamento da designação temporária para o exercício de função pública, ou seja, da relação jurídico-administrativa estabelecida entre as partes, não pode ser apreciado pela Justiça do Trabalho. 3. Reclamação julgada procedente” (Rcl nº 4.464/GO, Relator o Ministro Ayres Britto, redatora do acórdão a Ministra Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 20/5/09, DJe-157 divulgado em 20/8/09, publicado em 21/8/09). 5. Pedido de pagamento de verba do FGTS não atrai a competência da Justiça do Trabalho. “A existência de pedido de condenação do ente local ao pagamento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS não torna a Justiça do Trabalho competente para o exame da ação” (Rcl nº 7.039/MG-AgR, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 2/4/09, DJe-84 divulgado em 7/5/09, publicado em 8/5/09). 6. Compete à Justiça comum julgar ações envolvendo servidores submetidos a regime instituído por lei local em vigência antes ou após a Constituição de 1988. “Compete à Justiça Estadual processar e julgar causas instauradas entre o Poder Público e seus servidores submetidos a regime especial disciplinado por lei local editada antes ou após a Constituição Republicana de 1988” (CC nº 7.201/AM, Relator o Ministro Marco Aurélio, redator do acórdão o Ministro Ricardo Lewandowski,Tribunal Pleno, julgado em 29/10/08, DJe-236 divulgado em 11/12/08, publicado em 12/12/08). No mesmo sentido: “Compete à Justiça comum processar e julgar causas instauradas entre o Poder Público e seus servidores submetidos a regime especial disciplinado por lei local editada antes da Constituição Republicana de 1988, com fundamento no art. 106 da Constituição de 1967, na redação que lhe deu a Emenda Constitucional nº 1/69, ou no art. 37, IX, da Constituição de 1988” (RE nº 573.202/AM, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, julgado em 21/8/08, Repercussão Geral – Mérito, DJe-232 divulgado em 4/12/08, publicado em 5/12/08) 7. Dissídios envolvendo cargos em comissão devem ser julgados pela Justiça comum. “1. Interessado nomeado para ocupar cargo público de provimento comissionado que integra a estrutura administrativa do Poder Judiciário sergipano. 2. Incompetência da Justiça Trabalhista para o processamento e o julgamento das causas que envolvam o Poder Público e servidores que sejam vinculados a ele por relação jurídico administrativa. Precedentes. 3. Reclamação julgada procedente” (Rcl nº 4.752/SE, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 21/8/08, DJe-197 divulgado em 16/10/08, publicado em 17/10/08). 8. Não cabe ao STF, em reclamação, examinar argumentos relativos à nulidade do vínculo entre o servidor e o poder público. “Não compete ao Supremo Tribunal Federal, no âmbito estreito de cognição próprio da reclamação constitucional, analisar a regularidade constitucional e legal das investiduras em cargos efetivos ou comissionados ou das contratações temporárias realizadas pelo Poder Público” (Rcl nº 4.785/SEMC-AgR, Relator o Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 17/12/07, DJe-47 divulgado em 13/3/08, publicado em 14/3/08).

Portanto, o STF deixou assentada a natureza administrativa do regime jurídico da contratação

temporária, mas não se posicionou sobre a aplicação do art. 19-A da Lei 8036 ao caso em tela.

3- A jurisprudência do STJ sobre contratação temporária

No STJ a questão é dividida. No sentido de haver o direito ao pagamento de FGTS em caso

de contrato temporário firmado fora dos permissivos constitucionais, colhe-se o seguinte

