A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

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1 UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO – UNICAP DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL COMUNICAÇÃO SOCIAL COM HABILITAÇÃO EM PUBLICIDADE E PROPAGANDA MÃE, COMPRA BRÓCOLIS? A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças ANNA LARYSSA THORPE FERNANDES RECIFE 2011

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO – UNICAP

DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL

COMUNICAÇÃO SOCIAL COM HABILITAÇÃO EM PUBLICIDADE

E PROPAGANDA

MÃE, COMPRA BRÓCOLIS?

A influência da propaganda de produtos alimentícios

sobre o consumo das crianças

ANNA LARYSSA THORPE FERNANDES

RECIFE

2011

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO – UNICAP

DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL

COMUNICAÇÃO SOCIAL COM HABILITAÇÃO EM PUBLICIDADE E

PROPAGANDA

MÃE, COMPRA BRÓCOLIS?

A influência da propaganda de produtos alimentícios

sobre o consumo das crianças

Projeto de monografia apresentado à

Universidade Católica de Pernambuco como

requisito parcial para a obtenção do título de

bacharel em Comunicação Social com

Habilitação em Publicidade e Propaganda sob a

orientação da Profª Ms. Izabela Domingues.

RECIFE

2011

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“A tarefa não é tanto ver aquilo que ninguém viu, mas pensar

o que ninguém ainda pensou sobre aquilo que todos veem.”

-ARTHUR SCHOPENHAUER

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AGRADECIMENTOS

Agradeço em primeiro lugar a Deus, que me deu forças para

seguir em frente mesmo com todas as dificuldades

encontradas no caminho. Agradeço também a minha família,

principalmente a minha mãe, que sempre acreditou em mim,

depositando todo o seu carinho, amor e confiança, me

consolando nos momentos de desespero.

Agradeço a João, que me deu todos os “puxões de orelha” que

foram preciso para eu não perder o foco. Aos meus amigos

que me ajudaram em tudo que precisei, revisando meus textos

e dando suas opiniões.

Por fim, agradeço a professora Izabela Domingues que me

acompanhou nessa jornada, me orientando neste trabalho.

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RESUMO

Esta monografia tem por objetivo mostrar a influência diária que as crianças recebem das

propagandas de produtos alimentícios constantemente veiculadas na mídia.

É sabido que as

crianças tendem a aceitar o que veem na TV como real e não necessariamente entendem que há

uma intenção persuasiva nos comerciais ou que eles são pagos. No geral, as crianças pré-

escolares podem não ter habilidade de fazer qualquer distinção entre os programas e os

comerciais, pois a defesa cognitiva delas ainda não está desenvolvida o suficiente para filtrar os

apelos da publicidade. Tendo isso em vista, este estudo visa analisar as estratégias que são

utilizadas para influenciar as crianças e as formas como a publicidade se dirige a elas.

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ABSTRACT

This monograph has the purpose of showing the daily influence that children receive from

constantly broadcasted food and beverage advertising. It is known that children tend to accept

whatever they see on TV as their reality, and they don't understand that there is a persuasive

intention in the advertisings or even that they are paid. Overall, preschool children may not have

the abilities of making any distinction between the programs and the adverts, as their intellectual

defense is not developed enough to filter the advertisement' appeal yet. With that in mind, this

study aims to analyze the strategies used to persuade children and the ways that advertisement is

directed to them.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 09

1. SOCIEDADE DE CONSUMO.......................................................................................... 11

1.1 O que é sociedade de consumo ........................................................................................ 11

1.1.2 Necessidade x Felicidade......................................................................................... 12

1.1.3 Principais Mudanças................................................................................................ 13

1.2 Internacionalização x Globalização ................................................................................ 14

1.3 Como o consumo constrói indivíduos na atualidade ..................................................... 16

1.3.1 Consumidores e Cidadãos ....................................................................................... 17

1.3.2 Cidadania na sociedade contemporânea .................................................................. 18

2. CRIANÇA ........................................................................................................................... 20

2.1 A evolução do conceito de criança ao londo da história ................................................ 20

2.1.1 Quais foram as mudanças ........................................................................................

2.

22

1.2 Criança: sinônimo de mão de obra barata ............................................................... 22

2.1.3 Efim, tudo mudou.................................................................................................... 23

2.2 A criança e o consumo...................................................................................................... 25

2.2.1 O poder de influência das crianças na commpra dos familiares.............................. 25

2.2.2 Tendências de crescimento no mercado de produtos infantis ................................ . 29

3. PUBLICIDADE .................................................................................................................. 31

3.1 A publicidade como linguagem da sedução.................................................................... 31

3.2 Propaganda como ferramenta do Marketing ................................................................ 32

3.3 Perspectivas e tendências mercadológicas para o público infantil............................... 33

3.4 A influência da propaganda sobre o consumo infantil.................................................. 35

4. A PROPAGANDA E A LEI .............................................................................................. 40

4.1 A obesidade infantil .......................................................................................................... 40

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4.2 Regulamentação da propaganda para a criança ........................................................... 43

CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................ . 46

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................

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INTRODUÇÃO

Na sociedade de consumo contemporânea, as crianças se tornaram um público-alvo

bastante disputado pelas empresas que comercializam bens materiais e simbólicos. Elas,

entretanto, são mais vulneráveis ao consumo, realizado de modo mais inconsequente do que os

adultos, e sofrem, cada vez mais cedo, com graves consequências relacionadas aos excessos do

consumismo, inclusive a obesidade infantil. Este trabalho tem o intuito de investigar a influência que a propaganda de produtos

alimentícios exerce sobre as decisões de compras dos consumidores mirins. É notório o domínio

que o uso de desenhos animados e apresentadores infantis na propaganda tem sobre as crianças.

Desta forma, é fundamental refletir acerca da influência da propaganda sobre a publicidade e o

universo infantil. Vê-se que alguns comerciais de produtos são pensados para entretê-las e

buscam criar uma realidade onde tudo possa ser comprado, consumido e rapidamente descartado

sem consequências.

Ao anunciarem roupas de cama, móbiles e brinquedos de berço decorados com logos de marcas ou imagens de personagens licenciados, os profissionais de marketing fazem o que podem para assegurar que os bebês reconhecerão e pedirão produtos decorados de maneira semelhante, que vão desde cereais até bichinhos de pelúcia, à medida que suas habilidades verbais evoluírem. (LINN, 2006, p. 70)

Com essas estratégias, o mercado visa fidelizar as crianças desde cedo, gerando um

carinho das mesmas para com as marcas, objetivando que num futuro próximos essas crianças já

sejam consumidores em potencial e já estejam familiarizadas com a marca.

De acordo com Macneal (1999, p.16), se podem observar três faces do consumo infantil.

A primeira: as crianças são mercado primário de consumo, pois consomem os produtos

diretamente destinados a elas, como brinquedos, balas e doces; a segunda: as crianças

influenciam e opinam, incentivando as compras da família; a terceira: as crianças são mercado-

futuro, isto é, a criança se tornará um adolescente e, após, um adulto que deverá consumir

produtos e marcas que conheceu ainda na infância.

Em cada fase a criança tem seu valor como consumidora, sendo como mercado primário,

influenciadoras ou mercado-futuro, ela desperta o interesse das empresas em tê-las como público/

consumidor, pois vêem nelas os consumidores do futuro.

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Assim, esse trabalho estuda alguns aspectos que fazem com que o mercado deseje o

público alvo infantil e a influência que ele sofre a respeito destas propagandas que geram tantas

polêmicas.

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1. SOCIEDADE DE CONSUMO

1.1 O que é sociedade de consumo?

Para se entender a sociedade de consumo é preciso resgatar o conhecimento dos períodos

históricos anteriores à Idade Contemporânea, já que os comportamentos de hoje refletem o

passado e são o resultado de todas as transformações pelas quais o mundo ocidental passou.

Barbosa defende que a sociedade de consumo surgiu entre os séculos XVI e XVIII e que, embora

muitos historiadores afirmem que ela só aconteceu depois da Revolução Industrial, existiu uma

revolução do consumo e comercial antes da mesma e que foi algo primordial para a

modernização do Ocidente (2008, p.07).

Mas o que seria essa sociedade de consumo? Ela é uma forma de denominar a sociedade

contemporânea: uma época capitalista na maior parte do mundo, que se caracteriza pelo consumo

massivo.

Sociedade de consumo é um dos inúmeros rótulos utilizados por intelectuais, acadêmicos, jornalistas e profissionais de Marketing para se referir à sociedade contemporânea. Ao contrário de termos como sociedade pós-moderna, pós-indústrial e pós-iluminista – que sinalizam para o fim ou ultrapassagem de uma época - sociedade de consumo, à semelhança das expressões sociedade da informação, do conhecimento, do espetáculo, de capitalismo desorganizado e de risco, entre outras, remete o leitor para uma determinada dimensão percebida como específica e, portanto, definidora, para alguns, das sociedades contemporâneas (BARBOSA, 2008, p.7).

Essa sociedade apresenta uma ênfase na relação dos homens com os objetos em

detrimento dos homens com os outros homens, em função da importância que os bens materiais

adquiriram no mundo capitalista.

À nossa volta, existe hoje uma espécie de evidência fantástica do consumo e da abundância, criada pela multiplicação dos objetos, dos serviços, dos bens materiais, originando como que uma categoria de mutação fundamental na ecologia da espécie humana. Para falar com propriedade, os homens da opulência não se encontram rodeados, como sempre acontecera, por ouros homens, mas mais por objetos. (BAUDRILLARD, 1995, p.15).

