A atuação do programa de financiamento carta de crédito Caixa no mercado imobiliário

172
ALINE AMARAL DE SOUSA A ATUAÇÃO DO PROGRAMA DE FINANCIAMENTO CARTA DE CRÉDITO CAIXA NO MERCADO IMOBILIÁRIO Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional – IPPUR/UFRJ Rio de Janeiro 2006

description

A atuação do programa de financiamento carta de crédito Caixa no mercado imobiliário

Transcript of A atuação do programa de financiamento carta de crédito Caixa no mercado imobiliário

  • AALLIINNEE AAMMAARRAALL DDEE SSOOUUSSAA

    AA AATTUUAAOO DDOO PPRROOGGRRAAMMAA DDEE FFIINNAANNCCIIAAMMEENNTTOO

    CCAARRTTAA DDEE CCRRDDIITTOO CCAAIIXXAA NNOO MMEERRCCAADDOO IIMMOOBBIILLIIRRIIOO

    IInnssttiittuuttoo ddee PPeessqquuiissaa ee PPllaanneejjaammeennttoo UUrrbbaannoo ee RReeggiioonnaall IIPPPPUURR//UUFFRRJJ

    Rio de Janeiro 2006

  • AALLIINNEE AAMMAARRAALL DDEE SSOOUUSSAA

    AA AATTUUAAOO DDOO PPRROOGGRRAAMMAA DDEE FFIINNAANNCCIIAAMMEENNTTOO

    CCAARRTTAA DDEE CCRRDDIITTOO CCAAIIXXAA NNOO MMEERRCCAADDOO IIMMOOBBIILLIIRRIIOO

    Dissertao apresentada ao Curso de Mestrado do Programa de Ps-Graduao em Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ, como parte dos requisitos necessrios obteno do grau de Mestre em Planejamento Urbano e Regional. Orientador: Prof. Dr. Adauto Lcio Cardoso Doutor em Planejamento Urbano - USP

    Rio de Janeiro 2006

  • AALLIINNEE AAMMAARRAALL DDEE SSOOUUSSAA

    AA AATTUUAAOO DDOO PPRROOGGRRAAMMAA DDEE FFIINNAANNCCIIAAMMEENNTTOO

    CCAARRTTAA DDEE CCRRDDIITTOO CCAAIIXXAA NNOO MMEERRCCAADDOO IIMMOOBBIILLIIRRIIOO

    Dissertao apresentada ao Curso de Mestrado do Programa de Ps-Graduao em Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ, como parte dos requisitos necessrios obteno do grau de Mestre em Planejamento Urbano e Regional. Orientador: Prof. Dr. Adauto Lcio Cardoso Doutor em Planejamento Urbano - USP

    Aprovado em: ____________________________________ Prof. Dr. Adauto Lcio Cardoso Orientador Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional - UFRJ ____________________________________ Prof. Dra. Ana Clara Torres Ribeiro Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional - UFRJ ____________________________________ Prof. Dr. Jos Agostinho Anachoreta Leal Universidade Cndido Mendes - UCAM

  • Agradecimentos

    A Deus, por mais essa oportunidade.

    Ao Csar, pela presena e compreenso de sempre.

    Aos meus pais, pelo grande apoio.

    Ao Professor Adauto, pela orientao e pela ajuda na hora certa.

    Aos Professores Agostinho, Ana Clara e Luiz Csar, pela participao nas bancas

    examinadoras.

    Aos Professores do IPPUR, pela ajuda no perodo de licena maternidade.

    Aos colegas da turma do mestrado 2004, pelo carinho.

    Ao Aser Cortines, pelas longas conversas e explicaes.

    Luciana Costa e Rodrigo Ucha, por toda ajuda e mais um pouco.

    Aos amigos da Caixa, em especial Vera Escudero e Jeanine Claper, que possibilitaram a

    conciliao do meu trabalho com o estudo.

  • Para um nmero considervel de pessoas, o importante, nos dias

    atuais, ter Crdito, seja ele qual for, porque crdito tambm

    sinnimo de confiana. Leoni (1997) confima essa crena: Credere

    palavra latina que significa acreditar, ou seja, confiar; forma de

    obter recursos para destinar a algum empreendimento ou atender a

    alguma necessidade.

    Para Schrickel (1995), o conceito de crdito mais amplo: Crdito

    todo ato de vontade ou diposio de algum de destacar ou ceder,

    temporariamente, parte do seu patrimnio a um terceiro, com a

    expectativa de que esta parcela volte a sua posse integralmente,

    depois de decorrido o tempo estipulado.

    Silva, J. (1997), trata o conceito de crdito num sentido mais restrito e

    especfico: Em um banco, que tem a intermediao financeira como

    sua principal atividade, o crdito consiste em colocar disposio do

    cliente (tomador de recursos) certo valor sob a forma de emprstimo

    ou financiamento, mediante uma promessa de pagamento numa data

    futura.

  • Resumo Trata-se da investigao da atuao do Programa de financiamento Carta de Crdito Caixa no mercado imobilirio. A idia central verificar como o Programa est inserido no mbito da produo e comercializao de imveis - novos e usados - e em que sentido essas operaes de financiamento influenciam e so influenciadas pela dinmica do mercado que nesse caso, devido s caractersticas do Programa, um mercado voltado para as classes mdia e alta, onde em muitos casos a convergncia de interesses de distintos capitais nutre a especulao imobiliria e contribui para a valorizao fundiria. Palavras-chave: financiamento imobilirio, Caixa Econmica Federal, mercado imobilirio

  • Abstract This is a study of the Caixas Letter of Credit Financing Program in the real estate market. The main idea is to find out how the Program fits in the production and commercialization of properties new and used and how these financing operations influence and are influenced by the markets dynamic which in that case, due to the Programs characteristics, is directed to the medium and high classes, which in many cases the convergence of interests of distinct funds sustains the real estate speculation and contributes to the landed property valorization. Key-words: real estate financing, Caixa Econmica Federal, real estate

  • Lista de Ilustraes

    Grfico 1.1 Dficit habitacional urbano segundo as faixas de renda familiar em salrios mnimos 23

    Grfico 1.2 SFH Financiamentos Habitacionais nmero de unidades 28

    Figura 1.1 Segmentos de atuao da CAIXA 39

    Figura 1.2 Desenvolvimento Urbano diagnstico Brasil 41

    Grfico 1.3 Financiamentos CAIXA unidades contratadas at 2005 43

    Figura 2.1 Fluxograma Aquisio de Imvel Carta de Crdito Caixa 79

    Figura 3.1 Fluxograma Modelagem da Cadeia Produtiva da Construo Civil no Brasil: produo e comercializao de unidades habitacionais 85

    Grfico 3.1 Motivos de rejeio de solicitaes de financiamento imobilirio 92

    Grfico 3.2 Total de financiamentos habitacionais concedidos no Brasil 114

    Grfico 3.3 Bancos conhecidos como concessores de financiamento imobilirio 114

    Grfico 4.1 Nmero de bairros por regio contratos CC Caixa Municpio do Rio de Janeiro 1996 a 2006 132

    Grfico 4.2 Contratos CC Caixa Municpio Rio de Janeiro por regio 1996 a 2006 132

    Grfico 4.3 Contratos CC Caixa por bairro em cada regio Municpio do Rio de Janeiro 1996 a 2006 133

    Grfico 4.4 Padro CAIXA dos imveis CC Caixa por regio Municpio do Rio de Janeiro 1996 a 2006 137

  • Lista de Tabelas

    Tabela 1.1 Famlias residentes em domiclios particulares por classes de rendimento mensal de todas as fontes da pessoa de referncia da famlia 25

    Tabela 1.2 Indicadores de Crdito Imobilirio evoluo do saldo das contas de poupana SBPE 48

    Tabela 1.3 SBPE Financiamentos Imobilirios Nmero de unidades e valores contratados 49

    Tabela 1.4 SBPE Operaes contratadas com recursos de caderneta 49

    Tabela 2.1 Enquadramento CC FGTS Geral 54

    Tabela 2.2 Enquadramento CC FGTS Regies Metropolitanas RJ, SP e DF 54

    Tabela 2.3 Enquadramento CC FGTS Operaes Especiais 55

    Tabela 2.4 Programa CC Caixa Aquisio de Imvel Residencial Caracterizao ao longo do tempo 69

    Tabela 3.1 Desafio da Caixa para habitao em 2006 Crdito imobilirio Execuo oramentria Exerccio 2006 84

    Tabela 3.2 Inadimplncia CC Caixa Total pas acima de 60 dias 99

    Tabela 3.2 Inadimplncia CC Caixa Total pas acima de 90 dias 99

    Tabela 3.3 Imvel novo e usado CC Caixa Total pas Investimentos quantidade e valor 111

    Tabela 3.3 Imvel novo e usado CC Caixa Total pas Custo mdio por unidade 111

    Tabela 3.4 Linhas de Crdito Habitacional 116

    Tabela 3.5 Simulador de Evoluo Contrato CC Caixa 117

    Tabela 4.1 Contratos CC Caixa Municpio do Rio de Janeiro 1996 a 2006 128

    Tabela 4.2 Contratos CC Caixa por bairro em cada regio Municpio do Rio de Janeiro 1996 a 2006 129

    Tabela 4.3 Padro CAIXA dos imveis comercializados perfil dos imveis 135

    Tabela 4.4 Preos de venda de imveis no Rio de Janeiro 139

    Tabela 4.5 A evoluo dos contratos CC Caixa no Municpio do Rio de Janeiro Investimentos realizados em habitao quantidade e valor 149

    Tabela 4.5 A evoluo dos contratos CC Caixa no Municpio do Rio de Janeiro Investimentos custo mdio por unidade 149

  • Tabela 4.6 A evoluo dos contratos CC Caixa no Estado do Rio de Janeiro Investimentos realizados em habitao quantidade e valor 150

    Tabela 4.6 A evoluo dos contratos CC Caixa no Estado do Rio de Janeiro Investimentos custo mdio por unidade 150

    Tabela 4.7 A evoluo dos contratos CC Caixa no Brasil Investimentos realizados em habitao quantidade e valor 151

    Tabela 4.7 A evoluo dos contratos CC Caixa no Brasil Investimentos custo mdio por unidade 151

    Tabela 4.8 A evoluo dos contratos CC FGTS no Brasil Investimentos realizados em habitao quantidade e valor 152

    Tabela 4.8 A evoluo dos contratos CC FGTS no Brasil Investimentos custo mdio por unidade 152

