A LUTA PELA POSSE DA TERRA NO MARANHÃO: CASO DE CAXIAS/MA

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A LUTA PELA POSSE DA TERRA NO MARANHÃO: CASO DE CAXIAS-MA ANA CAROLINA NUNES DE AZEVEDO 1 UEMA - [email protected] PAULO HENRIQUE FERREIRA SOARES 2 UEMA - [email protected] MARIA TEREZA DE ALENCAR 3 UEMA - [email protected] Resumo A pesquisa tem como objetivo espacializar as questões da luta pela posse da terra no Maranhão e em Caxias-MA, abordando os conflitos agrários decorrentes da incansável luta dos camponeses pela posse da terra que está concentrada sob o poder dos grandes latifundiários, identificando as causas dos conflitos no estado e os impactos sociais. A metodologia desenvolvida ao longo do trabalho foi à pesquisa bibliográfica e pesquisa em documentos. Os conflitos estão presentes em todo estado, em especial na região Leste, próxima ao Tocantins e Pará. Palavras chaves: Conflitos. Maranhão. Posse da terra. 1. Introdução Desde o processo de colonização portuguesa que aqui se instalou com o regime de sesmaria - regime de posse da terra vigente em Portugal e que foi transplantado para o Brasil, que dava o direito da posse de terra aos brancos, “puros de sangue” e aos católicos, o país é marcado pela concentração fundiária e a desigualdade social. Enquanto que os brancos e os católicos tinham direito a posse da terra, os índios, escravos, judeus, etc. não tinham o mesmo o direito. O período colonial no Brasil se constitui de três componentes importantes na organização social, que eram: a grande propriedade fundiária, a monocultura de exportação e o trabalho escravo. Além disso, a forma familiar de produção que acontece desde o período de ocupação, sendo subordinada à grande propriedade, produzindo produtos alimentícios para a subsistência e pequenos mercados locais, pois as grandes lavouras só produziam cana de açúcar que era exportado para Portugal. 1 Graduanda do Curso de Licenciatura em Geografia da Universidade Estadual do Maranhão 2 Graduando do Curso de Licenciatura em Geografia da Universidade Estadual do Maranhão 3 Professora Orientadora Doutora em Geografia da Universidade Estadual do Maranhão

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A LUTA PELA POSSE DA TERRA NO MARANHÃO: CASO DE CAXIAS-MA

ANA CAROLINA NUNES DE AZEVEDO1

UEMA - [email protected]

PAULO HENRIQUE FERREIRA SOARES2

UEMA - [email protected]

MARIA TEREZA DE ALENCAR3

UEMA - [email protected]

Resumo A pesquisa tem como objetivo espacializar as questões da luta pela posse da terra no Maranhão e em Caxias-MA, abordando os conflitos agrários decorrentes da incansável luta dos camponeses pela posse da terra que está concentrada sob o poder dos grandes latifundiários, identificando as causas dos conflitos no estado e os impactos sociais. A metodologia desenvolvida ao longo do trabalho foi à pesquisa bibliográfica e pesquisa em documentos. Os conflitos estão presentes em todo estado, em especial na região Leste, próxima ao Tocantins e Pará.

Palavras chaves: Conflitos. Maranhão. Posse da terra.

1. Introdução

Desde o processo de colonização portuguesa que aqui se instalou com o

regime de sesmaria - regime de posse da terra vigente em Portugal e que foi

transplantado para o Brasil, que dava o direito da posse de terra aos brancos, “puros

de sangue” e aos católicos, o país é marcado pela concentração fundiária e a

desigualdade social. Enquanto que os brancos e os católicos tinham direito a posse da

terra, os índios, escravos, judeus, etc. não tinham o mesmo o direito.