É percebido, então, que o homem está cada vez mais se afastando dos seus semelhantes e

sentindo uma necessidade de viver associado a objetos. E, muitas vezes, quando se fala em

necessidade, ela está relacionada à felicidade. É como se fosse uma justificativa para se consumir

mais. Como se, por se adquirir novas coisas, junto com esses bens viesse também a felicidade.

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Dessa forma, vai se criando um hábito pelo consumo. Como o homem quase nunca está

satisfeito, ele fica sempre nesse círculo de comprar à espera da tal felicidade que virá atrelada ao

objeto adquirido.

Todo discurso sobre necessidades assenta numa antropologia ingênua: a da propensão natural para a felicidade. Inscrita em caracteres de fogo por detrás da menor publicidade para as Canárias ou para os sais de banho, a felicidade constitui a referência absoluta da sociedade de consumo, revelando-se como o equivalente autêntico da salvação. (BAUDRILLARD, 1995, p.47).

1.1.2 Necessidade X Felicidade

É interessante pensar o que, realmente, é necessidade nos dias de hoje, já que essa linha

entre necessidade e vontade fica cada dia mais tênue. De acordo com Pinto, o ato de consumir

limita a percepção da sociedade, através de posses de ordem material e o “ter” se torna a palavra-

chave, em detrimento do “ser”, o valor do objeto vai se tornando mais importante do que as

relações pessoais e a busca por sempre mais, pode estimular a competição e o egocentrismo

(2007, p. 14).

Na visão de Baudrillard, as necessidades se agrupam pelo valor de uso, obtém-se uma relação de

fidelidade natural, onde, em sua presença, deixa de haver desigualdade social e não existe

proletário nem privilegiado, reina a igualdade universal (1995, p.48). Já Bauman argumenta que o

que move a sociedade de consumo são o desejo e o capricho. O desejo se enraíza na comparação,

na vaidade, na inveja e na necessidade de aprovação. O capricho, por sua vez, é infantil e

inseguro (apud BARBOSA, 2008, p. 46).

O que impele a sociedade de consumo não é um conjunto fixo, circunscrito e finito de necessidades, mas o desejo (desire) e agora na época do capitalismo tardio o capricho (wish). Ambos são fenômenos essencialmente evasivos e efêmeros, que prescindem de justificação ou apologia em torno de um objetivo ou causa. (BARBOSA, 2008, p.46).

Em contraponto a Bauman, Campbell afirma que toda essa insaciabilidade vinda do ser

humano se encontra na época que se passa do hedonismo tradicional para o hedonismo moderno.

Segundo o autor, o hedonismo tradicional é aquele que vem das sensações que se sente e de todos

os prazeres que essas sensações podem proporcionar. Já o hedonismo moderno é totalmente

ligado às emoções, onde a imaginação do indivíduo toma o total controle e o mesmo não precisa

ter passado por uma determinada experiência: ele simplesmente usa a sua imaginação (apud

BARBOSA, 2008, p. 51). E, portanto, Campbell afirma que a principal atividade do consumo não

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é a seleção, a compra ou o uso dos produtos, mas a busca do prazer imaginativo que a imagem do

produto lhe proporciona. Dessa forma, o consumo é um resultante desse “hedonismo

mentalístico” (apud BARBOSA, 2008, p.52-53).

Sendo assim, o comportamento do consumidor passou por uma transição com várias

mudanças, que o levou à sociedade de consumo. Antes, na época do hedonismo tradicional, o

homem consumia pelas sensações que aquele consumo iria lhe proporcionar. Hoje, no hedonismo

moderno, o indivíduo não consome mais pela busca dessas sensações e, sim, pelo prazer

imaginativo que o produto irá lhe fornecer.

1.1.3 Principais mudanças

Mas e quais foram as mudanças ocorridas pela consolidação da sociedade de consumo?

Segundo Canclini as maneiras como se consomem alteraram principalmente as possibilidades e

as formas de exercer a cidadania, que sempre estiveram associadas a capacidade de tornar próprio

os bens de consumo e o modo de usá-los (2006, p.29). Já Barbosa explica que não foi só uma

mudança, foram várias, desde a preocupação com novas formas de lazer a expansão da ideologia

individualista, passando também pela valorização do amor romântico e o aumento do grau de

literariedade da população. Mas, segundo a autora, duas foram as mais marcantes, a passagem do

consumo familiar para o consumo individual e a transformação do consumo de pátina para o

consumo de moda (2008, p.24).

Na Europa, entre os séculos XVI e XVIII, as pessoas consumiam a partir de seus grupos

sociais, até por que a sociedade era dividida em uma pirâmide muito demarcada. Na base da

mesma, ficavam os plebeus, após vinha a burguesia e, no topo, ficavam os nobres e o clero.

Nessa época existiam regras que definiam o que consumir e o que não consumir.

Grupos com estilo de vida previamente definidos e manifestos na escolha de roupas, atividades de lazer, padrões alimentares, bens de consumo e comportamento em relação aos quais as escolhas individuais encontram-se subordinadas e condicionadas. Todo o estilo de vida desses grupos de status era controlado e regulado, em parte, pelas leis suntuárias. Estas definiam o que deveria ser consumido por determinados segmentos sociais e o que era proibido para outros. Várias eram as razões que circundavam a existência dessas leis, desde uma preocupação moral com o luxo até a demarcação de posição social. (BARBOSA, 2008, p.20)

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Toda essa relação durou até a sociedade contemporânea individualista e de mercado.

Hoje em dia, as classes sociais não são mais divididas dessa forma. Existem vários grupos, com

estilos diferentes e que ditam a própria moda.

O segundo fator que marcou a chegada da sociedade de consumo foi a passagem do

consumo de pátina para o consumo de moda. A pátina é relacionada a um bem que está numa

determinada família há muito tempo, como uma jóia, um móvel ou algo do tipo. Isso agrega valor

ao objeto e gera status ao seu dono. Já a moda, que existe nos dias atuais, marca uma novidade e

proporciona ao seu dono um jeito de se tornar individual e diferenciado das outras pessoas e

também, sendo, bastante mutável, tendo novos conceitos a cada nova coleção.

A pátina é a marca do tempo deixada nos objetos, indicando que os mesmos pertecem e são usados pela mesma família há gerações. A pátina está ligada a um ciclo de vida mais longo do objeto, e dependendo do mesmo, conferia e ainda confere tradição, nobreza, enfim, status aos seus proprietários...Ao contrário da pátina (a moda), é um mecanismo social expressivo de uma temporalidade de curta duração, pela valorização do novo e do individual. (BARBOSA, 2008, p. 24-25)

Canclini explica que, nos séculos XIX e XX, as nações modernas transcenderam as visões

aldeanas de camponeses e indígenas e evitaram que os cidadãos se “dissolvessem na vasta

dispersão do mundo”. O consumo de um produto nacional costumava ser mais barato do que o

consumo de um produto importado, o valor de consumir “o nosso” era sustentado por uma

nacionalidade econômica. Bens e marcas estrangeiras eram um recurso de prestígio e, às vezes,

uma opção por qualidade. (1999, p. 41).

Aos poucos, os objetos foram perdendo a fidelidade territorial e a montagem virou

multinacional, passando a ser produzida nos países com menor custo e, iniciando assim, uma

internacionalização da globalização. (CANCLINI, 1999, p. 42)

1.2 Internacionalização x Globalização

A globalização vivida hoje apresenta uma infidelidade nacional no que é consumido,

sendo difícil encontrar algo cem por cento territorial. Usando como exemplo um carro, cada parte

dele é produzida em um lugar distinto. Cada um desses lugares é especialista em suas respectivas

partes, ou possui a mão-de-obra mais barata, ou produz insumos com preços mais baixos. Enfim,

existe essa mistura de nacionalidades que faz com que o produto não tenha uma única nação.

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... Quando compramos um carro Ford montado na Espanha, com vidros feito no Canadá, carburador italiano, radiador austríaco, cilindros e baterias ingleses e eixo de transmissão francês... O processo de produção é fragmentado, fabricando cada partes dos bens nos países em que o custo é menor. Os objetos perdem a relação de fidelidade com os territórios originários. (CANCLINI, 1999, p. 41)

Isso tudo tem a ver com profundas mudanças na sociedade, que envolvem a

internacionalização das culturas nacionais e também a globalização. Segundo Canclini, a

internacionalização foi uma abertura das fronteiras geográficas de cada país para incorporar bens

materiais e simbólicos de outros. As maiorias dos bens consumidos eram fabricados no próprio

território, e era possível, não estando satisfeito com o produto, ir procurá-lo em outro lugar (1999,

p.42). Com a globalização, bens e serviços são gerados em vários locais diferentes e o que mais

importa é a velocidade com que eles percorrem o mundo.

A internacionalização interfere até na criação do nome de uma marca, de acordo com

Kapferer, a internacionalização das marcas obriga a cuidar das pronúncias e a evocação dos

nomes pelo mundo. Ela tem que ter habilidades para se tornar internacional (2003, p.131). Para

que quando adentre em outros países a tradução do seu nome não prejudique sua imagem ou

mesmo que não tenha nenhum problema com uma outra marca já existente neste outro país.