precedente:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. FGTS. CONTRATO DE TRABALHO DECLARADO NULO POR AUSÊNCIA DE APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO. DIREITO AO DEPÓSITO E LEVANTAMENTO. SÚMULA 466/STJ. 1. "O titular da conta vinculada ao FGTS tem o direito de sacar o saldo respectivo quando declarado nulo seu contrato de trabalho por ausência de prévia aprovação em concurso público" (Súmula 466/STJ). Em razão de expressa previsão legal, "é devido o depósito do FGTS na conta vinculada do trabalhador cujo contrato de trabalho seja declarado nulo nas hipóteses previstas no art. 37, § 2º, da Constituição Federal, quando mantido o direito ao salário" (art. 19-A da Lei 8.036/90 incluído pela Medida Provisória 2.164-41/2001). 2. Ressalte-se que "a declaração de nulidade do contrato de trabalho em razão da ocupação de cargo público sem a necessária aprovação em prévio concurso público, consoante previsto no art. 37, II, da CF/88, equipara-se à ocorrência de culpa recíproca, gerando, para o trabalhador, o direito ao levantamento das quantias depositadas na sua conta vinculada ao FGTS" (REsp 1.110.848/RN, 1ª Seção, Rel. Min.Luiz Fux, DJe de 3.8.2009 recurso submetido ao regime do art. 543-C do CPC). 3. No caso, "o Tribunal de origem decidiu que o fato de o contrato temporário ser declarado nulo não induz ao pagamento do FGTS". Contudo, "tal entendimento destoa da jurisprudência do STJ, que é no sentido de que a declaração de nulidade do contrato de trabalho em razão da ocupação de cargo público sem a necessária aprovação em prévio concurso público, consoante previsto no art. 37, II, da CF/88, equipara-se à ocorrência de culpa recíproca, gerando, para o trabalhador, o direito ao levantamento das quantias depositadas na sua conta vinculada do FGTS" (REsp 1.335.115/MG, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 24.9.2012). 4. Agravo regimental não provido. (AgRg no AgRg no REsp 1291647/ES, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/05/2013, DJe 22/05/2013)

Já no sentido da inaplicabilidade da regra contida no art. 19-A da Lei 8036, eis o seguinte

precedente do STJ: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DECLARATÓRIOS NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO TEMPORÁRIO. RELAÇÃO DE TRABALHO. NATUREZA JURÍDICO-ESTATUTÁRIA. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO CELETISTA. FGTS. PAGAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. ART. 19-A DA LEI N.º 8.036/90. INAPLICABILIDADE. PRECEDENTES DO STF E DO STJ. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. EXAME. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DA SUPREMA CORTE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. "A Emenda Constitucional 19/98, que permitia a pluralidade de regimes jurídicos pela administração, foi suspensa, neste ponto, pelo Supremo Tribunal Federal, impossibilitando a contratação de servidor público pelo regime trabalhista (ADI 2.135-MC/DF)" (CC 100.271/PE, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, Terceira Seção, DJe 6/4/09). 2. "O Supremo Tribunal Federal decidiu no julgamento da Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395 que 'o disposto no art. 114, I, da Constituição da República, não abrange as causas instauradas entre o Poder Público e servidor que lhe seja vinculado por relação jurídico-estatutária'" (AgRg na Rcl nº 8.107, Rel. p/ Ac. Min. CÁRMEN LÚCIA, STF, Tribunal Pleno,

DJe 26/11/09). 3. Nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/90, é "devido o depósito do FGTS na conta vinculada do trabalhador cujo contrato de trabalho seja declarado nulo nas hipóteses previstas no art. 37, § 2º, da Constituição Federal, quando mantido o direito ao salário. 4. Caso concreto que diverge da hipótese do art. 19-A da Lei 8.036/90, pois o vínculo de trabalho que existiu entre os litigantes não era oriundo de investidura em cargo ou emprego público posteriormente anulada por descumprimento do princípio do concurso público insculpido no art. 37, § 2º, da CRFB/88, mas de contratação de servidor temporário sob o regime de "contratação excepcional". 5. A tese segundo a qual o art. 19-A da Lei 8.036/90 deveria ser interpretado à luz do art. 7º, III, da CF/88 não é passível de ser apreciada na presente via recursal, por se tratar de matéria reservada à competência do Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 102, III, da Constituição da República. 6. Agravo regimental não provido. (AgRg nos EDcl no AREsp 45.467/MG, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/03/2013, DJe 15/03/2013)

Abaixo é transcrito trecho do voto condutor proferido pelo Ministro Arnaldo Esteves Lima,

no qual são apontadas as razões da inaplicabilidade do art. 19-A da Lei 8036 aos servidores

temporários:

O caso concreto, todavia, trata de hipótese absolutamente diversa daquela prevista pelo art. 19-A da Lei 8.036/90 c.c. 37, II, § 2º, da CF/88, uma vez que a parte embargante, como expressamente confessado na petição inicial, prestou serviços à FAMUC sem a realização de concurso público, "sob o regime de 'contratação excepcional" (fl. 7e). Em outros termos, não se trata a parte agravante de ex-servidora cujo contrato de trabalho, pela ausência de aprovação prévia em concurso público, tivesse sido anulada. Tal entendimento, outrossim, encontra-se consoante com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que no julgamento do AgRg na Rcl nº 8.107 (rel. p/ Ac. Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, DJe 26/11/09), concluiu que qualquer demanda envolvendo o servidor público e a Administração Pública deve ser processada e julgada perante a Justiça Comum, tendo em vista que a relação jurídica entre o servidor e o Poder Público, seja de que natureza for, haverá de gravitar na seara da legislação administrativa, ao asseverar que "não há possibilidade, na relação jurídica entre servidor e oPoder Público, seja ele permanente ou temporário, de ser regido senão pela legislação administrativa.11

11 Em igual sentido: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. VÍNCULO JURÍDICO- ADMINISTRATIVO INAFASTÁVEL. EMENDA CONSTITUCIONAL 19/98. PLURALIDADE DE REGIMES JURÍDICOS. SUSPENSÃO DOS EFEITOS PELO STF. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO CELETISTA. FGTS. PAGAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. A contratação temporária de trabalho, nos termos do art. 37, IX, da CF, tem natureza nitidamente administrativa, excluindo-se a competência da Justiça do Trabalho para a apreciação dos feitos relativos a esse vínculo. 2. A Emenda Constitucional 19/98, que permitia a pluralidade de regimes jurídicos pela Administração, foi suspensa, nesse ponto, pelo Supremo Tribunal Federal, impossibilitando a contratação de servidor público pelo regime trabalhista (ADI 2.135-MC/DF). 3. O Supremo Tribunal Federal adotou o entendimento de que a mera prorrogação do prazo de contratação de servidor temporário não é capaz de transmudar o vínculo administrativo que este mantinha com o Estado em relação de natureza trabalhista (RE 573.202/AM, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWISKI). 4. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1356972/MG, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/05/2013, DJe 10/05/2013) E também: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. NATUREZA ADMINISTRATIVA. SUJEIÇÃO ÀS REGRAS DE DIREITO PÚBLICO. INAPLICABILIDADE DA CLT. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL DO ALEGADO DIREITO AO FGTS. AGRAVO REGIMENTAL

No que diz respeito ao precedente do STJ que confere ao servidor temporário o direito aos

depósitos de FGTS (AgRg no AgRg no REsp 1291647/ES), calha mencionar que embora

suscitado pelo recorrente e reconhecido no tribunal local o óbice relativo ao regime jurídico

administrativo, a questão não foi apreciada pelo STJ, que simplesmente aplicou acriticamente

precedentes anteriores da corte referentes aos efeitos da nulidade da contratação firmada com

a Administração Pública, suscitando, em especial, a decisão do Recurso Especial nº 1110848.

Todavia, o precedente judicial contido no julgamento do Recurso Especial nº 1110848, do

qual se originou a súmula nº 466, juntamente com a própria súmula se revelam inadequados

para regular a situação dos servidores contratados de forma temporária. Eis a ementa do RESP