O período colonial no Brasil se constitui de três componentes importantes na

organização social, que eram: a grande propriedade fundiária, a monocultura de

exportação e o trabalho escravo. Além disso, a forma familiar de produção que

acontece desde o período de ocupação, sendo subordinada à grande propriedade,

produzindo produtos alimentícios para a subsistência e pequenos mercados locais,

pois as grandes lavouras só produziam cana de açúcar que era exportado para

Portugal.

1Graduanda do Curso de Licenciatura em Geografia da Universidade Estadual do Maranhão 2 Graduando do Curso de Licenciatura em Geografia da Universidade Estadual do Maranhão

3 Professora Orientadora Doutora em Geografia da Universidade Estadual do Maranhão

Marta
Carimbo
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O período na Nova Republica, após a ditadura militar foi marcado pelo grande

número de conflitos no campo, envolvendo a posse da terra, ocorrências de trabalho

escravo, conflitos trabalhistas, organização de movimentos sociais e outros tipos de

conflitos vinculados à seca, ao movimento sindical e à política agrícola.

Foram quatro fases na ocorrência dos conflitos no campo, no período de 1985

a 1989, foram grandes as causas, entre 1990 e 1992 uma redução relativa, um

aumento dos conflitos nos anos de 1993 a 1995, finalmente em 1996 a 1998 manteve-

se alta e crescente a incidência dos mesmos. A realidade maranhense e também toda

brasileira apresenta uma ampla conflitualidade e um aumento da violência no espaço

agrário, nos quais existem fortes violações de direitos humanos.

Observa-se que os conflitos agrários no Maranhão, decorrente da luta pela

posse da terra, tem suas raízes históricas, aproximadamente quatro séculos, e nada

se fez em relação a reforma agrária. Ainda há muito que se fazer, e as ações do

governo atual não demonstram nenhuma ação em relação à melhoria do sistema

agrário, significando que a impunidade sempre esteve, e estar ligada ao poder político,

e a riqueza daqueles que praticam crimes hediondos contra os camponeses e/ou

agricultores familiar.

2. A Luta pela terra no Brasil

A Lei nº 601, 1850 (Lei de terras) nada mais foi do que uma solução

encontrada pela elite brasileira para manter a estrutura agrária inalterada, assim

impedindo o acesso livre a terra por parte da população pobre, só era possível ter a

posse da terra por meio da compra em dinheiro. Objetivavam conseguir trabalhadores

livres para as lavouras de café, pois o estado brasileiro já estava planejando a

imigração de europeus para substituir o trabalho escravo que estava prestes a ser

abolido. Em meados do século XIX o Brasil teve um primeiro momento adequado para

realização da reforma agrária, mas isto não interessava as elites brasileiras, pois os

mesmos queriam ter trabalhadores sem terra para trabalharem nas lavouras de café.

Com o Golpe de 1964 é nesse período que ocorre a efervescência da

modernização tecnológica, juntamente com organizações políticas dos trabalhadores

rurais sobre tudo os movimentos sociais que ganham forças, a exemplo das Ligas

Camponesas no Nordeste, que se organizaram e começaram a lutar pela posse da

terra.

Ressalta Sorj (1986, p. 23),

As mobilizações no período do Governo João Goulart adquiriram características de confrontamento e polarização crescentes, levando

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à unificação de grande parte da burguesia em torno do golpe de Estado que se contrapunha ao movimento reformista, contando, portanto, as perspectivas da transformação da estrutura fundiária a partir de um processo de mobilização popular.

Após o Golpe de 1964 a modernização tecnológica permanece ostentada e

organizada enquanto que a estrutura fundiária manteve-se desorganizada e desigual.

Diante disso foram criados pela elite politica dominante da época enquanto legislação

o Estatuto do Trabalhador rural e o Estatuto da Terra, que na verdade foi um meio de

“minimizar” os movimentos sociais, sem falar que o Estatuto do Trabalhador rural

proibia greves e/ou manifestações no campo.

