A MAIÊUTICA SOCRÁTICA COMO FERRAMENTA DE REFLEXÂO NA EDUCAÇÃO

9

Click here to load reader

Transcript of A MAIÊUTICA SOCRÁTICA COMO FERRAMENTA DE REFLEXÂO NA EDUCAÇÃO

Page 1: A MAIÊUTICA SOCRÁTICA COMO FERRAMENTA DE REFLEXÂO NA EDUCAÇÃO

CENTRO UNIVERSITÁRIO SÃO CAMILO – ESPÍRITO SANTO

A MAIÊUTICA SOCRÁTICA COMO FERRAMENTA DE REFLEXÃO

NA EDUCAÇÃO.

THE SOCRATIC MAIEUTICS AS A REFLECTION TOOL IN THE EDUCATION.

Resumo: Este artigo visa especificar como a Maiêutica socrática juntamente com

outras noções filosóficas de tendências conservadoras ainda podem inovar a

educação, mediante a ações simples no cotidiano do fazer docente.

Palavras Chaves: Sócrates, Maiêutica, Platão, Diálogo, Reflexão Crítica.

Abstract: This article aims to specify how the Socratic maieutics with others

conservative philosophical tendencies and notions can still innovate the education,

face to simple actions on the teaching quotidian.

Keywords: Socrates, Maieutics, Plato, Dialogue, Critical Reflection.

Page 2: A MAIÊUTICA SOCRÁTICA COMO FERRAMENTA DE REFLEXÂO NA EDUCAÇÃO

A MAIÊUTICA SOCRÁTICA COMO FERRAMENTA DE REFLEXÂO

NA EDUCAÇÃO.

1 - Introdução

O grande objetivo da Educação atualmente com certeza é a reflexão e o

questionamento. A sociedade ocidental necessita urgentemente de pessoas que

obtenham a capacidade de pensar, refletir e criar ao invés de apenas recitar e

reutilizar conceitos prontos, como é o caso da educação tecnicista que visa

basicamente formar um indivíduo capacitado para o mercado de trabalho.

É impressionante como se analisarmos a cultura e a educação brasileira,

ainda veremos os fortes aspectos positivistas da educação tecnicista impregnado

nelas, talvez como herança da gestão dos militares desde o golpe de 1964.

A educação influenciada pelos ideais positivistas carece de incentivo ao desenvolvimento do pensamento crítico. A educação tecnicista apoiada nos ideais positivistas não deve reduzir-se apenas ao ensino técnico, mas deve preocupar-se também em buscar a razão do próprio procedimento técnico. Aceitar a ciência como o único conhecimento, como queria o positivismo, é algo reducionista que perde uma considerável parcela de conhecimento que não estão no dado; fica prejudicada tanto a criação como a dedução [...] (LEAL; ISKANDAR, 2002, p. 94)

A necessidade de se fazer uma educação voltada para a reflexão e o

desenvolvimento do raciocínio crítico, vai muito além da relação professor-aluno,

mas, principalmente vai de encontro à figura do pedagogo.

2 - Metodologia e Métodos.

A metodologia de pesquisa se deu através de pesquisa bibliográfica em

artigos científicos publicados em diversos periódicos, bem como livros. O objetivo

desta pesquisa foi demonstrar a utilidade da maiêutica como instrumento de

incentivo ao raciocínio crítico e ao desenvolvimento de ideias.

Todas as citações foram retiradas de textos que trabalham integralmente ou

parcialmente os conteúdos envolvidos neste de maneira a dar suporte ao conteúdo

desta unidade.

Page 3: A MAIÊUTICA SOCRÁTICA COMO FERRAMENTA DE REFLEXÂO NA EDUCAÇÃO

CENTRO UNIVERSITÁRIO SÃO CAMILO – ESPÍRITO SANTO

3 - Resultado e Discussão

É possível realizar um planejamento que adote algum método para estimular

os educandos, não só a absorver o conteúdo, mas sim a compreender o que o

mesmo é? É possível estimular alunos do ensino médio a através de uma análise

crítica perceber a sua importância na sociedade? É possível estimular o educando a

enxergar os conteúdos não só como ferramenta científica, mas como algo que pode

lhe ser útil no seu cotidiano? Nilda Teves (1992 apud FERREIRA; p. 18, Rodolfo; p.

51) dá-nos uma boa dica de porque essas perguntas são importantes.

Quando se fala, imagina-se, pressupõe-se que o outro está nos compreendendo, mais ainda, esperam-se dele certas respostas. A nossa expectativa em relação aos outros se funda nas ideias, nas crenças, que temos em relação a nós.

