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ISSN 1677-0668 ANO IX Nº 38 abril/junho de 2009 Revista de Conjuntura Publicação do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal A crise acabou? Especialistas afirmam que o cenário econômico ainda é de incerteza, mas há sinais de uma retomada gradual da economia 13 de agosto “Dia do Economista” José Luiz Pagnussat As medidas contracíclicas e os gastos de pessoal da União Carlos Eduardo de Freitas Desenvolvimentismo revisitado Luiz Fernando de Paula As repercussões da crise internacional sobre a economia brasileira: o que foi feito e o que fazer em termos de políticas econômicas contra-cíclicas? Fernando Ferrari Filho Apreciação cambial, crescimento de longo-prazo, controles de capitais e doença holandesa: análise e propostas para o caso brasileiro José Luis Oreiro

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As medidas contracíclicas e os gastos de pessoal da União Apreciação cambial, crescimento de longo-prazo, controles de capitais e doença holandesa: análise e propostas para o caso brasileiro As repercussões da crise internacional sobre a economia brasileira: o que foi feito e o que fazer em termos de políticas econômicas contra-cíclicas? 13 de agosto “Dia do Economista” ISSN 1677-0668 Luiz Fernando de Paula Fernando Ferrari Filho Carlos Eduardo de Freitas José Luiz Pagnussat

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ARTIGOS

ANO

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009

Revista deRevista deConjunturaPublicação do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal

A crise acabou?

Especialistas afi rmam que o cenário econômico ainda é de incerteza, mas há sinais de uma

retomada gradual da economia

13 de agosto “Dia do Economista”

José Luiz Pagnussat

As medidas contracíclicas e os gastos de pessoal

da União Carlos Eduardo de Freitas

Desenvolvimentismo revisitado

Luiz Fernando de Paula

As repercussões da crise internacional sobre a

economia brasileira: o que foi feito e o que fazer em termos

de políticas econômicas contra-cíclicas?

Fernando Ferrari Filho

Apreciação cambial, crescimento de longo-prazo,

controles de capitais e doença holandesa: análise

e propostas para o caso brasileiro

José Luis Oreiro

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Em 2010, Brasília completará 50 anos. Para homenagear a capital federal no seu cinqüentenário o CORECON/DF lançou três projetos:

• O banco de artigos, monografi as e teses sobre a economia do DF;• O fórum “Brasília 50 anos”; e• A coletânea “Brasília 50 anos”, a ser publicada em abril de 2010.

Para a coletânea de artigos sobre a economia do DF, o CORECON/DF selecionará trabalhos que abordem temas como: história econômica do DF; estrutura econômica; indústria e agricultura; constituição e desenvolvimento dos segmentos do setor serviços (públicos e privados); infraestrutura econômica; Brasília como pólo de desenvolvimento regional; expansão do entorno e das áreas de infl uência do DF; difi culdades e potencialidades da economia do DF; problemas e soluções para o transporte; ordenamento territorial; entre outros temas relacionados à economia do DF.

Os trabalhos poderão ser enviados até o dia 30 de novembro de 2009 para o e-mail: [email protected]

Todos os trabalhos recebidos estarão disponíveis na página do CORECON/DF, no “banco de artigos sobre a economia do DF”.

Os melhores trabalhos serão publicados na coletânea “Brasília 50 anos”. A seleção dos trabalhos será realizada por comissões temáticas formada por professores, considerando a qualidade técnica do trabalho e a adequação e contribuição para a temática abordada.

BRASÍLIA50ANOS

Conselho Regional de Economia da 11ª Região-DFSCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 202CEP 70300-907 - Brasília -DF Tels: (61) 3225-9242 / 3223-14293964-8366 / 3964-8368Fax: (61) 3964-8364E-mail: [email protected]: www.corecondf.org.br

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A assinatura da Revista de Conjuntura pode ser efetuada contactando o Corecon/DF. O valor da assinatura é de

R$ 80,00 anual, o que equivale a quatro edições da revista.

3 13 de agosto “Dia do Economista”

José Luiz Pagnussat

14 As medidas contracíclicas e os

gastos de pessoal da União

Carlos Eduardo de Freitas

26Desenvolvimentismo revisitado

Luiz Fernando de Paula

35As repercussões da crise

internacional sobre a economia brasileira: o que foi feito e o que

fazer em termos de políticas econômicas contracíclicas?

Fernando Ferrari Filho

39Apreciação cambial, crescimento

de longo prazo, controles de capitais e doença holandesa:

análise e propostas para o caso brasileiro

José Luis Oreiro

ArtigoS

2 editorial

22 capaA crise acabou?

ÍndicePublicação do Conselho Regional de

Economia do Distrito Federal

ANO IX • Nº 38 • abril/junho de 2009

ConjunturaRevista de

Nesta edição

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Editor responsávelJosé Luiz Pagnussat

Conselho editorialHumberto Vendelino RichterJosé Fernando Cosentino TavaresJosé Roberto Novaes de AlmeidaJúlio Flávio Gameiro MiragayaMário Sérgio Fernandez SallorenzoMaurício Barata de Paula Pinto

Jornalista responsávelDaniela Lima (Reg. DRT/DF: 4926)

RedaçãoDaniela Lima

Editoração eletrônicawww.arsventura.com.br

Tiragem: 4.000Periodicidade: trimestral

As matérias assinadas por colaboradores não refletem, necessariamente, a posição da entidade. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desta edição, desde que citada a fonte.

CONSELHO REGIONAL DE ECONOMIA DA 11ª REGIÃO - DF

PresidenteJosé Luiz Pagnussat

Vice-presidenteJusçanio Umbelino de Souza

Conselheiros efetivosMário Sérgio Fernandez SallorenzoRoberto Bocaccio PiscitelliMax Leno de AlmeidaMônica Beraldo Fabrício da SilvaMaurício Barata de Paula PintoHomero Gustavo Reginaldo LimaJosé Luiz PagnussatJusçanio Umbelino de SouzaHumberto Vendelino Richter

Conselheiros suplentesPaulo Luiz Figueiredo de OliveiraMiguel RendyAndre NunesGuilherme Costa DelgadoNewton Ferreira da Silva MarquesVictor José HohlÉrton Birk TeixeiraDiones Alves CerqueiraRonalde Silva Lins

Conselheiro Federal pelo DFJúlio Miragaya

Gerente ExecutivoIsmar Marques Teixeira

Equipe do CoreconAngeilton Francisco Lima Faleiro Iraci da Costa Lopes Jamildo Cezário Gomes Maria Aparecida Carneiro Michele Cantuária Soares

EstagiárioTyago Belarmino de Lira (ensino médio)

End.: SCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 202CEP 70300-907 – Brasília/DFTel: (61) 3225-9242 / 3223-14293964-8366 / 3964-8368Fax: (61) 3964-8364E-mail: [email protected]: www.corecondf.org.brHorário de funcionamento:das 8h às 18h (sem intervalo)

O dia 13 de agosto é o “DIA DO ECONOMISTA”, data comemorativa da regula-

mentação da profissão pela lei n° 1.411, de 13 de agosto de 1951. Nessa data foi

criada legalmente a profissão de economista no Brasil e definida as prerrogati-

vas inerentes ao desenvolvimento das nossas atividades profissionais, deveres

e direitos.

A lei 1.411, que foi regulamentada pelo Decreto - Federal n° 31.794 de 17 de

novembro de 1952, estabeleceu que a designação profissional de economista é

privativa dos bacharéis em Ciências Econômicas, registrados nos Conselhos de

Economia. Definiu, ainda, a organização das entidades fiscalizadoras da profissão:

o Conselho Federal de Economia – Cofecon e os Conselhos Regionais de Economia

– Corecons. Os Conselhos são autarquias federais especiais, dotadas de persona-

lidade jurídica de direito público, com autonomia administrativa e financeira e

constituem serviço público federal. Estão sujeitas, portanto, à todas as regras de

gestão definidas para o setor público, como concurso público, licitações etc.

O exercício da profissão de economista é restrito aos profissionais registrados

nos Corecons pelos quais é expedida a carteira profissional, que constitui prova de

identidade para todos os efeitos legais.

Cabe aos Corecons fiscalizar o exercício profissional do Economista no sentido

da defesa da sociedade, que tem o direito de receber serviços adequados e de

qualidade, frente aos profissionais que exercem atividades inerentes aos econo-

mistas. A preocupação do Conselho é com o exercício ilegal da profissão, decor-

rente, principalmente, da invasão de outros profissionais nas atividades privativas

dos economistas, e da adequação da qualificação profissional para a atividade

exercida. O Conselho fiscaliza, ainda, o atendimento ao “Código de Ética do

Economista”, que disciplina o exercício da profissão e define valores, princípios,

ideais e regras de conduta - obrigações ou proibições aplicáveis às várias situações

e problemas encontrados no exercício da profissão.

O nosso Código de Ética inclui entre as condutas que violam valores éticos: a

baixa qualidade técnica do trabalho, a violação de sigilo, não evitar situações de

conflito de interesses, parcialidade, enriquecimento ilícito etc. Para os economis-

tas que atuam no Setor Público, o Código de Ética prevê, ainda, como condutas

que violam valores éticos: o uso indevido do cargo público; o recebimento de

presente; uso de bens públicos em atividade privada; uso de servidores públicos

em atividade particular; abuso de autoridade; tráfico de influência; uso indevido

de informação privilegiada; prestação de assessoria a entidade privada; e atividade

paralela à do serviço público.

Neste sentido, convocamos todos os economistas para colaborarem com o

Conselho na fiscalização da nossa profissão. Vamos lutar juntos pela melhoria de

nossa categoria, pela superação das desigualdades econômico-sociais, pelo bem

comum e o desenvolvimento sustentável do Brasil.

O Corecon/DF, em comemoração ao dia 13 de agosto, durante a “Semana

do Economista”, programou vários eventos nas universidades e no “Espaço do

Economista”, para os quais estão convidados. Economistas participem do Conselho,

que é de todos nós, e parabéns pelo seu dia.

EditorialEditorialPublicação do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal

ConjunturaRevista de

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Artigo

O dia 13 de agosto foi consagrado como o “Dia do

Economista” em razão da data da promulgação da lei

nº 1.411, em 13 de agosto de 1951, que regulamen-

tou a profissão de economista no Brasil e estabeleceu

as normas de sua organização. Esta lei definiu que a

designação profissional de economista é privativa dos

bacharéis em Ciências Econômicas, diplomados no

Brasil. Reconheceu, ainda, os profissionais de notório

saber que atuavam como economistas na época, mas

não normatizou sobre a pós - graduação strictu sensu

(mestrado e doutorado).

Nos últimos anos houve várias tentativas frustradas

de aprovar o reconhecimento dos mestres e doutores

em economia como economistas. Vários projetos de lei

tramitaram no Congresso Nacional desde o final dos

anos 80 com esse objetivo, sem sucesso.

A lei nº 1.411, de autoria do deputado gaúcho

Fernando Ferrari, criou, juntamente com a regulamen-

tação da profissão, o Conselho Federal de Economia

(Cofecon) e os Conselhos Regionais de Economia

(Corecon), que são Autarquias Federais com a finali-

dade de fiscalizar o exercício da profissão. Para exercer

a profissão de economista os bacharéis deverão ser

registrados nos Conselhos Regionais de Economia –

Corecon, que fornece carteira de identidade profissional

com validade em todo o Território Nacional.

Este artigo analisa alguns marcos históricos da

origem da profissão de economista no Brasil, a estru-

tura atual dos cursos de economia, o símbolo do econo-

mista e o cenário atual do ensino e profissão.

Breve histórico

Vários autores relatam a história da profissão do

economista e do ensino de Economia no Brasil, com

destaque para os estudos do professor Nivalde José de

Castro da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Para

este autor (CASTRO, 1991) embora as origens do ensino

de economia datem do início do século XIX, sua consti-

tuição formal, com a criação do primeiro curso superior

só ocorreu na década de 30 do Século XX.

O embrião dos cursos de economia no Brasil está

nas cadeiras de economia criadas nos cursos de Direito

e Engenharia e, em especial, no ensino técnico comer-

cial. Estes cursos de comércio não formavam bacharéis,

eram essencialmente práticos e pretendiam formar

profissionais com conhecimentos de contabilidade,

direito mercantil e noções de economia política apli-

cada ao comércio e indústria. Os primeiros cursos

superiores de economia resultaram da evolução desses

cursos de comércio criados no século XIX.

A gestação do ensino comercial e de economia no

Brasil foi lançada no século XIX, com a vinda da Família

Real Portuguesa, em 1808. O marco inicial da evolução

do ensino de economia foi a instituição formal das

“Aulas de Comércio”. Mas o ensino de economia passou

a ser mais valorizado depois da chegada do Visconde

de Cairú (José da Silva Lisboa).

Em novembro de 1808 foi criada uma cadeira

de “Aula Pública de Ciências Econômicas” no Rio de

Janeiro (23/11/1808), atribuída ao Visconde de Cairú,

13 de agosto “Dia do Economista”

José Luiz Pagnussat

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considerado, por alguns historiadores, o primeiro

economista brasileiro, por ser o introdutor da economia

política e do liberalismo econômico no Brasil. Os estu-

dos do comércio tiveram seus passos iniciais na obra

de Visconde de Cairú. Em 1801, publicou, em Lisboa,

sua obra “Princípios de Direito Mercantil”, primeira obra

publicada em nossa língua, sobre economia política.

Em 1804, segundo Castro (1991), publicou sua obra

“Princípios de Economia Política”. Alguns historiadores

também lhe atribuem a autoria da idéia de abertura

dos portos brasileiros, em 1808. Consta que ele teria

participado do édito liberal de 28/1/1808 que abriu os

portos brasileiros às nações amigas.