Vale acrescentar que a modernização, na verdade só beneficiou as médias e

grandes propriedades, por meios de créditos subsidiado que proporcionou aos

grandes latifundiários a compra de tratores, máquinas modernas, fertilizantes, etc.

Como resultado da modernização conservadora, houve um aumento massivo

da mão de obra assalariada nas grandes propriedades modernizadas, surgindo então

os tralhadores “boias-frias”.

Segundo Wagner Miralha, em relação aos resultados da modernização

tecnológica gerou efeitos positivos no plano econômico, para a agricultura brasileira,

como:

a transformação da base técnica;

o aumento médio da produtividade, graças aos insumos modernos; e,

o aumento da produção agropecuária nacional, que possibilitou ao país mais

divisas através do aumento das exportações de produtos agrícolas.

Porém, os efeitos positivos só ficaram no âmbito econômico, enquanto que para a

esfera social, espacial, cultural e o ambiental os resultados desse processo não foram

nada satisfatórios, pelo contrario, a modernização conservadora gerou efeitos

drásticos, como por exemplo:

aumento maciço do êxodo rural, pois esse processo abrangeu somente o

médio e o grande produtor, como citado a cima, gerando então uma expulsão e

desapropriação de grande parte de pequenos produtores, meeiros, posseiros,

agricultores familiares, etc.

ampliou ainda mais as desigualdades sociais, pois os resultados dessa

modernização beneficiou muito pouco, ou nada a classe trabalhadora,

favorecendo assim as elites;

causou sérios danos ambientais;

provocou danos à saúde humana, dentre outros.

Com o fim da ditadura militar em meados da década de 1980, com a volta do

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estado “democrático” pensava-se que a reforma agrária poderia ser realizada com a

ajuda dos movimentos sociais, diante disso no governo de José Sarney chegou-se a

elaborar o primeiro Plano Nacional da Reforma Agrária (PNRA), mas esse plano só

ficou no papel nada fora concretizado, pois as forças contrárias à reforma agrária,

eram maiores.

Na década de 1990 os movimentos sociais que lutam pela posse da terra não ficaram

pra trás, principalmente o MST com a ajuda e apoio da CPT, seguiram crescendo e

aumentando o número de integrantes, conseguindo assim uma repercussão nacional

com ocupações de várias fazendas improdutivas, passando assim a entrar na mídia e

ganhar espaço além da boa parte da opinião pública a seu favor.

O Brasil teve a oportunidade de promover a reforma agrária mais uma vez ela

foi barrada pelos grandes interesses particulares dos grandes proprietários de terra,

contudo no período que vai do fim da ditadura militar à meados da década de 1990,

Configura-se a criação de obstáculos jurídicos e administrativos que apontavam para uma paralisia não apenas política, mais também jurídica e institucional dos programas de implementação de assentamentos rurais que, ainda que muito lenta e parcialmente, vinham sendo implementados nos anos 80. O Governo Collor deu continuidade a esta paralisação política e institucional da reforma agrária. […] a legislação agrária, sobretudo após a constituinte, a Lei Agrária e suas complementações e regulamentações, tornou-se contraditória e complicada (BERGAMASCO; NORDER, 2003, pp. 33-34).

Assim os movimentos MST foram ganhando repercussões nacionais e

ocupações de várias fazendas, estimulou o governo federal com a presidência de

Fernando Henrique Cardoso acelerar os processos de desapropriação de terras e a

intensificação de implantar os assentamentos rurais, elevando o número de famílias

assentadas. É importante ressaltar que os projetos de assentamentos rurais

implantados até hoje, em sua maioria, só ocorreram em virtude da pressão dos grupos

minoritários, pois se fosse pela vontade do estado pouco ou nada tinha sido feito até

hoje com relação a desapropriação de terras de assentamentos rurais. Mesmo sendo

uma vitória para estes grupos, é visível a carência nos assentamentos no que se

refere ao crédito, à extensão rural, educação, lazer e saúde.

