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PROFESSORES REFLEXIVOS EM UMA ESCOLA REFLEXIVA Isabel Alarcão (Resenha) Isabel Alarcão refina o conceito de reflexividade, focando o professor e a escola que se pensam e se avaliam em seu projeto educativo, qualificando não apenas seus alunos, mas toda a comunidade educativa formada por autores em contexto, construtores de práticas sociais geradas pelo esforço de encontrar novas soluções para os problemas que vivenciam. Neste livro, a autora reafirma a necessidade do pensamento crítico e acentua a dimensão coletiva da atividade dos professores. Enuncia as características distintivas do conhecimento destes profissionais da educação que assume como quadro de referência para a sua formação e o seu desenvolvimento. Mas não esquece os alunos nem a sua posição, bem como a dos professores e a da escola, perante as exigências da sociedade e da informação, do conhecimento e da aprendizagem. No primeiro capítulo, intitulado “Alunos, professores e escola face à sociedade da informação” aborda a problemática das competências de acesso, avaliação e gestão da informação e o papel que, na sociedade do conhecimento e da aprendizagem, se espera dos alunos, dos professores e da escola. No segundo capítulo, “A formação do educador reflexivo” a autora explica as razões do fascínio pela abordagem reflexiva e a desilusão que, no Brasil, se faz sentir. Reafirma a necessidade da reflexão crítica; acentua a sua dimensão coletiva e apresenta um conjunto de estratégias de formação propiciadoras do desenvolvimento de educadores reflexivos. No quarto capítulo, “Gerir uma escola reflexiva” discute a organização da escola com o objetivo de criar condições de reflexibilidade individuais e coletivas e de requalificação profissional e institucional. Capítulo I – Alunos, professores e escola face à sociedade da informação Introdução A sociedade da informação, como sociedade aberta e global, exige competências de acesso, avaliação e gestão da informação oferecida. De imediato se coloca uma questão: a das diferenças ao acesso à informação e da necessidade de providenciar igualdade de oportunidades sob pena de desenvolvermos mais um fator de exclusão social: a info - exclusão. Como discernir sobre a informação válida e inválida, correta ou incorreta, pertinente ou supérflua? Como organizar o pensamento e a ação em função da informação, recebida ou procurada? A sociedade da informação em que vivemos O cidadão comum dificilmente consegue lidar com a avalanche de novas informações que o inundam e que se entrecruzam com novas idéias e problemas, novas oportunidades, desafios e ameaças. No tempo em que vivemos a mídia adquiriu um poder esmagador e a sua influência é multifacetada, podendo ser usada para o bem e para o mal. As mensagens passadas apresentam valores, uns positivos, outros negativos, de difícil discernimento para aqueles que, por razões várias, não desenvolveram grande espírito crítico, competência que inclui o hábito de se questionar perante o que lhe é oferecido. O mundo, marcado por tanta riqueza informativa, precisa urgentemente do poder clarificador do pensamento. Edgar Morin afirma que só o pensamento pode organizar o conhecimento. Para conhecer, é preciso pensar. E uma cabeça bem feita - ao invés de bem cheia – é a que é capaz de transformar a informação em conhecimento pertinente. Para o autor, o conhecimento pertinente é o conhecimento que é capaz de situar qualquer informação em seu contexto e, se possível, no conjunto em que está inscrita.(Morin, 2000) Inerente a esta concepção, emerge a relevância do sentido que se atribui às “coisas”. Assume-se como fundamental, a compreensão entendida como a capacidade de perceber os objetos, as pessoas, os acontecimentos e as relações que entre todos se estabelecem. Nesta era da informação e da comunicação, que se quer também a era do conhecimento, a escola não detém o monopólio do saber. O professor não é o único transmissor do saber e tem de aceitar situar-se nas suas novas circunstâncias que, por sinal, são bem mais exigentes. O aluno também já não é mais o receptáculo a deixar-se rechear de conteúdos. O seu papel impõe-lhe exigências acrescidas. Ele tem de aprender a gerir e a relacionar informações para as transformar no seu conhecimento e no seu saber. Também a escola tem de ser uma outra escola. A escola, como organização, tem de ser um sistema aberto, pensante e flexível. Sistema aberto sobre si mesmo, e aberto à comunidade em que se insere. Esta era começou por se chamar a sociedade da informação, mas rapidamente se passou a chamar sociedade da informação e do conhecimento a que, mais recentemente, se acrescentou a designação de sociedade da aprendizagem. Reconheceu-se que não há conhecimento sem aprendizagem. E que a informação, sendo uma condição necessária para o conhecimento, não é condição suficiente. A designação de sociedade do conhecimento e da aprendizagem traduz o reconhecimento das competências que são exigidas aos cidadãos hoje. Importa, assim, refletir sobre as novas competências. As novas competências exigidas pela sociedade da informação e da comunicação, do conhecimento e da aprendizagem. No início dos anos 90 reuniram-se na Europa conceituados industriais europeus e reitores das universidades européias com o objetivo de pensarem o papel da educação no mundo atual. Deste encontro elaborou-se um relatório que ficou conhecido pelo modo como abordaram a noção de competência necessária a uma vivência na contemporaneidade. A noção de competência incluía não só conhecimentos (fatos, métodos, conceitos e princípios), mas capacidades (saber o que fazer e como), experiência (capacidades sociais, redes de contatos, influência), valores (vontade de agir, acreditar, empenhar-se, aceitar responsabilidades e poder (físico e energia mental) (Keen, citado em Cochineaux e Woot, 1995). Conceptualizações deste tipo apontam para uma formação holística e integrada da pessoa que não se limita à informação e ao conhecimento, mas vai além deles para atingir a sabedoria, característica que era tão querida aos

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PROFESSORES REFLEXIVOS EM UMA ESCOLA REFLEXIVAIsabel Alarcão (Resenha)

Isabel Alarcão refina o conceito de reflexividade, focando o professor e a escola que se pensam e se avaliam em seu projeto educativo, qualificando não apenas seus alunos, mas toda a comunidade educativa formada por autores em contexto, construtores de práticas sociais geradas pelo esforço de encontrar novas soluções para os problemas que vivenciam.Neste livro, a autora reafirma a necessidade do pensamento crítico e acentua a dimensão coletiva da atividade dos professores. Enuncia as características distintivas do conhecimento destes profissionais da educação que assume como quadro de referência para a sua formação e o seu desenvolvimento. Mas não esquece os alunos nem a sua posição, bem como a dos professores e a da escola, perante as exigências da sociedade e da informação, do conhecimento e da aprendizagem.No primeiro capítulo, intitulado “Alunos, professores e escola face à sociedade da informação” aborda a problemática das competências de acesso, avaliação e gestão da informação e o papel que, na sociedade do conhecimento e da aprendizagem, se espera dos alunos, dos professores e da escola.No segundo capítulo, “A formação do educador reflexivo” a autora explica as razões do fascínio pela abordagem reflexiva e a desilusão que, no Brasil, se faz sentir. Reafirma a necessidade da reflexão crítica; acentua a sua dimensão coletiva e apresenta um conjunto de estratégias de formação propiciadoras do desenvolvimento de educadores reflexivos.No quarto capítulo, “Gerir uma escola reflexiva” discute a organização da escola com o objetivo de criar condições de reflexibilidade individuais e coletivas e de requalificação profissional e institucional.

Capítulo I – Alunos, professores e escola face à sociedade da informação

Introdução

A sociedade da informação, como sociedade aberta e global, exige competências de acesso, avaliação e gestão da informação oferecida.De imediato se coloca uma questão: a das diferenças ao acesso à informação e da necessidade de providenciar igualdade de oportunidades sob pena de desenvolvermos mais um fator de exclusão social: a info - exclusão.Como discernir sobre a informação válida e inválida, correta ou incorreta, pertinente ou supérflua? Como organizar o pensamento e a ação em função da informação, recebida ou procurada?

A sociedade da informação em que vivemos

O cidadão comum dificilmente consegue lidar com a avalanche de novas informações que o inundam e que se entrecruzam com novas idéias e problemas, novas oportunidades, desafios e ameaças.No tempo em que vivemos a mídia adquiriu um poder esmagador e a sua influência é multifacetada, podendo ser usada para o bem e para o mal. As mensagens passadas apresentam valores, uns positivos, outros negativos, de difícil discernimento para aqueles que, por razões várias, não desenvolveram grande espírito crítico, competência que inclui o hábito de se questionar perante o que lhe é oferecido.O mundo, marcado por tanta riqueza informativa, precisa urgentemente do poder clarificador do pensamento. Edgar Morin afirma que só o pensamento pode organizar o conhecimento. Para conhecer, é preciso pensar. E uma cabeça bem feita - ao invés de bem cheia – é a que é capaz de transformar a informação em conhecimento pertinente. Para o autor, o conhecimento pertinente é o conhecimento que é capaz de situar qualquer informação em seu contexto e, se possível, no conjunto em que está inscrita.(Morin, 2000) Inerente a esta concepção, emerge a relevância do sentido que se atribui às “coisas”. Assume-se como fundamental, a compreensão entendida como a capacidade de perceber os objetos, as pessoas, os acontecimentos e as relações que entre todos se estabelecem.Nesta era da informação e da comunicação, que se quer também a era do conhecimento, a escola não detém o monopólio do saber. O professor não é o único transmissor do saber e tem de aceitar situar-se nas suas novas circunstâncias que, por sinal, são bem mais exigentes. O aluno também já não é mais o receptáculo a deixar-se rechear de conteúdos. O seu papel impõe-lhe exigências acrescidas. Ele tem de aprender a gerir e a relacionar informações para as transformar no seu conhecimento e no seu saber. Também a escola tem de ser uma outra escola. A escola, como organização, tem de ser um sistema aberto, pensante e flexível. Sistema aberto sobre si mesmo, e aberto à comunidade em que se insere.Esta era começou por se chamar a sociedade da informação, mas rapidamente se passou a chamar sociedade da informação e do conhecimento a que, mais recentemente, se acrescentou a designação de sociedade da aprendizagem. Reconheceu-se que não há conhecimento sem aprendizagem. E que a informação, sendo uma condição necessária para o conhecimento, não é condição suficiente.A designação de sociedade do conhecimento e da aprendizagem traduz o reconhecimento das competências que são exigidas aos cidadãos hoje. Importa, assim, refletir sobre as novas competências.

As novas competências exigidas pela sociedade da informação e da comunicação, do conhecimento e da aprendizagem.

No início dos anos 90 reuniram-se na Europa conceituados industriais europeus e reitores das universidades européias com o objetivo de pensarem o papel da educação no mundo atual. Deste encontro elaborou-se um relatório que ficou conhecido pelo modo como abordaram a noção de competência necessária a uma vivência na contemporaneidade.A noção de competência incluía não só conhecimentos (fatos, métodos, conceitos e princípios), mas capacidades (saber o que fazer e como), experiência (capacidades sociais, redes de contatos, influência), valores (vontade de agir, acreditar, empenhar-se, aceitar responsabilidades e poder (físico e energia mental) (Keen, citado em Cochineaux e Woot, 1995).Conceptualizações deste tipo apontam para uma formação holística e integrada da pessoa que não se limita à informação e ao conhecimento, mas vai além deles para atingir a sabedoria, característica que era tão querida aos

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nossos antepassados gregos.Será bom que nos perguntemos até onde é que a escola leva os alunos neste percurso. Para uma grande parte da população, a resposta será talvez frustrante. Ficar-se-ão alguns apenas pelos dados, dados que não conseguirão trabalhar ao nível, superior, da informação. Poucos atingirão a sabedoria. Um número maior desenvolverá a capacidade de visão. O grosso situar-se-á ao nível da informação e da compreensão. Não se deve atribuir só à escola a culpa por esta caracterização. Há que se ter em conta as capacidades individuais, mas também a desresponsabilização da sociedade que, impotente perante a resolução de tantos dos problemas que ela criou, coloca na escola expectativas demasiado elevadas sem muitas vezes a valorizar como devia.Um dos autores que mais tem trabalhado a questão das competências é Philipe Perrenoud. Para ele, ter competência é saber mobilizar os saberes. A competência não existe, portanto, sem os conhecimentos. Como conseqüência lógica não se pode afirmar que as competências estão contra os conhecimentos, mas sim com os conhecimentos. Elas reorganizam-nos e explicitam a sua dinâmica e valor fundamental.Vejamos como exemplo a aprendizagem de uma língua estrangeira em contexto fora da escola. É possível saber-se bem a gramática de uma língua e ter até um bom domínio do vocabulário e contudo ficar imobilizado lingüisticamente numa situação real de comunicação pela incapacidade de mobilizar adequadamente os conhecimentos necessários naquela situação concreta.Como afirma Perrenoud, “a abordagem por competências não pretende mais do que permitir a cada um aprender a utilizar os seus saberes para atuar” (2001:17).Relativamente à questão da subordinação da educação à economia no que respeita às competências, não se pense que a noção de competência tenha passado do mundo empresarial para o da educação. Antes pelo contrário. A noção de competências utilizada anteriormente sob a capa de outras designações como destrezas, saberes-fazeres, ou na apropriação do termo inglês skill, foi utilizada no mundo da educação antes de ser adotada pelo mundo empresarial.As empresas reconhecem hoje a realidade das competências. Mas mesmo no mundo dos negócios não se trata de competências simples, lineares, acabadas e imutáveis, mas de competências dinâmicas em que a compreensão do mundo e a sabedoria da vivência social são fundamentais.

A competência para lidar com a informação na sociedade da aprendizagem

Entre as competências necessárias à vida na sociedade moderna, destaca-se a capacidade de utilizar a informação de modo rápido e flexível, o que coloca problemas ao nível do acesso, da avaliação e da gestão das informações, mas também da organização e ativação dos conhecimentos. Estes processos implicam a capacidade para lidar com a informação e os meios que a tornam acessível.É preciso saber o que procurar e onde procurar. A informação, pela sua grande quantidade e pela multiplicidade de utilizações que potencialmente encerra, tem de ser reorganizada por quem a procura. O professor continua a ter o papel de mediador, mas é uma mediação orquestrada e não linear.É imprescindível que se criem condições, nas escolas e nas comunidades, que compensem a falta de acessibilidade a fontes de informação que possam existir no seio das famílias. Só isso não basta, porém. Impõe-se uma diferente organização do trabalho escolar, promovendo o trabalho colaborativo entre os alunos, reorganizando os horários de forma a que os alunos tenham tempo para pesquisas s criando verdadeiras comunidades de aprendizagem.

Os alunos na sociedade da aprendizagem

Numa “sociedade que aprende e se desenvolve” , como a caracterizou Tavares (1996), ser aluno é ser aprendente. Mais do que isso: é aprender a ser aprendente ao longo da vida.Subjaz a este modelo uma abordagem pedagógica de caráter construtivista, sócio-cultural. A aprendizagem é um modo de gradualmente se ir compreendendo melhor o mundo em que vivemos e de sabermos melhor utilizar os nossos recursos para nele agirmos. Uma boa parte das competências hoje exigidas são dificilmente ensináveis. E contudo elas têm de ser desenvolvidas.Importa perguntar: qual o lugar da aprendizagem dentro e fora da sala de aula e, mais à frente, reconceptualizar o papel do professor.Para Demo (citado em Carreira, 2000), a sala de aula deixou de ser um espaço onde se transmitem conhecimentos, passando a ser um espaço onde se procura e onde se produz conhecimento. Uma conceptualização da escolarização neste sentido implica a utilização de estratégias de organização das aprendizagens que assentem no próprio aluno e promovam a sua capacidade de auto e hetero-aprendizagem. E que, por isso mesmo, lhe conferem poder, o responsabilizam e autonomizam e, de deste modo, contribuem para a tão desejada democratização.

Os professores na sociedade da aprendizagem

Colocando-se a ênfase no sujeito que aprende, pergunta-se então qual o papel dos professores. Criar, estruturar e dinamizar situações de aprendizagem e estimular a aprendizagem e a auto-confiança nas capacidades individuais para aprender são competências que o professor de hoje tem de desenvolver.Não há que declarar morte ao professor. Pelo contrário, na era da informação, ele é o timoneiro na viagem da aprendizagem em direção ao conhecimento.Os professores são estruturadores e animadores das aprendizagens e não apenas do ensino.Primeiro que tudo, os professores têm que repensar o seu papel. Se é certo que continuam a ser fontes de informação, têm de se conscientizar que são apenas uma fonte de informação, entre muitas outras. Deve, no entanto, salientar-se que o seu valor informativo tem níveis diferentes conforme o acesso que os seus alunos puderem ter a outras fontes de informação. É fundamental que os professores percebam esta diversidade.O professor tem, também ele, de se considerar num constante processo de auto-formação e identificação profissional. Tem de ser um professor reflexivo numa comunidade profissional reflexiva.

A escola na sociedade da aprendizagem

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As escolas ainda não compreenderam que, também elas, têm de se repensar.Permanecem na atitude negativa de se sentirem defasadas, mal compreendidas e mal-amadas, ultrapassadas, talvez inúteis. Ficam à espera de alguém que as venha transformar. E não perceberam ainda que só elas podem transformar a si próprias. Por dentro. Com as pessoas que as constituem: professores, alunos, funcionários. Em interação com a comunidade circundante.As escolas que já perceberam o fenômeno, começaram a funcionar como comunidades auto-críticas, aprendentes, reflexivas. Constituem a escola reflexiva, que pode ser definida como “organização que continuamente se pensa a si própria, na sua missão social e na sua organização, e se confronta com o desenrolar da sua atividade em um processo heurístico simultaneamente avaliativo e formativo”.A escola reflexiva não é telecomandada do exterior. É auto-gerida. Tem o seu projeto próprio, construído com a colaboração dos seus membros. Sabe para onde quer ir e avalia-se permanentemente na sua caminhada. Contextualiza-se na comunidade que serve e com esta interage. Acredita nos seus professores, cuja capacidade de pensamento e de ação sempre fomenta. Envolve os alunos na construção de uma escola cada vez melhor. Pensa-se e avalia-se. Constrói conhecimento sobre si própria.Uma escola reflexiva é uma comunidade de aprendizagem e é um local onde se produz conhecimento sobre educação.

Capítulo II - A formação do professor reflexivo

Introdução

Após o que poderíamos chamar de apoteótica recepção, assiste-se hoje, no Brasil, a uma crítica acesa contra a proposta do professor reflexivo (cf. por exemplo, Pimenta e Ghedin, 2002). Importa também tentar compreender se a expectativa foi demasiado elevada, se a proposta não foi totalmente entendida ou se ela é difícil de pôr em ação na prática quotidiana dos professores.

Em que se baseia a noção de professor reflexivo?

A noção de professor reflexivo baseia-se na consciência da capacidade de pensamento e reflexão que caracteriza o ser humano como criativo e não como mero reprodutor de idéias e práticas que lhe são exteriores.

Como se explica o fascínio que atraiu?

O fascínio por esta nova conceptualização pode ser entendido se tivermos em consideração a crise de confiança na competência de alguns profissionais (que tendemos a generalizar), a reação perante a tecnocracia instalada, a relatividade inerente ao espírito pós-moderno, o valor hoje atribuído à epistemologia da prática, a fragilidade do papel que os professores normalmente assumem no desenvolvimento das reformas curriculares, o reconhecimento da complexidade dos problemas da nossa sociedade atual, a consciência de como é difícil formar bons profissionais, e amplas visões associadas a estas representações sociais.

Por que a atual desilusão?

As três hipóteses seguintes parecem ter, no seu conjunto, valor explicativo.- Colocaram-se as expectativas demasiado alto e pensou-se que esta conceptualização, tal como um pozinho mágico, resolveria todos os problemas de formação, de desenvolvimento e de valorização dos professores, incluindo a melhoria do seu prestígio social, das suas condições de trabalho e de remuneração;- O conceito de reflexão não foi compreendido na sua profundidade, podendo ter seguido a força dos modismos;- É necessário reconhecer as dificuldades pessoais e institucionais para pôr em ação, de uma forma sistemática e não apenas pontual, programas de formação (inicial e contínua) de natureza reflexiva.

Qual a relação entre o professor reflexivo e a escola reflexiva?

O professor não pode agir isoladamente na sua escola. É neste local, o seu local de trabalho, que ele, com os outros, seus colegas, constrói a profissionalidade docente. Mas se a vida dos professores tem o seu contexto próprio, a escola, esta tem de ser organizada de modo a criar condições de reflexividade individuais e coletivas, sendo ela própria, reflexiva.

Como formar professores reflexivos para e numa escola reflexiva?

Se a capacidade reflexiva é inata no ser humano, ela necessita de contextos de liberdade e de responsabilidade que favoreçam o seu desenvolvimento. Nestes contextos formativos com base na experiência, a expressão e o diálogo assumem um papel de enorme relevância. Um triplo diálogo: um diálogo consigo próprio, um diálogo com os outros incluindo os que antes de nós construíram conhecimentos que são referência e o diálogo com a própria situação.Este diálogo não pode ser meramente descritivo, pois seria extremamente pobre. Tem de atingir um nível explicativo e crítico que permita aos profissionais agir e falar com o poder da razão.A reflexão, para ser eficaz, precisa de ser sistemática nas suas interrogações e estruturante dos saberes dela resultantes. A metodologia de pesquisa-ação apresenta-se com potencialidades para servir a este objetivo.Nos últimos anos tem-se realçado o valor formativo da pesquisa-ação e a formação em contexto de trabalho, pelo que muitas vezes se usa o trinômio pesquisa-formação-ação. A pesquisa-ação é uma metodologia de intervenção social cientificamente apoiada e desenrola-se segundo ciclos de planificação, ação, observação, reflexão. Subjaz a esta abordagem a idéia de que a experiência profissional, se sobre ela se refletir e conceptualizar, tem um enorme valor formativo. Aceita-se também que a compreensão da realidade, elemento que constitui o cerne da aprendizagem, é produto dos sujeitos enquanto observadores participantes implicados. Reconhece-se também que o que mobiliza a

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formação dos profissionais adultos advém do desejo de resolver os problemas que encontram na sua prática quotidiana.

A pesquisa-ação, a abordagem reflexiva e a aprendizagem experencial

Compreendido o problema, urge planificar a solução de ataque e pô-la em execução para, em seguida, se observar o que resulta da experiência, se conceptualizarem resultados e problemas emergentes, se planificar ou re-planificar, entrando assim num novo ciclo da espiral da pesquisa-ação.

A análise de casos

Os casos que os professores contam revelam o que eles ou os seus alunos fazem, sentem, pensam, conhecem. Shulman (1986) diz que os casos representam conhecimento teórico e assumem um valor explicativo que vai além da mera descrição. Para ele, “um acontecimento pode ser descrito; um caso tem de ser explicado, interpretado, discutido, dissecado e reconstruído”

As narrativas

Geralmente é difícil ganhar o hábito de escrever narrativas. Perante a folha de papel em branco, o professor normalmente pergunta-se sobre o que há de escrever. Algumas perguntas podem ajudar: O que aconteceu? Como? Onde? Por que? O que senti eu e / ou outras pessoas envolvidas? O que penso relativamente ao que aconteceu?

Narrativas e casos: que relação?

As narrativas estão na base dos casos, mas os casos implicam uma teorização. Os casos não são meras narrativas; eles encerram em si conhecimento sobre a vida.

Os portfólios

Portfólio: “um conjunto coerente de documentação refletidamente selecionada, significativamente comentada e sistematicamente organizada e contextualizada no tempo, reveladora do percurso profissional”.Existem, neste processo, duas características a salientar. Por um lado, o fato de o portfólio ser uma construção pessoal do seu autor, que seleciona os seus trabalhos, os organiza, os explica e lhes dá coerência. Por outro lado, o fato de o portfólio ter uma finalidade: dar-se a conhecer, revelar-se, aspirando a um reconhecimento do mérito. Idália Chaves utiliza a designação “portfólios reflexivos”.

