A FIGURA DO BEDEL ESCOLAR NAS CARTAS PUBLICADAS NO … · 2020. 9. 8. · Assim, pretendemos, neste...

12
1157 ISBN 978-85-7915-171-2 A FIGURA DO BEDEL ESCOLAR NAS CARTAS PUBLICADAS NO JORNAL A REGENERAÇÃO (1861) 1 MARIA GÉSSICA ROMÃO DA SILVA PIBIC/UFPB. E-mail: [email protected] CAMILA ALMEIDA DE ARAÚJO PIVIC/UFPB. E-mail: [email protected] Palavras Iniciais O interesse pelas epístolas nos jornais consiste em entender o pensamento de uma época a respeito da educação e instrução pública na Paraíba. Objetivando desvendar os interesses e ideias pedagógicas de um determinado momento histórico, a escrita epistolar interessa ao historiador “por estar recheada de práticas culturais de um tempo, hábitos e valores partilhados plenos de re- presentações de uma época” (CUNHA, 2008, p. 1). O achado de uma carta “incita sempre a contar: a história de sua descoberta, a histó- ria dos que escreveram, a história dos acontecimentos que evoca. O atrativo está no suspense, na decifração dos enigmas [que podem nos revelar aspectos importantes sobre a história, em especial a da educação]” (DAUPHIN e POUBLAN, 2002, p. 79). Segundo Gómez (2002, p. 14), o surgimento das cartas “se perdem na Antiguidade, talvez em um dos remotos fragmentos do Antigo Egito, e, por outro lado, qualquer dos tratadistas que se ocuparam dela no Século de Ouro mencionava a Cícero quase como o homo fator da arte epistolar”. Por volta dos séculos XVI e XVII, as cartas adquiriram uma importância significativa como um dos instrumentos de comunicação mais utilizados na época. Assim, as cartas devem ser entendidas como instrumentos de conversação que “não só serviam para expressar ideias e pensamentos, notícias 1 Fabiana Sena / UFPB/CNPq- Professora Orientadora – Universidade Federal da Paraíba [email protected]

Transcript of A FIGURA DO BEDEL ESCOLAR NAS CARTAS PUBLICADAS NO … · 2020. 9. 8. · Assim, pretendemos, neste...

  • 1157

    I S B N978-85-7915-171-2

    A FIGURA DO BEDEL ESCOLAR NAS CARTAS PUBLICADAS NO JORNAL A REGENERAÇÃO (1861)1

    MARIA GÉSSICA ROMÃO DA SILVAPIBIC/UFPB. E-mail: [email protected]

    CAMILA ALMEIDA DE ARAÚJOPIVIC/UFPB. E-mail: [email protected]

    Palavras Iniciais

    O interesse pelas epístolas nos jornais consiste em entender o pensamento de uma época a respeito da educação e instrução pública na Paraíba. Objetivando desvendar os interesses e ideias pedagógicas de um determinado momento histórico, a escrita epistolar interessa ao historiador “por estar recheada de práticas culturais de um tempo, hábitos e valores partilhados plenos de re-presentações de uma época” (CUNHA, 2008, p. 1). O achado de uma carta “incita sempre a contar: a história de sua descoberta, a histó-ria dos que escreveram, a história dos acontecimentos que evoca. O atrativo está no suspense, na decifração dos enigmas [que podem nos revelar aspectos importantes sobre a história, em especial a da educação]” (DAUPHIN e POUBLAN, 2002, p. 79).

    Segundo Gómez (2002, p. 14), o surgimento das cartas “se perdem na Antiguidade, talvez em um dos remotos fragmentos do Antigo Egito, e, por outro lado, qualquer dos tratadistas que se ocuparam dela no Século de Ouro mencionava a Cícero quase como o homo fator da arte epistolar”. Por volta dos séculos XVI e XVII, as cartas adquiriram uma importância significativa como um dos instrumentos de comunicação mais utilizados na época. Assim, as cartas devem ser entendidas como instrumentos de conversação que “não só serviam para expressar ideias e pensamentos, notícias

    1 Fabiana Sena / UFPB/CNPq- Professora Orientadora – Universidade Federal da Paraíba [email protected]

    mailto:[email protected]

  • 1158XII ENCONTRO CEARENSE DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO

    II ENCONTRO NACIONAL DO NÚCLEO DE HISTÓRIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO

    ComunicaçõesGT 4 • FONTES E MÉTODOS PARA PESQUISA CIENTÍFICA

    I S B N978-85-7915-171-2

    ou consolos espirituais, mas também para compartilhar vivências mais íntimas, pessoais e até mundanas” (IDEM, 2002, p. 18).

