A GEOMETRIA NO PRIMEIRO GRAU: EXPERIMENTAL au · cartolina, regua eesquadro, dobraduras de papel...

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A GEOMETRIA NO PRIMEIRO GRAU: EXPERIMENTAL au DEDUTIVA? Luiz Marcio Imenes FUNBEC f:omo deve ser trabalhada a geometria no primeiro g!au? Atraves de experifmcias simples com tesoura e cartolina, regua e esquadro, dobraduras de papel etc? Ou atraves da demonstra~jo de teoremas? A geometria esta ausente da maioria de nossas salas de aula. Esta ausencia e, sem duvida, seu problema principal. Entretanto, mesmo quando ela e trabalhada pelo professor de Matematica, tenho observado que, salvo exce96es, ha falhas graves na sua abordagem. Neste artigo pretendo esc/arecer esta afirma9ao e apresentar sugest6es para a supe- ra9ao daque/as fa/has. Varios sac os callinhos pelos quais se pode tentar 0 ensinar geometria. Num deles, bastante comum entre nosatl! cerca de 20 anos atras, os programas oficiais d~ Matematica davam pouca enfase a geometria a ltes do 3° ana ginasial (atual 7" serie). Nesta serie, ageometria eraentao apre- sentada na forma dedutiva. Os livros didaticos e as aulas de geometria cJaepoca, em geral, come«a- yam com os conceitos primitivos (ponto, reta, pIa- no), os primeiros postulados e axiomas, as primei- ras defin6es e, de~ois, uma sucessao de teore- mas (com enunciadc. hipotese, tese, demonstra- «aO e c.q.d. !). .u. Quarto ca80 de 'eoqruencia. dado pelo seguinte Teorema: Doi& tric1nguloa .do rongruentea, 'qVaJlNO Mm urn !ad<J, urn dngulo adjacen~ e urn dngulooposto a ts~ lado, reopeclif)Q~ iguai. (L.A.A,.) ('). Sejam 08 triAnguioo ABC e A' B'C' (fig. SO). Temoa: { BC - B'C' R Ii -Ii' T< t>ABC-t>A'B'C', A - A' (L.A.A o .) .~ .~, .A, n""ONBTRA9IO : 1. Tran.porfem08 0 triAngulo ABC sabre 0 triAngulo A'B'C', demodo Que Be coincida com 0 Bell igual B'C'. N•• condi,1les da hip6tese (B-£l'), dizemo. que A cleve coincidir com A', ou aeja, A B = A' H' e 08 dais triAngulos serAo iguais pelocaso L.A.L.; 2. Com ereito, Be nAo f6sse A B :::l< A' B', deveria ser, par e.xemplo, AB > A'B' e entao existiria urn ponto A", tal que A"B' = AB e unindo A" com C resultaris . t> A"B'C' = t> ABC (L.A.L.), .. ~, portanto: A :::a A". Como A = l' (por hip.) segue-se que: A' = A", isto ~,. um absurdo, pois, A' sendo A.nguloexterno ao .~ A"A'C' ~ maior que 0 Angulo interno nao adjscente A" - (n. o 39). Chegarfarnos 8. absurdo aoalogo, caso f6ase AB < A' 8'. Logo, AB - A'B' e t>ABC - t>A'B'C' c.q.d. "Matemat!ca --:- curso ginasia/", 3' serie, Osvaldo Sangiorgi, Companhla Edltora Naciona/, Sao Paulo, 1954.

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A GEOMETRIA NO PRIMEIRO GRAU:EXPERIMENTAL

auDEDUTIVA? Luiz Marcio Imenes

FUNBEC

f:omo deve ser trabalhada a geometria no primeirog!au? Atraves de experifmcias simples com tesoura e

cartolina, regua e esquadro, dobraduras de papel etc? Ouatraves da demonstra~jo de teoremas?