nº 1110848:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. ADMINISTRATIVO. FGTS. NULIDADE DE CONTRATO POR AUSÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO. DIREITO AO LEVANTAMENTO DOS SALDOS FUNDIÁRIOS. CITAÇÃO DO MUNICÍPIO DE MOSSORÓ/RN. CARÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E 356 DO STF. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DOS DISPOSITIVOS VIOLADOS. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO RECURSAL. SÚMULA 284 DO STF. 1. A declaração de nulidade do contrato de trabalho em razão da ocupação de cargo público sem a necessária aprovação em prévio concurso público, consoante previsto no art. 37, II, da CF/88, equipara-se à ocorrência de culpa recíproca, gerando, para o trabalhador, o direito ao levantamento das quantias depositadas na sua conta vinculada ao FGTS. 2. Precedentes do STJ: REsp 863.453/RN, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, DJ 12.11.2007; REsp 892.451/RN, Segunda Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 25.04.2007; REsp 877.882/RN, Segunda Turma, Rel. Min. Humberto Martins, DJ de 28.02.2007; REsp 827.287/RN, Primeira Turma, Rel. Min. José Delgado, DJ de 26.06.2006; REsp 892719/RN, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 13.03.2007, DJe 02.06.2008. 3. O requisito do prequestionamento é indispensável, por isso que inviável a apreciação, em sede de recurso especial, de matéria sobre a qual não se pronunciou o Tribunal de origem, incidindo, por analogia, o óbice das Súmulas 282 e 356 do STF. 4. In casu, os arts. 22 e 29-C da Lei 8.036/1990, 21 do CPC, e 406 do CC, não foram objeto de análise pelo acórdão recorrido, nem sequer foram opostos embargos declaratórios com a finalidade de prequestioná-los, razão pela qual impõe-se óbice intransponível ao conhecimento do recurso quanto aos aludidos dispositivos. 5. As razões do recurso especial mostram-se deficientes quando a recorrente não aponta, de forma inequívoca, os motivos pelos quais considera violados os dispositivos de lei federal, fazendo incidir a Súmula 284 do STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia." 6. In casu, a recorrente não aponta violação a qualquer dispositivo legal, limitando-se a

DESPROVIDO. 1. O conceito de Trabalhador extraído do regime celetista não é aplicável a quem mantêm com a Administração Pública uma relação de caráter jurídico-administrativo, razão pela qual a regra do art. 19-A da Lei 8.036/90, quanto ao pagamento do FGTS, não se ajusta a estes últimos. Precedente: AgRg no AREsp 96.557/MG, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, DJe 27.6.2012. 2. Agravo Regimental desprovido. (AgRg no AREsp 233.671/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/10/2012, DJe 19/10/2012).

alegar a necessidade de chamamento ao processo do Município de Mossoró, incidindo, mutatis mutandis, a Súmula 284 do STF, bem assim as Súmulas 282 e 356, haja vista a simultânea ausência de prequestionamento da questão. 7. A eventual ação de regresso, quando muito, imporia a denunciação da lide do Município, que é facultativa, como o é o litisconsórcio que o recorrente pretende entrevê-lo como "necessário". 8. Não há litisconsórcio passivo entre o ex-empregador (o Município) e a Caixa Econômica Federal - CEF, uma vez que, realizados os depósitos, o empregador não mais detém a titularidade sobre os valores depositados, que passam a integrar o patrimônio dos fundistas. Na qualidade de operadora do Fundo, somente a CEF tem legitimidade para integrar o pólo passivo da relação processual, pois ser a única responsável pela administração das contas vinculadas do FGTS, a teor da Súmula 82, do Egrégio STJ (Precedente: REsp 819.822/RN, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 19.06.2007, DJ 29.06.2007 p. 496). 9. A Corte, em hipóteses semelhantes, ressalva o direito da CEF ao regresso, sem prejudicar o direito do empregado (Precedente: REsp 897043/RN, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 03.05.2007, DJ 11.05.2007 p. 392). Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008. (REsp 1110848/RN, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/06/2009, DJe 03/08/2009)

Este julgado tratava de contrato de trabalho declarado nulo. A servidora autora fora contratada

pelo vínculo trabalhista e, declarada a nulidade do vínculo, pleiteava receber o FGTS

depositado na Caixa Econômica Federal, que fora devolvido ao município contratante. O

município sequer foi réu na ação, cujo polo passivo foi integrado pela Caixa Econômica.

Portanto, a precedente tratou de recebimento do FGTS por servidor contratado pelo regime da

CLT cujo contrato fora declarado nulo por falta de concurso público. Neste aspecto, a decisão

nada mais fez do que aplicar literalmente o art. 19-A da Lei 8036.

