A comunicação como poder nas organizações

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A comunicação como poder nas organizações  Introdução Pretendemos, nesta primeira parte, estabelecer uma ligação entre as variáveis que organizam o conceito de empresa e os elementos condicionantes e determinantes do conceito de comunicação. Procurar-se-á, ao correr das idéias deste livro, apoio nas áreas de Teoria de Sistemas, Sociologia e Psicologia da Administração. É evidente que, ao se tratar de um campo tão amplo como Empresa e C omunicação, não poderão ser evitadas as normais inferências, fruto de observação direta de experiências no trato rotineiro com organizaçõe s complexas.  A empresa como sistema Como unidade socioeconômica voltada para a produção de um bem de consumo ou serviço, a empresa é um sistema que reúne capital, trabalho, normas, políticas, natureza técnica. Uma empresa não apenas objetiva gerar bens econômicos, para uma relação de troca entre produtor e consumidor, mas procura também desempenhar papel significativo no tecido social, missão que deve cumprir qualquer que seja o contexto  político. É de alta relevância o papel formador da empresa, dentro dos sistemas  políticos, sua contribuição social, por meio da geração de empregos, descoberta de  processos, avanços tecnológicos, enfim, seu papel de vanguarda na elaboração de estratégias, produtos e serviços que resultam em progresso. Quanto a sua natureza econômica, é bom enfatizar que, graças à produção de bens e serviços para uma relação de troca, a empresa cria as condições para se viabilizar. Conciliando aspectos sociais e econômicos, a organização ajusta-se ao escopo para o qual foi idealizada. Outro ponto que pretendemos realçar diz respeito à definição de sistema. A administração moderna há muito está se apoiando na Teoria de Sistemas, Para melhor clarificar a questão, procuremos posicionar a empresa como uma unidade dentro do vasto e complexo espectro das organizações. Se entendemos por organização o ordenamento, a disposição das partes que compõem um todo, ou, no dizer de Talcott Parsons (1), a unidade social direcionada à consecução de metas específicas, vamos constatar na extensão do conceito, os fundamentos dos princípios sistêmicos. A Teoria de Sistemas, por sua vez, impregna-se do conceito de organização, na medida em que um sistema é o todo organizado, constituindo-se na possibilidade técnica e operacional de integração de partes, intercambiadas e interdependentes. Ou, na visão de Walter Buckley (2), o sistema é uma entidade concreta ou abstrata, que reúne componentes que se relacionam mutuamente. Uma característica fundamental do sistema é, pois, o elemento organizacional que lhe é intrínseco, pelo que se infere que o todo, pela Teoria de Sistemas, é maior que a soma de suas partes, evidenciando-se, aqui, o caráter organizacional que constitui o elemento comprobatório do conceito. Ao caracterizar o sistema como entidade abstrata, Buckley pretendeu lembrar dificuldades inerentes a determinados tipos de sistemas, cujos limites são muito difíceis de ser delineados.

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A comunicao como poder nas organizaes

IntroduoPretendemos, nesta primeira parte, estabelecer uma ligao entre as variveis que organizam o conceito de empresa e os elementos condicionantes e determinantes do conceito de comunicao. Procurar-se-, ao correr das idias deste livro, apoio nas reas de Teoria de Sistemas, Sociologia e Psicologia da Administrao. evidente que, ao se tratar de um campo to amplo comoEmpresa e Comunicao,no podero ser evitadas as normais inferncias, fruto de observao direta de experincias no trato rotineiro com organizaes complexas.A empresa como sistemaComo unidade socioeconmica voltada para a produo de um bem de consumo ou servio, a empresa um sistema que rene capital, trabalho, normas, polticas, natureza tcnica. Uma empresa no apenas objetiva gerar bens econmicos, para uma relao de troca entre produtor e consumidor, mas procura tambm desempenhar papel significativo no tecido social, misso que deve cumprir qualquer que seja o contexto poltico. de alta relevncia o papel formador da empresa, dentro dos sistemas polticos, sua contribuio social, por meio da gerao de empregos, descoberta de processos, avanos tecnolgicos, enfim, seu papel de vanguarda na elaborao