    É interessante destacar, também, a utilização das cartas com a função de educar, que passaram a ser “utilizadas na formação dos jovens, graças ao reconhecimento de seu papel como ‘arte formado-ra da existência’” (MALATIAN, 2009, p. 196), a exemplo destas car-tas, podemos citar as epístolas familiares escritas por pais e filhos, que evidenciavam além da função educativa, um caráter civilizador. Como a arte de escrever cartas foi se tornando comum, foi necessá-ria a criação dos manuais de escrever cartas, os quais orientavam os escrevedores às regras de como escrevê-las. Nestes eram escla-recidas, também, a escolha do padrão de papel, pena e tinta a serem escolhidos, assim como o vocabulário a ser utilizado. Além disso, “os manuais estabeleciam os temas a serem abordados conforme o correspondente e seu grau de proximidade e intimidade, os cui-dados com a preservação de sigilos e mesmo das próprias cartas” (IDEM, 2009, p. 198). Dessa forma, o papel do secretário, passou a ser evidenciado, este “devia encarregar-se das cartas de seu senhor procurando que as mesmas cumprissem uma série de requisitos, que fossem suficientes para poder entendê-las como projeções simbólicas de quem as enviava” (GÓMEZ, 2002, p. 34).

    No que diz respeito às epístolas publicadas nos jornais, ve-mos como a imprensa se caracterizou em um importante espaço de debate para educação e instrução pública no período do Im-pério. Esta contribuiu em vários aspectos para com a sociedade, constituindo-se como fonte expressiva, compartilhou através dos jornais∕periódicos das representações políticas, sociais, econômi-cas e educacionais. Em particular no Brasil, a imprensa “participou ativamente, [...] sendo capaz de exercer influência, expressar po-sicionamentos, ajudando a construir ou a consolidar opiniões das mais diversas” (FONSECA, 2002, p. 1). Sendo para Pallares-Burke (1998, p. 5) “poderosos instrumentos do projeto iluminista de mu-dar as ideias e maneiras das pessoas comuns”.

  • 1159

    ComunicaçõesGT 4 • FONTES E MÉTODOS PARA PESQUISA CIENTÍFICA

    XII ENCONTRO CEARENSE DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO II ENCONTRO NACIONAL DO NÚCLEO DE HISTÓRIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO

    I S B N978-85-7915-171-2

    Assim, pretendemos, neste trabalho, analisar três cartas, en-contradas no jornal A Regeneração do ano de 1861, da província da Paraíba, pois percebemos que os assuntos destas epístolas nos deixam alguns resquícios do funcionário escolar bedel. Além dis-to, todas estas foram apontadas como cartas de Negócios e Encar-gos, segundo os Manuais de Escrever Cartas, os quais serão mais bem explicados nos tópicos que seguem. E, compreendendo que na perspectiva da Nova História Cultural não se deve tomar as cartas como reflexos da realidade iremos confrontar tais escritos com os Relatórios de Província, as Leis e os Regulamentos do período do Império.

    A Imprensa no Brasil e na Paraíba: Breve Histórico

    A imprensa, ao longo da história, estabeleceu um importante papel na educação e formação do povo brasileiro. Como assinala Lustosa (2009, p. 15) “a imprensa brasileira foi um espaço de di-vulgação científica [...] a função do jornal não era só informar, mas também educar, difundir as Luzes, suprir a carência de livros e de escola”. Concordando com a autora, entendemos a necessidade de perpassar, brevemente, pelos caminhos históricos da imprensa no Brasil e, mais especificamente, na Paraíba.

