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LEONIR ADRIANO ARGENTE
A INFLUÊNCIA DO ÁLCOOL NO SER HUMANO E SUAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS
CASCAVEL 2014
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LEONIR ADRIANO ARGENTE
INFLUÊNCIA DO ÁLCOOL NO SER HUMANO E SUAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS
Artigo científico apresentado à disciplina de Metodologia de Pesquisa Científica como requisito parcial para a conclusão do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu – Especialização em Direito Militar Contemporâneo do Núcleo de Pesquisa em Segurança Pública e Privada da Universidade Tuiuti do Paraná. Orientador: Prof. Esp. João Carlos Toledo Junior.
CASCAVEL 2014
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AINFLUÊNCIA DO ÁLCOOL NO SER HUMANO E SUAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS
RESUMO Desde os tempos mais remotos o álcool sempre acompanhou a evolução da humanidade. Após sua descoberta e de suas características específicas, vem sendo usado em vários setores da indústria, sobretudo o de bebidas. Considerado droga lícita, o álcool é livremente comercializado, é banalizado pela mídia, causa sérios danos no organismo humano e provoca graves problemas sociais. O consumo de álcool tem sido cada vez mais frequente, principalmente entre a população jovem, inclusive entre pessoas no âmbito militar, causando transtornos militares, todo tipo de violência inclusive a doméstica, gerando altos custos para o Estado e a sociedade em geral em razão da embriaguez, do alcoolismo e de outras diversas doenças relacionadas ao consumo, revelando-se dessa forma, um grave problema social. O objetivo deste trabalho é analisar os efeitos da bebida alcoólica no organismo humano, bem como analisar as consequências jurídicas acerca do uso do álcool como bebida, abordando inclusive os aspectos trazidos pelo Código Penal Militar. A metodologia utilizada foi caracterizada por pesquisa bibliográfica acerca do tema. Contudo, a pesquisa aqui apresentada não pretende abranger todos os conteúdos correlatos, pois que os conceitos e normas concernentes ao uso do álcool apresentam-se em constante evolução.
Palavras-chaves: Álcool. Bebida Alcoólica. Embriaguez.
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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 4
2 REVISÃO DA LITERATURA .................................................................................... 6
2.1 Origem do Álcool ................................................................................................ 6 2.2 Do Conceito de Bebida Alcoólica ....................................................................... 7 2.3 Do Metabolismo do Álcool no Organismo Humano ............................................ 8 2.4 Efeitos da Bebida Alcoólica no Ser Humano ...................................................... 9 2.5 Do Conceito de Embriaguez ............................................................................. 10 2.6 Do Diagnóstico da Embriaguez Pelo Álcool ..................................................... 11 2.7 Das Espécies de Embriaguez Descritas Pela Doutrina Penal .......................... 13
2.7.1 Embriaguez Não Acidental ....................................................................... 14 2.7.2 Embriaguez Acidental .............................................................................. 15 2.7.3 Embriaguez Patológica ............................................................................ 17 2.7.4 Embriaguez Preordenada ........................................................................ 18
2.8 Da Embriaguez Por Bebida Alcoólica no Código Penal Comum e no Código Penal Militar ............................................................................................................ 19
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 22
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 24
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AINFLUÊNCIA DO ÁLCOOL NO SER HUMANO E SUAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS
Leonir Adriano Argente1
1 INTRODUÇÃO
Desde que foi descoberto, o álcool sempre acompanhou e fez parte do
desenvolvimento da sociedade. O uso dessa substância propiciou o
desenvolvimento da indústria, contribuiu para a geração de empregos em vários
setores em função do cultivo de plantas destinadas à produção, industrialização e
comercialização do álcool, bem como permitiu a sociabilidade quando passou a ser
usada de forma moderada em bebidas destinadas a ocasiões comemorativas.
Porém, atualmente observa-se que o consumo abusivo do álcool implica em
sérias consequências sociais, ocasionando impactos negativos nos âmbitos
econômico, jurídico e, sobretudo o familiar. A importância do tema ora apresentado
evidencia-se pela existência dos diferentes problemas sociais relacionados ao uso
do álcool que, apesar de ser considerado droga e de causar sérios danos ao ser
humano, é socialmente aceito e de fácil acesso.
Dentre os principais problemas sociais ligados ao consumo de álcool está a
criminalidade abrangendo todo tipo de violência, as doenças relacionadas ao
consumo, como por exemplo, o alcoolismo podendo levar o indivíduo inclusive à
morte, os acidentes de trânsito que por sua vez geram altos custos para o Estado,
comprometendo principalmente a estrutura da saúde pública, causam perdas
materiais e humanas, além de sofrimento às vítimas e familiares, bem como à
sociedade de maneira geral.
Nesse sentido, o presente trabalho tem como objetivo analisar os efeitos da
bebida alcoólica no ser humano, bem como analisar as consequências jurídicas
acerca da embriaguez.
O texto analisa desde a origem do álcool, seu uso pela sociedade, seu
metabolismo e consequências no organismo humano, retratando ainda, o aspecto
1 3º Sargento do Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Paraná, formado em Direito pela FAG – Faculdade Assis Gurgacz em 2009. e-mail: [email protected]
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da embriaguez e suas espécies tratadas pela doutrina penal, elenca as regras
estabelecidas pelo Código Penal Comum e pelo Código Penal Militar.
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2 REVISÃO DA LITERATURA
2.1 Origem do Álcool
De acordo com Reis e Rodrigues (2003), a palavra álcool é oriunda do árabe
al-kuhl, e significa essência ou, ainda, corpo sutil, leve, espiritual, (grifo no original).
