A manteiga

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S e há alimento que tem sido maltra- tado pelas autoridades nutricionais é, sem dúvida, a manteiga. Os argu- mentos são bem conhecidos, vários e to- dos eles, aparentemente, alicerçados na “divina” ciência: ser uma gordura saturada e, por isso mesmo, responsável pelo dis- seminar de problemas cardiovasculares que acossam o nosso tempo, bem como pelo crescimento exponencial do cancro. A manteiga foi assim, sobretudo sob o in- fluxo interessado da indústria alimentar, acusada de ser um “perigo alimentar”. Em sua substituição logo se apressaram a “in- ventar” as “magníficas” margarinas, algu- mas das quais até, supostamente, com capacidade para reduzir o colesterol, esse inimigo “figadal” das nossas artérias e veias. Sobre o tema do “colesterol – a substân- cia maldita?” já deixámos, em tempos, algo escrito e suficientemente clarifica- dor. Por isso, vamos, agora, centrar o pre- sente estudo nos outros “crimes”, estes atribuídos à manteiga. Desde já alertamos para o facto de alicer- çar as nossas conclusões, como sempre, não exclusivamente na sacro-santa ciên- cia, mas, também, na antropologia, no empirismo e em algum bom senso que deverá, especialmente nestas matérias, imperar e prevalecer. 1) A manteiga e as doenças cardiovasculares As doenças cardiovasculares eram ra- ras na entrada do século XX. De acordo com os dados estatísticos, entre 1920 e 1960, essas doenças tiveram um acrés- cimo exponencial, tornando-se numa das principais causadoras de mortes nos EUA e também, em parte, na Europa. Coincidência, ou talvez não, durante esse mesmo período, o consumo da mantei- ga caiu, nos EUA, de cerca de um pouco mais de 7 kg para 1,8 kg, por habitante e por ano. O que logo resulta óbvio, mes- mo na ausência da “muleta científica”, é que a manteiga não pode ter cometido tais crimes e, por isso, cai, por falta de fundamento, a “acusação” formulada pe- las autoridades nutricionais. A favor de tal conclusão medeiam ainda algumas “provas” adicionais. Com efeito, o elevado consumo de manteiga em países como a França não conseguiu ser provado pela “acusação”: estar corre- lacionado com a incidência de doenças cardiovasculares. Antes pelo contrário, a França é o país que apresenta menores problemas ligados às doenças cardiovas- culares. A verdade é que a manteiga (e veremos adiante qual a melhor forma de obtê-la e tomá-la) contém doses generosas de nu- trientes que nos protegem das doenças cardiovasculares, tais como a vitamina A (de que largas faixas da população hoje são carentes), que é indispensável para a boa saúde das suprarrenais e da tiroide (não esquecer que a manteiga é também rica em iodine, fundamental para o bom funcionamento da tiroide), ambas envol- vidas na boa saúde e funcionamento do coração e do sistema cardiovascular. Da nossa experiência em Nutrição Ortomo- lecular, sabemos bem que deficiências desta vitamina na mãe gestante podem levar a anormalidades cardíacas e a má formações nos vasos sanguíneos dos be- bés. A manteiga, proveniente de vacas ali- mentadas em pastagem (1), retirada por processos tradicionais mecânicos (e não pela adição de um fermento) e não pas- NUTRIÇÃO / INVESTIGAÇÃO MANTEIGA Fonte de saúde ou de doença? Saúde Actual 38

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Se há alimento que tem sido maltratadopelas autoridades nutricionaisé, sem dúvida, a manteiga. Os argumentossão bem conhecidos, vários e todoseles, aparentemente, alicerçados na“divina” ciência: ser uma gordura saturadae, por isso mesmo, responsável pelo disseminarde problemas cardiovascularesque acossam o nosso tempo, bem comopelo crescimento exponencial do cancro.A manteiga foi assim, sobretudo sob o influxointeressado da indústria alimentar,acusada de ser um “perigo alimentar”. Emsua substituição logo se apressaram a “inventar”as “magníficas” margarinas, algumasdas quais até, supostamente, comcapacidade para reduzir o colesterol,esse inimigo “figadal” das nossas artériase veias.Sobre o tema do “colesterol – a substânciamaldita?” já deixámos, em tempos,algo escrito e suficientemente clarificador.Por isso, vamos, agora, centrar o presenteestudo nos outros “crimes”, estesatribuídos à manteiga.Desde já alertamos para o facto de alicer-çar as nossas conclusões, como sempre,não exclusivamente na sacro-santa ciência,mas, também, na antropologia, noempirismo e em algum bom senso quedeverá, especialmente nestas matérias,imperar e prevalecer.