    No início do século XVIII, D. João V, o rei de Portugal proibiu a existência e funcionamento de tipografias no Brasil. Isso aconte-ceu pelo fato de uma suposta crise econômica, por qual passava a sociedade vigente. Assim, o primeiro jornal brasileiro denominado Correio Brasiliense ou Armazém Literário foi publicado em Londres, no ano de 1808 e impresso por Hipólito da Costa Pereira Furtado de Mendonça. Apesar de haver rumores de imprensas clandestinas existentes no Brasil Colonial, somente com a chegada da Corte Por-tuguesa, como consequência da invasão das tropas napoleônicas, fora fundada e oficializada a Imprensa Régia, mais precisamente em 13 de maio de 1808. De acordo com Freitas (2006, p. 55), com

  • 1160XII ENCONTRO CEARENSE DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO

    II ENCONTRO NACIONAL DO NÚCLEO DE HISTÓRIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO

    ComunicaçõesGT 4 • FONTES E MÉTODOS PARA PESQUISA CIENTÍFICA

    I S B N978-85-7915-171-2

    a oficialização da imprensa “acabaram por iniciar a institucionali-zação da cultura brasileira e por estimular os brasileiros a elaborar uma identidade nacional e organizarem-se como nação”. Entre ou-tras medidas, tomadas podemos mencionar: a abertura dos portos, a organização das vilas com vistas à urbanização e a criação de ins-tituições de ensino superior.

    No dia 10 de setembro de 1808, surgiu o periódico intitu-lado Gazeta do Rio de Janeiro. Segundo Freitas (2006, p. 55) este jornal se caracterizava como “divulgador dos assuntos científicos, noticiando a produção de obras, a realização de cursos, a produção e venda de livros e textos científicos. Além das notícias e alusões, o periódico chegou a publicar memórias científicas”. Bahia (2009, p. 20) nos informa que tal jornal “integra inovações culturais como o Liceu de Artes, as escolas médico-cirúrgicas, a Academia de Ma-rinha e a Biblioteca Real”. Em sequência a este periódico nasce a Idade d’Ouro do Brasil, na Bahia, produzido no dia 14 de maio de 1811 e O Patriota, “Jornal Litterario, Politico, Mercantil &c. do Rio de Janeiro, o primeiro periódico especialmente dedicado às ciên-cias e às artes no país”, que circulou no Brasil entre janeiro de 1813 e dezembro de 1814 (FREITAS, 2006, p. 55).

    Na província da Paraíba, o surgimento da imprensa, como res-salta Araújo (1985, p. 31) “denominou-se com o periódico intitulado Gazeta do Governo da Paraíba do Norte, fundado em 16 de fevereiro de 1826 e impresso na Typografia Nacional da Parahyba, administra-da pelo súdito inglês Waller S. Boardman”. Ao falar sobre a imprensa paraibana, Machado (2009, p. 1) traz alguns dados importantes:

    A província da Paraíba, vinculada a Pernambuco até 1799, teve participação ativa em todos os movimentos revolucio-nários, inclusive na Confederação do Equador, mas somen-te em 1826, contou com a sua primeira tipografia enviada do Recife, que recebeu o nome de Typographia Nacional da Parahiba, editando seu primeiro periódico, A Gazeta da Pa-rahiba do Norte.

  • 1161

    ComunicaçõesGT 4 • FONTES E MÉTODOS PARA PESQUISA CIENTÍFICA

    XII ENCONTRO CEARENSE DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO II ENCONTRO NACIONAL DO NÚCLEO DE HISTÓRIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO

    I S B N978-85-7915-171-2

    O segundo jornal fundado na Paraíba nasceu no ano de 1828, circulando até o ano seguinte, 1829, e recebia o nome de Gazeta Pa-rahybana. Em seguida surgiu o Petiguaré, ainda em 1829 e o Correio da Parahyba, impresso em Recife. Araújo (1985, p. 35) menciona ou-tros títulos, que circularam na Paraíba durante a década de 30, do sé-culo XIX, estes são: “O Raio da Verdade, O Publicador Parahybano, am-bos de 1833 [...] e O Parahybano, em 1835, que circulou até 36”. Ainda nesta década Bahia (2009, p. 66) nos fala sobre a existência de “O Re-público de 1831 e O Constitucional Paraibano de 1838”. A década de 40, também foi marcada pelo surgimento de alguns periódicos, como: O Verdadeiro Monarchista (1840 a 1844), O Reformista (1848), O Ta-puya, A Ordem, O investigador, O Espreitador e O Correio Official Pa-rahybano, estes últimos do ano 1849. Em 1850 é inaugurada a Revista Alva, como também o periódico Argos Parahybano (ARAÚJO, 1985).