É preciso que o educando compreenda um diálogo e a importância de seu

raciocínio, e é a partir dessas perguntas que muitos de nós irão refletir em como

coisas muitas vezes tão distantes de nossa realidade e abstratas aos nossos

saberes, são na verdade saberes importantes no nosso cotidiano. Um bom exemplo

disso é a Biologia.

Aos nossos olhos a genética é algo tão inalcançável, que em muitas ocasiões

nós a encaramos como um saber complexo em que apenas os cientistas do Projeto

Genoma realmente os poderiam achar interessantes ou mesmo compreensíveis.

A maioria dos nossos alunos do ensino médio já aprendeu a utilizar

microscópios e a lidar com ideias básicas de Genética, que qualquer um de nós

professores, pedagogos e gestores também somos capazes de lidar; partindo desse

pressuposto, logicamente concluímos que a Biologia é complexa, mas não é tão

estratosférica quanto muitas vezes pensamos.

Não são raras às vezes em que crianças nos pegam desprevenidos com

perguntas realmente boas, como as já tradicionais e temidas pelos pais: De onde

vêm os bebês? ou Como eu entrei na barriga da mamãe?. Ou até algumas em que a

questão moral não é tão aflorada como, por exemplo: Porque eu tenho olhos claros

e meu irmão tem olhos castanhos?. Estes são apenas mais alguns exemplos de

como a genética e a biologia ainda que discretamente, estão presentes na nossa

vida.

Page 4: A MAIÊUTICA SOCRÁTICA COMO FERRAMENTA DE REFLEXÂO NA EDUCAÇÃO

A questão é central deste debate é; nosso currículo educacional tem levado

nossos estudantes a compreender tudo o que eles realmente deveriam

compreender? Não, é a resposta mais óbvia. Como já descrito acima, ainda temos a

herança tecnicista nos nossos professores e gestores. A aula expositiva é realmente

um modelo muito bom, mas ao contrário do que muitos de nossos professores estão

acostumados, ela não é a única opção. É realmente difícil fugir da tríade: Aula

expositiva, dever de casa e prova.

Sair da posição de conforto realmente não é fácil, mas o que está em questão aqui

não é uma revolução cultural ou educacional em classe, mas sim uma postura até

bastante conservadora se comparada com outras mais correntes. Apenas uma

estratégia que o pedagogo pode utilizar no momento de instruir o corpo docente; A

Maiêutica Socrática Olavo de Carvalho (1998, p. 28) explica bem como Sócrates não

se contentava com a zona de conforto, enfim, “Sócrates ia pelas praças cobrando os

direitos da consciência, aviltada pelos abusos da retórica”.

Sócrates foi um filósofo helênico que viveu aproximadamente quatro séculos antes

de Cristo, assim como a maioria dos Sofistas, Sócrates desvalorizava a escrita,

considerava-a pobre em comparação com a língua falava. Ele certamente era um

dos grandes gênios da oratória em seu tempo. A maioria das informações que se

tem sobre este arauto da filosofia vem através dos escritos de Platão, seu discípulo.

Mas Platão não se limita a seguir os passos do grande Parmênides, pois inspira­se também no modo como seu mestre Sócrates (o qual supõe­se que tenha nascido em 469 a.C.) fazia filosofia para propor um método que possibilitasse a passagem do mundo sensível ao mundo inteligível, método que vai denominar de dialética. (GOTTSCHALK, 2007, p.15)

Entre muitas das coisas que Sócrates deixou como legado, uma delas com

certeza foi a Maiêutica. O termo “Maiêutica”, tem como significado “parir”, “dar a luz”,

isso é uma analogia à incessante busca de Sócrates pela verdade interior

aprisionada na alma imortal; o que explica o seu jargão “Conhece-te a ti mesmo”.

3.1 – Exemplos de funcionamento da maiêutica.

Page 5: A MAIÊUTICA SOCRÁTICA COMO FERRAMENTA DE REFLEXÂO NA EDUCAÇÃO

CENTRO UNIVERSITÁRIO SÃO CAMILO – ESPÍRITO SANTO

Como funcionava a Maiêutica? No que consistia a Maiêutica? Essa é a

pergunta que muitos se fazem. A Maiêutica nada mais é que um “jogo” de perguntas

e respostas incessantes de Sócrates que visava extrair de um indivíduo respostas e

em seguida contrapô-las, de maneira a causar confusão e forçar a pessoa a

reformular seus conceitos até que ele eliminasse aquilo que era socialmente imposto

através de uma ideia simplista e desenvolver, “trazer a luz” um conhecimento que

está aprisionado na alma imortal, que teria outrora testemunhado todas as ideias.