Figura 01: Marca da Nike, que em certos países Árabes não é registrável.

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Os meios de comunicação foram bons para abrir caminhos para a globalização econômica,

com a chegada da TV, no fim dos anos 30 , as formas de comunicação mudaram totalmente no

mundo. A exibição instantânea das imagens combinava muito bem com as necessidades de uma

sociedade cada vez mais consumista.1

1.3 Como o consumo constrói indivíduos na atualidade

Com o passar do tempo vários meios de comunicação foram entrando na sociedade atual,

de certa forma, as comunicações massivas, foram guiando as pessoas em direção ao consumo.

Essas novas maneiras de se manter informado, fez com que todas as pessoas tivessem mais

conhecimento sobre tudo ao seu redor, inclusive sobre os direitos que cada um possui.

Desiludidos com as burocracias estatais, partidárias e sindicais, o público recorre à rádio e à televisão para conseguir o que as instituições cidadãs não proporcionam: serviços, justiça, reparações ou simples atenção. Não é possível afirmar que os meios de comunicação de massa com ligação direta via telefone, ou que recebem os espectadores em seus estúdios, sejam mais eficazes que os órgãos públicos, mas fascinam porque escutam e as pessoas sentem que não é preciso se “ater a adiantamentos, prazos, procedimentos formais que adiam ou transferem as necessidades(...) (CANCLINI, 1999, p. 49)

Figura 02: Família assistindo TV na década de 60.

1 http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/guerra-fria/guerra-fria2.php acessado dia 31/05/11 às 21:40

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Dessa forma, os antigos meios de conhecimento foram substituídos pelos meios de

comunicação. Este, oferecendo inúmeras possibilidades de liberdade ao consumidor.

Percebe-se então que o que caracteriza a relação do indivíduo com o consumo na sociedade contemporânea é a liberdade de escolha, através das inúmeras possibilidades que se apresentam a ele – o que sustenta o ato de consumir como processo individualista e traz à tona a crítica social de perda de coletividade anteriormente discutida. Reside justamente nessa variedade de escolhas a possibilidade de representação pessoal a partir do consumo. Através dele as pessoas podem se definir da maneira que mais lhes agradar e tentar transmitir ao outro a imagem que desejarem. (PINTO, 2007, p. 18)

Essa liberdade de escolha gerou muitas mudanças, e essas mudanças socioculturais, segundo

Canclini, podem ser resumidas em cinco etapas:

• Um redimensionamento das instituições e dos circuitos de exercício do público, que é a

perda de peso dos órgãos locais e nacionais em benefício dos conglomerados empresariais

de alcance transnacional;

• A reformulação dos padrões de assentamento e convivência urbanos, que é o caso das

grandes cidades, onde atividades básicas (trabalhar, estudar, consumir) se realizam longe

do lugar de residência e o tempo de locomoção para estes lugares, reduz o tempo

disponível para habitar a própria;

• A reelaboração do “próprio”, que é devido ao predomínio dos bens e mensagens

provenientes de uma economia e cultura globalizada sobre aqueles gerados na cidade e na

nação a que se pertence;

• A conseqüente redefinição do senso de pertencimento e identidade, onde cada vez menos

grupos se reúnem por lealdades locais ou nacionais e mais pela a participação e

comunidades transnacionais ou desterritorializadas de consumidores;

• A passagem do cidadão como representante de uma opinião pública ao cidadão

interessado em desfrutar de uma certa qualidade de vida. (1999, p.50)

1.3.1 Consumidores e Cidadãos

Analisando essas mudanças ocorridas na sociedade de consumo, é notório que um grande

número de pessoas está no século XX como consumidoras, mas como cidadãs estão no século

XVIII. Isso é visto, especialmente, nos países periféricos, onde o consumo de bens e serviços

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aumenta cada vez mais ao mesmo tempo em que a globalização exclui desocupados e migrantes

dos direitos humanos básicos: trabalho, saúde, educação, moradia. (CANCLINI, 1999, p. 51-52)

O projeto iluminista tinha a intenção de fazer com que a modernidade fosse acessível a

todos. Pela concepção neoliberal de globalização, em que os direitos são desiguais, as novidades

modernas aparecem para a maioria como objetos de consumo, e para muitos apenas como um

espetáculo. O direito de ser cidadão, de tomar decisões a respeito de como são produzidos e

utilizados esses bens se restringe só à elite. (1999, p. 52)

O consumo também serve como um elemento de distinção no mundo ocidental. Pinto

observa que é possível pensar no consumo como um organizador cultural, pois ele é capaz de

agregar sentido ao ato de consumir (2007, p.17). A maneira como as pessoas consomem, nos

dias de hoje, tenta passar alguma mensagem para os outros, mostra algo sobre as mesmas e

solidifica a imagem que fazem de si.

Percebe-se então que o que caracteriza a relação do indivíduo com o consumo na sociedade contemporânea é a liberdade de escolhas, através das inúmeras possibilidades que se apresentam a ele – o que sustenta o ato de consumir como processo individualista e traz à tona a crítica social de perda de coletividade. (2007, p.18)

Como Pinto destaca, é a liberdade de escolhas que marca o consumo na

contemporaneidade. Dessa forma, a individualidade é sustentada junto com a perda do senso de

coletividade. As pessoas podem demonstrar a forma como mais desejam serem vistas, fazendo

com que o outro tenha na cabeça a imagem que elas mesmas querem passar. Esses bens

consumidos servem, além de tudo, como uma legenda para quem os usa, transmitindo tudo o que

a pessoa quer passar.

Percebe-se, então, como o indivíduo contemporâneo pode se posicionar socialmente através das práticas de consumo: conceitos sobre família, status social, ou sobre posição ideológica podem ser entendidos, entre outros fatores, através das mercadorias que ele consome. Os estudos das práticas de consumo viabilizam esse processo como uma das esferas da vida que tem o potencial de construir identidades, tornando-se representante de idéias, posições, estilos de vida e, nas sociedades ocidentais, atuando sobre os indivíduos e traduzindo-se como forma de expressão e de construção novas maneiras de interação social. (PINTO, 2007, p. 20)

1.3.2 Cidadania na sociedade contemporânea

O exercício tradicional da cidadania, através das esferas públicas governamentais, na

sociedade de consumo contemporânea, ficou mais difícil. Segundo Canclini, o processo de

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consumo deve ser pensando como manifestação política, já que ele faz você pensar, questionar,

fazer escolhas e executar o político (1999, p.53-54).

De acordo com o autor, as heterogêneas manifestações de público, organismos não-

governamentais, empresas privadas e indivíduos, surgiram com a evolução do processo

econômico, exercendo cidadania através dos seus interesses como consumidores (1999, p. 54).

Pode-se notar quantos protestos existem na atualidade que questionam a sociedade de

consumo e alguns de seus procedimentos. Desde movimentos contra o trabalho escravo, contra o

trabalho infantil, até a preservação do meio ambiente e a busca por uma forma de consumir sem

que seja preciso agredi-lo – assunto bastante discutido no mundo globalizado. Como forma de

exercício político da sociedade civil, surgem os códigos de defesa do consumidor, visando fazer o

consumidor exercer seu lado de cidadão.

Dentro do contexto de imediatismo desenvolvido na sociedade contemporânea, essas crianças podem crescer convivendo com a volatilidade na experiência do consumo, uma vez que elas se acostumam com mercadorias – dirigidas ao público infantil ou não - sendo substituídas em uma escala de tempo muito pequena. Isso pode influenciar sua relação com o consumo na medida em que a liquidez com que esse processo se apresenta pode despertar nelas os fenômenos de desejo e capricho[...] (PINTO, 2007, p. 16)

Assim como Pinto coloca, a busca pela satisfação através do consumo, pode se apresentar

cada vez mais cedo, na vida das crianças, acelerando cada vez mais as experiências fornecidas

pelo consumo.

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2. CRIANÇA

2.1 A evolução do conceito de criança ao longo da história.

O conceito de criança sofreu, e continua a sofrer, diversas alterações ao longo do tempo.

Durante a Idade Média, não existia uma diferenciação clara entre crianças e adultos (ÁRIES,

1973, p.39). Em relatos de livros, documentos, e principalmente, pinturas, pode-se perceber que

essas crianças eram tratadas como adultos em miniatura. Nos quadros do pintor espanhol Diego

Velasquéz, é possível encontrar crianças vestidas como adultos e portando-se como eles.

Figura 03: Las Meninas – pintura de Diego Velasquéz

Em diversos quadros da Idade Média, era comum ver crianças nobres paramentadas como

seus pais, reis e rainhas. O pequeno Luís XVII, príncipe da França, em pintura de 1710, com

apenas três anos, é mostrado totalmente vestido como adulto. Sua pose, olhar e vestimenta não

mostram que ali está uma criança. Além disso, não era difícil encontrar pinturas em que as

crianças retratadas não tinham traços específicos da sua fase da vida. Elas eram representadas

com traços físicos de adultos, apenas a estatura inferior era a referência de que se tratava de uma

criança (ARIÈS, 1973, p.39-40).

Page 21: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

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Figura 04: Luís XVII –Alexandre Kucharsky

Áries observa que as crianças recebiam um tratamento diferente dos adultos apenas nos

primeiros anos de vida, somente enquanto eram totalmente dependentes de suas amas ou mães.