A geometria esta ausente da maioria de nossassalas de aula. Esta ausencia e, sem duvida, seuproblema principal. Entretanto, mesmo quando elae trabalhada pelo professor de Matematica, tenhoobservado que, salvo exce96es, ha falhas graves nasua abordagem. Neste artigo pretendo esc/areceresta afirma9ao e apresentar sugest6es para a supe-ra9ao daque/as fa/has.

Varios sac os callinhos pelos quais se podetentar 0 ensinar geometria. Num deles, bastantecomum entre nos atl! cerca de 20 anos atras, osprogramas oficiais d ~ Matematica davam poucaenfase a geometria a ltes do 3° ana ginasial (atual7" serie). Nesta serie, a geometria era entao apre-sentada na forma dedutiva. Os livros didaticos e asaulas de geometria cJa epoca, em geral, come«a-yam com os conceitos primitivos (ponto, reta, pIa-no), os primeiros postulados e axiomas, as primei-ras defini«6es e, de~ ois, uma sucessao de teore-mas (com enunciadc. hipotese, tese, demonstra-«aO e c.q.d. !).

.u. Quarto ca80de 'eoqruencia. € dado pelo seguinteTeorema: Doi& tric1nguloa .do rongruentea, 'qVaJlNO Mm urn

!ad<J, urn dngulo adjacen~ e urn dngulo oposto a ts~ lado,reopeclif)Q~ iguai. (L.A.A,.) (').Sejam 08 triAnguioo ABC e A' B'C' (fig. SO). Temoa:

{BC - B'C'

R Ii -Ii' T< t>ABC-t>A'B'C',A - A'

(L.A.Ao.) .• ~

.~, .A,n""ONBTRA9IO :

1. Tran.porfem08 0 triAngulo A BC sabre 0 triAnguloA'B'C', de modo Que Be coincida com 0 Bell igualB'C'. N•• condi,1les da hip6tese (B-£l'), dizemo. queA cleve coincidir com A', ou aeja, A B = A' H' e 08dais triAngulos serAo iguais pelo caso L.A.L.;

2. Com ereito, Be nAo f6sse A B :::l< A' B', deveria ser, pare.xemplo, AB > A'B' e entao existiria urn ponto A",tal que A"B' = AB e unindo A" com C resultaris

. t>A"B'C' = t> ABC (L.A.L.), ..~, portanto: A :::a A".

Como A = l' (por hip.)segue-se que: A' = A",isto ~,.um absurdo, pois, A' sendo A.nguloexterno ao.~ A"A'C' ~ maior que 0 Angulo interno nao adjscenteA" - (n.o 39). Chegarfarnos 8. absurdo aoalogo, casof6ase AB < A' 8'. Logo,

AB - A'B' e t>ABC - t>A'B'C'c.q.d.

"Matemat!ca --:- curso ginasia/", 3' serie, Osvaldo Sangiorgi,Companhla Edltora Naciona/, Sao Paulo, 1954.

Esta abordagem baseava-se, em ultima instan-cia, no modele de construc;so da geometria apre-sentado pelo geometra grego Euclides, na sua fa-mosa obra: "Os Elementos" (300 A.C.). Nso vamosdiscutir aqui os aspectos positivos e negativos des-ta abordagem. Ha razoavel consenso sobre a suainadequac;so, a nlvel de 10 grau. No Brasil e emmuitos outros palses ela foi abandonada.

o movimento de renovac;so do ensino da Mate-matica, conhecido por Matematica Moderna, pro-pos mudanc;as no ensino da geometria. Algunsautores procuraram algebriza-Ia, estudando-a veto-rialmente e dando destaque as transformac;oes noplano (translac;so, simetria, rotac;so).

Para maior comodidade. os primeiros exemplos serao dados utilizando-se ospontos de intersel;ao das linhas horizontais com as verticais.

