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  • A ATUAO DO PSICLOGO NO ENSINO PBLICO DO PARAN:

    CONTRIBUIES DA PSICOLOGIA HISTRICO-CULTURAL

    Patrcia Vaz de Lessa1

    Marilda Gonalves Dias Facci2

    RESUMO: Esta apresentao relata resultados de pesquisa realizada em 2008/2010 que objetivou identificar e analisar as prticas desenvolvidas pelos psiclogos na rede pblica do Estado do Paran e examinar como ocorre o processo de atendimento s queixas escolares no grupo investigado. Atentamo-nos, tambm, para compreender em que medida os profissionais apresentavam elementos de uma concepo crtica na forma de atuao, partindo do aporte terico da Psicologia Histrico-Cultural. Em relao aos resultados obtivemos os seguintes dados: das 350 cidades que entramos em contato, localizamos 291 cidades que tm psiclogos e considerando que existem cidades que possuem mais de um psiclogo, no total foram localizados 385. Consideramos que os profissionais vivenciam um momento de transio, pois percebemos, na pesquisa, que existe um movimento de avano nas prticas e na compreenso das queixas escolares, evidenciadas nas aes que envolvem todo o contexto escolar, que buscam superar a viso tradicional, com enfoque clnico, caminhando em direo a uma atuao que eleve em contar os determinantes histrico-culturais que produzem estas queixas. Palavras-chave: Psicologia Escolar; Psicologia Histrico-Cultural; Atuao Critica. Agncia financiadora: Fundao Araucria Apoio ao Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico do Paran. 1. INTRODUO

    A escola est em crise: evidenciamos as contradies entre uma escola que deveria

    ensinar e uma sociedade que, embora na aparncia defenda o conhecimento, na essncia nem

    sempre garante o acesso ao conhecimento a todos os alunos. Consideramos que essa situao

    traz elementos significativos para uma investigao acerca da atuao do psiclogo escolar

    frente s queixas escolares. sobre esse contexto escolar e o trabalho do psiclogo que surgiu

    o interesse pela pesquisa que foi apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Psicologia

    da Universidade Estadual de Maring, cujos resultados sero apresentados neste artigo. Nosso

    objetivo, portanto, discorrer sobre as prticas desenvolvidas pelos psiclogos na rede 1 Psicloga, Pedagoga, Especialista em Metodologia da Ao Docente, Mestre em Psicologia pela Universidade Estadual de Maring UEM. Docente do Departamento de Psicologia do Centro Universitrio Filadlfia Unifil. E-mail: [email protected] 2 Doutora em Educao Escolar pela UNESP-Araraquara, professora do Departamento de Psicologia e Programa de Ps-Graduao em Psicologia da Universidade Estadual de Maring. E-mail: [email protected].

  • pblica do Estado do Paran, alm de examinar como ocorre o processo de atendimento s

    queixas escolares no grupo investigado.

    A pesquisa que vamos relatar no artigo faz parte de um projeto de maior abrangncia,

    que teve seu incio em 2008, intitulado A atuao do psiclogo na rede pblica de educao

    frente demanda escolar: concepes, prticas e inovaes, coordenado pela Prof Dra.

    Marilene Proena Rebello de Souza da Universidade de So Paulo. A pesquisa teve com

    finalidade analisar a atuao do psiclogo escolar nos seguintes estados brasileiros: So

    Paulo, Minas Gerais, Bahia, Rondnia, Santa Catarina, Acre e Paran 3. No Paran, tivemos o

    inicio da pesquisa em 20084. No mestrado, demos continuidade pesquisa, ampliando os

    dados coletados anteriormente, passando por duas fases: os questionrios e as entrevistas.

    Ressaltamos que a analise dos dados coletados foi realizada a partir de uma

    Concepo Crtica de atuao e na Psicologia Histrico-Cultural, de base marxista, concepo

    que buscamos defender neste trabalho.

    Para este artigo, propomos a apresentao dos dados dos questionrios. No entanto,

    antes da exposio desses dados, vamos situar, sucintamente, o desenrolar acerca da histria

    da Psicologia Escolar no Brasil.

    Antunes (2007) afirma que desde os tempos da colnia no Brasil os fenmenos

    psicolgicos foram preocupao presente nas diferentes reas do saber, presente nas

    produes advindas de instituies como faculdades de medicina, hospcios, escolas e

    seminrios, fato esse que, segundo a referida autora, contribuiu para o desenvolvimento da

    Psicologia no seio dessas reas, dentre elas a medicina e a educao, fundamentalmente

    importantes para absoro dos avanos dos estudos psicolgicos na Europa.