Após essa fase, passavam a ver o mundo através dos ensinamentos dos adultos, de toda a

sociedade e não apenas de sua família, pois era comum que as crianças dessa época servissem ou

auxiliassem em tarefas familiares.

Durante a Idade Média, a conceituação das fases da vida do ser humano era dividida em

seis. As três primeiras, que correspondem a 1° idade (do nascimento aos 7 anos), 2° idade (dos 7

aos 14 anos) e 3° idade (dos 14 aos 21 anos), eram etapas não valorizadas pela sociedade.

Somente a partir da 4° idade, a juventude (dos 21 aos 45 anos), as pessoas começavam a ser

reconhecidas socialmente. Ainda existiam a 5° idade (a senectude), considerando a pessoa que

não era velha, mas que já tinha passado da juventude; e a 6° idade (a velhice), dos 60 anos até a

morte (Ariès, 1973, p. 25-26). A infância era uma fase curta e interrompida quando as crianças já

eram vistas como seres independentes.

O conceito de infância reflete as variações da cultura humana e as transformações

histórico-sociais ocorridas, assumindo marcas bem definidas de cada época. É importante

perceber que até o século XVI a história não aponta consciência sobre o papel social das crianças,

o conceito de infância não era admitido como uma categoria das fases da vida humana.

Page 22: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

22

2.1.1 Quais foram as mudanças?

Já durante a Idade Moderna, entre os séculos XVII e XVIII algumas mudanças sociais

começaram a ocorrer. Diversos pensadores do século XVIII, como Locke e Rousseau,

“afirmaram com segurança que as crianças são importantes em si, em vez de serem simplesmente

adultos imperfeitos” (HEYWOOD, 2004 p. 37).

Os trabalhos desses dois pensadores impulsionaram a expansão do pensamento a respeito

das crianças, chegando seus estudos o mais próximo das noções contemporâneas de infância,

mais do que qualquer outro pensador anterior a eles. Rousseau desenvolveu o conceito de

inocência, defendendo que as crianças são seres puros (HEYWOOD, 2004).

Como inocentes, poderia-se deixar que correspondessem à natureza, e nada fariam, que não fosse bom, podendo fazer mal, mas não com a intenção de prejudicar. Então, poderiam aprender lições a partir das coisas, e não a partir dos homens, pois tais lições estariam relacionadas aos móveis ou as janelas que tivessem quebrado, por exemplo. (HEYWOOD, 2004, p. 38).

Graças à expansão dos conceitos de infância, aos poucos, foi percebida a necessidade da

criação de escolas, a fim de que as crianças aprendessem leitura, escrita e aritmética. A escola

substituiu a forma empírica de aprender conhecimentos, através dos ensinamentos dos adultos.

Ela passou a funcionar como uma forma de preparação para a fase adulta.

Com todas as reticências e retardamentos, a criança foi separada dos adultos e mantida à

distância numa espécie de quarentena, antes de ser solta no mundo. Essa quarentena foi a escola.

Começou, então, um longo processo de enclausuramento das crianças que se estende até nossos

dias e ao qual se dá o nome de escolarização (ARIÉS, 1978, p.05). Ariés não fala do colégio

interno em si: ele defende que esse enclausuramento é a escola em geral. Nela, a criança aprende

e depois, segundo o autor, é “solta no mundo”.

2.1.2 Criança: sinônimo de mão de obra barata.

No século XVIII, um novo olhar foi direcionado sobre as crianças. Com o apogeu da

Revolução Industrial, as crianças de classe mais baixas passaram a ser vistas como mão-de-obra

barata, ou seja, um valor econômico, que precisava ser explorado, numa época em que o mercado

precisava, cada vez mais, de trabalhadores. (ARRUDA e PILETTI, 2002, p.239)

Page 23: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

23

Nesse momento, as crianças abandonam a escola e tornam-se trabalhadores braçais,

dentro do sistema capitalista, que plantava suas bases. No entanto, Heywood explica que, quando

os estudos sobre ciências sociais começam a se desenvolver e se ampliam os conhecimentos

sobre a fase infantil, as crianças começam a ser retiradas das fábricas e são, novamente, inseridas

no conceito de aprendizagem escolar (2004, p.36).

Fig. 05 – Crianças Trabalhando. Revolução Industrial.

Quando o conceito histórico de família passa a se fazer presente, os genitores tornam-se

responsáveis por assegurar o bem–estar das crianças. Outras ciências que se desenvolviam na

época, como a Medicina, a Sociologia e a Psicologia, ajudaram a embasar, cientificamente, o

conceito de infância.

É somente a partir do século XIX, tanto no Brasil, como no restante do mundo, que admite-se uma preocupação a respeito do papel social da criança. Pesquisas apontam que é apenas a partir da década de 60 que os estudos sobre crianças e sobre educação começam a apresentar elos de ligação (ARIÈS, 1978, p.45)

Somente no fim do século XIX, surgiu o conceito de que as crianças são especiais e

diferentes, portanto dignas de ser estudadas por si sós (HEYWOOD, 2004, p.43). Começou,

então, uma preocupação com o papel social que ela exercia.

2.1.3 Enfim, tudo mudou.

Page 24: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

24

Já no fim do século XIX, percebe-se uma tendência crescente à separação entre crianças e

adultos. Esse panorama já vinha se delineando desde o surgimento da escola entre os séculos

XVII e XVIII. Com a Revolução Francesa, em 1789, a função do Estado sofreu modificações e a

responsabilidade e o respeito pela criança também mudaram. “Os governos começaram a se

preocupar com o bem-estar e com a educação das crianças” (LEVIN, 1997, p. 254)

Nesse ínterim de mudanças, surgem pesquisadores como Durkheim, que busca quebrar a

distância existente entre infância e escola, vendo nessa nova conjuntura uma forma de disciplinar

e moralizar a criança.

Dar educação à criança passou a ser uma forma de adequá-la às regras do jogo social,

político e econômico. Segundo Durkheim, educar é incutir nas crianças um sentimento de

moralidade. Para isso, era necessário que as crianças apreendessem três elementos: o espírito de

abnegação (abrir mão de algo em favor dos ideais coletivos), espírito de disciplina (gosto de

obediência à autoridade) e a autonomia da vontade (submissão esclarecida). (DURKHEIM, 1978,

p. 77)

Na contemporaneidade, percebe-se uma enorme ruptura entre os diversos conceitos que se

desenvolveram ao longo da história. Isso se deve a diversos fatores, entre eles, ao fato de que as

crianças da era atual são frutos de uma sociedade capitalista e neoliberal. Na era medieval, as

principais fontes de informação eram a escola e o conhecimento adquiridos empiricamente, na

vivência com adultos. Nos dias atuais, as mídias estão mais presentes e influenciam cada vez

mais as crianças, substituindo, em parte, os conhecimentos antes obtidos com os pais e na escola.

Atualmente, a televisão ocupa uma enorme parcela na educação e no tempo livre da maioria das

crianças pelo mundo (Instituto Alana, 2005).

Existem, nos dias atuais, algumas conceituações básicas sobre crianças. Segundo o

Estatuto da Criança e do Adolescente ECA (Lei federal 8.069, de 13 de julho de 1990), a

separação entre essas duas fases da vida se dá somente através da idade. Para o Estatuto, crianças

são os indivíduos que tem até 12 anos incompletos e adolescentes aqueles que têm entre 12 e 18

anos de idade.

A Convenção Internacional Sobre os Direitos da Criança realizada pela ONU

(Organizações das Nações Unidas), instaurada no ano de 1989, propõe que a primeira infância

seja definida no período abaixo dos oito anos de idade, para que sejam englobadas todas as

Page 25: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

25

crianças até o período de passagem da pré-escola para o ensino fundamental (UNICEF; Bernard

van Leer Foundation, 2006).

2.2 A Criança e o consumo

2.2.1 O poder de influência das crianças na compra dos familiares

As crianças são expostas às propagandas, e estão sempre bem informadas sobre o

mercado de consumo. Antes mesmo de nascer, elas já fazem parte desse “mundo”. Os pais se

preparam para a chegada de seus filhos, compram roupas, fraldas, brinquedos. Esses produtos

suprem as futuras necessidades do bebê, mas, também, detém um caráter simbólico para os pais,

que ao apresentar os filhos para a sociedade já tem em mente que marcas eles devem consumir

para estarem inseridos no contexto social desejado. “As pessoas são levadas a se identificar com

o que consomem” (SLATER, 2005, p. 114).

Segundo Santos, as crianças passam por três etapas associadas à faixa de idade. De 0 a 2

anos existe a fase do Universo das Observações, onde a criança conhece as compras

acompanhadas pelos pais, e não consegue distinguir as marcas dos produtos. Depois vem o

Universo das Indagações (dos 3 aos 5 anos) que é a fase do 'eu quero', nesta etapa, as crianças

iniciam as manifestações de desejos de compras e fazem suas solicitações aos pais. Agora elas já

são capazes de reconhecer marcas, distinguir entre embalagens e localizar produtos em

prateleiras. Quando a criança começa a assumir uma postura mais ativa e seletiva em relação às

suas escolhas de marcas e produtos, ela entra no Universo Racional, que vai dos 6 aos 11 anos de

idade. Nesta fase, ela passa a imitar seus pais, ao executar compras sozinhas ou acompanhadas de

amigos. Começa a ter noção de dinheiro, de tomada de decisões, de integração com o ambiente e

comunicação, relacionamento com outras pessoas. (SANTOS, 2000, p.63-64).