Segundo Zacharias, Zacharias e Sobrinho (1991), o álcool é um líquido de
efeito embriagante, incolor, de odor e sabor característicos, é obtido pela
fermentação e destilação de substâncias açucaradas extraídas de diversas plantas
ou frutos, como por exemplo: a uva, a cana-de-açúcar, milho, cevada, etc.
Conforme Vargas (1988) existem vários tipos de álcool. Dentre eles, cita o
álcool amílico, obtido por destilação de óleo fusil; o benzílico, usado como solvente
de tintas e gomas; o butílico, obtido pela fermentação do glicerol; o isopromanílico,
derivado do isopropanalol; o metílico, proveniente da destilação de madeiras secas,
e o álcool etílico, derivado da fermentação e destilação de grãos e frutas, sendo este
utilizado principalmente no preparo de bebidas de caráter social.
Segundo os ensinamentos de Reis e Rodrigues (2003, p.129):
O álcool ou etanol ou álcool etílico pertence ao subgrupo das funções oxigenadas álcoois, que são compostos orgânicos com uma ou mais hidroxilas (OH) ligadas diretamente ao átomo de carbono, não pertencentes a um núcleo benzênico, cuja fórmula química é C2H5OH. O álcool pode ser obtido através do processo de fermentação decorrente do metabolismo de leveduras que desdobram o açúcar, produzindo o álcool, e pelo processo de destilação.
Para Brasil (2006), na terminologia química, os álcoois constituem um
numeroso grupo de compostos orgânicos derivados de hidrocarbonetos. Dentre
esses compostos o álcool etílico ou etanol é o principal ingrediente psicoativo das
bebidas alcoólicas, e é obtido através da fermentação de açúcar produzido por
lêvedos. Além de seu uso para o consumo humano, o etanol é também usado como
combustível, como solvente e na manufatura química.
De acordo com Reis e Rodrigues (2003), após o álcool ser produzido por meio de
um processo de fermentação de matérias-primas ricas em açúcares, tais como:
cana-de-açúcar, uva, grãos, cereais, entre outros, é misturado a outras substâncias
como sais minerais e acidulantes que contribuem para a característica final do
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produto e, após são armazenados em tonéis e embalagens específicas, o que
proporcionam sabor e aroma característicos.
2.2 Do Conceito de Bebida Alcoólica
Segundo Zacharias, Zacharias e Sobrinho (1991, p.56), bebida alcoólica é a
“bebida preparada mediante a fermentação alcoólica de sucos de frutas, de raízes,
de sementes e de outras porções de vegetais ricos em açúcar ou em amido”.
Conceitua Brasil (2006, p.33), bebida alcoólica como sendo “líquido que
contém álcool (etanol) e é destinado a ser bebido”, grifo no original.
Já o Decreto nº 6.117/20072, ao tratar da Política Nacional Sobre o Álcool,
estabelece que “é considerada bebida alcoólica aquela que contiver 0.5 grau Gay-
Lussac ou mais de concentração, incluindo-se aí bebidas destiladas, fermentadas e
outras preparações, como a mistura de refrigerantes e destilados [...]”.
Por sua vez, a Lei 11.705/20083, em seu artigo 6°, estabelece que “são
consideradas bebidas alcoólicas as bebidas potáveis que contenham álcool em sua
composição, com grau de concentração igual ou superior a meio grau Gay-Lussac”.
Segundo Kosovski (1998, p.76), “o conteúdo das diferentes bebidas é
expresso em graus ‘Gay-Lussac’ (°GL), que correspondem ao número de mililitros
(ml) de etanol em cada 100 ml da bebida”.
De acordo com Sardella (2003), a expressão “GL” é uma referência ao físico e
químico francês Joseph Louis Gay-Lussac que por volta do ano de 1808 fez os
primeiros estudos sobre o comportamento dos gases.
2Decreto nº 6.117, de 22 de maio de 2007: Aprova a Política Nacional sobre o Álcool, dispõe sobre as medidas para redução do uso indevido de álcool e sua associação com a violência e criminalidade, e dá outras providências.
3 Lei nº 11.705/2008: Altera a Lei no 9.503, de 23 de setembro de 1997, que ‘institui o Código de Trânsito Brasileiro’, e a Lei no 9.294, de 15 de julho de 1996, que dispõe sobre as restrições ao uso e à propaganda de produtos fumígeros, bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos agrícolas, nos termos do § 4o do art. 220 da Constituição Federal, para inibir o consumo de bebida alcoólica por condutor de veículo automotor, e dá outras providências.
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2.3 Do Metabolismo do Álcool no Organismo Humano
De acordo com Vargas (1988), a distribuição do álcool pelo organismo ocorre
em ordem decrescente pelo sangue, cérebro, fígado e pâncreas, pulmões, coração,
paredes intestinais, músculos e, pelo tecido ósseo e gorduroso em pequena
concentração. Também pode ocorrer a intoxicação pelo álcool através de inalação
quando pessoas ficam expostas por muito tempo em ambientes com presença do
álcool.
Ao tratar do metabolismo do álcool, Zacharias, Zacharias e Sobrinho (1991,
p.28), afirmam que:
Ingerida a bebida que o contenha, o álcool é rapidamente absorvido pelo estômago (20%) e intestinos (duodeno 42%, jejuno 20% e íleo 18%), podendo ser encontrado no sangue em menos de 10 minutos, para alcançar sua máxima difusão pelo organismo meia hora depois e assim se manter durante mais uma hora, tendo início, em seguida, sua eliminação. Salienta-se, entretanto, que a concentração alcoólica no sangue é variável em tempo e teor, segundo o tipo da bebida, sua diluição, a quantidade ingerida e o ritmo da ingestão, tendo também influência a quantidade e a qualidade de alimentos na ocasião contidos no estômago.