Apartir de 2003 com o Governo Lula foi necessário avaliar o PNRA uma

proposta que viabilizava mudanças e medidas interessantes com relação a estrutura

fundiária reinclusão de várias famílias no processo produtivo, constituindo uma política

de combate à desigualdade e desenvolvimento econômico, no entanto vai se exigir

uma integração interinstitucional entre os ministérios e órgãos federais relacionados

com a questão agrária.

Outro ponto bastante positivo no plano é o reconhecimento das diversidades

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regionais e culturais e a desigualdade entre homem e mulher no Brasil, pois temos um

país muito heterogêneo. Apesar de vários aspectos positivos do PNRA há também

vários métodos que impedem a realização de uma verdadeira reforma agrária que

seja capaz de transformar a estrutura agrária brasileira, desconcentrando a posse da

terra dinamizando o espaço rural e proporcionando o desenvolvimento de uma ampla

forma.

3. A luta pela posse da terra no Maranhão

A questão fundiária maranhense tem sua origem na forma como se distribui o

acesso aos recursos fundiários, estando relacionados a políticas governamentais que

vem se desenvolvendo desde final dos anos de 1970, sendo acentuada com a “Lei

Sarney de Terras” que objetivou a transferência de grandes terras a grupos

empresariais do Nordeste e Centro-Sul do Brasil.

Desta forma é que grupos agroempresariais dos Estados de Pernambuco e de

Alagoas se sentem atraídos para se instalarem na região do Leste maranhense, nas

cidades de Aldeias Altas, Coelho Neto e Caxias, especificamente na área em que se

situa atualmente o Assentamento Caxirimbu.

Assim, é a partir dos anos de 1980, quando ocorre a efervescência da grilagem

de terras no Maranhão, que podem ser notados os maiores movimentos de luta pela

posse da terra em Caxias. As terras férteis e providas de pastos de boa qualidade da

área rural do município são alvo de negociações com empresários rurais do Estado de

Pernambuco que instalam fazendas/empresas na região para o plantio de eucalipto,

cana-de-açúcar e criação de gado.

Em 1989, quando se registrava grande concentração fundiária na Região dos

Cocais e a massiva presença de latifúndios por exploração, ocorrem oferta de terras,

que se dão, mais por meio de apropriação fraudulenta, através do mercado de terras

como argumenta Maristela Andrade (1995). De fato, terras foram vendidas pelo

Instituto de Terras Maranhense – ITERMA, em favor de grandes grupos econômicos,

com vistas a desenvolvimento do Estado, porém, sem levar em consideração seus

ocupantes anteriores, populações que há várias gerações moravam, cultivavam e

trabalhavam a terra.

Em decorrência da concentração de terra e da luta dos camponeses contra

este regime é comum no Maranhão famílias serem perseguidos por pistoleiros onde a

maioria é exilada deixando suas famílias a mercê de próximas vitimas. Aos

camponeses sem perspectivas concretas de sobrevivência não lhe resta alternativa do

que resistir a violência dos latifundiários, já houve varias mortes e tanto a imprensa

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como qualquer pessoa de bom senso, afirmam que o Maranhão é como um barril de

pólvora.

São conflitos que ganham destaques, entre eles pode ser citada a revolta da

Balaiada, constituídos basicamente por camponeses que reivindicaram inúmeras

injustiças vivenciadas naquele período.

De acordo com a CPT no Maranhão em 2013 teve 3 casos de morte provocado

pela questão dos sistema agrário, foram:

Bom Jesus das Selvas – P. A. Capoema - 20/02/2013

Gilmar dos Santos de Jesus – adulto – assentado

Assassinado em emboscada, no Assentamento Capoema, em Bom Jesus das

Selvas, quando ia tirar leite. Tudo indica que o homicídio está relacionado à denúncia

da venda ilegal de lotes da reforma agrária e grilagem de terras na região de

Buriticupu e Bom Jesus das Selvas. Várias denúncias já haviam sido feitas ao longo

dos anos, mas o INCRA nada fez para coibir tal prática.