[...] Como é possível conhecermos algo do qual não sabemos nada? Para esses professores itinerantes, não haveria um conhecimento absoluto a ser transmitido, todo o saber possível se reduz a meras opiniões refutáveis por hábeis argumentos. Para combater o relativismo presente nos argumentos dos sofistas, Platão recorre a mitologias e entidades metafísicas, esboçando em um de seus diálogos de transição, Mênon, pela primeira vez, a sua teoria da reminiscência, ou seja, a ideia de que a alma é imortal e que teria contemplado todas as verdades possíveis em outras encarnações. (GOTTSCHALK, 2010; p, 64)

As perguntas de Sócrates sempre revelavam no discurso oposto algumas

contradições ou questões mal explicadas, como demonstradas abaixo no diálogo

fictício entre dois personagens, Paulo e Pedro.

Paulo: – Eu contribuí com o projeto social “Luz e vida”.

Pedro: - Porque você contribuiu?

Paulo:- Porque isso é bom.

Pedro: - E porque isso é bom?

Paulo: - Ora, porque é bom, todos acham isso bom.

Pedro: - Só porque todos concordam com algo, essa coisa é necessariamente boa?

Paulo: - Não, mas é uma boa indicação de que é, afinal quem faria algo ruim por opção? Se todos concordam, possivelmente é bom.

Pedro: - Existe bondade absoluta? Isso é, existem atitudes que são universalmente aceitas como boas?

Paulo: - Sim. Existem.

Pedro: - Então, porque há tanta discordância no mundo?

Paulo: - Porque existem pessoas tomando más decisões.

Page 6: A MAIÊUTICA SOCRÁTICA COMO FERRAMENTA DE REFLEXÂO NA EDUCAÇÃO

Pedro: - Mas você disse que ninguém escolheria algo ruim por opção.

Paulo: - É... Tu tens razão. Existem coisas podem ser boas para alguns e ruins para outros.

“Pedro: - De certo que sim.

O Diálogo acima mostra claramente o funcionamento da Maiêutica como ferramenta

de encontrar um fundamento real para as coisas. Sócrates agia de maneira bastante

similar, como demonstrado em um diálogo com um escravo:

[...] Sócrates e um escravo de Mênon, que nunca havia aprendido geometria antes, mas que, não obstante, vai sendo conduzido paulatinamente por Sócrates até deduzir “por si só” o teorema de Pitágoras. Sucintamente, eis como isto ocorre: Sócrates inicia desenhando um quadrado no chão, perguntando em seguida ao escravo, qual seria o tamanho do lado de um quadrado cuja área fosse o dobro do quadrado inicial. Sempre partindo das respostas convictas do escravo, Sócrates vai reformulando-as, introduzindo novas figuras, até que, já no final do intenso interrogatório o escravo, já exausto, vê desenhado por Sócrates um quadrado que satisfaz as condições do problema matemático [...] (GOTTSCHALK, 2010; p.65)

Esta com certeza é uma ótima estratégia que o professor pode utilizar para

trabalhar não só suas disciplinas, mas valores morais, ética, cidadania e política. Já

não há mais espaço para a educação que só forma pessoas destinadas a

desempenhar papéis profissionais na sociedade. Esta é uma arma antiquíssima na

luta pelo conhecimento que, entretanto, os pedagogos e professores ainda parecem

desconhecer. Promover debates ideológicos, Direita e Esquerda; Progressismo e

Conservadorismo; Capitalismo e Socialismo. Debates Filosóficos e Morais, Certo e

Errado; Bom e Mau; Bem e Mal, Ser e Não-Ser. Promover debates sobre temas

polêmicos: educação etnicorracial, cotas e etc.

O Choque de ideias leva o aluno a se questionar, raciocinar e argumentar,

tornando o debate muito mais rentável e produtivo.

O professor quando “in class”1 pode usar esse método inclusive para

transmitir o conteúdo a ser estudado; vejamos mais um diálogo hipotético entre um

professor e seu aluno.