As perguntas pedagógicas

Como atributo do ser humano, a capacidade de questionarmos e de nos questionarmos a nós próprios é um motor de desenvolvimento e de aprendizagem. Porém, as perguntas, para merecerem a designação de pedagógicas, têm de ter uma intencionalidade formativa e isso, independentemente de quem as faz, quer o próprio professor, quer um colega ou supervisor.

Capítulo 4 - Gerir uma escola reflexiva

Introdução

Se a vida dos professores tem o seu contexto próprio, a escola, esta tem de ser organizada de modo a criar condições de reflexividade individuais e coletivas.

Uma nota autobiográfica, enquadradora do tema

Neste trecho do livro, a autora mapeia a sua experiência como professora e como formadora de professores. Para ela, assume grande significado a teoria da aprendizagem experencial de David Kolb (1984).Segundo Kolb, a aprendizagem implica um processo de compreensão da realidade que nos leva a passar do nível concreto da experiência ao nível abstrato da conceptualização a que se associa um processo de intriorização-exteriorização que, da reflexão, nos leva à ação. O ciclo de aprendizagem constituir-se-á, então, em quatro momentos fundamentais: experiência, observação reflexiva, conceptualização e generalização e, finalmente, experimentação na ação.Faz-se necessário ao educador abrir-se ao pensamento sobre a escola como uma comunidade socialmente organizada e dinamizada por um projeto próprio. A escola deve ser concebida como organismo vivo, também ela em desenvolvimento e em aprendizagem, norteada por uma finalidade (educar) que se concretiza num grande plano de ação: o projeto educativo.

Pensando sobre a essência da escola

A escola deve ser vista como uma comunidade. Comunidade em que participam vários atores sociais que nela desempenham papéis ativos, embora diversificados. Comunidade que tem uma missão: educar. Missão que não é exclusiva da escola, mas pertence também à família, à municipalidade, e à sociedade em geralA escola surge-nos como um todo e não como um ajuntamento de pessoas. Esse todo, para ser coeso e dinâmico, exige uma organização. Em resumo, a escola é uma comunidade social, organizada para exercer a função de educar e instruir.

A escola como eu gostaria que ela fosse.

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A autora expressa o desejo de que a escola tivesse as seguintes características: uma escola que conceba, projete, atue e reflita em vez de uma escola que apenas executa o que os outros pensaram para ela; uma escola que tenha uma ambição estratégica por oposição a uma escola que não tenha visão e que não saiba olhar-se no futuro; uma escola que não lamente seus insucessos, mas que questione o insucesso nas suas causas para, relativamente a elas, traçar planos de ação; uma escola que analise, desconstrua e refaça as suas opções e a sua ação curricular; uma escola que saiba criar suas próprias regras, prestando contas de sua atuação, justificando seus resultados e auto-avaliando-se para definir o seu desenvolvimento; uma escola que se alimente do saber, da produção e da reflexão dos seus profissionais; uma escola que conhece suas necessidades, cria os seus contextos de formação e integra a formação no seu desenvolvimento institucional.

Como cheguei ao conceito de escola reflexiva

A escola nunca está verdadeiramente feita. Encontra-se sempre em construção, em desenvolvimento. Deve-se entender a escola como uma construção social, dinâmica, mediada pela interação dos diferentes atores sociais que nela vivem e com ela convivem. Destacam-se as idéias de pensamento e de reflexão, organização e missão, avaliação e formação. Por detrás desta concepção é fácil reconhecer a idéia de professor reflexivo de Schön. Mas subjaz-lhe também a noção de organização aprendente de Senge (1994), definida como uma: “organização que está continuamente expandindo a sua capacidade de criar o futuro” (1994:14)Em síntese, a escola tem uma missão: educar. Pensa-se e organiza-se para saber como desempenhar essa missão num dado contexto temporal e sócio-cultural. Quer saber se está no bom caminho e para isso investiga-se a si própria.

Escola, comunidade com projeto

Assume particular relevância o movimento em favor da autonomia das escolas e do projeto de escola de que tanto se tem falado.Um projeto de escola, de acordo com Macedo (1995:113), é “o cerne da política da escola – política distinta e original de cada comunidade educativa, definida na gestão de tensões positivas, princípios, normas nacionais e objetivos, necessidades, recursos e modos de funcionamento específicos de cada escola”.O projeto aparece assim na sua dimensão de processo e de produto, de preferência e de referência. Esta idéia de um produto que se assume como referência é muito importante para o âmago deste texto: gerir a escola reflexiva. Mas igualmente importante é perceber o processo que dá lugar ao produto e que implica tomadas de decisão a que subjazem valorações e preferências.Uma outra idéia que urge considerar é a de que, tendo a escola por missão educar e instruir, o projeto se deve centrar no modo como a escola se organiza para criar as condições de aprendizagem e desenvolvimento inerentes ao currículo.

O currículo no centro do projeto de escola

O currículo deve ser entendido no seu sentido lato, ou seja, como conjunto de aprendizagens proporcionadas pela escola e consideradas socialmente necessárias num dado tempo e contexto. Como afirma Roldão, é “o currículo que legitima socialmente a escola, como instituição a quem a sociedade remete a ‘passagem’ sistemática (das) aprendizagens tidas como necessárias” (2000:17)Central ao currículo e à escola está a noção de educação e de aprendizagem, correlacionadas com a de ensino e de avaliação de onde decorrem as de organização de espaços, tempos e recursos. A escola tem há vários anos vindo a ser organizada em termos de quatro princípios que Roldão designou como “homogeneidade, segmentação, seqüencialidade e conformidade” (2001:127) e de cuja operacionalização resulta a previsão de percursos iguais para todos, a organização dos alunos por turmas tanto quanto possível homogêneas e de composição estável, a existência de tempos e espaços previamente definidos e espartilhados em grades horárias, a progressiva segmentação disciplinar e a multidocência à medida que a informação ganha em profundidade e o conhecimento perde o significado de conjunto.As escola, os professores, os políticos e os pais começam a interrogar-se sobre se este paradigma organizacional de incrível uniformidade e o paradigma de educação e aprendizagem que lhe está subjacente (e que se baseia na idéia da transmissão linear do saber do professor para o aluno), se adequa à nova realidade caracterizada por: uma população escolar altamente heterogênea e massificada; acessibilidade da informação; exigência do conhecimento como bem social; requisitos da sociedade global relativamente aos saberes qualificados; necessidade de se explorarem as capacidades de trabalho individual e cooperativo para se transformar em conhecimento o saber que brota da assimilação das informações.No novo paradigma, a noção de grupo de aprendizagem, a reconstituir-se em função das necessidades ou dos objetivos, deveria substituir a de turma fixa, o que obviamente implica outras formas de organização da relação do aluno com os professores, com as fontes de informação e com o saber.Perrenoud, em 2001, idealizou uma nova organização do trabalho na escola, baseada em objetivos (e não tanto em programas), em ciclos de aprendizagem pluri-anuais (em vez de turmas imutáveis), em grupos flexíveis (em vez de turmas imutáveis), em módulos intensivos (em vez de grades horárias provisórias / fragmentárias), em projetos pluridisciplinares (em vez de capelinhas disciplinares), em tarefas escolares à base de problemas e de projetos (em vez dos exercícios clássicos).O próprio Perrenoud reconheceu as dificuldades de implementar estas novas formas de organização.No entanto, é necessário um afastamento progressivo do atual modelo que temos, se quisermos mudar a cara da escola. Só através da atenção dialogante com a própria realidade que lhe fala é que a escola será capaz de agir adequadamente, que o mesmo é dizer, agir em situação.A escola reflexiva tem a capacidade de pensar para se projetar e desenvolver. O projeto de escola, na sua dimensão de produto, é um documento. Mas esse projeto/documento resulta de um processo de pensamento sobre a missão da escola e o modo como ela se organiza para cumprir essa missão.O projeto deve basear-se numa visão prospectiva e estratégica do que se pretende para a escola, uma visão

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interpretativa da sua missão e alicerçada nos valores assumidos pelo coletivo dos atores sociais presentes na vida da escola. A construção do projeto é um processo de implicação das pessoas, de negociação de valores e percepções, de diálogo clarificador do pensamento e preparador de decisões.

Gerir uma escola reflexiva é gerir uma escola com projeto

Só um modelo democrático de gestão se coaduna com o conceito de escola reflexiva. O modelo democrático de gestão é aquele em que todos e cada um se sente pessoa. E ser pessoa é ter papel, ter voz, ser responsável. Um modelo em que cada um se considera efetivamente presente ou representado nos órgãos de decisão. E em que há capacidade real de negociação e de diálogo capaz de ultrapassar as dicotomias entre o eu e o nós.O projeto pode se transformar num documento inerte se não houver o envolvimento continuado das pessoas. São as pessoas que, na qualidade de atores sociais, dão vida aos projetos, desenvolvendo atividades várias, e mobilizando, nesse sentido, as estratégias que se lhes apresentam como conducentes à realidade das tarefas a executar.Gerir uma escola reflexiva é transformar o projeto enunciado em projeto conseguido ou o projeto visão em projeto ação.Gerir uma escola reflexiva implica ter um pensamento e uma atuação sistêmica que permita integrar cada atividade no puzzle global e não deixar-se navegar ao sabor dos interesses individuais ou das influências de grupos instituídos.A título de conclusão, gerir uma escola reflexiva é:- ser capaz de liderar e mobilizar pessoas;- saber agir em situação;- nortear-se pelo projeto de escola;- assegurar uma atuação sistêmica;- assegurar a participação democrática;- pensar e escutar antes de decidir;- saber avaliar e deixar-se avaliar;- ser conseqüente;- ser capaz de ultrapassar dicotomias paralisantes;- decidir;- acreditar que todos e a própria escola se encontram num processo de desenvolvimento e de aprendizagem.

A AVALIAÇÃO ESCOLAR (José Carlos Libâneo)A avaliação é em última análise uma reflexão do nível qualitativo do trabalho escolar do professor e do aluno. Sabe-se também que ela é complexa e não envolve apenas testes e provas para determinar uma nota.Uma definição de avaliação escolar Segundo o professor Cipriano C. Luckesi, a avaliação é uma análise quantitativa dos dados relevantes do processo de ensino aprendizagem que auxilia o professor na tomada de decisões. Os dados relevantes aqui se referem às ações didáticas. Com isto, nos diversos momentos de ensino a avaliação tem como tarefa: a verificação, a qualificação e a apreciação qualitativa. Ela também cumpre pelo menos três funções no processo de ensino: a função pedagógica didática, a função de diagnóstico e a função de controle.Avaliação na prática escolar Lamentavelmente a avaliação na escola vem sido resumida a dar e tirar ponto, sendo apenas uma função de controle, dando a ela um caráter quantitativo. Certamente, com isto, os professores não conseguem efetivamente usar os procedimentos de avaliar. Com estas ações, quando a avaliação se resume a provas, professores com critérios onde décimos às vezes reprovam alunos, há a exclusão do professor do seu papel docente, que é de fornecer os meios pedagógico-didáticos para os alunos aprenderem sem intimidação.Características da avaliação escolar Agora, o autor sintetiza as principais características da avaliação escolar.

a. Reflete a unidade objetivos-conteúdos-métodos.b. Possibilita a revisão do plano de ensino. c. Ajuda a desenvolver capacidades e habilidades. d. Volta-se para a atividade dos alunos. e. Ser objetiva. f. Ajuda na autopercepcao do professor.g. Reflete valores e expectativas do professor em relação aos alunos.

Esta frase marca este subtítulo "A avaliação é um ato pedagógico". (Libâneo, 1994, p.203). Instrumentos de verificação do rendimento escolar Uma das funções da avaliação é com certeza a de determinar em que nível de qualidade está sendo atendido os objetivos; para este fim, são necessários instrumentos e procedimentos. Alguns destes procedimentos ou instrumentos já são conhecidos, mas, neste subtítulo, o autor revisa e cita muitos deles ou os mais usados para verificar o rendimento escolar:

1. Prova escrita dissertativa. 1. Prova escrita de questões objetivas. 1. Questões certo-errado (C ou E). 1. Questões de lacunas (para completar). 1. Questões de correspondência.1. Questões de múltipla escolha. 1. Questões do tipo "teste de respostas curtas" ou de evocação simples. 1. Questões de interpretação de texto. 1. Questões de ordenação. 1. Questões de identificação.1. Procedimentos auxiliares de avaliação

11.1 A Observação; 2. A Entrevista;

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2. Ficha sintética de dados dos alunos. Atribuição de notas ou conceitos As notas demonstram de forma abreviada os resultados do processo de avaliação. Esta avaliação tem também uma função de controle, expressando o resultado em notas e conceitos. O autor fala também da importância de se valorizar todas as formas de avaliação, ou instrumentos, e não apenas a prova no fim do bimestre como grande nota absoluta, que não valoriza o processo. Propõe uma escala de pontos ensinando como utilizar médias aritméticas para pesos diferentes, por fim, mostra como se deve aproximar notas decimais.

CONSTRUINDO UM CONCEITO DE PARTICIPAÇÃO

A preocupação com a melhoria da qualidade da Educação levantou a necessidade de descentralização e democratização da gestão escolar e, consequentemente, participação tornou-se um conceito nuclear. Como aponta Lück et al. (1998), "o entendimento do conceito de gestão já pressupõe, em si, a idéia de participação, isto é, do trabalho associado de pessoas analisando situações, decidindo sobre seu encaminhamento e agir sobre elas em conjunto" (p.15). De acordo com a etimologia da palavra, participação origina-se do latim "participatio" (pars + in + actio) que significa ter parte na ação. Para ter parte na ação é necessário ter acesso ao agir e às decisões que orientam o agir. "Executar uma ação não significa ter parte, ou seja, responsabilidade sobre a ação. E só será sujeito da ação quem puder decidir sobre ela" (BENINCÁ, 1995, p. 14). Para Lück et al. (1998) a participação tem como característica fundamental a força de atuação consciente, pela qual os membros de uma unidade social (de um grupo, de uma equipe) reconhecem e assumem seu poder de exercer influência na determinação da dinâmica, da cultura da unidade social, a partir da competência e vontade de compreender, decidir e agir em conjunto. Trabalhar em conjunto, no sentido de formação de grupo, requer compreensão dos processos grupais para desenvolver competências que permitam realmente aprender com o outro e construir de forma participativa. Para Pichin-Rivière (1991) grupo é um "conjunto restrito de pessoas ligadas entre si por constantes de espaço e tempo, articuladas por sua mútua representação interna interatuando através de complexos mecanismos de assunção e atribuição de papéis, que se propõe de forma explícita ou implícita uma tarefa que constitui sua finalidade" (pp. 65-66). O que se diz explícito é justamente o observável, o concreto, mas abaixo dele está o que é implícito. Este é constituído de medos básicos (diante de mudanças, ora alternativas transformadoras ora resistência à mudança). Pichon-Rivière (ibdem) diz que a resistência à mudança é conseqüência dos medos básicos que são o "medo à perda" das estruturas existentes e "medo do ataque" frente às novas situações, nas quais a pessoa se sente insegura por falta de instrumentação. A partir desses breves comentários, pode-se compreender a importância do tão divulgado "momento de sensibilização" na implementação de planos, programas e projetos. Sensibilidade é "qualidade de ser sensível, faculdade de sentir, propriedade do organismo vivo de perceber as modificações do meio externo e interno e de reagir a elas de maneira adequada" (FERREIRA, s/d). Sensibilizar, portanto, é provocar e tornar a pessoa sensível; fazer com que ela participe de alguma coisa de forma inteira. Por outro lado, lembra Pichon-Riviére (1991) que "um grupo obtém uma adaptação ativa à realidade quando adquire insight, quando se torna consciente de certos aspectos de sua estrutura dinâmica. Em um grupo operativo, cada sujeito conhece e desempenha seu papel específico, de acordo com as leis da complementaridade" (p. 53). Com diz Libâneo (2001), a participação é fundamental por garantir a gestão democrática da escola, pois é assim que todos os envolvidos no processo educacional da instituição estarão presentes, tanto nas decisões e construções de propostas (planos, programas, projetos, ações, eventos) como no processo de implementação, acompanhamento e avaliação. Finalizando, cabe perguntar: como estamos trabalhando, no sentido do desenvolvimento de grupos operativos, onde cada sujeito, com sua subjetividade, possa contribuir na reconstrução de uma escola de que precisamos? PEDAGOGIA DA AUTONOMIAPaulo Freire

Pedagogia da Autonomia é um livro pequeno em tamanho, mas gigante em esperança e otimismo, que condena as mentalidades fatalistas que se conformam com a ideologia imobilizante de que "a realidade é assim mesmo, que podemos fazer?" Para estes basta o treino técnico indispensável à sobrevivência. Em Paulo Freire, educar é construir, é libertar o ser humano das cadeias do determinismo neoliberal, reconhecendo que a história é um tempo de possibilidades. É um "ensinar a pensar certo" como quem "fala com a força do testemunho". É um "ato comunicante, co-participado", de modo algum produto de uma mente "burocratizada". No entanto, toda a curiosidade de saber exige uma reflexão crítica e prática, de modo que o próprio discurso teórico terá de ser aliado à sua aplicação prática. Ensinar é algo de profundo e dinâmico onde a questão de identidade cultural que atinge a dimensão individual e a classe dos educandos, é essencial à "prática educativa progressista". Portanto, torna-se imprescindível "solidariedade social e política para se evitar um ensino elitista e autoritário como quem tem o exclusivo do "saber articulado". E de novo, Freire salienta, constantemente, que educar não é a mera transferência de conhecimentos, mas sim conscientização e testemunho de vida, senão não terá eficácia.Igualmente, para ele, educar é como viver, exige a consciência do inacabado porque a "História em que me faço com os outros (...) é um tempo de possibilidades e não de determinismo"(p.58). No entanto, tempo de possibilidades condicionadas pela herança do genético, social, cultural e histórico que faz dos homens e das mulheres seres responsáveis, sobretudo quando "a decência pode ser negada e a liberdade ofendida e recusada"(p.62).Segundo Freire, "o educador que 'castra' a curiosidade do educando em nome da eficácia da memorização mecânica do ensino dos conteúdos, tolhe a liberdade do educando, a sua capacidade de aventurar-se. Não forma, domestica"(p.63). A autonomia, a dignidade e a identidade do educando tem de ser respeitada, caso contrário, o ensino tornar-se-á "inautêntico, palavreado vazio e inoperante"(p.69). E isto só é possível tendo em conta os conhecimentos adquiridos de experiência feitos" pelas crianças e adultos antes de chegarem à escola. Para Freire, o homem e a mulher são os únicos seres capazes de aprender com alegria e esperança, na convicção de que a mudança é possível. Aprender é uma descoberta criadora, com abertura ao risco e a aventura do ser, pois ensinando se aprende e aprendendo se ensina. Neste sentido, afirma que qualquer iniciativa de alfabetização só toma

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dimensão humana quando se realiza a "expulsão do opressor de dentro do oprimido", como libertação da culpa (imposta) pelo "seu fracasso no mundo". Por outro lado, Freire insiste na "especificidade humana" do ensino, enquanto competência profissional e generosidade pessoal, sem autoritarismos e arrogância. Só assim, diz ele, nascerá um clima de respeito mútuo e disciplina saudável entre "a autoridade docente e as liberdades dos alunos, (...) reinventando o ser humano na aprendizagem de sua autonomia"(p.105). Conseqüentemente, não se poderá separar "prática de teoria, autoridade de liberdade, ignorância de saber, respeito ao professor de respeito aos alunos, ensinar de aprender” (p.106-107).A idéia de coerência profissional, indica que o ensino exige do docente comprometimento existencial, do qual nasce autêntica solidariedade entre educador e educandos, pois ninguém se pode contentar com uma maneira neutra de estar no mundo. Ensinar, por essência, é uma forma de intervenção no mundo, uma tomada de posição, uma decisão, por vezes, até uma ruptura com o passado e o presente. Pois, quando fala de "educação como intervenção", Paulo Freire refere-se a mudanças reais na sociedade: no campo da economia, das relações humanas, da propriedade, do direito ao trabalho, à terra, à educação, à saúde(...)"(p.123), em referência clara a situação no Brasil e noutros países da América Latina. Para Freire, a educação é ideológica mas dialogante e atentiva, para que se possa estabelecer a autêntica comunicação da aprendizagem, entre gente, com alma, sentimentos e emoções, desejos e sonhos. A sua pedagogia é "fundada na ética, no respeito à dignidade e à própria autonomia do educando"(p.11). E é "vigilante contra todas as práticas de desumanização"(p.12). É necessário que "o saber-fazer da auto reflexão crítica e o saber-ser da sabedoria exercitada ajudem a evitar a "degradação humana" e o discurso fatalista da globalização"(p.12).Para Paulo Freire o ensino é muito mais que uma profissão, é uma missão que exige comprovados saberes no seu processo dinâmico de promoção da autonomia do ser de todos os educandos. Os princípios enunciados por Paulo Freire, o homem, o filósofo, o Professor que por excelência verdadeiramente promoveu a inclusão de todos os alunos e alunas numa escolaridade que dignifica e respeita os educandos porque respeita a sua leitura do mundo como ponte de libertação e autonomia de ser pensante e influente no seu próprio desenvolvimento. A Pedagogia da Autonomia é sem dúvida uma das grandes obras da humanidade em prol duma educação que respeita todo o educando (incluindo os mais desfavorecidos) e liberta o seu pensamento de tradições desumanizantes - porque opressoras. A esperança e o otimismo na possibilidade da mudança são um passo gigante na construção e formação científica do professor ou da professora que "deve coincidir com sua retidão ética" (p.18). Paulo Freire, um Professor que através da sua vida não só procurou perceber os problemas educativos da sociedade brasileira e mundial, mas propôs uma prática educativa para os resolver. Esta ensina os professores e as professoras a navegar rotas nos mares da educação orientados por uma bússola que aponta entre outros os seguintes pontos cardeais:a rigorosidade metódica e a pesquisa, a ética e estética, a competência profissional, o respeito pelos saberes do educando e o reconhecimento da identidade cultural, a rejeição de toda e qualquer forma de discriminação, a reflexão crítica da prática pedagógica, a corporeificação, o saber dialogar e escutar, o querer bem aos educandos, o ter alegria e esperança, o ter liberdade e autoridade, o ter curiosidade, o ter a consciência do inacabado... Como princípios basilares a uma prática educativa que transforma educadores e educandos e lhes garante o direito a autonomia pessoal na construção duma sociedade democrática que a todos respeita e dignifica.Paulo Freire demonstra a todos os falantes da língua portuguesa, acostumados à maneira masculina de ver o mundo, a qual tem mantido invisível metade da humanidade os seres femininos, que a língua Portuguesa também nos proporciona as possibilidades do uso de linguagem que respeita a comparticipação visível e dignificante da mulher no mundo atual. Para Paulo Freire não existe unicamente o homem, o professor, o aluno, o pai mas também a mulher, a professora, a aluna, a mãe! A impressão geral do livro é que Paulo Freire escreve e discursa, acima de tudo, com amor pelo que faz. O autor vai lentamente introduzindo conceitos que se misturam e se complementam, às vezes de maneira sutil, e em outras ocasiões de maneira objetiva e absolutamente sincera. Uma das principais mensagens que o autor deixa nesta obra, ao meu ver, é o significado do ensinar. É com a mais brilhante vocação que o autor mostra em simples palavras que ensinar é todo um processo de troca entre aluno e professor, onde ambos aprendem, ambos adquirem e sanam dúvidas, ambos crescem como seres humanos. É a mensagem de que para ensinar precisamos, antes de mais nada, ter a consciência da importância e da beleza desta tarefa, da importância de se poder fazer a diferença num sistema socio-econômico-político com certezas às vezes tão opressoras e cruéis àqueles que não dispõe de meios financeiros para obter cultura e informação. Enfim, o professor Paulo Freire nos dá uma aula de ensinar, e nos fornece com um pensamento livre e despojado uma grande inspiração: de que ensinar vale a pena.Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. Paulo Freire A temática central deste livro é a formação de professores, inserida numa reflexão sobre a prática educativo- progressista em favor da AUTONOMIA dos alunos (pois FORMAR é muito mais do que simplesmente EDUCAR).Na verdade, o enfoque não foge muito do que poderia ser chamado de "ética do ensino", procurando alertar o leitor sobre a diferença entre treinar, ensinar e educar, temas freqüentes na obra deste autor.Grande parte do livro é dedicada a discussões sobre o quanto as atitudes que o professor toma dentro de sala e fora dela influenciam o que ele passa para seus alunos, englobando desde recomendações sobre a tomada de consciência de que os alunos têm uma cultura e uma curiosidade que precedem a imposição da escola, a discussão sobre a mudança de "curiosidade ingênua" para "curiosidade epistemológica" (que não diferem em sua essência, mas em sua complexidade, pois enquanto aquela se baseia apenas na experiência cotidiana, esta é dotada do rigor metódico, do criticismo), até a consideração dos educandos como seres humanos, portanto, seres histórico-sociais dotados de uma noção mínima de ética. O autor não fecha os olhos para as injustiças que acontecem com os "esfarrapados do mundo". Está ao lado deles, embora não aceite que, para que as injustiças acabem, ações terroristas sejam tomadas.Os professores têm grande responsabilidade ao ensinar e devem ser dotados de ÉTICA (universal do ser humano, sem cinismos), sendo esta intimamente relacionada ao seu preparo científico, combatendo a malvadez da ética de mercado mundial (baseada em lucros). Paulo Freire beira o moralismo quando se põe a discutir sobre os preconceitos embutidos consciente ou insconscientemente no processo educativo. Discute desde frases do tipo "Maria é negra, mas é bondosa e competente" e até justifica sua raiva frente a posturas deste tipo. Beira o moralismo também quando se refere a crianças de escola pública que depredam o próprio patrimônio (ou seja, a escola), porque "como cobrar das crianças um mínimo de respeito (...) se o Poder Público revela absoluta desconsideração à coisa pública?". Ele mesmo percebe isso, e freqüentemente se dirige ao leitor para que ele lembre que não está sendo descrita uma "educação de anjos", mas uma "educação de homens e mulheres". Talvez isso seja uma reflexão de ideologia esquerdista, sobre a qual também existe menção, tendo como foco os professores que se dizem "progressistas" mas