A criação da referida cadeira, e de sua atribuição a

Cairú, foi a primeira manifestação concreta de ensino

de Economia no Brasil. Entretanto, ela não ocorreu, pois

ele não pôde aceitar tendo em vista sua promoção ao

emprego de deputado do Superior Tribunal da Junta

do Comércio, dedicando-se doravante às atividades

políticas e de historiador (CASTRO, 1991). Alguns auto-

res da área de contabilidade relatam que “Cairú jamais

lecionou uma aula sequer”.

Em 1809, foram criadas as Aulas de Comércio, inti-

tuladas “aulas práticas”, por meio da promulgação

do Alvará de 15 de julho, iniciando-se oficialmente

o ensino comercial no Brasil. Essas formas de ensino

foram usadas durante o Império e atendiam aos negó-

cios públicos e privados. Refletia à preocupação da

Coroa Portuguesa em modernizar esse setor da econo-

mia. Em Portugal, a Aula de Comércio, fundada por

iniciativa de Pombal, já havia produzido resultados,

formando jovens em assuntos mercantis, com conheci-

mento comercial, econômico e financeiro.

Há indicações de Aulas de Comércio e aulas de

Ciências Econômicas no Rio de Janeiro e na Província

do Maranhão, no início do século XIX. No caso do

Maranhão, os estudos não são conclusivos, mas consi-

deram que a partir de 1811 havia as condições de

realização das primeiras Aulas de Comércio, suspensas

pelo Governo Imperial na década de 1820 e retomadas

na década de 1830, com o Decreto sem número, de

2/08/1831, que restabeleceu a Aula de Comércio na,

então, cidade do Maranhão1.

A partir da década de 1830, o governo imperial, por

meio de decretos, aprovou, estabeleceu e modificou as

condições de oferta dessas Aulas.

Em 1846, ocorreu a inclusão de uma disciplina de

economia política nas Aulas de Comércio2. A reforma do

ensino comercial de 1856 incluiu na estrutura curricular

as disciplinas de direito mercantil, economia política com

aplicação ao comércio e à indústria e estatística comer-

cial3. O Decreto de 1856 instituiu o Instituto Comercial do

Rio de Janeiro precursor da Academia de Comércio4. Para

Castro (1999), esse decreto deve ser considerado como o

da criação do ensino superior de Comércio, culminando,

‘‘‘‘

Em 1809, foram criadas as Aulas de Comércio,

iniciando-se oficialmente o ensino comercial no Brasil.

Essas formas de ensino foram usadas durante o Império e atendiam aos negócios

públicos e privados. Refletia à preocupação da Coroa

Portuguesa em modernizar esse setor da economia.

1 Decreto s/nº de 2.08.1831. Estabelece uma aula de comércio na cidade do Maranhão.

2 Decreto nº. 456, de 6.07.1846. Manda executar o regulamento da aula do comércio da cidade do Rio de Janeiro.

3 Decreto nº. 769, de 9.08.1854. Autoriza o governo para reformar a aula do comércio desta Corte, e a elevar até a quantia de vinte mil réis a con-tribuição dos alunos.

4 Decreto nº. 1763, de 14.05.1856. Dá novos estatutos à aula do comércio da Côrte.

4

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mais tarde, com os primeiros diplomados em Ciência

Econômica. Em 1861, foi realizada a terceira reforma no

ensino comercial, ampliando-se no curso profissional o

leque de disciplinas relacionadas com Economia (mate-

mática; escrituração mercantil e legislação de fazenda;

geografia e estatística comercial; direito comercial e

economia política)5. Em 1880, o Decreto 7.679 estabele-

ceu que o ensino comercial deveria conter 25% das disci-

plinas totais em cada uma das áreas de Contabilidade,

Economia Política, Geografia Econômica (comércio exte-

rior) e Ciências Jurídicas (ênfase em Direito Comercial)6.

No século XIX, merece destaque ainda as discipli-

nas de economia que eram ministradas nos cursos de

Direito e Engenharia. Segundo Castro (1991), citando o

Decreto de 9/01/1825, a disciplina de economia política

era obrigatória nos cursos de Direito criados em São

Paulo e Olinda nos primeiros anos após a independência

do Brasil. A ementa indicava as obras de Smith, Malthus,

Ricardo, Sismondi e outros. Nos cursos de Engenharia,

constituídos formalmente em 1873, havia disciplinas

relacionadas com economia, voltadas fundamental-

mente à aspectos instrumentais, no campo das finanças

e organização industrial. Destas duas profissões surgi-

ram os primeiros economistas brasileiros.

Em 1905, foi promulgado o Decreto7 que reconhe-

cia como sendo oficiais os diplomados da Academia

de Comércio do Rio de Janeiro, fundada em 1902,

destinados a formação superior de comércio. Em 1923,

outro Decreto equipara os diplomas da Academia de

Ciências Comerciais de Alagoas e de outras instituições

aos da Academia Comercial do Rio de Janeiro8.

Somente em 1919 foi criada, sem respaldo oficial, a

primeira faculdade de economia no Brasil: a Faculdade

de Ciências Políticas e Econômicas do Rio de Janeiro.

Mas só em 1926, com o Decreto9 de maio de 1926

foi homologado o reconhecimento formal do título

de graduado em Ciências Econômicas e Comerciais.

Porém, o aluno formado não recebia o título de

Bacharel, reservado aos que concluíam os cursos de

Medicina, Engenharia e Direito.

A primeira norma que trata efetivamente do currí-

culo de formação do economista é o Decreto 20.158,

de 30/06/1931. Sob o título genérico de Administração

e Finanças é dominado por disciplinas de caráter jurí-

dico, financeiro, contábil e administrativo. É com esse

‘‘

‘‘

Somente em 1919 foi criada, sem respaldo oficial, a primeira

faculdade de economia no Brasil: a Faculdade de Ciências

Políticas e Econômicas do Rio de Janeiro. Mas só em

1926, foi homologado o reconhecimento formal

do título de graduado em Ciências Econômicas e

Comerciais. Porém, o aluno formado não recebia o título

de Bacharel, reservado aos que concluíam os cursos de

Medicina, Engenharia e Direito.

5 Decreto nº. 2741, de 9.02.1861. Dá nova organização ao Instituto Comercial do Rio de Janeiro.

6 Decreto nº. 7679, de 28.02.1880. Altera os estatutos do Instituto Comercial do Rio de Janeiro, que baixaram com o Decreto nº. 3058, de 11.03.1863.

7 Decreto nº. 1339, de 9/01/1905. Declara instituições de utilidade pública a Academia de Comércio do Rio de Janeiro, reconhece os diplomas por ela conferidos, como de caráter oficial; e dá outras providências.

8 Decreto nº. 4724A, de 23/08/1923. Equipara os diplomas da Academia de Ciências Comerciais de Alagoas e de outras instituições, aos da Acade-mia Comercial do Rio de Janeiro e dá outras providências.

9 Decreto nº. 17329, de 28/05/1926. Aprova, o regulamento para os estabelecimentos de ensino técnico comercial reconhecidos oficialmente pelo governo federal.

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currículo que se forma a primeira turma da Faculdade

de Ciências Econômicas de São Paulo. Dela, 22 bacha-

réis participam, em 1935, da assembléia de fundação

da Ordem dos Economistas do Brasil – OEB.

Esse decreto surge no bojo da reforma educa-

cional denominada Francisco Campos. Essa reforma

contou com uma série de decretos: o Decreto

nº. 19.850 de 11/04/1931 que criava o Conselho

Nacional de Educação (CNE); os Decretos nº. 19.851,

19.852, de 11/04/1931 que instituíram o Estatuto das

Universidades Brasileiras; o Decreto 19.852 que reorga-

nizou a Universidade do Rio de Janeiro; além do refe-

rido Decreto nº. 20.158 de 30/06/1931, que organizou o

ensino comercial nos níveis médio e superior.

A reforma Francisco Campos de 1931 previa, ainda,

que deveria ser criada faculdade de ciências políticas

e econômicas, como componente da nova universi-

dade. A Faculdade seria objeto de pressões, interesses

e motivações de vários tipos, levando finalmente à cria-

ção da Faculdade Nacional de Ciências Econômicas da

Universidade do Brasil, em 1945. A intenção de criação

da Faculdade de Economia estava prevista no Decreto

nº 19.852, de 11 de abril de 1931, que organizava a

Universidade do Rio de Janeiro. Em 1933 a Universidade

do Rio de Janeiro forma uma comissão composta por

Luís Betim Paes Leme, Cândido Mendes de Almeida e

Valdemar Falcão para elaborar o projeto de uma facul-

dade de ciências políticas e econômicas.

Na verdade a Faculdade Nacional de Política e

Economia chega a ser criada oficialmente em 1937,

pela lei nº 452 de 5 de julho de 1937, mas não é implan-

tada, para frustração dos já formados em cursos afins,

e principalmente, frustrando a idéia de elevar ao grau

universitário um curso único, em que se enquadrem as

especializações de economia, administração e finanças.

Finalmente, o Decreto-Lei nº 7.988, de 22 de setem-

bro de 1945, transforma a antiga Faculdade Nacional

de Política e Economia, criada em 1937, na Faculdade

Nacional de Ciências Econômicas, e extingue o curso

superior de Administração e Finanças e de Ciências

Atuariais. Esse decreto modificou totalmente o currí-

culo de 1931 e incorporou definitivamente a Ciência

Econômica ao sistema universitário brasileiro.

O novo currículo tomou por base a sugestão de um

novo projeto de curso superior de Ciências Econômicas

elaborado por uma comissão formada por Eugênio

Gudin, Maurice Byé e Otávio Gouveia de Bulhões, em

1941. Registra-se, ainda, que em agosto de 1944, após a

Conferência de Bretton Woods, Eugênio Gudin visita a

Faculdade de Economia da Universidade de Harvard, em

companhia de Otávio Gouveia de Bulhões, onde discute

o projeto da Faculdade de Economia do Rio de Janeiro

(SCHWARTZMAN, BOMENY e COSTA, 2000). O resultado

da visita, segundo esses autores, é relatado em carta ao

ministro da Educação10, enviada de Chicago: “Escrevi na

pedra o programa e o projeto de currículo que lhe reco-

mendamos, para submetê-lo à critica de todos e para

receber as sugestões dos mestres. Tenho a satisfação de

comunicar-lhe que depois de fazerem várias perguntas

e de pedirem esclarecimentos, todos os professores de

Harvard acharam o programa excelente, dizendo que

nada havia a modificar.” Existia, no entanto, uma objeção:

“Perguntamos-lhes também sobre a conveniência ou

‘‘

‘‘

O Decreto-Lei, de 1945, transforma a antiga Faculdade

Nacional de Política e Economia, criada em 1937, na Faculdade Nacional de

Ciências Econômicas, e extingue o curso superior de Administração e Finanças e de Ciências Atuariais. Esse

decreto modificou totalmente o currículo de 1931 e

incorporou definitivamente a Ciência Econômica ao sistema

universitário brasileiro.

10 Schwartzman, Bomeny e Costa (2000) registra a Carta de Eugênio Gudin a Capanema, 21 de agosto de 1944. GC 38.09.17, doc. 22, série g.

6

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não de separar, as duas faculdades, a de economia e a de

administração. Eles nos levaram à janela para mostrar-

nos, do outro lado do rio, a faculdade de administração,

admiravelmente instalada, e nos recomendaram que se

não tivéssemos um rio, abríssemos um canal (...) para

separar as duas faculdades.” O resto da carta é dedicado

às possibilidades de participação de professores ameri-

canos na faculdade de economia, que pareciam promis-

soras para os anos de pós-guerra.

Apesar do currículo de 1931 ser geralmente consi-

derado o primeiro currículo mínimo de economia,

seria mais adequado considerar o currículo de 1945. O

currículo de 1931 era tomado, em sua maior parte por

matérias ou disciplinas de caráter jurídico, financeiro,

contábil e administrativo, havendo uma disciplina de

“Economia Política”, outra de “Geografia Econômica”

e uma de “História Econômica e “Fontes da Riqueza

Nacional” entre o total de dezessete. O currículo de

1945 ainda caracterizava-se por um elevado peso das

áreas jurídicas, de administração e de contabilidade,

mas, observa-se, entretanto, que esse currículo tinha

um grande número de disciplinas econômicas, que

são ainda hoje obrigatórias no ensino de economia,

embora com nomes distintos.

O fato é que o ensino de economia ainda não tinha

se desvinculado integralmente de suas origens, nem

das profissões afins de contador e administrador. Era

comum haver uma predominância de técnicos comer-

ciais de ensino médio entre os alunos das primeiras

turmas do curso de economia. Por outro lado, a origem

de parte considerável dos professores era de bacharéis

em direito e engenheiros.

A partir de 1962 se concretiza a separação entre

economia, contabilidade e atuária, mediante parece-

res e resoluções específicas do Conselho Federal de

Educação, já na vigência da Lei de Diretrizes e Bases.

Foram criados os três cursos, disciplinados pelo Parecer

397/62, e quatro anos depois surge o Curso Técnico em

Administração, com o Parecer 307/66.

Entre as características relevantes do currículo

mínimo de 1962 está a separação de um ciclo básico e

um ciclo de formação profissional, e a divisão entre as

matérias caracteristicamente econômicas e as acessó-

rias. A duração do curso foi fixada em quatro anos e a

carga horária mínima foi regulamentada em 1965 pelo

Ministério da Educação (Portaria nº 159/65).

