A Guerra dos Fae vol 3
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A Guerr a dos Fae
l i v r o t r ê s
L u z e T r e va s
tradução:
C h i c o Lop e s
elle casey
Capítulo 1
A mão de Tony, meu melhor amigo, pousou sobre meu ombro,
apaziguando meu coração – o que não era pouca coisa, considerando
que nesse momento em particular eu estava presa em uma batalha po-
tencialmente épica com ninguém menos que Ben, o Fae das Trevas, de-
mônio de fogo que agora parecia uma criatura saída direto das profun-
dezas do inferno. Tony ter dito que queria ir comigo e que não tínhamos
mais que icar separados era a melhor notícia que eu recebia em dois
meses, desde que eu me transformara de humana em fae. Agora, tudo
que eu tinha que fazer era descobrir como lidar com o terror lamejante
parado à minha frente com uma bomba de fogo nas mãos.
– Ben, ele não quer ir com você! Ele vem comigo!
Pensei que o rugido de nossos poderes opostos tornaria difícil ou-
vir, mas aparentemente não havia razões para eu gritar, pois Ben me
respondeu em um tom de voz perfeitamente normal, e eu o entendi sem
problemas.
– Eu o ouvi. Mas não acho que ele tenha todas as informações ne-
cessárias para tomar uma decisão. É justo que ele entre nessa sabendo
de tudo, não acha?
Ele arqueou as sobrancelhas para mim com um ar condescendente,
fazendo que eu me sentisse pequena e estúpida. Eu detestava me sentir
pequena e estúpida, e detestava ainda mais quando era Ben que me fazia
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sentir assim. A resposta dele também era preocupante, porque eu não
queria que Tony achasse que eu estava escondendo alguma coisa. Eu sa-
bia a verdade, e já a havia dito a Tony antes de Ben aparecer. Nós éramos
os bonzinhos, os Fae da Luz; Ben representava os malvados, os Fae das
Trevas. Não havia mais o que dizer, de verdade.
Era óbvio que esse Ben sabia um pouco de combate psicológico.
Provavelmente ele mesmo havia inventado o termo, uns cem anos
atrás ou algo assim. Não se consegue dizer a idade de um fae só de
olhar para ele. Por fora, ele era um humano sério e terrivelmente bo-
nito de dezoito anos. Por dentro, devia ter uns trezentos e cinquenta
anos, horroroso como um fae serpente, usando um feitiço para me
fazer acreditar que ele era a gostosura em pessoa. Eu nem sabia se
existia um fae serpente, mas ele poderia ser um. Ele certamente era
escorregadio.
Sacudi a cabeça, forçando-me a parar de pensar na aparência dele.
Tinha certeza de que a regra que eu tinha para garotos humanos se apli-
cava para os fae também – ou seja, quanto mais bonitos eles forem, pior
tratarão as garotas e mais supericiais serão. Que garoto vai desenvolver
uma personalidade decente se todo o mundo simplesmente lhe dá tudo
que ele quer só porque é lindo? Foco, Jayne. Tenho que ignorar esse ros-
to bonito... Concentrar-me na escuridão de sua alma e no quanto eu o
desprezo por tentar roubar Tony de mim.
– Tony sabe de tudo. Eu já havia lhe contado antes de você chegar;
aliás, sem ser convidado ou desejado, devo acrescentar.
Ben parou de me encarar e se voltou para Tony.
– Ela lhe contou que vai forçá-lo a lutar na guerra? Que você vai ter
que matar gente?
Senti a mão de Tony abandonar meu ombro, o que me deixou ins-
tantaneamente preocupada. Eu havia acabado de passar os últimos
trinta minutos convencendo Tony de que ele tinha que ir comigo e que
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tudo ia icar bem. Mas sabia que ele não gostava da ideia de violência, e
aparentemente Ben também não.
– Tony sabe o suiciente para tomar uma boa decisão, coisa que ele já
fez. Então, por que você não dá o fora daqui para podermos seguir nosso
caminho?
– Humm, Jayne... – a voz assustada de Tony surgiu atrás de mim –,
eu... eu não quero fazer parte da guerra...
Sua voz foi se apagando até desaparecer, mas eu sabia o que isso sig-
niicava. Eu tinha que fazer algo para remediar a situação o melhor que
pudesse – e rápido. Fixei em Ben o olhar mais raivoso que meu medo
me permitia.