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  • Se h alimento que tem sido maltra-tado pelas autoridades nutricionais , sem dvida, a manteiga. Os argu-mentos so bem conhecidos, vrios e to-dos eles, aparentemente, alicerados na divina cincia: ser uma gordura saturada e, por isso mesmo, responsvel pelo dis-seminar de problemas cardiovasculares que acossam o nosso tempo, bem como pelo crescimento exponencial do cancro. A manteiga foi assim, sobretudo sob o in-fluxo interessado da indstria alimentar, acusada de ser um perigo alimentar. Em sua substituio logo se apressaram a in-ventar as magnficas margarinas, algu-mas das quais at, supostamente, com capacidade para reduzir o colesterol, esse inimigo figadal das nossas artrias e veias.

    Sobre o tema do colesterol a substn-cia maldita? j deixmos, em tempos, algo escrito e suficientemente clarifica-dor. Por isso, vamos, agora, centrar o pre-sente estudo nos outros crimes, estes atribudos manteiga.

    Desde j alertamos para o facto de alicer-ar as nossas concluses, como sempre, no exclusivamente na sacro-santa cin-

    cia, mas, tambm, na antropologia, no empirismo e em algum bom senso que dever, especialmente nestas matrias, imperar e prevalecer.

    1) A manteiga e as doenascardiovascularesAs doenas cardiovasculares eram ra-ras na entrada do sculo XX. De acordo com os dados estatsticos, entre 1920 e 1960, essas doenas tiveram um acrs-cimo exponencial, tornando-se numa das principais causadoras de mortes nos EUA e tambm, em parte, na Europa. Coincidncia, ou talvez no, durante esse mesmo perodo, o consumo da mantei-ga caiu, nos EUA, de cerca de um pouco mais de 7 kg para 1,8 kg, por habitante e por ano. O que logo resulta bvio, mes-mo na ausncia da muleta cientfica, que a manteiga no pode ter cometido tais crimes e, por isso, cai, por falta de fundamento, a acusao formulada pe-las autoridades nutricionais.

    A favor de tal concluso medeiam ainda algumas provas adicionais. Com efeito, o elevado consumo de manteiga em pases como a Frana no conseguiu ser provado pela acusao: estar corre-

    lacionado com a incidncia de doenas cardiovasculares. Antes pelo contrrio, a Frana o pas que apresenta menores problemas ligados s doenas cardiovas-culares.

    A verdade que a manteiga (e veremos adiante qual a melhor forma de obt-la e tom-la) contm doses generosas de nu-trientes que nos protegem das doenas cardiovasculares, tais como a vitamina A (de que largas faixas da populao hoje so carentes), que indispensvel para a boa sade das suprarrenais e da tiroide (no esquecer que a manteiga tambm rica em iodine, fundamental para o bom funcionamento da tiroide), ambas envol-vidas na boa sade e funcionamento do corao e do sistema cardiovascular. Da nossa experincia em Nutrio Ortomo-lecular, sabemos bem que deficincias desta vitamina na me gestante podem levar a anormalidades cardacas e a m formaes nos vasos sanguneos dos be-bs.

    A manteiga, proveniente de vacas ali-mentadas em pastagem (1), retirada por processos tradicionais mecnicos (e no pela adio de um fermento) e no pas-

    NUTRIO / INVESTIGAO

    MANTEIGAFonte de sade ou de doena?

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  • teurizada, alm de conter doses genero-sas de antioxidantes (vitamina A, E e Sel-nio) que protegem as artrias e veias dos efeitos nefastos dos radicais livres, , tam-bm, rica em mega 3 e 6 e em lecitina, substncia que permite a correta assimi-lao e metabolismo do colesterol e de outros componentes da gordura. Relem-bramos (vide o nosso artigo sobre o co-lesterol publicado na Sade Actual, Jan/Fev. 2009) que apenas 5% da populao apresenta nveis de colesterol elevado derivados da sua ingesto, sendo que os restantes 95% resultam de problemas de alterao do metabolismo heptico. De salientar, ainda, que o colesterol (exge-no) que a manteiga pode legar ao nosso organismo um poderoso antioxidante, reparador da parede das artrias e veias e indispensvel para uma boa produ-o hormonal (testosterona, estrognio, etc.). No nos esqueamos que, se em vez da manteiga optarmos pelas marga-rinas, a sim estamos a colocar em risco a sade, pois esses produtos industriais so elaborados com leos vegetais que, inicialmente lquidos, precisam de sofrer um processo de hidrogenizao para se tornarem slidos e que tal processo leva formao de cidos gordos trans que,

    como bem sabemos, aumentam a snte-se do colesterol endgeno. Assim, em-bora as margarinas se publicitem como estando isentas de colesterol, a verdade que elas contribuem de forma defini-tiva para a produo de colesterol end-geno (1).