  • Lista de Abreviaturas e Siglas

    ABECIP Associao Brasileira das Entidades de Crdito Imobilirio e Poupana

    ADEMI Associao de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobilirio

    BACEN Banco Central do Brasil

    BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social

    BNH Banco Nacional da Habitao

    CAIXA Caixa Econmica Federal

    CBIC Cmara Brasileira da Indstria da Construo Civil

    CC CAIXA Carta de Crdito CAIXA

    CC FGTS Carta de Crdito Fundo de Garantia por Tempo de Servio

    CCI Cdula de Crdito Imobilirio

    CIBRASEC Companhia Brasileira de Securitizao

    CMN Conselho Monetrio Nacional

    COHAB Companhia Estadual de Habitao

    CRECI Conselho Regional de Corretores de Imveis

    CRI Certificado de Recebveis Imobilirios

    CVM Comisso de Valores Mobilirios

    EN Escritrio de Negcios da Caixa

    FAR Fundo de Arrendamento Residencial

    FAT Fundo de Amparo ao Trabalhador

    FDS Fundo de Desenvolvimento Social

    FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Servio

    FHA Federal Housing Administration

    FHLMC Federal Home Loan Mortgage Corporation

    FNMA Federal National Mortgage Association

  • GECRI Gerncia Nacional de Crdito Imobilirio da CAIXA

    GEURB Gerncia Nacional de Servios em Desenvolvimento Urbano da CAIXA

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    IGPM ndice Geral de Preos de Mercado

    IGP-DI ndice Geral de Preos Disponibilidade Interna

    INCC ndice Nacional de Custo da Construo

    ITBI Imposto sobre Transferncia de Bens Imveis

    OGU Oramento Geral da Unio

    PBQP-h Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade do Habitat

    PIB Produto Interno Bruto

    PV Ponto de Venda

    SAC Sistema de Amortizao Constante

    SACRE Sistema de Amortizao Crescente

    SBPE Sistema Brasileiro de Poupana e Emprstimo

    SECOVI Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locao e Administrao de Imveis

    SFH Sistema de Financiamento Habitacional

    SFI Sistema de Financiamento Imobilirio

    SIAPC Sistema de Avaliao de Pesquisa de Crdito

    SINDUSCON Sindicato da Indstria da Construo Civil

    SIRIC Sistema de Risco de Crdito da CAIXA

    SMF-RJ Secretaria Municipal de Fazenda do Rio de Janeiro

    SUHAB Superintendncia Nacional de Habitao da CAIXA

    SUDUP Superintendncia Nacional de Parcerias e Apoio ao Desenvolvimento Urbano

    SUREP Superintendncia Nacional de Repasses da CAIXA

    VIURB Vice-Presidncia de Desenvolvimento Urbano e Governo da CAIXA

  • Hiptese

    A principal hiptese a ser verificada no estudo em questo a de que o Programa de

    Financiamento Carta de Crdito Caixa tem uma relevncia significativa no mercado de

    crdito imobilirio voltado para as classes mdia-alta e alta, com uma certa influncia nos

    outros programas de financiamento semelhantes no mercado.

    Uma hiptese secundria a de que o aumento do nmero de operaes de financiamento

    imobilirio faz crescer a demanda especulativa de imveis em reas especficas, nas quais o

    valor da terra elevado e onde h liquidez nas operaes imobilirias como na maior parte

    das regies onde so efetuadas as contrataes do Programa Carta de Crdito Caixa (cujas

    transaes esto inseridas, em sua maioria, em um contexto de alto valor especulativo).

  • Sumrio

    INTRODUO 14

    1. UMA BREVE REFLEXO SOBRE O FINANCIAMENTO HABITACIONAL NO BRASIL E A DINMICA IMOBILIRIA NO MBITO DO MERCADO 191.1 A IMPORTNCIA DA HABITAO NO CONTEXTO DO GRUPO FAMILIAR 201.2 O SFH E A EXPERINCIA DO BNH NO FINANCIAMENTO HABITACIONAL NO BRASIL 261.3 O CONSUMO DO ESPAO VIA MERCADO IMOBILIRIO E O PROCESSO DE VALORIZAO/DESVALORIZAO INTRA URBANA 311.4 A LGICA DA INCORPORAO IMOBILIRIA E OS PADRES DE ACUMULAO CAPITALISTA NAS ESTRUTURAS ESPACIAIS 341.5 A ATUAO DA CAIXA NO FINANCIAMENTO HABITACIONAL 391.6 ALGUMAS CONSIDERAES SOBRE O FINANCIAMENTO HABITACIONAL ATUAL 46

    2. O PROGRAMA DE FINANCIAMENTO CARTA DE CRDITO CAIXA 512.1 ANTECEDENTES E CRIAO DO CC CAIXA 522.2 O SFI SISTEMA FINANCEIRO IMOBILIRIO 562.2.1 A Companhia Brasileira de Securitizao 622.3 CARACTERIZAO DO CC CAIXA 662.4 AQUISIO DE IMVEL RESIDENCIAL OU COMERCIAL NOVO OU USADO - A PRINCIPAL MODALIDADE 702.5 OUTRAS MODALIDADES DO PROGRAMA 732.5.1 Construo em terreno prprio ou aquisio de terreno e construo de imvel residencial ou comercial 732.5.2 Reforma e ou ampliao de imvel residencial ou comercial 742.5.3 Aquisio de lote urbanizado residencial ou comercial 762.6 A OPERACIONALIZAO DO PROGRAMA PELA CAIXA 772.7 A INTERRUPO TEMPORRIA PROBLEMAS COM A FONTE DE RECURSOS 80

    3. ASPECTOS RELEVANTES DO CC CAIXA E DO MERCADO IMOBILIRIO 823.1 FINANCIAMENTO PARA CLASSES MDIA E ALTA O PBLICO ALVO DO CC CAIXA 833.1.1 Anlise de crdito dos candidatos a financiamento 863.1.2 O risco de inadimplncia e as possibilidades de ocorrncia de pr-pagamentos 933.2 A INFLUNCIA DO MERCADO SECUNDRIO 1003.3 O EFEITO DA DINMICA ECONMICA SOBRE O PROGRAMA CC CAIXA 1023.4 O FINANCIAMENTO DE IMVEIS NOVOS E USADOS - EXISTEM DIFERENAS? 1083.5 UMA COMPARAO DO CC CAIXA COM OS PROGRAMAS SIMILARES DO MERCADO 1123.6 OS FINANCIAMENTOS DIRETOS COM AS INCORPORADORAS - UM PROBLEMA? 121

    4. O CASO DO RIO DE JANEIRO: UMA AVALIAO DO CC CAIXA NA CAPITAL CARIOCA 1244.1 REAS ONDE H UMA MAIOR UTILIZAO DO CC CAIXA 1254.2 AS PREFERNCIAS DOS BENEFICIRIOS - O PERFIL MDIO DOS IMVEIS 1344.3 O PROCESSO DE AVALIAO DOS IMVEIS 1404.4 A EVOLUO DO NMERO DE CONTRATOS AO LONGO DOS ANOS 144

    CONCLUSO 153

    GLOSSRIO 160

    REFERNCIAS 166

    ANEXO 169

  • 14

    INTRODUO

    Em 1940 dois teros da populao brasileira vivia em reas rurais. A partir dessa dcada,

    iniciou-se um rpido processo de industrializao e urbanizao, acelerados nas dcadas de 50

    e 60, sem um planejamento das cidades, da infra-estrutura e de um sistema de financiamento

    habitacional. Esta uma importante causa do crescimento desordenado das cidades e do

    surgimento de inmeras favelas, que aos poucos foram sendo consolidadas.

    Hoje, o Brasil possui aproximadamente 183 milhes de habitantes, com uma taxa de

    urbanizao de 82%, sendo que 40% da populao reside em reas metropolitanas, que

    correspondem a 2% do territrio nacional.1 A urbanizao acelerada, aliada fragilidade dos

    processos de planejamento e uma estrutura de distribuio de renda da populao bastante

    desigual, resultou em uma ocupao desordenada das cidades e na fragmentao do tecido

    urbano e social.

    Alm disso, a legislao urbana freqentemente impe regras dissociadas da realidade, com

    padres e custos raramente apropriados populao, restando aos pobres solues

    individuais, espontneas, que em grande parte das vezes comprometem o meio ambiente

    urbano, bem como a qualidade de vida e a segurana desta populao. As ocupaes

    espontneas de reas da cidade tm origem, por um lado, na existncia de grande percentual

    de populao em extrema pobreza, situao que no lhes permite acesso ao mercado formal

    de moradias e conseqentemente ao sistema de financiamento habitacional e por outro

    lado, na existncia de parcelas de terreno urbano, de propriedade pblica ou privada,

    desocupadas.

    Embora o mercado imobilirio formal no abranja a totalidade dos imveis no Brasil (por

    exemplo, no Rio de Janeiro 33% dos imveis esto na informalidade2), ele ser a nossa

    referncia no presente trabalho. O mercado imobilirio o mecanismo social de coordenao

    das decises individuais de localizao e uso do solo urbano, de forma que desta coordenao

    surge uma cidade cujo solo urbano (ou deveria ser) utilizado da forma mais eficiente. Cabe a

    1 Fonte: IBGE, censo 2000. 2 Fonte: IPP - Instituto Pereira Passos Secretaria Municipal de Urbanismo PCRJ, 2000 (considerando-se o n de domiclios particulares permanentes do IBGE, como o universo de domiclios formais e informais do Municpio e subtraindo-se o cadastro do IPTU residencial desse universo, obtm-se um parmetro de medida do estoque imobilirio informal).

  • 15

    esse mercado conciliar a liberdade de ao individual com a eficincia no uso dos recursos da

    sociedade. Temos assim, a metfora do mercado imobilirio como sendo a mo invisvel

    urbana que promove a cidade eficiente.

    Nos modelos tradicionais da economia urbana, a estrutura residencial o produto das decises

    autnomas e independentes dos participantes do mercado fundirio e imobilirio. O critrio de

    deciso familiar da localizao dos seus domiclios formulado a partir da escolha (trade off)

    entre o consumo de acessibilidade (proximidade a certas externalidades urbanas) e o

    consumo de quantidades de solo urbano (ABRAMO, 2002).

    Os sistemas de financiamento, que so instrumentos de regulao do regime urbano, possuem

    uma relevncia bastante considervel, posto que os mesmos so estratgicos para a

    estruturao e a consolidao do mercado imobilirio urbano capitalista. Esses sistemas

    institucionalizam uma lgica de funcionamento do mercado imobilirio na qual a

    determinao dos preos dos imveis depende em larga escala das estratgias de atuao dos

    capitais de promoo e do volume de crdito que alimenta o ciclo de financiamento da

    produo imobiliria.

    As opes de financiamento influenciam o tempo de ocupao e a transformao do solo

    urbano. Pode-se afirmar tambm que as diferentes formas de financiamento se articulam com

    as classes ou fraes de classes sociais, produzindo um espao diferenciado e segregado na

    cidade.

    O estabelecimento de um mercado ativo de crdito imobilirio em geral e o de

    financiamento habitacional em particular tem sido foco de crescente preocupao dos

    governos e vem fazendo parte das prioridades de polticas pblicas em vrios pases em

    desenvolvimento (COSTA, 2004).

    A explicao para tal preocupao se baseia tanto nos ganhos de bem-estar associados a um mercado de financiamento habitacional eficaz, como nos efeitos multiplicativos que seu desenvolvimento insere em termos de crescimento da renda e do emprego. (COSTA, 2004)

  • 16

    No Brasil, a primeira metade da dcada de 90 foi marcada por uma crise no financiamento no

    mercado formal de habitaes. Os financiamentos pblicos para a compra de imveis

    residenciais foram praticamente suspensos entre a segunda metade da dcada de 80 e meados

    da dcada de 90, causando uma grande retrao na produo de novas moradias para diversas

    camadas da populao (populares, mdias e altas).