A súmula 466 do STJ, resultante do julgamento do Resp 1110848, deixa claro que a

orientação firmada pela corte foi relativa ao levantamento do FGTS depositado pelo servidor

cujo contrato de trabalho fora declarado nulo por falta de aprovação em concurso. Vide

redação do enunciado sumular: “O titular da conta vinculada ao FGTS tem o direito de sacar o

saldo respectivo quando declarado nulo seu contrato de trabalho por ausência de prévia

aprovação em concurso público.”

A redação da súmula é clara ao tratar do direito de levantamento de depósitos de FGTS

efetivamente realizados, pois se refere ao “titular da conta vinculada ao FGTS” e ao saque do

”saldo respectivo”. Se havia depósitos realizados antes da declaração de nulidade, é porque o

contrato tinha natureza trabalhista. Diz, ainda, a súmula que a nulidade é relativa a “contrato

de trabalho”, o que, pela literalidade e sentido da expressão, afasta a incidência do enunciado

em relação às contratações via regime jurídico administrativo.

Igualmente ao Resp 1110848, os demais precedentes que ensejaram a elaboração da súmula

tratavam do direito ao levantamento dos depósitos de FGTS efetuados durante a vigência do

contrato, a pressupor ter se tratado de relação jurídica de natureza celetista. Vide ementa

abaixo reproduzida:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. FGTS. APRECIAÇÃO DE OFENSA A DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE. LEVANTAMENTO DOS DEPÓSITOS FUNDIÁRIOS REFERENTES A CONTRATO DE TRABALHO NULO POR INEXISTÊNCIA DE ANTERIOR APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO. CABIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. OCORRÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 29-C DA LEI 8.036/90. 1. O Superior Tribunal de Justiça tem-se manifestado reiteradamente no sentido de admitir a liberação do saldo do FGTS em favor do titular que teve seu contrato de trabalho declarado nulo. 2. O art. 29-C da Lei 8.036/90 é norma especial em relação aos arts. 20 e 21 do Código de Processo Civil e deve ser aplicado às relações processuais instauradas a partir da edição da Medida Provisória 2.164-40 (27.7.2001), inclusive nas causas que não têm natureza trabalhista, movidas pelos titulares das contas vinculadas contra a empresa pública gestora do FGTS. A referida medida provisória foi editada em data anterior à promulgação da Emenda Constitucional 32/2001, época em que o regime constitucional não fazia restrição ao uso desse instrumento normativo para disciplinar matéria processual. Ressalvou-se, no art. 2º da EC 32/2001, que as medidas provisórias editadas em data anterior à de sua publicação continuam em vigor até que medida provisória ulterior as revogue explicitamente ou até deliberação definitiva do Congresso Nacional. Precedentes. 3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesse ponto, parcialmente provido. (REsp 863453/RN, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/09/2007, DJ 12/11/2007, p. 171)12

12 Os demais precedentes que ensejaram a súmula 466 do STJ também discutem o levantamento do FGTS depositado pelo servidor cujo contrato fora declarado nulo. PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. FGTS. LEVANTAMENTO. ANULAÇÃO DE CONTRATO DE TRABALHO. AUSÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO. FALTA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO VIOLADO. SÚMULA 284/STF. ALEGADA OFENSA A ARTIGO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. COMPETÊNCIA DO STF. HIPÓTESE EM QUE É POSSÍVEL A MOVIMENTAÇÃO DA CONTA VINCULADA. 1. Nas hipóteses em que o recurso esteja fulcrado na alínea "a" do permissivo constitucional, cabe ao recorrente mencionar, com clareza, as normas que tenham sido contrariadas ou cuja vigência tenha sido negada, o que não ocorreu na hipótese dos autos. 2. A deficiência na fundamentação do recurso especial atrai, por analogia, o óbice da Súmula 284/STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia." 3. O exame da violação de dispositivos constitucionais é de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal, conforme dispõe o art. 102, III, da Constituição Federal. 4. "A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça tem-se manifestado reiteradamente no sentido de admitir a liberação do saldo do FGTS em favor do titular que teve seu contrato de trabalho declarado nulo por inobservância do art. 37, II, da CF/1988. Precedentes." (REsp 831.074/RN, 1ª Turma, Relator Ministro José Delgado, DJ de 25/5/2006). 5. Recurso Especial a que se nega provimento. (REsp 892719/RN, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/03/2007, DJe 02/06/2008) FGTS. LEVANTAMENTO DE SALDO DE CONTA VINCULADA. CONTRATO DE TRABALHO NULO. INOBSERVÂNCIA DO ART. 37, INCISO II, DA CF. POSSIBILIDADE. DEVOLUÇÃO DE VALORES AO MUNICÍPIO EMPREGADOR. ILEGALIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MEDIDA PROVISÓRIA N. 2.164-40, PUBLICADA EM 28.7.2001. JUROS DE MORA. ART. 406 DO NOVO CÓDIGO CIVIL. TAXA SELIC. APLICABILIDADE. 1. O STJ já se manifestou no sentido de ser possível o saque do saldo de contas vinculadas do FGTS nas situações em que contratos de trabalho tenham sido declarados nulos em virtude da inobservância do disposto no art. 37, II, da CF. 2. A Caixa Econômica Federal não tem poderes para dispor de valores pertencentes a terceiros, no caso, titulares de contas vinculadas do FGTS. O ato de devolução de valores ao Município empregador em virtude de anulação de contrato de trabalho configura-se ilegal. 3. Segundo entendimento consagrado pela Primeira Seção do STJ no julgamento, em 14.2.2005, dos Embargos de Divergência no Recurso Especial n. 583.125/RS, a Medida