Como se percebe, a criança, a partir de cada estágio que se encontra, pode assumir vários

papéis de compra. No Universo das Observações, seu papel de consumidora e de influenciadora

ainda não se desenvolveu, assim o processo de compra é de responsabilidade de outra pessoa, e

não dela. Ela não influencia, apenas orienta as compras.

No Universo das Indagações, a criança começa a demonstrar seus interesses, suas

preferências, ela começa a ter voz ativa, induzindo seus pais ao processo de compra.

Page 26: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

26

A fase do Universo Racional é a fase em que a criança exerce todos os papéis de compra,

ela se comunica bem e já tem um poder de persuasão mais forte. Elas não só utilizam o que seus

pais consomem, mais também, os influenciam a comprar o que querem. E com a mesada a

liberdade para gastar fica ainda maior.

Assim, crianças não exercem apenas o papel de influenciadoras. Também representam um

importante mercado quando gastam o próprio dinheiro, fruto de sua mesada, na compra de

produtos e serviços.

Um estudo feito pela InterScience, em 2003, constatou que apenas 8% das crianças

influenciava fortemente seus pais na decisão de compra. Já em 2009 essa porcentagem foi quase

sete vezes maior, foi constatado que 49% participam desse processo de forma intensa e, daqui a

dez anos, este índice será de 82%.

Outro estudo, também feito pela InterScience, constatou que 48% das crianças, entre 3 e 9

anos, tem poder de compra direto. Isto é, recebem dinheiro para gastar com o que quiserem.

Podemos perceber com esse estudo a força econômica que esse nicho de mercado detém.

E o quanto a distância entre influenciadora e consumidora é pequena.

“A criança é trainee2

Algumas marcas famosas, como Adidas, Harley Davidson e Nike, historicamente ligadas

ao público adulto, desenvolvem atualmente linhas exclusivas para o público infantil. São peças

minúsculas, mas que já estampam logomarcas enormes, pois essas empresas acreditam que “as

crianças podem desenvolver sentimentos positivos a respeito de logos e personagens licenciados

antes de terem palavras para os produtos associados a elas”. (LINN, 2006, p. 69).

de consumo. Quem é criança hoje é consumidor amanhã” (Gade,

1998, p. 186). Em outras palavras, o que Gade afirma é que as crianças são os consumidores

adultos de amanhã, ou seja, é necessário que a publicidade “molde” as crianças para que se

tornem consumidores fiéis de determinadas marcas ou produtos.

O uso da fantasia faz com que as crianças reproduzam as ações dos personagens de

desenhos animados e de filmes infantis, constatando a influência dos materiais televisivos sobre o

imaginário das mesmas. Essas propagandas ficam em suas cabeças e no ato da compra elas se

lembram do produto.

[...] as crianças mais novas gostam de cartoons, jingles, imagens, ação e efeitos especiais, histórias familiares, bastante música e ruído, percebem os anúncios fazendo

2 Trainee - Palavra de origem inglesa que significa aprendiz profissional.

Page 27: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

27

parte da programação, aceitando como verdade o que passa no mundo da fantasia. Já as crianças um pouco mais velhas fazem distinção entre a programação e as peças publicitárias, gostam cartoons e de um pouco de fantasia e ação, principalmente os meninos, que gostam de personagens divertidos e freqüentemente toma os personagens como modelo de comportamento. (GADE, 1998, p.187).

São percebidos na mídia, esses tipos de apelos passado nas propagandas. Um bom

exemplo é a propaganda do Toddynho que tem como slogan

Esta pesquisa tem como objetivo identificar as estratégias publicitárias criadas de forma a

persuadir o público infantil a consumir produtos e serviços, além de promover a predileção deste

público-alvo por determinadas marcas. Para tanto, formulou-se um estudo teórico-empírico, cujo

trajeto teórico está calcado em um raciocínio lógico indutivo, utilizando-se uma abordagem,

prioritariamente, qualitativa. A análise do conteúdo foi a técnica de análise escolhida para a

pesquisa. Como técnica de levantamento de dados, utilizou-se a observação de peças publicitárias

impressas e eletrônicas veiculadas nos principais meios de comunicação de massa. Foram

enfatizados os dados visuais e verbais como indicadores de disposições psicológicas coletivas.

Buscou-se identificar, através das peças selecionadas, uma ressonância geral dos anseios, desejos

e opiniões de um grande número de pessoas nas sociedades de consumo contemporâneas. A

pesquisa foi realizada considerando-se uma amostragem aleatória.

3

“Toddynho seu companheiro de

aventura”. Nesta, sempre são mostradas as crianças com o personagem do Toddynho se

aventurando, também se percebe o uso de animações, cores vivas e desenhos. Logo, a

propaganda tem o intuito de mostrar que com o Toddynho tudo se torna mais divertido,

induzindo a criança a consumir o produto.

3 Slogan – Palavra de língua inglesa que significa: frase de efeito de fácil memorização.

Page 28: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

28

Figura 06: Propaganda do achocolatado Toddynho.

Esse comercial tem o uso da fantasia, fazendo com que as crianças reproduzam ações de

personagens de desenhos animados e de filmes infantis, constatando a influência dos materiais

televisivos sobre o imaginário delas.

Outro exemplo é o do biscoito Treloso, que faz outro tipo de apelo, com ilustrações e

jingle4

Menino treloso quer comer biscoito, biscoito Treloso só Vitarella tem. Morango, chocolate, doce de leite, limão, laranja e creme eu quero também! No recreio da escola, no lanche, no passeio fica tudo mais gostoso, biscoito Treloso. Menino treloso quer comer biscoito, biscoito Treloso só Vitarella tem. (Jingle do biscoito Treloso criado pela Agência Ampla).

, que tornam a propaganda mais divertida e atrativa. O jingle fica na cabeça das crianças e

no ato da compra elas se lembram do produto.

4 Jingle – Palavra de origem inglesa que significa: mensagem publicitária musicalizada.

Page 29: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

29

Fig. 07 – Propaganda do biscoito Treloso.

2.2.2 Tendências de crescimento no mercado de produtos infantis

O censo de 2010, feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),

constatou que crianças de 0 a 14 anos representam 24,1% da população do país, algo em torno de

46 milhões. Deste grupo, 79% vivem nos centros urbanos, mais próximos dos bens de consumo

industrializado. Observando esses dados, é visto que as crianças representam um público

consumidor muito significativo.

Segundo pesquisa realizada pela Kiddos (estudo que visa conhecer os hábitos e atitudes

de crianças entro 4 e 11 anos dos países da América Latina) o poder de compra das crianças nas

famílias de classes A, B e C, de 6 a 11 anos, é de 88% referente à produtos alimentícios infantil,

50% à comida em geral, 23% à destino de férias da família, 19% à escolha de DVD´s, 17% à TV,

11% à escolha da marca do carro que os pais devem comprar, 9% à preferência do fornecedor de

internet, 9% referente à software e, por fim, 8% escolhem o computador que desejam.

(CAMPELO, 2009, p. 04)

A agência de publicidade Young & Rubican, constatou que as crianças, na faixa etária entre 0 a 14 anos, movimentam R$ 1,3 bilhão por ano (cerca de 0,3% do PIB brasileiro) em mesadas administradas por elas mesmas, consumindo pequenos objetos e lazer (SAMPAIO, 2000: 152-153).

A criança agora é vista como consumidora ativa, e não mais como dependente de um

adulto, agora ela é cliente que opina, exige, influencia, escolhe e consome. É um grupo que há

pouco tempo atrás não tinha sua força de consumidor reconhecida, mais atualmente é um dos

principais alvos da indústria do consumo.

Page 30: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

30

A criança brasileira “representa um mercado de consumo respeitável, sendo as crianças

decisoras para grande parte das compras e influenciadora para outro tanto”. (GADE, 1998, p.

185)

Page 31: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

31

3. PUBLICIDADE

3.1 A publicidade como linguagem da sedução

A publicidade sempre foi vista como manipuladora, no sentido ruim da palavra, a fim de

convencer todos a consumirem um determinado produto/serviço. Utilizando em seus discursos

palavras com “poderes mágicos” para fazer qualquer um mudar de ideia e opinião. Não que isso

seja algo falso, mas é sempre visto como algo ruim, maquiavélico, quando, na realidade, a

publicidade se utiliza desses recursos como qualquer outra forma de discurso, esse tipo de técnica

e manipulação é utilizado por todos em suas mais diversas finalidades.

Devemos considerar que, na realidade, a linguagem publicitária usa recursos estilísticos e argumentativos da linguagem cotidiana, ela própria volta para informar e manipular. Falar é argumentar, é tentar impor. O mesmo se pode dizer da linguagem jornalística, dos discursos políticos (sobretudo em época eleitoral), da linguagem dos tribunais (com defesas e acusações apaixonadas) e até do discurso amoroso. Em todos esses casos, há uma base informativa que, manipulada, serve aos objetos do emissor. (CARVALHO, 2004, p. 09).

Conforme Carvalho, falar é argumentar, é tentar impor, então por que ver a linguagem

publicitária como algo funesto, quando a manipulação é algo tão corriqueiro, utilizada por todos?