    Além dos periódicos mencionados, anteriormente, muitos outros títulos circularam na Paraíba do século XIX, entre eles os jornais de cunho político, comercial, noticioso, literário, recreativo e educativo. Consideramos imprescindível destacar, porém, o jornal A Regeneração, já que as cartas analisadas neste trabalho foram en-contradas neste periódico. Este era de cunho político, literário, no-ticioso e comercial, impresso e subscrito na Typografia Parahybana, na Rua da Baixa, nº 44. Tal jornal era publicado nas quartas-feiras e sábados, circulando pela Província nos anos de 1861 e 1862.

    Como vimos, os jornais do século XIX podem ser reconheci-dos como espaços públicos, nos quais se estabelecia uma forma de comunicação e que servia como um meio para exemplar determi-nadas pessoas. As cartas publicadas nesses jornais podem ser con-sideradas, por sua vez, como instrumentos “de expressão do pen-samento e um espaço ideal de debate” (PEIXINHO, 2009, p. 2830). A escrita epistolar, dentro dos jornais, se caracteriza pela gama de informações que estabelece ao historiador, pois através da mesma é possível tomar conhecimento de uma época, das trocas de opiniões, dos valores e da maneira de escrita de um tempo.

  • 1162XII ENCONTRO CEARENSE DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO

    II ENCONTRO NACIONAL DO NÚCLEO DE HISTÓRIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO

    ComunicaçõesGT 4 • FONTES E MÉTODOS PARA PESQUISA CIENTÍFICA

    I S B N978-85-7915-171-2

    As Cartas Sobre o Bedel Escolar no Jornal a Regeneração (1861)

    No século XIX, os jornais serviam de veículos de informações, que transportavam, entre outros gêneros, as epístolas, fazendo che-gar ao destinatário a informação que se queria passar. Como aponta Barbosa (2007, p.59), o gênero carta se caracteriza “como um dos tipos mais comuns e importantes nas colunas do jornal”. As cartas aqui analisadas fazem menção ao bedel escolar que é representado dentro dos aspectos burocráticos da instrução pública.

    A primeira carta publicada no dia 20 de abril de 1861 tratava da comunicação de licença concedida ao Bedel do ensino secundá-rio, no Liceu Paraibano. É interessante esclarecer que era função do Bedel, também conhecido como inspetor escolar, vigiar os compo-nentes da escola, monitorando, principalmente, as faltas dos alunos e dos professores da instituição escolar, o que fica esclarecido no texto de Foucault (1987, p.174), quando ressalta: “deve-se registrar dia por dia o comportamento dos alunos; e tudo o que se passa na escola; é periodicamente submetido a um inspetor” ou ainda “cada um dos alunos terá seu lugar marcado e nenhum o deixará nem trocará sem a ordem e o consentimento do inspetor das escolas” (FOUCAULT, 1987, p. 183). Abaixo, podemos ler a primeira carta encontrada:

    Idem ao mesmo, – havendo S. Exc. O Sr. Vice-presidente da província concedido 15 dias de licença com vencimento ao 1. Oficial desta repartição Leocadio Rodrigues Chaves, o co-munico a Vmc. Para os fins convenientes. Fez-se comunica-ção igual a respeito da prorrogação de licença concedida ao bedel do liceu por portaria de 30 do mês passado. (A REGE-NERAÇÃO, 20 de abril de 1861)2.

    Segundo a legislação que orientava a Instrução Pública no Império, o Bedel deveria compor o pessoal do Liceu: “Art. 1º – O pes-

    2 Mantemos a ortografia da época.

  • 1163

    ComunicaçõesGT 4 • FONTES E MÉTODOS PARA PESQUISA CIENTÍFICA

    XII ENCONTRO CEARENSE DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO II ENCONTRO NACIONAL DO NÚCLEO DE HISTÓRIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO

    I S B N978-85-7915-171-2

    soal do Liceu compõem-se de sete professores, cinco proprietários, dois substitutos, classificados 1º, 2º e de um Bedel” (INEP, 2004, p. 98). É apropriado destacar que apesar de não deixar claro, na carta o signatário, é possível perceber, através de seu conteúdo, que este se tratava de um membro ligado à parte burocrática da instrução pública, já que informava ao destinatário, o Exc. Sr. Vice-Presidente da Província, sobre a licença atribuída ao bedel da instituição.