Provisória n. 2.164-40/2001, por disciplinar normas de espécie instrumental material que criam deveres patrimoniais para as partes, não pode ser aplicada às relações processuais já instauradas. No caso vertente, a ação foi proposta após 28.7.2001, data em que foi publicada a MP n. 2.164-40/2001. 4. Os juros de mora devem incidir na correção do saldo das contas vinculadas do FGTS no percentual de 0,5% ao mês até a data de entrada em vigor do Novo Código Civil. A partir de então, deverá incidir a Selic (Lei n. 9.250/95), taxa que está em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional (art. 406 do Código Civil de 2002). 5. Recurso especial provido parcialmente. (REsp 892451/RN, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/04/2007, DJ 25/04/2007, p. 309) Também: TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL – FGTS – CONTRATO DE TRABALHO DECLARADO NULO POR AUSÊNCIA DE APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO – SALDO LIBERADO PELA CAIXA ECONOMIA FEDERAL – LEGITIMIDADE DA AUTARQUIA FEDERAL – FALTA DE CITAÇÃO DO MUNICÍPIO DE MOSSORÓ – LIBERAÇÃO DE SALDO DE FGTS – VIOLAÇÃO DO ARTIGO 29-C, DA LEI N. 8.036/90 – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – AGENTE OPERADOR DO FGTS – APLICAÇÃO DA MP N. 2.164-41/2001 ÀS AÇÕES AJUIZADAS POSTERIORMENTE À SUA PUBLICAÇÃO – PRECEDENTES. 1. A tese relacionada à não-citação do município de Mossoró para integrar a lide não comporta conhecimento, pois a recorrente não indicou os dispositivos tidos como violados. 2. É o entendimento sedimentado neste Tribunal de que, em se tratando, tão-somente, de saque do saldo do FGTS, a competência é da Justiça Estadual, e se há resistência da CEF em proceder ao levantamento deve ser ela demandada perante a Justiça Federal. 3. O artigo 19-A, inserido pela Medida Provisória 2.164/2001, apenas positivou o entendimento pacificado da Primeira Seção, com relação à movimentação da conta de FGTS pelo trabalhador, que, nos casos de nulidade de contrato de trabalho, equipara-se à demissão decorrente de culpa recíproca; de onde se conclui que as contas vinculadas ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço permanecem na esfera patrimonial do empregado, o que impede ingerência de terceiros. 4. Deve ser afastada a fixação da verba honorária na espécie, pois a ação foi ajuizada posteriormente à publicação da MP n. 2.164-40, que se deu em 28.7.2001, e que teve seu texto convalidado e repetido na Medida Provisória n. 2.164-41, de 24.8.2001. Recurso especial parcialmente conhecido e parcialmente provido, para afastar a condenação da Caixa Econômica Federal ao pagamento dos honorários advocatícios. (REsp 877882/RN, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/02/2007, DJ 28/02/2007, p. 217) Também: PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO – FGTS – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL – CONTRATO DE TRABALHO DECLARADO NULO – LEVANTAMENTO – ART. 29-C DA LEI 8.036/90 – PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – DESCABIMENTO. 