O método da argumentação vai desde uma defesa em um tribunal de justiça, onde os advogados

usam todo o seu poder de persuasão para convencer o júri da inocência do réu, até um simples

pedido de favor, onde também é utilizada a persuasão na sua forma de convencer/manipular o

outro, a fim de que o mesmo atenda ao seu pedido.

A publicidade tem a soberania de transformar um simples objeto em algo indispensável na

sua vida. Ela transforma simples perfumes em porções do amor, achocolatados em pura diversão

e um tênis em uma vida longa e saudável. A palavra deixa de ser meramente informativa, e é

escolhida em função da sua força persuasiva, clara ou dissimulada. (CARVALHO, 2004, p. 14)

Com a função de gerar um desejo no receptor a propaganda se utiliza de vocábulos que

despertem anseios e que seduzam, mas ao mesmo tempo seja despóticos o que é diferente da

linguagem utilizada no dia a dia, onde se minimiza pedidos e autoritarismos.

A mensagem quer persuadir o receptor a realizar uma ação predeterminada e para isso usa uma linguagem autoritária, na qual se destaca o uso do modo verbal imperativo. Fora do âmbito da publicidade, no cotidiano, a ordem “faça isso” é pouco usada, preferindo-se as formas eufemísticas: “ Por favor, quer me passar o sal?.” ( CARVALHO, 2004, p. 13)

Page 32: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

32

Fig. 08 – Propaganda do Chocolate Baton da marca Garoto.

3.2 Propaganda como ferramenta do marketing

Marketing é um conjunto de atividades desenvolvidas com o objetivo de atender as

necessidades dos clientes ao mesmo tempo em que atende aos interesses da empresa. Kotler

(2000, p.30) define marketing como “o processo social por meio do qual pessoas e grupos de

pessoas obtêm aquilo de que necessitam e o que desejam com a criação, oferta e livre negociação

de produtos e serviços de valor com os outros.”

Sant’Anna (2003, p. 17) explica que o marketing abrange todas as etapas, desde a

concepção física do produto, passando por sua distribuição e comunicação, até o contato com o

consumidor final, conhecendo o que o consumidor necessita e qual a proporção dessa demanda

no mercado.

Analisando Kotler e Sant’Anna, nota-se, que o marketing é um gerador de necessidades.

Ele tem a função de criar sempre ações que encantem e mantenham encantados os clientes,

fazendo com que os mesmos sintam necessidade de consumir o produto ou serviço.

E, analisando as necessidades humanas, temos a pirâmide de Maslow que faz uma

hierarquia dessas necessidades.

Page 33: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

33

Figura 09: Pirâmide de Maslow

Na base da pirâmide ficam as necessidades fisiológicas, que são primordiais para a

existência humana, após, vem a necessidade de segurança, depois a necessidade de amor, em

seguida de estima e por fim a de realização pessoal.

De acordo com essa teoria, a base da pirâmide seria então as mais importantes, que as

pessoas tendem a realizar primeiro e só depois é que vão satisfazendo as próximas necessidades.

Dessa forma, as necessidades do topo só serão atendidas após a realização das necessidades da

base. (KOTLER, 1991, 220)

Analisando essas necessidades, o marketing vem para supri-las, para satisfazê-las. E uma

necessidade não satisfeita gera uma motivação (KARSAKLIAN, 2000, p 11).

Com essas necessidades não realizadas, os indivíduos tendem a comprar cada vez mais,

para tentar fazer com que esse sentimento de algo vazio acabe e para preencher essa lacuna as

pessoas acabam consumindo numa quantidade cada vez maior.

E é justamente aí que o Marketing entra, fazendo o indivíduo perceber que necessita de

algo e ao mesmo não preenchendo esse “vazio” por inteiro, tentando sempre gerar uma

necessidade de querer mais.

3.3 Perspectivas e tendências mercadológicas para o público infantil

Page 34: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

34

As atuais estratégias de marketing e publicidade tem se embasado no conceito de

segmentação, personalização. As pesquisas realizadas para conhecer o público que consome o

seu produto estão identificando desde estilo de vida até hábitos bastante particulares.

Essa segmentação de mercado pode ocorrer de diversas maneiras, entre elas a

segmentação por idade ou fases da vida. Devido a essa extrema segmentação, hoje em dia, o

mercado está se mostrando mais preocupado e interessado em públicos que até recentemente não

despertavam curiosidade científica, um bom exemplo disso é o público-alvo criança.

Ao observar o quanto esse público é rentável, as empresas estão olhando mais para ele e

investindo cada vez mais em propaganda5

Antes as propagandas de artigos infantis eram voltadas para os pais, mas entre as décadas

de 70 e 80, as propagandas destes produtos se voltaram também para as crianças, utilizando

elementos lúdicos e, algumas vezes, personagens conhecidos pelo público.

.

Fig.10 – Propaganda voltada para os pais

5 Infância e Consumo: estudos no campo da comunicação; ANDI ; Instituto Alana

Page 35: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

35

Figura 11 – Propaganda voltada para criança

3.4 A influência da propaganda sobre o consumo infantil.

As propagandas voltadas para as crianças, são feitas, muitas vezes, por apresentadores de

programas infantis e personagens de desenhos animados, assim, os pequenos não sabem

diferenciar o que é mostrado no anúncio e o programa que costumam assistir, não distinguindo o

que é real do que é fantasioso.

Page 36: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

36

Figura 12: Maísa, apresentadora de programa infantil.

Essa influencia é tão forte que o Conselho Nacional de Auto-regulamentação Publicitária

(Conar) informa que nas propagandas alimentícias infantis não devem ter nenhum estimulo

imperativo de compra e de consumo6. Segundo Isabella Henriques, da ONG Crianças e

Consumo, o Conar é ótimo, mas deve haver regulamentação do Estado7

Segundo uma pesquisa do Ibope feita em 2009 as crianças até os 11 anos assistem muita

propaganda, diariamente ficam em média 6 horas diante da televisão, e é justamente nos horários

dos programas infantis que as propagandas para esse público mais aparecem. Assim, é sabido

que, as crianças ainda não estão preparadas para lidar com todo esse apelo gerado pela

publicidade, elas não têm a capacidade de discernimento de um adulto, elas sempre percebem

pelo lado emocional e ainda não têm juízo crítico formado.

.

No Brasil, considerando os meios de comunicação, a televisão é a que obtém maior investimento

publicitário. Segundo o Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (IBOPE), no primeiro

semestre de 2009, este meio de comunicação teve uma participação de 50% dos investimentos,

comparado a jornais, revistas, rádios. Outdoors e TV por assinatura. Considerando o investimento

publicitário por setores econômicos, em 2009 o ramo de alimentação investiu cerca de um milhão

e meio de reais somente em publicidade. Reforçando esses dados, pesquisas sobre propagandas

veiculadas na TV apontam que, em média, 22% são de gêneros alimentícios.

6 http://www.conar.org.br/ acessado dia 10/04/10 às 15:00

7 http://www.alana.org.br/CriancaConsumo/Home.aspx acessado dia 18/02/10 às 19:30

Page 37: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

37

Estimativas extra-oficiais registraram para o ano de 1997 um gasto de cerca de 9 bilhões

de dólares com roupas, brinquedos, calçados e alimentos para o seguimento das crianças. 30 %

do faturamento do setor de vestuário devem-se ao público infantil – o equivalente a 6,67 bilhões

de reais. Os calçados infantis foram responsáveis, ainda em 1997, por uma movimentação de 500

bilhões de reais (FERNANDES, 1997).

Hoje, a cifra final que representa o tamanho do mercado infantil no Brasil é a de mais de

57 bilhões de dólares por ano8

Dados coletados por meio de entrevista comprovam que as crianças assistem à TV em

diferentes horários do dia em companhia de algum adulto, todas as crianças citaram desenhos

animados como a modalidade preferida da programação e, de forma unânime, relataram ter

vontade de comprar algum objeto, alimento, roupa ou brinquedo que aparece na TV (ARAÚJO,

2006). Por isso, que existe um maior numero de inserção de campanhas para crianças nos

horários dos programas infantis.

. Este número demonstra a importância da criança no contexto

econômico nacional. Com isso, o mercado infantil tem atraído cada vez mais a atenção das

empresas, que percebem neste novo nicho a oportunidade de trabalhá-lo de maneira mais

apropriada, extraindo, assim, melhores resultados.

Refletindo acerca da influência da propaganda sobre as culturas das infâncias, advertindo

que os comerciais de produtos pensados para entreter crianças esforçam-se em criar uma

realidade onde tudo possa ser comprado, consumido e rapidamente descartado sem

consequências.

As crianças têm acesso a, pelo menos, um aparelho de TV no ambiente familiar. (

CARLSSON e FEILITZEN, 1999, p.19) (Esse dado afirma a marcante presença da televisão no

cotidiano da infância e sugere mudanças significativas nas formas de socialização e de acesso ao

conhecimento entre as crianças.

A TV gera fantasias nas crianças e elas, imitando, têm distúrbios tantos físicos como

psíquicos: ansiedade, frustração e agressividade; a TV exerce fascínio, tal que as mães

aproveitam a ocasião para colocar comida em suas bocas, algo que não iriam fazer

espontaneamente; a TV funciona, portanto, como um anestésico, tal a passividade que gera tal a

falta de discernimento que provoca.