    Uma das resultantes do encolhimento do sistema formal de financiamento de imveis foi uma

    enorme desintermediao financeira do setor. As construtoras e incorporadoras no tiveram

    outra escolha seno o oferecimento de financiamentos diretos aos seus compradores, por meio

    do parcelamento do preo de venda dos imveis ou modelos de autofinanciamento baseados

    em consrcios. Tais solues nasceram tmidas e desacreditadas pelo mercado, mas com o

    passar do tempo e com a criatividade dos empresrios da construo civil, passaram

    efetivamente a ocupar o espao deixado pelo sistema financeiro (ABECIP, 2004).

    A partir de 1995, com a estabilizao monetria, reduziu-se o grau de incerteza do mercado,

    sendo possveis operaes de crdito a prazos mais longos - maior facilidade para as

    operaes de financiamentos imobilirios. Nessa poca inicia-se uma reestruturao mais

    consistente do setor habitacional. Os efeitos da crise econmica sobre a produo imobiliria

    empresarial reduziram-se em funo do controle da inflao, do retorno do financiamento

    pblico para os adquirentes de imveis atravs da Caixa Econmica Federal, bem como do

    financiamento pelos bancos privados, que intensificaram seus investimentos no setor

    imobilirio.

    Atualmente existem dois sistemas que regem os financiamentos imobilirios no Brasil: o

    Sistema Financeiro de Habitao SFH, que foi criado na dcada de 60 passando por vrios

    ambientes econmicos e sofrendo perdas em conseqncia de polticas mal elaboradas; e o

    Sistema Financeiro Imobilirio SFI, que foi criado em 1997 e introduziu a Alienao

    Fiduciria de Bens Imveis.

    O objeto de anlise desse trabalho o Programa Carta de Crdito Caixa CC Caixa, que um

    programa de financiamento formatado pela Caixa Econmica Federal CAIXA principal

    agente de financiamento imobilirio do pas baseado no SFI e destinado s camadas de

    renda mdia e alta da populao, que teve incio em 1994. Devido ao perfil do pblico-alvo

  • 17

    do Programa, as operaes de crdito no mbito do CC Caixa geralmente referem-se a

    imveis localizados nas reas mais privilegiadas das cidades.

    Vale ressaltar que existe uma hierarquizao dos lugares atravs do preo pago para se ter

    acesso determinada localizao no urbano e que alguns sub-setores do setor imobilirio

    possuem maior poder de atrao do capital imobilirio, principalmente os ligados a

    empreendimentos residenciais de alto padro e edifcios comerciais para as classes mais

    abastadas, cuja caracterizao permite o enquadramento nas operaes de financiamento do

    Programa Carta de Crdito Caixa.

    As formas mais sofisticadas de mobilizao do capital financeiro, que garantem os recursos

    para a produo capitalista no setor imobilirio, somente so acessveis s camadas da

    populao de maior renda, sendo que as parcelas do mercado imobilirio com ligaes mais

    intensas com o setor financeiro podem apropriar-se das reas mais valorizadas da cidade,

    reas que possuem melhores condies de infra-estrutura e de equipamentos urbanos.

    A grande dependncia da produo habitacional com relao ao financiamento um fator que

    incentiva a segmentao do mercado habitacional, com efeitos sobre o urbano.

    A sofisticao da captao* de recursos um elemento que amplia o poder dos grandes

    capitais dos setores que atendem populao de maiores rendimentos, possibilitando sua

    atuao nas reas mais valorizadas da cidade, cujo acesso torna-se cada vez mais exclusivo.

    A idia central do trabalho investigar a atuao do Programa de financiamento Carta de

    Crdito Caixa no mercado imobilirio, verificando como o Programa est inserido no mbito

    da produo e comercializao de imveis e em que sentido essas operaes de financiamento

    influenciam e so influenciadas pela dinmica do mercado que nesse caso, devido s

    caractersticas do Programa, um mercado voltado para as classes mdia e alta, onde em

    muitas vezes a convergncia de interesses de distintos capitais nutre a especulao imobiliria

    e contribui para a valorizao fundiria.

    Para tanto, busca-se inicialmente, no Captulo I, contextualizar o tema por meio de uma breve

    reflexo sobre o financiamento habitacional no Brasil e a dinmica imobiliria no mbito do

    mercado, onde so abordadas questes acerca do consumo do espao na cidade e dos padres

  • 18

    de acumulao capitalista. No Captulo II, feita uma apresentao do Programa Carta de

    Crdito Caixa, focando a sua formatao, seus fundamentos, modalidades, fonte de recursos e

    operacionalizao. No Captulo III faz-se uma anlise dos aspectos relevantes do CC Caixa e

    do mercado imobilirio, onde tratada a questo do financiamento para as classes de renda

    mais alta, a influncia do sistema econmico sobre o Programa e apresentada uma

    comparao do CC Caixa com outros programas de financiamento similares, existentes no

    mercado. Por fim, no Captulo IV, apresentado o estudo de caso do Rio de Janeiro,

    avaliando o Programa CC Caixa na cidade.

    Sabemos que o momento atual de reestruturao das formas de financiamento habitacional,

    pois infelizmente as solues de mercado hoje atendem apenas a uma pequena parcela da

    populao. No entanto, o objeto desse trabalho est relacionado a essa parcela, que embora

    seja reduzida quando comparada totalidade populacional, demanda uma produo especfica

    de espao, que significativa na cidade.

    Cabe ainda dizer que nos ltimos anos, um fator que vem contribuindo para o aquecimento do

    mercado imobilirio nas reas mais valorizadas da cidade uma relativa reduo de produtos

    ofertados pelo mercado financeiro em funo da estabilizao monetria. O mercado

    imobilirio urbano aparece como uma opo de investimento dos capitais financeiros que

    passam a oferecer crdito habitacional como um produto capaz de concorrer com as outras

    opes oferecidas pelo mercado (ABECIP, 2002).

    Informamos que ao longo do texto aparecem algumas palavras e expresses seguidas de

    asterisco (*), o que indica que existe uma explicao para o termo no glossrio, na pgina

    160.

  • 19

    1. UMA BREVE REFLEXO SOBRE O FINANCIAMENTO HABITACIONAL NO BRASIL

    E A DINMICA IMOBILIRIA NO MBITO DO MERCADO

  • 20

    1.1 A IMPORTNCIA DA HABITAO NO CONTEXTO DO GRUPO FAMILIAR

    A habitao sem dvida alguma um importante fator de promoo social, que possibilita

    condies de melhoria da qualidade de vida das pessoas. Ela um elemento chave para o

    pleno exerccio da cidadania, considerando-se que quem tem sua habitao tem, entre outras

    coisas, sua individualidade preservada e maiores possibilidades de exercer um papel digno na

    sociedade ( muito comum inclusive, utilizar a habitao como um indicador social).

    O conceito da habitao compreende um conjunto de funes que se expressam na ocupao

    do espao - "o habitat", abrangendo diversas dimenses fsica, ambiental urbana, econmica

    e social, fazendo parte integrante da estrutura do meio ambiente urbano. A habitao deve

    prover o indivduo das reais condies de habitabilidade, suprindo suas necessidades bsicas e

    possibilitando um grau de acessibilidade suficiente sua integrao no contexto urbano.

    A habitao representa a expresso scio-cultural do indivduo e do grupo em que ele se insere, dentro das condies naturais locais existentes, utilizando situaes e materiais possveis e habitualmente adequados. (MYRON, 1970)

    Entre outras definies, a habitao tambm pode ser vista como a materializao dos

    direitos humanos, pois com uma moradia que o indivduo tem acesso a abrigo, saneamento,

    endereo, etc.; ou seja, a habitao essencial para uma vida digna. Sua adequao se verifica

    pela situao de habitabilidade e salubridade, condies ambientais apropriadas, espao

    suficiente, privacidade, segurana e durabilidade das construes, iluminao e ventilao,

    abastecimento de gua, esgotamento sanitrio e disposio de resduos slidos, bem como,

    acessibilidade em relao ao emprego e aos equipamentos urbanos. Assim, a habitao no

    s a edificao, mas est estendida pelos espaos urbanos por onde o indivduo circula e

    utiliza na vida diria: a rua, os acessos e as vias de circulao, a paisagem, sua relao com

    bairro e por extenso com a cidade.

    Alm disso, a habitao uma mercadoria que se difere das demais, pois engloba no seu valor

    o preo da terra, que no um bem produzido (no se reproduz), o que a encarece. O valor da

    habitao varia em funo de sua localizao, da urbanizao e da infra-estrutura disponvel

    no seu entorno, alm do acesso aos servios e bens de consumo coletivo e de aspectos sociais

  • 21

    e ideolgicos. Para assegurar as condies bsicas de vida, como infra-estrutura, sade,

    educao, transporte, trabalho e lazer, fundamental que a moradia esteja inserida no meio

    ambiente urbano adequado (COSTA, 2004).

    A necessidade de produzir a "habitao" para us-la como habitat, faz com que a mesma seja

    um produto, com valor econmico uma mercadoria; e com valor social um bem de uso.

    Muitas vezes o espao habitado passa a ser corrompido em seus valores de uso, passando a ser

    operado apenas como valor de troca. Enquanto operado como valor de troca (mercadoria), o

    espao produzido e apropriado fundamentalmente ao nvel da economia, privilegiando-se

    assim a propriedade privada e a especulao imobiliria.

    inquestionvel a funo econmica da moradia: sua produo oferece novas oportunidades

    de gerao de emprego e renda, mobiliza vrios setores da economia e influencia os mercados

    imobilirios e de bens e servios.

    Podemos afirmar tambm que a habitao um bem imprescindvel cujo custo de aquisio

    relevante qualquer que seja o nvel de renda do grupo familiar; sendo que, independentemente

    do estgio de desenvolvimento econmico, cultural e social dos pases, na maior parte deles o

    sistema se divide em quatro grandes programas e/ou pblico alvo. No Brasil, a Caixa

    Econmica Federal (rgo pblico que tem como uma de suas atribuies o desenvolvimento

    urbano) classifica esses segmentos em:

    O nvel de renda propicia condies de formao de uma poupana capaz de suprir

    esta necessidade sem ter que recorrer a financiamentos.

    Detentores de plena capacidade de pagamento, porm, no conseguem, dentro de

    um prazo aceitvel fazer face a esta demanda com poupana domstica, requerendo

    que se disponibilize recursos, a preo de mercado, respondendo pelo pleno retorno

    do capital emprestado, no requerendo subsdios de qualquer ordem.

    Possuem capacidade de pagamento, no entanto, esta apenas parcial, no sendo

    capazes de retornar, na ntegra e a preo de mercado, o capital requerido para

    aquisio de sua residncia prpria e, portanto, necessitam que uma parcela dos

    recursos lhes seja subsidiada.