Esse currículo mínimo vigorou até 1984, quando

surge o Parecer 375/84 e a Resolução 11/84, do

Conselho Federal de Educação, que aprova um novo

currículo mínimo de economia, que consolida os deba-

tes do conjunto da comunidade acadêmica brasileira

sobre as características que deveria ter o curso de

economia no Brasil.

As Novas Diretrizes Curriculares de Economia

mantêm a estrutura básica, os princípios e diretrizes

da Resolução 11/84 e do Parecer 375/84 do professor

Armando Dias Mendes11, então relator do Currículo de

Economia do CFE.

‘‘

‘‘Apesar do currículo de 1931

ser geralmente considerado o primeiro currículo mínimo de

economia, seria mais adequado considerar o currículo de 1945. Caracterizado por

um elevado peso das áreas jurídicas, de administração e de contabilidade, mas, observa-se, entretanto, que esse currículo tinha um grande número de disciplinas econômicas, que

são ainda hoje obrigatórias no ensino de economia, embora

com nomes distintos.

11 Autor do Parecer nº 375/84, que deu origem à Resolução 11/84 do Conselho Federal de Economia, definindo o Currículo Mínimo de Economia vigente no País a partir de 1985.

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Novas Diretrizes Curriculares de Economia

A estrutura atual dos cursos de economia foi defi-

nida pelas Novas Diretrizes Curriculares de Economia

aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE)

pela Resolução nº 4/2007, de 13 de julho de 2007. Essa

Resolução institui as Diretrizes Curriculares Nacionais

do Curso de Graduação em Ciências Econômicas,

bacharelado, a serem observadas pelas Instituições

de Educação Superior em sua organização curricular.

Outra Resolução do CNE (Resolução nº 2/2007) definiu

a carga horária mínima de 3.000 horas aula e a duração

de quatro anos como limite mínimo para integraliza-

ção do currículo.

Com a aprovação das Novas Diretrizes Curriculares

de Economia chegou ao fim um dos capítulos de uma

novela que já se arrastava no CNE por cerca de dez

anos. Nesse período houve uma queda de braço entre

os membros do CNE e as entidades representativas da

comunidade dos economistas (Conselhos Federal e

Regionais de Economia – Cofecon e Corecon -; ANGE

- Associação dos Cursos de Graduação em Economia;

Fenecon – Federação Nacional dos Economistas;

e ANPEC – Associação Nacional dos Cursos de

Pós-graduação em Economia). As entidades defendiam

a proposta de Diretrizes Curriculares sistematizada

pela Comissão de Especialistas em Economia nomeada

pela Secretaria de Ensino Superior do MEC (SESU/MEC).

Enquanto, sucessivos pareceres do CNE propunham

alterações na proposta da Comissão, com a elimina-

ção da monografia como componente curricular obri-

gatória e a redução da duração do curso para menos

de quatro anos. Prevaleceu a proposta da Comissão e

a manutenção dos princípios e diretrizes que orienta-

ram o currículo de 1984, com os ajustes acordados nos

eventos das entidades e no sentido de atender a LDB

- Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (lei nº.

9.394 de dezembro de 1996).

As Novas Diretrizes propiciaram a flexibilização do

currículo, reservando parte da carga horária (50%) para

o currículo mínimo, que garante a formação do perfil

profissional comum do economista, que caracteriza

o “economista nacional”, referendando os conteúdos

curriculares estabelecidos na Resolução 11/84; e reser-

vando 50% da carga horária para o perfil específico, de

livre escolha da IES. Com isso cada curso de economia

pode ter um perfil específico, de forma a atender as

peculiaridades regionais e a vocação e interesse dos

corpos docentes e discentes de cada IES.

As novas diretrizes estabeleceram como princí-

pios, que deverão nortear os projetos pedagógicos

dos cursos de economia: estar comprometido com o

estudo da realidade brasileira, sem prejuízo de uma

sólida formação teórica, histórica e instrumental; carac-

terizar-se pelo pluralismo metodológico, em coerência

com o caráter plural das ciências econômicas formadas

por correntes de pensamento e paradigmas diversos;

enfatizar as inter-relações dos fenômenos econômicos

com o todo social em que se insere; e ênfase na forma-

ção de atitudes, do senso ético para o exercício profis-

sional e para a responsabilidade social, indispensável

ao exercício futuro da profissão.

A estrutura curricular dos cursos de graduação

em Ciências Econômicas deverá contemplar, em seus

projetos pedagógicos e em sua organização curricular:

‘‘

‘‘

As Novas Diretrizes propiciaram a flexibilização

do currículo, reservando parte da carga horária (50%)

para o currículo mínimo, que garante a formação do

perfil profissional comum do economista, que caracteriza

o “economista nacional”, referendando os conteúdos curriculares estabelecidos

na Resolução 11/84; e reservando 50% da carga

horária para o perfil específico, de livre escolha da IES.

8

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9

abril / junho / 2009

I - Conteúdos de Formação Geral, que têm por

objetivo introduzir o aluno ao conhecimento da ciên-

cia econômica e de outras ciências sociais, abran-

gendo também aspectos da filosofia e da ética (geral

e profissional), da sociologia, da ciência política e dos

estudos básicos e propedêuticos da administração, do

direito, da contabilidade, da matemática e da estatística

econômica;

II - Conteúdos de Formação Teórico-Quantitativa,

que se direcionam à formação profissional propria-

mente dita, englobando tópicos de estudos mais avan-

çados da matemática, da estatística, da econometria, da

contabilidade social, da macroeconomia, da microeco-

nomia, da economia internacional, da economia polí-

tica, da economia do setor público, da economia mone-

tária e do desenvolvimento socioeconômico;

III - Conteúdos de Formação Histórica, que possibili-

tem ao aluno construir uma base cultural indispensável

à expressão de um posicionamento reflexivo, crítico e

comparativo, englobando a história do pensamento

econômico, a história econômica geral, a formação

econômica do Brasil e a economia brasileira contem-

porânea; e

IV - Conteúdos Teórico-Práticos, abordando ques-

tões práticas necessárias à preparação do graduando,

compatíveis com o perfil desejado do formando,

incluindo atividades complementares, Monografia,

técnicas de pesquisa em economia e, se for o caso, está-

gio curricular supervisionado.

Estes conteúdos deverão ter assegurado, no mínimo,

o percentual de 50% da carga horária total do curso, a

ser distribuído: para a Formação Geral (10%), Formação

Teórico-Quantitativa (20%), Formação Histórica (10%)

e Trabalho de Curso e as atividades acadêmicas de

formação em Metodologia e Técnicas da Pesquisa em

Economia (10%).

Pelas novas Diretrizes Curriculares o curso de gradu-

ação em Ciências Econômicas deve ensejar, como perfil

desejado do formando, capacitação e aptidão para

compreender as questões científicas, técnicas, sociais

e políticas relacionadas com a economia, revelando

assimilação e domínio de novas informações, flexibi-

lidade intelectual e adaptabilidade, bem como sólida

consciên cia social indispensável ao enfrentamento

de situações e transformações político-econômicas e

sociais, contextualizadas, na sociedade brasileira e no

conjunto das funções econômicas mundiais.

O Bacharel em Ciências Econômicas deve apre-

sentar um perfil centrado em sólida formação geral e

com domínio técnico dos estudos relacionados com a

formação teórico-quantitativa e teórico-prática, pecu-

liares ao curso, além da visão histórica do pensamento

econômico aplicado à realidade brasileira e ao contexto

mundial, exigidos os seguintes pressupostos:

I - uma base cultural ampla, que possibilite o enten-

dimento das questões econômicas no seu contexto

histórico-social;

II - capacidade de tomada de decisões e de resolu-

ção de problemas numa realidade diversificada e em

constante transformação;

III - capacidade analítica, visão crítica e competência

para adquirir novos conhecimentos; e

IV - domínio das habilidades relativas à efetiva

comunicação e expressão oral e escrita.

‘‘

‘‘

Pelas novas Diretrizes Curriculares o curso de graduação em Ciências

Econômicas deve ensejar, como perfil desejado do formando, capacitação e

aptidão para compreender as questões científicas, técnicas,

sociais e políticas relacionadas com a economia, revelando

assimilação e domínio de novas informações,

flexibilidade intelectual e adaptabilidade, bem como

sólida consciência social.

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a

Em síntese, os projetos pedagógicos dos cursos de

economia podem definir um perfil específico que carac-

teriza e diferencia o seu curso, mas devem, também,

garantir base técnico-científica comum que garante a

identidade do economista brasileiro (perfil comum).

Em síntese, o economista brasileiro atende o perfil

indicado por John Maynard Keynes.

Ele (o economista) deve ser matemático, historiador,

estadista, filósofo (...) deve entender os símbolos e falar

com palavras. Deve contemplar o particular nos termos

do genérico, e tocar o abstrato e o concreto na mesma

revoada do pensamento, Deve estudar o presente à luz

do passado com objetivos futuros. Nenhuma parte da

natureza humana ou das suas instituições deve ficar

completamente fora do alcance da sua visão. Ele deve

ser decidido e desinteressado com a mesma disposição;

tão distante e incorruptível quanto um artista, e ainda

assim algumas vezes tão perto da terra quanto um polí-

tico. (John Maynard Keynes, in: Essays in biography)12.

O símbolo do economista

O símbolo do economista é composto por dois

conjuntos: o primeiro conjunto possui dois elementos - a

folha de acanto, símbolo universal de perfeição artística e

índice de inteireza de carater e perfeição moral, e o globo

que representa o universo, o mundo; o segundo possui

também dois elementos - a cornucópia (palavra de

origem latina, que se refere ao corno mitológico, atributo

da abundância e símbolo da agricultura e do comércio),

que representa a fortuna, riqueza e economia (no sentido

de pecúlio), e a roda dentada simbolizando a indústria,

estágio mais adiantado da civilização contemporânea.

O primeiro conjunto como unidade (folha de

acanto mais globo) significa a ciência universal; o

segundo (cornucópia mais roda dentada), a indús-

tria como geradora de riquezas e economia dos

povos, em outras palavras, a abundância decorrente

do trabalho em escala industrial. A união dos dois

12 Citado por Armando Dias Mendes em texto apresentado ao IV Encontro de Economistas de Língua Portuguesa - EELP (2 a 4 de outubro de 2001), realizado em Évora, Portugal.

10

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11

abril / junho / 2009

conjuntos representa, é claro, a Ciência Econômica.

Cada um dos símbolos estão comentados nas pági-

nas dos Conselhos, Sindicados e Cursos de Economia. A

única controvérsia ocorre em relação à folha de acanto,

pois o Conselho Regional de Economia de São Paulo

indica a folha de louro e não de acanto, destacando

que a folha de louro é “a mais nobre das folhas vegetais,

simboliza valor, custódia e boa forma”.

Na verdade, a maioria das entidades e escolas indica a

folha de acanto e não de louro. Tanto o Conselho Federal

de Economia como a Federação Nacional dos Economistas

apresentam em suas páginas a folha de acanto.

Sem entrar na controvérsia, tanto a folha de louro

como a de acanto tem simbolismo histórico muito rico.

Alguns autores comentam que o loureiro era a árvore

consagrada à Apolo - Deus grego da profecia, poesia e

cura. As sacerdotisas transmitiam suas profecias após,

entre outros rituais, comer uma folha de louro. Na anti-

guidade greco-romana era símbolo de glória, com as

coroas feitas das folhas de louro. Ainda hoje as coroas

confeccionadas com ramos de louro são o símbolo da

vitória e são utilizados em diversas atividades espor-

tivas, inclusive para os atletas dos jogos olímpicos.

Muitos mitos se formaram em torno do louro no mundo

antigo dos romanos e gregos, que não é possível aqui

relatar. Registra-se ainda que no início do Cristianismo,

os mortos eram cobertos de louro em suas sepulturas

para simbolizar a vida eterna, porque a planta perma-

nece sempre verde. Em relação à educação consta que

o louro, companheiro da glória e do sucesso, símbolo

da poesia, é amigo das letras. A palavra “bacharelato”

vem do latim bacca laureus, o “formando coberto de

louros”.

A folha de acanto foi destacada na página do

Cofecon com os seguintes dizeres: “Posto que acoimada

de ser planta exótica, lembra, entretanto, uma época de

notável fulgor histórico - a arte helênica. A beleza de

seu limbo conferiu-lhe o poder da imortalidade, através

do censo estético de Calimico.”

Na história, folha de Acanto foi intensamente

utilizada na construção de templos e monumentos

sacros, passou com o tempo, a ser associada às virtu-

des de pureza e honestidade. Mas, para os economis-

tas, a origem da simbologia da folha de Acanto está na

História da Intendência Militar. É o símbolo do Serviço

de Intendência.

Consta que na Guerra de Tróia, assim como os

Assírios, Caldeus, Medos e Persas utilizaram a folha

de Acanto, porque secavam com facilidade com uma

tonalidade ligeiramente amarela-dourada, pendu-

rando-as nas entradas das barracas, de oficiais de alta

patente, com honras de magistrados, aos quais estava

incumbida a guarda e a gestão dos fundos destinados

aos pagamentos dos soldados e das demais despesas

“in-loco”, decorrentes da campanha militar. Assim, em

situações emergenciais, eram facilmente localizados

dentro de seus acampamentos.

Consta da História da Intendência Militar que foram

justamente os magistrados das finanças militares das

tropas de Agamenon, lendário rei de Micenas e herói

das pugnas troianas (relato de Homero na Ilíada) que,

pela primeira vez, elegeram a folha de Acanto para seu

símbolo distintivo, não como adorno de uniforme, mas

como meio prático de se fazerem localizar, com facili-

dade, dentro dos acampamentos.