Satubinha – P. A. Santa Maria - 26/04/2013

“Machado” – adulto – assentado

Assentado no P. A. Santa Maria foi assassinado com dois tiros quando saía do

Posto de Saúde em que trabalhava como vigia, no município de Satubinha. O crime

pode estar relacionado à disputa por lotes no assentamento, pois tanto a vítima quanto

o suspeito do crime (Juscelino) possuem lotes no local. A FETAEMA (Federação dos

Trabalhadores na Agricultura do Estado do Maranhão) denuncia que há disputa pelos

lotes de terra no assentamento.

Icatu – Povoado Santa Isabel - 28/09/2013

Rosivaldo Mesquista Sousa – 30 anos – posseiro

Assassinado a golpes de faca, no contexto da disputa por terra no Povoado

Santa Isabel, em Icatu. Os suspeitos do crime, Albino Cabral Santos, 32 anos, e José

Ribamar Cabral Araújo, 22 anos, residentes no povoado foram presos no mesmo dia

do assassinato. Quadro 1.

Nome Ocorrência OBS

Gilmar dos Santos de Jesus Assentamento Capoema Emboscada

“Machado” Santa Maria Tiros

Rosivaldo Mesquita Sousa Santa Isabel Facada

Quadro 1 - Mortes provocadas pela luta da posse da terra no MA

Dados: CPT, 2013

Vale acrescentar que a questão das quebradeiras de coco babaçu, que são

tomadas preferencialmente neste trabalho, apresentam necessidades e demandas

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específicas decorrentes das suas “práticas sociais”. Elas forjaram uma forma

específica de organização, de trabalho e de relação com a terra e os recursos naturais.

Nesse sentido, mais do que um direito que lhes assegure a propriedade em si mesma,

é necessário um direito que lhes assegure o livre acesso ao recurso natural.

(SHIRAISHI NETO, 2005)

4. Regiões de maiores conflitos no maranhão/caso de Caxias-Ma

Segundo a CPT, em 2003 Caxias registrou 2 casos de conflitos no campo em

relação a posse da terra que ocorreu nos povoados Buriti do Meio/Santa Rosa e em

São Manoel Cana Brava, envolvendo mais de 50 famílias.

No entanto no Maranhão uma das maiores regiões de conflito vem sendo a do

Bico de Papagaio (Imperatriz, Açailândia e outros). A região do Bico do Papagaio

localiza-se no extremo norte do Estado do Tocantins, está compreendido entre os rios

Araguaia, a Oeste, e Tocantins, a Leste; fazendo fronteira entre o Estado do Pará, a

Oeste, e Maranhão, a Leste. Os contornos geográficos do mapa do Tocantins

lembram à cabeça de um papagaio, daí a origem da denominação da região.

Encontra-se na transição geográfica entre o cerrado do Centro-Oeste e a floresta

Amazônica; os Rios Tocantins e Araguaia. Vastas extensões de terra adequadas para

a agricultura e a pecuária são partes da riqueza do Estado, a disputa pela posse dessa

terra, porém, é a causa de graves conflitos envolvendo fazendeiros e posseiros. Na

região do Bico do Papagaio, no norte do Estado do Tocantins, o problema é explosivo,

com frequentes emboscadas e mortes. Figura 1.

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Figura 01 – Bico do papagaio

Fonte:http://www.ebah.com.br/content/ABAAAA_HwAI/falta-reforma-agraria-amplia-conflitos-por-terra

O direito a terra tem sido uma bandeira de luta de trabalhadores rurais em todo

o Maranhão. As lutas extrativistas não ficaram atrás nessa empreitada reivindicatória.