S' ,/ ""-

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r ,,~, , p' , I I,, ,v , , , , F' ,

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A correspondencia considerada e chamada translar;iiode vetor v ou. maissimplesmente. translacao v.Ve-se. pela figura, que unindo-se. por meio de uma n!gua, cada ponto com 0seu correspondente. obtem-se figuras chamadas segmentos orientados quetem a mesma direl;ao e senti do do vetor v.

"Ensino atuallzado de Matematica ", .,. serie, Omar Catunda eoutros, Edart, 580 Paulo. 1975.

No Brasil, onde a Matematica Moderna chegouno inlcio dos anos 60, estas propostas difundiram-se pouco. Foram mais exploradas em outros pai-ses. Entre n6s, nesta fase do citado movimento, ageometria apresentada nos programas oficiais enos livros didaticos habituais sofreu poucas mu-danc;as. Com a introduc;:ao dos conjuntos, alterou-se um pouco a Iinguagem. Assim por exemplo,passou-se a usar 0 termo flguras congruentes nolugar de flguras Iguals. A mudanc;:aexplicava-se:figuras sac conjuntos de pontos e do is conjuntossac iguais se e somente se sac ambos vazios oupossue'm os mesmos elementos. Disto decorre queuma figura s6 e igual a ela mesma. Assim, porexemplo, para referir-se a duas circunferencias dis-tintas, de mesmo raio, passou-se a dizer que saccongruentes (e nao iguais). A 16glcadestas consi-derac;:oese, sem duvida, correta.

Nesta epoca da introduc;:ao dos conjuntos,houve tambem uma preocupac;:ao maior com a pre-cisao e coer€mcia dos simbolos e das representa-c;:oes.Assim, os livros didaticos passarem a usar,por exemplo, notac;oes como as do exemplo quesegue:

f--aegmento AB---iI . IA B _I -0 aeml-retaAB---- .•.

_-----aemi-reta 8,.,..4 ---i

All indica a rela determinada pelos pontos A e BiiJ indica a semi-rela determinada pelospontos A e B de origemA

BA indica a 'semi-reladbterminada pelospontos A e B de origemBAB indica 0 segmento de reta determinado pelos pontos A e B,

de extremos A e B .All e a reta suporte de AIl e de is e BA

"Matematica - curso moderno", :Jo volume para os ginesios,OsvaJdo 5angiorgi, Companhia Editora Naciona/, 5ao Paulo,1969.

Ainda como consequencia desta preocupac;:socom.a precisao e 0 rigor dos conceitos, chamava-se a atenc;so do aluno para a distinc;:so entre:

o triangulo e aregiao triangular

o angulo e aregiao angular

o poilgono e aregiao poligohal

a circunferencia e 0disco fechado.

Com a introduc;:ao dos conjuntos, mudou, asvezes, a forma de apresentar certos conceitos. As-sim, por exemplo, 0 segmento de reta passou a serdefinido como Intersecc;io de semi-retas:

f\ ~• • • •••- - -PlB -= i1'P> n 'e>~Outros exemplos:

• Angulo como unlio de semi-retas.• Regiao-angular como Intersecc;io de semi-pianos.• Triangulo como unlio de segmentos de reta.• Regiao triangular como Inter.ecc;io de regioesangulares.

Houve ainda outra inovac;ao: com a intenc;aode iniciar os alunos em "questoes topol6gicas" oslivros passaram, muitas vezes, a incluir um capitUlosobre curvas abertas e fechadas, explorando asnoc;:oesde interior, exterior, fronteira etc.

E claro que estas mudanc;as explicavam-sedentro do movimento geral de renovac;so por quepassava 0 ensino de Matematica.