1. Compete à Justiça Federal processar e julgar demandas relativas ao FGTS em que a CEF se nega a promover o levantamento dos saldos das contas vinculadas. 2. Pedido de levantamento dos depósitos da conta vinculada do FGTS por titular cujo contrato de trabalho, firmado com o Município de Mossoró - RN, foi declarado nulo posteriormente. 3. O TST tem entendimento consolidado no sentido de que, nos casos de contrato declarado nulo por falta de concurso público, fica ressalvado o direito a salário pelo serviço prestado, sob pena de enriquecimento ilícito por parte do empregador. Se é devido o pagamento de salário, conseqüentemente nasce para o ente público a obrigação de proceder ao depósito na conta vinculada do empregado (art. 15 da Lei 8.036/90). 4. O STJ, equiparando a hipótese de nulidade do contrato de trabalho à demissão do trabalhador decorrente de culpa recíproca, tem considerado devida a liberação do saldo da conta vinculada do FGTS. Situação que foi positivada posteriormente com o advento da MP 2.164-41/2001, que inseriu os arts. 19-A e 20, II, na Lei 8.036/90. 5. Ressalva do direito da CEF de reaver, em ação própria os valores indevidamente devolvidos ao Município de Mossoró (REsp 724.289/RN). 6. A MP 2.164-40/2001, publicada em 27/07/2001, acrescentou o art. 29-C à Lei 8.036/90, afastando a condenação em honorários advocatícios nas ações entre o FGTS e os titulares das contas vinculadas ou naquelas em que figurem os respectivos representantes ou substitutos processuais. A lei especial atinge as ações ajuizadas posteriormente à alteração legislativa não se dirigindo o comando apenas às demandas trabalhistas (Pacificação de entendimento a partir de decisão proferida pela Primeira Seção no EREsp 583.125/RS). 7. Recurso parcialmente provido. (REsp 861445/RN, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/09/2006, DJ 19/10/2006, p. 285) Também: PROCESSUAL CIVIL, CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. FGTS. LEVANTAMENTO. POSSIBILIDADE. CONTRATO DE TRABALHO DECLARADO NULO POR AUSÊNCIA DE APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II, CF/88). CULPA RECÍPROCA. JUROS MORATÓRIOS. ART. 406 DO NOVO CC. INCIDÊNCIA DA TAXA SELIC. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL, AUSÊNCIA DE CITAÇÃO DO MUNICÍPIO DE MOSSORÓ E EXCLUSÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. TESES NÃO-PREQUESTIONADAS. SÚMULAS 282 E 356/STF. 1. Ação em que se pleiteia a liberação dos saldos do FGTS de ex-empregado do Município de Mossoró/RN em face da