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se renderam à rotina neocapitalista. Freire parece, então, não utópico, mas excessivamente confiante na vontade das pessoas de se tornarem melhores (i.e. apoiarem atitudes "progressistas"). Existe ainda uma preocupação com a caracterização do meio escolar como um meio de convívio social onde existem exemplos humanos além dos que se encontram nos livros didáticos, e como o professor é um desses exemplos, ele deve ter plena consciência disso, e portanto julgar as próprias ações. Freire não insiste, neste livro, no aspecto teórico da epistemologia, mas sempre recomenda a postura crítica frente a qualquer atitude, seja ela um conteúdo escolar ou não, porque essa postura crítica é o que caracteriza a "curiosidade epistemológica" e permite que, uma vez identificados os erros, sejam feitas mudanças. E essas mudanças são aquelas que levariam à melhoria das condições de vida de cada um, ou ao progresso.Freire tem, no entanto, várias distorções de visão, pois além de várias vezes ser utópico, sugere que se leve discussões políticas para a sala de aula (o que é negativo para a formação de Ciências Sociais, porque a ideologia do professor contamina o que ele se dispuser a discutir) e ainda tem uma visão excessivamente centrada no ser humano, colocando animais (inclusive mamíferos) como seres inferiores (o que é negativo principalmente na formação de Ciências Naturais).Com base nestes apontamentos iniciais, podem ser citadas algumas das considerações sobre a prática docente: 1) Deve existir uma reflexão crítica entre a relação Teoria/ Prática, para que nenhuma perca seu sentido ou importância.2) O professor não pode somente transferir conhecimento, devendo haver uma troca de ensinamentos e aprendizagens entre educador e educando (este, cada vez mais curioso, poderá criar sempre mais). O professor deve estar aberto aos questionamentos e dificuldades dos alunos. Entretanto, se o aluno foi submetido a um falso ensinar, isto não significa que ele está condenado, pois se ele tiver curiosidade e capacidade de se arriscar, pode superar esta falha. 3) É preciso reforçar a capacidade crítica do educando e sua insubmissão, dentro de uma rigorosidade metódica, para que ele não se torne um simples "memorizador". 4) Os conhecimentos dos alunos têm que ser respeitados, principalmente daqueles vindos de classes mais baixas, e aplicá-los aos conteúdos ensinados (REALIDADE DENTRO DO APRENDIZADO). 5) A crítica deve estar inserida no ensino, a partir da curiosidade dos alunos. Esta, inicialmente ingênua, ao ser superada, pode tornar- se epistemológica, com a aplicação da prática pedagógico- progressista. 6) Necessidade de decência e pureza (que não pode ser entendida como puritanismo). Se o ensino for transformado em pura técnica, o educador distancia- se da ética.- Não deve haver discriminação, pois esta prática fere a dignidade do ser humano e não se aplica à democracia. 7) É necessário ensinar o educando a PENSAR CERTO. 8) Deve- se assumir a identidade cultural de cada um, assunção esta incompatível com os pensamentos elitistas. 9) O professor tem que estar ciente de que suas atitudes podem influenciar profundamente a vida de um aluno, positiva ou negativamente. 10) O conhecimento do professor precisa ser vivido por ele, encarnado, para que se transforme em prática aplicável.11) O ensino e sua prática não podem ser tratados como algo definitivo, são passíveis de mudança. O ser humano também é inacabado e justamente por isso, o ato de ensinar/aprender deve ser permanente. 12) É necessária a consciência de que as pessoas podem ser CONDICIONADAS de acordo com o meio. Porém, isto não significa que elas sejam DETERMINADAS por ele (os obstáculos não são eternos). 13) O respeito pela autonomia do aluno é exigido pela ética. Cada um possui particularidades e pensamentos que não podem ser minimizados ou ridicularizados. Se isto acontecer, a ética é transgredida.- Bom senso. Autoridade não pode ser entendida como autoritarismo. O professor tem que entender, em certas ocasiões, pontos falhos do aluno. Ao invés de reprimi-lo, tem que ajudá-lo, com humildade e tolerância. 14) Sobre a avaliação: seria boa uma forma na qual fosse feita junto com os alunos, pois a avaliação é para eles, e não para o educador. 15) Para a realização da docência decente, devem existir condições favoráveis, higiênicas, espaciais e estéticas. O corpo docente deve lutar pelos seus direitos (como um salário digno), isto faz parte da prática de lecionar. 16) Se a educação é ofendida (principalmente nas escolas públicas), o professor deve tomar uma postura política que o permita lutar contra esta ofensa, além de repensar sobre a eficácia das greves. 17) Deve haver alegria e esperança. A esperança faz parte do ser humano, e negá-la contradiz a prática progressista da educação e a ética (sempre contra a frase: "O QUE FAZER? A REALIDADE É ASSIM MESMO"). 18) O futuro deve ser tratado como problema, que pode ser solucionado, e não como inexorável. Com base nisso, o professor tem que estar convencido de que mudanças são possíveis, por exemplo, com relação aos favelados e aos sem- terra. 19) O professor, assim como o aluno, também é movido pela curiosidade. Ela é a mola propulsora do aprendizado e do ensino do educador, da construção e produção de conhecimentos. Proporciona um diálogo entre o professor e o aluno. Porém, este diálogo não deve ser tratado como apenas um vai- vem de perguntas e respostas: momentos explicativos do educador são necessários. 20) É preciso tomar muito cuidado com a relação autoridade- liberdade, sempre ameaçadas pela prática do autoritarismo e da licenciosidade, prática esta que pode acabar levando a disciplina à indisciplina. 21) O educador tem que ser seguro, competente e generoso, atitudes estas que exigem esforço e moralidade. 22) Não se deve falar de cima para baixo, achar que é o dono da verdade. Um educador não deve falar PARA o educando, mas sim COM ele, e isso só é possível quando o educador sabe escutar. Porém, a escuta não deve ser passiva, ela é uma boa forma de se fazer questionamentos sobre o que está sendo exposto, de defender uma opinião própria. Isto pode ser refletido numa maneira crítica e justa de avaliação.Existem, então, após todos estes apontamentos, algumas relações que nunca podem ser desenlaçadas, para que a pedagogia da autonomia seja aplicável: ensino dos conteúdos com formação ética dos educandos, prática com teoria, ignorância com saber (seja de educador ou educando), autoridade com liberdade, respeito ao professor com respeito ao aluno, ensinar com aprender. Todas elas devem ser respeitadas e tratadas com responsabilidade. Aspectos políticos também sempre devem ser levados em conta. Classes dominantes enxergam a educação como IMOBILIZADORA E OCULTADORA de verdades. Entretanto, a educação é uma forma de se intervir no mundo. Contudo, deve ficar muito claro para o educador que a autonomia não vem de um dia para o outro, leva tempo para ser construída. Um grande cuidado também é extremamente necessário ao educador: de que a educação é ideológica e que, dependendo da ideologia, ele pode acabar aceitando idéias perigosas (o mundo é assim, não está assim, por exemplo).E, por fim, deve ficar muito claro que uma docência decente, de qualidade, não se separa da afetividade que o professor tem por seus alunos (embora ela não deva interferir, por exemplo na avaliação, e nem signifique que o educador deva amar todos seus alunos de maneira igual).Freire introduz a Pedagogia da Autonomia explicando suas razões para analisar a prática pedagógica do professor em relação à autonomia de ser e de saber do educando. Enfatiza a necessidade de respeito ao conhecimento que o aluno

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traz para a escola, visto ser ele um sujeito social e histórico, e da compreensão de que "formar é muito mais do que puramente treinar o educando no desempenho de destrezas" (p.. 15). Define essa postura como ética e defende a idéia de que o educador deve buscar essa ética, a qual chama de "ética universal do ser humano" (p. 16), essencial para o trabalho docente. Não podemos nos assumir como sujeitos da procura, da decisão, da ruptura, da opção, como sujeitos históricos, transformadores, a não ser assumindo-nos como sujeitos éticos (...) É por esta ética inseparável da prática educativa, não importa se trabalhamos com crianças, jovens ou com adultos, que devemos lutar (p. 17 e 19). Em sua análise, menciona alguns itens que considera fundamentais para a prática docente, enquanto instiga o leitor a criticá-lo e acrescentar a seu trabalho outros pontos importantes. Inicia afirmando que "não há docência sem discência" (p. 23), pois "quem forma se forma e re-forma ao formar, e quem é formado forma-se e forma ao ser formado" (p.25). Dessa forma, deixa claro que o ensino não depende exclusivamente do professor, assim como aprendizagem não é algo apenas de aluno. "Não há docência sem discência, as duas se explicam, e seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do outro. Quem ensina aprende ao ensinar, e quem aprende ensina ao aprender" (p. 25). Justifica assim o pensamento de que o professor não é superior, melhor ou mais inteligente, porque domina conhecimentos que o educando ainda não domina, mas é, como o aluno, participante do mesmo processo da construção da aprendizagem.Segue sua análise colocando como absolutamente necessário o rigor metódico e intelectual que o educador deve desenvolver em si próprio, como pesquisador, sujeito curioso, que busca o saber e o assimila de uma forma crítica, não ingênua, com questionamentos, e orienta seus educandos a seguirem também essa linha metodológica de estudar e entender o mundo, relacionando os conhecimentos adquiridos com a realidade de sua vida, sua cidade, seu meio social. Afirma que "não há ensino sem pesquisa nem pesquisa sem ensino" (p. 32). Esse pesquisar, buscar e compreender criticamente só ocorrerá se o professor souber pensar. Para Freire, saber pensar é duvidar de suas próprias certezas, questionar suas verdades. Se o docente faz isso, terá facilidade de desenvolver em seus alunos o mesmo espírito.O professor que pensa certo deixa transparecer aos educandos que uma das bonitezas de nossa maneira de estar no mundo e com o mundo, como seres históricos, é a capacidade de, intervindo no mundo, conhecer o mundo (...) Ensinar, aprender e pesquisar lidam com dois momentos: o em que se aprende o conhecimento já existente e o em que se trabalha a produção do conhecimento ainda não existente (p.31). Ensinar, para Freire, requer aceitar os riscos do desafio do novo, enquanto inovador, enriquecedor, e rejeitar quaisquer formas de discriminação que separe as pessoas em raça, classes... É ter certeza de que faz parte de um processo inconcluso, apesar de saber que o ser humano é um ser condicionado, portanto há sempre possibilidades de interferir na realidade a fim de modificá-la. Acima de tudo, ensinar exige respeito à autonomia do ser do educando. O respeito à autonomia e à dignidade de cada um é imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros (...) O professor que desrespeita a curiosidade do educando, o seu gosto estético, a sua inquietude, a sua linguagem, mais precisamente, a sua sintaxe e a sua prosódia; o professor que ironiza o aluno, que o minimiza, que manda que "ele se ponha em seu lugar" ao mais tênue sinal de sua rebeldia legítima, tanto quanto o professor que se exime do cumprimento de seu dever de propor limites à liberdade do aluno, que se furta ao dever de ensinar, de estar respeitosamente presente à experiência formadora do educando, transgride os princípios fundamentalmente éticos de nossa existência (p. 66). É importante que professores e alunos sejam curiosos, instigadores. "É preciso, indispensável mesmo, que o professor se ache repousado no saber de que a pedra fundamental é a curiosidade do ser humano" (p. 96). Faz-se necessário, portanto, que se proporcionem momentos para experiências, para buscas. O professor precisa estar disposto a ouvir, a dialogar, a fazer de suas aulas momentos de liberdade para falar, debater e ser aberto para compreender o querer de seus alunos. Para tanto, é preciso querer bem, gostar do trabalho e do educando. Não com um gostar ou um querer bem ingênuo, que permite atitudes erradas e não impõe limites, ou que sente pena da situação de menos experiente do aluno, ou ainda que deixa tudo como está que o tempo resolve, mas um querer bem pelo ser humano em desenvolvimento que está ao seu lado, a ponto de dedicar-se, de doar-se e de trocar experiências, e um gostar de aprender e de incentivar a aprendizagem, um sentir prazer em ver o aluno descobrindo o conhecimento. É digna de nota a capacidade que tem a experiência pedagógica para despertar, estimular e desenvolver em nós o gosto de querer bem e gosto da alegria sem a qual a prática educativa perde o sentido. É esta força misteriosa, às vezes chamada vocação, que explica a quase devoção com que a grande maioria do magistério nele permanece, apesar da imoralidade dos salários. E não apenas permanece, mas cumpre, como pode, seu dever (p. 161). Nessa obra, portanto, expondo os saberes que considera necessários à prática docente, Paulo Freire orienta ao mesmo tempo que incentiva os educadores e educadoras a refletirem sobre seus fazeres pedagógicos, modificando aquilo que acharem preciso, mas especialmente aperfeiçoando o trabalho, além de fazerem a cada dia a opção pelo melhor, não de forma ingênua, mas com certeza de que, se há tentativas, há esperanças e possibilidades de mudanças daquilo que em sua visão necessita mudar.Uma das tarefas primordiais dos educadores é trabalhar com os educandos a rigorosidade metódica com que devem se aproximar dos objetos cognicíveis. Resgatar nos saberes cotidianos, ainda que vindos de curiosidade ingênua, o estímulo à capacidade criadora do educando. A superação da ingenuidade levando à criticidade segundo pensar correto de Freire demanda profundidade e superficialidade na compreensão e interpretação dos fatos. Quem pensa certo é quem busca seriamente a segurança na argumentação, e é o que discordando do seu oponente, não tem o porquê contrair uma raiva desmedida. Quem observa, o faz segundo um ponto de vista, mas não por isso situa o observador em erro, uma vez que o erro não está em ter um ponto de vista, mas absolutizá-lo e desconhecer que, mesmo do acerto do seu ponto de vista é possível que a razão ética nem sempre esteja com ele. O inacabamento do ser ou sua inconclusão é próprio da experiência vital, onde há vida, há inacabamento. A diferença entre um ser inacabado e o ser determinado é que o primeiro muito embora seja condicionado, tem consciência do inacabamento. O ser inacabado sabe que a passagem pelo mundo não é pré-determinada, pré-estabelecida, e o seu “destino” não é um dado mas algo que precisa ser feito e de sua própria responsabilidade.Para ter segurança o professor deve estudar e preparar suas aulas, deve se esforçar para estar à altura de sua profissão. O esforço para atingir estas metas fornece a moral necessária para que o professor transpareça a segurança de seus conhecimentos e sua autoridade nos assuntos que vai ensinar. É ouvindo o aluno com paciência e criticamente que aprendemos a falar com ele. Aprendendo a escutar o educando, ouvindo suas dúvidas, em seus receios, em sua incompetência provisória, faz com que o docente aprenda a falar com ele. O bom professor deve ser curioso e deve provocar curiosidade. Esta curiosidade deve ser incentivada para que mantenha viva a chama do querer saber, do querer entender. Se esta troca não ocorrer, com o tempo o professor se verá diante de uma situação

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quase estática, paternalista da maneira de ensinar, que impedem o exercício livre da curiosidade. A curiosidade deve ser democrática. A curiosidade que silencia a outra se nega a si própria. A educação deve também servir de meio e forma para transformações sociais, mas deve-se ter consciência da sua indevida utilização como meio de reprodução de ideologias dominantes. Na opinião de Paulo Freire, não é possível ao bom professor ser um ser completamente apolítico, dado que estará expondo suas opiniões e ensinando muitos conceitos baseados em sua visão de mundo. Mas podem demonstrar que é possível mudar. E isto reforça nele ou nela a importância de sua tarefa político–pedagógica.Esta abertura ao querer bem não significa que, como professor, obrigue a querer bem todos os alunos de maneira igual. Significa, de fato, que a afetividade não deve assustar o docente, que não deve ter medo de expressá-la. O professor deve descartar como falsa a separação radical entre seriedade docente e afetividade.Nossa impressão geral do livro é que Paulo Freire escreve e discursa, acima de tudo, com amor pelo que faz. O autor vai lentamente introduzindo conceitos que se misturam e se complementam, às vezes de maneira sutil, e em outras ocasiões de maneira objetiva e absolutamente sincera. Uma das principais mensagens que o autor deixa nesta obra, ao nosso ver, é o significado do ensinar. É com a mais brilhante vocação que o autor nos mostra em simples palavras que ensinar é todo um processo de troca entre aluno e professor, onde ambos aprendem, ambos adquirem e sanam dúvidas, ambos crescem como seres humanos. É a mensagem de que para ensinar precisamos, antes de mais nada, ter a consciência da importância e da beleza desta tarefa, da importância de se poder fazer a diferença num sistema socio-econômico-político com certezas às vezes tão opressoras e cruéis àqueles que não dispõe de meios financeiros para obter cultura e informação. Enfim, o professor Paulo Freire nos dá uma aula de ensinar, e nos fornece com um pensamento livre e despojado uma grande inspiração: de que ensinar vale a pena.

A gestão escolar relativa ao processo docente educativo e o papel orientador do gestor Francisca Martins dos Santos

O conceito de Gestão Escolar, relativamente recente, é de extrema importância para que se tenha uma escola que atenda às atuais exigências da vida social: formar cidadãos e oferecer, ainda, a possibilidade de apreensão de competências e habilidades necessárias e facilitadoras da inserção social. Para fim de melhor entendimento, costuma-se classificar a gestão escolar em três áreas, que funcionam interligadas, de modo integrado ou sistêmico: Gestão Pedagógica, (grifo meu) Gestão de Recursos Humanos e Gestão Administrativa. (Dos Santos, 2006, p.130) Toda a comunidade educativa na intencionalização (projetualização) da educação. No entanto, cabe ao gestor escolar assegurar que a escola realize sua missão: ser um local de educação, entendida como elaboração do conhecimento, aquisição de habilidades e formação de valores. O gestor deverá animar e articular a comunidade educativa na execução do projeto educacional, incrementando a gestão participativa da ação pedagógico-administrativa, conduzindo a gestão da escola em seus aspectos administrativos, econômicos, jurídicos e sociais. O gestor é o articulados/mediador entre escola e comunidade. Ele deve incentivar a participação, respeitando as pessoas e suas opiniões, no que chamamos de gestão democrática. O gestor escolar tem de se conscientizar de que ele, sozinho, não pode administrar todos os problemas da escola. O caminho é a descentralização, isto é, o compartilhamento de responsabilidades com alunos, pais, professores e funcionários. O que se chama de gestão democrática onde todos os atores envolvidos no processo participam das decisões.Uma vez tomada, trata-se as decisões coletivamente, participativamente, é preciso pô-las em práticas. Para isso, a escola deve estar bem coordenada e administrada. Não se que dizer com isso que o sucesso da escola reside unicamente na pessoa do gestor ou em uma estrutura administrativa autocrática na qual ele centraliza todas as decisões. Ao contrário, trata-se de entender o papel do gestor como líder cooperativo, o de alguém que consegue aglutinar as aspirações, os desejos, as expectativas da comunidade escolar e articular a adesão e a participação de todos os segmentos da escola na gestão em um projeto comum. O diretor não pode ater-se apenas às questões administrativas. Como dirigente, cabe-lhe ter uma visão de conjunto e uma atuação que apreenda a escola em seus aspectos pedagógicos, administrativos, financeiros e culturais. (Libâneo, 2005, p.332)Considera-se a Gestão Pedagógica o lado mais importante e significativo da gestão escolar. Cuida de gerir a área educativa propriamente dita da escola e da educação escolar. Estabelece objetivos, gerais e específicos, para o ensino. Define as linhas de atuação de acordo com os objetivos e o perfil da comunidade e dos alunos. Propõe metas a serem atingidas. Elabora os conteúdos curriculares.Acompanha e avalia o rendimento das propostas pedagógicas e dos objetivos e o cumprimento das metas. Avalia o desempenho dos alunos, do corpo docente e da equipe escolar como um todo.Suas especificidades estão enunciadas no Regime Escolar e no Projeto Político-Pedagógico, também denominado Proposta Pedagógica, da escola. Parte do Plano Escolar ou Plano Político-Pedagógico de Gestão Escolar também inclui elementos da gestão pedagógica: objetivos gerais e específicos, metas, plano de curso, plano de aula, avaliação e treinamento da equipe escolar. O diretor é o grande articulador da Gestão Pedagógica e o primeiro responsável pelo seu sucesso, auxiliado, nessa tarefa, pelos apoios pedagógicos.A prática tem mostrado que o diretor é fundamental para dinamizar a construção coletiva do projeto, sua implantação e o acompanhamento e verificação da realização prática do teoricamente proposto.Profissionais competentes, líderes que tenham capacidade para coordenar esforços coletivos. (Hengemuhle, 2004, p.191)Sua função envolve atividades de mobilização, de motivação e de coordenação. Dirigir uma escola implica colocar em ação os elementos do processo organizacional (planejamento, organização, avaliação) de forma integrada e articulada.Assim, o gestor é a figura que deve possuir e liderança, no clima de organização da escola que pressupõe a liberdade de decidir no processo educativo e não nos gabinetes burocráticos. (Borges, 2008, p.83)O gestor escolar tem de se conscientizar de que ele, sozinho, não pode administrar todos os problemas da escola. O caminho é a descentralização, isto é, o compartilhamento de responsabilidades com alunos, pais, professores e funcionários.