8 http://www.ibope.com.br acessado dia 15/04/10 às 20:35

Page 38: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

38

Um exemplo de uma criança modelo é Cinthya Rachel, da década de 80, que trabalhou com exclusividade para os anúncios do suco Tang, por onde ela passava era chamada de “tanguinha”. Essa história trouxe algumas dores de cabeça para seus pais: “Não existe uma amiguinha dela que venha aqui em casa e saia sem querer um pacotinho de refresco. E no aniversario dela, dia 17 de junho, os refrigerantes nem precisaram ser abertos, porque as crianças exigiam Tang” (GIACOMINI, 1991, p. 58).

Ana Maria Crippa argumenta que a fonte de maior credibilidade para a criança é outra

criança da mesma idade e parecida com ela no anuncio do produto (GIACOMINI, 1991, p.26).

Como exemplo disso, tem-se a propaganda do chocolate Batom em que a criança usava o slogan

com verbo no imperativo “Compre Batom” para influenciar as outras a comprarem o chocolate.

Há programas infantis recheados de propaganda oculta, como as aparições de guloseimas

durante toda a programação, exercendo assim, um tremendo atrativo e envolvimento total das

crianças. Encantada, ela não terá chance de filtrar esta ação e, compulsoriamente, pedirá que

comprem aquilo que seus heróis ou ídolos comem ou bebem; a situação ainda é mais grave

quando se sabe que tais programas têm penetração em milhões de lares de classes sociais mais

baixas, cujos pais não têm poder aquisitivo para atender a tais pedidos, aprofundando a ansiedade

e a frustração da criança.

Como exemplo, pode ser citado o caso da Kellogg’s. Esta empresa usava apelos

imperativos e personagens lúdicos nas campanhas publicitárias, abusando da inexperiência das

crianças, oferecendo jogos e brinquedos com os produtos e dessa forma estimulava a obesidade

infantil.

A criança é, no Brasil, a soberana do lar. Sua participação nas decisões da casa tem sido crescente e proporcional ao “abandono” dos pais, abandono este representado pela priorização do trabalho a fim de aumentar a renda familiar, pelas atividades externas para um melhor relacionamento social, relegando as crianças à televisão. Neste contexto, os pais sentem-se obrigados a ressarci-la pelo abandono, cedendo com facilidade a seus pedidos e desejos, entre eles o de comprar e possuir (GIACOMINI, 1991 p. 54).

As crianças são agentes passivos das táticas comerciais, assim, não reagem aos

desmandos de empresários obcecados pelo lucro, apenas pede para comprar aquilo que se dirige a

ela e tem ansiedade por aquilo que ainda não possui. Nos supermercados, muitas vezes, as

crianças interferem na hora da decisão da compra. Assim, elas formam três mercados diferentes.

Mercado primário: as crianças gastam muito em seus desejos e compras. Elas gastam a mesada

que ganham dos pais em guloseimas. Mercado de influência: elas influenciam a decisão dos pais

na hora da compra. Mas essa submissão depende da família. Os estilos dos pais variam do

permissivo ao restritivo e também em termos da quantidade de responsabilidade destinada ás

Page 39: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

39

crianças nas decisões. Para decidir na hora de comprar um produto, elas usam táticas como, falar

que tinham visto o produto na televisão, dizer que um irmão ou amigo já o possui, colocar o

objeto diretamente dentro do carrinho de supermercado e continuar a pedir – um comportamento

frequentemente “persuasivo”. Mercado futuro: as crianças têm um modo de crescer e se tornar

adultos, e os profissionais de marketing inteligentes tentam selar a lealdade à marca em uma

idade precoce (SOLOMON, 2002 p. 293).

As crianças maiores adquirem a habilidade de consumo através dos amigos e professores. Por

exemplo, as crianças conversam com eles sobre produtos, e essa tendência aumenta com a idade.

Para crianças pequenas, porém, as duas fontes primárias de socialização são, sobretudo, a família

e a mídia.

O processo de socialização do consumidor começa com os bebês, que acompanham seus pais às lojas, onde são expostos os estímulos de marketing. Nos primeiros dois anos as crianças começam a pedir objetos desejados. Á medida que aprendem a caminhar, elas também passam a fazer suas próprias seleções quando estão nas lojas. Por volta dos cinco anos, a maioria das crianças faz compras com a ajuda dos pais avós e, aos oito, fazem compras independentes e tornam-se consumidores habilitados (SOLOMON, 2002, p. 295).

Avaliar a compreensão de crianças pequenas é especialmente difícil porque os pré-

escolares não são muito bons em respostas verbais. Um modo de contornar esse problema é

mostrar às crianças gravuras de outras crianças em diferentes cenários e pedir-lhes que apontem

para o desenho que corresponde ao que um comercial está querendo que façam. O problema com

o processamento de comerciais pelas crianças foi exacerbado quanto à programação de TV, que

em essência, expõe brinquedos, alimentos. Esse formato tem sido alvo de muitas críticas, pois

torna indefinidos os limites entre programação e comerciais. Vários grupos de pais colocam

objeções a tais programas.

Page 40: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

40

4. A PROPAGANDA E A LEI

4.1 A obesidade infantil.

A obesidade no Brasil vem crescendo cada vez mais rápida e apresentando dados

alarmantes, com uma alimentação menos saudável os números de obesos crescem a cada dia. Um

estudo feito pelo Ministério da Saúde mostra que o brasileiro está cada vez mais obeso e com a

alimentação menos balanceada. Essa pesquisa aponta que 48,1% da população brasileira está

acima do peso e 15% são obesos. Na última medição, há cinco anos, a proporção era de 42,7%

para sobrepeso e 11,4% para obesidade9.

Obesidade já foi considerada algo belo, e antigamente era comum ver pessoas acima do

peso retratada em pinturas e esculturas. Demonstrando o padrão de beleza da época, onde era

difícil imaginar as doenças que a mesma poderia causar.

Com a análise desses dados, verifica-se que o país que

antes era afetado pela da desnutrição ultrapassou esse problema e foi para o outro que é a

obesidade.

A obesidade já foi considerada um sinônimo de fartura, beleza, e é possível encontrarmos na literatura de estudiosos da arte como Wolfflin (2000) figuras, descrições, pinturas e esculturas de mulheres obesas ao lado de famílias e crianças também obesas. Esculturas pré-históricas egípcias e gregas apontam mulheres de seios fartos, braços robustos, pernas e abdomens volumosos. (FREITAS, 2009, p. 22).

Fernando Botero, pintor e escultor colombiano do século XX, conhecido pela criação do

volume em suas obras, onde, expandia as figuras e comprimia os espaços em torno das mesmas é

um excelente exemplo de artista que produziam essas artes onde eram retratadas pessoas mais

volumosas.

9 http://www.planetauniversitario.com/index.php?option=com_content&view=article&id=21632:pesquisa-mostra-aumento-da-obesidade-no-brasil&catid=56:ciia-e-tecnologia&Itemid=75 acessado dia 09/05/11 às 22:40

Page 41: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

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Fig. 12 - Pintura de Fernando Botero.

É possível ver que o conceito de beleza mudou muito ao longo dos anos, o que era belo

antigamente não se encaixa nos padrões de belezas existentes atualmente, onde predominam a

magreza quase doentia, que contrasta com os números cada vez maiores de obesos existentes.

A preocupação em torno da obesidade se torna ainda maior quando se fala em obesidade

infantil, que já está sendo considerada uma epidemia, segundo Cecília Oliveira, nutricionista e

doutoranda em Ciências Aplicadas a Pediatria10

O que se pode perceber é que os hábitos alimentares das crianças estão ficando cada vez

piores e com o bombardeamento das propagandas de alimentos influenciando mais esse consumo

é que nota-se que a saúde infantil está ameaçada pelas doenças derivadas da obesidade.

, a obesidade infantil vem aumentando cada vez

mais rápido nas últimas décadas. Isso é muito preocupante, pois doenças que costumavam

aparecer apenas em adultos estão cada vez mais frequentes nas faixas etárias mais novas.

Para que a o conceito de obesidade fosse algo universal a OMS (Organização Mundial da

Saúde) criou o IMC (Índice de Massa Corporal) com o intuito de ser usado como medida

internacional para o excesso de peso11

Obtém-se o IMC dividindo o peso pelo quadrado da altura. Com o resultado é possível

saber se a pessoa está abaixo do peso, peso normal, sobrepeso, obesidade grau I, obesidade grau

II ou obesidade Mórbida.

.

10 www.efdeportes.com/efd95/desnutri.html acessado dia 30/05/11 às 13:04

11 Site da OMS: http://portal.saude.gov.br/portal/saude/default.cfm acessado dia: 15/05/11 às 20:00

Page 42: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

42

Figura 13: Tabela IMC (Índice de massa corporal).

Por exemplo, uma criança com 55 kg e com 1,35 de altura: 55/ 1,35² = 30,17. O IMC

dessa criança é 30,17 isso quer dizer que a mesma possui obesidade de grau I.

As consequências derivadas da obesidade são inúmeras, tanto com relação à saúde quanto

psicológicas. As doenças mais comuns derivadas da obesidade são: Diabetes, hipertensão,

aumento do colesterol, varizes, gota, doenças cardiovasculares, entre outras.12

Tendo em vista os males que a obesidade pode causar, alguns projetos e algumas ONGs já

começaram campanhas contra essa doença. A

Active Life Movement

, que é uma organização que

visa mudar os hábitos de consumo de fast food dos americanos, fez alguns anúncios para tentar

incentivá-los a prática de esportes.