    A segunda carta, também foi publicada no dia 20 de abril de 1861. Esta comunicava ao Diretor da Instrução Pública sobre a con-tratação de um novo Bedel em substituição ao que estava de licen-ça. Na carta fica clara, também, a ordem de pagamento ao cidadão contratado, que deveria ser feita pelo Diretor de Instrução.

    Idem ao mesmo. – O cidadão Antero da Silva Ramalho que foi contratado para servir interinamente o lugar de Bedel do liceu na falta do efetivo, o dito lugar durante 38 dias, se-gundo acaba de ser-me declarado pelo diretor da instrução pública. Cumpre por tanto que Vmc. lhe mande pagar neste sentido o que lhe dever na razão de 2 réis por dia, como já foi comunicado a essa repartição. Comunicou-se ao dire-tor da instrução pública. (A REGENERAÇÃO, 20 de abril de 1861).

    Faz-se conveniente destacar a legislação que regulamentava a instrução pública no Império sobre as faltas do funcionário Bedel, quando menciona em seu art. 9º, o seguinte:

    Art. 9º – O bedel nas suas faltas, e impedimentos é obrigado a nomear pessoa idônea, que o substitua sob sua respon-sabilidade, aprovada pelo Diretor, e paga a sua custa; não o fazendo o Diretor providenciará perdendo o bedel, o or-denado, que reverterá em favor do que o substituir. (INEP, 2004, p. 99).

    A terceira carta ainda publicada no dia 20 de abril de 1861 é destinada ao Exm Sr. Vice-presidente da província. Nesta, o signa-tário, não informado na mesma, comunica a renúncia do Bedel do

  • 1164XII ENCONTRO CEARENSE DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO

    II ENCONTRO NACIONAL DO NÚCLEO DE HISTÓRIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO

    ComunicaçõesGT 4 • FONTES E MÉTODOS PARA PESQUISA CIENTÍFICA

    I S B N978-85-7915-171-2

    Liceu ao término da licença do qual desfrutava, bem como acusa o recebimento de um ofício enviado.

    Nesta data se comunica ao tesouro provincial ter se apre-sentado no dia 4 do corrente ano, o bedel do Liceu que re-nunciou o resto da licença em cujo gozo se achava, segundo Vmc. Trouxe ao conhecimento do Exm Sr. Vice-presidente da província por ofício nº 108, de hoje, que acuso recebido. (A REGENERAÇÃO, 20 de abril de 1861).

    Nas três cartas, anteriormente analisadas, percebemos a fi-gura do Bedel Escolar representada por ocupar uma função impor-tante, a de vigiar e punir alunos e professores. Mas, também, como um membro da instrução pública subordinado aos outros, podendo observar uma espécie de hierarquia. De acordo com a Resolução de número 26 que regulamenta as funções de cada funcionário do Liceu paraibano,

    Art. 84 – Ao Bedel compete:§ 1º – Abrir e fechar o Liceu.§ 2º – Cuidar do asseio e limpeza da casa.§ 3º – Fazer no sino sinal para a entrada e saída das aulas§ 4º – Avisar ao diretor todas as vezes que os professores faltarem e entregar-lhe no fim no mês a lista de faltas dos mesmos – professor e dos estudantes.§ 5º – Advertir os estudantes que transgredirem as dispo-sições do art. 59, ou perturbarem a ordem do silêncio do Liceu, dando parte ao Diretor, se eles se não coibirem.§ 6º – Executar as ordens do Diretor, e secretário no que for tendente ao serviço do Liceu. (INEP, 2004, p. 104).

    Assim a figura deste funcionário é representada como sujei-to que ora aplica as regras – “Avisar ao diretor todas as vezes que os professores faltarem [...] advertir os estudantes...” – ora acata ordens, já que cargos como o do diretor estava acima deste – “Exe-cutar as ordens do Diretor...”. Um exemplo disto, nas cartas, fica vi-sível em seus conteúdos que, apesar de não especificarem todos os

  • 1165

    ComunicaçõesGT 4 • FONTES E MÉTODOS PARA PESQUISA CIENTÍFICA

    XII ENCONTRO CEARENSE DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO II ENCONTRO NACIONAL DO NÚCLEO DE HISTÓRIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO

    I S B N978-85-7915-171-2

    signatários e destinatários, deixam vestígios de que os mesmos são funcionários superiores ao bedel, pois não se dirigem diretamente a este funcionário, embora estejam falando dele e de assuntos de seu interesse. Isso nos faz entender que não cabia a tal funcionário publicar cartas nos jornais ou, ainda, escrever para o presidente da província, ficando este ofício a cargo do diretor da instrução.