Segundo França (2004, p.319), “o organismo humano metaboliza cerca de 90
a 95% do álcool pelo processo de oxidação [...]. O restante é eliminado pelos rins,
pulmões, pele e glândulas salivares, entre outros”.
Cerca de 65% do álcool é absorvido pelo estômago e 35% pelo intestino,
onde a absorção é mais rápida. Em média, a absorção se completa entre 4 e 6
horas, porém, a maioria dos alimentos tende a retardar a absorção pelo estômago.
Antigamente, estudiosos do álcool preocupavam-se apenas com os seus sintomas
psíquicos ou psicopatológicos. Porém, ao estudarem e conhecerem melhor a
distribuição e metabolização do álcool no organismo, concluíram que é de extrema
importância considerar fatores como desnutrição, carências vitamínicas, tipo de
alimentação, além da quantidade e teor de álcool nas bebidas ingeridas, uma vez
que a alcoolemia acima de certo grau sempre produz algum dano, bem como a
defesa do organismo contra a intoxicação alcoólica é assegurada pela oxidação e
eliminação do álcool. (VARGAS, 1988).
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2.4 Efeitos da Bebida Alcoólica no Ser Humano
Segundo Kosovski (1998, p.67) “o limite a partir do qual o álcool causa danos
físicos não é bem estabelecido, variando para cada tipo de lesão, existindo uma
proporcionalidade entre o dano e a quantidade de álcool ingerido”.
Ainda, de acordo com Kosovski (op.cit), dentre os problemas causados pela
ingestão do álcool estão os acidentes tanto no lar, como no serviço ou nas estradas;
alterações sanguíneas como hemorragias e doenças do fígado; lesão cerebral;
câncer na boca, estômago, esôfago, fígado, problemas pulmonares, cardíacos,
cirrose hepática, hipoglicemia, pancreatite, impotência, etc. Também afirma que o
álcool é uma substância solúvel em água. Dessa forma, as mulheres apresentam
complicações físicas mais precoces que os homens, pois o menor peso, tecido mais
gorduroso e menos água corpórea em relação aos homens, são fatores que
favorecem o aparecimento de reações fisiológicas em razão da ingestão do álcool.
De acordo com Zacharias, Zacharias e Sobrinho (1991), a intoxicação
alcoólica evolui em três fases: fase de excitação, que é aquela em que a pessoa se
mostra desinibida, eufórica, com vivacidade motora e pulso acelerado; a fase de
confusão, que é a fase em que o indivíduo apresenta agressividade, irritabilidade,
zumbidos, incapacidade de fixar a atenção, diminuição da sensibilidade, melancolia,
etc. e por fim, a fase comatosa, na qual o indivíduo não consegue se manter em pé,
só reage mediante estímulos violentos, mostra-se pálido, há queda na sua
temperatura corporal, enfim, mostra-se num quadro de colapso que pode culminar
com a morte.
Ao relacionar os efeitos do álcool no organismo humano, Vargas (1988),
afirma que são várias as repercussões orgânicas causadas pela ingestão do álcool.
Dentre essas repercussões, destaca que o excesso de álcool favorece o
aparecimento de crises convulsivas; causa a queda da glicemia, onde o quadro varia
desde uma embriaguez comum até o coma, passando por quadros de alucinação,
confusão e agressividade; causa atrofias cerebrais; causa redução progressiva da
acuidade visual; causa o aparecimento de lesões de nervos periféricos,
caracterizadas por dores musculares, queimação nas extremidades dos membros
inferiores, fraqueza muscular, dormência, formigamentos, que evoluem pra uma
perda da sensibilidade táctil; além de alterações diminuindo a resistência contra
infecções e aumento do trabalho cardíaco; alterações metabólicas como
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influenciando na permeabilidade celular e transporte de lipídios; alterações
hemodinâmicas comprometendo as funções cardíacas e circulatórias, entre outras.
De acordo com Brasil (2006), o álcool é um sedativo/hipnótico, que uma vez
consumido provoca no organismo em maior ou menor grau reações que vão desde a
euforia à depressão, tornam os reflexos mais lentos, comprometem a dirigibilidade
segura, e além de inúmeras doenças, pode resultar em dependência, transtornos
mentais, orgânicos, físicos e comportamentais, intoxicação, envenenamento e até a
morte.
2.5 Do Conceito de Embriaguez
Ao conceituar a embriaguez, afirmam Zacharias, Zacharias e Sobrinho (1991,
p.147), que é “o conjunto das perturbações pisíquicas e somáticas, de caráter
transitório, resultante da intoxicação aguda pela ingestão de bebida alcoólica ou pelo
uso de outro inebriante”.
Embriaguez é o estado causado pela ingestão de bebidas alcoólicas, embriagamento. Embriagado é aquele que se embriagou, ou ingeriu bebida alcoólica em excesso, com os sentidos perturbados, tonto, aturdido, submetido a encanto, enlevado, extasiado, perturbado emocionalmente, alucinado [...]. (HOUAISS, 2001, p.1.120).
Segundo Brasil (2006), a embriaguez equivale a uma intoxicação causada
pela administração de substância psicoativa e que resulta em perturbações da
percepção, do juízo crítico, do afeto, da consciência, do comportamento e de outras
funções psicofisiológicas.
Ao tratar do conceito de embriaguez, Bitencourt (2007), afirma que é a
intoxicação aguda e transitória causada em razão da ingestão do álcool ou de
substância de efeitos análogos. Ainda, sustenta que a embriaguez apresenta três
estágios: o inicial, caracterizado pela excitação; o de depressão; e o letárgico, onde
o indivíduo pode apresentar sono profundo ou coma.