Ao mesmo tempo em que 0 ensino de geome-tria recebia est as modifica<;:oes, ocorria tambamum outro fato importante: 0 abrandamento na exi-gencia de se demonstrar os teoremas. Nao se podeafirmar que este abrandamento fizesse parte dasnovas propostas trazidas pela Matematica Moder-na. Talvez ele tenha side uma resposta a inadequa-<;:aodo tratamento que antes se dava a geometria:no momenta das mudan<;:as aproveitou-se para parde lado uma abordagem nao apropriada. E dificilsaber ata onde esta atitude foi consciente. 0 fate aque este abrandamento na exigencia de se de-monstrar os teoremas teve aspectos positivos enegativos. Um aspecto positivo esta na rupturacom 0 modele anterior (onde pretendia-se "de-monstrar tudo"), que ja havia demonstrado suainadequa<;:ao. Um aspecto negativo daquele abran-damento a que, com 0 passar do tempo, passou-seao extremo oposto: "demonstrar nada".

Antes de prosseguir convam chamar a aten<;:aodos colegas leitores para 0 seguinte: esta analiseque estamos fazendo das mudan<;:as no ensino dageometria a bastante simplificada. Na verdade osproblemas sac mais complexos. Uma analise maisprecisa comportaria 0 exame das mudan<;:as ocorri-das no ensino de toda a Matematica, imerso porsua vez dentro de questoes mais gerais: a Educa-<;:ao como um todo, as condi<;:oes s6cio-econami-cas do pais etc. Esta analise iria muito alam deminhas possibilidades e das finalidades deste ar-tigo.

A geometrla entre n68, hoJeAtualmente, nas raras ocasioes em que a geo-

metria a trabalhada em classe, constata-se que,salvo as exce<;:oes de praxe, 0 caminho adotadodefine-se como "nenhum dos anteriores". Trata-sede uma abordagem despersonalizada, sem umaIinha definida. Temos uma "colcha" onde podemser notados "retalhos" das propostas mencio-nadas.

Nesta "salada", as vezes se diz que a geome-tria das primeiras saries a "intuitiva" e que adosultimos anos do primeiro grau a "formalizada".Nem uma coisa nem outra a verdade. Em geral, osalunos sac apenas Informados a respeito de certaspropriedades das figuras. Nem descobrem tais pro-priedades fazendo experiencias, nem chegam aelas fazendo dedulfoes. Vejamos tras exemplos.1) Nas 48 e 58 saries, com um experimento simples,as crianlfas podem descobrir que1m' = 100dm'.Basta representar no chao, com jornal e fita adesi-va, um quadrado de lado 1m e, de po is, recobri-Iocom cartoes quadrados de lado 10cm. Entretanto,via de regra, sac simplesmente informados de que1m' = 100 dm'.2) Os alunos podem compreender que as diagonais

de um paralelogramo cortam-se ao meio, fazendomedi<;:oes numa figura onde sac representados umparalelogramo e suas diagonais.

Posteriormente, no final do 1- grau, esta pro-priedade pode ser deduzida com base na con-gruancia de triangulos. Entretanto, normal mente,nao se faz nem uma coisa nem outra. 8implesmen-te informamos os alunos de que as diagonais deum paralelogramo cortam-se ao meio.3) Na 78 sarie costumamos Informa-Ios de que:• "Duas retas paralelas, cortadas por uma transver-sal, formam angulos alternos-internos iguais".• "A soma das medidas dos angulos internos deum triangulo a 180'"• "A soma das medidas dos angulos internos deum quadrilatero a 360'."• "A soma 8 das medidas dos angulos internos deum polfgono de n lados a 8=180' (n-2)".

Quando afirmo que simplesmente informamosos alunos a respeito destas propriedades queredizer que as idaias contidas naquelas proposi<;:oesnao costumam ser construfdas. Poderiamos cons-truf-Ias realizando experimentos simples com te-soura e papel para, depois, apresenta-Ias dedutiva-mente (como mostraremos logo adiante). Entretan-to, nao se faz nem uma coisa nem outra. Estasinforma<;:oes costumam ser apresentadas isolada-mente, uma a uma, sem que se estabelelfa qualquerrela<;:ao entre elas. 8ao apresentadas sem justifica-tivas e como se fossem fatos independentes. Nestaapresenta<;:ao, a soma das medidas dos angulos deum triangulo nao se relaciona com a propriedadedas paralelas nem com a soma dos angulos doquadrilatero e dos poligonos em gera!.