    A relao entre a Psicologia e a Pedagogia, segundo Antunes (2007) foi influenciada

    pelo Movimento da Escola Nova e Medicina. O movimento escolanovista se deu em

    contraposio Escola Tradicional por volta de 1930, na qual pode-se observar que a

    Psicologia se faz presente enquanto fundamento, a partir das ideias defendidas por Jean

    Piaget; a Medicina, por sua vez, contribuiu para uma concepo higienista na educao. A

    Psicologia tambm colaborou dando base cientfica a Pedagogia Tecnicista, por volta de 1970

    3 A pesquisa desenvolvida na USP contou com apoio de doutorandos e bolsistas de graduao, alm da coordenao em cada Estado. Para o Estado do Paran recebemos subsdios da Fundao Araucria- Apoio ao desenvolvimento cientfico e tecnolgico do Paran. 4 A equipe responsvel pela coleta de dados no Estado do Paran era coordenada pela Prof. Dr. Marilda Gonalves Dias Facci e composta pelas seguintes pesquisadoras: Prof. Dr. Zaira de Ftima Rezende Gonzales Leal, Prof. Dr Sonia Mari Shima Barroco e por Valria Garcia da Silva - aluna do Programa de Ps-Graduao em Psicologia da Universidade Estadual de Maring.

  • e fundamentou ainda o Construtivismo, a partir do final da dcada de 1980, retomando ideias

    da Epistemologia Gentica.

    Yazlle (1997), afirma que desde o incio a psicologia declara-se comprometida com

    [...] um projeto social burgus e com as regras sociais decorrentes do capitalismo (Yazlle, p.

    14). A Psicologia foi entrando na escola para explicar como a criana aprende, e o psiclogo

    por sua vez foi pautando sua ao, guiado pela medicina e pela psicometria, viso que perdura

    em muitas intervenes do psiclogo na atualidade. Na dcada de 1960, com a Teoria da

    Carencia Cultural, o foco do trabalho estaria centrado no aspecto psicolgico no qual o olhar

    se volta para o diagnstico dos problemas dos alunos e a Psicologia, neste momento,

    explicava o fracasso escolar estritamente relacionado aos dficits dos alunos ou de sua

    condio precria de vida.

    Na dcada de 1970, segundo Maluf (2006), comeou a haver um questionamento no

    modelo de atuao dos psiclogos, descontentes com o modelo clnico que predominava, e,

    segundo a autora, buscava-se compreender [...] os determinantes histricos e sociais da

    formao e da atuao do psiclogo escolar (p. 135).

    Meira (2000) relata que foi nesse perodo que se iniciaram as discusses sobre os

    caminhos e descaminhos da Psicologia Escolar, marcando o fato com a publicao, em 1984,

    do livro Psicologia e Ideologia uma introduo crtica Psicologia Escolar, de Maria

    Helena de Souza Patto. neste momento histrico que surgiu uma viso crtica de Psicologia

    e percebeu-se no ser mais possvel ignorar a importncia e o compromisso da Psicologia em

    efetivar uma ruptura com os interesses das classes dominantes e construir novos pressupostos

    gerais para a rea e, como Machado (2010) afirma, comear a ampliar o campo e atuao para

    o processo de escolarizao, envolvendo a comunidade escolar. Neste aspecto, Proena

    (2002), ao se referir s queixas escolares, destaca que as avaliaes e intervenes realizadas,

    na grande maioria das vezes, culpabilizavam as crianas por no aprenderem, no

    considerando o processo de escolarizao que produz a queixa e no possibilitando conhecer

    os fatores multideterminados que levam ao no aprendizado. Tanto Machado como Souza

    questionam a utilizao de testes psicomtricos e entendem a necessidade de superar essa

    forma de atuao e compreenso naturalizante e individualizante dos problemas no processo

    de escolarizao.

    Nesta linha de interveno crtica, a partir da dcada de 1990, outra forma de atuao

    passa a ser desenvolvida, com base em pressupostos marxistas, pautada na Psicologia

    Histrico-Cultural, fundamentada no materialismo histrico e dialtico. Conforme enfatiza

    Meira (2000) a condio necessria para uma viso crtica implica analisar a Educao

  • inserida em uma sociedade de classes, compreender sua funo na socializao dos

    conhecimentos e considerar as mltiplas determinaes que compem o processo ensino-

    aprendizagem.

    Tanamachi e Meira (2003) definem que a Psicologia desenvolvida a partir do

    Materialismo Histrico Dialtico marcada por princpios que compreendem o mundo

    objetivo como histrica e socialmente determinado e que o indivduo deve ser compreendido

    a partir das relaes sociais, ou seja, relaes materiais de produo. A escola tem que primar

    pelo processo de humanizao, pois como afirma Leontiev (1978), pela educao que o

    homem se humaniza, isto , o homem precisa se apropriar dos bens culturais para se tornar

    humanizado. Vigotski (2000) deixa claro o quanto aprendizagem promove o desenvolvimento

    das funes psicolgicas superiores, tais como memria lgica, abstrao, ateno

    concentrada, entre outras funes. Para o autor, a escola deve trabalhar com conhecimentos

    cientficos e neste processo, conforme anuncia Facci (2004b), o professor faz a mediao

    entre o conhecimento curricular e o aluno, provocando transformaes nas funes

    psicolgicas superiores dos alunos e, consequentemente, na forma de conhec