Segundo Capez (2003), em razão da intoxicação aguda e transitória que
causa o álcool ou qualquer substância de efeitos psicotrópicos, a embriaguez é uma
causa que exclui a capacidade de entendimento e vontade do agente. Tais
substâncias podem ser entorpecentes como a morfina; estimulantes como a
cocaína; ou ainda, alucinógenos como a ácido lisérgico, por exemplo.
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2.6 Do Diagnóstico da Embriaguez Pelo Álcool
De acordo com Brasil (2006), o teor alcoólico no sangue é geralmente
expresso como massa por unidade de volume, como por exemplo: miligramas por
100 mililitros (mg/100 ml), miligramas por litro (mg/l), gramas por 100 mililitros (g/100
ml), etc.
No Brasil, quando é medido o teor alcoólico pelo exame de sangue, é
expresso em decigramas de álcool por litro de sangue e, no caso de medição em
aparelho de ar alveolar pulmonar, o chamado etilômetro, é expresso em miligramas
por litro de ar.
Segundo Sznick (1980, p.90), “para se saber quanto há de intoxicação
alcoólica no organismo humano, vários são os modos de se apurar [...]. O exame
pode ser procedido tanto na urina, quanto no sangue, na saliva, no ar expirado e,
nos cadáveres, nas vísceras”.
Para Mirabete (2005, p.283), “a embriaguez pode ser comprovada pelo
exame de dosagem alcoólica no sangue, pelo exame clínico e até por testemunhas
quando não foi possível, por qualquer razão, realizar-se o exame pericial”.
Segundo Zacharias, Zacharias e Sobrinho, (1991, p.147), “a perícia médico-
legal para o diagnóstico da embriaguez em suas diversas fases orienta-se pelo
exame clínico do paciente e pelas técnicas laboratoriais que dosam a concentração
sanguínea do álcool etílico”.
Ensinam ainda Zacharias, Zacharias e Sobrinho (1991), que para a avaliação
do grau de ebriedade, devem ser observados fatores como a idade, o sexo, a
quantidade de alimentos contida no estômago, bem como a construção física do
indivíduo. Ainda, explica que de maneira genérica, num exame de alcoolemia, uma
concentração alcoólica de até 0,5 ml por litro de sangue não justiça embriaguez; que
uma concentração de álcool entre 0,6 e 1,5 já é considerada embriaguez, porém
com ressalvas, já que nesse caso, é necessário também analisar o estado e
comportamento do indivíduo; uma concentração entre 1, 6 e 3,0 ml de álcool por litro
de sangue, tem-se a chamada embriaguez incompleta, ou a fase de excitação; já
quando a concentração de álcool estiver entre 3,1 e 5,0 ml, conclui-se pela
embriaguez completa, que é a chamada fase de confusão; ainda, uma concentração
entre 5,1 e 5,5 ml por litro de sangue causa o coma alcoólico com sérios riscos de
morte, e por fim, a concentração acima de 5,5 ml leva o indivíduo à morte.
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De acordo com França (2004), para a verificação da dosagem de álcool no
organismo humano podem ser utilizados a saliva, a urina, o líquor, o ar expirado e o
sangue. A dosagem através da saliva é desaconselhável, uma vez que nela se
encontram substâncias redutoras capazes de levar a resultados falsos. A
concentração de álcool na urina varia de acordo com a quantidade de água em
relação ao sangue e depende do fluxo resultante dos rins, do tipo de bebida, do
número de micções, bem como do fato de a bexiga estar ou não cheia no momento
da coleta e, por isso, não apresenta valor absoluto. Ainda, a dosagem do líquor
cefalorraquidiano é menos usada. Em relação ao ar expirado, a concentração
poderá ser obtida em aparelho próprio em que o indivíduo através do sopro faz o ar
passar por uma mistura de permanganato de potássio e ácido sulfídrico onde o
álcool é oxidado, o permanganato é descorado e, assim, apura-se a concentração.
Segundo Vargas (1988), quando se busca diagnosticar a embriaguez, deve-
se levar em conta os seguintes fatores: individual, duração da intoxicação, teor
alcoólico da bebida consumida, a dose de álcool, bem como o sexo da pessoa, uma
vez que a mulher é mais sensível que o homem, e exibe diferenças conforme seu
estado, por exemplo, a puberdade, a gravidez ou menopausa. Ainda, a embriaguez
deve ser determinada pela alcoolemia de rotina, associada ao exame clínico do
paciente, observando-se que a presença de odor etílico, por exemplo, é um guia que
pode levar a resultados errados, pois que o odor não é devido ao teor da bebida
alcoólica, mas sim a impurezas da própria bebida ou outras causas.
De acordo com França (2004, p. 318), “uma mesma quantidade de álcool
ministrada a várias pessoas pode acarretar, em cada uma, efeitos diversos [...].
Alguns se embriagam com pequenas quantidades e outros ingerem grandes porções
revelando uma estranha resistência ao álcool”.
A tolerância ao álcool depende de fatores como a taxa de absorção do álcool
pelo sistema digestivo; a concentração da bebida; o hábito de beber, já que o
abstêmio, o bebedor moderado e o grande bebedor apresentam graus distintos de
tolerância; os estados emotivos; o sono; o fumo; as doenças, bem como, deve-se
considerar que aproximadamente dois terços do corpo são constituídos de líquidos,
portanto, quanto maior o peso, mais diluído ficará o álcool (FRANÇA, op.cit).
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2.7 Das Espécies de Embriaguez Descritas Pela Doutrina Penal
Segundo Capez (2003), as espécies de embriaguez tratadas no Direito Penal
Brasileiro são as seguintes: embriaguez não acidental, que pode ser voluntária ou
culposa, podendo ainda ocorrer de forma completa ou incompleta; embriaguez
acidental, que pode decorrer de caso fortuito ou força maior, podendo ser completa
ou incompleta; embriaguez patológica, e embriaguez preordenada.