    É importante mencionar que tais epístolas, se enquadram nas normas e regras de escrever cartas, estabelecidas pelos Manu-ais de Escrever Cartas. E se tratando das epístolas publicadas no jornal A Regenaração são classificadas como cartas de negócios e encargos, assim, também, podem ser entendidas como cartas de informação e ordem. Tal tipologia fundamenta-se no Manual O Se-cretazrio Portuguez Compendiosamente, (1801), de Francisco José Freire, quando cita: “A esta espécie de Cartas, servem de assumpto assim as cousas publicas, como as particulares, as quaes se devem tratar como já dissemos na Instrucção Preliminar” (FREIRE, 1801, p. 198) e o Novo Secretário Português ou Código Espistolar, (1860), de J. I. Roquette, que assim ressalta: “a este gênero de cartas po-demos chamar de primeira necessidade [...] verificar as ideias pró-prias para que passem à imaginação daquele a quem desejamos participá-los, este é o fim de tais cartas” (ROQUETTE, 1860, p. 246). Esta classificação pode ser entendida, como de ordem, nas cartas, quando os verbos cumprir e mandar são mencionados, como atri-buição e dever do Diretor da Instrução Pública. Já a classificação como sendo de informação, é vista quando é informado ao Diretor de Instrução sobre a contratação de um novo Bedel ou ainda da li-cença deste funcionário.

    Podemos compreender que o estudo das três epístolas do jornal A Regeneração de 1861, possibilitaram, ainda que de forma parcial, uma compreensão a respeito da Instrução Pública na Paraí-ba. Através de tal análise foi possível entender que a figura do Bedel Escolar foi representada por ocupar uma função importante, a de vigiar e punir alunos e professores. Mas, também, como um mem-

  • 1166XII ENCONTRO CEARENSE DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO

    II ENCONTRO NACIONAL DO NÚCLEO DE HISTÓRIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO

    ComunicaçõesGT 4 • FONTES E MÉTODOS PARA PESQUISA CIENTÍFICA

    I S B N978-85-7915-171-2

    bro da instrução pública subordinado a outros, podendo observar uma espécie de hierarquia.

    Considerações Finais

    É possível verificar, através deste artigo, que o estudo da epistolografia se caracteriza como uma fonte para a História da Educação, “abrindo cada vez mais um rico campo para as pesquisas sobre práticas e funções culturais da escrita na sociedade letrada que se desenvolve a partir do século XIX [...] contribuindo para en-tender melhor cada época e cada sociedade” (CUNHA, 2008, p. 1).

    Através da análise das três epístolas publicadas no jornal A Regeneração de 1861, foi possível entender que a figura do Bedel Escolar foi representada por ocupar uma função importante, a de vigiar e punir alunos e professores. Mas, também, como um mem-bro da instrução pública subordinado a outros, podendo observar uma espécie de hierarquia. É importante esclarecer que as cartas publicadas no jornal A Regeneração não se configuram como espe-lho fiel da realidade, mas como a representação dos assuntos re-ferente à instrução e educação que circulavam nas cartas através dos jornais e que nos deixam pistas sobre as relações de poder e o estado da Província paraibana, no Império.

    Assim, as cartas “funcionam como uma espécie de atestado de acumulação de um determinado capital simbólico e de uma dis-posição para a luta política, que autoriza e legitima seu autor a fre-quentar e a ocupar uma posição estratégica no debate que se trava acerca da educação/instrução na Corte imperial” (GONDRA, 2003, p. 30). Sendo possível compreender que o estudo das missivas nos jornais paraibanos oitocentistas se caracteriza “como uma outra fonte para a História da Educação, requer outros enfoques, releitu-ras e re-interpretações que se inserem na ótica da cultura escrita” (CUNHA, 2008, p. 02).