Consta, ainda, que esse simbolismo permaneceu nas

legiões guerreiras de Roma. Os magistrados nomea dos

para cuidar das finanças militares autenticavam docu-

mentos com um sinete que tinha as características da

folha do Acanto.

Esse distintivo do intendente militar que nasceu a

cerca de cinco milênios, no entrevero das batalhas, é o

mesmo distintivo dos Intendentes das Forças Armadas

do Brasil e elemento do símbolo do economista.

O Globo completa o primeiro conjunto do símbolo

do economista, representa a economia mundial. A

administração universal. A Ciência da Administração,

abrangendo a todo o mundo – a Ciência Universal.

Não há controvérsia, alguns conselhos, sindicatos e

universidades colocam que é o símbolo representativo

do “Universo, o Mundo”.

Louro ou acanto

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A Cornucópia é o símbolo da “fortuna, riqueza,

economia, fartura, abundância” (Cofecon). “Ícone mito-

lógico, atributo de abundância, fortuna e símbolo da

agricultura e do comércio” (Corecon/SP). Esta imagem,

no formato de uma corneta, ou amplificador, é apre-

sentada no ombro de Artemisa, deusa da fartura na

mitologia grega. Na entrada principal do Museu do

Prado, em Madrid, Espanha, há uma estátua dessa

deusa, em tamanho natural, junto com todas as demais

divindades da Grécia antiga. Na mitologia era um vaso

em forma de chifre, com frutas e flores que dele saíam

em abundância frutas e flores. Conta a lenda que é

o chifre da Cabra Amaltéia que Zeus (Júpiter) deu

às ninfas que dele cuidaram quando criança. Tinha

a virtude de se encher com tudo que o possuidor

desejasse. Era atributo da deusa da Ambundância,

divindade alegórica representada como uma bela

mulher coroada de flores, tendo na destra um corno

repleto de flores e frutos. Hoje, simboliza a agricultura

e o comércio. No símbolo do economista no lugar da

frutas e flores que saem da Cornucópia é a moeda, o

ouro, melhor representativo da abundância e riqueza.

A roda dentada representa “a Indústria, estágio mais

adiantado da civilização contemporânea” (Cofecon). É o

“símbolo do labor e da fortuna. Indústria (terra, capital e

trabalho)” (Corecon/SP).

O significado do segundo conjunto do símbolo do

economista (Cornucópia mais roda dentada) repre-

senta a indústria como geradora da riqueza para a

economia dos povos. A abundância decorrente do

trabalho industrial. O processo indefinido da máquina

como processo civilizador e propulsor do progresso.

Considerações finais

Para finalizar, cabe ainda registrar alguns pontos

que estão na agenda de preocupações e discussões

das entidades da categoria e cursos de economia.

No campo da profissão de economista o fato que se

destaca é a proposta de atualização da legislação,

com a ampliação e reconhecimento de novos campos

de atuação dos economistas; a questão do reconhe-

cimento dos “tecnólogos” em economia; das profis-

sões afins, como Relações Internacionais e Ciência

Política, que estão em processo de incorporação

pelos Conselhos de Economia, passando a compor

uma grande área de economia, fiscalizada e normati-

zada pelo sistema Cofecon/Corecons. Nesse mesmo

debate estão os mestres e doutores em economia, que

hoje não são reconhecidos como economistas pelos

Conselhos, mas que em muitos casos são consagrados

como “grandes economistas”.

O cenário atual da profissão de economista é de

estabilização do número de economistas e de cursos

de economia, enquanto que os cursos afins se mantêm

em elevado crescimento.

A questão da redução da demanda pelos cursos é

outra preocupação das entidades. O número de cursos

de economia apresentou, nos últimos anos, redução

substancial, com o fechamento, inclusive, de cursos

tradicionais, em razão da redução da demanda. Este é

um fenômeno mundial.

Cornucópía

Roda dentada

Globo

12

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13

abril / junho / 2009

Um sinal positivo, entretanto, é a proliferação de

cursos de pós-graduação strictu sensu em economia

(mestrado e doutorado). Em Brasília existem dez

cursos de pós-graduação contra apenas três em nível

de graduação, em pleno funcionamento. Talvez este-

jamos passando por uma nova evolução do curso

de economia, como ocorreu no passado, em que o

curso evoluiu do nível técnico para a graduação e o

bacharelato. O novo economista seria pós-graduado.

Na verdade, pesquisa realizada pelo Cofecon entre

os economistas registrados constatou que a grande

maioria dos profissionais já possui pós-graduação

latu sensu, e que uma boa parcela possui mestrado

ou doutorado.

Outro sinal positivo tem sido os bons resultados

dos cursos que fizeram os ajustes do seu currículo e

diferenciaram os seus cursos com perfis específicos. Por

exemplo, certamente em Brasília há espaço para um

curso de Economia da Regulação, em nível de gradua-

ção, dada a grande demanda por esses profissionais

com as agências de regulação. Ou ainda um curso de

Economia do Setor Público, Economia Ambiental etc,

além dos cursos ecléticos já existentes.

Quanto ao desempenho profissional, os econo-

mistas têm se destacado com o melhor desempenho

nos concursos públicos, obtendo elevados índices

de aprovação. Tem o melhor índice de permanência

no emprego e estão entre os melhores remunerados,

segundo dados de pesquisa do Cofecon.

Outro destaque é o prestígio desses profissio-

nais junto à sociedade. Os economistas no Brasil, e

no mundo, estão entre os profissionais que recebem

maior espaço na mídia. Toda a sociedade, desde o mais

humilde ao mais abastado, quer saber o que pensam

os economistas.

Bibliografia consultada

CASTRO, Nivalde José de. O processo de profissiona-

lização do economista no Brasil. Texto de Debate nº

15. Rio de Janeiro: UFRJ/FEA, 1991.

CASTRO, Nivalde José de. O economista: a história da

profissão no Brasil. Rio de Janeiro: Cofecon; Corecon/

RJ e Corecon/SP, 2001. 120p.

LOUREIRO, Maria Rita. Os economistas no governo.

Gestão econômica e democracia. Rio de Janeiro,

Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1997. 201 páginas.

MENDES, Armando Dias. Currículo Mínimo de

Economia. Cadernos ANGE de Orientação Acadêmica,

Nº 1, 1993.

SCHWARTZMAN, Simon; BOMENY, Helena Maria

Bousquet; e COSTA, Vanda Maria Ribeiro. Tempos de

Capanema, 1ª edição: Editora da Universidade de São

Paulo e Editora Paz e Terra, 1984 - 2ª edição, Fundação

Getúio Vargas e Editora Paz e Terra, 2000.

José Luiz Pagnussat

Presidente do Corecon/DF e ex-presidente do Conselho Federal de Economia (1996) e da Associação Nacional dos Cursos de Gradu-

ação de Economia (1999-2001). Foi professor da Universidade Católica de Brasília de 1985 a 2004 e é professor da Escola Nacional

de Administração Pública – ENAP, desde 1988.

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A Medida Provisória 431, de 14.05.08, convertida na

lei 11.784, de 22.09.08, instituiu um amplo reajuste sala-

rial no serviço público da União, abrangendo grande

número de carreiras. O impacto caixa no Tesouro se

deu em novembro de 2008, correspondente à folha de

competência outubro.

A mídia, setores da academia e lideranças empre-

sariais reagiram com veemência contra aquela reestru-

turação, alegando que ela representava um aumento

permanente de gasto com risco de comprometimento

do equilíbrio fiscal num horizonte de dois a três anos.

Além disso, as críticas têm associado os gastos de

pessoal aos gastos correntes, considerados secundários,

quando a prioridade deveria ser dada às despesas de

investimentos.

Nessa linha de raciocínio, censuram também o

governo por suas políticas anticíclicas que, em vez de

privilegiarem um ciclo de novos investimentos públicos

– despesas reversíveis – teriam enfatizado gastos corren-

tes que são perenes.

Esta preocupação com os gastos do governo de

maneira geral, e de salários, em particular, é de todo

pertinente. O Estado não tem competidores; por conse-

guinte, precisa de limites institucionais e da vigilância da

sociedade sobre suas despesas.

Os pacotes anticíclicos

Nada obstante às críticas. As medidas anticícli-

cas do governo constaram basicamente de reduções

temporárias de impostos, alongamento do período de

concessão do seguro desemprego, dilação de prazos

para recolhimentos de tributos, disponibilização de R$

100 bilhões para novos financiamentos do BNDES, redu-

ções de recolhimentos compulsórios dos bancos, cria-

ção de fundos de avais, autorização para que o Fundo

Garantidor de Créditos (FGC) refinanciasse emprésti-

mos de bancos médios e pequenos e de um ambicioso

programa na área da construção civil com recursos

privados e públicos, envolvendo o FGTS e subsídios

do próprio Tesouro Nacional. Todas essas são medidas

reversíveis, e, mais do que isso, com ênfase na formação

de capital fixo da economia.

Com exceção o reajuste de 12% do salário mínimo,

antecipado em 2009 para fevereiro (em 2008 entrou em

vigor no mês de março). O percentual de 12% foi mais do

dobro da variação do IPCA nos 11 meses de março/2008

a fevereiro/2009, que ficou em 5,4%. A variação do PIB

em 2008 atingiu 5,1%, porém no último trimestre o

PIB caiu 3,6% em relação ao 3º trimestre, e caiu outra

vez no 1º trimestre de 2009. Ou seja, o reajuste onerou

empresas, prefeituras etc, num ano recessivo. Além

disso, o aumento do desemprego desfalcou as receitas

da Previdência, e o aumento do salário mínimo de 12%

aumentou os gastos previdenciários.

O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento)

que agrupa os investimentos governamentais priori-

tários continuou sua marcha, enfrentando as vicissitu-

des inerentes aos problemas ambientais, às restrições

decorrentes de reclamações de etnias indígenas e aos

As medidas contracíclicas e os gastos de pessoal da União

Carlos Eduardo de Freitas

Artigo

14

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abril / junho / 2009

vais-vens das questões licitatórias, ademais das exigên-

cias do Tribunal de Contas da União (TCU).

Os pontos acima fazem parte da agenda nova do

Brasil, pós-abertura democrática, Constituição de 88,

nova Lei de Licitações1, sem falar da conscientização

mundial em torno da problemática do clima. Não se

trata de culpar essa nova moldura, à qual os projetos de

investimentos governamentais têm que se adaptar, pela

lentidão com que vêem se desenvolvendo.

O volume dos investimentos públicos caiu após a

crise da dívida externa de 1982 e só começaram a ser

retomados com mais ênfase depois do Projeto Piloto de

Investimentos (PPI) do governo federal de 2004. Além do

mais o arcabouço institucional que tocava os projetos

foi totalmente reformado – a Rede Ferroviária Federal, a

Portobrás, o DNER e o GEIPOT foram extintos. Criou-se

o DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de

Transportes), a Secretaria Especial de Portos e as agên-

cias reguladoras. Vieram as Parcerias Público-Privadas,

generalizaram-se as concessões de rodovias, privatiza-

ram-se ferrovias e portos. Em resumo, mudou o modelo.

Não que o modelo novo seja pior que o antigo.

Possivelmente será até melhor. O problema é que tudo

isso leva tempo para entrar em fase e ganhar veloci-

dade de cruzeiro. Ainda mais na presença das novida-

des listadas acima, que não faziam parte da experiência

até então acumulada pelas equipes técnicas envolvidas

com os projetos de investimentos públicos.

A proposta de um conjunto de investimentos novos

do governo como medida anticíclica embute, portanto,

complicações e parece de certa forma, ingênua. Não

é coisa trivial como procuram dar a entender as críti-

cas, quer da mídia, quer da academia ou das lideran-

ças empresarias. Investimentos do governo requerem

estudos de viabilidade técnico-econômica, tanto mais

complexos na medida em que se refiram à infraestru-

tura. Demandam processos licitatórios demorados e

trabalhosos. Em suma, até que pudessem ter início, os

seus eventuais objetivos anticíclicos estariam superados.

O governo vem ajustando o foco na problemática do

investimento público desde o PPI em 2004, com o obje-

tivo de recuperar a eficiência e a velocidade de execução

dos projetos, adaptando-os às exigências do Brasil do

século XXI. Entretanto, os resultados ainda são modes-

tos. O governo não consegue empenhar, liquidar e pagar

os valores consignados no orçamento de investimen-

tos ano após ano, mesmo no quinto exercício fiscal de

esforço concentrado, em que a própria Casa Civil passou

a coordenar esse processo. Por conseguinte, seria de fato

inócuo tentar acrescentar projetos ao PAC. Melhor e mais

realista será manter a ênfase no Programa, e estimular os

investimentos privados, como atestam os recursos dire-

cionados ao BNDES, ao programa “Minha Casa Minha

Vida”, e as reduções temporárias de carga tributária sobre

veículos automotores e outros bens duráveis e de capi-

tal, material de construção etc. Deve - se lembrar ainda

que em providência acertada e que, aliás, se justificava

‘‘

‘‘

A proposta de um conjunto de investimentos novos

do governo como medida anticíclica embute, portanto,

complicações e parece de certa forma, ingênua. Não é coisa trivial como procuram

dar a entender as críticas, quer da mídia, quer da

academia ou das lideranças empresarias. Investimentos do

governo requerem estudos de viabilidade técnico-econômica, tanto mais

complexos na medida em que se refiram à infraestrutura.

1 Lei 8.666 e seguintes da primeira metade da década de 90.

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de há muito, o governo excluiu a Petrobrás da apuração

das necessidades de financiamento do setor público,

liberando-a da camisa de força das metas de superávit

primário para organizar seu programa de investimentos

conforme a sua própria capacidade econômico-finan-

ceira enquanto empresa.