Assim, tanto por sua redação como pelos precedentes que ensejaram seu nascimento, a

súmula 466 do STJ se revela inadequada para regular a situação dos servidores temporários,

cujo regime jurídico é de natureza administrativa.

Portanto, corretos os precedentes do STJ anteriormente mencionados que realizam a distinção

necessária entre a nulidade dos contratos de servidores públicos trabalhistas (empregados

públicos) e a invalidade da contratação de servidores temporários, afastando em relação a

estes últimos a incidência do art. 19-A da lei 8036, dada a própria redação do diploma legal

em comento, o qual é restrito aos servidores sujeitos ao regime jurídico trabalhista.

declaração de nulidade do contrato de trabalho por não-atendimento ao concurso público (art. 37, II, CF/88). Acórdão do Tribunal a quo que, reformando a sentença, admitiu a procedência do pedido exordial. Recurso especial da CEF que alega: 1) incompetência da justiça federal; 2) nulidade pelo não-acolhimento do chamamento do município ao processo; 3) ausência de vedação legal quanto à devolução dos valores do FGTS ao Município; 4) incidência de juros de mora pela taxa de 0,5% ao mês e 5) violação dos arts. 29-C da Lei nº 8.036/90 e 21 do CPC. 2. No que se refere às teses de incompetência absoluta da Justiça Federal, ausência de citação do Município de Mossoró e exclusão da condenação em honorários advocatícios, verifica-se, sem maiores dificuldades, que o aresto guerreado, em momento algum, se pronunciou a respeito desses temas. Ausente o requisito do prequestionamento, inviável a apreciação desses inconformismos, diante do que preceituam as Súmulas 282 e 356/STF. 3. Relativamente à determinação de pagamento dos valores fundiários, irretorquível é o acórdão recorrido. As contas vinculadas do FGTS compõem a esfera patrimonial dos empregados, estando em seus nomes os respectivos créditos porventura existentes. Uma vez depositados os valores em favor do titular da conta em razão de sua prestação laboral, incorporam-se ao seu patrimônio, devendo estar protegidos contra ingerências de terceiros. 4. Condutas inadequadas do Município de Mossoró ao requerer o estorno dos valores depositados em favor do autor e da CEF ao proceder à referida entrega dessas importâncias, intervindo no patrimônio do titular da conta sem a sua anuência, previsão legal ou autorização do Poder Judiciário. 5. Nas lides relativas ao FGTS, a jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de considerar devidos juros moratórios no percentual de 0,5% ao mês, a partir da citação (Súmula 163/STF), até o advento do novo Código Civil, quando então serão calculados nos termos do art. 406 desse Diploma legal. 6. Quanto à interposição do recurso pela alínea “c” do permissivo constitucional, a parte não cumpriu com os requisitos recursais, de modo a comprovar, demonstrando analiticamente, o dissídio jurisprudencial, nos termos da Lei e do RISTJ. 7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, não-provido. (REsp 827287/RN, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 01/06/2006, DJ 26/06/2006, p. 128) Também: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. FGTS. LITISCONSÓRCIO PASSIVO COM O MUNICÍPIO DE MOSSORÓ. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DOS DISPOSITIVOS TIDOS POR VIOLADOS. SÚMULA 284/STF. LEVANTAMENTO DE DEPÓSITOS FUNDIÁRIOS PELO MUNICÍPIO EMPREGADOR, EM VIRTUDE DE NULIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. O recorrente deixou de indicar os dispositivos de lei federal que teriam sido violados pelo acórdão recorrido, quanto à necessidade de citação do município para que integrasse o pólo passivo da demanda, bem assim quanto à matéria referente à incompetência absoluta da Justiça Federal para o processamento do feito. Óbice da Súmula 284/STF. 2. Não foram prequestionadas as matérias constantes dos arts. 406 do Código Civil, 21 do CPC e 22 e 29-C da Lei nº 8.036/90. Incidência das Súmulas 282 e 356/STF. 3. À Caixa Econômica Federal incumbe gerir a movimentação dos depósitos do FGTS, não lhe sendo permitido liberá-los senão nos casos previstos em lei, o que não é a hipótese dos autos. 4. Esta Corte sempre admitiu a movimentação pelo empregado dos valores depositados em sua conta vinculada do FGTS em casos de nulidade do contrato de trabalho por inobservância do art. 37, II, da CF/88, porquanto equipara essa situação à demissão do trabalhador decorrente de culpa recíproca. Precedentes. 5. Recurso especial improvido. (REsp 781365/RN, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/10/2005, DJ 07/11/2005, p. 250)

Conclusão

Com base no exposto, é possível concluir o seguinte:

1- os servidores temporários são regidos por regime jurídico de natureza administrativa;

2- a invalidade da contratação temporária não desnatura o vínculo jurídico formado, que

permanece sendo de natureza administrativa;

3- o art. 19-A da Lei 8036, por sua própria redação e pelo disposto no §2º do art. 15 da mesma

lei, não se aplica a servidores regidos por regime administrativo especial, caso este dos

servidores temporários;

4- a concessão de FGTS a servidor temporário a pretexto de nulidade do vínculo não se

compactua com a Constituição Federal.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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