de estratgias, produtos e servios que resultam em progresso. Quanto a sua natureza econmica, bom enfatizar que, graas produo de bens e servios para uma relao de troca, a empresa cria as condies para se viabilizar. Conciliando aspectos sociais e econmicos, a organizao ajusta-se ao escopo para o qual foi idealizada.Outro ponto que pretendemos realar diz respeito definio de sistema. A administrao moderna h muito est se apoiando na Teoria de Sistemas, Para melhor clarificar a questo, procuremos posicionar a empresa como uma unidade dentro do vasto e complexo espectro das organizaes. Se entendemos por organizao o ordenamento, a disposio das partes que compem um todo, ou, no dizer de Talcott Parsons (1), a unidade social direcionada consecuo de metas especficas, vamos constatar na extenso do conceito, os fundamentos dos princpios sistmicos. A Teoria de Sistemas, por sua vez, impregna-se do conceito de organizao, na medida em que um sistema o todo organizado, constituindo-se na possibilidade tcnica e operacional de integrao de partes, intercambiadas e interdependentes. Ou, na viso de Walter Buckley (2), o sistema uma entidade concreta ou abstrata, que rene componentes que se relacionam mutuamente. Uma caracterstica fundamental do sistema , pois, o elemento organizacional que lhe intrnseco, pelo que se infere que o todo, pela Teoria de Sistemas, maior que a soma de suas partes, evidenciando-se, aqui, o carter organizacional que constitui o elemento comprobatrio do conceito. Ao caracterizar o sistema como entidade abstrata, Buckley pretendeu lembrar dificuldades inerentes a determinados tipos de sistemas, cujos limites so muito difceis de ser delineados.Estamos, evidentemente, tratando de sistemas abertos, que se caracterizam por formas de encadeamento e intercmbio entre as partes e o todo, circuitos de realimentao, direo para metas, mecanismos de mediao e controle, que os fazem evoluir acompanhando a dinmica social. Como exemplo, o sistema poltico, cujos limites no se confinam ao corpo de disposies, normas e instituies polticas. Sua existncia depende do sistema econmico e vice-versa. Da a dificuldade para se medir os exatos limites de um sistema. Como sistema, a empresa possui limites definidos, de um lado, pelos componentes administrativos necessrios gerao de bens e servios, de outro, recebe influncias do meio ambiente, podendo-se aduzir, por inferncia, que uma empresa no apenas resultante de componentes concretos do microssistema organizacional, mas conseqncia de foras, presses, recursos e situaes, nem sempre fceis de detectar, presentes no corpo social. Quando se organiza, pois, uma empresa, na verdade, o que est-se organizando so seus circuitos internos e externos, ajustando-os e promovendo seu intercmbio com outros sistemas.A empresa, enquanto sistema, apia-se na cooperao, analisada por Chester I. Barnard (3), por meio do que ele chama de categorias determinantes de variaes e situaes de cooperao, tais como: a) aspectos relacionados ao meio ambiente fsico; b) aspectos relacionados ao meio ambiente social; c) aspectos relacionados ao comportamento dos indivduos e d) outras variveis que podem influir nas questes de cooperao, como recursos tecnolgicos, polticas de remunerao etc.A componente cooperativa inerente ao sistema organizacional j havia sido detectada por H. Spencer (4), na sua abrangente viso do contexto social, ao lembrar que "todas as espcies so iguais na medida em que cada qual exibe cooperao entre seus componentes em benefcio do todo".Ao lado da dimenso de cooperao, lembramos a viso de M. Weber (5), que estabeleceu os princpios determinantes da legitimidade organizacional ao conceituar a burocracia. Quando edifica o arcabouo organizacional sobre uma base meramente burocrtica respeito s normas e hierarquia, culto impessoalidade, entre outros requisitos Weber confere organizao uma rigidez e uma falta de maleabilidade, que, hoje, sob certos aspectos, criam obstculos ao avano organizacional.Se juntarmos estes pensamentos viso de Etzioni (6), que estuda a legitimidade das organizaes face a trs tipos de poderes remunerativo, normativo e coercitivo teremos o quadro para radiografar a empresa sob os prismas sociolgico, psicolgico, antropolgico, bases fundamentais para a anlise da questo da comunicao. Etzioni, apesar de observar o crescente papel da comunicao na vida das