Gastos correntes versus investimentos

Em segundo lugar, gastos correntes não são secun-

dários em relação às despesas de investimento. Na cate-

goria de investimentos estão os dispêndios relativos

ao capital físico, basicamente infraestrutura econômica

– rodovias, ferrovias, portos, aeroportos etc. – e bens de

capital em geral – prédios, instalações, veículos, aerona-

ves, embarcações etc. Os gastos correntes compreen-

dem as demais despesas do governo, como os inves-

timentos no capital humano da nação – educação e

saúde – as despesas com polícia, forças armadas, justiça,

preservação do meio ambiente, administração tributária,

gestão da moeda e do crédito, relações internacionais,

política comercial, e assim por diante.

Também se costuma englobar nos gastos correntes

os pagamentos de transferência, como os programas

de seguridade a cargo do Ministério da Previdência

Social e os assistenciais a cargo do Ministério do

Desenvolvimento Social e Combate à Fome. São assim

denominados porque transferem renda diretamente

de determinados segmentos da população para outros.

Trata-se de subsídios que poderiam ser entendidos

como uma espécie de Imposto de Renda negativo. Ao

contrário de outras áreas – saúde e educação, por exem-

plo – onde o consumo das pessoas, ou, neste caso, o

investimento das pessoas em seu capital humano se

materializa por intermédio de despesas correntes do

governo. Elas, as pessoas, como regra geral não recebem

recursos dos cofres públicos, mas usam gratuitamente

serviços de escolas, universidades, médicos, ambulató-

rios e hospitais públicos.

Todas as despesas alinhavadas acima são divulgadas

sob a rubrica de consumo do governo, ou gastos corren-

tes. São secundários? Dispensáveis? Porque o investi-

mento no capital humano teria hierarquia inferior ao

investimento no capital físico? Ambos são fundamentais

para a expansão da capacidade produtiva e da eficiência

da economia. Eles se completam – um precisa do outro

para produzir seus efeitos.

Porque as despesas para melhorar a qualidade dos

serviços de polícia ou para aumentar a eficácia e eficiên-

cia do Judiciário seriam de segunda categoria? Inclusive

com aumento dos contingentes. Ou a gestão da moeda

e do crédito e da supervisão do sistema financeiro, ou a

diplomacia? Em suma, a hierarquização do gasto fiscal

não obedece à dicotomia simplista “investimentos”

versus “gastos correntes”. As prioridades precisam ser

discutidas com uma visão de conjunto das despesas

públicas. Atividades classificadas como despesas corren-

tes disputam as prioridades em igualdade de condições

com gastos classificados como investimentos.

E tem mais: os investimentos na ampliação do capi-

tal físico puxam fluxos novos de despesas correntes.

Por exemplo, a construção de um prédio para funcio-

namento de um hospital público vai exigir aumento do

número de médicos, enfermeiros, auxiliares, serviços de

‘‘

‘‘

Na categoria investimentos estão os dispêndios relativos ao capital físico, basicamente infraestrutura econômica e bens de capital. Os gastos

correntes compreendem as despesas do governo, como os investimentos no capital

humano da nação – educação e saúde – as despesas com

polícia, forças armadas, justiça, preservação do meio ambiente, administração tributária, gestão

da moeda e do crédito, relações internacionais,

política comercial.

16

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abril / junho / 2009

limpeza, faxina, vigilância, administração, aquisição de

medicamentos, e assim por diante, tudo isso classificado

como despesa de custeio. O mesmo ocorre com um

novo prédio para uma escola e assim por diante.

O gasto corrente tem realmente caráter perene.

Mas, excetuando-se o reajuste do salário mínimo (muito

elevado), o governo não contemplou, até onde foi possí-

vel verificar, gastos correntes de caráter perene em seu

pacote anticíclico.

A relevância dos gastos com pessoal

As críticas também associam os aumentos dos gastos

com pessoal a uma expansão de gastos correntes. Isso é

verdade, embora os investimentos públicos exijam um

razoável aparato de funcionários nas áreas setoriais do

governo, além do planejamento e controle financeiro.

As obras em si são contratadas com terceiros, mas o

governo tem que planejá-las, licitá-las, acompanhá-las e

fiscalizá-las.

O setor público é antes de tudo um provedor de

serviços, e como tal, grande empregador. Assim, são

equivocadas as críticas que apontam os gastos com

pessoal como puro e simples desperdício de dinheiro.

Os salários são pagamentos pelos serviços de profes-

sores, de médicos nos hospitais públicos, de delegados

de polícia, juízes, procuradores de justiça, mas também

de enfermeiros, auxiliares, funcionários administrativos

das universidades e escolas, engenheiros, economistas,

gestores, diplomatas etc. Todos prestando serviços à

população.

Então como discutir o gasto fiscal? Como analisá-lo

ou criticá-lo? O governo é o primeiro a dificultar essa

discussão dada a forma como divide as despesas: investi-

mentos, custeio e pessoal. O problema é que assim colo-

cada a questão, parece que o gasto com pessoal seria

uma despesa em si. Não é. Despende-se com pessoal

em polícia, em justiça, em defesa do meio ambiente, em

saúde, em educação, em acompanhamento e fiscaliza-

ção das obras de infraestrutura e assim por diante.

A classificação da despesa pública por função facilita-

ria a análise crítica da gestão governamental. Poder-se-ia

saber, por exemplo, quanto e como o governo gastou

recursos públicos em infraestrutura rodoviária, com

implantações de rodovias, adequações, manutenções,

e administração; dentro disso, quanto pagou de servi-

ços de terceiros, de pessoal e de material de consumo:

quanto investiu em edificações, equipamentos para

fiscalização e policiamento das rodovias; e, dentro da

preocupação com salários dos servidores, qual o custo

do pessoal ligado diretamente às obras; do pessoal

administrativo no DNIT e ANTT; dos integrantes da

Polícia Rodoviária Federal e assim por diante. O debate

ficaria mais claro e objetivo.

A discussão da eficiência

Assim, é explicado que:

O pacote anticíclico do governo não trouxe despesas

perenes, com a exceção do aumento do salário mínimo,

já comentado;

O chamado gasto corrente não tem hierarquia

econômica inferior aos gastos classificados como

investimentos;

‘‘

‘‘

Então como discutir o gasto fiscal? Como analisá-lo ou criticá-lo? O governo é o primeiro a dificultar essa discussão dada a forma

como divide as despesas: investimentos, custeio e

pessoal. O problema é que assim colocada a questão, parece que o gasto com

pessoal seria uma despesa em si. Não é. Despende-se com

pessoal em polícia, em justiça, em defesa do meio ambiente, em saúde, em educação, etc.

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a

A eleição das prioridades públicas deve ser condu-

zida em torno do conjunto de todas as despesas consi-

deradas próprias de Estado, independente de sua classi-

ficação contábil;

O governo, ao não divulgar uma abertura mais

completa da despesa fiscal por funções dificulta análises

criteriosas e abre espaço para críticas muitas vezes equi-

vocadas e que confundem a opinião pública;

Pagamento de salários de servidores públicos não é

sinônimo de desperdício de recursos; o governo é essen-

cialmente um mega provedor de serviços, e, como tal,

grande empregador de mão-de-obra, com destaque da

mão-de-obra de maior qualificação.

Passemos à substância, ao que efetivamente

estaria por trás da indignação das lideranças empre-

sariais, de alguns segmentos da academia e da

mídia. Trata-se da reestruturação salarial do final de

2008, cuja coincidência perversa com o momento

mais agudo da crise econômica norte-americana e

mundial, gerou dois efeitos:

A impressão de que o reajuste salarial dos servidores

poderia ser parte do pacote anticíclico;

O contraste de servidores, estáveis em seus empre-

gos, recebendo aumentos salariais enquanto o desem-

prego grassava no setor privado, atingindo inclusive

pessoal de elevada qualificação.

A reestruturação salarial não tinha nada a ver com

a crise e com as providências do governo para atenuar

seus efeitos sobre o Brasil. Vinha sendo negociada ante-

riormente, decidida e aprovada no Congresso Nacional

e colocada em prática ainda sob a égide das perspec-

tivas de desenvolvimento econômico que fluíam do

clima de prosperidade mundial que vinha do início da

década, isto é, num contexto exatamente oposto ao

da crise. Entretanto, militava no sentido contracíclico, e

como o governo não cogitou de reprogramar as parce-

las do reajuste ainda devidas, estabeleceu-se, não sem

motivo, a confusão.

O governo poderia ter negociado com os servido-

res uma revisão das datas de pagamento das parcelas

subseqüentes do reajuste, evitando ampliar o fosso

entre as situações dos funcionários públicos e dos

empregados do setor privado. Se quisesse compensar,

do ponto de vista da crise, poderia ampliar o alcance das

medidas anticíclicas de desoneração tributária e aumen-

tar ainda mais o período de concessão do benefício do

seguro-desemprego.

Uma atitude nessa linha teria apoio da opinião

pública e talvez evitasse a discussão desnecessária sobre

gastos correntes e de investimento, sobre a natureza do

gasto com pessoal e da não sustentabilidade fiscal em

horizontes de dois a três anos.

Mas, em resumo, o debate fiscal se situa em três

esferas:

a) A primeira questão diz respeito ao tamanho do

Estado; que funções lhe devem ser atribuídas;

b) A segunda esfera de discussão refere-se à eleição

de prioridades; acordado certo tamanho do Estado, quais

deveriam ser os focos primários e quais os secundários?

c) A terceira consiste no debate sobre eficiência, ou

seja, conhecido o tamanho do Estado desejado pela socie-

dade, e eleitas as prioridades, como alcançar os objetivos

das ações de governo da forma mais econômica possível.

‘‘

‘‘

O governo poderia ter negociado com os servidores

uma revisão das datas de pagamento das parcelas

subseqüentes do reajuste, evitando ampliar o fosso

entre as situações dos funcionários públicos e dos

empregados do setor privado. Se quisesse compensar,

do ponto de vista da crise, poderia ampliar o alcance

das medidas anticíclicas de desoneração tributária e

aumentar ainda mais o período de concessão do benefício do

seguro-desemprego.

18

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abril / junho / 2009

Embora as críticas venham mesclando as três esfe-

ras de discussão, o foco estaria no item “c”. Percebem-se

nos mesmos críticos preferências por um Estado

menor, embora o tamanho que o Estado brasileiro

atingiu decorra fundamentalmente de decisões da

Constituinte de 1988 no âmbito da seguridade social.

Dessa forma, as censuras ao governo são no sentido

de que ele não estaria a liderar a continuidade do

programa de reformas, cujo objetivo é justamente

reverter a Constituição de 19882 neste capítulo. No

tocante às prioridades parece que os críticos preferi-

riam investimentos no capital físico a investimentos no

capital humano. Fora disso não são claros. Apregoam

a necessidade de substituir despesas correntes por

investimentos em capital físico, sem indicar quais os

chamados gastos correntes que deveriam ceder lugar

para os investimentos.

Conclusões

Mas o reajuste dos servidores federais foi correto

ou incorreto? Era necessário para manter ou elevar a

qualidade dos serviços públicos? Obedeceu aos princí-

pios de estímulo ao trabalho, à dedicação funcional, ao

aperfeiçoamento técnico?

Não se colocou ainda no Brasil uma discussão aberta

sobre os critérios mais adequados para nortear a fixa-

ção dos salários do serviço público. Em tese, deveriam

obedecer, os vencimentos dos servidores, a um princí-

pio de compatibilidade com o setor privado. Não signi-

ficaria que devessem ser iguais. Mas sim observar uma

equivalência, levando em conta características específi-

cas de cada setor. Na esfera privada os bônus de desem-

penho são comuns, porém parecem mais complicados

no setor público3. Já os funcionários públicos gozam de

estabilidade no emprego, o que não se aplica ao setor

privado. O estatuto da estabilidade deveria ser avaliado

em termos financeiros e parametrizado para que se

fosse estabelecendo a compatibilidade objetivada.

Mas o reajuste foi razoável? Justificavam-se à luz

da evolução dos rendimentos dos servidores públicos

federais nos últimos anos?

É claro que a resposta a essa pergunta só pode

ser dada mediante análise da reestruturação sala-

rial, carreira por carreira. Porém, uma verificação com

base em grandes números, sem pretensões à exatidão,

poderia dar algumas pistas.

Foi o que se fez. Observou-se que entre 20014 e 2008

o crescimento real dos proventos médios dos servidores

‘‘‘‘

Não se colocou ainda no Brasil uma discussão aberta

sobre os critérios mais adequados para nortear

a fixação dos salários do serviço público. Em

tese, deveriam obedecer, os vencimentos dos

servidores, a um princípio de compatibilidade com

o setor privado. Não significaria que devessem

ser iguais. Mas sim observar uma equivalência, levando

em conta características específicas de cada setor.

2 Na verdade a pregação pelas reformas vai além da Constituição de 88. Por exemplo, um dos objetivos seria reverter a própria legislação trabalhista.

3 Há algumas tentativas de replicar esta prática no governo, como um projeto de lei que transita na Câmara dos Deputados de instituir uma grati-ficação de desempenho para os funcionários do DNIT como prêmio por um aumento da velocidade de execução dos projetos de investimento na infraestrutura de transportes. Há outras experiências mais antigas, cujo grau de sucesso conviria pesquisar.

4 A análise a partir de 2001 justifica-se porque só estavam imediatamente disponíveis para os rendimentos dos empregados do setor privado dados a partir de 2001 no site do Banco Central, utilizado como fonte.

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públicos federais ativos, isto é, excluindo aposentados e

pensionistas, cresceu à razão de 2,01% a.a. Se incluídos

os aposentados e pensionistas a taxa de crescimento

de 2001 a 2008 dos rendimentos médios dos servidores

públicos e seus pensionistas seria de 2,26% a.a.