  • 22

    Formado por aqueles que esto abaixo da linha de financiamento, ou seja, que

    no possuem capacidade de pagamento e, por conseguinte, no tm acesso ao

    crdito por meio de financiamentos convencionais; dependem de subsdios do

    poder pblico.

    A cultura brasileira e, inclusive a nossa Constituio Federal, impe ao Estado a obrigao de

    proporcionar condies de moradia digna a seus cidados e, portanto, a incapacidade de

    pagamento no retira das famlias o seu direito casa prpria, gerando, por conseguinte, a

    obrigao da Unio Federal de aportar no s recursos onerosos, mas tambm, subsidiar, total

    ou parcialmente, aqueles que no apresentam capacidade plena de pagamento.

    Nesse contexto, os dois primeiros segmentos supra citados no se constituem diretamente,

    pblico alvo do poder pblico, competindo a este direcionar esforos no sentido de atender

    queles que no possuem capacidade de pagamento ou que, a possuem apenas parcialmente.

    Subsidiar habitaes para os estratos sociais com menor poder aquisitivo no uma

    exclusividade de pases pobres ou em desenvolvimento e, dadas as caractersticas peculiares

    dos bens imveis que, em decorrncia de sua relevncia social e de seu valor econmico, sua

    aquisio exige sacrifcios mesmo para aqueles com melhor nvel de renda, a prtica da

    concesso de subsdios praxe, inclusive, entre os pases altamente desenvolvidos.

    Um dos grandes equvocos no que se refere concesso de subsdios habitao a

    estruturao de modelos que no apresentam equilbrio e sustentabilidade e que, na maioria

    das vezes resultam em concesso de benefcios de forma imensurada e ineficaz gerao

    presente, impedindo aes planejadas de longo prazo e gerando desequilbrios a serem pagos

    por aqueles que no tiveram acesso aos privilgios que ficaram restritos a uma pequena

    minoria.

    Na elaborao de polticas pblicas voltadas para o provimento e o financiamento de

    habitaes deve-se perseguir alternativas que proporcionem a racionalizao das aes,

    minimizem riscos*, modernizem o mercado, favoream a atuao dos diversos agentes

    econmicos e resultem na melhoria da qualidade das habitaes, conjugada com a reduo de

    custos. Neste sentido, deve-se dar tratamento diferenciado aos diferentes, tendo como foco e

  • 23

    reconhecendo a existncia de segmentos bastante distintos e, por conseguinte, implementando

    aes diferenciadas:

    Faixa de renda situada abaixo da linha de financiamento: o grande desafio a ser

    vencido, devendo-se ter como meta a expanso do acesso moradia por meio da

    utilizao de recursos oramentrios, induzindo a participao do poder pblico e

    comunidades locais, criando alternativas de financiamento no convencionais e

    fomentando a cultura da participao efetiva dos prprios beneficirios.

    Faixa de renda com capacidade parcial de pagamento: mix de funding oneroso com

    subsdios oramentrios.

    Faixa de renda com capacidade plena de pagamento: disponibilizao de recursos e

    atendimento pelo prprio mercado, buscando o mximo de desregulamentao.

    Grfico 1.1 - Dficit habitacional urbano segundo as faixas de renda familiar em salrios mnimos 2000

    Fonte: Fundao Joo Pinheiro, Dficit Habitacional no Brasil - municpios selecionados e microrregies

    geogrficas, 2 edio, abril de 2005 e Dficit Habitacional no Brasil 2000, dezembro de 2001.

    O nosso foco no presente trabalho refere-se camada da populao que possui capacidade

    plena de pagamento, pois esse o pblico para o qual se destina o Programa Carta de Crdito

    Caixa na verdade, a destinao desse programa so pessoas fsicas em geral, independente

    da faixa de renda; porm, para a viabilizao dos contratos existem pr-requisitos a serem

    82,38%

    8,93%6,13% 2,56%

    at 3 sm

    de 3 a 5 sm

    de 5 a 10 sm

    mais de 10 sm

  • 24

    obedecidos, tais como pesquisa cadastral, anlise da capacidade de pagamento, avaliao de

    risco da operao, etc., para os quais somente as camadas de maior renda obtm aprovao.

    Apresentamos na Tabela 1.1, como caracterizao do cenrio brasileiro, a distribuio das

    famlias no Pas por classes de rendimento mensal. A partir desses dados podemos concluir

    que no Brasil, apenas pouco mais de 5% das famlias tm condies de enquadramento no

    Programa CC Caixa; e na Regio Metropolitana do Rio de Janeiro, esse nmero no chega a

    10% (considerando-se que o pblico-alvo do CC Caixa so famlias com rendimento mensal

    superior a 10 salrios mnimos).

    Outra evidncia apresentada pelos dados que se seguem que mais de 75% das famlias

    brasileiras ganham at 5 salrios mnimos (dentre os quais quase 80% ganham at 3 salrios

    mnimos).

    Ou seja, embora o nosso trabalho esteja relacionado faixa populacional com plena

    capacidade de pagamento para fins de financiamento habitacional (pblico CC Caixa), a

    grande maioria da populao brasileira necessita de uma parcela de recursos subsidiada

    interveno do poder pblico sem a qual no possvel a aquisio da moradia prpria.

  • 25

    Tabela 1.1 Famlias residentes em domiclios particulares por classes de rendimento mensal

    de todas as fontes da pessoa de referncia da famlia

    Famlias residentes em domiclios particulares

    (Unidade)

    Famlias residentes em domiclios particulares

    (Percentual)

    Total 56.039.518 100,00

    At 1/2 salrio mnimo 2.788.512 4,98

    Mais de 1/2 a 1 salrio mnimo 10.473.203 18,69

    Mais de 1 a 2 salrios mnimos 14.973.424 26,72

    Mais de 2 a 3 salrios mnimos 6.919.308 12,35

    Mais de 3 a 5 salrios mnimos 7.710.539 13,76

    Mais de 5 a 10 salrios mnimos 5.160.053 9,21

    Mais de 10 a 20 salrios mnimos 2.309.595 4,12

    Mais de 20 salrios mnimos 949.639 1,69

    Sem rendimento 3.863.100 6,89

    Sem declarao 892.145 1,59

    Total 3.962.693 100,00

    At 1/2 salrio mnimo 67.755 1,71

    Mais de 1/2 a 1 salrio mnimo 430.611 10,87

    Mais de 1 a 2 salrios mnimos 903.531 22,80

    Mais de 2 a 3 salrios mnimos 574.542 14,50

    Mais de 3 a 5 salrios mnimos 667.073 16,83

    Mais de 5 a 10 salrios mnimos 507.474 12,81

    Mais de 10 a 20 salrios mnimos 272.965 6,89

    Mais de 20 salrios mnimos 97.712 2,47

    Sem rendimento 230.603 5,82

    Sem declarao 210.427 5,31

    Nota:

    1) At 2003, exclusive a populao da rea rural de Rondnia, Acre, Amazonas, Roraima, Par e Amap.2) A categoria Sem rendimento inclui as pessoas de referncia que receberam somente em benefcios.

    Fonte: IBGE - Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios, PNAD 2004.

    Brasil

    RM do Rio de Janeiro

    Brasil e Regio Metropolitana Classes de rendimento mensal de todas as fontes

    Varivel

  • 26

    1.2 O SFH E A EXPERINCIA DO BNH NO FINANCIAMENTO HABITACIONAL NO BRASIL

    O Banco Nacional da Habitao BNH foi criado em 1964 pelo Governo Federal com o

    objetivo de gerir o Sistema Financeiro da Habitao SFH, cuja premissa era viabilizar a

    construo e a aquisio da casa prpria. Com a criao do BNH surge a expectativa de

    estmulo poupana, maior absoro de mo-de-obra e desenvolvimento da indstria da

    construo civil.

    A finalidade do BNH era compatibilizar os objetivos sociais e o desempenho econmico do

    Banco atravs dos programas de habitao popular. Progressivamente o BNH tornou-se um

    banco de desenvolvimento urbano, e incorporou atividades de saneamento bsico,

    financiamento de materiais de construo, transporte e pesquisa.

    O BNH era o rgo controlador do Sistema Brasileiro de Poupana e Emprstimos SBPE,

    conjunto instituies captadoras de poupana voluntria, que financiavam investimentos

    imobilirios prioritariamente destinados s classes mdia e alta, e gestor do Fundo de Garantia

    por Tempo de Servio FGTS, responsvel por toda a poltica habitacional do governo

    federal. Ao BNH foi atribuda a funo de formatar as condies gerais dos financiamentos

    baseados no SFH; podemos citar por exemplo taxa de juros, prazo, garantias* e condies de

    pagamento (VALPASSOS, 2003).

    Os recursos para o SFH eram provenientes, principalmente de uma contribuio compulsria

    de empresrios e trabalhadores, o FGTS, institudo em 1967, e de caderneta de poupana, que

    conformaria o SBPE, responsvel pelo financiamento de imveis para a populao de

    rendimentos mdios. O SFH ento utilizou poupana compulsria (FGTS) e voluntria

    (caderneta e letra de cmbio). Tambm como componentes do SFH foram criadas as

    sociedades de crdito imobilirio, que subordinadas ao BNH, funcionavam como agentes

    financeiros do sistema, operando no financiamento para a construo, venda ou aquisio de

    unidades habitacionais.

    Nesse contexto, as medidas destinadas a facilitar a compra da casa prpria (inclusive a adoo

    de subsdios) mostraram a necessidade da interveno do poder pblico no sentido de

    viabilizar o acesso ao mercado habitacional, sobretudo para as classes populares.

  • 27

    Juntamente com o SFH foi instituda a correo monetria, indexador calculado mensalmente

    pelo Governo, que permitia o reajuste das prestaes de amortizao* e juros com a correo

    do valor monetrio da dvida. A correo monetria, alm de corrigir o valor da dvida do

    muturio, tambm era aplicada nos depsitos de caderneta de poupana, das letras

    hipotecrias e do FGTS. Tambm foram institudas as COHABs (Companhias Estaduais de

    Habitao que obtinham financiamentos com recursos do FGTS junto ao BNH) que

    coordenavam os trabalhos das agncias que participavam da construo das casas, reduzindo

    o preo das unidades produzidas (VALPASSOS, 2003).

    Logo aps a adoo do SFH houve uma grande oferta de recursos para o financiamento

    habitacional, devido s condies favorveis e atrativas das aplicaes (decorrentes da

    segurana e rentabilidade* dos depsitos em caderneta de poupana e letras imobilirias) e

    lucratividade das sociedades de crdito imobilirio, j que os muturios pagavam taxas

    superiores quelas acordadas com o BNH.

    Entretanto, com a elevao da inflao, o desequilbrio gerado pelos critrios de reajuste das

    prestaes e do principal da dvida afetou negativamente o SFH (entre 1969 e 1974 os

    investimentos em habitao popular tornaram-se escassos e decrescentes, sendo o FGTS

    utilizado prioritariamente em investimentos em outras atividades infra-estrutura, mercado

    financeiro, outros programas habitacionais, etc.).