organizaes, fixa-se num modelo rgido, que denota diferenas organizacionais, baseadas em tipos de poder. O poder remunerativo, que legitima a organizao pela remunerao pecuniria, o poder normativo, que cria a legitimao pela obedincia norma e o poder coercitivo, responsvel pelas coeres e castigos.Sobre esse leque de situaes, desenvolveremos nossa viso de comunicao.Comunicao como sistemaA comunicao um sistema aberto, semelhante empresa. Como sistema, a comunicao organizada pelos elementos fonte, codificador, canal, mensagem, decodificador, receptor, ingredientes que vitalizam o processo.Processo que se divide em duas etapas, a primeira, de transmisso da mensagem; a segunda, de recuperao, necessria para o controle da comunicao por parte da fonte. Ora, essa viso torna-se rgida, se se pretende estabelecer uma aproximao com o modelo matemtico-ciberntico de N. Wiener. Preferimos identificar nos elementos que formam o processo comunicacional os condicionantes sociolgicos e antropolgicos que envolvem as fontes, os codificadores, os decodificadores, os receptores. So estes fatores que esto disposio das organizaes para o ordenamento e cumprimento de metas e objetivos.Procuremos alinhar alguns aspectos. Em primeiro lugar, cabe lembrar que a organizao persegue um equilbrio entre as partes que a formam. Seu equilbrio resultante da disposio ordenada entre suas partes. Essa integrao obtida graas ao processo comunicacional. Aparece, assim, a primeira relao entre comunicao e empresa. Pode-se afirmar, em conseqncia, que quando se organiza uma empresa, como bem lembra Lee Thayer (7), na verdade est-se organizando o processo de comunicao entre suas partes. A comunicao, enquanto processo, d vida, por meio do encadeamento das partes, empresa. Aceitando-se a premissa, pode-se extrair a concluso: uma empresa se organiza, se desenvolve, enfim, sobrevive, graas ao sistema de comunicao que ela cria e mantm e que responsvel pelo envio e recebimento de mensagens de trs grandes sistemas: 1) o sistema sociopoltico, onde se inserem os valores globais e as polticas do meio ambiente; 2) o sistema econmico-industrial, onde se inserem os padres da competio, as leis de mercado, a oferta e a procura; e 3) o sistema inerente ao microclima interno das organizaes, onde esto estabelecidas as normas e polticas necessrias s operaes empresariais. Trazendo informaes desses trs sistemas ou enviando informaes para eles, o processo comunicacional estrutura as convenientes ligaes entre o microssistema interno e o macrossistema social, estuda a concorrncia, analisa as presses do meio ambiente, gerando as condies para o aperfeioamento organizacional.A partir dessa anlise, pode-se aprofundar o entendimento da comunicao, pesquisando-se suas mltiplas perspectivas conceituais, extraindo-se de cada conceito uma experincia para a administrao. Por exemplo, se se quer isolar o fenmeno comunicacional sob o prisma meramente sociolgico, buscar-se-o fundamentos na teoria de formao dos grupos, na teoria de formao da opinio pblica, momento em que importantes questes afloram, entre elas, por exemplo, a situao das lideranas informais, os problemas gerados pela temida rede de boatos, os freqentes rudos originados pela comunicao formal, os processos de organizao das chamadas relaes solidrias. O processo da comunicao est igualmente imbricado sociocultura organizacional, e nesse caso, o objeto de anlise se concentra sobre os elementos formadores dos climas internos, a partir da pesquisa de etnia e cultura dos tipos organizacionais, apoiando-se, portanto, em fundamentos antropolgicos. O diagnstico amplo das situaes internas, sob as perspectivas sociolgicas e antropolgicas, tarefa imprescindvel para a implantao de projetos comunicacionais. A aplicao de um modelo de comunicao calcado na cultura organizacional influi decisivamente sobre a eficcia geral da empresa. Como tcnica, a comunicao direciona naturalmente seus estudos para a procura de mensagens adequadas, corretas, oportunas, claras, concisas, precisas, que possam ser assimiladas sem rudos pelos participantes organizacionais. Para atingir tal meta, a comunicao procurar ajustar seu discurso, estudando as habilidades e disposies das fontes e receptores, a natureza tcnica dos canais,acomplexidade e/ou simplicidade dos contedos, a oportunidade e regularidade dos fluxos, o tamanho dos grupos.E, em