Números do setor privado indicam que a evolução

do rendimento médio do setor privado pode ter sido

semelhante. O rendimento real médio anual das pessoas

ocupadas do setor privado cresceu a uma taxa de 2,04%

a.a. entre 20015 e 2008, portanto ligeiramente acima da

remuneração média dos servidores públicos ativos.

Os grandes números sugerem, portanto, que

os rendimentos médios evoluíram de forma muito

próxima, embora com uma pequena vantagem para

o setor privado. Haveria razão para um reajuste tão

elevado e abrangente como o que foi definido pela

Medida Provisória 431 de 14.05.08? Pelos dados globais,

em princípio, não. Entretanto, situações específicas de

determinadas carreiras poderiam justificar algumas

reestruturações nos planos de cargos e salários. Essa

discussão, entretanto, exige o detalhamento da reforma

administrativa e a análise individualizada das diferentes

situações das diversas carreiras, inclusive com a indis-

pensável compatibilização com as remunerações vigen-

tes no setor privado.

Finalmente, do ponto de vista macroeconômico é

relevante estimar-se o impacto do reajuste salarial sobre

as despesas do governo federal. Ressalve-se que os

cálculos foram elaborados com base nos dados dispo-

níveis publicamente e em valores globais, de modo que

podem não ser totalmente precisos.

O item 128 da Exposição de Motivos da Medida

Provisória 431 informa os impactos financeiros do

reajuste salarial dos servidores públicos distribuídos

pelos cinco anos em que foram divididos os aumentos,

como segue:

2008 – R$ 3.533.227.727,00

2009 – R$ 11.027.002.965,00

2010 – R$ 15.338.852.113,00

2011 – R$ 18.948.898.538,00

2012 – R$ 19.608.034.109,00

Embora a redação desse item 128 seja confusa,

entende-se que os valores são cumulativos e os impac-

tos líquidos a cada ano corresponderiam ao montante

acumulado até o ano, subtraído do montante corres-

pondente ao acumulado até o ano anterior.

Foi isso o que fizemos, de modo que os efeitos líqui-

dos de cada exercício que se somariam aos acumulados

dos anos anteriores seriam os seguintes:

2008 – R$ 3.533 milhões

2009 – R$ 7.494 milhões

2010 – R$ 4.312 milhões

2011 – R$ 3.610 milhões

2012 – R$ 659 milhões

Supôs-se ainda que o valor de 2008 tivesse tido efeito

caixa em dois meses (novembro e dezembro), ou seja,

R$ 1.766,5 milhões em cada mês. De 2009 em diante

esse valor estaria refletido nos doze meses do ano, ao

qual se somariam os impactos correspondentes ao ano.

Admitiu-se que nos exercícios de 2009 a 2012 os reajustes

salariais ocorreriam no segundo semestre, isto é, de julho

a dezembro. O impacto mensal foi então calculado pela

divisão do impacto líquido do exercício divido por seis.

Assim, por exemplo, as folhas de novembro e dezem-

bro de 2008 teriam sido aumentadas, cada uma, por R$

1.766,5 milhões (os excessos em relação a esse valor

poderiam ser entendidos como pagamentos de atra-

sados). As de janeiro a junho de 2009 estariam afeta-

das pelo mesmo valor, isto é, somou-se aos valores dos

mesmos meses de 2008, R$ 1.766,5 a cada um deles. A

partir de julho e até dezembro adicionou-se o impacto

do ano, R$ 7.494 milhões.

Procedendo-se dessa forma sucessivamente, estima-

ram-se os valores básicos das folhas de salários de cada

ano. Acrescentou-se a cada ano um adicional de 1,34%

correspondente à taxa média de crescimento observada

do número total de funcionários ativos, de aposentados

e de instituidores de pensões entre 1998 e 2008.

O resultado final foi a projeção das despesas com

pessoal da União no quadriênio 2009/2012, conforme o

Quadro I.

5 Para 2001 o rendimento médio anual correspondeu à média dos últimos quatro meses do ano. A série histórica retrocede apenas até se-tembro de 2001.

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abril / junho / 2009

A projeção do PIB considerou as previsões para 2009

e 2010 do Boletim Focus (Banco Central) de 17/07/09,

respectivamente, -0,3% e 3,63%. Para 2011 e 2012 assu-

miu-se a taxa de crescimento de 3,24% a.a. correspon-

dente à taxa de crescimento potencial do PIB derivada

do comportamento observado de 1998 a 20086.

O Quadro I mostra o crescimento das despesas com

pessoal que passa da média de 4,79% do PIB entre 1998

e 2007 para 5% em 2008, já sob a influência do reajuste

salarial, mas também sentido a queda do PIB no último

trimestre. Para o quadriênio 2009/2012 a média da

participação da folha de salários da União atinge novo

patamar – 5,57% – representando um crescimento

equivalente a 0,76% do PIB com os gastos com pessoal

em comparação com o período 1998/2008, cuja média

alcançou 4,81% do PIB.

Ainda que se supusesse um crescimento do PIB mais

robusto, de 4,5% nos exercícios de 2011 e 2012, a média

da folha em relação ao PIB seria de 5,52% no período

2009/2012, com crescimento da despesa correspon-

dente de 0,71% do PIB comparativamente aos 4,81%

dos onze anos de 1998 a 2008.

Sem dúvida, o governo federal deve uma explicação

mais detalhada sobre o reajuste salarial de 2008.

Carlos Eduardo de Freitas

Economista formado pela Universidade Federal do Rio de janeiro (UFRJ), com mestrado em Economia pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). É consultor de Assuntos Econômicos em Brasília, prestando serviços à Secretaria do Tesouro Nacional (STN) na área de análise

econômico-fiscal de investimentos governamentais. Além disso, elabora estudos e pareceres econômicos para clientes privados

e participa do Grupo de Conjuntura do Corecon/DF. Ocupou a Presidência do Conselho de Curadores da Centrus – Fundação

Banco Central de Previdência Privada. Foi coordenador do Núcleo de Brasília da Escola de Pós Graduação em Economia da Fundação

Getúlio Vargas (EPGE/FGV), voltado para cursos de especialização e aperfeiçoamento. De 2003 a 2005 foi membro do Conselho de

Administração da Companhia Siderúrgica Belgo Mineira. Entre os anos de 1990 e 1991, foi economista do Banco Central do Brasil e

também assessor especial da ministra da Economia. Nesta mesma época, participou ativamente do processo de renegociação da dívida

externa brasileira, em particular, junto aos bancos privados e FMI.

6 Para o detalhamento da metodologia utilizada nessa estimativa ver Carlos Eduardo de Freitas, “Brasil 2007 – Ciclo de crescimento ou bolha?”, Revista de Conjuntura - Corecon/DF, Ano VII, nº 31, julho/setembro de 2007, pp. 37 e seguintes.

Quadro I

PIB R$ milhões Preços

correntes

Despesas c/pessoal

União Total Geral Preços

Correntes

Participação Desp c/

pessoal/PIB

R$ milhões R$ milhões %

Col .(1) Col. (2) Col .(3)=(2)/(1)

1998 979.276 47.955 4,90%

1999 1.065.000 49.181 4,62%

2000 1.179.482 57.969 4,91%

2001 1.302.136 66.679 5,12%

2002 1.477.822 74.582 5,05%

2003 1.699.948 78.972 4,65%

2004 1.941.498 89.421 4,61%

2005 2.147.239 94.066 4,38%

2006 2.369.797 115.010 4,85%

2007 2.597.611 125.569 4,83%

2008 2.889.719 144.485 5,00%

2009 3.010.697 173.888 5,78%

2010 3.260.384 186.628 5,72%

2011 3.517.492 194.656 5,53%

2012 3.794.874 198.982 5,24%

Fonte: site do Banco Central e estimativas do autor.

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A CRISE ACABOU

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A crise mundial se instalou em setembro de 2008

com a brusca contração na oferta de crédito inter-

bancário e a desvalorização do patrimônio financeiro

nos países mais desenvolvidos. Caiu junto o consumo

privado. Sem consumidores e sem crédito, o inves-

timento retraiu-se. Os países em desenvolvimento

foram contagiados de imediato via baixa das cotações

das commodities, escassez de financiamento externo

(em parte por aversão ao risco), e redução do fluxo do

comércio internacional: segundo a mais recente esti-

mativa do FMI, o comércio mundial deve cair 11% em

2009, para aumentar discretamente em 2010.

Baseados em dados da economia, alguns analistas

do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal

(Corecon/DF) acreditam na recuperação da economia

brasileira, mas alertam que o cenário ainda é de incer-

tezas. José Fernando Cosentino, economista e consul-

tor de Orçamento da Câmara dos Deputados mostra

alguns índices e analisa as perspectivas futuras. De

acordo com ele e segundo dados do Fundo Monetário

Internacional (FMI), o produto mundial vai cair 1,3%

em 2009, mas crescerá em 1,9% em 2010. As econo-

mias mais ricas vão encolher 3,8% em 2009, e ter cres-

cimento nulo em 2010. Já as economias emergentes

e em desenvolvimento crescerão em 2009 1,6%, e 4%

em 2010. A Ásia, em particular, deverá crescer 4,8% em

2009, e 6,1% em 2010. Baseado nestas informações, o

economista acredita que a saída, portanto, está à vista.

Na opinião do grupo de conjuntura econômica do

Corecon/DF, no qual faz análises periódicas dos temas

atuais, a recuperação da economia brasileira acontece

devido a resultados, como por exemplo, o desempenho

do PIB, que no primeiro trimestre de 2009, caiu apenas

0,8% na margem, abaixo das projeções do mercado

(entre -0,9% e -3,0%). Quando comparado ao primeiro

trimestre de 2008, a queda do PIB é de 1,8%, o que

por Daniela Lima

Especialistas afirmam que o cenário econômico ainda é de incerteza, mas há sinais de uma retomada gradual da economia.

22

Page 25: 38-revista

?A CRISE ACABOU

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abril / junho / 2009

coloca a economia brasileira entre as com melhores

respostas à crise em nível mundial.

Outra observação feita pelo grupo de conjuntura

foi a reativação do consumo das famílias, que teve cres-

cimento de 0,7% neste primeiro trimestre de 2009. No

último trimestre de 2008 o consumo das famílias teve

uma queda de 1,8%, após 21 trimestres seguidos de

crescimento.

Para a retomada do crescimento econômico de

forma sustentada é preciso analisar o comportamento

do Consumo e do Investimento, que segundo os econo-

mistas é um fator determinante. Na opinião do grupo

de conjuntura, o mercado interno é que terá que viabi-

lizar a expansão da demanda/inversões para susten-

tar o crescimento da economia. Do lado da oferta, os

dados da produção industrial mostram que a indústria

volta a crescer, mas de forma lenta.

Observa-se ainda uma preocupação em relação

ao setor externo da economia, que de acordo com

os analistas, a queda nas exportações e importações

certamente não será revertida no curto prazo, dada a

redução do crescimento da economia mundial. Para os

economistas pertencentes ao grupo, soma-se a entrada

maciça de capital estrangeiro direto e, também, no

mercado de capitais brasileiro. A conseqüência é uma

tendência de queda no câmbio, com prováveis efeitos

negativos no setor exportador brasileiro.

Para concluir, o grupo avalia que a economia brasi-

leira irá manter o ritmo de recuperação, superando os

próximos desdobramentos da crise com maior faci-

lidade, e que, junto com a China e Índia, se destaque

entre os melhores desempenhos da economia mundial.

Já para o economista José Cosentino, os preços das

commodities vêm reagindo e o crédito foi restabele-

cido ou substituído, prognosticando retomada lenta,

porém gradual. Segundo Cosentino, a maior parte dos

países, como o Brasil, vem incentivando o consumo

interno, visto como a alternativa para dinamizar as

economias. Ele acredita que duas ameaças estão afas-

tadas, no consenso dos analistas: a primeira é de que

assistiríamos a uma reedição da Grande Depressão

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de 1929. Os governos reagiram razoavelmente arti-

culados, com estímulos monetários para encurtar o

período de contração do crédito, e fiscais, para incen-

tivar o consumo e o investimento. O segundo é que o

dólar seria rejeitado como reserva de valor, arrasando a

economia norte-americana e desorganizando a econo-

mia global. A China tem deixado claro que não liderará

iniciativa nesse sentido.

“Com relação a sinais de recuperação, parece estar

havendo o tão esperado descolamento, mesmo que

a custos fiscais imprevistos. Países emergentes cujas

instituições e regras fiscais e monetárias cujos funda-

mentos estavam sólidos foram capazes de responder

prontamente aos desafios da crise e sairão na frente na

recuperação. O reaquecimento da Bovespa e o volume

de investimento direto estrangeiro no Brasil são indí-

cios desse fenômeno”, afirma Cosentino.

Na opinião do economista, dificilmente o Brasil terá

novamente, neste ciclo, taxas negativas de crescimento,

como aconteceu em dois trimestres consecutivos até

março. “O mundo deverá se comportar da mesma forma,

com as economias asiáticas puxando a recuperação.

A China vai crescer mais de 7% em 2009 e até maio,

segundo pesquisa recente do Ipea, enquanto as expor-

tações brasileiras totais caíram 23%, as para a China

aumentaram 34%, concentradas em produtos primários.