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Isso, na maioria das vezes, decorre do fato de o gestor centralizar tudo, não compartilhar as responsabilidades com os diversos atores da comunidade escolar.Na prática, entretanto, o que se dá é a mera rotinização e burocratização das atividades no interior da escola, e que nada contribui para a busca de maior eficiência na realização de seu fim educativo; (Paro, 2008, p.130)O gestor escolar deve ser um líder pedagógico que apóia o estabelecimento das prioridades, avaliando, participando na elaboração de programas de ensino e de programas de desenvolvimento e capacitação de funcionários, incentivando a sua equipe a descobrir o que é necessário para dar um passo à frente, auxiliando os profissionais a melhor compreender a realidade educacional em que atuam, cooperando na solução de problemas pedagógicos, estimulando os docentes a debaterem em grupo, a refletirem sobre sua prática pedagógica e a experimentarem novas possibilidades, bem como enfatizando os resultados alcançados pelos alunos.No entanto abordaram-se vários aspectos referentes à função do gestor na escola pública, como o caráter burocrático no qual se encontra tão envolvido, a parte burocrática à qual são condicionadas, faltando-lhe, muitas vezes, tempo para cuidar da parte pedagógica, a colocação de sua função pedagógica em segundo plano, as relações de poder que se estabelecem, a sua importância como articulador pedagógico e mediador entre a escola e os segmentos da comunidade escolar e local, bem como a importância do exercício da liderança. Espera-se, demonstrar, como as funções mencionadas são essenciais ao gestor, caso a escola queira democratizar a gestão da escola pública e avançar na melhoria da qualidade do ensino e, conseqüentemente, na qualidade de vida dos educandos, tornando a sociedade mais humana e justa.Observou-se que esse problema é tratado por muitos profissionais nos últimos cinco anos, além de estarmos conscientes de algumas dificuldades que tem nossa escola referente ao planejamento pedagógico, e tomando em conta que o pedagogo principal da escola é o gestor. Aonde a responsabilidade maior em conduzir todo este processo está voltada para sua pessoa Decidir aplicar dois instrumentos de medição (questionário), a uma amostra de professores e de gestores com objetivo de medir as ações dos gestores em um determinado número de escolas.

OS INSTUMENTOS MEDIRAM CARACTERISTICAS E QUALIDADES, QUE SE IDENTIFIQUEM COM:• EXPERIÉNCIAS PEDAGÓGICAS DO GESTOR E DE CADA PROFESSOR.• CONHECIMENTO DO GESTOR E DOS PROFESSORES SOBRE O PAPEL DO GESTOR NA ESCOLA NO CAMPO DO

PLANEJAMENTO PEDAGÓGICO.• NÍVEL DE CONSCIENTIZAÇÃO DOS PROFESSORES E DO GESTOR COM RESULTADOS ÓTIMOS DE UM BOM

PLANEJAMENTO PEDAGÓGICO.• NÍVEL DE PRIORIDADE QUE Os PROFESSORES DÃO AO TRABALHO DO GESTOR NO PROCESSO PEDAGÓGICO.• POLÍTICA DE PREPARAÇÃO PRÉVIA DA SECRETARIA DE EDUCAÇÃO PARA OS GESTORES.

As instituições de educação deveriam destinar recursos para uma política eficiente de preparação destinada aos gestores com isso se evitariam transtornos que muitas vezes que gestores despreparados causam ao sistema educacional. É desejável que os candidatos à eleição ao cargo de gestor tenham formação profissional específica e competência técnica, incluindo liderança, capacidade de gestão e conhecimento de questões pedagógico-didáticas. (Libâneo, 2005, p332)Análise de resultadoGestor: A maioria admite não ter recebido nenhum treinamento ou preparação para exercer a função de gestor. Mostram-se opiniões que sua participação no planejamento pedagógico é importante mais que não precisa ser um líder pedagógico e acredita não ser necessária a troca com os docentes de métodos e técnicas pedagógicas. Além disso, afirma permitir a aplicação de novas técnicas e idéias no enriquecimento do processo ensino aprendizagem, e fica disposto a fazer mudanças fundamentadas para melhorar o trabalho da escola, como por em ordem questões administrativas, financeiras e principalmente pedagógicas. As contradições existentes são inúmeras, isso mostra o seu despreparo para assumir um cargo de gestor escolar.Professores: Constatou- se a grande preocupação dos professores em relação à questão pedagógica, mais especificamente ao planejamento, se reconhece tempo é insuficientes segundo os professores para desenvolver um trabalho de qualidade, relatam que há um distanciamento entre o gestor escolar e o planejamento pedagógico, alguns professores relatam que nunca houve a participação do gestor escolar durante tal ação, os docentes acreditam que o gestor deve exercer papel importante no planejamento pedagógico, ou seja, um líder pedagógico onde professores e gestor devem reunir-se e trocarem idéias, métodos e técnicas pedagógicas e permitir sua aplicação com o objetivo de obter resultados positivos no processo ensino aprendizagem e melhorar o trabalho da escola em todas as suas dimensões. Seguem os resultados obtidos nas pesquisas no qual se pode observar que existem paradoxos e contradições em relação ao papel do gestor e as questões pedagógicas que precisam ser quebradas ousando construir um projeto de escola que reflete as (novas) utopias da educação, construindo assim uma gestão democrática e participativa. Consideramos que todo gestor precisa de algum tipo de preparação prévia antes de assumir o cargo de gestor antes mesmo que se cogite a possibilidade de se assumir o cargo. Esta preparação deveria fazer parte das políticas educacionais da secretaria de educação ou de outra entidade responsável em executar tal tarefa.É muito importante observar a divergência que há entre os professores e gestor quanto ao trabalho docente e o planejamento pedagógico. É notável a afirmação do gestor quando ele diz que não deve ser um líder pedagógico em contrapartida 100% dos docentes acreditam que o gestor deve ser o líder natural da escola. Considerarmos que o papel do gestor é muito importante para o bom funcionamento da escola. Portanto deve haver um processo de seleção muito sério na escolha dos gestores.Para concluir deve-se frisar que o gestor escolar deve ser o principal pedagogo, e o maior responsável pelo processo ensino aprendizagem, pois é a pedra angular do edifício educativo que o coletivo docente deve construir dia a dia na escola.Entendemos que a participação do gestor é fundamental em todas as áreas: administrativa, financeira e principalmente pedagógica. O diretor é, sem dúvida, a "autoridade máxima na escola e o responsável último por ela" (Paro 1995, p. 89).

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Didática: é uma ciência cujo objetivo fundamental é ocupar-se das estratégias de ensino, das questões práticas relativas à metodologia e das estratégias de aprendizagem. Sua busca de cientificidade se apóia em posturas filosóficas como o funcionalismo, o positivismo, assim como no formalismo e o idealismo. Sintetizando, poderíamos dizer que ela funciona como o elemento transformador da teoria na prática. A Didática segundo Libâneo Prática educativa e sociedade Os professores são parte integrante do processo educativo, sendo importantes para a formação das gerações e para os padrões de sociedade que buscamos. Libâneo situa a educação como fenômeno social universal determinando o caráter existencial e essencial da mesma. Estuda também os tipos de educação, a não intencional, refere-se a influências do contexto social e do meio ambiente sobre os indivíduos. Já a intencional refere-se àquelas que têm objetivos e intenções definidos. A educação pode ser também, formal ou não-formal, dependendo sempre dos objetivos. Educação, instrução e ensino A educação é apresentada com um conceito amplo, que podemos sintetizar como uma modalidade de influências e inter-relações que convergem para a formação da personalidade social e o caráter, sendo assim uma instituição social. Já a instrução está relacionada à formação e ao desenvolvimento das capacidades cognoscitivas, mediante o domínio de certos conhecimentos. O ensino por sua vez é conceituado aqui como as ações, meios, condições para que aconteça a instrução. Observa-se que a instrução está subordinada à educação. Estas relações criam uma relação intrincada destes três conceitos que são responsáveis pelo educar. Educação escolar, Pedagogia e Didática A educação escolar é um sistema de instrução e ensino de objetivos intencionais, sistematizados e com alto grau de organização, dando a importância da mesma para uma democratização maior dos conhecimentos. O autor coloca que as práticas educativas é que verdadeiramente podem determinar as ações da escola e seu comprometimento social com a transformação. Afirma que a pedagogia investiga estas finalidades da educação na sociedade e a sua inserção na mesma, diz que a Didática é o principal ramo de estudo da pedagogia para poder estudar melhor os modos e condições de realizarmos o ensino e instrução. A Didática e a formação profissional do professor Existem duas dimensões da formação profissional do professor para o trabalho didático em sala de aula. A primeira destas dimensões é a teórico-científica formada de conhecimentos de filosofia, sociologia, história da educação e pedagogia. A segunda é a técnico–prática, que representa o trabalho docente incluindo a didática, metodologias, pesquisa e outras facetas práticas do trabalho do professor. Neste subtítulo, Libâneo define a didática como a mediação entre as dimensões teórico-científica e a prática docente. A Escolarização e as lutas democráticas Realmente a escolarização é o processo principal para oferecer a um povo sua real possibilidade de ser livre e buscar nesta mesma medida participar das lutas democráticas, o autor endente democracia como um conjunto de conquistas de condições sociais, políticas e culturais, pela maioria da população para participar da condução de decisões políticas e sociais. Libâneo, (1994, 35) cita Guiomar Namo de Mello: " A escolarização básica constitui instrumento indispensável à construção da sociedade democrática ", fala também dos índices de escolarização no Brasil, mostrando a evasão escolar e a repetência como graves problemas advindos da falta de uma política pública, de igualdade nas oportunidades em educação, deixando como resultado um enorme número de analfabetos na faixa de 5 a 14 anos. O Fracasso escolar precisa ser derrotado Nessa parte, o autor fala mais detalhadamente deste grave problema do nosso sistema escolar, detalha gráficos que apontam para um quadro onde a escola não consegue reter o aluno no sistema escolar. Aponta muitos motivos para isto, mas considera, como principal, a falta de preparo da organização escolar, metodológica e didática de procedimentos adequados ao trabalho com as crianças pobres. Isto acontece devido aos planejamentos serem feitos prevendo uma criança imaginada e não a criança concreta, aquela que está inserida em um contexto único. Somente o ingresso na escola pode oferecer um ponto de partida no processo de ensino aprendizagem. As tarefas da escola pública democrática Todos sabemos da importância do ensino de primeiro grau para formação do indivíduo, da formação de suas capacidades, habilidades e atitudes, além do seu preparo para as exigências sociais que este indivíduo necessita, dando a ele esta capacidade de poder estudar e aprender o resto da vida. O autor lista as tarefas principais das escolas públicas, entre elas, destacam-se: Proporcionar escola gratuita pelos primeiros oito anos de escolarização; * Assegurar a transmissão e assimilação dos conhecimentos e habilidades; * Assegurar o desenvolvimento do pensamento crítico e independente; * Oferecer um processo democrático de gestão escolar com a participação de todos os elementos envolvidos com a vida escolar. A didática como atividade pedagógica escolar os temas fundamentais da didática são: 1. Os objetivos sócio-pedagógicos; 2. Os conteúdos escolares; 3. Os princípios didáticos; 4. Os métodos de ensino aprendizagem; As formas organizadas do ensino; Aplicação de técnicas e recursos; Controle e avaliação da aprendizagem. Os componentes do processo didático o processo didático está centrado na relação entre ensino e aprendizagem. Podemos daí determinar os elementos constitutivos da Didática: 1. Conteúdos das matérias; 2. Ação de ensinar; Ação de aprender. Desenvolvimento histórico da Didática e tendências pedagógicas O autor afirma que a didática e sua história estão ligadas ao aparecimento do ensino. Desde a Antigüidade clássica ou no período medieval já temos registro de formas de ação pedagógicas em escolas e mosteiros. Entretanto, a didática aparece em obra em meados do século XVII, com João Amos Comenio, ao escrever a primeira obra sobre a didática "A didática Magna", estabelecendo na obra alguns princípios com: A finalidade da educação é conduzir a felicidade eterna com Deus. * O homem deve ser educado de acordo com o seu desenvolvimento natural, isto é de acordo com suas características de idade e capacidade. * A assimilação dos conhecimentos não se da de forma imediata. * O ensino deve seguir o curso da natureza infantil; por isto as coisas devem ser ensinadas uma de cada vez. Já mais adiante, Jean Jacques Rousseau (1712-1778) propôs uma nova concepção de ensino, baseado nas necessidades e interesses imediatos da criança. Porém, este autor não colocou suas idéias em prática, cabendo mais adiante a outro pesquisador faze-lo, Henrique Pestalozzi (1746-1827), que trabalhava com a educação de crianças pobres. Estes três teóricos influenciaram muito Johann Friedrich Herbart (1776-1841), que tornou a verdadeira inspiração para pedagogia conservadora, determinando que o fim da educação é a moralidade atingida através da instrução de ensino. Estes autores e outros tantos formam as bases para o que chamamos modernamente de Pedagogia Tradicional e Pedagogia Renovada.

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Tendências pedagógicas no Brasil e a Didática Nos últimos anos, no Brasil, vêm sendo realizados muitos estudos sobre a história da didática no nosso país e suas lutas, classificando as tendências pedagógicas em duas grandes correntes: as de cunho liberal e as de cunho progressivista. Estas duas correntes têm grandes diferenças entre si. A tradicional vê a didática como uma disciplina normativa, com regras e procedimentos padrões, centrando a atividade de ensinar no professor e usando a palavra (transmissão oral) como principal recurso pedagógico. Já a didática de cunho progressivista é entendida como direção da aprendizagem, o aluno é o sujeito deste processo e o professor deve oferecer condições propícias para estimular o interesse dos alunos por esta razão os adeptos desta tendência dizem que o professor não ensina; antes, ajuda o aluno a prender. As características do processo de ensino Inicia-se analisando as características do ensino tradicional e suas principais limitações pedagógicas: o professor só passa a matéria e o aluno recebe e reproduz mecanicamente o que absorve; é dada uma excessiva importância a matéria do livro sem dar a ele um caráter vivo; o ensino é somente transmitido com dificuldades para detectar o ritmo de cada aluno no aprender; o trabalho docente está restrito às paredes da sala de aula. O autor propõe que entendamos o processo de ensino como visando alcançar resultados tendo com ponto de partida o nível de conhecimentos dos alunos e determinando algumas características como: o ensino é um processo, por isto obedece a uma direção, este processo visa alcançar determinados resultados como domínio de conhecimentos, hábitos, habilidades, atitudes, convicções e desenvolvimento das capacidades cognoscitivas, dando ao ensino este caráter bilateral, combinando as atividades do professor com as do aluno. Processos didáticos básicos: ensino e aprendizagem O livro mostra novamente a importância de garantir a unidade didática entre ensino e aprendizagem e propõe que analisemos cada parte deste processo separadamente. A aprendizagem esta presente em qualquer atividade humana em que possamos aprender algo. A aprendizagem pode ocorrer de duas formas: casual, quando for espontânea ou organizada quando for aprender um conhecimento específico. Com isto define-se a aprendizagem escolar como um processo de assimilação de determinados conhecimentos e modos de ação física e mental. Isto significa que podemos aprender conhecimentos sistematizados, hábitos, atitudes e valores. Neste sentido, temos o processo de assimilação ativa que oferece uma percepção, compreensão, reflexão e aplicação que se desenvolve com os meios intelectuais, motivacionais e atitudes do próprio aluno, sob a direção e orientação do professor. Podemos ainda dizer que existem dois níveis de aprendizagem humana: o reflexo e o cognitivo. Isto determina uma interligação nos momentos da assimilação ativa, implicando nas atividades mentais e práticas. O livro coloca a aprendizagem escolar como uma atividade planejada, intencional e dirigida, não sendo em hipótese alguma casual ou espontânea. Com isto, pode pensar que o conhecimento se baseia em dados da realidade. De início, é importante definir o ensino e o autor coloca-o como o meio fundamental do processo intelectual dos alunos, ou seja, o ensino é a combinação entre a condução do processo de ensino pelo professor e a assimilação ativa do aluno. O ensino tem três funções inseparáveis: *Organizar os conteúdos para transmissão, oferecendo ao aluno relação subjetiva com os mesmos. * Ajuda os alunos nas suas possibilidades de aprender. * Dirigir e controlar atividade do professor para os objetivos da aprendizagem. Mostra-se também a unidade necessária entre ensino e a aprendizagem, afinal o processo de ensino deve estabelecer apenas exigências e expectativas que os alunos possam cumprir para poder realmente envolvê-los neste processo e mobilizar as suas energias. A estruturação do trabalho docente O autor reflete sobre este entendimento errôneo de que o trabalho docente na escola é o de "passar" a matéria de acordo, geralmente, com o livro didático. E mostra que a estrutura da aula deve ter um trabalho ativo e conjunto entre professor e aluno, ligado estreitamente com a metodologia específica das matérias, porém, não se identifica com leia. A cinco momentos da metodologia de ensino na sala de aula: * Orientação inicial dos objetivos de ensino aprendizagem; * Transmissão /assimilação da matéria nova; * Consolidação e aprimoramento dos conhecimentos, habilidades e hábitos; * Aplicação de conhecimentos, habilidades e hábitos; * Verificação e avaliação dos conhecimentos e habilidades. A atividade de estudo e o desenvolvimento intelectual Neste subtítulo, o autor declara algo muito importante e já dito em outros momentos humanos "O objetivo da escola e do professor é formar pessoas inteligentes..." Neste aspecto, o professor deve se satisfazer se o aluno compreende a matéria e tem possibilidade de pensar de forma independente e criativa sobre ela. Levanta dificuldades do trabalho docente para estimular aos alunos, principalmente porque o professor usa um estilo convencional de aula, igual para todas as matérias, com falta de entusiasmo e sem adequação com o mundo prático e real do aluno. Porém, estas dificuldades podem ser superadas com um domínio maior do conteúdo por parte do professor, eleger mais do que um livro de referência, estar atualizado com as notícias, conhecer melhor as características dos seus alunos, dominar técnicas, didáticas e metodologias. Com isto, cada tarefa didática será uma tarefa de pensamento para o aluno. Algumas formas de estudo ativo O estudo ativo envolve inúmeros procedimentos para despertar no aluno hábitos, habilidades de caráter permanente. Para isto temos várias tarefas e exercícios específicos para este fim, listados aqui como pelo autor: Exercícios de reprodução - testes rápidos para verificar assimilação e domínio de habilidades. Tarefa de preparação para o estudo - Diálogo estabelecido entre o professor/aluno, aluno/aluno e observa e revisão de matérias anteriores. Tarefas de fases de assimilação de matérias - Atividades que favoreçam o confronto entre os conhecimentos sistematizados e a realidade dos alunos. Tarefas na fase de consolidação e aplicação – compõem-se de exercícios e revisão de fixação.

30. A importância dos objetivos educacionais A prática educacional baseia-se nos objetivos por meio de uma ação intencional e sistemática para oferecer aprendizagem. Desta forma os objetivos são fundamentais para determinação de propósitos definidos e explícitos quanto às qualidades humanas que precisam ser adquiridas. Os objetivos têm pelo menos três referências fundamentais para a sua formulação. * Os valores e idéias ditos na legislação educacional. * Os conteúdos básicos das ciências, produzidos na história da humanidade. * As necessidades e expectativas da maioria da sociedade. É importante destacar que estas três referências não devem ser tomadas separadamente, pois devem se apresentar juntos no ambiente escolar. Devemos ter claro que o trabalho docente é uma atividade que envolve opções sobre nosso conceito de sociedade, pois isto vai determinar a relação com os alunos. Isto prova que sempre conscientemente ou não, temos ou traçamos objetivos.

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Objetivos gerais e objetivos específicos Os objetivos são o marco inicial do processo pedagógico e social, segundo Libâneo. Os objetivos gerais explicam-se a partir de três níveis de abrangência. O primeiro nível é o sistema escolar que determina as finalidades educativas de acordo com a sociedade em que está inserido; o segundo é determinado pela escola que estabelece as diretrizes e princípios do trabalho escolar; o terceiro nível é o professor que concretiza tudo isto em ações práticas na sala de aula. Alguns objetivos educacionais podem auxiliar os professores a determinar seus objetivos específicos e conteúdos de ensino. Entre estes objetivos educacionais destacam-se: a) colocar a educação no conjunto de lutas pela democratização da sociedade; b) oferecer a todos as crianças, sem nenhum tipo de discriminação cultural, racial ou política, uma preparação cultural e científica a partir do ensino das materiais; c) assegurar a estas crianças o desenvolvimento máximo de suas potencialidades; d) formar nos alunos a capacidade crítica e criativa em relação a matérias e sua aplicação; e) formar convicções para a vida futura; f) institucionalizar os processos de participação envolvendo todas as partes formadoras da realidade escolar. Os conteúdos de Ensino Desde o início do livro, o autor vem reiterando a idéia que as escolas têm, como tarefa fundamental, a democratização dos conhecimentos, garantindo uma base cultural para jovens e crianças. Sob este aspecto, muitos professores fazem a idéia de que os conteúdos são o conhecimento correspondente a cada matéria, ou mesmo, que são a matéria do livro didático.O autor fala que esta visão não é completamente errada, pois há sempre três elementos no ensino: matéria, professor e o aluno. Neste aspecto, devemos estudar o ensino dos conteúdos como uma ação recíproca entre a matéria, o ensino e o estudo dos alunos. Por isto é muito importante que os conteúdos tenham em si momentos de vivências práticas para dar significado aos mesmos. Definindo os conteúdos, eles são o conjunto de conhecimentos, habilidades, hábitos, modos valorativos e atitudes, organizados pedagógica e didaticamente, buscando a assimilação ativa e aplicação prática na vida dos alunos. Critérios de seleção Aqui, o autor propõe uma forma mais didática de resolver esta difícil tarefa de selecionar os conteúdos a serem ministrados em sala de aula. Abaixo, coloca-se esta forma ordenada de elaborar os conteúdos de ensino: Correspondência entre os objetivos gerais e os conteúdos. Caráter científico. Caráter sistemático. Relevância social. Acessibilidade e solidez. Conceito de métodos de ensino Um conceito simples de método é ser o caminho para atingir um objetivo. São métodos adequados para realizar os objetivos. É importante entender que cada ramo do conhecimento desenvolve seus próprios métodos, observa-se então métodos matemáticos, sociológicos, pedagógicos, entre outros. Já ao professor em sala de aula cabe estimular e dirigir o processo de ensino utilizando um conjunto de ações, passos e procedimentos que chamamos também de método. Agora não se pode pensar em método como apenas um conjunto de procedimentos, este é apenas um detalhe do método. Portanto, o método corresponde à seqüência de atividades do professor e do aluno.