A geometria apresentada desta maneira reduz-se a uma sarie de receitas. Nem a intuitiva ouexperimental, nem a dedutiva. Deste modo, as ver-dades geomatricas transformam-se em dogmas.Os fatos geomatricos carecem de significado. Ageometria perde seu encanto ...

No inicio deste artigo afirmei que, nas rarasocasioes em que a geometria a trabalhada em salade aula, tenho observado falhas graves na suaabordagem (ha exce<;:oes, a claro!). Penso que, 0que foi apontado justifica aquela afirma<;:ao. Pre-

tendo, a seguir, contribuir com algumas ideias nointuito de superar aquelas falhas.

Geometria experimentalA aprendizagem da geometria inicia-se (ou de-

veria iniciar-se) nas primeiras series do primeirograu. Atraves da explora<;ao sensorial de objetos,cedo a crian<;a aprende a reconhecer formas eclassificar figuras. Mais tarde aprende a comparare medir comprimentos; descobre propriedades dasfiguras, identifica paralelismos e perpendicularis-mos etc. Neste processo desenvolve a sua percep-<;ao do espa<;o.

Nesta aprendizagem e fundamental 0 uso demateriais e instrumentos: papel, cartolina, tesoura,cola, lapis coloridos, regua, esquadro, compasso,transferidor, ladrilhos, embalagens etc.

Caixas e embalagens tem formas geometricasvariadas. Trabalhando com elas, a crian<;a classifi-ca figuras, planifica, estabelece rela<;oes entre figu-ras planas e a figura espacial, identifica as faces,arestas e vertices de um poliedro etc.

Com ladrilhos e mosaicos a crian<;a faz reco-brimentos e prepara 0 terreno para 0 calculo deareas. Tambem descobre propriedades dos pollgo-nos. Assim, por exemplo, podemos propor queobserve este mosaico onde foram combinadosquadrados e oct6gonos.

Sabendo que 0 azulejo octogonal tem lados eangulos iguais, pedimos que descubra a medida deseus angulos, sem usar transferidor.

Com tesoura, cola, cartolina e instrumentos dedesenho os alunos constr6em poliedros.

Deslizando 0 esquadro naregua fixa eles ob-tem retas paralelas.

IEste processo permite perceber intuitivamente

que, se forem iguais os angulos correspondentesform ados por duas retas res cortadas por umatransversal, entao as retas res serao paralelas.

Com tres palitos de sorvete e dois percevejosos alunos pod em representar as tres retas e suasintersec<;oes:

Manipulando este material simples, fica claroque a igualdade dos dois angulos esta associadaao paralelismo das duas retas e vice-versa.

Recortando um triangulo de papel, numerandoseus angulos, separando-os com a tesoura e dis-pondo-os de modo a representar sua soma, a crian-Cfa compreende a propriedade relativa a soma dosangulos de um triangulo.

o mesmo podemos fazer com a soma dosangulos de um quadrillitero.

.L~.-._- _.-

Com dobraduras a crianCfaconstr6i a bissetrizde um angulo e verifica, experimental mente, que as

tras bissetrizes de um triangulo encontram-se nummesmo ponto.

Palitos de sorvete e percevejos permitem cons-truir polfgonos e comprovar, pela experiancia, arigidez dos triangulos.

i'/\-/ \

~ '"Puxando assim, deforma? /

Um leque ajuda a compreender 0 que e umangulo, a entender quando um angulo aumenta oudiminui; permite visualizar angulos reto, raso, deuma volta, agudo e obtuso.