    Aps anos de financiamentos do SFH crescentes em quantidade, o sistema entrou na fase

    crtica em 1983. Os recursos tornaram-se insuficientes para a viabilizao do

    desenvolvimento sustentvel do setor imobilirio, devido diminuio constante da renda

    domstica (que causou significativa reduo dos investimentos econmicos) e falncia dos

    mecanismos de investimento ao financiamento habitacional.

    Houve um crescimento quase que constante no nmero de financiamentos habitacionais pelo

    SFH desde a sua criao, sendo o pice em 1980, com 627 mil unidades financiadas.

    Entretanto, com a brusca elevao da inflao nos anos subseqentes, reduziu-se

    significativamente a quantidade de financiamentos, chegando a atingir uma mdia inferior a

    150 mil unidades por ano, no perodo entre 1983 e 1996 (CBIC, 2002).

  • 28

    Grfico 1.2 - SFH - Financiamentos Habitacionais - nmero de unidades Fonte: CBIC

    O SFH apresentou desempenho bastante significativo ao longo da existncia do BNH, porm,

    o sistema no foi capaz de atender plenamente populao de baixa renda. Os objetivos

    sociais e econmicos do BNH no eram coerentes entre si e foram aos poucos perdendo

    amplitude e importncia, devido sua incompatibilidade com a lgica financeira do Banco,

    que fazia concesses retrica empresarial para garantir uma certa eficcia no desempenho

    junto aos setores populares (AZEVEDO, 1996).

    O BNH no conseguiu atingir satisfatoriamente os setores de baixa renda atravs dos

    programas tradicionais (famlias com renda mensal entre um e trs salrios mnimos). Com a

    diminuio progressiva do salrio mnimo real as prestaes ficaram altas e cresceu a

    inadimplncia*, provocando a crise financeira das COHABs. A poltica adotada foi reduzir

    os investimentos para as famlias de baixa renda e aumentar as aplicaes para o mercado

    mdio (classe mdia e alta). Essa estratgia foi facilitada pelo comportamento do mercado

    imobilirio, pois com a especulao diminuram as alternativas habitacionais de segmentos da

    baixa classe mdia.

    A caracterizao scio-econmica dos muturios do BNH sofreu uma mudana qualitativa e

    passou a ser formada principalmente por famlias com rendimentos mensais superiores a trs

    SFH - Financiamentos Habitacionais

    0

    100.000

    200.000

    300.000

    400.000

    500.000

    600.000

    700.000

    1964

    1966

    1968

    1970

    1972

    1974

    1976

    1978

    1980

    1982

    1984

    1986

    1988

    1990

    1992

    1994

    1996

    1998

    2000

    Unidades Financiadas

    0%

    100%

    200%

    300%

    400%

    500%

    600%

    700%Taxa Anual de Inflao

    Recursos Inflao IPC-FIPE

  • 29

    salrios mnimos. Em virtude dessas mudanas, a inadimplncia caiu para ndices bem mais

    baixos, porm no incio da dcada de 80 ela voltou a subir, com as prestaes do BNH

    subindo acima do salrio mnimo (na dcada de 80 o pas enfrentou um perodo de

    instabilidade macroeconmica, extrema elevao da inflao com dificuldades para planos de

    longo prazo, tais como SFH e indexao de tarifas).

    Em meados da dcada de 80, devido mobilizao da opinio pblica e fortes presses sobre

    o governo, o BNH ofereceu um abono que favoreceu enormemente os muturios, porm

    agravou o dficit do SFH, e conseqentemente, a crise institucional do Banco. Nessa mesma

    poca tentaram-se vrios planos de estabilizao monetria, culminando com o Plano Real em

    1994 (cuja implantao gerou uma estabilidade monetria e boas perspectivas para o

    reaquecimento do setor imobilirio). Na rea habitacional, os financiamentos voltaram-se

    cada vez mais aos muturios ao invs das COHABs e cooperativas (AZEVEDO, 1996).

    A trajetria do BNH leva a concluir que apesar dos subsdios embutidos nos programas

    populares, a situao econmica das famlias com renda inferior a trs salrios precria e

    no suporta a contrapartida exigida dos muturios no Brasil, e em demais pases em

    desenvolvimento. Dado o problema habitacional da populao pobre, a soluo que apareceu

    foi a autoconstruo, que caracteriza-se em sua maioria por um longo perodo de tempo e por

    uma qualidade nem sempre satisfatria (o BNH iniciou ainda, a partir de 1975 vrios projetos

    alternativos em autoconstruo e destinados aos segmentos mais carentes, porm, estes

    tiveram um baixo desempenho).

    De acordo com dados do censo (IBGE), das quase 4,5 milhes de unidades habitacionais

    financiadas pelo BNH nos seus 22 anos de existncia, somente 33,5% foram formalmente

    destinadas aos setores populares. Dado que o valor mdio dos financiamentos de interesse

    social era inferior ao valor mdio dos financiamentos para as classes de renda mais elevada,

    conclui-se que uma parcela ainda menor do valor dos financiamentos foi direcionada para a

    habitao de interesse social.

    O BNH foi, sobretudo at incio dos anos 80, uma das entidades mais poderosas dos sistemas

    poltico administrativo e econmico do Brasil, pela diversidade e magnitude dos interesses

    afetados por sua atuao, que inclua entre outro, as dezenas de milhes de depositantes do

    FGTS e das cadernetas de poupana, os milhes de muturios do sistema, os governos

  • 30

    estaduais e municipais, tambm devedores do sistema, as empresas de construo civil, os

    incorporadores imobilirios, empresas pblicas de saneamento e outras entidades do Sistema

    Financeiro da Habitao.

    Dessa forma, o BNH ficou como uma espcie de "smbolo" do regime poltico que o criou e

    cuja deteriorao, em termos polticos e econmicos, esteve claramente associada ao

    agravamento dos problemas que passou a enfrentar nos anos 80, com a perda do controle da

    inflao, a conteno dos salrios, a reduo do crescimento econmico, o aumento do

    desemprego e a crise financeira do poder pblico.

    O que podemos observar que a criao do SFH e do BNH no conseguiu atender

    plenamente s necessidades habitacionais das camadas mais pobres da populao, posto que

    grande parte do financiamento de moradias destinou-se aos estratos de rendimento mdio e

    alto da populao. O BNH, porm, produziu mudanas radicais no sistema financeiro pblico

    e privado, bem como propiciou a modernizao e concentrao das empresas do ramo de

    construo civil.

    Com a instalao da Nova Repblica, era um consenso a crise do SFH e a necessidade de reestruturao do mesmo. O Governo ento decretou a extino do BNH em 1986 (quando estava longe de se alcanar consenso sobre pontos bsicos da reforma do SFH), e a incorporao das atividades do Banco CAIXA, sem porm estabelecer uma proposta clara de atuao para o setor habitacional e nenhuma soluo para os problemas existentes at ento. (AZEVEDO, 1996)

  • 31

    1.3 O CONSUMO DO ESPAO VIA MERCADO IMOBILIRIO E O PROCESSO DE

    VALORIZAO/DESVALORIZAO INTRA-URBANA

    O acesso ao espao urbano visto como a porta de entrada para a moradia definitiva. Para o

    entendimento dos mecanismos que viabilizam o acesso terra urbana e o consumo do

    espao interessante conhecer o processo das operaes de financiamento e a forma de

    funcionamento do mercado fundirio-imobilirio dentro de um tempo e espao delimitados.

    O mercado imobilirio, juntamente com a poltica urbana, um importante mecanismo de produo e regulao do processo de estruturao urbana e do espao metropolitano. Este mercado, ao longo do regime urbano-concorrencial, pode ser caracterizado como componente de uma forte concentrao fundiria urbana. (ABRAMO, 2001).

    Os valores do mercado imobilirio so afetados pelo crescimento da populao, pela expanso

    da renda e pelo movimento geral dos preos. Uma importante caracterstica do mercado

    imobilirio que as construes consomem tempo para serem completadas, o que ocasiona

    um desconto no fluxo de caixa proveniente da receita da venda das unidades. Logo, o

    montante de tempo gasto com cada projeto afeta as decises a serem tomadas.

    A literatura sobre o tema da dinmica imobiliria vem revelando empiricamente a preferncia

    dos capitais imobilirios pela produo de imveis para as famlias de maior renda (demanda

    solvvel), atraindo-as para reas onde seu lucro garantido pela transformao de seu uso.

    Por outro lado, o estoque residencial proporcionado pelo deslocamento dessas famlias,

    utilizado pelas famlias de renda inferior. A procura dos indivduos/famlias controlada pela

    avaliao do estoque habitacional, e pela informao e percepo sobre este estoque.

    Pode-se dizer que o sistema de financiamento para as classes mdia e alta fundamenta-se na

    tendncia de valorizao futura do imvel. Esse ciclo alimentado pelo sistema de poupana

    e crdito habitacional.

    O capital imobilirio atravs da lgica de mercado envolve a valorizao de certas reas da

    cidade no intuito de atrair um segmento da demanda que se dispe a comprometer um

    montante mais significativo de recursos na aquisio da moradia. Certamente, essa

  • 32

    valorizao fundiria-imobiliria tem como suporte um sistema de financiamento que

    viabilize o acesso do mesmo pblico a residncias de valores cada vez maiores.

    Para realizar seus ganhos fundirios, o capital imobilirio utiliza estratgias de ao, tais

    como a atuao de forma concentrada, delimitando reas de valorizao, e a inovao do

    produto-habitao. Essa inovao altera o padro de ocupao de toda uma rea, valorizando-

    a em relao s outras reas da cidade. Essas estratgias se traduzem em externalidades, que

    so incorporadas ao valor dos imveis, definindo assim, acesso diferenciado das famlias com

    diferentes rendimentos (PENALVA SANTOS, 1997).

    A estratgia de inovao para atrair demanda, se traduz na oferta do imvel com todos os seus

    atributos intrnsecos (caractersticas fsicas) e extrnsecos (acessibilidades que a localizao

    permite usufruir). Esses atributos representam os valores de uso do imvel, por sua condio

    essencial de abrigo do homem, como tambm representam um ativo da economia familiar, e

    sua aquisio levar em considerao a sua valorizao futura na estrutura de preos

    imobilirios na cidade. Projetos inovadores e plenos de caractersticas inovadoras representam

    diferencial competitivo no mercado (tais como heliporto, reas verdes, transporte particular de

    nibus, etc.). Essa estratgia de inovao contribui para diferenciar o novo imvel do estoque

    existente, e com isso produzir um efeito depreciador no estoque antigo, que perde parte da

    atratividade anterior, elevando a importncia das novas construes.

    A estrutura imobiliria fruto da dinmica de valorizao/desvalorizao intra-urbana,

    empreendida pelos investimentos imobilirios, que regulam o mercado e modificam o estoque

    de imveis e a estrutura de preos. Desse modo, as estratgias locacionais do capital

    imobilirio incidem em mudanas nas caractersticas das reas da cidade, produzindo efeitos

    atrativos e repulsivos, deslocando a demanda. Neste sentido, grande parte das cidades no

    Brasil se estruturam segundo um padro de urbanizao e de segregao espacial marcado por

    diferenas nas formas de ocupao e produo do espao.