    Mais uma vez se confirma o meu lema de h muitos anos o homem f-lo, me-lhor no com-lo!

    2) Manteiga, sistemaimunitrio e cancroA ideia de que a manteiga (gordura satu-rada) aumenta o risco de cancro chega-nos desde meados do sculo passado, levando ao seu crescente abandono e ao aumento do consumo das modernas margarinas(2). Lembramos que foi nesta mesma altura, tambm, que os investiga-dores pretenderam estabelecer o postu-lado de que a manteiga era causa primei-ra das doenas cardiovasculares.Pois bem, a vitamina A, E e o selnio que podemos encontrar na manteiga, aliados ao cido Linoleico Conjugado (CLA) (3) e aos cidos gordos de cadeia curta e m-dia de que ela tambm rica, so pode-

    rosos reguladores do sistema imunitrio e tm poderosos efeitos anti-tumorais.

    3) Manteiga, ossose depressoAs vitaminas A e D em que a manteiga to generosa, so fundamentais no apenas para garantir uma absoro ti-ma do clcio e outros nutrientes funda-mentais sade dos ossos e dentes, mas, como o caso da vitamina D, fundamen-tal para mantermos um excelente nimo, alm de prevenir efeitos degenerativos a nvel celular (4). Bom, mas ela ainda rica num esterol denominado sigmaesterol que nos protege da calcificao articular (artrite degenerativa), do endurecimento das artrias, das cataratas e da calcifica-o da glndula pineal. Esta maravilhosa substncia, no entanto, perde-se com a prfida pasteurizao.

    4) Manteiga, sade intestinal e peso idealA manteiga contm, como vimos, cidos gordos de cadeia curta e mdia que nos protegem contra grmenes patogni-cos, nomeadamente fungos (lembro que

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  • a candidase intestinal hoje uma das al-teraes patolgicas mais disseminadas entre a nossa populao), cidos gordos que so essenciais para o corpo produzir energia. Um desses cidos o butrico que aumenta a sensibilidade insulina, controla os lpidos sanguneos e tem propriedades anti-inflamatrias, antican-cergenas, regula o cortisol e tem sido testado para tratar a doena de Crohn, a permeabilidade intestinal e as doenas autoimunes (5). Com efeito, a gordura corporal acumulada (nomeadamente a abdominal) prevalentemente compos-ta por cidos gordos de cadeia longa, que provm essencialmente das gordu-ras polinsaturadas (6) , bem como de hi-dratos de carbono refinados. A manteiga contribui assim com um tipo de gordura que ajuda a queimar gordura corporal, alm de que, pela sua riqueza em nu-trientes, d-nos a sensao de saciedade, evitando que tenhamos vontade de pe-tiscar aquele bolo, aquela bolacha, enfim aquele alimento que nos vai engordar.

    Para se obter um ventre plano (six pack abs), a manteiga um excelente aliado.

    5) Manteiga e fatoresde crescimentoA manteiga contm dois dos decisivos fatores para termos crianas saudveis e bem desenvolvidas.

    O primeiro a j nossa bem conhecida vitamina A. Esta vitamina extremamen-te importante durante a gravidez, como forma de prevenir que o beb tenha pro-blemas de bom desenvolvimento dos ossos, dentes e palato, ou outros defeitos de nascena. Ela pois garantia de ossos e dentes fortes, mas tambm de bom desenvolvimento das caractersticas se-xuais.

    O outro fator talvez uma das vitaminas mais descuradas da atualidade e cujas carncias na populao so assinalveis. Falamos da Vitamina K2, que essencial no crescimento e no desenvolvimento do recm-nascido, bem como na ma-nuteno da boa sade ssea na idade adulta. Mas ateno, esta preciosa vitami-na s a encontramos em manteiga que provenha de vacas criadas em pastagens e sem ter sido submetida ao processo de pasteurizao industrial (7).

    Podemos pois concluir que as low fat diets so um perigoso erro alimentar, tanto em crianas como em adultos. H que recriar a confiana na manteiga crua de qualidade, valorizando esses mara-vilhosos, srios e dedicados produtores de bom leite de elevada qualidade que continuam a dar-nos a possibilidade de termos disposio esse precioso ali-mento (8) .

    6) Que manteiga escolher?Esta pergunta fcil de responder por tudo aquilo que j deixmos dito. Se pretendemos ter este precioso alimen-to com toda a sua riqueza nutritiva, sem alteraes na estrutura dos seus ci-dos gordos e sem perda de qualidades nutritivas, ento devemos consumi-la sempre crua, isto , no pasteurizada. E no tenhamos medo dos fantasmas que durante dcadas a indstria alimentar veio fomentando de bactrias perigosas e propagao de doenas. Se os animais de que provm o leite forem acompa-nhados e controlados do ponto de vista sanitrio, a sua manteiga um saudvel alimento.