O sistema positivo penal brasileiro prevê as seguintes formas de embriaguez: I – Quanto à extensão: a) completa, quando a intoxicação já atingiu a segunda e terceira fases, caso em que o sujeito somente pode cometer delitos omissivos ou comissivos por omissão; b) incompleta, quando a ebriedade ainda permanece na primeira fase, condição em que são comuns determinados ilícitos contra a pessoa, o patrimônio, a honra e os costumes, posto que o álcool e as substâncias de efeitos análogos estimulam a conduta ilícita, vencendo as resistências que, normalmente, a maioria das pessoas demonstra em relação às práticas delituosas. II – Quanto ao aspecto subjetivo: a) voluntária, quando o sujeito bebe com a vontade de alcançar qualquer um dos estágios ou fases da embriaguez; b) culposa, quando o sujeito não pretende se embriagar, mas chega a tal estado por ter ingerido a bebida alcoólica, ou substância de efeito análogo, por impudência, por imperícia (erro quanto à natureza da bebida ou substância, ou o seu teor) ou, ainda, por negligência; c) acidental, quando a ebriedade decorre de caso fortuito ou de força maior; d) preordenada, quando o sujeito se embriaga propositadamente, para cometer o delito; e) habitual, quando o sujeito é dado ao uso inveterado do álcool, ou substância de efeito similar, com possibilidade de chegar à psicose alcoólica.(ZACHARIAS; ZACHARIAS; SOBRINHO, 1991, p. 147, grifos no original).
A lei refere-se a três espécies de embriaguez quanto à sua origem: voluntária, em que o agente pretende embriagar-se; culposa, quando o agente, embora não pretenda embriagar-se, bebe demais, imprudentemente, chegando ao estado etílico; e fortuita, ou acidental, a decorrente de caso fortuito ou força maior (acidente, sensibilidade extrema ao álcool, coação, fraude, etc.)(MIRABETE, 2005, p. 280, grifo no original).
A embriaguez, sob o aspecto subjetivo, isto é, referente à influência do momento em que o agente se coloca em estado de embriaguez, pode apresentar-se como: a) não acidental: voluntária (intencional) ou culposa (imprudente); b) acidental: caso fortuito ou força maior; c) preordenada; d) habitual e/ou patológica. (BITENCOURT, 2007, P.115, grifo no original).
De acordo com Prado (2006), a embriaguez comporta as seguintes espécies:
não acidental, que pode ser voluntária, ou seja, aquela querida pelo indivíduo, e
culposa, que é aquela que deflui de culpa, onde o estado de ebriedade é previsível;
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acidental, que deriva de caso fortuito ou força maior, onde no primeiro caso o
indivíduo não a previu e nem a quis, portanto, não há vontade ou culpa, já a
embriaguez acidental decorrente de força maior, ocorre em razão de uma situação
inevitável para o agente. Ainda, considerando a intensidade da ação do álcool ou de
substância análoga, a embriaguez pode ser incompleta, chamada fase de excitação;
completa, que caracterizada pela fase de depressão; comatosa, fase em que o
indivíduo apresenta letargia e é equiparada à embriaguez completa e, a patológica,
manifestada pelo estado de demência alcoólica.
2.7.1 Embriaguez Não Acidental
Ao tratar da embriaguez não acidental, Capez (2003), explica que essa
espécie subdivide-se em voluntária ou culposa. A voluntária é a que ocorre quando o
agente ingere a substância alcoólica com a intenção de embriagar-se, ou seja, há
uma vontade de ingressar num estado de alteração psíquica. Esta pode ser
completa, quando há perda total da capacidade de entendimento e vontade do
agente; ou incompleta, que se ocorre quando a embriaguez retira apenas
parcialmente a capacidade de autodeterminação do agente, restando ainda resíduos
de compreensão e vontade. Já na embriaguez culposa, o agente quer ingerir a
substância, porém, não tem a intenção de embriagar-se, mas isso ocorre em razão
da sua imprudência em consumir doses excessivas.
Na visão doutrinária de Bitencourt (2007), a embriaguez é voluntária ou
dolosa quando o agente ingere a bebida com a intenção de embriagar-se; e será
culposa quando o agente não tem a intenção de embriagar-se, porém, por
imprudência, ingere quantidade excessiva de bebida alcoólica. Sustenta ainda, que
o aspecto doloso ou culposo da embriaguez decorre não do fato praticado sob o
efeito do álcool, mas da própria embriaguez voluntária ou culposa. Dessa forma,
assevera o autor, que o grau de responsabilidade penal do agente não se altera pelo
fato de o agente ter querido apenas beber ou mesmo embriagar-se, portanto,
independentemente de a embriaguez voluntária ou culposa ser completa ou
incompleta, será o agente punido.
Para Mirabete (2005, p.280) “perante a lei penal, a embriaguez voluntária ou
culposa, seja incompleta ou completa, não exime de responsabilidade penal,
presumindo a lei, sempre, que o agente é dotado de imputabilidade”.
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A embriaguez não acidental jamais exclui a imputabilidade do agente, seja voluntária, culposa, completa ou incompleta. Isso porque ele, no momento em que ingeria a substância, era livre para decidir se devia ou não o fazer. A conduta, mesmo quando praticada em estado de embriaguez completa, originou-se de um ato de livre arbítrio do sujeito, que optou por ingerir a substância quando tinha possibilidade de não o fazer. (CAPEZ, 2003, p.281, grifo no original).