    Nas reas mais valorizadas das cidades, que muitas vezes so marcadas pela escassez do solo

    urbano, encontram-se prioritariamente as classes mdia e alta, sendo que boa parcela dessa

    populao utiliza-se de operaes de financiamento para a aquisio de imveis do estoque j

    existente ou de novas produes.

  • 33

    A dinmica imobiliria tem um importante papel na estruturao do espao, via investimentos

    capazes de deslocar a demanda e influenci-la em suas decises. Essa deciso tem duas

    motivaes bsicas: acesso aos servios de habitao, e posse de um ativo que no futuro

    poder se valorizar, e viabilizar a mudana de residncia da famlia. A menor ou maior

    importncia dessas motivaes depende do tipo de famlia (renda) e de sua condio de

    ocupao no imvel anterior/atual (SMOLKA, 1994).

    Existe uma forte relao entre a dinmica imobiliria e a mobilidade residencial, onde as reas

    com maiores taxas de transao de compra e venda de imveis na cidade, so as que esto

    sendo objeto de investimentos do capital imobilirio, ou seja, esto em processo de

    valorizao com possvel transformao de sua estrutura urbana, por meio por exemplo, da

    produo de novos imveis (SMOLKA, 1994).

    De acordo com a permanncia ou o aumento da escassez relativa do solo urbano em reas

    mais valorizadas das cidades, a valorizao dos imveis nelas localizados tende a crescer. O

    que pode se dizer que existe uma coalizo de interesses por parte dos incorporadores

    imobilirios, grandes construtores e proprietrios de terra para que esse modelo de

    organizao scio-espacial se mantenha, o que j vem acontecendo, devido ao poder desses

    segmentos.

    Tal fato relaciona-se lgica de mercado que permeia os agentes de financiamento, em um

    contexto de economia de mercado em que a propriedade de terra atua como fator limitante

    aquisio da moradia em locais de melhores condies de infra-estrutura e servios urbanos.

    Pode-se observar que os agentes envolvidos na apropriao de renda da terra, tais como

    incorporadores imobilirios, construtores, proprietrios, detm um poder que controla a

    dinmica da produo e comercializao imobiliria e promove o agravamento da situao de

    segregao, j to em evidncia na maioria das cidades brasileiras esses elementos

    contribuem para a produo de um espao na cidades marcado pela fragmentao e

    hierarquizao, bem como pela segregao scio-espacial da decorrente.

  • 34

    1.4 A LGICA DA INCORPORAO IMOBILIRIA E OS PADRES DE ACUMULAO

    CAPITALISTA NAS ESTRUTURAS ESPACIAIS

    A estrutura urbana representa a segregao existente na cidade bem como demonstra a

    constante disputa pelos recursos urbanos. Podemos considerar que a localizao uma das

    caractersticas mais relevantes da terra urbana enquanto produto, tendo ela uma influncia

    direta no processo de distribuio de poder entre as classes sociais.

    A obteno de lucros pelos incorporadores devido localizao dos imveis baseada na

    renda da terra venda da relativa escassez do solo urbano. A escassez da terra em razo de

    sua localizao, considerados os usos que podem ser feitos dela, um dos fatores

    determinantes do valor que ela pode alcanar e das rendas que ela pode gerar (ABRAMO,

    2002).

    O preo que a terra, como mercadoria, pode alcanar no mercado varia em razo da qualidade

    do solo urbano enquanto suporte fsico para a produo da habitao onde se processa a

    reproduo do capital. A vizinhana, os servios e equipamentos urbanos disponveis,

    aspectos que no podem ser reproduzidos, caracterizam o espao urbano onde as rendas

    produzidas so absolutas e de monoplio, e resultam na produo da segregao social no

    espao.

    A acumulao capitalista nas estruturas espaciais, em termos urbanos, tem origem na

    valorizao do capital imobilirio - na monopolizao do acesso a uma condio

    indispensvel s atividades a serem desenvolvidas. Quanto maior for a desigualdade no

    desenvolvimento dos espaos referente distribuio de equipamentos, bens e servios, maior

    a frequncia da incorporao imobiliria na dinmica de organizao da cidade (SMOLKA,

    1994).

    O valor da propriedade imobiliria na economia pode ser definido como a renda que ela

    proporciona, capitalizada a determinada taxa de juros. O uso do solo urbano na economia

    capitalista e o seu regulamento pelo mecanismo de mercado, no qual o preo desta mercadoria

    se forma pela sua acessibilidade utilizao do espao, acabam por determinar os preos do

    mercado imobilirio pelo qual a demanda estiver disposta a pagar. Cabe ressaltar aqui a

    importncia da acumulao patrimonial das famlias adquirentes de imveis (em muitos casos

  • 35

    requerentes ao crdito imobilirio), pois esse fator tambm determinante na formao dos

    preos do mercado imobilirio.

    Um dos principais elementos que interage na produo do espao construdo o Estado, que

    alm de representar o local para articulaes dos interesses de classe, age atravs de polticas

    pblicas. J do ponto de vista das relaes econmicas, no se pode negar que a produo do

    espao construdo est associada aos processos de acumulao e suas crises.

    O Estado articula os conflitos entre as classes e setores interessados na ocupao do solo

    urbano. Ele prov na medida de seus interesses (e no das classes detentoras do poder -

    acumuladoras de capital), os equipamentos urbanos direcionando as polticas pblicas

    (BOTELHO, 2005).

    O regime de acumulao capitalista, ao determinar a formatao do espao construdo,

    segmenta a cidade produzindo reas diversificadas, umas mais aprazveis e outras nem tanto.

    Assim, para uma melhor compreenso da dinmica das mudanas espaciais faz-se necessrio

    um contnuo acompanhamento das mudanas nos quadros poltico e social. Podemos observar

    que os problemas urbanos resultam das contradies entre os interesses das classes alta e

    mdia e das camadas populares que sofrem com a organizao social e espacial imposta pelo

    capital.

    Observa-se, pois, que, do ponto de vista da distribuio e do consumo, a localizao

    imprescindvel para entender-se os efeitos da distribuio dos equipamentos urbanos (de sua

    exteriorizao) em um sistema urbano.

    Podemos analisar a gesto das estruturas espaciais urbanas (espao urbano construdo) sob os

    aspectos dos interesses neles envolvidos e do regime de acumulao. Quanto ao regime de

    acumulao, o que na verdade interfere no espao construdo a sua dinmica, ou melhor, a

    forma de se articular os interesses dos capitais e do Estado.

    Os diversos interesses de distintos capitais, do Estado e de classes sociais por regies

    especficas do territrio promove de forma crescente a especulao imobiliria e a maior

    valorizao da terra. Em relao transao imobiliria, so elementos influentes na

    valorizao dos terrenos, a singularidade de cada um, pelas suas caractersticas estruturais, e

  • 36

    as possibilidades de majorao de seu valor em funo do desenvolvimento da malha urbana

    (fatores subjetivos). Observa-se entretanto, que o papel do Estado um dos mais importantes

    no que diz respeito ordenao espacial urbana, a partir do sistema capitalista, e ainda, nos

    reflexos na formao social.

    Um dos sistemas mais desenvolvidos de produo da habitao o denominado "Promoo

    Imobiliria" (ou seja, da atividade imobiliria enquanto parte do processo da aquisio da

    habitao) que possui duas caractersticas bsicas, quais sejam: a viso da habitao como

    mercadoria e a figurao do incorporador imobilirio paralela figura do proprietrio da terra

    (considerando o fato de que para o desenvolvimento das atividades econmicas necessria

    uma base espacial e que tal recurso escasso, uma vez que no se reproduz; e necessrio

    que a cada operao imobiliria seja pago, pelo incorporador, um valor ao proprietrio pelo

    uso da terra). Esse sistema no , porm, generalizado em pases subdesenvolvidos ou em

    desenvolvimento, como o Brasil, pois ele focaliza, principalmente, os setores da populao

    que tm renda mais alta, logo, inviabiliza o acesso habitao pela maioria da populao.

    A produo de novos empreendimentos para a comercializao no mercado imobilirio feita

    sob o comando do capital de incorporao compra do terreno e execuo da obra. Cabe ao

    incorporador (de forma direta ou indireta) a obteno do financiamento e a organizao dos

    processos construtivos e comercial; ou seja, ele torna-se um dos mais importantes agentes da

    estruturao do espao na cidade, medida que participa ativamente das determinaes

    quanto ao uso do solo urbano.

    No sistema de promoo imobiliria, o incorporador imobilirio que se responsabiliza pela articulao da ao dos demais atores. O incorporador viabiliza a construo de imveis, assumindo para si as funes de compra do imvel-base (terreno) com a atividade de construo, repassando as atividades de divulgao e venda das unidades. Nessa operao deve o incorporador tirar seu lucro, ressarcidos os gastos de construo e planejamento, o que representa a valorizao do capital. Sendo assim, o capital de incorporao, ao desempenhar seus papis de liberar o terreno e financiar as empresas construtoras, viabiliza uma maior circulao do capital comercial. (COSTA, 2004)

    Quanto ao preo da incorporao, esse engloba o preo da terra, a ser pago ao proprietrio

    urbano, e o lucro a ser obtido pelo incorporador. O preo da terra no pode ser excessivo, pois

    inviabilizaria o lucro na promoo imobiliria. O preo deve ater-se demanda capitalista do

  • 37

    solo (preo oferecido pela incorporao imobiliria). Quando, porm, o incorporador no

    dispe da verba necessria construo, deve recorrer s agncias de financiamento ou ao

    capital dos futuros compradores (entrada), calculando-se e adicionando-se ao preo os lucros

    a serem ganhos.

    O ciclo capitalista de promoo e incorporao imobiliria tem a sua consolidao nos

    sistemas de poupana e emprstimo. Os sistemas de poupana e emprstimo habitacional

    sempre estiveram voltados principalmente para as camadas de renda mdia e superior da

    populao urbana, o que promove a consolidao de uma lgica de valorizao fundiria

    forma segmentada da oferta de imveis. Essa estratgia de valorizao de certas reas da

    cidade visa a atrair um segmento da demanda que possui disponibilidade de

    comprometimento de uma parcela maior de recursos na aquisio do imvel residencial.

    Cabe dizer que no crdito imobilirio as garantias prioritrias so a Alienao Fiduciria de

    Bens Imveis (transferncia ao credor do domnio e posse de um bem, em garantia de

    pagamento por uma obrigao que lhe devida) e o Patrimnio de Afetao* (mecanismo

    legal pelo qual se materializa a segregao patrimonial de uma incorporao imobiliria dos

    demais ativos do incorporador, com o objetivo de proteger as partes envolvidas, tais como

    incorporador, construtora, promitentes compradores, financiador e investidor) nas

    incorporaes imobilirias*.