Os conflitos em torno dos babaçuais também somaram números alarmantes. Parte

desses conflitos pode ser visualizada na região do Mearim, pertencente à Zona dos

Cocais, maior produtora de babaçu no estado. A situação agrária dessa região à

época de intensas disputas indicava um quadro em que 57% dos estabelecimentos

rurais existentes eram arrendados, e apenas 22% dos trabalhadores eram posseiros

(TEMPOS NOVOS, 1990b, p. 7). Figura 02.

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Figura 02 - Região dos cocais

Fonte: http://www.ebah.com.br/content/ABAAAA_HwAI/falta-reforma-agraria-amplia-conflitos-por-terra

Os conflitos se desencadearam principalmente entre os anos 1970 e 1980,

devido à intensidade de práticas de cercamento empregada por proprietários/grileiros.

Áreas agricultáveis passaram a ser substituídas por capim (ANDRADE, 2005, p. 178).

Por vezes, mesmo sem desenvolver a pecuária, fazendeiros substituíam os babaçuais

por pastagens, a fim de intimidar a entrada dos trabalhadores nas áreas. Nesse

sentido, o processo de cercamento constitui mais do que uma ruptura de espaços para

o trabalhador, indicou a concretização da grilagem e da violência (LUNA, 1984, p. 43).

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Queimadas, Três Irmãos e Montabarro são comunidades quilombolas

localizadas no interior do Maranhão, na cidade de Codó, região de mata dos cocais,

distante 350 km da capital, São Luís, é a cidade maranhense que concentra maior

número de conflitos no estado, segundo a publicação Conflitos no Campo 2013, da

CPT. Através de pesquisa realizada pelos quilombolas e pela FETAEMA, Comissão

Pastoral da Terra- MA, Paróquia de São Raimundo e pela ONG Suiça ''Cooperaxion'',

revelou-se, além de um território de valor histórico inestimável, formado por cemitérios,

bosques com mais de 2 séculos, a resistência do tambor das comunidades que estão

envolvidas em um conflito agrário que perdura mais de 30 anos, contra a empresa do

setor sucroalcooleiro Costa Pinto, sediada no Rio de Janeiro, responsável pela

expulsão de centenas de famílias camponesas nas cidades de Codó, Caxias e Aldeias

Altas, região de cocal e cerrado maranhense.

Falida com o desmantelo do programa Pró-Álcool, ainda na década de 1990, a

empresa Costa Pinto parece ter “arrumado'” parceiros comerciais internacionais, e

agora pretende, com maquinaria industrial e intimidações, destruir quase 300 anos de

religiosidade, festas tradicionais, lendas e mistérios tão ricos e presentes das matas de

Codó, terra da Macumba.

Desde 2010, as investidas da empresa Costa Pinto contra as comunidades

tornaram-se mais intensas. Em 2012, as lideranças locais passaram a ser alvo da

sanha ''empresarial'' do agrobusiness e tornaram -se desenfreadas as ameaças contra

sua integridade. José da Silva Pacheco, o Souza, ingressou no Programa de Protecao

aos Defensores dos Direitos Humanos da Presidência da República, já no ano de

2013. A empresa passou a proibir o plantio de qualquer espécie e até mesmo a pesca

no rio Iguará, que banha as comunidades.

Em 2013, a empresa Costa Pinto ingressa com Ação Possessória contra José

da Silva Pacheco e contra o Padre Benito Cabeza Fernandes (Padre Bento), agente

da CPT, objetivando que o primeiro não mais entrasse na comunidade (onde reside

desde que nasceu) e que o segundo deixasse de realizar missas e visitas na

comunidade. De início, foi concedido liminar em favor da empresa, imediatamente

suspensa pelo Tribunal de Justiça do Maranhão, em recurso de agravo de instrumento,

movido pela comunidade. (DIOGO CABRAL, Advogado da CPT MA)