A embriaguez voluntária pelo álcool ou de substâncias análogas não excluem
a imputabilidade do agente, conforme estabelece o artigo 28, inciso II do Código
Penal4.
Dessa forma, mesmo que a embriaguez tenha ocorrido de forma voluntária
ou culposa, o agente responderá pelo ato, já que o estado de ebriedade foi querido
por ele, bem como não agiu com a devida prudência a fim de não ingressar num
estado de embriaguez.
2.7.2 Embriaguez Acidental
Ao tratar da embriaguez acidental, Bitencourt (2007), ensina que é aquela
proveniente de caso fortuito ou força maior. No caso fortuito, o agente ignora a
natureza tóxica do que está ingerindo, ou não tem condições de prever que aquela
substância poderá provocar-lhe a embriaguez. Já no caso de força maior, o agente
sabe o que está acontecendo, porém, não consegue impedir, uma vez que
independe da sua vontade ou de seu controle.
Para Capez (2003), a embriaguez acidental pode ocorrer de caso fortuito ou
força maior. Caso fortuito é aquele em que alguém ingere bebida desconhecendo o
conteúdo alcoólico ou dos efeitos que a bebida pode provocar. Já a força maior
ocorre em razão de uma força externa ao agente, ou seja, por exemplo, devido a
uma coação física ou moral irresistível, o indivíduo ingere álcool e em seguida perde
o controle sobre suas ações. Ainda, a embriaguez acidental quando completa exclui
a imputabilidade, e por consequência, o agente fica isento de pena, uma vez que
perdeu a capacidade de compreensão e vontade sobre sua conduta. Por outro lado,
se a embriaguez for incompleta, não exclui a imputabilidade, porém, permite uma
diminuição da pena de um a dois terços, conforme o grau de perturbação.
4 Código Penal:. Art. 28, caput- Não excluem a imputabilidade penal: [...] inciso II: a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos.
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De acordo com Mirabete (2005, p.282):
Caso a embriaguez seja fortuita, ou acidental, sendo ela completa, e, portanto, o agente inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato, é ele considerado inimputável. Tratando-se de embriaguez fortuita incompleta, em que o agente não perde inteiramente a capacidade de entendimento ou de autodeterminação, prevê a lei um caso de culpabilidade reduzida, com a diminuição da pena de um a dois terços. A redução da pena é obrigatória, devido à maior dificuldade de entendimento e determinação do agente [...]
Tratando-se de embriaguez acidental completa, o agente não será
responsabilizado, já que nessa situação ele perde a capacidade de entendimento e
autodeterminação. Porém, para que fique isento de pena, é necessário restar
comprovado que a embriaguez efetivamente ensejou a perda da capacidade de
discernimento. Já se a embriaguez, mesmo decorrente de caso fortuito ou força
maior, ou seja, de forma acidental, for incompleta tem como consequência uma
redução da pena. (BITENCOURT, 2007).
O Código Penal Brasileiro prevê em seu artigo 28, §1º5que se a embriaguez
proveniente de caso fortuito ou força maior for completa, de modo que o agente no
momento da ação ou omissão seja inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito
do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, será ele isento de
pena. Ainda, o artigo 28, §2º6 preconiza que se por embriaguez, decorrente de caso
fortuito ou força maior, o agente não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a
plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo
com esse entendimento, a pena pode ser reduzida de um a dois terços.
5 Código Penal: Art. 28 [...]: § 1º - É isento de pena o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. 6 Código Penal: Art. 28 [...]: § 2º - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, por embriaguez, proveniente de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
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2.7.3 Embriaguez Patológica
Em relação à embriaguez patológica, observa-se que essa espécie é tratada
pela doutrina penal como doença mental e, consequentemente, deve ser
juridicamente tratada como tal.
Em tema de inimputabilidade penal, doença mental é toda manifestação nosológica, de cunho orgânico, funcional ou psíquico, episódica ou crônica, que pode, eventualmente, ter como efeito a situação de incapacidade psicológica do agente de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. (FÜHRER, 2003, p.55).
Segundo Zacharias, Zacharias e Sobrinho (1991, p.148), embriaguez
patológica é:
Forma de embriaguez aguda, a que estão sujeitos os indivíduos extremamente suscetíveis à ação tóxica do álcool e nos quais a ingestão de pequena quantidade de bebida é suficiente para provocar além das perturbações peculiares à embriaguez comum, uma profunda obnubilação da consciência, que os leva, em estado crepuscular e dominados por intensa excitação psicomotora, à prática de atos de furiosa e indiscriminada violência contra pessoas e coisas, podendo revestir-se do aspecto de graves delitos, inclusive o homicídio.
Segundo Zacharias, Zacharias e Sobrinho (1991) estão sujeitos à embriaguez
patológica, por exemplo, indivíduos predispostos a anomalias mentais como os
psicopatas, neuróticos, epiléticos e aqueles que tenham sofrido traumatismos
cranianos. Ainda, ressalta que na vigência da crise é comum o exibicionismo, bem
como são comuns crimes como o estupro, atentado violento ao pudor, e ainda,
afirma que tal situação pode perdurar por minutos ou estender-se por horas,
terminando sempre com um sono profundo, onde o indivíduo ao acordar demonstra
amnésia parcial ou total do ocorrido.
Para Mirabete (2005, p.280), “na embriaguez patológica (psicose alcoólica,
demência alcoólica), o agente deve ser considerado à luz do art. 26, já que se
tratará de uma doença mental ou perturbação da saúde mental”.
De acordo com a doutrina de Capez (2003), a embriaguez patológica, por
tratar-se de verdadeira doença mental, deve receber o mesmo tratamento penal
dispensado a esta, uma vez que o indivíduo alcoólatra ou dependente se coloca em
estado de embriaguez devido a uma vontade invencível de continuar a consumir o
álcool.