    O alto padro o preferido das construtoras e incorporadoras brasileiras, segmento que j a

    alguns anos lidera o mercado imobilirio no pas e est no topo da lista dos lanamentos. O

    foco ocorre a despeito da maior oferta de recursos para o financiamento de imveis

    residenciais para as classes de renda mdia e da melhoria das condies para contratao de

    crdito - que impulsionariam principalmente os negcios na classe mdia (BOTELHO, 2005).

    A estratgia se justifica pela rentabilidade maior no alto padro, j que a venda desse tipo de

    imvel traz preos mais elevados. Pelos indicadores do mercado pode-se prever que no

    haver ainda uma forte retomada dos negcios nas classes de menor renda no mdio prazo.

    Observa-se que j na poca de atuao do BNH (1967/1986) havia uma tendncia a priorizar

    o financiamento para as camadas sociais de renda mais elevada, que apresentavam-se como

    demanda efetiva, configurando-se como preferncias dos setores empresariais ligados

  • 38

    questo imobiliria o que j pode ser considerado como um fator de segregao. De acordo

    com a chamada viso do mercado, a segregao a expresso da distribuio espacial das

    classes seja com base em critrios de renda, ocupao, etc., pelo mercado imobilirio e

    fundirio e onde os mecanismos institucionais aparecem subordinados prpria lgica do

    mercado.

    Pode-se dizer que no momento atual a capacidade governamental de implementao de

    polticas pblicas corretivas, preventivas e distributivas reduzida e os mecanismos de

    correo do mercado se mostram incapazes de solucionar os danos sociais e distribuir a renda.

    Observa-se claramente, que a estrutura espacial urbana, em termos de infra-estrutura, servios

    e equipamentos coletivos, rege-se em consonncia com as relaes decorrentes do sistema de

    acumulao de capitais, acompanhando e refletindo suas crises. O investimento que o Estado

    injeta no tecido urbano fator de intensa valorizao diferencial da terra, o que gera grande

    especulao imobiliria e produz um espao social desigual e segregador (RIBEIRO e LAGO,

    2002).

    Nos municpios brasileiros, a maior parcela dos investimentos pblicos so dirigidos s reas

    destinadas aos grupos de renda mdia e alta, o que gera grande parte das condies gerais

    necessrias para os padres de acumulao capitalista se reproduzirem em escala ampliada. A

    produo das estruturas espaciais gera portanto, zonas que, devido ao preo da terra s podem

    ser destinadas s camadas de maior poder aquisitivo.

  • 39

    1.5 A ATUAO DA CAIXA NO FINANCIAMENTO HABITACIONAL

    Com a extino do Banco Nacional da Habitao BNH em 1986 a Caixa Econmica Federal

    Caixa incorporou as funes do Banco e assumiu o papel de principal agente de

    financiamento habitacional no Brasil.

    Desde ento, a Caixa tem como um de seus objetivos principais promover a melhoria contnua

    da qualidade de vida da sociedade, intermediando recursos e negcios financeiros de qualquer

    natureza, atuando, prioritariamente, no fomento ao desenvolvimento urbano e nos segmentos

    de habitao, saneamento e infra-estrutura, e na administrao de fundos, programas e

    servios de carter social.

    A Caixa uma instituio do Governo Federal, subordinada ao Ministrio da Fazenda, que

    possui essencialmente trs macro segmentos de atuao, sendo eles: Banco Comercial,

    Transferncia de Benefcios e Desenvolvimento Urbano.

    Figura 1.1 - Segmentos de atuao da CAIXA

    Fonte: VIURB/CAIXA

    Financiamento de Longo Prazo

    Implementao Poltica Habitacional

    Aces

    so a

    Ext

    ensa

    Bas

    e de

    Clie

    ntes

    Opo

    rtuni

    dade

    s de

    Neg

    cio

    s

    Relacionamento de Longo Prazo

    Oportunidades de Negcios

    Transferncia de Benefcios

    (Benefcios Sociais e Loterias)

    Banco Comercial(Depsitos, Crdito,

    Tesouraria e Servios)

    Desenvolvimento Urbano

    (Habitao, Saneamento e Infra-estrutura)

    Financiamento de Longo Prazo

    Implementao Poltica Habitacional

    Aces

    so a

    Ext

    ensa

    Bas

    e de

    Clie

    ntes

    Opo

    rtuni

    dade

    s de

    Neg

    cio

    s

    Relacionamento de Longo Prazo

    Oportunidades de Negcios

    Transferncia de Benefcios

    (Benefcios Sociais e Loterias)

    Banco Comercial(Depsitos, Crdito,

    Tesouraria e Servios)

    Desenvolvimento Urbano

    (Habitao, Saneamento e Infra-estrutura)

  • 40

    A Caixa o principal agente do Governo Federal na implementao da poltica urbana.

    Financia, repassa recursos oramentrios federais e presta assistncia tcnica nos seguintes

    setores:

    Habitao

    Saneamento ambiental

    Infra-estrutura urbana

    Gesto municipal

    Transportes

    Regularizao fundiria

    Em 2005, o oramento da Caixa para desenvolvimento urbano foi de R$ 15 bilhes,

    abrangendo as seguintes fontes de recursos: FGTS, FAR, FDS, OGU, FAT, CAIXA, BNDES.

    A questo central, e a principal meta da rea de Desenvolvimento Urbano da Caixa, tornar a

    moradia acessvel para os segmentos populacionais de baixa renda, atravs de programas de

    financiamento habitacional de interesse social, embora isso no seja uma questo fcil.

    Segundo a Vice-Presidncia de Desenvolvimento Urbano e Governo (VIURB), os principais

    objetivos da rea de Desenvolvimento Urbano da Caixa so:

    consolidar a Caixa como agente de mudana das questes sociais, urbanas e

    ambientais

    assegurar a universalizao do acesso moradia

    atuar como principal agente na implementao das polticas de universalizao

    dos servios de saneamento ambiental e de infra-estrutura

    integrar, no mbito da Caixa, as aes e polticas de Governo

    participar do processo de desenvolvimento cientfico e tecnolgico

    apoiar a implementao de aes sociais do Governo, em especial no que

    concerne ao meio ambiente, sade e gesto pblica

    articular parcerias e interagir de com vrios atores na elaborao e

    regulamentao de aes relacionadas ao desenvolvimento social, ambiental e

    econmico

    disponibilizar informaes para facilitar a interao com os segmentos da

    sociedade

  • 41

    utilizar a expertise da Caixa no saneamento ambiental, habitao, infra-

    estrutura e gesto urbana, com vistas prestao de servios, assistncia

    tcnica e gerenciamento de programas

    Figura 1.2 - Desenvolvimento urbano diagnstico Brasil

    Fonte: VIURB/CAIXA

    Dentro da viso de que os municpios devem ser os principais agentes de implementao da

    poltica habitacional, a Caixa busca trabalhar no sentido de que a aplicao de recursos de

    carter social deve guardar sintonia com o perfil do dficit habitacional, e vem desenvolvendo

    parcerias com as Prefeituras Municipais e os Estados, de forma a permitir a estruturao de

    operaes que viabilizem a concesso de financiamentos por meio de modelos no

    convencionais e assim, viabilizar o atendimento s famlias que se encontram abaixo da linha

    de financiamento, as quais correspondem a aproximadamente 84% do dficit habitacional. 3

    O ideal que a Caixa conseguisse, principalmente por meio dessas parcerias, neutralizar o

    risco de crdito e assim, atender a um segmento do estrato social que, quando submetido s

    avaliaes de risco de crdito convencional, apresentam elevado nvel de rejeio.

    3 Fonte: IBGE, censo 2000.

    ocupao desordenada das cidadessegregao scio-espacialcarncia de infra-estrutura

    degradao dos ambientes naturais

    crescimento desordenado das cidades

    fragilidade tcnica, institucional e financeirados governos muninicipais

    instrumentos inadequados de gestoe planejamento urbano e territorial

    investimentos urbanos escassos

    ocupao desordenada das cidadessegregao scio-espacialcarncia de infra-estrutura

    degradao dos ambientes naturais

    ocupao desordenada das cidadessegregao scio-espacialcarncia de infra-estrutura

    degradao dos ambientes naturais

    crescimento desordenado das cidadescrescimento desordenado das cidades

    fragilidade tcnica, institucional e financeirados governos muninicipais

    fragilidade tcnica, institucional e financeirados governos muninicipais

    instrumentos inadequados de gestoe planejamento urbano e territorial

    instrumentos inadequados de gestoe planejamento urbano e territorial

    investimentos urbanos escassosinvestimentos urbanos escassos

  • 42

    Outro fator de relevncia que se deve trabalhar no sentido de reduzir o custo operacional,

    requerendo portanto, menor volume de subsdios, e tambm criando condies para que os

    Estados e Municpios se utilizem da estrutura logstica e operacional da Caixa para

    implementarem suas polticas habitacionais voltadas para os segmentos de baixa renda.

    A Caixa atua enquanto agente financiador em dois momentos, quais sejam: quando da

    construo dos imveis e quando da comercializao dos mesmos.

    O agente proponente (incorporador imobilirio, construtor, etc.) recorre, no primeiro

    momento, Caixa para complementar seu capital, atravs de emprstimos, ressarcindo-a com

    os recursos provenientes da venda dos imveis.

    Em um segundo momento, devido aos altos preos alcanados pelos imveis e sua

    desconexo com os salrios vigentes no mercado, faz-se necessrio capital circulante que

    viabilize a compra do imvel parcelada em vrios meses.

    Atualmente, a CAIXA trabalha com programas de financiamento habitacional para diferentes

    faixas de renda, em diferentes modalidades, atravs de fontes de recursos diversas FGTS,

    FAT, FDS, OGU, recursos prprios da CAIXA, etc. Podemos citar principalmente:

    Aquisio de material de construo (para construo ou reforma)

    Aquisio de Imvel novo ou usado

    Financiamento de imvel na planta

    Arrendamento Residencial

    Poupana de crdito imobilirio

    Apoio produo de habitaes

    Crdito Solidrio

    Revitalizao de reas centrais

    Subsdio Habitao de Interesse Social

    O principal elemento de definio para o tipo de financiamento a ser concedido para cada

    beneficirio a renda mensal. Para recursos subsidiados, como os provenientes do Oramento

    Geral da Unio OGU, ou FGTS, por exemplo, existe um limite de renda estabelecido.

  • 43

    O leque de produtos habitacionais oferecidos pela CAIXA realmente diversificado, porm, o

    nmero de financiamentos concedidos est aqum do desejado.

    Grfico 1.3 - Financiamentos Caixa Unidades contratadas at 2005 (Imveis novos e usados)

    Fonte: VIURB/CAIXA

    Para que os financiamentos sejam concedidos a contento, preciso ter a ponta principal, que

    o beneficirio (comprador), e que espera crdito com condies atraentes, ou seja: juros mais

    baixos, prazo maior, percentual de entrada menor.

    A utilizao de recursos do oramento de 2005 da CAIXA para habitao no 1 semestre de

    2005 tambm foi menor do que o esperado (para um ano em que se anunciava um boom

    imobilirio).