– Diminua o poder, babaca, assim poderemos falar sobre isso sem
explodir a vizinhança.
– Eu diminuo se você diminuir.
Ele levantou as sobrancelhas de novo, dessa vez com ar desaiador.
Cara, ele é mesmo bom com esse negócio da sobrancelha.
Relaxei um pouco meu domínio sobre O Verde, informando-lhe que
queria que ele voltasse pela fronteira dos mundos embaixo da casa de
Tony e fosse para dentro da Terra, onde descansava, antes que eu o cha-
masse para cima e o usasse para fazer minhas vontades. O brilho verme-
lho que se juntava aos poucos nas mãos de Tony se dissipou a princípio
por seus braços, e depois por todo o seu corpo. Logo estávamos ambos pa-
rados ali, parecendo adolescentes normais de novo. Nada mais de brilho.
Nada de barulho ou de agitação. Dei uma olhada para os garotos ao meu
lado – Finn, Jared, Spike e Chase. Todos haviam visivelmente relaxado
suas posturas de combate, mas ainda estavam apreensivos.
– Eu não conio nele – disse Finn.
– Nem eu – acrescentou Spike.
Chase permaneceu em silêncio – como sempre – segurando
meu amigo pixie, Tim, que jazia machucado, uma vez que Ben o havia
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praticamente fritado no ar com um raio de fogo. Meu outro amigo,
Jared, um demônio, também estava em silêncio. Mesmo assim, eu sabia
que eles não coniavam mais em Ben do que eu.
– Bom, eu conio – disse Tony.
Eu olhei para ele, frustrada.
– Droga, Tony, mas o que é que... Achei que já havíamos supe-
rado isso.
– Sim, você está certa, já superamos. Não estou dizendo que vou a
algum lugar com ele ou que não vou com você. Só digo que conio nele.
Ele foi legal comigo, Jayne, e nunca fez nada para me machucar. E, apa-
rentemente, ele poderia, se quisesse.
Ele olhou para Ben, dando um sorriso nervoso.
Isso era tão típico de Tony: dar a alguém o benefício da dúvida, mes-
mo que fosse um maldito imbecil que fritava pixies.
– Ouça, Tony, entendo que você se sentiu abandonado quando eu
iquei na loresta e você teve que voltar para cá...
Tony foi me interromper, mas como eu sabia bem o que ele ia dizer,
levantei a mão para que ele se calasse.
– E sei que você não se lembra de ter estado lá, mas estava, e eu ica-
rei feliz de lhe provar isso quando voltarmos. Mas temos que ir. – Olhei
para Ben. – Você pode coniar nele, mas nós não pensamos o mesmo; e
temos um amigo que precisa de cuidados – apontei com a cabeça para
Tim, caído nas mãos de Chase com os restos de uma asa carbonizada
despontando da lateral de seu corpo.
– Ele está respirando – disse Chase.
– Bom, por sorte ele está inconsciente, porque sei bem que ter uma
asa arrancada é doloroso; certamente tê-la queimada é excruciante.
Lancei a Ben um olhar que mostrava exatamente quão repulsivo eu
o achava.
Tony olhou para Tim, e sua expressão assumiu um ar enojado.
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Ben ia ignorar meu comentário, mas, então, ele viu o olhar de Tony
também.
– Tony, você tem que entender, pixies são realmente perigosos. Eles
podem parecer pequenos e foinhos, mas ele estava vindo me atacar. Eu
estava apenas me defendendo.
Tony olhou para mim, concordando, o que me deixou desconfor-
tável. Por que é que eu tinha que defender meu pequeno amigo, agora
inerte, que estava apenas tentando nos salvar?
Olhei para Ben com raiva.
– Tim, como você convenientemente esqueceu, estava apenas nos
protegendo. De você!
– Eu não era perigoso para nenhum de vocês. Não iz nada. Vocês é
que começaram com as ameaças.
Quanto mais essa conversa avançava, pior eu me sentia. De alguma
maneira, Ben estava virando tudo do avesso para fazer parecer que eu
era a vilã da situação. Eu sabia que meu rosto deixava clara minha frus-
tração, e quando olhei para ele para responder, o vi sorrindo, satisfeito.
O imbecil achava que havia me colocado em uma sinuca de bico.