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Para Bitencourt (2007, p. 117) “a embriaguez patológica manifesta-se em
pessoas predispostas, e assemelha-se à verdadeira psicose, devendo ser tratada,
juridicamente, como doença mental (art.26 e seu parágrafo único)”.
O código Penal Brasileiro estabelece em seu artigo 26, caput,7 que se no
momento da ação ou da omissão o agente que por doença mental ou
desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era inteiramente incapaz de
entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse
entendimento, será ele isento de pena.
Por sua vez, o artigo 26, parágrafo único8do Código Penal, preconiza que a
pena poderá ser reduzida de um a dois terços se o agente, em razão de perturbação
de saúde mental, ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era
no momento da ação ou da omissão inteiramente capaz de entender o caráter ilícito
de sua atitude ou de determinar-se de acordo com esse entendimento (BRASL,
2008).
2.7.4 Embriaguez Preordenada
Segundo Sznick (1980, p.93) “a embriaguez é preordenada quando o agente
ingere substância inebriante a fim de, com o estado de ebriedade, adquirir estímulo
e coragem para cometer um delito, a que tem intenção de praticar”.
Se o agente se coloca propositalmente em situação de inimputabilidade para
cometer o crime, ou se não adota os cuidados possíveis para evitar o perigo que
suas crises de inconsciência produzem, deverá responder pelo resultado lesivo.
Contudo, nos casos de intervalos lúcidos, o Direito tem que lidar com dois graus de
consciência num mesmo indivíduo. Portanto, nesses casos, ao se apurar a
responsabilidade, prevalece o momento do crime, já que nessa situação o indivíduo
agiu de forma consciente (FÜHRER, 2000).
7 Código Penal: art. 26, caput: é isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. 8 Código Penal: art. 26: [...] Parágrafo único: pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento..
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Conforme ensina Capez (2003), preordenada é a embriaguez em que o
agente desde o momento em que começa a ingerir bebida alcoólica já tem o objetivo
de, nesse estado, cometer ilícitos, diferindo, dessa forma, da embriaguez voluntária
em que o agente apesar de querer embriagar-se, não tem o propósito de cometer
crimes nesse estado. Ainda, observa que na embriaguez preordenada, o ato de
ingerir bebida alcoólica já constitui conduta inicial do comportamento típico. Dessa
forma, o cometimento de crime sob essa modalidade de embriaguez, além de não
excluir a imputabilidade, agrava a pena, conforme estabelece o artigo 61, II, l, do
Código Penal.
De acordo com Mirabete (2005, p.280) “no caso de embriaguez preordenada,
em que o agente se embriaga para cometer ou com risco de cometer o crime, há
circunstância agravante genérica (art. 61, II, l)”.
O Código Penal Brasileiro em seu artigo 61, inciso, II, alínea l9, prevê que é
uma circunstância que agrava a pena, ter o agente cometido o crime em estado de
embriaguez preordenada.
2.8 Da Embriaguez Por Bebida Alcoólica no Código Penal Comum e no Código Penal Militar
O Código Penal Brasileiro10dispõe que em seu artigo 28, inciso II que a
embriaguez voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos,
não excluem a imputabilidade penal.
Ainda, estabelece o § 1º, do mesmo artigo 28, que é isento de pena o agente
que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao
tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do
fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Já o § 2º, determina
que a pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, por embriaguez,
proveniente de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo da ação ou da
omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-
se de acordo com esse entendimento.
Assim, o agente embriagado que comete um ilícito penal pode ser levado a
consequências jurídicas distintas, dependendo das causas e circunstâncias em que
9 Código Penal, artigo 61: São circunstâncias que agravam a pena: [...] inciso II: ter o agente cometido o crime: [...] alínea l: em estado de embriaguez preordenada. 10 Código Penal Brasileiro: Instituído pelo Decreto-Lei nº 2.848 de 7 de Dezembro de 1940.
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ocorreu a embriaguez e da sua capacidade de entendimento no momento do ato
ilícito. Portanto, é necessário conhecer o conceito e as espécies de embriaguez
tratadas no direito penal brasileiro, bem como conceituar a chamada imputabilidade
penal, uma vez que dependendo das circunstâncias em que ocorreu a embriaguez e
da capacidade de entendimento no momento do fato, poderá o agente do ato ilícito
ter a pena reduzida ou até mesmo ficar dela isento.
Já o Código Penal Militar11, ao tratar da embriaguez em serviço, em seu
artigo 202 estabelece que “embriagar-se o militar, quando em serviço, ou
apresentar-se embriagado para prestá-lo”, estabelecendo uma pena de detenção de
seis meses a dois anos.
A configuração da infração penal militar da embriaguez em serviço pode
ocorrer por meio de duas condutas: A de embriagar-se estando em serviço ou de
apresentar-se para o serviço estando embriagado.