processo de compreenso, multidisciplinar, aparecero permeados nas mensagens de comunicao, fundamentos da Lingstica, de Sociologia, Antropologia, tica, Direito etc. A comunicao , portanto, uma rea multidisciplinar, mediando os interesses dos participantes, os interesses da empresa, enquanto unidade econmica, e os interesses da administrao. Essa grande caracterstica do fenmeno comunicacional de mediao de objetivos mostra sua magnitude e importncia para o equilbrio do microclima interno. Na outra ponta do sistema, esto as vertentes comunicativas, ajustando a identidade empresarial ao meio social, processo que engloba as tarefas clssicas e bem definidas de Relaes Pblicas, Publicidade, Jornalismo, Editorao, Identidade Visual e os modelos de sistemas de informao.Comunicao como poder expressivoSe alguns poderes legitimam a empresa, a comunicao exerce igualmente um certo e grande poder. A propsito lembramos o pensamento de Karl Deutsch (8), que mostra o poder como a possibilidade de uma pessoa ou uma entidade gerar influncia sobre outrem. A comunicao, que, enquanto processo, transfere simbolicamente idias entre interlocutores, capaz de, pelo simples fato de existir, gerar influncias. E mais: exerce, em sua plenitude, um poder que preferimos designar depoder expressivo,legitimando outros poderes existentes na organizao, como o poder remunerativo, o poder normativo e o poder coercitivo. oportuno lembrar que as normas, o processo de recompensas e os sistemas de coero existentes nas organizaes, para se legitimarem, passam, antes, por processos de codificao e decodificao, recebem tratamento ao nvel do cdigo lingstico, assumindo, ao final, a forma de um discurso que pode gerar maior ou menor aceitao pelos empregados. A comunicao, como processo e tcnica, fundamenta-se nos contedos de diversas disciplinas do conhecimento humano, intermedia o discurso organizacional, ajusta interesses, controla os participantes internos e externos, promove, enfim, maior aceitabilidade da ideologia empresarial. Comopoder expressivo,exerce umafuno-meioperante outrasjunces-fimda organizao. Nesse sentido, chega a contribuir para a maior produtividade, corroborando e reforando a economia organizacional.O poder expressivo das empresas viabiliza o processo burocrtico, adicionando elementos expressivos, emotivos e inferncias s rgidas posturas hierrquicas, e tornando o ato de administrar no apenas uma relao mecnica entre posies do organograma, mas uma relao social positiva dentro da viso de que o trabalho um bem dignificante e de que a economia e a administrao no so cincias exatas mas, sobremodo, cincias humanas, temas, alis, que esto na ordem do dia das atuais questes polticas e econmicas do Brasil. Quanto ao fluxo externo, cabe alinhar, mais uma vez, a possibilidade da comunicao, utilizando-se de seus processos e tcnicas, ajustando os files de segmentos de mercado, criando e mantendo uma identidade, ampliando o esforo mercadolgico, melhorando as vendas e aperfeioando os contatos com pblicos diferenciados.So estas posies que consideramos importantes quando se pretende estabelecer uma aproximao entre a empresa e o seu sistema de comunicao. Para concluir, resta lembrar um princpio que sintetiza a idia-chave desta primeira reflexo: "Os bons administradores so aqueles que conseguem produzir significaes, tanto quanto dinheiro". As significaes so o amlgama da comunicao.

REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS1. Parsons. Talcott.O Sistema das Sociedades Modernas.So Paulo, Pioneira, 1974.2. Buckley, Walter.A Sociologia e a Moderna Teoria dos Sistemas.So Paulo, Cultrix. 1971.3. Barnard, Chester I. "As Organizaes como Sistemas Corporativos".InEtzioni. Amitai.Organizaes Complexas; Um Estudo das Organizaes em Face dos Problemas Sociais.So Paulo. Atlas, 1978.4. Spencer, H. Cit por Buckley, Walter,op. cit.5. Weber, Max.The theory of Social and Economic Organization.The Free-Press/London, Collier-MacMillan, 1964.6. Etzioni, Amitai.Anlise Comparativa de Organizaes Complexas; Sobre o Poder, o Engajamento e Seus Correlatos.Rio de Janeiro, Zahar, 1974.7. Thayer, Lee.Comunicao: Fundamentos e Processos; na Organizao, na Administrao, nas Relaes Interpessoais.So Paulo, Atlas, 1979.8. Deutsch, Karl W.Poltica e Governo.Trad. Maria Jos da Costa/Flix Matoso Miranda Mendes, Braslia, Editora Universidade de Braslia, 1979.