Desenhando quadrados de tamanhos variados,medindo seus lados e diagonais e organizandoestes dados numa tabela, os alunos podem perce-ber, experimental mente, que a medida da diagonalde um quadrado e diretamente proporcional a me-dida de seu lado.

d (m m) I (m m) d/I28 20 1,4

50 35 1,4270 50 1,4

143 100 1,43

A constante de proporcionalidade aproximadae 1,4:

11=1 ,41ou d=1,4 I

Muitos outros exemplos poderiam ser apresen-tad os com a intenCf80 de caracterizar um trabalhoexperimental com a geometria. Aos colegas inte-ressados nesta abordagem recomendamos, porexemplo, estas leituras:1) Geometria ExperimentalMEC -IMECC - PREMEM - UNICAMP - CENP(8.venda nos postos da FAE)2) Nova proposta curricular para 0 ensino de Mate-matica no 1° grau, 2' ediCf80 preliminar, CENP,Secretaria de Estado da EducaCf80,SP.

No trabalho com a geometria experimental eimportante compreender, claramente, qual e 0 pa-pel desempenhado pelos materiais e instrumentos.Eles nao valem por si s6. Sao apenas acess6rios doprocesso. Sem duvida, sac acess6rios importantes.Mas 0 material didatico, sozinho, nao desencadeiao processo de aprendizagem. Fundamentais sac asoperac;6es mentais que a crianc;a realiza quandodesenvolve certas atividades com ele. Disto decor-re a importancia fundamental do professor e damaneira como ele trabalha com seus alunos, usan-do 0 material didatico de forma adequada.

Geometrla dedutlvaNo infcio deste artigo mencionamos 0 modo

como a geometria era habitual mente apresentadaentre n6s, ate meados dos anos 60. Naquela abor-dagem pretendia-se colocar 0 aluno em contatocom 0 modelo classico de construc;ao da geome-tria, inaugurado por Euclides. Pretendia-se com elacolocar 0 estudante em contato com a ideia deconstruc;ao axiomatica, tao importante na pesquisaMatematica: a partir dos conceitos primitivos e dospostulados e axiomas, 0 ediffcio 16gico da geome-tria era construfdot teorema ap6s teorema. De fato,e absurdo pretender-se que estudantes de primeirograu entendam estas ideias.

Hojet quando se enfatiza a importancia da geo-metria dedutiva, nao se esta mais pensando naque-les term os. Trata-se de apresentar, em momentosadequados, um pequeno numero de proposic;6esque se encadeiam logicamente, numa seqO€mcJade teoremas. Vejamos um exemplo.

Ja vimos que, com alguns experimentos sim-ples, e possivel compreender que "duas retas cor-tadas por uma transversal sac paralelas se e so-mente se os angulos correspondentes (e portantoos alternos-internos), tem medidas iguais.

'" '"1 e 2 sao angu/oscorrespondentes

l' e '2 sao angu/osa/tern os-intern os

Esta proposic;ao, obtida empiricamente (e naodemonstrada dedutivamente) sera aqui considera-da um postulado. A partir dela podemos provarque:

"A soma das medidas dos angulos de urn trian-gulo e igual a 1800"

De fato, dado um triangulo ABC qualquert con-sideremos a reta r, paralela aBC, passando por A.

A propriedade das paralelas permite concluir que:1=Ae2=C

Como: l' + A + ~= 1800

resulta que: A + A + C = 180°Deste modo, a partir da propriedade das para-

lelas, deduzlmos que a soma das medidas dosangulos de urn triangulo e igual a 180°.

Consideremos agora um quadrilatero qual-quer.

A diagonal AC divide-o em dois triangulos.Sabernos que:

1 + 0 + ~- 180° 2 + A + 4 - 180°,. -. -" A

Logo: 1 + 2 + 0 + A + 3 + 4 - 360°••••• A A A

Mas: 1 + 2 - A e 3 + 4 - CDonde: A + 0 + A + C - 360°

Assim, o.conhecimento de que a soma dasmedidas dos angulos de urn triangulo e 180° permi-te-nos deduzlr que a soma das medidas dos angu-los de um quadrilatero e 360°.