38. A relação objetivo-conteúdo-método Um entendimento global sobre esta relação é que os métodos não têm vida sem os objetivos e conteúdos, dessa forma a assimilação dos conteúdos depende dos métodos de ensino e aprendizagem. Com isto, a maior característica deste processo é a interdependência, onde o conteúdo determina o método por ser a base informativa dos objetivos, porém, o método também pode ser conteúdo quando for objeto da assimilação. O que realmente importa é que esta relação de unidade entre objetivo-conteúdo–método constitua a base do processo didático. Uma definição de avaliação escolar Segundo o professor Cipriano C. Luckesi, a avaliação é uma análise quantitativa dos dados relevantes do processo de ensino aprendizagem que auxilia o professor na tomada de decisões. Os dados relevantes aqui se referem às ações didáticas. Com isto, nos diversos momentos de ensino a avaliação tem como tarefa: a verificação, a qualificação e a apreciação qualitativa. Ela também cumpre pelo menos três funções no processo de ensino: a função pedagógica didática, a função de diagnóstico e a função de controle. Características da avaliação escolar Agora, o autor sintetiza as principais características da avaliação escolar. * Reflete a unidade objetivos-conteúdos-métodos. * Possibilita a revisão do plano de ensino. * Ajuda a desenvolver capacidades e habilidades. * Volta-se para a atividade dos alunos. * Ser objetiva. * Ajuda na autopercepção do professor. * Reflete valores e expectativas do professor em relação aos alunos. * Esta frase marca este subtítulo "A avaliação é um ato pedagógico". (Libâneo, 1994, p.203). Importância do planejamento escolar O planejamento do trabalho docente é um processo de racionalização, organização e coordenação da ação do professor, tendo as seguintes funções: explicar princípios, diretrizes e procedimentos do trabalho; expressar os vínculos entre o posicionamento filosófico, político, pedagógico e profissional das ações do professor; assegurar a racionalização, organização e coordenação do trabalho; prever objetivos, conteúdos e métodos; assegurar a unidade e a coerência do trabalho docente; atualizar constantemente o conteúdo do plano; facilitar a preparação das aulas. Tem-se que entender o plano como um guia de orientação devendo este possuir uma ordem seqüencial, objetividade e coerência entre os objetivos gerais e específicos, sendo também flexível. Aspectos cognoscitivos da interação O autor define como cognoscitivo o processo ou movimentos que transcorre no ato de ensinar e no ato de aprender. Sob este ponto de vista, o trabalho do professor é um constante vai e vem entre as tarefas cognoscitivas e o nível dos alunos. Para se ter um bom resultado de interação nos aspectos cognoscitivo deve-se: manejar os recursos de linguagem; conhecer o nível dos alunos; ter um bom plano de aula; objetivos claros; e claro, é indispensável o uso correto da língua Portuguesa.

Organização e planejamento do ensino: globalização, interdisciplinaridade e integração curricular

Ao longo da história da escola, na transposição didática dos saberes científicos em saberes escolares, diferentes maneiras de planejar o ensino têm sido preconizadas. Esses saberes vêm sendo organizados através da listagem de conteúdos a serem vencidos pelos estudantes por etapas, da chamada "educação tradicional", passando pelas propostas de organização destes conteúdos em torno de um assunto - como centros de interesse, metodologia de projetos e unidades de trabalho da "Escola Nova" - até as "proposições contemporâneas" que retomam as propostas de integração curricular do escolanovismo ressignificando-as e, nalguns casos, politizando-as de forma mais explícita através do uso de "temas emergentes, eixos temáticos, temas geradores, temas culturais" e, mais recentemente, retomando a "pedagogia de projetos".Todas estas propostas didático-pedagógicas têm em comum a compreensão de que uma visão globalizante e interdisciplinar deve presidir a organização dos conteúdos nas propostas de trabalho, pelo mínimo, no início da

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escolarização. A afirmação do Parecer 853/71 - CFÉ (apud Feldens, 1982, p.14), em defesa dessa forma de organização no Currículo por Atividades da Educação Fundamental, justifica esta proposta a partir da forma como a criança percebe o mundo: "Tanto mais imaturos sejam eles, quanto mais em blocos lhes surge o mundo das coisas, dos fatos e das idéias".Na defesa de projetos curriculares integrados, Santomé (1998, p.187) afirma que a utilidade social do currículo está em permitir aos alunos e alunas compreender a sociedade em que vivem, favorecendo, para tal, o desenvolvimento de aptidões, tanto técnicas como sociais, que os ajudem em sua localização na comunidade de forma autônoma, crítica e solidária. Para que tal objetivo seja alcançado, há temas, questões e problemas que precisam ser trabalhados e que não' se enquadram, na maioria das vezes, nas áreas de conhecimento tradicionais e, conseqüentemente, não fazem parte dos "currículos por disciplina" surgidos com a modernidade, sendo, pois, excluídos das salas de aula.O mesmo autor defende que devem ser respeitados os conhecimentos prévios, os interesses e os ritmos dos estudantes na organização das propostas de trabalho. Logo é preciso aumentar o poder de participação e de decisão dos mesmos na escola. É preciso também ouvir segmentos da sociedade, especialistas de diferentes áreas, para romper o isolamento que caracteriza ambos os mundos. Na escola são trabalhados o "sistema de conhecimentos de uma sociedade ( ... ), os padrões de verdade ... " (Inglis, apud Santomé, 1988, p.190), logo é preciso ouvir esta mesma sociedade sobre o tipo de escola desejada para seus filhos e filhas.Para Arroyo (1994), também é preciso redescobrir o vínculo entre a sala de aula e a realidade social: conjugar o aprender a aprender com o aprender "a viver. Aprende-se participando, vivenciando sentimentos, tomando atitudes, escolhendo procedimentos.Ensina-se pelas experiências proporcionadas, pelos problemas criados, pela ação desencadeada. O processo de aprendizagem é um processo global. Dá-se ênfase na nossa cultura escolar à atividade intelectual. Não se concebe o conhecimento enquanto ação, considerando, como coisas opostas, o saber e o fazer, a teoria e a prática, o trabalho intelectual e o trabalho manual, a ciência e a cultura. Há uma supervalorização dos processos cognitivos em detrimento dos demais. Há um dissociamento do processo de pensar do de atuar. Muito se tem avançado na pedagogia do discurso, da palavra, e continua-se muito distante da pedagogia da ação, da intervenção, ainda segundo o mesmo autor. Apesar de todo o destaque teórico dado para a necessidade de a criança fazer – aprendizagem através da atividade -, desencadeado nos Estados Unidos e também na Europa com o advento da Escola Nova, a ênfase ainda hoje recai no ensino verbalista, na supervalorização do cognitivo, nas exigências de silêncio e imobilidade, em sala de aula. O "currículo por atividades" não passa muitas vezes de um rótulo sem significado.

Organização dos currículos: o modelo linear disciplinarA forma mais clássica de organização do conteúdo escolar, ainda hoje, é o modelo linear disciplinar, ou o conjunto de disciplinas justapostas, na maioria das vezes de uma forma bastante arbitrária. Para Santomé (1998, p.lIO), as principais críticas a esta forma de organização partem da percepção de que, nesta forma, presta-se insuficiente atenção:- aos interesses dos estudantes;- à experiência prévia dos estudantes, a seus níveis de compreensão, seus ritmos, com a conseqüente não estimulação dos necessários conflitos sociocognitivos;- à problemática específica do meio sociocultural e ambiental do alunado, principalmente quando é privilegiado o uso do livro- texto;- às relações pessoais entre estudantes e professores e professoras devido ao desmembramento artificial da realidade em disciplinas diferenciadas;- às dificuldades de aprendizagem decorrentes da constante mudança de atenção de uma matéria para outra;- à falta de nexos entre as disciplinas e o decorrente esforço de memorização que tal fato acarreta;- à incapacidade para ajustar ao currículo questões práticas, interdisciplinares, atuais, perguntas mais vitais, não confinadas, geralmente, nos limites das áreas disciplinares;- à inflexibilidade de organização do tempo, espaço e recursos humanos para viabilizar visitas, excursões, experiências diferenciadas, no recinto escolar; - à pesquisa, ao estudo autônomo, à atividade crítica e à curiosidade intelectual;- ao papel do professor e da professora como pesquisadores capazes de diagnosticar, propor e avaliar projetos e currículos.

O currículo integrado: possibilidadesO currículo integrado permite:- trabalhar conteúdos culturais relevantes;- abordar conteúdos que são objetos de atenção em várias áreas de conhecimento;- levar a pensar interdisciplinarmente, criando hábitos intelectuais de levar em consideração diferentes possibilidades e pontos de vista;- favorecer a visibilidade dos valores, ideologias e interesses presentes em todas as questões sociais e culturais, o que a organização do currículo por disciplinas dificulta perceber;- favorecer o trabalho colegiado nas escolas, resgatando a idéia de "corpo docente";- preparar para a mobilidade profissional futura;- aumentar a probabilidade de surgimento de novas carreiras e especialidades -interdisciplinaridades - que permitam enfrentar novos problemas e desafios;- estimular a análise de problemas concretos e reais e o conseqüente surgimento de pessoas criativas e inovadoras.A proposta de currículo integrado surgiu como uma alternativa progressista aos modelos empresariais de objetivos comportamentais que eram oferecidos, desde meados do século, para melhorar o desempenho de estudantes nas instituições de ensino.

Integração e Interdisciplinaridade no Ensino Brasileiro: efetividade ou ideologia, de Ivani Catarina Arantes Fazenda, publicado pelas Edições Loyola, em 1996 (1979), na sua 4ª edição, aborda a interdisciplinaridade como uma nova atitude a ser assumida perante a questão do conhecimento, substituindo a forma fragmentária pela unitária do ser humano. E, para isso, a autora destaca, de modo bastante simples, porém de tamanha grandeza a

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questão interdisciplinar ao enfatizar que esta “não se ensina, não se aprende, apenas vive-se”. Esse viver a interdisciplinaridade é por ela habitado, desde a atitude que mantém diante da questão do conhecimento, como o clareamento de determinados conceitos que cerceiam a prática interdisciplinar. Conceitos, dentre os quais se destacam disciplina, multidisciplina, pluridisciplina, interdisciplina, transdisciplina, integração e interação. Quando discute o conceito de integração, trata que integração estaria relacionada, de modo bastante formal, às disciplinas, dando uma visão parcial, não de totalidade sobre o conhecimento. Enquanto que “interação é condição “sine quan non” para a efetivação da interdisciplinaridade, pois une, de fato, os conhecimentos e contribui para com a transformação da realidade. Entretanto, para que se possa “interagir” de forma produtiva com o meio e com o conhecimento, é preciso manter um constante contato com as nossas dúvidas, com os nossos limites, pois deles acabam surgindo razões de força para novas pesquisas, novas facetas pessoais e sociais e diferentes formas e atitudes para lidar com o conhecimento. De acordo com Hilton Japiassú, que prefaciou o livro, é preciso que façamos a substituição da “Pedagogia da Certeza” pela “Pedagogia da Incerteza”, pois como ele – um dos muitos parceiros de Ivani – mesmo destaca, “o conhecimento nasce da dúvida”. Japiassú comunga com as idéias de Fazenda e aponta que essa incerteza/subjetividade que circunda a questão do conhecimento revitaliza a produção científica. Além disso, sensibiliza-nos como seres aprendentes, inacabados diante do saber. Concomitante com essas reflexões acerca da integração/interação e objetividade/subjetividade, a autora percorre o caminho sobre a formação do conceito de interdisciplinaridade e percebe que este não possui um único sentido e uma estabilidade. Conforme a intenção de pesquisa – atitude esta primordial para a constituição da aprendizagem interdisciplinar, a interdisciplinaridade poderá vir a ser utilizada de diferentes formas e apresentar-se como o ponto de encontro e de renovação da atitude perante o conhecimento. Dessa maneira, discorre acerca da não separação do conhecimento para com a prática dos sujeitos e aponta algumas das utilidades e obstáculos que implicam a prática da interdisciplinaridade. Em relação às benécies da interdisciplinaridade, aspectos de uma melhor formação geral e profissional são apontados, bem como o seu incentivo à formação de novos pesquisadores e novas pesquisas. Logo, contribui para amenizar a relação dicotômica existente entre ensino e pesquisa, pois apresenta-se como forma de compreender e modificar o mundo com diferentes olhares; olhares estes, habitados pela atitude interdisciplinar. Desse modo, facilmente chega-se a presumir que a interdisciplinaridade é apontada como uma exigência interna das disciplinas para restabelecer o saber em sua unidade. Em contrapartida, revela os obstáculos de efetivação da interdisciplinaridade. Para tanto, destaca dificuldades epistemológicas, institucionais, psicossociológicas, culturais, metodológicas, materiais e relacionadas à formação dos professores. Essas possibilidades e não possibilidades para a concretização da interdisciplinaridade são subsidiadas pela análise legal que a autora estabelece com a legislação Federal, Estadual e Municipal (SP) para a efetivação do ensino de 1º e 2º Graus e Ensino Superior, classificados hoje, de Educação Básica, nos seus níveis Fundamental e Médio e Educação Superior. Essa análise é bastante interessante porque caminha entre e sobre a legislação, estabelecendo uma reflexão crítica da realidade, revelando as similaridades existentes entre as referidas leis, bem como no que se tem avançado – ou não, para que a aplicação de uma proposta de aprendizagem unificadora venha realmente processar-se. Convém, no entanto, destacar a reflexão que Ivani Fazenda tece acerca da não compreensão de alguns conceitos relacionados à atitude interdisciplinar e aos aspectos legais, aflorando a necessidade de nós, enquanto professores, sujeitos aprendentes e ensinantes, tomarmos ciência desses termos para poder agir de modo fidedigno às suas origens, significados e pregações, para contribuirmos com a materialização de uma educação verdadeiramente unificadora. Nessas condições, após habitar a construção de conceitos, o revelar das possibilidades e não possibilidades para a concretude da interdisciplinaridade, bem como estabelecendo um paralelo legal, a nível Federal, Estadual e Municipal (SP), deparamo-nos, novamente, com a incerteza sobre o fazer interdisciplinar e sobre as responsabilidades que são direcionadas aos pesquisadores que se propõe desvelar questões dessa natureza. Porém, ao mesmo tempo, embriaga-nos e revitaliza-nos pela e com a possibilidade se sentirmos impregnados em nosso ser o desejo da mudança, da pesquisa e da não conformidade, ou seja, da metamorfose que se revela uma constante na interdisciplinaridade. Assim, por muitas vezes, aparentemente ”encasulados”, somos novamente lançados à vida e a ela somos convidados e instigados a atribuir cores novas, tornando viva a nossa capacidade de viver.

Educação Inclusiva: do que estamos falando?Rosita Edler Carvalho

O texto reflete as principais questões que têm sido discutidas nacional e internacionalmente, quando se trata de educação inclusiva. Embora todos os educadores estejam de acordo quanto à necessidade de melhorarmos a qualidade das respostas educativas de nossas instituições de ensino-aprendizagem para todos os aprendizes: crianças, adolescentes, jovens e adultos, ainda não há consenso quanto à forma de levar o sistema gestor de políticas educacionais e nossas escolas a assumirem a orientação inclusiva. Alguns, mais radicais, ou defendem a permanência da educação especial no seu ‘modelo’ de serviços, ou, defendem o desmonte da educação especial; outros, mais moderados, entendem que a educação especial precisa rever seus princípios e seus procedimentos, evoluindo para o ‘modelo’ de suporte. Retomando trechos da Declaração de Salamanca, fica ressaltada que a proposta de educação inclusiva não é específica para alunos e alunas com necessidades educacionais especiais ou outro termo que se escolha. Como processo contínuo, dialético e complexo diz respeito a qualquer aluno que, por direito de cidadania, deve freqüentar escolas de boa qualidade, onde aprenda a aprender, a fazer, a ser e onde participe, ativamente. Inúmeros desafios são identificados e precisam ser removidos; dentre eles o aspecto atitudinal se destaca, particularmente pelos preconceitos e estereótipos com que a diversidade biológica tem sido tratada e internalizada no imaginário coletivo.

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A inclusão educacional tem ocupado significativo espaço de reflexões em todo o mundo, particularmente a partir da década de 90. Deve ser entendida como princípio (um valor) e como processo contínuo e permanente. Não deve ser concebida como um preceito administrativo, dado a priori, que leva a estabelecer datas, a partir das quais as escolas passam a ter o estado de inclusivas, em obediência à hierarquia do poder ou a pressões ideológicas.De um lado, a expressão respeito à diferença, na medida em que focaliza o sujeito significativamente diferente, deixa de enfatizar as normas e as práticas educativas que criam, mantêm ou reforçam as diferenças. De outro lado, o respeito às diferenças traz um ranço conservador e determinista, na medida em que esse apelo pode influenciar a formação de um imaginário coletivo no qual as pessoas com diversidade biológica acentuada estão e serão como são, sem que lhes seja possível evoluir, restando-nos, portanto, respeitá-las, tolerando-as...A tolerância, quando é utilizada como forma de apelo para garantir a presença de aprendizes em situação de deficiência nas turmas comuns, pode ser considerada como mais um desdobramento da análise sobre o moralismo abstrato.

Apesar de a tolerância ser uma virtude pessoal - que reflete o comportamento social de um indivíduo-, precisamos reconhecer que tem conotações que “remetem à capacidade fisiológica de suportar determinados remédios ou a uma decisão dos poderes públicos, tomados com base em considerações de ordem política, teológica ou jurídica” (p.23).No que tange às pessoas que apresentam necessidades especiais decorrentes de uma situação de deficiência ou não, penso que a tolerância - como uma espécie de favor, de gentileza em “agüentar” sua presença -, ao lado do respeito à diferença, como forma de aceitação passiva do Outro-, estão no conjunto de práticas de moralismo abstrato e utópico e na contramão da ética da inclusão.A igualdade de oportunidades é uma outra expressão que merece nossas reflexões, particularmente porque consta de mandamentos legais e dos documentos nacionais e internacionais que nos apontam diretrizes para a educação inclusiva.O princípio geral é o da igualdade de direitos a oportunidades isto é, ao direito igual de cada um de ingressar na escola e, nela, exercitar sua cidadania, aprendendo e participando.Na medida em que, atendendo a todos e a cada um, buscamos aprimorar as respostas educativas de nossas escolas, de modo que o direito de todos à educação não fique, apenas, como retórica e se efetive na prática, agimos em consonância com o princípio da igualdade de oportunidades. Mas, será que devemos entender ‘igualdade de oportunidades’ como sinônimo de ‘oportunidades iguais’ (as mesmas), para todos? Penso ser esta uma provocação interessante para provocar debates.As barreiras existentes Sob essa denominação cumpre-nos examinar aspectos mais objetivos, porque referidos aos sistemas educacionais, às escolas, aos recursos humanos e, principalmente, aos próprios sujeitos da inclusão. Quem são eles?De modo geral, a proposta de educação inclusiva está, equivocadamente, relacionada apenas às pessoas em situação de deficiência.Abrindo um parêntese, imagino que alguns leitores devem estar interrogando se estou adotando uma nova terminologia, na medida em que me refiro às pessoas em situação de deficiência.Na verdade, mais uma vez, estou me valendo dos ensinamentos do Professor Plaisance baseados numa nova classificação dos níveis de deficiência, publicada em 2001. Nesta, em vez da tradicional classificação da OMS de 1980 que se refere à deficiência, incapacidade e impedimento (desvantagem social), a nova classificação ressalta o funcionamento global das pessoas, relacionando-o, intimamente, com os fatores contextuais que a cercam.Assim, a expressão pessoa em situação de deficiência apresenta a vantagem de relacionar as influências do meio com as capacidades que as pessoas podem desenvolver e manifestar. Servem como exemplo, duas pessoas com a mesma deficiência e que, segundo a situação e as condições em que vivem, vão encontrar maiores ou menores barreiras para suas necessidades de ir e vir, de aprender e de participar, em termos de precocidade, qualidade e intensidade das ajudas e apoios especializados que receberam. As situações contextuais que as envolvem sendo diferentes, igualmente diferentes serão os níveis de autonomia e de participação que poderão desenvolver, bem como a qualidade de seu ‘ funcionamento’ pessoal, social e escolar. Embora considere que discutir termos e expressões nem sempre nos ajude a descobrir os caminhos da inclusão, reconheço sua importância, pois, como bem sabemos – desde Foucault com ‘As Palavras e as Coisas’, as palavras são fundantes dos sujeitos e dos objetos de que falam.Fechando o longo parêntesis creio que, de modo geral, os sujeitos da inclusão devem ser identificados dentre aqueles que não têm acesso aos bens e serviços histórica e socialmente disponíveis. Infelizmente estamos nos referindo a uma considerável parcela de nossa população.Inúmeros alunos com dificuldades de aprendizagem podem ser considerados em situação de deficiência decorrente de condições sociais e econômicas adversas, bloqueadoras de seu pleno desenvolvimento, mesmo sem apresentarem perturbações no nível biológico como cegueira, surdez, retardo mental, paralisia cerebral, por exemplos.E o evento de Salamanca, em 1994, de certo modo ocorreu para evidenciar a exclusão da inclusão das necessidades educacionais especiais de tantos e tantos alunos que precisam, definitivamente, constar das políticas educacionais e das práticas pedagógicas de todas as escolas. Não por apelos sentimentais, por respeito às diferenças e muito menos por tolerância...Destaco que a idéia-força que orientou o texto de Salamanca é a da escola para todos e não apenas para as pessoas com deficiência, como muitos supõem ser o eixo vertebrador da Declaração, à qual se seguem as Linhas de Ação com diretrizes para a universalização da escola. Lendo o texto da Declaração, parece não haver dúvidas de que os sujeitos da inclusão são todos: os que nunca estiveram em escolas, os que lá estão e experimentam discriminações, os que não recebem as respostas educativas que atendam às suas necessidades, os que enfrentam barreiras para a aprendizagem e para a participação, os que são vítimas das práticas elitistas e injustas de nossa sociedade, as que apresentam condutas típicas de síndromes neurológicas, psiquiátricas ou com quadros psicológicos graves, além das superdotadas/ com altas habilidades, os que se evadem precocemente e, obviamente, as pessoas em situação de deficiência, também.Aquilo que é necessariamente diferente do ensino escolar para melhor atender às especificidades dos alunos com deficiência, o que inclui, principalmente, instrumentos necessários à eliminação das barreiras que as pessoas com deficiência têm para relacionar-se com o ambiente externo. Por exemplo: o ensino da Língua Brasileira de Sinais (Libras), do código Braille, uso de recursos da informática e outras ferramentas tecnológicas, além de linguagens que