    A promessa de um novo ciclo para esse ano teve dois principais fundamentos: as novas regras

    do Conselho Monetrio Nacional CMN, que obrigariam os bancos a at quadruplicarem o

    crdito em imveis, e a Lei 10.9314, promulgada em 2004, que deu mais segurana jurdica s

    4 A Lei N 10.931, de 02 de agosto de 2004 dispe sobre o Patrimnio de Afetao de Incorporaes Imobilirias, Letra de Crdito Imobilirio, Cdula de Crdito Imobilirio, Cdula de Crdito Bancrio e d outras providncias. Esta Lei institui o regime especial de tributao aplicvel s incorporaes imobilirias, em carter opcional e irretratvel enquanto perdurarem direitos de crdito ou obrigaes do incorporador junto aos adquirentes dos imveis que compem a incorporao.

    Unidades Contratadas (mil)

    96142

    274268

    338383

    627

    465

    541

    77 86 78107

    231280

    100

    244

    397

    65 54 61 59

    167

    362

    439

    334369

    330339391

    1974

    1975

    1976

    1977

    1978

    1979

    1980

    1981

    1982

    1983

    1984

    1985

    1986

    1987

    1988

    1989

    1990

    1991

    1992

    1993

    1994

    1995

    1996

    1997

    1998

    1999

    2000

    2001

    2002

    2003

    2004

    446

    Unidades Contratadas (mil)

    96142

    274268

    338383

    627

    465

    541

    77 86 78107

    231280

    100

    244

    397

    65 54 61 59

    167

    362

    439

    334369

    330339391

    1974

    1975

    1976

    1977

    1978

    1979

    1980

    1981

    1982

    1983

    1984

    1985

    1986

    1987

    1988

    1989

    1990

    1991

    1992

    1993

    1994

    1995

    1996

    1997

    1998

    1999

    2000

    2001

    2002

    2003

    2004

    2005

    446

    488

    2005

    Unidades Contratadas (mil)

    96142

    274268

    338383

    627

    465

    541

    77 86 78107

    231280

    100

    244

    397

    65 54 61 59

    167

    362

    439

    334369

    330339391

    1974

    1975

    1976

    1977

    1978

    1979

    1980

    1981

    1982

    1983

    1984

    1985

    1986

    1987

    1988

    1989

    1990

    1991

    1992

    1993

    1994

    1995

    1996

    1997

    1998

    1999

    2000

    2001

    2002

    2003

    2004

    446

    Unidades Contratadas (mil)

    96142

    274268

    338383

    627

    465

    541

    77 86 78107

    231280

    100

    244

    397

    65 54 61 59

    167

    362

    439

    334369

    330339391

    1974

    1975

    1976

    1977

    1978

    1979

    1980

    1981

    1982

    1983

    1984

    1985

    1986

    1987

    1988

    1989

    1990

    1991

    1992

    1993

    1994

    1995

    1996

    1997

    1998

    1999

    2000

    2001

    2002

    2003

    2004

    2005

    446

    488

    2005

  • 44

    empresas do setor e aos muturios. Mesmo assim, os bancos inclusive a Caixa

    emprestaram menos do que era inicialmente previsto e, ao contrrio do que se imaginava,

    quase no houve ampliao das facilidades para os financiamentos para a casa prpria

    (ABECIP, 2005).

    De janeiro a junho de 2005 foram emprestados em operaes de financiamento habitacional

    em todo o Brasil pela Caixa somente R$ 2,9 bilhes, do total de R$ 10,3 bilhes disponveis

    para moradia. Ou seja, apenas 28,5%. Devido a isso, em julho a Caixa anunciou algumas

    medidas, como por exemplo a reduo das exigncias para comprovao de renda na tomada

    do crdito, para tentar reverter essa situao (CAIXA, 2005). At o final de dezembro, o valor

    total gasto pela Caixa no ano de 2005 para financiar habitaes foi R$ 7,6 bilhes.

    Outro ponto importante a ser considerado no mbito dos financiamentos concedidos pela

    Caixa a questo da inadimplncia dos muturios, que abrange uma parcela significativa dos

    tomadores. Podemos acreditar que atualmente est ausente no processo das operaes de

    financiamento habitacional um foco direcionado ao combate inadimplncia. Uma maior

    mediao para resolver problemas e criar canais eficazes de relacionamento poderia melhorar

    significativamente a satisfao do cliente gerando, em decorrncia, uma maior adimplncia.

    No mbito do Plano Geral de Negcios da Caixa para 2005, a Habitao foi definida como

    uma das metas prioritrias para a Rede de Distribuio de Produtos, com destaque para as

    linhas de financiamento voltadas produo habitacional.

    Em nvel operacional, foram implementadas medidas necessrias ao pleno funcionamento dos

    mecanismos introduzidos por intermdio da Resoluo do Conselho Curador do FGTS

    CCFGTS 460/04, que tem como objetivo a concesso de subsdio a pessoas fsicas nos

    financiamentos de habitao popular destinado a complementao da capacidade de

    pagamento (para famlias/proponentes pessoas fsicas com renda bruta mensal at R$ 1,5 mil).

    A estratgia de atuao consiste em operaes estruturadas e realizadas em parceria com

    Estados e municpios e suas entidades da administrao indireta.

    Cabe citar que a Caixa a principal instituio financeira governamental responsvel pelo

    atendimento s famlias de baixa renda em particular quelas situadas na faixa de at trs

    salrios mnimos.

  • 45

    Entretanto, importante ressaltar que existe uma contradio a ser administrada, pois a Caixa,

    que embora seja uma instituio financeira de vocao social, possui objetivos de um banco

    comercial, como equilbrio financeiro, retorno do capital aplicado, etc. Sendo assim, no

    sempre fcil dinamizar programas alternativos de financiamento para os setores de renda mais

    baixa, que exigem elevado grau de subsdios, envolvimento institucional, desenvolvimento de

    pesquisas, entre outros fatores.

    Vale dizer ainda que a Caixa vem recentemente perdendo participao na concesso de

    crdito imobilirio no pas. Historicamente, a instituio era responsvel por 90% de todo

    financiamento habitacional concedido no pas.

    Entretanto, essa situao comea a dar sinais de mudana. Em 2004, a Caixa contratou R$ 6

    bilhes em operaes de crdito imobilirio. O setor privado, por sua vez, liberou outros R$ 3

    bilhes para o financiamento habitacional. Com isso, a participao da Caixa na concesso de

    crdito imobilirio recuou de 90 para 66%. Ainda assim, a Caixa se mantm no posto de

    maior operadora de crdito imobilirio do pas (ABECIP, 2005).

    Cabe enfatizar que a Caixa a maior Instituio Financeira em volume de depsitos vista,

    emprstimos e financiamentos a maior com foco no segmento imobilirio. tambm a

    segunda maior Instituio Financeira do Brasil em ativos.

  • 46

    1.6 ALGUMAS CONSIDERAES SOBRE FINANCIAMENTO HABITACIONAL ATUAL

    Aps o Plano Real ocorreu uma elevao significativa no nmero de unidades residenciais

    lanadas, principalmente nas regies metropolitanas, e com ela cresceu tambm o nmero de

    concesses de financiamentos imobilirios, sendo evidente a incompatibilidade de qualquer

    mecanismo de financiamento de longo prazo com o risco de inflao elevada (a atividade de

    financiamento promove uma ligao entre o setor imobilirio e o ambiente macroeconmico).

    Com a estabilidade da economia, ficou mais fcil comprar um imvel atravs de

    financiamento, tanto pela capacidade de planejamento do oramento domstico, quanto pela

    maior oferta de crdito por parte das instituies financeiras.

    Nos ltimos anos os financiamentos imobilirios com recursos da caderneta de poupana e do

    FGTS tm registrado crescimento, embora o crdito habitao ainda corresponda a uma

    pequena frao do Produto Interno Bruto PIB cerca de 1,5 %. (BANCO CENTRAL,

    2005)

    O Brasil dispe atualmente de duas estruturas formais de financiamento habitacional: o

    Sistema Financeiro Habitacional SFH, com caractersticas rgidas em termos de taxas,

    opes contratuais e limites de financiamento; e o Sistema Financeiro Imobilirio SFI,

    criado a partir do esgotamento do SFH, com caractersticas menos rgidas, e amparado na

    figura legal da Alienao Fiduciria de Bens Imveis.

    Segundo a Associao Brasileira das Entidades de Crdito Imobilirio e Poupana ABECIP,

    a disposio dos bancos a de ampliar as linhas de crdito imobilirio, sobretudo aquelas

    destinadas construo de imveis novos (que segundo a ABECIP j registrou uma alta de

    93% em 2005). Entretanto, o sistema de financiamento depende da poupana, que nos ltimos

    anos perdeu captao de recursos para outras modalidades de investimento.

    Ainda de acordo com a ABECIP um outro problema para a expanso do crdito no pas a

    capacidade de endividamento das famlias, pois a questo da renda est diretamente ligada ao

    aumento da demanda por crdito (o dficit habitacional est concentrado na faixa de renda

    familiar de at 5 salrios mnimos e essas pessoas esto fora do mercado financeiro).

  • 47

    Um fator que contribuiu para o aumento dos financiamentos vinculados poupana foi a

    fixao de metas de expanso do crdito definidas pelo Conselho Monetrio Nacional

    CMN, em troca de no penalizar os bancos que no cumprissem o limite obrigatrio de

    emprestar 65% dos depsitos de poupana habitao.

    As metas, acertadas entre os bancos e o setor imobilirio, definiram que no segundo semestre

    de 2005 os financiamentos teriam que subir 50% em relao ao mesmo perodo de 2004. Se

    os bancos no alcanassem o limite, o dinheiro seria ento recolhido ao Banco Central com

    remunerao de somente 80% da variao da TR (2% ao ano), ou seja, menos do que a

    poupana paga ao correntista (TR mais 6% ao ano).

    Observa-se que os bancos/agentes de financiamento tm demonstrado empenho em ampliar a

    concesso de crdito imobilirio para a classe mdia. Segundo o jornal Folha de So Paulo:

    Para disputar a clientela da classe mdia, segmento pouco explorado at pouco tempo atrs, o setor est se valendo de vrias estratgias, como a reduo do custo do financiamento habitacional e a criao de agncias com funcionrios especializados no assunto. (FOLHA DE SO PAULO, 24 agosto de 2005)

    O aumento do financiamento habitacional tambm reflexo da combinao da

    regulamentao de instrumentos que trouxeram mais segurana para as operaes de crdito

    imobilirio - como a Alienao Fiduciria de Bens Imveis e o Patrimnio de Afetao, que

    aprimoraram o sistema de garantias nas operaes de crdito imobilirio - com resolues do

    CMN, que passaram a incentivar a ampliao da contratao de crdito para a habitao.

    Antes da implementao da Alienao Fiduciria de Bens Imveis, as operaes eram

    garantidas pelo sistema de hipoteca*, no qual os bancos tinham menos segurana para operar

    o crdito imobilirio, pois com a garantia hipotecria, a retomada do imvel em casos de

    inadimplncia era um processo jurdico lento,