Segundo Antonio Carlos no Estado do Maranhão, as unidades econômicas

camponesas caracterizam-se pela itinerância dos cultivos anuais, pela roçagem e

queima da vegetação natural, pela criação de aves e suínos em pequena escala, pelo

extrativismo de madeira e frutas nativas (açaí, muruci, bacuri, babaçu) e pela

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fabricação de farinha de mandioca. Tendo como principal finalidade a garantia do auto

abastecimento ou a compra de produtos (sal, açúcar, café, roupas, calçados,

medicamentos e bebidas) e serviços que, embora não sejam gerados pelo sistema de

cultivo, são necessários à reprodução dos membros do núcleo familiar. Esses gastos

são cobertos pela renda monetária obtida na venda de parte da produção

agropecuária e agroindustrial, especialmente, de farinha de mandioca.

Fazendo uma comparação em 2003 de acordo com a CPT ocorreram 75

conflitos por terra, totalizando 9.024 famílias em todo Maranhão.

Segundo a CPT, em 2013 houve 142 conflitos por terra no Maranhão,

envolvendo 7.746 famílias. A cidade com o maior número de conflitos foi Codó na

região dos cocais a 302 km da capital São Luís. Na cidade aconteceram 13 conflitos.

Enquanto Caxias, não registrou nenhum conflito. Todos eles concentrados na área

rural onde estão implantando grandes empreendimentos.

Fazendo um levantamento da incansável luta pela terra em Caxias nos últimos

10 anos tivemos como resultado, conforme mostra o quadro 2.

Ano Ocorrência (Povoado) Famílias envolvidas

2013 Nenhum registro

2012 Assentamento Jaguarana/ Porto do Paiol

159

2011 Pai Geraldo/ Aldeias Altas 03

2010 Pov. São Martinho/ Buriti do sangue/ Central dos Medeiros

108

2009 Pov. São Martinho/ Buriti do sangue

90

2008 Buriti do sangue/ Central dos Medeiros/ São Miguel e Poção

92

2007 Buriti do sangue/ Central dos Medeiros/ São Miguel e Poção/ Genipapo II

112

2006 Porção e São Miguel/ Poção/ Genipapo II

63

2005 Buriti do meio/ Santa Rosa 54

2004 Buriti do meio/ Santa Rosa 54

Quadro 2 – Conflitos por terra (Caxias - MA)

Dados: CPT, últimos 10 anos.

Como se percebe no quadro 2 Caxias, assim como Urbano Santos, Codó,

Imperatriz, Açailândia e outras cidades do Maranhão também foram palco da luta pela

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posse da terra, luta essa que causou morte, desapropriação, entre outros eventos

ocorridos citados no decorrer do trabalho.

5. Considerações finais

A luta pela terra sempre foi um motivo de inúmeros conflitos e deslocamentos

populacionais no Brasil, o fato de haver a separação entre o produtor familiar

(camponeses) e os grandes proprietários, fazem com que esses embates se tornem

cada vez mais radicais, onde inúmeros camponeses são mortos ao tentarem enfrentar

os detentores do poder.

No Maranhão assim como nos outros estados à luta pela posse legal da terra é

sangrenta devido ao fato do latifúndio contar com o apoio do governo e da imprensa

para esconder a amplitude dos fatos.

A Comissão Pastoral da Terra reafirma que a pistolagem no Estado do

Maranhão é mecanismo político utilizado por latifundiários há décadas com o objetivo

de eliminar fisicamente qualquer antagonismo aos domínios das velhas cercas

oligárquicas que transformaram o Maranhão em terra dos mais baixos índices de

qualidade de vida.

Diante do exporto, chega-se a conclusão de que o problema da luta pela posse

da terra requer inúmeras mudanças por possuir em seu cerne questões culturais,

econômicas, sociais e políticas que precisam, portanto, ser tratadas em conjunto para

que haja um resultado efetivo. De nada adiantarão medidas isoladas, senão soluções

temporárias.

Referências

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