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precisam estar disponíveis nas escolas comuns para que elas possam atender com qualidade aos alunos com e sem deficiência (p.8).Segundo este conceito, o atendimento educacional especializado traduz-se, principalmente, pelos recursos lingüísticos diferenciados o que, a meu ver, é suscetível de problematização.‘Recursos’(instrumentos) específicos têm conotação bem diferente do sentido de ‘atendimento especializado’, na medida em que este pressupõe a relação entre pessoas, das quais uma é especializada, inclusive no uso dos ‘instrumentos’ necessários, segundo a na tureza da deficiência e a especificidade das barreiras enfrentadas pelos sujeitos.Outros autores sugerem que as discussões sobre educação especial devam ocorrer no contexto de uma agenda mais ampla, com foco na educação para todos, o que implica, necessariamente, no desenvolvimento de escolas regulares de melhor qualidade. Sob essa ótica, a visão dicotômica que identifica um sistema comum e outro especial de educação - este voltado para pessoas com necessidades educacionais especiais-, é substituída pelo entendimento da educação especial como um processo geral e que se traduz, nas escolas, por culturas, políticas e práticas inclusivas.Trata-se de mudança nos conceitos e nas práticas. E, como mudanças não ocorrem no vácuo, nem de um dia para outro, precisamos analisar nossas próprias atitudes frente à diferença, pois as transformações devem se processar a partir de nós mesmos. Igualmente, precisamos rever nosso entendimento sobre o papel das classes e das escolas especiais.Estudos realizados por alunos de Mestrado e Doutorado e que estão sumarizados por Mendes, Ferreira e Nunes (2003) mostram que as classes especiais não estão integradas no cotidiano das escolas, assim como há desarticulação entre o projeto pedagógico da escola e os trabalhos desenvolvidos nas referidas classes. Outras observações dignas de registro evidenciam que: (a) os professores das salas de recursos nem sempre organizam seus planos de trabalho juntamente com os professores das classes comuns e (b) que a passagem de alunos das classes especiais para as comuns, como reintegração, não se dá com facilidade nem para o aluno, nem para seu novo professor.Com essas e outras constatações temos que reconhecer que as classes especiais e as salas de recursos não têm cumprido seu papel, cabendo examinar as causas.Penso que tais evidências não implicam na eliminação dos serviços oferecidos como educação especial, embora precisem ser repensados. A própria Declaração de Salamanca adverte que as políticas educativas deverão levar em conta as diferenças individuais e as diversas situações, como é o caso de alunos surdos e surdos-cegos para os quais é mais conveniente que a educação seja ministrada em escolas ou em classes especiais, nas escolas comuns.O que fazer com e nas classes e escolas especiais são questões em aberto a merecer nossas considerações, a começar pela identificação dos alunos que, realmente, necessitam dessas modalidades de atendimento educacional especializado. Talvez, uma boa pista esteja na tipologia dos apoios que devem ser oferecidos, segundo as diferenças individuais e as diversas situações dos alunos.Penso que, com uma visão mais ‘moderada’ da educação inclusiva, o destino da educação especial alarga seu leque de compromissos, não mais como um sistema paralelo e muito menos com a permanência de suas práticas. Estas precisam ser examinadas, com bom senso e sem os extremismos apaixonados que nos impedem de perceber falhas e aspectos que precisam ser, urgentemente, modificados.Sob a ótica da mudança, as ações da educação especial também devem ser ressignificadas como um conjunto de serviços e de recursos de apoio, orientados para a educação regular, em benefício de todos os aprendizes.- Os desafios para as escolas regulares assumirem uma orientação inclusiva em suas culturas, políticas e práticas, não são pequenos. De modo geral, faz parte da cultura das escolas explicar as dificuldades escolares de muitos e muitos alunos como resultantes de suas limitações pessoais e do contexto social em que vivem.Estou me referindo ao modelo do déficit que responsabiliza o aprendiz e apenas ele pelas dificuldades que manifesta e enfrenta. Nossa forma tradicional de pensar tem-nos levado a procurar o que “falta” em nossos alunos para compensá-los, educacionalmente. Essa concepção tem gerado movimentos de segregação, não só dos alunos, que acabam sendo encaminhados para ambientes muito restritivos, como da exclusão deles em nosso imaginário...A inclusão educacional exige que expliquemos dificuldades escolares não só tendo os alunos como focos, mas considerando-se as limitações existentes em nossos sistemas de ensino e em nossas escolas. O desafio implica numa nova visão de necessidades educacionais especiais que, além das dos alunos, traduzem-se por necessidades das escolas, dos professores e de todos os recursos humanos que nelas trabalham.Mas, o maior desafio está nas salas de aula onde o processo ensino-aprendizagem ocorre de forma sistemática e programada. A grande questão parece ser: como planejar e desenvolver práticas pedagógicas verdadeiramente inclusivas, de modo a atender a todos e a cada um, valorizando o trabalho na diversidade, entendida como um recurso e não como obstáculo? O que nos falta para desenvolver práticas pedagógicas com direção inclusiva?Este tema precisa ser objeto de nossas reflexões, a começar pela problematização de alguns aspectos que vão desde a arrumação da sala de aula, até o desenvolvimento da aprendizagem cooperativa, com ênfase para a cultura do pensar.Outro desafio que tem sido enfrentado pelas escolas regulares diz respeito à avaliação. Esse tema é tão complexo e importante que justificaria um outro artigo. Sem nenhuma pretensão de me aprofundar no tema, mas para não deixá-lo ‘ em branco’, vou me ater a alguns aspectos, sugerindo que sejam aprofundados e ampliados pelos colegas que se disponham a discutir as idéias que apresento neste artigo.O primeiro dos aspectos diz respeito à avaliação diagnóstica, muito compatível com o modelo do déficit e que queremos substituir. Do ponto de vista clínico, com vistas a tratamento é importante diagnosticar, buscar as causas e fazer prognósticos terapêuticos. Do ponto de vista pedagógico, o diagnóstico clínico nem sempre oferece aos educadores as pistas do que devem fazer, no âmbito pedagógico. Sob esse aspecto, mais importante é avaliar os fatores que bloqueiam ou facilitam a aprendizagem, com vistas a identificar e operacionalizar as providências pedagógicas a serem adotadas pelos professores, em sala de aula.Quanto ao aproveitamento na aprendizagem, tudo o que se tem criticado sobre a avaliação como aferição do rendimento escolar, aplica-se a qualquer aluno. A avaliação não deve ter o papel de prática rotuladora que estigmatiza e segrega, mas, necessariamente, o de sinalizar as mudanças que precisam ocorrer.Passemos, finalmente, ao último tópico proposto. - As estratégias de alavancagem para mover um sistema educacional numa direção inclusiva levam-nos a pensar nos princípios que embasam a política educacional adotada e nas formas de administração consideradas como eficazes.

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Os princípios e valores que embasam as políticas educacionais constituem a base axiológica que move os formuladores de política. Se democráticos e centrados na aprendizagem em vez do ensino, os princípios serão verdadeiras alavancas que fazem sair da retórica para a prática, na medida em que o que está previsto nos objetivos, passa a acontecer, de fato. De certo modo, quando problematizei o conceito de inclusão, de respeito às diferenças, de tolerância e de igualdade de oportunidades, estive no terreno dos princípios, isto é, dos valores. E o papel da avaliação, também, pode ser traduzido em princípios, quando suas práticas servem para qualificar o progresso das escolas e dos alunos e não como “medição”. Em outras palavras, em vez de valorizar aquilo que medimos temos que aprender a avaliar aquilo que valorizamos!Penso que esses temas, dentre outros, precisam ser discutidos nas Secretarias de Educação, nas Escolas, nas Universidades, na Comunidade e por políticos voltados para o bem comum e não para seus interesses pessoais.O conceito de inclusão é, dentre eles, o mais sutil porque inclusão é processo e não um estado, porque a movimentação física de alunos para que estejam presentes nas classes comuns não garante que estejam integrados com seus colegas e aprendendo e participando. Podemos estar presentes e excluídos...Se chegarmos a alguns consensos, concluiremos pela necessidade de rever a natureza das práticas que temos adotado, seja nas classes comuns, seja nas classes e escolas especiais, ou nas salas de recursos e por serviços itinerantes.Quanto às formas de administração dos sistemas, merece ser desdobrada em suas instâncias hierárquicas desde os gestores a nível central (MEC, Secretarias de Educação de Estados, de Municípios ou do Distrito Federal), até os dirigentes das escolas. Em qualquer dos níveis de planejamento e administração de sistemas inclusivos, a discussão dos princípios deve alavancar as decisões a serem tomadas e as providências cabíveis para atingir objetivos.Mas, uma boa administração precisa de dados confiáveis sobre alunos, professores e gestores. Precisa “ouvir a voz das crianças”. Precisa ouvir a voz das próprias pessoas em situação de deficiência.Lembro-me, agora, de uma experiência muito interessante ocorrida em São Luiz, Maranhão, onde foi solicitado a todos os alunos que escrevessem para o Secretário Municipal de Educação. Segundo informações do próprio Secretário, os dados obtidos nas cartas foram muito mais significativos e propositivos de mudanças do que aqueles coletados nas estatísticas e relatórios disponíveis!As práticas dialógicas envolvendo os atores são muito recomendáveis no espírito da administração compartilhada em que todos são, também, autores. Sei que é mais fácil falar ou escrever, sendo bem mais difícil concretizar, na prática, particularmente se não forem removidas as justificáveis insatisfações que a quase totalidade dos educadores manifesta.Queixam-se das condições materiais em que trabalham, dos seus baixos salários, do número de alunos por turma, do despreparo decorrente de sua formação inicial e continuada, da falta de tempo para, nas escolas, estudarem juntos, discutirem práticas pedagógicas, trocando “figurinhas”...Certamente não estou me referindo a nada de novo, pois essas e outras justas reclamações dos nossos educadores são bem antigas.Sabendo que vontade política é um ingrediente indispensável na busca de soluções, permito-me questionar, parafraseando o Prof. Mel: temos, governo e educadores, realmente, vontade coletiva de tornar nossas escolas inclusivas?Esta, creio, é a principal de todas as alavancas.Movê-la não depende só dos educadores e das escolas. A articulação entre as políticas públicas para a remoção das barreiras existentes é tarefa de todos nós. Mas não dependem de boa-vontade e sim de efetivas ações que garantam o funcionamento de escolas de boa qualidade para todos e com todos.

Ciclos, Seriação e Avaliação: confronto de lógicasFREITAS. LuizCarlosde. SãoPaulo:Moderna, 2003. 96p.

Neste livro o professor Luiz Carlos de Freitas discute, dentro da temática da avaliação,os modelos de seriaçãoou ciclos.Numa exposição clara e bastante didática, analisa em quatro breves capítulos a lógica da escola, a lógica da avaliação, a lógica dos ciclos e a lógica das políticas públicas, colocando o leitor a par dessa polêmica.Ao tratar, no primeiro capítulo, sobre a /ógicada escola,o autor inicia a discussão sobre como se organizam os tempos e os espaços da escola. Sua construção histórica determina a sala de aula como espaço mais importante da produção pedagógica, que se faz no tempo da seriação dos anos escolares. Recupera alguns ideais daeducação moderna, como, por exemplo, a máxima liberal de que a escola deve ensinar tudo a todos, de modo que a desigualdade social deve ser compensada com os recursos pedagógicos da escola.Para Freitas, esse ideal, que prevalece até os dias de hoje, constitui o que ele chama de "perspectiva ingênua da eqüidade", pois a forma como a sociedade está organizada afeta o cumprimento desse papel da escola, o que requer um olhar para a necessidade de eliminação dos desníveis socioeconômicos e da distribuição do capital cultural/social entre os alunos.Ensinar tudo a todos "pode ser o nosso desejo, mas está longe de ser o compromisso social da escola na atual sociedade", diz o autor, pois "há uma hierarquia econômica fora da escolaque afeta a constituição das hierarquias escolares - queiramos ou não, gostemos ou não". (p.18)Analisando em alguns autores os antecedentes da concepção de progressão continuada, apresenta o argumento de que "há que se diversificar o tempo de aprendizagem", ou seja, é preciso que cada um avance em seu ritmo, usando todo o tempo que lhe seja necessário. A progressão continuada, instituída no Estado de São Paulo em 1998, agrupou em um módulo as séries de Ia. a 4a. e, em outro módulo, as sériesde 5a.a 8a. , sob os argumentos do respeito aos ritmos diferenciados de aprendizagem e da eficácia dos recursos escolares.Nesse ponto o autor problematiza as raízes da avaliação na escola e a própria lógica da escola capitalista. Explica que, na formação social capitalista e no desenvolvimento de suas forças produtivas, a função da escola é preparar rapidamente, em série, recursos humanos para alimentar a produção hierarquizada e fragmentada. Nesse aspecto nos deparamos, então, com os processos de aprendizagem artificiais, pois ensinar de maneira tradicional (verbal e por série) é mais rápido que por métodos ativos (pesquisa).

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A forma atual da escola diz respeito às necessidades de preparação de mão-de-obra do capitalismo: o conhecimento foi partido em disciplinas e distribuído por anos. "Convencionou-se que uma certa quantidade de conhecimento devia ser dominada pelos alunos dentro de um determinado tempo" (p.27).No processo histórico de constituição escolar, a avaliação surge como um "motivador artificial" para a aprendizagem. O sistema de avaliação resultante em notas tem o sentido de estimular o aluno para os estudos -'~prender para trocar por nota" (p.28).Conclui o autor que essa é a lógica da escola e que decretos não chegam a afetar a trama do processo educativo. "Não foi o professor quem inventou essa lógica: ela faz parte da própria gênese da escolà' (p.30). Para Freitas, a lógica da exclusão e a lógica da submissão se completam: caso as crianças não aprendam o conteúdo escolar,aprenderão a ser submissas, pela escola. "Deixadas ao acaso, sem resistências, essas lógicas usuais se cumprem" (p.39). No segundo capítulo, o autor apresenta a lógicatk avaliação como aquela que leva a "aprender para mostrar conhecimento ao professor", e não "aprender para intervir na realidade". Elabora três segmentos de avaliação do processo pedagógico que ocorre em sala de aula entre professor e alunos: 10.) Instrucional: baseia-se na demonstração do domínio de conteúdos e habilidades pelo aluno, através de provas e trabalhos. 2°.) Comportamento: expressa o controle e o poder do professor sobre o comportamento do aluno, visando a obediências. 3°.) Valores e Atitudes: sua avaliação se revela-nos momentos em que o professor critica os valores e atitudes do aluno, humilhando-o.Tal explicação evidencia o peso da avaliação informal no processo ensinoaprendizagem, como uma categoria importante que desvelamecanismos de exclusão da escola, tão "eficientes"quanto aqueles expressos na falsa neutralidade da avaliação formal.O terceiro capítulo analisa a lógicadosciclos,e Freitas afirma: "os ciclos procutam contrariar a lógica da escola seriada e sua avaliação". Só por isso, já devem ser apoiados. Não eliminam a avaliação formal, muito menos a informal, mas redefinem seu papel (...)" (p.5l).. O autor aborda de forma positiva as experiências lançadas pela Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte e de Porto Alegre, na implantação dos "ciclos de formação", subdivididos entre infância, pré-adolescência e adolescência.Orientando-se pelo tempo de formação do próprio desenvolvimento humano, os parâmetros a serem seguidos pelo professor baseiam-se nas características pessoais e nas vivências socioculturais.O autor acrescenta a essa visão a noção de que os ciclos devem planejar suas vivências,estabelecendo forte vínculo com a realidade social (no sentido de apontar suas contradições). Também se revela a noção do trabalho coletivo e da solidariedade como ancoragem da aprendizagem: "estudantes não 'exploram' o professor, professornão 'explorá o estudante e estudante não pode 'explorar' estudante". (p.59). A diferença está no fato de o professor ser mais experiente do que o estudante. "Devolver essa relação à sua naturalidade é algo fundamental como princípio educativo". (p.59)Outra dimensão apontada pelo autor diz respeito à auto-organização dos estudantes. "Ao 're-situarmos' a posição do aluno, seremos levados a discutir a posição de todos os atores no processo educativo (...) - a escola deve ser o palco dessa aprendizagem (...)" (p.62), tendo em vista que as relações devem ser horizontalizadas e não baseadas na aprendizagem da subordinação.No quarto capítulo, ao discutir a lógicadas políticas públicas, o autor opina que os ciclos não devem ser implantados como política pública que determine sua adoção em massa - as escolas devem ter autonomia para fazer a opção pelos ciclos. Nesse aspecto, o autor critica a implantação da progressão continuada no Estado de São Paulo, pois, nesse sistema, a avaliação assume papel de controle e atua para implementar verticalmente uma política pública. O autor apresenta um quadro esquemático, estabelecendo diferenças entre os princípios e as concepções do sistema de Progressão Continuada (concepção conservadora e liberal) e aqueles dos Ciclos (propostas transformadoras e progressistas).A avaliação do desempenho da escola, em São Paulo, prepara-a para um quase mercado, através dos mecanismos de competição, punição, comparação e premiação.Conclui o autor que os ciclos devem ser vistos como um processo de mobilização e tomada de consciência dos reais impedimentos para que os estudantes aprendam, gerados por uma estrutura social injusta.Esta obra do professor Luiz Carlos de Freitas expressa seu valor pela atualidade da temática e pela profundidade das críticas que apresenta sobre a escola, marcada pela generosidade de não culpar apressadamente o professor pelos problemas surgidos na realidade, sem, no entanto, iludi-lo pelo caminho da inovação alienante, tão presente nos discursos pedagógicos atuais.

O Jogo do contrário em avaliaçãoJussara Hoffmann

O título deste livro revela o posicionamento da autora frente às práticas avaliativas excludentes e ainda vigentes no país. Ela propõe que os educadores experimentem fazer o contrário do que vêm fazendo no sentido de não comparar os alunos, de prestar atenção em cada um deles, de reinventar as práticas avaliativas para não deixar nenhum estudante sem aprender. De forma didática, desenvolve a ação avaliativa em três tempos; tempo de conhecer bem os alunos, tempo de compreender seus jeitos de aprender e tempo de mediação. Suas considerações teóricas aparecem exemplificadas com interessantes estudos de casos e outros exemplos

Parte IEntre claros e escuros da avaliação

Avaliação formativa ou avaliação mediadora?Processo subjetivo e multidimensionalUma ação em três temposUma concepção formativa e mediadoraAs contribuições de Piaget e Vygotsky

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O papel mediador do professor

Aprender ou não aprender?Com que critérios avaliamos?Leituras positivas e negativasO aprender sem complementosEvolução e conjunto das aprendizagensO aprender e o desejo de aprender

Respeitar ou valorizar as diferenças?Cuidados especiaisUma pedagogia do contágio

Quantidade ou qualidade em avaliação?Qualidade e aprendizagem: conceitos multidimensionaisDa observação à ação reflexiva: relatórios e dossiêsRelatórios: compreender e compartilhar histórias de vidaRelatórios: do pensar ao agir na formação docente

Sistema de avaliação é causa ou consequência do fracasso escolar?A discussão sobre regimes não seriados e reprovaçãoSobre o princípio de não reprovarAcesso e permanência na escolaMovidos pela aprendizagem?

Parte IIFazendo o jogo do contrário em avaliação

O jogo do contrário em avaliaçãoObservar aluno por alunoOs “difíceis” estudos de casoAvaliação mediadora em três tempos

Tempo de admiração: conhecer parajustificar o “não sido” ou compreender para promover oportunidades?O princípio de compreenderO exercício do aprendizado do olharO compartilhamento do olhar avaliativoA multidimensionalidade do olharE o que se admira afinal dos e nos alunos?A perigosa prioridade às questões atitudinaisValoração objetiva e subjetiva: um olhar em açãoAutoavaliação: um olhar que “realiza” o próprio aluno Conselhos de classe: compreender para encaminhar?Arquivos e registros: constituindo históriasLeitura positiva com apoio multidisciplinar

Tempo de reflexão: corrigir tarefas ou interpretar situações de aprendizagem?Interpreta-se para compreenderTempo de reflexão: entrelaçando olharesSobre o cenário avaliativoSobre as relações afetivasMediando a aprendizagem da leitura e da escritaSobre a dinâmica das aprendizagensAnálise dos avanços e necessidades percebidasPercursos possíveis de um olhar reflexivoA qualidade dos instrumentos de avaliaçãoO tempo de reflexão e a dimensão do sensível

Tempo de reconstrução: avaliar para aprovar e reprovar ou formar para vida? A experiência dos países que avançaramFinlândia: a leitura em primeiro lugarMalásia: diversidade e multidimensionalidadeExperiências em avaliação mediadora no paísRelatos de casosSobre o inédito-viável

Avaliação formativa ou avaliação mediadora?

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Para se entender de avaliação, o primeiro passo é conceber o termo na amplitude que lhe é de direito. Ao avaliar efetiva-se um conjunto de procedimentos didáticos que se estendem sempre por um longo tempo e se dão em vários espaços escolares, procedimentos de caráter múltiplo e complexo tal como se delineia um processo.Decorre daí que não se deve denominar por avaliação testes, provas ou exercícios (instrumentos de avaliação). Muito menos se deve nomear por avaliação boletins, fichas, relatórios, dossiês dos alunos (registros de avaliação).Métodos e instrumentos de avaliação estão fundamentados em valores morais, concepções de educação, de sociedade, de sujeito. São essas as concepções que regem o fazer avaliativo e que lhe dão sentido. É preciso, então, pensar primeiro em como os educadores pensam a avaliação antes de mudar metodologias, instrumentos de testagem e formas de registro. Reconstruir as práticas avaliativas sem discutir o significado desse processo é como preparar as malas sem saber o destino da viagem.A avaliação da aprendizagem, mais especificamente, envolve e diz respeito diretamente a dois elementos do processo: educador/avaliador e educando/avaliando. Alguém (educando) que é avaliado por alguém (educador).Mesmo que o educador trabalhe com muitos alunos, sua relação, no processo avaliativo, estabelecer-se-á de forma diferente com cada um deles. Por meio da ação mediadora, da tomada de decisão, ele estará afetando vidas e influenciando aprendizagens individuais. Da mesma forma, cada aluno irá estabelecer maiores ou menores vínculos intelectuais e afetivos com cada professor, resultando em atitudes e respostas diversas por parte destes.Dessa forma, o processo avaliativo é sempre de caráter singular no que se refere aos estudantes, uma vez que as posturas avaliativas inclusivas ou excludentes afetam seriamente os sujeitos educativos. É preciso refletir, portanto, sobre procedimentos adotados como justos, com a prerrogativa de que se avaliam muitos alunos nas escolas e universidades. Esta justificativa não é pertinente!Todo processo avaliativo tem por intenção:

a) observar o aprendiz; b) analisar e compreender suas estratégias de aprendizagem; e c) tomar decisões pedagógicas favoráveis à continuidade do processo.

Somente se constitui o processo como tal, se ocorrerem os três tempos: observar, analisar e promover melhores oportunidades de aprendizagem.Não se pode dizer que se avaliou porque se observou algo do aluno. Ou denominar por avaliação apenas a correção de sua tarefa ou teste e o registro das notas, porque, nesse caso, não houve a mediação, ou seja, a intervenção pedagógica, decorrente da interpretação das tarefas, uma ação pedagógica desafiadora e favorecedora à superação intelectual dos alunos.Essa é a intenção do avaliador: conhecer, compreender, acolher os alunos em suas diferenças e estratégias próprias de aprendizagem para planejar e ajustar ações pedagógicas favorecedoras a cada um e ao grupo como um todo. O objetivo de “promover melhores condições de aprendizagem” resulta em mudanças essenciais das práticas avaliativas e das relações com os educandos, uma vez que toda observação ou “exigência” do professor passa a vir acompanhada de apoios, tanto intelectuais quanto afetivos, que possibilitam aos alunos superar quaisquer desafios.Nesse caso, nenhuma atenção aos alunos é considerada em demasia (como muito se fala, hoje, de “alunos que tomam tempo”), seja em termos de estratégias de sala de aula, seja em termos de Conselho de Classe ou de apoio pedagógico de qualquer natureza.Perder tempo, pelo contrário, é não fazer a intervenção pedagógica no tempo certo.No sentido de sua sistematização, devem-se programar tarefas avaliativas, tempos de análise de tarefas e devolução aos alunos, estratégias interativas decorrentes, etc. Mas tratando-se a avaliação de um processo, como se defendeu de início, é contínua e evolutiva, não podendo ocorrer por etapas delimitadas. Bimestres, trimestres, semestres, anos letivos, no que se refere aos registros escolares, não podem ser determinantes da sistemática de avaliação, ainda mais quando se trata de acompanhar os alunos no processo evolutivo da leitura e da escrita. Tal processo é alicerce ao desenvolvimento dos alunos em todas as áreas de conhecimento. Portanto, as anotações sobre seu desempenho bimestral, por exemplo, são pequenas “paradas” de um trem em movimento, ou seja, momentos de o professor dar notícias sobre o caminho percorrido pelo aluno até aquele momento. Da mesma forma, o significado essencial desses registros é servirem de pontos de referência para a continuidade das ações educativas, do próprio professor ou de professores que lhe sucederem, quando são feitos ao final de anos letivos.