Para obter a soma das medidas dos angulos deurn pentagono podemos decomp6-lo de varias ma-neiras.

No primeiro caso, a soma 'das medidas dosangulos dos 3 triangulos a igual a soma das medi-das dos angulos do pentagono (55)' Logo:

55- 3 x 1800- 5400

No segundo caso, a soma das medidas dosangulos do triangulo e do quadrilatero, tam barn aigual a soma das medidas dos angulos do pentago-no, portanto:

55 - 1800 + 3600- 5400

Mas no terceiro caso, a soma das medidas dosangulos dos triangulos nso a igual a soma dasmedidas dos angulos do pentagono. Mas, aindaneste caso podemos obter 55' Basta fazer:

Esta ultima decomposi<;:aodo pentagono em 5triangulos pode ser facilmente aplicada a urn poll-gono de 11 lados, por exemplo:

Temos: 511 -11 x 1800 - 3600 -19800- 3600 -16200

Finalmente, podemos generalizar este racioci-nio para urn pollgono de n lades (a letra n estarepresentando urn numero qualquer, desde queinteiro maior ou igual a 3):

5 - n x 1800- 3600n

ou 5n - n x 1800- 2 x 1800

Donde 5n - 1800 (n - 2)

Assim, partindo da propriedade das paralelas (pos-tulado obtido empiricamente), fomos deduzlndouma sarie de outras propriedades, umas a partirdas outras, numa sequencia 16gica. Em sintese acadeia a essa:

Oeste fato deeorre este outro, que por sua vezImpllea neste outro, que aearreta esta outra con-clusao, da qual pode-se deduzlr esta outra proprie-dade etc.

Eis urn objetivo importante (mas nao unico)para 0 ensino de geometria no 10 grau: contribuirpara que as pessoas aprendam a desenvolver ra-ciocinios em cadeias 16gicas, como na forma resu-mida acima.

No estudo da geometria h8 varios momentosem que a oportuno apresentar estas sequ{lncias dealguns poucos teoremas: no calculo das areas, nasrela<;:6esmatricas no triangulo retangulo, no estu-do de angulos na circunferencia etc.

Conelusoes finalsAtravas de exemplos procurei esclarecer 0 que

esta sendo entendido por geometria experimentale por geometria dedutiva. Estamos em condi<;:6esde voltar ao titulo deste artigo:

A geometrla no 1° grau:experimental ou dedutlva?

Penso haver respondido esta pergunta. Portudo que foi apresentado esta claro que as duasabordagens sac fundamentais e que a precise bus-carmos a forma de trabalhar com uma e outra. Eprecise compreender que 0 modelo nso a linear.

Nao se trata de partir de uma para atingir aoutra. Nem tampouco deve-se pensar que umaabordagem a "superior" a outra.

E claro que, nas primeiras saries do 10 grau 0metoda de trabalho sera explorat6rio, com grandeapelo a percep<;:aosensorial. Neste nivel, 0 aprendi-zado da geometria a fundamentalmente empirico.As "dedu<;:6es", neste inicio, envolvem estruturas16gicas extremamente simples. Por exemplo: "seuma figura tern 3 bicos entao ela nao rola".

Nas saries finais do 10 grau 0 raciocinio deduti-vo deve ser, gradativamente, intensificado. Mas, atodo momento e mesmo no 20 grau, estaremossempre voltando as atividades experimentais. Porisso, reafirmo, a rela<;:aoentre as duas abordagensnao a linear. Trata-se de uma rela<;:aomais comple-xa, dinamica e viva.

Durante 0 tempo em que estive as voltas com a redaqaodeste artigo, foram extremamente valiosas as conversas comVerenice Leite Ribeiro, Maria do Carmo D. Mendonqa. ClaudiaC. de Segadas Vianna e Marcelo LelJis. Deixo aqui registradosos meus agradecimentos a estes amigos queridos.