  • 1167

    ComunicaçõesGT 4 • FONTES E MÉTODOS PARA PESQUISA CIENTÍFICA

    XII ENCONTRO CEARENSE DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO II ENCONTRO NACIONAL DO NÚCLEO DE HISTÓRIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO

    I S B N978-85-7915-171-2

    Referências Bibliográficas

    A REGENERAÇÃO. Ao Diretor da Instrução Pública. Paraíba. 20 de abril de 1861.A REGENERAÇÃO. Ao Exc. Sr. Vice-presidente da província. Paraíba. 20 de abril de 1861. A REGENERAÇÃO. Ao tesouro provincial. Paraíba. 20 de abril de 1861.ARAÚJO, Fátima. Paraíba: imprensa e vida. 1ª edição, 1985. BAHIA, Benedito Juarez. História, jornal e técnica: história da im-prensa brasileira, Rio de Janeiro: Mauad X, 2009.BARBOSA, Socorro de Fátima Pacífico. Jornal e Literatura: a impren-sa brasileira no século XIX. Porto Alegre: Nova Prova: 2007. CUNHA, Maria Teresa Santos. A escrita epistolar e a história da edu-cação. Santa Catarina: UESC, 2008.DAUPHIN, Cécile e POUBLAN, Daniele. Maneiras de escrever, ma-neiras de viver. Cartas familiares no século XIX. In BASTOS, Maria Helena Câmara et al (org.). Destinos das letras. História, educação e escrita epistolar. Passo Fundo: UPF, 2002.FONSECA, Taís Nívea de Lima. A Inconfidência Mineira e Tiradentes vistos pela Imprensa: a vitalização dos mitos (1930 – 1960). Revista Brasileira de História. V.22 nº44. São Paulo, 2002.FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Petrópolis: Vozes, 1987.FREIRE, Francisco José. O Secretario Portuguez Compediosamente. Lisboa: Ulyssiponense, 1801.FREITAS, Maria Helena. Considerações acerca dos primeiros periódi-cos científicos brasileiros, 2006. GOMÉZ, Antonio Castillo. Como o polvo e o camaleão se transfor-mam: modelos e práticas epistolares na Espanha moderna. In: BAS-TOS, Maria Helena Câmara et al (org.). Destinos das letras. História, educação e escrita epistolar. Passo Fundo: UPF, 2002.GONDRA, José. Ao correr da pena: reflexões relativas às cartas de professores do século XIX. In: MIGNOT, Ana Cristina V. e CUNHA,

  • 1168XII ENCONTRO CEARENSE DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO

    II ENCONTRO NACIONAL DO NÚCLEO DE HISTÓRIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO

    ComunicaçõesGT 4 • FONTES E MÉTODOS PARA PESQUISA CIENTÍFICA

    I S B N978-85-7915-171-2

    Maria Teresa S. Práticas de memória docente. São Paulo: Cortez, 2003.INEP, Coleção Documentos da Educação Brasileira. Leis e Regula-mentos da Instrução da Paraíba no Período Imperial. Brasília: Insti-tuto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2004.LUSTOSA, Isabel. Uma Imprensa Ilustrada: Os primeiros jornalis-tas brasileiros e seu lugar no mundo português. In: Intelectuais e Imprensa: aspectos de uma complexa relação. São Paulo: Nankin, 2009.MACHADO, Regina Coeli Vieira. Imprensa (escrita) no Nordeste. Pes-quisa Escolar Online, Recife: Fundação Joaquim Nabuco, 2009. Dis-ponível em: . Aces-so em: 23 de maio de 2013.MALATIAN, Teresa. Cartas: narrador, registro e arquivo. In: PINSKY, Carla B. e LUCA, Tânia Regina de. O historiador e suas fontes. São Paulo: Contexto, 2009.PALLARES-BURKE, Maria Lúcia Garcia. A Imprensa como uma Em-presa Educativa no Século XIX. nº 104, p.144-161, São Paulo: USP, 1998. educa.fcc.org.br/pdf/cp/n104/n104a09.pdf. Acesso em 20 de maio de 2013.PEIXINHO, Ana Teresa. O epistolar como modo comunicacional da imprensa de opinião no século XIX. In: 6º Congresso SOPCOM. 14 a 18 de abril de 2009. Disponível em: http://conferencias.ulusofona.pt/index.php/sopcom_iberico/sopcom_iberico09/schedConf/presentations?searchField=1&searchMatch=contains&search=peixinho&track=19. Acesso em 24 de maio de 2013.ROQUETTE, J. I. Novo Secretário Portuguez ou Código Epistolar. Pa-riz: Aillaud, Monlon, 1860.

    Comunica

    ções

    http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar/index.php