Nova legislação e política de cotas desencadeariam ascensão econômica e inclusão dos negros, diz professor

Até agora ausente das prateleiras de bibliotecas e das salas de aula, livros paradidáticos que levantam questões sobre o negro brasileiro sem reduzi-lo a objeto começam a aparecer. Se antes a temática não representava um mercado potencial para as editoras, a nova legislação já dá mostras de avanços concretos. Em vigor desde janeiro de 2003, a lei federal 10.639 torna obrigatório o ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e Africana em todas as escolas de ensino fundamental e médio públicas e particulares.O livro Para entender o negro no Brasil de hoje: história, realidades, problemas e caminhos (Global Editora/Ação Educativa) foi escrito pelo antropólogo Kabengele Munanga, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo, e por Nilma Lino Gomes, da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais. Voltado para Educação de Jovens e Adultos (antigo supletivo), a obra também está sendo usada em cursos de graduação de outras universidades. Em entrevista ao USP Online, o professor Kabengele, que nasceu na República Democrática do Congo e leciona na USP desde 1980, conversou sobre a educação no Brasil, defendeu o sistema de cotas e apresentou algumas idéias de sua obra.A aprovação da lei 10.639 ajuda a desconstruir o mito da democracia racial no Brasil?Kabengele Munanga - A lei vem provar que o Brasil não era uma democracia racial, pois levou 115 anos para introduzir no ensino o estudo da matriz cultural africana. E ela não caiu do céu, mas é resultado da luta do movimento

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social negro. A nova lei tem tudo de positivo. Porém, é preciso que ela seja efetivamente implementada e que seja definido exatamente o conteúdo a ser ministrado. A África é um continente de 56 países e ilhas. A lei não disse que África e Brasil ensinar. Mas se não fosse a lei, ninguém se mobilizaria.Como é o ensino da cultura afro-brasileira e africana na escola?K. Munanga - A África que nós conhecemos é a do Tarzan, Simba Safári, Aids, fome, guerras, das tribos. Será que a África é só isso? Já viu algum livro didático mostrar que a África é o berço da humanidade, que as maiores civilizações se desenvolveram lá, que a civilização egípcia era negra? Nunca se viu na historiografia oficial, nos livros didáticos, os impérios e reinos africanos. A África é simplesmente tida como tribo. É isso o que a lei pretende corrigir. Além de introduzir a história da África no currículo, é uma nova história que será ensinada, em que a identidade africana e dos afro-descendentes é apresentada de maneira positiva.O senhor explica que foi após a conferência de Berlim (1885) que se deu a passagem de uma imagem positiva do povo e continente africanos para uma negativa.K. Munanga - Os primeiros viajantes na África, como os árabes, deixavam documentos sinceros sobre aquela sociedade, relatando as formas de organização política, expressão artística etc. Quando começou a colonização da África, essas memórias foram apagadas. Para se justificar a dominação através do discurso da Missão Civilizadora, foi preciso negar os atributos daquelas sociedades. Os livros escritos depois da colonização não trazem mais uma África autêntica, mas esteriotipada. É essa África que foi ensinada na historiografia oficial. Isso também tenta justificar a posição do negro na sociedade brasileira. O discurso é também um dispositivo de dominação, é ele que legitima a situação do "outro", o nomeia. Não basta força militar, é preciso que o poder seja legitimado pelo discurso.O senhor vê resquícios dos princípios da Missão Civilizadora em alguns trabalhos assistencialistas de organizações não-governamentais, que pretendem salvar o negro e pobre (já que no Brasil pobreza tem cor)?K. Munanga - Seria uma injustiça dizer isso, pois não colaboro com ONGs e conheço muito pouco sobre elas. Parto do princípio de que muitas delas perceberam que o Estado não estava cumprindo suas obrigações. Nesse sentido, muitas organizações contribuíram com os países africanos, fazendo o que o governo não fazia no sistema de saúde e educação. Não creio que eles estavam fazendo isso com o espírito da Missão Colonizadora. Como membros da sociedade e conscientes das injustiças cometidas contra essas sociedades, eles acham que podem fazer algo, não cruzam os braços.Qual a importância da Frente Negra Brasileira e do Teatro Experimental do Negro para a educação e inclusão dos negros?K. Munanga - Foram tentativas. A Frente Negra Brasileira foi um movimento social fundado por uma elite negra dos anos 30. Ela foi a primeira a denunciar o mito da democracia racial, e só depois a academia foi estudá-lo. Aqueles negros colocaram o mesmo problema que hoje estamos colocando: a educação é um dos caminhos para poder integrar o negro no mercado de trabalho, no sistema de poder. A diferença é que os movimentos negros atuais, que surgiram em 1975, além de reivindicar a escola também querem que ela reconheça sua identidade, ensine a história e cultura dos negros africanos. Movimentos negros anteriores, como no caso específico da Frente Negra, queriam simplesmente se integrar na cultura dominante. Porém, ambos os movimentos lutam para que o negro faça parte do sistema educacional. Quantos negros há na Universidade de São Paulo?Como surgiu o debate sobre cotas? K. Munanga - Chegou um momento em que movimentos sociais negros eles descobriram que o único caminho para garantir o acesso do negro à educação superior de boa qualidade era através de uma política pública, uma medida obrigatória. E se isso não for feito, se contar apenas com a boa vontade do cidadão, nada vai acontecer. É claro que o sistema de cotas é uma experiência que já foi vivida por outros países do mundo. É o caso, por exemplo, dos EUA, onde os negros são cerca de 12% da população e, a partir das lutas pelos direitos cívicos nos anos 1960, uma parcela deles conquistou uma grande mobilidade social e econômica. Há uma classe média negra bastante notável, com intelectuais nas grandes universidades, médicos em grandes hospitais, engenheiros até na NASA. A experiência deles deu certo. Na Índia o governo também adotou a política das cotas para as castas dos "intocáveis" desde 1950, três anos após a independência do país.Se essa política já existe em outros países, por que no Brasil ela tem um tom de novidade, como se não houvesse outras experiências em outros lugares?K. Munanga - Justamente porque não há vontade política para mudar as coisas. Quantas coisas o Brasil copia dos Estados Unidos? Modelo econômico, ciência e tecnologia... Não copiam as cotas porque não querem. Muitos brasileiros ainda não acreditam na existência do racismo no Brasil. Eles acham que a questão é simplesmente econômica, de classes, ou uma questão social. Como se o machismo e a homofobia não fossem uma questão social. Todas as questões que tocam a vida do coletivo são sociais, mas o social não é algo abstrato, tem especificidade, tem endereço, sexo, religião, cor, idade, classe social.Muitos acham que o caminho para corrigir as desigualdades sociais seria uma política universalista, baseada na melhoria da escola pública, o que tornaria todos os cidadãos brasileiros capazes de competir. Mas isso é um discurso para manter o status quo, porque enquanto se diz isso nada é feito. Não se esqueça que quando as escolas públicas no Brasil eram boas, os negros e pobres não tiveram acesso a ela. Havia uniformes caros e outros mecanismos que os excluíam. O pobre estudava nas escolas particulares, como foi o caso de José Corrêa Leite, um dos fundadores da Frente Negra Brasileira. Então não adianta dizer que basta melhorar o nível das escolas públicas. Mesmo porque isso significaria acabar com a clientela das escolas particulares, que possuem um forte lobby e não tem nenhum interesse em ver escola pública de boa qualidade.Se o governo conseguisse fazer isso [melhorar a escola pública] seria ótimo. Mas a partir do momento em que pobres e ricos mandarem seus filhos para as escolas públicas, haverá outras formas de excluir o negro. O problema de cotas irá se colocar novamente.Então haveria um círculo vicioso?K. Munanga - Sim, mas há uma saída. Um aluno que entra pelas cotas e se forma, vai encontrar as mesmas barreiras do preconceito no mercado de trabalho. Mas a situação dele será diferente, pois ele terá sólida formação, que vai lhe abrir muitas portas. Ele certamente passará em um concurso público. E quando ele encontrar alguma porta fechada, saberá lutar por seus direitos, ou poderá ter emprego e dinheiro para contratar um advogado. É uma grande diferença. É como dizer que a sociedade deixou de ser machista. Não é verdade. A mulher está ocupando espaços

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públicos porque ela lutou e se capacitou. A competência abre muitas portas, embora muitas outras estejam fechadas. Como essa mulher também não tinha uma formação política, achava que seu lugar era na cozinha e na maternidade.O senhor se refere às mulheres brancas?K. Munanga - Sim, pois as mulheres negras são as maiores vítimas da discriminação. São duplamente discriminadas, enquanto mulheres e enquanto negras. Mas o acesso à educação propicia melhor conscientização e capacidade de lutar pelos seus direitos. Além do mais, a educação tem fator de multiplicação. Um jovem que foi para a escola, passou por uma boa universidade, tem consciência dos problemas da sociedade, não deixará seus filhos passarem pelo mesmo caminho. O acesso que ele tem a uma certa mobilidade social e ascensão econômica faz com que seus filhos possam estudar em uma boa escola. E ele pode também se tornar aquele referencial que o negro não tem.O ProUni (Programa Universidade para Todos) teria os mesmos resultados que as cotas em universidades púbicas, no sentido de propiciar a conscientização política e ascensão econômica de pobres e negros?K. Munanga - Creio que sim. Não sei como as escolas particulares trabalham as questões raciais, mas o aluno que entra pelo ProUni se informa sobre o programa e sabe porque está indo à universidade. Há faculdades particulares de qualidade. E todas têm o efeito multiplicador, tanto na educação dos filhos como na futura ascensão econômica deles. A expansão do ensino público leva tempo. Enquanto isso os jovens que terminaram o Ensino Médio não podem estudar? Graças ao ProUni, hoje se tem mais de 40 mil afro-descendentes que entraram nessas escolas particulares. Isso é um ganho.Em seu livro e em outras obras, o senhor desconstrói o mito de um sistema escravista africano que justificaria e legitimaria as formas de escravidão que deram origem aos tráficos. Qual era o conceito de "escravo" na África antes dos tráficos liderados por europeus e árabes?K. Munanga - Em primeiro lugar, a existência do chamado "escravo" não é razão para aceitar a escravidão. Em qualquer circunstância, a escravidão é uma instituição desumanizante e deve ser condenada. O homem nasce livre até que alguém o escravize. Portanto, o próprio conceito está errado. O correto é "escravizado", não "escravo". Não há uma categoria de escravo natural. Porém, esse conceito já está enraizado na literatura. Em segundo lugar, o conceito de "escravo" vem de outra visão de mundo, diferente da africana. Como em outras sociedades, na África existia a categoria de cativos, que eram prisioneiros de guerra ou pessoas que cometiam algum delito na sociedade e eram levadas por outros grupos étnicos. Os homens trabalhavam como serventes dos reis, príncipes e guerreiros, enquanto as mulheres se tornavam esposas e reprodutoras das famílias reais. Todos os filhos dos cativos eram livres. Em outros casos, famílias penhoravam algum parente quando havia grandes calamidades. Esses parentes poderiam trabalhar em outras famílias temporariamente ou para sempre, caso sua família original não tivesse condições de adquiri-lo de volta. Em hipótese alguma havia um escravismo como sistema de produção, pois não era uma sociedade de acúmulo de capital, mas de subsistência.Essa categoria de cativo africano foi traduzida como escravo. Mas não o é, pois o sistema escravista pressupõe que os escravizados sejam bem mais numerosos que os senhores. No Brasil, até século XVII, os negros eram cerca de 70% da população. Em compensação, algumas sociedades africanas não queriam nem guardar o cativo, achavam que ele não servia para nada. Por isso alguns eram enterrados vivos com reis, para servi-lo no outro mundo. Muitos reis e príncipes colaboraram com o tráfico negreiro para outros continentes, capturando negros de outros grupos étnicos para vendê-los como escravizados. Mas este fato também não justifica a escravidão. Quando se fala de escravidão na África só se pensa no tráfico liderado pelos europeus. E a responsabilidade árabe com a escravidão através das rotas oriental e transaariana?K. Munanga - Não se fala sobre isso porque a escravidão liderada pelos árabes é anterior à européia. Começou no século VI e terminou no século XX. Os escravizados foram deportados para os países do Oriente Médio. Talvez não se fale muito porque não se vê tantos negros mestiços nos países árabes como se vê nas Américas. Isso porque era freqüente a castração dos negros, muitos trabalhavam como eunucos. Apesar de as mulheres servirem como concubinas nos haréns, a taxa de mortalidade dos negros era alta. Inclusive quando as pessoas dizem que o Brasil foi o último país do mundo a abolir a escravidão, não é verdade. A Arábia Saudita a aboliu em 1962. É uma história que ninguém conhece.

Resenha: O jogo das diferenças: o multiculturalismo e seus contextos

GONÇALVES, Luiz Alberto Oliveira; SILVA, Petronilha Beatriz Gonçalves e. O jogo das diferenças: o multiculturalismo e seus contextos. 4. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2006. 112 p. (Coleção Cultura Negra e Identidades).

De autoria do professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Luiz Gonçalves, que fez pós-doutorado em Sociologia pela Ecole des Hautes Etudes em Sciences Sociales (Paris-França), e da professora da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Petronilha Silva, que possui pós-doutoramento em Teoria da Educação pela University of South Africa (Pretória-África do Sul), o livro “O jogo das diferenças: o multiculturalismo e seus contextos” faz parte de uma coleção denominada “Cultura Negra e Identidades”, cuja coordenação é da educadora Nilma Lino Gomes.A importância dessa obra é patente para quaisquer sujeitos. Serve tanto para o que educa, como para o que está se formando educador. Serve igualmente aos indivíduos que querem “apenas” praticar a ação de respeitar o outro.O texto em questão possui como tema central o multiculturalismo, que é uma forma de questionar a ideologia etnocêntrica ou o eurocentrismo, e os desdobramentos dessa política identitária no mundo contemporâneo.Dito de outra forma, “[...] o multiculturalismo desde sua origem aparece como princípio ético que tem orientado a ação de grupos culturalmente dominados, aos quais foi negado o direito de preservarem suas características culturais.” (p. 17).Além disso, o multiculturalismo recoloca “[...] o problema da diversidade cultural no centro dos debates políticos de sua época, produz hiatos e descontinuidades na forma como as Ciências Sociais apresentam a sociedade a qual estudam.” (p. 22).A obra é composta, além da Apresentação e das Referências, por quatro capítulos assim denominados: “O multiculturalismo e seus significados”, “Multiculturalismo e educação nos Estados Unidos”, “O multiculturalismo na América Latina” e “Estudos culturais e pesquisa em educação no Brasil”.

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No primeiro capítulo os autores externam pormenorizadamente várias compreensões sobre o significado do que é multiculturalismo, bem como explicitam que inicialmente este tinha como centralidade a questão étnica e procurava dar visibilidade aos negros e indígenas, por exemplo. Posteriormente, o multiculturalismo passou a ser uma forma de defender também outras questões, tais como: gênero, preferência sexual, geração e pessoas que portam o que se chama de necessidades especiais.Destaca-se ainda nesse capítulo as transformações alavancadas pelo multiculturalismo na sociedade em geral e as contribuições dele (dos agentes que o integram) para determinadas parcelas da população, sobretudo as contribuições no campo dos direitos civis e na área educacional.O segundo capítulo analisa o surgimento do multiculturalismo nos EstadosUnidos da América (EUA) e define quais questões o mesmo defendia e continua a defendernessa sociedade, tendo em vista que os primeiros estudos multiculturais datam do final doséculo XIX. São externados também os sujeitos que empreenderam lutas em prol dosdireitos civis, da afirmação da cidadania e da participação ativa dos “excluídos” nasociedade norte-americana.Para demonstrar como se deram essas questões foram explicitados os significados de inúmeros temas-assuntos, quais sejam: Black Studies, Estudos Negros, Africologia e o nome do seu fundador, filosofia afrocêntrica, afrocentrismo, Estudos Afroamercianos,Estudos Índio-americanos, Estudos Asiático-americanos, educação multicultural, pedagogia da eqüidade, aprendizado da diversidade e foram externadas também algumas críticas feitas à educação multicutural.O terceiro capítulo trata do movimento multicultural na América Latina, em especial o brasileiro. Dentre os assuntos abordados, pode-se destacar a contestação da “imagem de paraíso racional” existente no Brasil, bem como o chamado “mito da democracia racial”. Esses elementos são desconstruídos à luz do multiculturalismo afrobrasileiro que, por sua vez, serve inegavelmente para denunciar e alterar a realidade de exploração na qual vivem milhões de agentes históricos.Essa denúncia foi e é feita por meio da poesia, da música, da literatura militante e da corrente culturalista, em síntese, a Teoria da Negritude e a Teoria do Sujeito. Contudo, esse trabalho não é nada fácil, ao contrário, é extremamente complexo. O Estado, que possui o monopólio da força legalizada, ao procurar construir uma suposta identidade nacional, acaba, por exemplo, por inibir/coibir a pluralidade cultural de inúmeros povos.Nesse sentido, o Estado nacional constitui-se como um objeto que também precisa ser re-significado pelos agentes multiculturalistas, tal como ocorre com os currículos escolares das instituições ensino, que são, de uma forma ou outra, o principal campo de atuação dos multiculturalistas.Além desses assuntos, são mencionados no penúltimo capítulo os movimentos sociais que se engajaram na luta pelo respeito à diversidade cultural, ou seja, foram externadas as organizações afro-brasileiras existentes no Brasil e as políticas multiculturais por elas empreendidas para alterar os currículos escolares, para que os mesmos contemplem a diversidade cultural que compõe, efetivamente, a sociedade brasileira. No último capítulo tem-se um estado da arte da produção científica realizada em Instituições de Ensino Superior (IES) brasileiras, cujo tema central de investigação foi o multiculturalismo. Os dados não são nada favoráveis à produção multicultural. Apenas uma pequena parte das dissertações de mestrado e das teses de doutorado abordou a questãomulticultural.Na realidade, o que ocorre é que as políticas multiculturais ainda são pouco contempladas nos currículos escolares, tanto na Educação Básica como na Educação Superior, embora existam vários movimentos sociais lutando para ampliar o espaço de tais políticas. No dizer dos autores, “[...] não se têm claramente formulada uma proposta que garanta, em níveis acadêmicos, uma formação permanente de professores e uma política cultural de envergadura nacional.” (p. 96).Por fim, vale frisar que o livro “O jogo das diferenças” é um instrumento muito relevante para evidenciar a diversidade cultural que compõe a sociedade brasileira. Sendo assim, quem faz a leitura da obra não pode negar que o Brasil e também o mundo são extremamente multiculturais. Portanto, quem nega a multiculturalidade acaba por negar também a sua própria história.

INTERVENÇÃO PRECOCE: REFLEXÕES SOBRE O DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA CEGA ATÉ DOIS ANOS DE IDADE Gérson Carneiro de Farias* RESUMO O artigo envolve a reflexão do processo de desenvolvimento infantil da criança cega até dois anos de idade (período sensório-motor): as aquisições motoras tais como o desenvolvimento da preensão, da linguagem, a noção do objeto, o vínculo mãe/criança, bem como a análise do programa de atendimento em intervenção precoce. A reflexão mostra que o desenvolvimento infantil se dá pelo movimento, favorecendo as estruturas do pensamento e da linguagem, assim como a relação com o ambiente e com as pessoas, particularmente com a mãe. A análise do programa mostra que seu sucesso depende do atendimento direto prestado à criança, com regularidade e continuidade do trabalho em casa, e à família com orientações e integração de esforços. PALAVRAS-CHAVE: Desenvolvimento sensório-motor – Programa de atendimento em intervenção precoce e criança cega. INTRODUÇÃO A educação especial como linha de pesquisa do programa de pós-graduação em educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) adota um enfoque psicossocial: centrado nas pessoas com deficiências. Ou seja, um delineamento que leva em conta as possibilidades do sujeito para aprender, desenvolver-se, adaptar-se, participar da vida em sociedade e exercitar sua cidadania. A pós-graduação desenvolve pesquisas do tipo Follow-up: efeitos de programas para enriquecimento. Nesse sentido, a proposta desta comunicação é analisar o desenvolvimento da criança cega até dois anos de idade para aplicação de um programa de intervenção precoce do tipo Follow-up com crianças cegas. De acordo com estudos realizados na área de intervenção precoce, que comparam crianças cegas1 com crianças videntes (que enxergam), a seqüência do desenvolvimento da criança cega é igual a da criança vidente, porém o ritmo é mais lento, no tocante à postura e a deslocamentos. Os reflexos são análogos, resguardando a função óculo manual da criança que enxerga e que, na criança que não vê, a ausência da visão irá interferir na construção do seu