    Se se pretende aumentar a garantia de salubridade, bem como a presena e o teor dos seus nutrientes, ento deve-se tentar que ela provenha de vacas alimen-tadas em pastagem. Se, alm disso, se pretende que ela no contenha txicos, ento deve optar pela de provenincia biolgica. Finalmente, deve ser escolhida manteiga sem sal, porque, embora um pouco de sal seja indispensvel vida, a verdade que, em geral, as pessoas j tomam sal a mais na sua comida diria e, alm disso, o sal junto com gordura vai ter um efeito pernicioso no organismo, irritando os nervos e destruindo clulas (com efeito, ele vai produzir uma altera-o nos ions celulares levando as clu-las apoptose. Apenas alguns gros de sal, incluindo o sal marinho, destroiem aproximadamente 1 milho de glbulos vermelhos. So necessrias trs horas para substituir estas clulas e mais de 24 horas para eliminar as clulas mortas. Du-rante esse processo, um conjunto vasto de nutrientes eliminado pelo sangue e pelo corpo, sendo que, desta forma, o sal apressa o envelhecimento). O sal con-traria, ainda, os efeitos do cido butrico, antes referidos.

    Em concluso: a escolha deve ser MANTEIGA BIOLGICA (de vacas alimen-tadas em pastagem e no com raes), NO PAUSTEURIZADA, SEM SAL e nunca deve ser aquecida (9).

    (1) Vide sobre o tema de repensar as fontes do coleste-rol elevado este estudo levado a cabo por dois mdicos Cranton, E.M., Frackelton, J.P.: Journal of Holistic Medicine, Spring/Summer 1984. O Dr William Castelli, Diretor do co-nhecido Framingham Study, elaborado em 1992, escreveu: In Framingham, Massachusetts, the more saturated fat one ate, the more cholesterol one ate, the more calories one ate, the lower peoples serum cholesterol. . .(2) Pearce, M. L., Dayton, S.: Incidence of cancer in men on a diet high in polyunsaturated fat. Lancet 1971; i: 464(3) Ip, C., Scimeca, J.A., Thompson, H.J.: Conjugated linoleic acid. A powerful anticarcinogen from animal fat sources. Cancer 1994; 74(3 Suppl): 1050-4. Shultz, T.D., Chew, B.P., Seaman, W.R., Luedecke, L.O.: Inhibitory effect of conjuga-ted dienoic derivatives of linoleic acid and beta-carotene on the in vitro growth of human cancer cells. Cancer Let-ters 1992; 63: 125-133.(4) Supplee, G.C., Ansbacher, S., Bender, R.C., Flanigan, G.E.: The Influence of Milk Constituents on the Effectiveness of Vitamin D, Journal of Biological Chemistry, 141:95?107, May, 1936.(5) Os estudos levados a cabo at agora que evidencia-vam propriedades inflamatrias intestinais da manteiga estavam todos assentes no consumo de manteiga paus-teurizada e, sem dvida, esta tem efeito inflamatrio intes-tinal e leva a permeabilidade intestinal.(6) Vide este estudo levado a cabo na Sucia em 61.471, com idade compreendidas entre os 40 e os 66 anos, em que se constactou que enquanto as gorduras monosa-turadas tinham um efeito protector sobre o desenvolvi-mento do cancro da mama, j as polinsaturadas tinham um efeito potenciador do mesmo. As gorduras saturadas apresentavam-se neutras. Wolk, A., et al.: A Prospective Study of Association of Monounsaturated Fat and Other Types of Fat With Risk of Breast Cancer. Arch Intern Med. 1998; 158: 41-45.(7) Este processo de pausteurizao consiste em elevar a temperatura num flash de 3 segundos at os 80 graus celsius e numa subsequente refrigerao imediata. um violento tratamento de choque que desnaturaliza e altera este precioso alimento. Este processo industrial nada tem que ver com o processo tradicional de pausteurizao de ir muito lentamente subindo a temperatura em banho-maria, que preserva todas as qualidades do alimento.(8) Osborne, T. B., Mendel, L. B.: The Influence of Butter Fat on Growth, Journal of Biological Chemistry, 16:423?437, 1914.(9) Pela dificuldade que, ao longo dos anos, tivemos para que os nossos pacientes pudessem beneficiar de to rico, saudvel e teraputico alimento, resolvemos colocar, no dispensrio da nossa clinica (Foz vital Dr. Marcos Blood Diet Clinic), tal produto disposio do pblico, como forma de os ajudar a resolver essa dificl busca. Esperamos que, no futuro prximo, a produo de qualidade nos traga, de novo, este maravilhoso alimento ancestral com maior abundncia e melhor preo.

    A. Marcos. Ph.D.

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