“Nada garante para o Brasil, no entanto, cresci-

mento expressivo já em 2010, diferentemente do que

dizem prever as autoridades da área econômica (4%

ou mais), ou mesmo o mercado (3,5%). As medidas

monetárias, de crédito e fiscais puderam presumivel-

mente suavizar as oscilações do PIB, antecipando o

consumo interno em 2009, mas não reproduzem as

condições econômicas excepcionais do ano passado,

nem impedirão que a economia continue morna em

2010. A exceção seria caso o governo federal de fato

implementasse um eficaz programa de investimentos,

por ser anunciado junto com o próximo orçamento,

cujas despesas estão fora do controle das metas

primárias, e contribuísse direta ou indiretamente na

formação bruta de capital”, afirma Cosentino.

Com a crise econômica, o Brasil sofreu alguns impac-

tos e continuará a sentir pelo menos até 2010 ou 2011,

é o que avaliam os analistas econômicos. A queda das

exportações e importações, na opinião do economista

Dércio Munhoz é um dos problemas sofridos nesta

crise financeira. Além de dificuldades na renovação da

linha de financiamento externo e de recursos exter-

nos no setor real da economia, a queda no emprego

e na demanda interna e externa. De acordo com ele, a

economia está sendo sustentada neste momento por

incentivos fiscais, compras de bens etc.

Para Cosentino, o Brasil foi atingido pela crise em

situação muito boa, segundo ele, até o terceiro trimes-

tre de 2008, o PIB vinha crescendo a 6,3% ao ano e sua

vulnerabilidade externa estava extremamente redu-

zida (reservas cambiais de mais de US$ 200 bilhões). “A

situação fiscal foi excepcionalmente positiva em 2008,

o governo federal pode gastar mais, destinar mais de

R$ 14 bilhões para o Fundo Soberano do Brasil, e a

ainda atingir com folga sua meta primária”.

O economista avalia que a economia brasileira conti-

nuará a sentir por mais um ou dois anos os efeitos da

crise, com menor produção e emprego. “Se os governos

mundiais falharem na aplicação das políticas monetária

e fiscal, o que é pouco provável pode haver nova queda

de atividade global. As exportações vão continuar fracas,

pelo baixo nível de atividade das economias centrais, e

a demanda externa continuará afetada também pela

nova onda protecionista mundial. A apreciação do

real, motivada pela queda do dólar frente a todas as

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Page 27: 38-revista

25

abril / junho / 2009

A crise econômica mundial não acabou, mas

o Brasil já está em processo de reativação do

crescimento econômico de forma sustentada. O

cenário de médio prazo é de retomada do ciclo

de crescimento econômico iniciado em 2004 e

interrompido com a crise no último trimestre

de 2008, quando atingia um ritmo acelerado de

crescimento que superava a 6%. O Brasil pode,

ainda em 2009, apresentar crescimento positivo

do PIB e retomar o ciclo de prosperidade a partir

de 2010. Para tanto é necessário a atuação forte

do governo na economia e a atenção microeco-

nômica para as ondas de percalços que, ainda,

devem afetar setores da economia brasileira,

mas de forma cada vez mais fracos.

José Luiz Pagnussat

Presidente do Corecon-DF

O cenário futuro da economia A retomada gradual do crescimento, com

perda relativa de importância das economias

centrais como motores. Uma questão ainda

por equacionar é como será a substituição dos

Estados Unidos no papel de consumidor endi-

vidado e deficitário no balanço de pagamentos,

que não poderá caber à Europa.

No Brasil, o menor rigor com o controle das

contas públicas deixará um dívida ser paga

adiante, sem que isso seja pecado capital, pois

ainda assim nossa situação fiscal é incompara-

velmente melhor que a de muitos países centrais

ou periféricos à crise. Eventualmente, ficará

demonstrado que nossa taxa de juros pode ser

menor que se acreditava, o que se refletirá em

vantagens duradouras do ponto de vista das

finanças públicas e do investimento produtivo.

José Fernando Cosentino Tavares

Consultor de Orçamento da Câmara dos Deputados

moedas como também pela entrada de capitais exter-

nos, continuará prejudicando o setor exportador e os

investimentos para a exportação”. E analisa que alguns

desequilíbrios se corrigem mais rapidamente. “O déficit

em transações correntes do balanço de pagamentos

está em queda. Mesmo com o dólar desvalorizado na

crise, a balança comercial brasileira deverá ser ampla-

mente superavitária em 2009, pois as importações estão

caindo mais rapidamente que as exportações. Neste

primeiro semestre, o saldo positivo foi quase 25% mais

alto que no mesmo período de 2008”.

Entretanto, depois que toda essa crise financeira

passar, qual a experiência que resta às economias do

mundo, e especialmente do Brasil? Muitos analistas

acreditam que os mercados não podem se auto-regular,

e afirmam que o mercado financeiro tem que ser ativa-

mente regulamentado e supervisionado pelos governos

segundo regras comuns, incluindo as transações inter-

nacionais, e para o Brasil, as conclusões são as mesmas.

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Artigo

Neste artigo discutiremos conceitos e proposições

relacionados a uma nova estratégia de desenvolvi-

mento nacional para países em desenvolvimento, em

particular para uma economia de médio porte, como a

brasileira. O ponto de partida é, por um lado, a constata-

ção do fracasso de políticas implementadas, inspiradas

do Consenso de Washington, e, de outro, a constatação

de que o “velho desenvolvimentismo” tem que ser reno-

vado, em função de uma nova realidade: economias

relativamente maduras ainda que desiguais social-

mente, no contexto de uma economia globalizada.

Para tanto, um conjunto de questões é aqui analisada:

qual a estratégia nacional de desenvolvimento deve

ser adotada? Qual a sua diferença em relação ao “velho

desenvolvimentismo”? Qual o papel do Estado? Quais

políticas econômicas e setoriais devem ser adotadas?

Do “velho” desenvolvimentismo ao Consenso de

Washington

O Brasil teve do período do pós-2ª Guerra Mundial

até o início dos anos 1980 um crescimento econô-

mico vigoroso, com uma taxa de expansão média do

PIB real de 7,1% em 1947/1980, e com um dinamismo

expansivo puxado em boa medida pelo setor indus-

trial (8,5%), com destaque para a indústria de transfor-

mação. Acompanhando este forte dinamismo, houve

profundas mudanças estruturais na economia brasi-

leira: deslocamento do eixo dinâmico da economia do

setor agroexportador para o setor industrial voltado

para o mercado interno, aumento da população

economicamente ativa no setor secundário, ampliação

das desigualdades sociais e preservação de grandes

margens de pobreza absoluta, entre outras. Por detrás

deste processo, havia uma explícita estratégia nacio-

nal de desenvolvimento – conhecida como nacional-

desenvolvimentista – que tinha como elemento central

o impulso à industrialização do país, dos ramos mais

leves aos ramos mais pesados, baseado no processo

de substituição de importações e numa participação

estatal, atuando o Estado como agente planificador,

financiador e produtor direto (insumos básicos e infra-

estrutura), coadjuvado pelas empresas multinacionais

que se situaram nos segmentos mais dinâmicos da

indústria de transformação.

Esta estratégia – que teve no Brasil possivelmente

o seu maior sucesso – foi objeto de várias críticas rela-

cionadas principalmente ao caráter “trunco” da indus-

trialização: investimentos industriais capital-intensivos

realizados em uma sociedade fortemente heterogênea

e com um passado de economia agroexportadora,

que contribui para a exclusão de parte da população

do processo de modernização; falta de um “núcleo

endógeno de industrialização”, dado o papel secundá-

rio da empresa privada nacional na formação do tripé

econômico; condições de financiamento inadequadas,

principalmente quanto ao financiamento de longo

prazo; desequilíbrios setoriais na indústria de transfor-

mação, em particular o atraso relativo do setor de bens

Desenvolvimentismo revisitado

Luiz Fernando de Paula

26

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abril / junho / 2009

de capital; uma indústria defasada tecnologicamente

e com baixos níveis de produtividade, em função da

existência de um protecionismo indiscriminado e sem

tempo de terminar.

Este modelo – fortemente influenciado pelo pensa-

mento cepalino dos anos 1950 – entrou em crise nos

anos 1980, por ocasião dos impactos da crise da dívida

externa, que contribuiu sobremaneira tanto para a

deterioração financeira do setor público, que teve suas

condições de financiamento fortemente fragilizadas,

quanto para aceleração da inflação, por conta dos

choques causados pelas maxidesvalorizações cambiais

em um contexto de uma economia crescentemente

indexada.

Foi neste contexto, que, ao final da década de 1980

e no início da década de 1990, que surgiu um conjunto

de proposições que visavam prover uma nova estra-

tégia de crescimento econômico para América Latina,

após uma década de estagnação. Proposta inicialmente

por John Williamson (1990), economista do Banco

Mundial, o conjunto de proposições rapidamente se

tornou no denominador comum das proposições e

aconselhamento político das instituições baseadas

em Washington (Banco Mundial e FMI) para os países

latino-americanos, e mesmo para outros países em

desenvolvimento. Tais proposições1 objetivam estimu-

lar o crescimento econômico através de um conjunto

de políticas e reformas de natureza liberalizante, que

visavam a disciplina macroeconômica (entendida

como estabilidade de preços), abertura comercial e

políticas microeconômicas de mercado. A recomenda-

ção de abertura da conta de capital, que não constava

das proposições originais de Williamson, foi acrescen-

tada ao receituário pelas instituições multilaterais,

constituindo o que alguns denominaram de “Consenso

de Washington II”. Tal consenso foi a base das reformas

liberalizantes que, em maior ou menor grau, foram apli-

cadas em vários países da América Latina, incluindo

Argentina, Brasil e México, ao longo da década de 1990.

Contudo, o resultado de tal estratégia foi, em vários

aspectos, decepcionantes, em particular no que se

refere ao crescimento econômico, sendo a Argentina,

até então o exemplo a ser seguido, o caso lapidar

do fracasso das políticas inspiradas no Consenso de

Washington, sob o estímulo das instituições multila-

terais. Vários aspectos foram criticados: a liberalização

financeira causou, em vários países crises bancárias; a

liberalização da conta de capital estimulou a especu-

lação e crises cambiais, com efeitos negativos sobre

variáveis reais (produto e emprego); a privatização

‘‘

‘‘

Ao final de 1980 e no início de 1990, surgiu um conjunto

de proposições que visavam prover uma nova estratégia de crescimento econômico para América Latina, após uma década de estagnação. Proposta

inicialmente por John Williamson, economista do Banco Mundial, o conjunto

de proposições rapidamente se tornou no denominador comum das proposições e

aconselhamento político das instituições para os países

latino-americanos, e outros países em desenvolvimento.

1 Eram dez as proposições originais de Williamson: (a) disciplina fiscal; (b) redirecionamento dos gastos públicos para áreas de retorno econô-mico e potencial de distribuição de renda; (c) reforma tributária; (d) liberalização da taxa de juros doméstica; (e) taxa de câmbio competitiva; (f ) liberalização comercial; (g) liberalização dos fluxos de investimento direto estrangeiro; (h) privatização; (i) desregulamentação dos mercados; (j) assegurar os direitos de propriedade.

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resultou em fracasso em alguns países ao não serem

acompanhadas de políticas de promoção de competi-

ção; a fixação demasiada com o objetivo de controle de

inflação foi em alguns casos prejudicial ao crescimento.

Frente a esses resultados, as instituições multilate-

rais (FMI e Banco Mundial) fizeram parcialmente uma

“mea culpa”, sugerindo que o marco regulatório deve-

ria ser fortalecido concomitamente com a implanta-

ção das reformas, a liberalização de conta de capitais

deveria ser feita gradualmente, o Estado deveria adotar

as políticas de rendas compensatórias etc. Mais ainda:

no meio acadêmico, economistas renomados como

Stiglitz e Dani Rodrik têm questionado seriamente as

proposições e implicações do consenso sobre os países

em desenvolvimento.

Velho e Novo Desenvolvimentismo2

Como assinalado acima, a estratégia desenvolvi-

mentista dos anos 1950 na América Latina, foi forte-

mente influenciada pelo chamado “pensamento cepa-

lino”, que desenvolveu, “uma proposição política para

países subdesenvolvidos, ou seja, a de industrializar,

como meio de superar a pobreza ou de reduzir a dife-

rença entre eles e os países ricos, e de atingir indepen-

dência política e econômica através de um crescimento

econômico autosustentado”3. A Cepal, ao efetuar uma

crítica à doutrina dominante do livre comércio, a partir

da análise da deterioração dos termos de troca e do

desenvolvimento desigual na propagação do progresso

técnico, defendia que a industrialização era o único

meio que os países latino-americanos dispunham para

captar os frutos do progresso técnico e elevar progres-

sivamente o nível de vida da população. O aprofunda-

mento da industrialização, contudo, requeria a ação do

Estado, em particular o planejamento estatal e medidas

protecionistas, visando aprofundar o processo de subs-

tituição de importações.

A estratégia desenvolvimentista, que implementou

a industrialização pesada no Brasil, a partir dos anos

1950, foi fortemente influenciada por tais proposi-

ções. Em um certo sentido, o Brasil foi o caso mais bem

sucedido de industrialização, baseada na estratégia

nacional-desenvolvimentista, ao lograr êxito no seu

processo de industrialização pesada. O Estado, como

planejador, sustentador financeiro dos grandes blocos

de investimento e produtor direto de insumos básicos

e infraestrutura, e as empresas transnacionais, concen-

trando-se nos segmentos mais dinâmicos da indús-

tria de transformação, foram os protagonistas deste

processo. A empresa privada nacional teve um papel

complementar, se constituindo na realidade no sócio

menor do chamado “tripé econômico”. A ausência de

‘‘

‘‘

A estratégia desenvolvimentista dos anos

1950 na América Latina, foi fortemente influenciada

pelo chamado ‘pensamento cepalino’, que desenvolveu,

‘uma proposição política para países subdesenvolvidos, ou seja, a de industrializar, como meio de superar a pobreza ou

de reduzir a diferença entre eles e os países ricos, e de

atingir independência política e econômica através de um

crescimento econômico autosustentado’.