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esquema corporal futuro: lateralidade, organização e estruturação espaciais, e na orientação e identificação dos objetos e pessoas (WARREN, 1984). Tais estudos reforçam ainda que a cegueira é fator de restrição ao processo de desenvolvimento como um todo, acarretando na área da locomoção a perda do equilíbrio, dos reflexos de proteção, da coordenação motora e do sentido de justeza dos passos (MILLER, 1979). Freedman e Cannady (1971) assinalam que a restrição ambiental incide mais no processo de orientação e mobilidade2 do que a perda da visão, assim como a síndrome da superproteção, afirmam Warren e Kocon (1974).Outros fatores que interferem no processo de desenvolvimento infantil da criança cega é o pouco contato da mãe com a criança (BURLINGHAM, 1967; FRAIBERG, SMITH e ADELSON,1965) e a ausência de estimulação vestibular3: mudanças de posição da criança ou balançá-la no colo, por exemplo (WARREN, 1984). Ferrel, Shaw e Deitz (1998) acrescentam que o tempo se encarrega de diminuir a diferença que existe entre as aquisições básicas de desenvolvimento da criança cega em relação à criança vidente, permitindo-nos a reflexão de que um programa de atendimento em intervenção precoce poderá minimizar ainda mais essa diferença (FARIAS, 1995).Com o objetivo de refletir sobre o desenvolvimento da criança cega até dois anos de idade e a atitude do educador a ser tomada frente ao programa de atendimento em intervenção precoce, o presente artigo foi redigido. O período de desenvolvimento intelectual a ser considerado nesta comunicação é o sensório-motor de Piaget (1975), que indica dois processos de aprendizagem que ocorrem na primeira infância: a) aprendizagem iniciada pela criança e b) aprendizagem facilitada pelo adulto (NUNES,1995; VYGOTSKY, 1989). Contudo, fazendo incursões no pensamento de Wallon (1976) da linguagem e o vínculo mãe-criança. ANÁLISE SOBRE O PERÍODO SENSÓRIO-MOTOR Com base nesses estudos e levando-se em consideração o período sensório-motor, isto é, do nascimento até dois anos de idade, a criança cega deve ser colocada em ambientes ricos em estímulos auditivos e táteis para que sua audição e mão aprendam a funcionar em conjunto, facilitando desse modo seu processo de locomoção: rolar, arrastar, quadrupedar, equilibrar, apoiar e andar. Com a audição e a mão funcionando em conjunto, ou seja, a manipulação dos objetos ajudará na construção da inteligência prática futura e na noção do objeto, bem como na aquisição da fala. Sobre esse assunto, Vygotsky (1989, p. 27-9) esclarece queantes de controlar o próprio comportamento, a criança começa a controlar o ambiente com a ajuda da fala. Isso produz novas relações com o ambiente, além de uma nova organização do próprio comportamento [...], fala e ação faz parte de uma mesma função psicológica complexa, dirigida para a solução do problema em questão [...], as crianças resolvem suas tarefas práticas com a ajuda da fala, assim como dos olhos e das mãos [...], usando como instrumento não somente os objetos à mão, mas procurando e preparando tais estímulos de forma a tornálos úteis para a solução da questão e para o planejamento de ações futuras. Em um ambiente rico em estímulos e graças ao movimento, a criança vai desenvolvendo atitude inteligente no mundo que a cerca: a manipulação de objetos e o relacionamento com as pessoas vão se estabelecendo de forma segura e autônoma. Em outras palavras, mediante experiências repetidas, a criança aprende a planejar sua atividade, requisita assistência de outra pessoa, controlando-a e tornandoa parte necessária de sua atividade prática, iniciando desse modo seu processo de aprendizagem. É nesse período, denominado sensório-motor, que a criança constrói gradativamente o conhecimento de si própria e do ambiente na e por meio da sua contínua interação com o ambiente físico e social, em um extremo processo de adaptação e progressiva conquista deste ambiente (NUNES, 1995). DESENVOLVIMENTO COGNITIVO De acordo com a teoria de Piaget (1975), é neste período que o desenvolvimento infantil, por meio da motricidade social, progredirá de simples reflexos para a representação e internalização do pensamento. Este período subdivide-se em seis estágios. 1-Reflexos (do nascimento até 1 mês). O comportamento infantil é caracterizado inicialmente por respostas reflexas do próprio corpo da criança e por alguns aspectos do ambiente externo. Alguns refinamentos da ação reflexa ocorrem com as descobertas infantis, por exemplo, alguns objetos são sugados, outros não. Segundo Freedman (1964), neste estágio, a criança pode sorrir em resposta à voz dos pais. Mostra controle geral dos movimentos dos braços e pernas. De um modo geral, o desenvolvimento da criança cega é semelhante ao da criança vidente neste estágio (WARREN, 1984). E, devido à imaturidade motora, a criança tem um período muito longo de dependência do adulto. Necessita de carinho, de atenção, de abrigo, de alimentação e higiene, esclarece Vygotsky (1989). 2-Reação Circular Primária (de 1 a 4 meses). A criança vidente começa a repetir ações que produzem efeitos no ambiente, que a satisfazem e que sejam interessantes para ela. Para Piaget (1975), neste estágio, a repetição das ações se dá somente pelo prazer e não são ainda controladas pelos efeitos no ambiente. Essas ações inicialmente são dirigidas mais para seu próprio corpo do que para os objetos a sua volta. Sendo a cegueira fator de restrição ao processo de desenvolvimento no seu campo de ação no tocante a gesto e rapidez, até o quarto mês a criança cega fará uso da mão e da boca de modo limitado e ao acaso para conhecimento do objeto. O contato corporal, o qual Wallon (1976) chama de diálogo tônico com a mãe e o brinquedo cantado (música), são processos interativos entre mãe e criança que irão fortalecer o desenvolvimento da linguagem futura, reforçando ainda o vínculo afetivo entre os dois. Desse modo, a integração das atitudes do outro na criança se faz mediante seu jogo tônico e, pela experiência vivida de seu corpo em movimento, a criança vem a estruturar as situações afetivas em esquemas tônico-emocionais específicos. A criança interioriza um aspecto de outra pessoa e se transforma em função desta, tendo assim seu processo de aprendizagem facilitado (WALLON,1976). 3-Reação Circular Secundária (de 4 a 8 meses). A criança vidente produz ações que causam efeitos no ambiente, que a satisfazem e são interessantes para ela. Este estágio marca o início da orientação eficaz no ambiente. Na criança cega pode haver atraso nos reflexos e um desenvolvimento motor mais lento. Inicia-se a exploração dos objetos sonoros em experiências auditivas e táteis: a voz da mãe, os passos e o colo. Por exemplo, a criança continua sorrindo em resposta à voz da mãe, mas pode haver uma aversão à voz de estranhos no oitavo mês (WARREN, 1984). Continua o uso da boca e das mãos. A criança começa a produzir sons silábicos, vocalizando e imitando seus mediadores. Isso mostra que a criança cega necessita da ação do outro e do objeto. Ou seja, a ação da criança sobre o seu corpo e sobre os objetos que a rodeiam é fundamental tanto para o desenvolvimento da motricidade e da percepção, quanto para o desenvolvimento das estruturas cognitivas e de linguagem. Nesse sentido, Vygotsky (1989) ressalta que, desde que nasce, a criança está em constante interação com os adultos, que não só asseguram sua sobrevivência, mas também mediam sua relação com o mundo.

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4-Reação Circular Secundária de Coordenação (de 8 a 12 meses). O início da intencionalidade é visto neste estágio, em que a criança vidente coordena suas ações em relação ao ambiente de diferentes modos. Usa de meios específicos para atingir fins específicos, demonstrando a organização do seu desenvolvimento no ambiente. A criança antecipa os efeitos de sua ação e os efeitos das ações de outras pessoas. Todavia, a criança cega precisa ser incentivada ao movimento e à procura do objeto sonoro no ambiente. O controle da cabeça e do tronco nas posições sentada e de pé será ajudado pelo arrastar, quadrupedar e posteriormente andar, seguindo a mesma seqüência do desenvolvimento da criança que enxerga, conforme frisado, porém um pouco mais tarde. Explorando os objetos com as mãos e os pés, será favorecida a coordenação preensãoaudição. O contato imediato com o objeto reforçará a noção do objeto e a compreensão das primeiras palavras. Por exemplo, a criança cega precisa saber que existe alguma coisa, em cuja direção é preciso se movimentar. A imitação e a imagem especular (do espelho), presente na criança que vê, será compensada pela ação do adulto (outro) e pelo contato. O influxo do meio ambiente e as atividades concretas de estimulação vão contribuir para a aquisição da linguagem e a consciência do seu próprio corpo. Observa-se que o sistema motor favorece as bases do desenvolvimento do pensamento lógico e a percepção influi na representação mental (SALTINI, 1994). Ou seja, é da percepção e ação da criança sobre o ambiente que se forma a representação mental da realidade. Assim, a criança cega só poderá pensar o que significa a palavra “bola”, por exemplo, depois que tiver tocado ou brincado com ela. Num segundo momento, estará preparada para falar e futuramente até escrever a palavra “bola” que representa a idéia “bola”. Caso ela não tenha oportunidade de usar os sentidos do tato, audição, gustação e olfato, para conhecer a realidade, terá dificuldade para representá-la simbolicamente. A questão é saber qual dos canais de percepção pode substituir a visão para que a criança identifique objetos e pessoas e adquira a estrutura espacial. É possível afirmar que, quando se bloqueia um canal de entrada existem outros canais que se desenvolvem. No caso da criança cega, esta desenvolve outras formas de comunicação, que servem para lhe dar outras percepções e outras dimensões. À medida que as informações vindas do ambiente, processadas pelo Sistema Nervoso Central, mais particularmente pelo córtex cerebral, mediante percepção tátil, auditiva, cinestésica, olfativa ou gustativa, são imediatamente checadas ou integradas com informações armazenadas, memorizadas em um esquema global, sem características visuais, porém táteis, auditivas e de outro tipo daquele objeto concreto com o mundo exterior, forma-se a “imagem” (esquema mental) de relação entre as coisas, entre as partes desse objeto concreto com o mundo externo (as suas qualidades) e os conceitos. No exemplo acima, ao manipular a bola, a “imagem” (esquema mental) inclui suas características essenciais: redonda, cheia etc., bem como suas relações sociais desenvolvidas frente àquele objeto, tais como brincar, chutar, pegar etc. Por isso, a criança cega não terá dificuldades para aprender se lhe for propiciado estimulação em tempo e de forma adequada, um ambiente rico em experiências onde ela possa trabalhar sensório-motoras integradas e significativas ajudarão a criança cega a se conhecer, explorar o mundo, elaborar e organizar o seu próprio conhecimento rumo à competência social. 5- Reação Circular Terciária (de 12 a 18 meses). Neste estágio, a criança que enxerga se envolve em atividades de tentativas e erros. Sua ação torna-se mais flexível e ela pode sistematicamente variá-la para obter objetivos específicos. Parece buscar novidades por querer aprender mais sobre o ambiente. A criança cega inicia suas próprias descobertas no ambiente, onde objetos e pessoas se fazem necessários, e a riqueza dos estímulos auditivos e táteis seja uma constante. Isto é, onde a criança possa em experiências repetidas conhecer os objetos, o ambiente e as pessoas. Que ela possa ainda aumentar seu repertório de palavras, sua autonomia frente à mãe, ao pai, a outras pessoas e objetos. A criança cega, segundo Bruno (1993), necessita de vivência corporal significativa para poder organizar sua ação no espaço. Este autor afirma quea construção da imagem corporal advém também da oportunidade de relacionar-se com crianças da sua idade, para poder perceber o próprio corpo em relação ao do outro, e construir desta forma a noção do eu e do outro (p.22). A construção de sua identidade se dá na interação e comunicação com o outro, mediante oportunidades de ação sobre o meio e de vivências sensoriais variadas e significativas. Assim, estará sendo construído também seu processo de linguagem e de pensamento. 6-Internalização do Pensamento (de 18 a 24 meses). Este estágio marca o início do pensamento internalizado na criança vidente. Ela necessita se empenhar, não por muito tempo, em atividades de ensaio e erro, para melhor pensar sobre possíveis efeitos que causam. De acordo com Piaget (1975), este estágio é um marco em que a criança liberta suas próprias percepções e ações. Ela começa a ser capaz de imaginar suas ações e conseqüências. Na criança cega, as experiências de andar, sentar, rodar, levantar e transportar, puxar, empurrar, chutar, saltar, correr, subir e descer escadas, atividades de apoio e sem apoio, que envolvem a sua motricidade, auxiliarão a aumentar sua confiança, habilidade, autonomia e independência. A coordenação dinâmica geral dessas atividades irá ao encontro da formação de seu esquema corporal futuro. Nesse sentido, os apelos do meio ambiente e a aprendizagem facilitada pelo adulto implicam em novas atribuições do educador precoce. Além de prover um ambiente rico em estímulos, favorecendo sempre que possível a exploração livre pela criança, caberá ao educador: (1) intensificar certas dimensões relevantes desses estímulos; (2) ensinar à criança um repertório de comportamentos adaptativos; e (3) estabelecer conseqüências adequadas para essas respostas do sujeito (NUNES,1995). O que se exige do educador, portanto, é que ele planeje sua atividade, garanta a segurança de um ambiente propício e use de uma metodologia adaptada à ausência da visão, ou seja, auditiva e tátil. Ilustrando, o desenvolvimento da preensão se dará por experiências de enfiar contas, grupar objetos pequenos, esconder e buscar objetos. Essas práticas de exploração vão ajudar a criança na formação de conceito (noção do objeto), e na ampliação de seu repertório de palavras no diálogo com a mãe, pai e parceiros. O desenvolvimento do esquema corporal futuro se dará por experiências do corpo em sensações cutâneas com o meio, tocando os objetos com a boca, arrastando-se e se expondo ao sol e ao vento etc., mediante percepções tátil e auditiva que vão ajudá-la a organizar seu espaço. Segundo Vygotsky (1989), o desenvolvimento da criança, num primeiro momento, é mediado pelo outro. Num segundo momento, a criança se apropria do comportamento, da cultura e dos modos de funcionamento psicológico do seu grupo cultural, internalizando-os. Isto é, sem a intervenção de outras pessoas a criança se apropria da aprendizagem. A atividade que antes precisou ser mediada passa a ser independente. Assim, o processo de desenvolvimento da criança está enraizado nas ligações entre a sua história social e individual. Ao internalizar as experiências fornecidas pela cultura, a criança reconstrói individualmente os modos de ação realizados externamente e aprende a organizar os próprios processos mentais.

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Em outras palavras, a criança, na interação com sua mãe e familiares, vai transformando esse meio familiar em função do atendimento às suas necessidades básicas, assim, transformando a si mesma. Quando ela modifica o ambiente físico e social por meio do seu cognição, linguagem e competência social. Desse modo podemos concluir que, para Vygotsky (1989), o desenvolvimento da criança acontece a partir das constantes interações com o meio social em que vive mediante aprendizagem. PROGRAMA DE ATENDIMENTO EM INTERVENÇÃO PRECOCE Os programas de intervenção precoce para crianças com necessidades educacionais especiais têm se mostrado efetivo (NUNES, 1995). Esses programas têm uma preocupação em detectar e diagnosticar o problema da criança de forma transdisciplinar4 . Os procedimentos do diagnóstico incluem: (a) a anamnese, na qual são avaliados os fatores de risco e os dados que constatam a presença de deficiências, realizada por meio da história familiar e dos antecedentes da própria criança; (b) os exames médicos, mediante os quais se procede a análise de anomalias maiores e menores que auxiliam a identificação precoce de quadros de deficiência; (c) a avaliação psicológica, em que se analisa o desenvolvimento da criança, sobretudo nas áreas de motricidade, linguagem, competência social e cognição; (d) e, para completar, a análise da estimulação do ambiente do qual procede a criança. Além disso, são incluídos, quando necessário, exames complementares, tais como os de laboratório, e os encaminhamentos a neuropediatras, oftalmologistas etc. Desse modo, o objetivo principal desses programas é o de impulsionar o desenvolvimento das habilidades básicas das crianças, quer sejam normais, de risco ou com distúrbios no desenvolvimento, em seus primeiros anos de vida, a fim de prevenir ou minorar os “déficits” instalados, ou que poderão se instalar, possibilitandolhes um processo evolutivo tão equilibrado quanto possível. Segundo Guralnick e Neville (1979), esses programas também promovem a competência social nas crianças. A competência social é um constructo que se integra aos domínios cognitivo, afetivo, motor e de comunicação, portanto, está relacionada às aquisições básicas da criança. Acrescentam eles que esses programas precisam ser imbuídos de entusiasmo, responsabilidade, persistência, sensibilidade e flexibilidade de quem os aplica (os mediadores). A mediação influencia outras relações da criança com outros mediadores, facilitando desse modo às aquisições sensório-motoras, refletindo ainda na autonomia e independência da criança. Reforçando este pensamento, Guralnick (1997) acrescenta que a freqüência e a qualidade dos contatos com diferentes adultos, a variedade de brinquedos e materiais disponíveis, o valor da estimulação em diversos ambientes e a segurança (vacinação, nutrição, amor etc.) oferecida pela família vão contribuir para o desenvolvimento da criança. Ou seja, a competência social torna a criança mais segura de suas ações e menos dependente da mãe, mais sociável e mais firme emocionalmente. Como frisado, a intervenção precoce tem esse propósito, cuja meta é prevenir ou minimizar problemas de desenvolvimento para criança de risco, decorrentes de fatores biológicos, ambientais ou socioculturais. Seu sucesso depende da integração de esforços, da eficiência de quem atende, da comunidade local e da família, em planejar e coordenar os serviços de forma sistêmica. Em outras palavras, seu sucesso depende da estrutura familiar, isto é, se a família tem moradia, plano de saúde, emprego, boa alimentação, da continuidade do trabalho em casa e da freqüência e regularidade no trabalho de intervenção precoce. Isso mostra, uma vez mais, a evidência e a necessidade de uma intervenção efetiva, iniciando-a nas primeiras idades do desenvolvimento infantil, juntamente com um programa adequado ao ambiente familiar e paralelo a um trabalho sistemático de saúde e nutrição. Mostra também a importância do envolvimento dos pais, para que auxiliem efetivamente no desenvolvimento de sua criança, além da orientação individual a eles encarregada em função das condições particulares da própria criança e da prática de atividades que devem realizar com a criança em casa. O “caderno de linguagem: caminhando juntos”, de Sampaio (2000), presta-se a esse serviço, permitindo acompanhar o desenvolvimento da criança, registrar as atividades e servir de intercâmbio entre diferentes profissionais, tais como neuropediatras, oftalmologistas etc. Como ela afirma: um veículo facilitador do processo de intervenção precoce. Desse modo, o “caderno de linguagem: caminhando juntos” descreve toda a história do processo de intervenção precoce na vida da criança, assim como da identidade de quem a escreve: mãe, pai, tia, avó etc. Ele delega e intermedia a passagem da fala oral para a escrita. Refiro-me às mães e/ou responsáveis que, não sabendo ler ou escrever, pedem a individual e o coletivo, aberto ao diálogo transdisciplinar, numa perspectiva de longa duração, na medida em que permite um confronto entre as práticas anteriores e posteriores, tornando-se uma prática de representação: representa o trabalho desenvolvido na intervenção precoce, por meio do discurso que a mãe descreve, cuja fonte é a criança. Portanto, ela sabe para quem escreve e como escreve (GÓMES, 2002). As palavras que usa não somente revelam o seu pensar, como também projetam o seu fazer. Resumindo, o “caderno de linguagem: caminhando juntos” testemunha e conta a história da intervenção precoce para as gerações futuras, cumprindo assim seu papel social. Realizada a avaliação diagnóstica de forma transdisciplinar, o educador elabora, juntamente com a equipe, da qual os pais devem fazer parte, o plano individual de ensino com os objetivos a serem alcançados nas diferentes áreas do desenvolvimento: motor, de linguagem, competência social e cognição, identificando potencialidades e atrasos no desenvolvimento, ou seja, aquilo que a criança é capaz de fazer independentemente (nível de desenvolvimento real) e aquilo que ela faz com ajuda (nível de desenvolvimento potencial). O espaço de atuação do educador de intervenção precoce se dá no intervalo entre o nível de desenvolvimento potencial e o real, a que Vygotsky (1989) denomina zona de desenvolvimento proximal. Por meio dela, podemos dar conta não só dos processos de maturação já completados, mas também dos processos em vias de desenvolvimento, demonstrando que aquilo que uma criança pode fazer com assistência hoje poderá fazer sozinha amanhã. Assim, na criança cega o seu nível de desenvolvimento real, isto é, o que ela consegue fazer sozinha é restringido pela ausência da visão, havendo a necessidade de se trabalhar mais o seu nível de desenvolvimento potencial pela ação do outro. A organização da aprendizagem pelo outro induz o desenvolvimento mental. Trata-se, pois, de apostar na capacidade da criança, propondo um tipo de trabalho que considere mais suas qualidades do que seus defeitos. Nesse sentido, a ação pedagógica deve ser norteada visando a promover o desenvolvimento das habilidades sensório-motoras da criança. Portanto, recomenda-se: (I) que o educador utilize o ensino real e potencial, isto é, que inicie pelo nível de desenvolvimento real para promover sucesso (motivação), iniciando o trabalho com atividades já conhecidas pela criança. Isso induz novas atividades, e, após, o nível potencial com ajuda, transformando o nível de desenvolvimento potencial em real; (II) que o ensino seja funcional, significa criar situações reais de intervenção, ou seja, é mais adequado ensinar à criança cega o conceito de bola quando ela estiver brincando no “play-ground” do

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que na sala de intervenção; (III) que a estimulação seja adequada e consistente, implica tornar a relação criança/adulto sintonizada com o interesse da criança, ambiente propício, duração do estímulo e observação das respostas; (IV) que se adaptem as atividades às condições da deficiência da criança, por exemplo, se o objetivo é favorecer o desenvolvimento da noção de permanência do objeto à criança cega, os estímulos visuais deverão ser substituídos por auditivos e táteis. No caso da bola, o educador deve balançar a bola com guizo perto da criança e permitir que ela a manuseie. Se a bola é retirada de suas mãos, ela demonstrará a aquisição da noção do objeto esticando a mão para pegá-la; (V) que se avalie e se registre o desempenho da criança. A avaliação contínua do comportamento da criança faz parte do processo de intervenção precoce. O registro de observação do desempenho da criança de forma sistemática, ao longo do processo e em diferentes situações, favorecerá a demonstração dos progressos e o aperfeiçoamento dos procedimentos do ensino. Assim, a avaliação do plano de ação do programa de atendimento em intervenção precoce que analisa os efeitos dessa intervenção sobre o desenvolvimento infantil, particularmente o período sensório-motor, demonstra que: (1) os efeitos positivos de um ambiente verbalmente estimulado sobre o desenvolvimento cognitivo dependem, essencialmente, dos padrões mais abstratos da linguagem utilizada no meio familiar e da forma de relacionamento do adulto com a criança; (2) as variáveis ambientais modificam o ritmo e a extensão do processo evolutivo infantil, acelerando-o ou retardando-o, mas não em sua totalidade, já que a sua evolução também depende do substrato biológico que a criança traz consigo. Deduz-se que o enriquecimento adequado de um ambiente precariamente estimulador, efetuado desde os primeiros tempos de vida, repercute favoravelmente no desenvolvimento infantil, compensando, assim, em grande parte, os efeitos negativos das variáveis ambientais inadequadas, (3) e, finalmente, que certas condições do meio circundante podem influir no desenvolvimento infantil, permitindo indicar as linhas básicas dos correspondentes programas de intervenção precoce (PÉREZ-RAMOS; PÉREZ-RAMOS, 1996). Portanto, é preciso tornar este ambiente materialmente sustentável, psicologicamente integrado e espiritualmente fecundo: caloroso para a criança e para a mãe. CONCLUSÃO Concluindo, o desenvolvimento da criança cega até dois anos de idade se dá pelo movimento. Não é à toa que Piaget chama esse período de sensório-motor. De acordo com Wallon, a inter-relação existente entre a intervenção precoce e a motricidade infantil, em que a linguagem, o símbolo e o movimento desempenham importantes papéis, além de apresentar a linguagem corporal como importante meio de comunicação tônico-afetiva, favorece a evolução das estruturas motoras de base, bem como das aprendizagens, que dependem da estrutura genética e ambiental (nutrição, cuidado, estimulação e ensino), que são fatores cruciais para o desenvolvimento (RAMEY; RAMEY S., 1998). Esses fatores afetam não só os padrões de interação mãe/criança em termos de melhoria na quantidade e qualidade, como também as áreas específicas do desenvolvimento da criança, tais como: linguagem e competência social. Assim, a qualidade da relação mãe/filho interfere na evolução da criança. A complementação alimentar produz benefícios não só sobre o crescimento físico, mas também sobre as áreas comportamentais relacionadas. O período sensório-motor, segundo Piaget, é reconhecido como determinante no desenvolvimento posterior, e, portanto, parece coerente afirmar que as intervenções efetuadas durante este período não só demonstram efeitos imediatos, mas também capacitam a criança à aprendizagem futura. Um ambiente saudável e os recursos que a comunidade pode prover vão contribuir também para o desenvolvimento da motricidade, da linguagem, da competência social e cognição, bem como da estrutura genética da criança. Para Vygotsky, o conhecimento é construído socialmente no âmbito das relações humanas. Ou seja, é pela aprendizagem nas relações com os outros que a criança vai construindo seu conhecimento que permite o desenvolvimento mental, afetivo e motor. Em outras palavras, a intervenção precoce adequada e consistente, a aprendizagem no meio familiar em rotinas diárias e a convivência social é que trarão a reboque o desenvolvimento da criança cega, amenizando as suas dificuldades, geradas pela ausência da visão. Nesse sentido, o programa de atendimento deve ir ao encontro das necessidades da família, ou seja, na colaboração entre profissionais e responsáveis pela criança e no saber ouvir os pais nas suas crenças, atitudes e valores, para orientá-los no processo de educação da criança.