– Não ique aí se fazendo de super-honesto. Você nunca contou a
Tony que era um fae, e nunca lhe revelou suas verdadeiras intenções –
olhei para Tony e continuei. – Pergunte a ele, Tony. Pergunte por que
ele não lhe contou. Você coniou em um cara que estava mentindo e es-
condendo coisas o tempo todo.
Nesse exato momento alguém bateu na porta do quarto de Tony.
– Tony? Há alguém com você no quarto?
O rosto de Tony assumiu uma expressão de pânico.
– Não, mãe! É só uma música!
– Bom, diminua, então. Já passou bastante de sua hora de dormir.
Finn deu uma risadinha, mas teve a decência de parecer desgostoso
quando olhei feio para ele. Só o que faltava era que Tony achasse que
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estávamos rindo dele. Tudo bem, a mãe dele era tola e obviamente qua-
se surda, mas isso não era culpa dele.
Sussurrei para o grupo.
– Ouçam, não vamos chegar a lugar nenhum com isso. Além do
mais, não há razão para isso. Tony vem conosco, e precisamos ir –
olhei para Tony, praticamente implorando com o olhar. – Você ainda
vem, certo?
– É, ainda vou. Mas quero ouvir o que Ben tem a dizer primeiro. Ele
é meu amigo, Jayne. Sei que você não gosta disso, mas é assim que é. Eu
devo a ele a oportunidade de me contar seu lado da história.
Ben sorriu.
– Tony é uma pessoa justa. Sempre esteve disposto a ouvir. Talvez
você pudesse perder um minuto ouvindo também, Jayne. Você pode se
surpreender com o que eu tenho a dizer.
– Pfff... improvável.
Jared deu um passo à frente com as mãos levantadas em um gesto
de paz.
– Por que não vamos lá para fora ou para algum lugar onde possamos
falar à vontade? – disse ele olhando de Ben para mim. – Um território
neutro, um lugar onde todos possam se sentir à vontade.
Ben concordou.
Olhei em volta e todo o mundo parecia pensar que essa era uma boa
ideia. Eu era mais a favor de dar o fora dali logo e não olhar para trás,
mas tinha que ser justa com Tony. Eu não queria que ele abandonasse
tudo achando que eu tinha algo a esconder.
– Certo. Onde?
– Que tal aquela lanchonete vinte e quatro horas perto da escola? –
sugeriu Tony.
Todos nós concordamos.
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Dois segundos depois, a imagem de Ben desapareceu no ar. “En-
contro vocês lá” foi a última coisa que ele disse, antes de desaparecer
em um sopro de vento e fumaça escura.
Olhei para Tony e vi que seus olhos estavam quase saltando das ór-
bitas. Eu sorri.
– E você conia nesse cara... Diabo fae, ou o que quer que ele seja.
Balancei a cabeça, andando até a janela e olhando para fora para ter
certeza de que Ben não estava mais lá. Fiquei pensando quão longe ele
conseguia ir com aquela coisa de desaparecimento esfumaçado.
– Vocês vão na frente e nos esperem lá fora. Vou ajudar Tony a ar-
rumar a mala. – Olhei para Chase: – Por favor, tenha cuidado com Tim.
Vou ver por aqui se acho alguma coisa onde possamos colocá-lo.
Chase concordou antes de seguir os outros, saindo janela afora com
cuidado enquanto eu e Tony observávamos.
Uma vez sozinhos, voltei-me para ele.
– Você vai precisar de pouca coisa, só aquilo que for indispensável.
Haverá roupas e coisas para você lá.
– Para mim, onde? – perguntou Tony sem se mover.
– No complexo. Onde nós moramos.
Tony parecia alito, mas nada disse. Peguei levemente sua mão.
– Ouça, é o seguinte: quando chegarmos lá, você vai conhecer o lugar
todo e saber o que está acontecendo, e vai ter a chance de escolher icar ou
voltar. Você já teve essa chance antes, e escolheu voltar para casa. Eu acho
que é porque você ainda não sabia de tudo na época. Agora, vou garantir que
você saiba de tudo. Tenho certeza de que quando souber, vai decidir icar.
– Então, poderei voltar caso decida que não quero ter nada a ver com
tudo isso?
Balancei a cabeça, frustrada.
– Sim. Mas, Tony, você não vai conseguir icar de fora. O fato de
Ben estar aqui é uma prova disso. De qualquer maneira você vai se
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envolver. Ou vai voluntariamente conosco, ou vai arrastado por Ben.