Figura 14: campanha da agência Latinworks de Austin (EUA) para Active Life Movement 12

. (Superman)

http://www.gastronet.com.br/endocrin.htm acessado dia 15/05/11 às 15:10

Page 43: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

43

Figura 15: campanha da agência Latinworks de Austin (EUA) para Active Life Movement

. (Barbie)

O Instituto Alana é outro exemplo. Ele possui o Projeto Criança e Consumo que tenta

despertar a consciência crítica da sociedade acerca da prática de consumo por crianças e

adolescentes.

4.2 Regulamentação da propaganda para a criança

A influência da propaganda é tão grande que, a rigor, a legislação brasileira já proíbe a

publicidade direcionada ao público de até 12 anos. Justamente por que a criança não consegue

entender o comercial “ao pé da letra”.

Ao verem um comercial na TV, as crianças com até 3 anos de idade não fazem distinção

entre programação e comercial (somente a partir dos 5 anos é que a criança começa a ter noção

do mundo em que vive), pois ficam anestesiados diante de tanta informação misturada com

fantasia. (CAMPELO, 2009, p.06). Elas não conseguem assimilar o caráter persuasivo da

publicidade, uma vez que tem interpretações muito literais, se no comercial é falado que certo

brinquedo é o mais bonito do mundo, a criança simplesmente entende que esse brinquedo é

realmente o mais bonito do mundo. Não compreendem que as pessoas que estão atuando na

propaganda são atores pagos para isso e pensam que eles estão realmente falando a verdade

Page 44: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

44

quando dizem que consome determinado produto e que o mesmo é o mais saboroso que já

experimentaram.

Nas propagandas, são utilizados apresentadores de programas infantis, personagens de

desenhos animados, cantores, atores mirins, etc. Assim, as crianças não sabem diferenciar o que é

mostrado no anúncio, dos programas que costumam assistir, não distinguindo o que é real do que

é fantasioso, a percepção delas em relação aos personagens usado nas propagandas é de que eles

são pessoas reais. Logo a mensagem é recebida pela criança de modo subliminar violando o

Código de Defesa do Consumidor e o CONAR.

A Seção 11, Art. 37°, letra “e”, “f” e “g”, do Código Brasileiro de Auto-regulamentação

Publicitária, descreve o seguinte:

“Art. 37° – Este artigo condena qualquer tipo de anúncio que exerça um apelo interativo

de consumo diretamente à criança. E mais:

I – Os anúncios deverão refletir cuidados especiais em relação à segurança e às boas maneiras

e, ainda, abster-se de:

e) não se permitirá que a influência do menor, estimulada pelo anúncio, leve-o a constranger

seus responsáveis ou importunar terceiros ou o arraste a uma posição socialmente condenável;

f) empregar crianças e adolescentes como modelos para vocalizar apelo direto, recomendação

ou sugestão de uso ou consumo, admitida, entretanto, a participação deles nas demonstrações

pertinentes de serviço ou produto;

g) qualquer situação publicitária que envolva a presença de menores deve ter a segurança como

primeira preocupação e as boas maneiras como segunda preocupação (Ibidem).”

Preceitos básicos que definem a ética publicitária, segundo informações contidas no site

do CONAR: a) Todo anúncio deve ser honesto e verdadeiro e respeitar as leis do país. b) Deve

ser preparado com o devido senso de responsabilidade social, evitando acentuar diferenciações

sociais. c) Deve ter presente a responsabilidade da cadeia de produção junto ao consumidor,

-Deve respeitar o princípio da leal concorrência e deve respeitar a atividade publicitária e não

desmerecer a confiança do público nos serviços que a publicidade presta.

A deputada federal Maria do Carmo Lara (PT – MG) foi indicada, na Comissão de Defesa

do Consumidor, como relatora do Projeto de Lei n° 5.921, de 2001, do deputado Luiz Carlos

Hauly (PSDB – PR). A proposta inicial era de acrescentar ao aritgo 37 do Código de Defesa do

Page 45: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

45

Consumidor, mais um parágrafo: “É também proibida à publicidade à destinada a promover à

venda de produtos infantis, assim considerados aqueles destinados apenas à criança”.

Em entrevista ao site Agrosoft, Isabela Henriques coordenadora-geral do projeto Criança

e Consumo, do Instituto Alana, explicou que, “a publicidade não é uma manifestação do

pensamento pura e simples. Ela está atrelada ao comércio e à economia. Não tem a ver com as

garantias fundamentais. É necessária a proteção da criança”13

Desta forma, o que mais se percebe é que de tanto influenciar as crianças a consumir os

produtos anunciados, a propaganda, está causando transtornos não só psicológicos, mas também à

saúde das mesmas.

.

13 http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2009-03-10/frente-parlamentar-quer-debate-no-congresso-sobre-regulamentacao-da-propaganda acessado dia 25/05/11 às 15:00

Page 46: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Analisando as propagandas de produtos alimentícios que são veiculadas na TV, foi visto

que a maioria dos alimentos tinha altos teores de gordura, açúcar e sal. As propagandas de

produtos alimentícios influenciam o consumo das crianças, fazendo-as querer consumir cada vez

mais esses tipos de alimentos, ao qual elas veem o tempo todo na TV.

Refletimos acerca da influência da propaganda sobre as culturas das infâncias, advertindo que os comerciais de produtos pensados para entreter crianças esforçam-se em criar uma realidade onde tudo possa ser comprado, consumido e rapidamente descartado sem consequências.(GADE, 1980, p. 113).

Essa sistemática que os comerciais voltados para o público infantil toma, comprova o

quanto que as crianças são suscetíveis às influências externas, sendo induzidas facilmente ao

desejo de possuir um determinado produto que viu na televisão.

Dia a dia nega-se as crianças o direito de ser criança. Os fatos que zombam desse direito, ostentam seus ensinamentos na vida cotidiana. O mundo trata os meninos ricos como se fossem dinheiro, para que se acostumem a atuar como o dinheiro atua. O mundo trata os meninos pobres como se fossem lixo, para que se transformam em lixo. E os do meio, os que não são ricos, nem pobres, conserva-os atados a mesa do televisor, para que aceitem desde cedo, como destino, a vida prisioneira. Muita magia e muita sorte que tem as crianças que conseguem ser crianças (CORTEZ, 2005, v. 26, p.117).

Dependendo das características de personalidade da criança bem como de suas

experiências diárias, a mídia pode satisfazer necessidades diferentes e também se constituir em

uma forma de violência simbólica que permeia o imaginário social, com signos e símbolos

associados a personagens, marcas e produtos, que passam a ser adquiridos ou utilizados como

modelos para obtenção de um status ou identidade e senso de pertencimento ao grupo.

O senso cognitivo da criança é constituído por uma mistura entre o real e o fantasioso,

elas não só assistem a propaganda, também se divertem com ela. Os pequenos, demonstram que

são, na sua maioria, receptores irrequietos, que interage com o que os atrai e ignora o que não é

interessante para eles. Com isso é percebido que o público mirim, é um telespectador exigente.

No caso da propaganda, a criança interage com o comercial que faz parte do seu mundo, no caso

produtos infantis, e se dispersa facilmente com a mensagem publicitária que não o atrai.

(

Em uma propaganda, a seleção vocabular é essencial para promover o produto, e isso se faz através da linguagem popular cotidiana, pelo uso de recursos lingüísticos como as metáforas, os trocadilhos, as rimas, o humor, entre outros. As palavras são geralmente

LAURINDO; LEAL, 2008, p. 154-155).

Page 47: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

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colocadas de forma estratégica no texto publicitário, pois o sentido que se deseja transmitir nesse discurso deve ser sempre bem claro e objetivo, adequando-se ao público com que se está comunicando (SILVA, 2007, p. 45).

A própria linguagem publicitária é totalmente trabalhada para atingir seu público alvo, no

caso das propagandas infantis, elas tem o propósito de encantar as crianças e fazer com que elas

não se dispersem enquanto assistem ao comercial. A linguagem publicitária se utiliza de algumas

estratégias para que esse “encantamento” seja mais duradouro e eficaz, isso vai desde o uso de

personagens para transmitir a mensagem a informações curtas, que são absorvidas mais

facilmente pelas crianças. Entretanto, ritmos lentos, discursos maçantes e autoritários, atitude

professoral (“eu sei e você não sabe”), falta de originalidade faz com que elas neguem e rejeitem

a propaganda.

No Brasil, as crianças passam, diariamente, mais de 5 horas diante da televisão, e é

justamente nos horários dos programas infantis que as propagandas para esse público mais

aparecem. Percebe-se que as crianças ainda não estão preparadas para lidar com todo esse apelo

gerado pela publicidade. Elas não têm a capacidade de discernimento de um adulto, ou seja, elas

sempre percebem pelo lado emocional e ainda não têm o juízo crítico formado.

Isto demonstra a importância da criança no contexto econômico nacional. O mercado

infantil tem atraído cada vez mais a atenção das empresas, que percebem neste novo nicho a

oportunidade de trabalhá-lo de maneira mais apropriada, extraindo, assim, melhores resultados.

Analisando todos os pontos abordados neste trabalho, pode-se concluir que as crianças

são fortemente influenciadas pelas propagandas de alimentos, e que essa influencia pode causar

danos tanto psicológicos quanto físicos.

Page 48: A influência da propaganda de produtos alimentícios sobre o consumo das crianças.

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