1 Expressão inglesa que significa “Em classe” ou “Em sala”.

Page 7: A MAIÊUTICA SOCRÁTICA COMO FERRAMENTA DE REFLEXÂO NA EDUCAÇÃO

CENTRO UNIVERSITÁRIO SÃO CAMILO – ESPÍRITO SANTO

“Professor: - João, você poderia me dar o conceito de Justiça”? João: - Sim professor, Justiça é o ato de estabelecer igualdade. Professor: - É uma boa resposta, mas me parece incompleta, poderia me dar um exemplo? João: Sim, se alguém rouba deve ser punido por isso e o que foi roubado ressarcido. Professor: E você atribuiria o mesmo processo a todos os casos de roubo? João: Sim. Professor: João, suponhamos que o ladrão era um mendicante que roubou uma sacola de feijão para alimentar seu filho faminto, você ainda acha esse procedimento justo? Após algum silêncio, João Responde: - Não, mas pode haver algumas variações no tratamento aos crimes de roubo, afinal, eles não são todos iguais. Professor: - Sim, estou de acordo, mas que diferenciação você faria? João: - Nesse caso eu faria “vista grossa”. Professor: - Muito humano da sua parte, mas nesse caso, não haveria justiça, pois não haveria igualdade, segundo seu conceito. Afinal, a pessoa roubada ainda estaria no prejuízo. João: - É, tens razão; nesse caso poderíamos prender o meliante, ressarcir o valor do produto, ou mesmo o produto e dar a ele uma pena mais leve. Professor: Sim, com certeza essa é uma decisão mais razoável que a anterior, mas ainda assim haveria desigualdade. E o filho faminto, quem cuidaria dele? João: Ora, o estado! Ele poderia ser sustentado pelo estado! Professor: Claro, é uma saída racional, mas você acha justo que o filho de uma ladrão, ainda que passando fome, seja sustentado pelo estado enquanto muitas crianças filhas de pessoas honestas estão passando fome? Isso não seria desigualdade? João: - Com certeza, talvez a definição de igualdade não seja a mesma para todos os fatos; um fato pode ser justo num cenário e injusto em outro. “Professor: - Sim, eu creio que seja um ponto de vista muito mais coerente que o anterior.”

O professor estimula seu aluno neste exemplo a definir Justiça; obviamente

não é fácil, mas como exemplo funciona bem a demonstração de como a maiêutica

pode ser útil no debate sobre valores, inclusive o aluno João chegou bem próximo a

uma definição aristotélica de justiça como nos mostra (PASSOS, 2009, p.46-47).

[...] Primeiro, a justiça, assim como as demais virtudes de caráter (coragem, temperança, liberalidade etc.) É uma disposição e não mera capacidade [...] Segundo, é pela justiça que os homens agem justamente. Isso significa que uma ação só é justa, estrita ou absolutamente falando, se for causada pela disposição de ser justo. Assim, aquele que agiu apenas imitando a forma externa da ação justa, foi justo e agiu justamente apenas por acidente, como alguém que não roubou só porque soube que seria descoberto. E ainda que se possa interpretar que a ação foi justa, embora o agente seja

Page 8: A MAIÊUTICA SOCRÁTICA COMO FERRAMENTA DE REFLEXÂO NA EDUCAÇÃO

Injusto, o critério de qualificação da ação prossegue sendo uma disposição presente no agente justo [...]

4 - Conclusão.

Apesar de ser um método muito comum a injustamente tão criticada

pedagogia tradicional, a maiêutica ainda é uma ferramenta importantíssima no que

se refere à formação do pensamento e a capacidade de raciocinar criticamente e por

isso é altamente aconselhada aos pedagogos e professores como ferramenta de

emancipação intelectual em sala de aula. O que para muitos pode ser considerada

uma proposta conservadora, é na verdade um resgate de pontos positivos que

incentivaram a nossa educação durante muitos anos e entretanto foi esquecida

durante o processo da educação tecnicista fundamentada no ideal positivista dos

militares durante o período da ditadura.

Page 9: A MAIÊUTICA SOCRÁTICA COMO FERRAMENTA DE REFLEXÂO NA EDUCAÇÃO

CENTRO UNIVERSITÁRIO SÃO CAMILO – ESPÍRITO SANTO

REFERÊCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

GOTTSCHALK, Cristiana Maria Cornelia. O papel do método no ensino: Da

Maiêutica Socrática à Terapia Wittgensteiniana. ETD: Educação Temática Digital,

v. 12, p.64-81, 2010.

GOTTSCHALK. Cristina Maria Cornelia. O papel do mestre: Mênon revisitado sob

uma perspectiva Wittgensteiniana. Universidade Autônoma de Barcelona. p.13-28,

2007.

LEAL, Maria Rute; ISKANDAL, Jamil Ibrahim. Positivismo e Educação. Revista

Diálogo Educacional, Curitiba, v. 3, n. 7, p. 89-94, set./dez. 2002.

PASSOS, Jorge R. C. Justiça e Equidade em Aristóteles. Revista Augustus. Rio

de Janeiro, v. 14, n. 28; p. 45-56, ago/2009.

RODRIGUES, Alberto Tosi. Sociologia da Educação. Rio de Janeiro: Lamparina,

2007, 6. Ed.130.

FERREIRA, Rodolfo. Entre o sagrado e o profano: O lugar social do professor.

Rio de Janeiro: Quartet, 3ª Edição, 2002.

CARVALHO, Olavo de. O Jardim das Aflições: De Epicuro a ressurreição de

César, um ensaio sobre o materialismo e a religião civil. Rio de Janeiro. Ed.

Topbooks. 2ª Edição. 1998.