Porém, uma observação importante a se fazer é a de que o fato de o militar
recusar-se a realizar o teste de bafômetro não ilide possibilidade de ser enquadrado
do crime do artigo 202 do Código Penal Militar conforme jurisprudência a seguir:
Ementa: CRIME MILITAR. EMBRIAGUEZ EM SERVIÇO (CPM, ART. 202 ). SOLDADO QUE SE APRESENTA, NA CASERNA, PARA INICIAR TURNO DE TRABALHO, VISIVELMENTE EMBRIAGADO. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS PELA PROVA ORAL COLHIDA, QUE DÁ A CERTEZA NECESSÁRIA DA PRÁTICA DO DELITO. AUSÊNCIA DO TESTE DO BAFÔMETRO QUE NÃO OBSTA O RECONHECIMENTO DA INFRAÇÃO. CONDUTA QUE SUBSOME, NA ÍNTEGRA, À PREVISÃO DO CÓDIGO CASTRENSE. CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. "Caracteriza-se a culpabilidade do policial militar que, conscientemente, ingere bebida alcoólica no dia em que estava de serviço, uma vez que conhece a ilicitude da conduta, não podendo ser excluída a sua imputabilidade" (TJMSP, Apelação Criminal n. 005277/03, 1ª Câmara, rel. Ubirajara Almeida Gaspar, j. 6.4.2004). Data de publicação: 20/05/2009. Disponível em: http://tj-sc.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/6535352/apelacao-criminal-apr-43052-sc-2009004305-2
Nesse sentido, de acordo com os conceitos acerca da embriaguez
anteriormente estudados, ocorrerá a prática do referido crime em caso de
embriaguez do militar e não no caso de estar alcoolizado, uma vez que uma pessoa
pode apresentar certa quantidade de álcool no organismo, porém, não estar
11 Código Penal Militar: Instituído pelo Decreto-Lei nº 1.001 de 21 de Outubro de 1969.
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embriagada já que como visto cada organismo reage de maneira distinta por
diversos fatores, sobretudo em razão da tolerância ao álcool.
Dessa forma, para a caracterização da embriaguez dever-se-ia
necessariamente ser realizado o exame de sangue e não apenas concluir pela
embriaguez pelo simples contato visual.
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3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante dos breves estudos realizados com o presente trabalho, percebe-se
que o uso do álcool faz parte da própria humanidade. Desse modo, ainda que seu
uso imoderado traga sérios problemas sociais, não há como a sociedade evitá-los,
uma vez é parte da própria história e cultura humana.
Observou-se que o álcool no organismo humano produz efeitos distintos entre
as pessoas. Isso de deve ao grau de tolerância ao álcool que cada indivíduo possui,
bem como aos fatores como a idade, massa corpórea, sexo, capacidade de
absorção, frequência no consumo, quantidade de alimentos no estômago, entre
outros. Porém, para a apuração do estado da embriaguez, a legislação não leva em
conta esses fatores, de modo que ao concluir pela aplicação das mesmas normas
de forma generalizada, tanto no âmbito penal comum como no penal militar, acaba
por cometer injustiças já que o consumo da mesma quantidade de álcool confere
diferentes efeitos em indivíduos distintos.
Portanto, ainda que a legislação preveja que determinada quantidade de
álcool no organismo caracteriza a embriaguez, observou-se esse critério analisado
de forma isolada não é apto a justificar a imposição de penalidades, pois seria
necessário analisar os efeitos que são diversos em cada indivíduo. Dessa forma, é
necessário intensificar a produção de estudos sobre as implicações do álcool no
organismo humano, e assim, estabelecer parâmetros condizentes com a situação
específica dos indivíduos.
Conclui-se que dentre os métodos para se constatar a embriaguez, o mais
eficaz é sem dúvida o exame de sangue, pois exames da saliva, urina e do ar
expirado podem levar a resultados falsos. Dessa forma, para a caracterização da
embriaguez dever-se-ia necessariamente ser realizado o exame de sangue e não
apenas por simples análise de características externas do indivíduo, por exemplo,
pois como já observado, os efeitos são diferentes em cada pessoa.
Em relação às espécies de embriaguez, a doutrina é pacífica em sua
conceituação e aplicação das disposições legais. O indivíduo que comete ilícito sob
a influência de álcool pode ser levado a consequências jurídicas distintas
dependendo das causas em que ocorreu a embriaguez e das circunstâncias mentais
ocasionadas pela embriaguez, ou seja, se no momento do fato ele apresentava ou
não capacidade de entender o caráter ilícito de sua conduta.
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Pela pesquisa ora realizada, percebeu-se o estudo da influência do álcool no
ser humano e suas consequências jurídicas inclusive em âmbito militar são muito
mais amplos, necessitam de um maior aprofundamento, sobretudo em relação aos
efeitos do álcool no organismo humano a fim de se caracterizar a embriaguez.
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REFERÊNCIAS
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________Código Penal Brasileiro. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm. Acessado em: 20/07/2014. ________Código Penal Militar. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del1001.htm. Acessado em 20/07/2014. ________ Decreto n° 6117 de 22 de maio de 2007. Aprova a Política Nacional sobre o Álcool, dispõe sobre as medidas para redução do uso indevido de álcool e sua associação com a violência e criminalidade, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6117.htm Acessado em 20/07/2014. ________ Lei nº 11.705 de 19 de junho de 2008. Altera a Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro, e a Lei nº 9.294, de 15 de julho de 1996, que dispõe sobre as restrições ao uso e à propaganda de produtos fumígeros, bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos agrícolas, nos termos do § 4o do art. 220 da Constituição Federal, para inibir o consumo de bebida alcoólica por condutor de veículo automotor, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11705.htm. Acessado em 20/07/2014. CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Geral. 5ª ed. Revista e atualizada. Volume 1. Saraiva. São Paulo, 2003. FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal. 7ª ed. Guanabara Koogan. Rio de Janeiro, 2004. FÜHRER, Maximiliano Roberto Ernesto. Tratado da Inimputabilidade no Direito Penal. Malheiros Editores. São Paulo, 2000. HOUAISS, Antônio. Dicionário da Língua Portuguesa. Instituto Antônio Houaiss. São Paulo, 2001. KOSOVSKI, Ester. Drogas, Alcoolismo e Tabagismo. Revista Plantão Médico. Editora Biologia e Saúde. Rio de Janeiro, 1998.
25
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