Você é importante para Ben por alguma razão que ele não está nos re-
velando. E é importante para mim porque é meu melhor amigo. Você
vai acabar como fae de luz ou das trevas... E eu quero que você seja de
luz, comigo.
– E quanto a Tim? Achei que ele fosse seu novo melhor amigo.
Sorri.
– Ciúmes?
Tony sorriu levemente.
– Não. Não muito.
– Bom, você não tem com que se preocupar, ninguém pode tomar o
lugar que é seu em meu coração. Mas você vai adorá-lo. E ique feliz por
não poder ouvi-lo.
– Você pode? Como?
– Um feitiço de bruxa. Eu explico depois.
– E por que eu não iria querer poder ouvi-lo?
– Digamos que pixies têm gases.
Tony pareceu enojado.
– Ah, credo.
– É. Nem me diga. Vamos lá, vamos fazer sua mala. O que você quer
levar?
Tony olhou a sua volta no quarto; foi buscar a foto de nós dois que
estava em um porta-retratos quebrado, como resultado de tê-la atirado
na parede no dia anterior. Eu o vira quebrando-o quando visitara seu
quarto, quando viajava pelo Cinza com a ajuda de meu amigo Gregale,
o elfo cinzento. Foi quando eu soube o quanto Tony estava realmente
mal. Vê-lo chorar sobre a foto e depois atirá-la na parede me deixou
arrasada por dentro.
Ele arrancou a parte quebrada do porta-retratos e tirou a foto, co-
locando-a no bolso de trás da calça enquanto jogava os restos no lixo.
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Pegou um suéter caído no chão e o vestiu rapidamente, sentando-se na
cama para colocar suas botas.
– Você tem alguma coisa onde eu possa colocar Tim?
Ele apontou para o guarda-roupa sem levantar os olhos dos cadarços.
– Ali.
Fui até o guarda-roupa e abri a porta, afastando o lixo até encontrar
uma velha caixa de sapatos. Então, fui até a cama, peguei o travesseiro
de Tony e tirei a fronha, usando-a para forrar a parte de dentro da caixa,
para icar mais confortável.
Tony se levantou e foi até a escrivaninha, tirando um papel da im-
pressora.
– Vou deixar um bilhete para meus pais.
– O que você vai dizer a eles?
– Que vou icar fora um tempo e que depois ligo.
– Diga que vai mandar um e-mail. Nós temos computadores, mas
não telefones.
Tony deu de ombros.
– Tudo bem.
Ele terminou o bilhete, dobrou o papel e o colocou sobre o traves-
seiro. Puxou os lençóis e cobertores para que a cama parecesse mais ar-
rumada. Chutou as roupas sujas para um canto do quarto onde já havia
uma pilha delas. Tony olhou em volta, jogando as mãos para cima e de-
pois deixando-as cair.
– Pronto? – perguntei. – Está com seu passaporte?
– Acho que sim... Sim, está comigo.
Ele foi até a escrivaninha e o pegou em uma gaveta, eniando-o no
bolso de trás da calça.
– Ótimo. Vamos embora.
Eu queria dar o fora dali o mais rápido possível, antes que ele mu-
dasse de ideia.
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Saímos pela janela, apoiando-nos no telhado da varanda e usando a
cerca para descer. Os outros nos esperavam no jardim da frente.
Fui até Chase e lhe mostrei a caixa.
– Coloque-o aqui.
Chase colocou Tim com cuidado dentro da caixa. Olhei para meu
pequeno companheiro, que ainda estava gelado, e o cobri o mais gentil-
mente possível com o canto da fronha.
– Aguente irme, Tim. Vamos voltar logo para que Maggie possa
ajudá-lo.
Não recebi resposta nenhuma, então tampei a caixa e usei aquele
breve momento de hesitação para me centrar e lutar contra o sentimen-
to de desespero que tomava conta de mim. Funguei, tossi, livrando-me
da massa disforme que se formava no fundo de minha garganta. Eu não
poderia participar do showzinho de Ben sentindo-me toda chorosa e
fraca. Não dava para diminuir a seriedade desse encontro. Era pela vida
de Tony que eu estava lutando. Haveria tempo para lamentar por Tim
mais tarde – quando eu estivesse com todos os meus companheiros em
um avião rumo à Floresta Verde.