2 A expressão “novo desenvolvimentismo” foi primeiro proposta por Bresser-Pereira (2003, cap. 20), e posteriormente desenvolvida em Sicsú, Paula e Michel (2005).

3 Cf R. Bielschowsky. Pensamento Econômico Brasileiro: o ciclo ideológico do desenvolvimentismo, Rio de Janeiro: Ipea, 1988.

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abril / junho / 2009

uma burguesia nacional forte é um dos aspectos críti-

cos no estabelecimento de uma estratégia nacional de

desenvolvimento no Brasil4. A história mundial mostra

que não há capitalismo forte sem um empresariado

nacional forte. Em outras palavras, sem a consolidação

de um “núcleo endógeno” da industrialização – cons-

tituído de um empresariado nacional forte e compe-

titivo - o desenvolvimento torna-se frágil, pois não se

criam grupos empresariais capazes de participar em

igualdade de condições do pesado jogo de competi-

ção internacional de comércio e investimentos.

Além da falta de uma política estatal mais efetiva

e de longo prazo que favorecesse a empresa privada

nacional no processo de desenvolvimento industrial,

o “protecionismo tarifário generalizado e sem tempo

determinado para acabar” não estimulou o processo

de aprendizagem das empresas nacionais. Isto ocorreu

porque não foi acompanhado de um processo conco-

mitante de geração de exportações e de desenvolvi-

mento tecnológico doméstico. Em outras palavras, o

processo de substituição de importações no Brasil não

requereu a absorção e o desenvolvimento tecnológico,

contribuindo para incutir no empresariado industrial

brasileiro uma mentalidade protecionista, que encarava

o protecionismo com um fim e não como um meio para

que, num determinado horizonte de tempo, se implan-

tasse uma indústria eficiente e competitiva, voltada

tanto para o mercado interno quanto para o mercado

internacional5.

A estratégia novo-desenvolvimentista, embora

tenha suas origens no “velho desenvolvimentismo”,

ainda que com um olhar crítico em alguns aspectos

desta estratégia, busca adequar a estratégia desenvol-

vimentista aos novos tempos e à realidade específica

de cada país. De comum entre as duas estratégias está

a visão crítica às políticas de “laissez-faire”, a necessi-

dade de se implementar uma estratégia nacional de

desenvolvimento que busque uma complementari-

dade entre Estado e mercado (ainda que no momento

atual em moldes diversos), e a importância de se pensar

os problemas dos países em desenvolvimento a partir

de uma ótica da problemática específica desses países

(e não procurando copiar estratégias importadas dos

países desenvolvidos).

Na visão novo-desenvolvimentista não faz mais

sentido, como no atual estágio de desenvolvimento

produtivo brasileiro, a existência de um Estado-

empresário e de um protecionismo do mercado

interno nos moldes do passado. O novo desenvolvi-

mentismo não propõe a redução do Estado, mas a sua

4 Diferentemente do caso brasileiro, a estratégia nacional de desenvolvimento da Coréia do Sul buscou justamente estimular a criação de um empresariado nacional forte e competitivo.

5 Cf Suzigan, W (1988). Estado e industrialização no Brasil. Revista de Economia Política, v. 8, n. 4, pp. 5-16, out./dez.

‘‘‘‘

Além da falta de uma política estatal mais efetiva

e de longo prazo que favorecesse a empresa

privada nacional no processo de desenvolvimento

industrial, o “protecionismo tarifário generalizado e sem

tempo determinado para acabar” não estimulou o

processo de aprendizagem das empresas nacionais. Isto ocorreu porque não foi acompanhado de um

processo concomitante de geração de exportações e de desenvolvimento

tecnológico doméstico.

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a

reconstrução, tornando-o mais forte, e mais capaz no

plano político, regulatório e administrativo, além de

financeiramente sólido. Propõe, ademais, uma estraté-

gia nacional de desenvolvimento que promova políticas

voltadas ao progresso técnico e a introdução de novas

técnicas de produção, o desenvolvimento de mecanis-

mos nacionais de financiamento do investimento com

poupança doméstica, políticas econômicas redutoras de

incertezas inerentes ao mundo financeiramente globa-

lizado e o desenvolvimento de instituições específicas

adequadas ao desenvolvimento (como o desenvolvi-

mento do capital humano através da educação pública).

Tampouco faz sentido a manutenção de um prote-

cionismo indiscriminado à indústria no atual estágio de

desenvolvimento de economias “semimaduras”, como

a brasileira: o comércio internacional – como fonte de

crescimento econômico – deve ser intensificado, o que

torna desejável a liberalização da conta de transações

correntes (incluindo comércio), embora esta abertura

deva ser feita de uma forma inteligente, cautelosa e

negociada para que reciprocidades que interessem às

exportações brasileiras sejam conquistadas.

A alternativa novo desenvolvimentista defende a

constituição de um Estado capaz de regular a economia

– que deve ser constituída por um mercado forte e um

sistema financeiro funcional – isto é, que seja voltado

para o financiamento da atividade produtiva e não para

a atividade especulativa. Para tanto, é necessário não só

buscar formas inteligentes de ação estatal, complemen-

tares à ação privada, como também proporcionar condi-

ções para que o Estado possa desempenhar de forma

mais eficaz sua ação – para o que pode ser necessário

uma “reforma da gestão pública”. Trata-se de adotar uma

forma de gestão que aproxime as práticas dos gerentes

públicos às dos privados, tornando-os ao mesmo tempo

mais autônomos e responsáveis perante a sociedade. Tal

reforma requer não somente uma maior profissionali-

zação da gestão pública como também um certo grau

de descentralização do Estado, com a transferência de

determinadas funções específicas do Estado a agências

(semi)autônomas e a transferência de serviços sociais e

científicos a organizações de serviço públicos, semi ou

não estatais. Note-se, contudo, que isto não significa

que as decisões mais importantes relativas às políticas

públicas a serem implementadas devam ser igualmente

descentralizadas, pois cabe às esferas governamentais,

eleitas democraticamente, a definição destas.

Na concepção novo desenvolvimentista, o Estado

deve ser forte para permitir ao governo a implemen-

tação de políticas macroeconômicas “defensivas” e

pró-crescimento. Políticas de caráter defensivo são, por

exemplo, aquelas que reduzem a sensibilidade do país

a crises cambiais; e, políticas pró-crescimento referem-

se àquelas medidas de promoção do pleno emprego,

sobretudo em contextos recessivos. Políticas industrial

e de comércio exterior – usadas de forma inteligente e

criativa – podem e devem ser utilizadas para estimular

a competitividade da indústria e melhorar a inserção do

país no comércio internacional. O Estado deve, ademais,

possuir um sistema tributário progressivo, para reduzir

as desigualdades de renda e de riqueza que são exage-

radas. Em que pese a maior interdependência entre

as nações. Estados são estratégicos como instrumento

de ação coletiva que as nações dispõem para serem

competitivas internacionalmente.

‘‘

‘‘

O Estado deve, ademais, possuir um sistema

tributário progressivo, para reduzir as desigualdades de renda e de riqueza que são exageradas. Em que pese a maior interdependência entre as nações. Estados

são estratégicos como instrumento de ação coletiva que as

nações dispõem para serem competitivas internacionalmente.

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Estabilidade macroeconômica ao invés de mera

estabilidade de preços

A política econômica, na perspectiva aqui proposta,

relaciona-se à adoção de um conjunto de medidas que

visa aumentar o nível de demanda agregada, de modo

a criar um ambiente estável que estimule os empre-

sários a realizar novos investimentos - uma vez que os

níveis de emprego e utilização da capacidade produ-

tiva dependem, em boa medida, dos determinantes da

demanda agregada, principalmente da decisão de inves-

timento dos empresários. Em outras palavras, a política

econômica deve procurar afetar o investimento privado

global, criando um ambiente seguro que estimule esco-

lhas mais arriscadas – mas que rendam lucros e geram

empregos – no lugar da simples acumulação de ativos

líquidos - isto é, a boa política é aquela que induz os

agentes a investirem em ativos de capital, dando origem

a investimento novo.

Contudo, o objetivo da política econômica deve ser

amplo: deve estar voltada para a estabilidade macroe-

conômica, um conceito mais amplo do que o de mera

estabilidade de preços, ou seja, deve procurar também

reduzir as incertezas relativas à demanda futura que são

inerentes aos negócios na economia. Nesta perspectiva,

controle de inflação é importante, na medida em que a

inflação persistente, e elevada gera distorções na econo-

mia (torna mais imprevisível o horizonte de decisões de

mais longo termo), mas não deve ser exagerado, sob o

perigo de colocar em risco os objetivos de estabilidade e

crescimento do produto e do emprego. Assim, o objetivo

da política econômica deve incluir o maior crescimento

do produto e emprego, buscando minimizar ou evitar

maiores contrações econômicas, devido aos altos custos

econômico-sociais das desacelerações.

Estabilidade de preços e aumento do produto e

emprego são compatíveis dentro dessa visão e, para

tanto, o governo deve fazer uso de um instrumental

de política econômica com objetivos múltiplos – e não

somente utilizar a política monetária voltada exclusiva-

mente para o controle da inflação. A perspectiva novo

desenvolvimentista sustenta que para se atingir os obje-

tivos múltiplos de política – como crescimento econô-

mico e estabilidade de preços – é necessária uma maior

coordenação de políticas (fiscal, monetária, cambial,

salarial etc): devem-se avaliar os impactos conjuntos da

adoção das políticas sobre os objetivos como um todo.

Assim, a coordenação de políticas é fundamental para se

atingir a estabilidade macroeconômica.

Igualmente importante é manter uma taxa de

câmbio competitiva (ou seja, desvalorizada), como

mostra a experiência de vários países que tiveram cres-

cimento acelerado no pós-guerra, de modo a garantir

condições de sustentabilidade do balanço de pagamen-

tos através da geração de superávits em conta corrente

(com consequente aumento nas reservas internacio-

nais) e arrefecer a contratação de empréstimos externos

(reduzindo, assim, a vulnerabilidade externa do país).

A forma de financiamento do balanço de pagamentos

também é importante, devendo-se evitar fluxos de capi-

tal de portfólio e dívida de curto prazo que podem gerar

custos associados a alta volatilidade dos fluxos de capi-

tais, sem gerar benefícios de difusão de conhecimento.

Portanto, uma estratégia novo desenvolvimentista deve

‘‘

‘‘

Em outras palavras, a política econômica

deve procurar afetar o investimento privado global,

criando um ambiente seguro que estimule

escolhas mais arriscadas – mas que rendam lucros e

geram empregos – no lugar da simples acumulação de

ativos líquidos - isto é, a boa política é aquela que induz os agentes a investirem em

ativos de capital, dando origem a investimento novo.

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buscar formas de reduzir a vulnerabilidade externa

da economia, de modo a evitar os efeitos de choques

externos – causados por mudanças nos sentimentos do

mercado, inclusive decorrentes de “comportamento de

manada” - sobre a taxa de câmbio. Afinal, vários estudos

têm mostrado os efeitos nefastos que a excessiva vola-

tilidade da taxa de câmbio, em países em desenvolvi-

mento, têm sobre decisões de investimento, inflação,

dívida pública etc. Nos países em desenvolvimento, a

volatilidade cambial em geral é bem maior do que nos

países desenvolvidos, possuidores de moedas fortes e

conversíveis, devido ao reduzido tamanho dos merca-

dos financeiros desses países com relação aos fluxos de

capitais de curto prazo que ingressam nos mesmos.

Competitividade do setor industrial

Uma das características do processo de industrializa-

ção latino-americano – incluindo o Brasil – é a assimetria

entre um elevado componente de imitação (fase prévia

de aprendizagem) e um componente marginal de inova-

ção econômico-social. Ademais, nenhum país da região

logrou simultaneamente crescimento e equidade social.

Economias bem-sucedidas em termos de crescimento e

equidade compartilham uma característica básica, que

é a incorporação do progresso técnico e elevação da

produtividade. Neste contexto, em função das insuficiên-

cias no âmbito da equidade e da baixa incorporação

do progresso técnico em setores-chaves da indústria, o

crescimento econômico e a competitividade apresen-

taram um comportamento claramente espasmódico na

América Latina.

A competitividade do setor industrial contribui

positivamente para o crescimento econômico, já que o

comércio internacional de manufaturas é o que normal-

mente mais se expande no comércio mundial, e, ao

mesmo tempo, o crescimento contribui para estimular a

introdução de progresso técnico e, consequentemente,

aprimorar a competitividade. Embora a capacidade dos

países de se inserir de forma mais efetiva nos mercados

internacionais dependa, em parte, de sua capacidade de

acompanhar as tendências tecnológicas internacionais,

para muitos países que não estão na fronteira tecnoló-

gica, os retornos associados com a facilidade de trans-

ferência da tecnologia podem ser maiores do que os

retornos de desenvolverem de forma pioneira pesquisa

e desenvolvimento. Por isso, políticas públicas que faci-

litem a transferência da tecnologia – assim como a sua

absorção pelo aparelho produtivo - são cruciais para o

desenvolvimento.

Portanto, nos países latino-americanos, como o

Brasil, é fundamental a realização de uma transformação

produtiva que resulte na elevação da produtividade da

mão-de-obra que dê sustentação a uma competitivi-

dade internacional autêntica apoiada na incorporação

de progresso técnico e em práticas gerenciais inova-

doras. Para tanto, uma política abrangente deve ser

adotada, incluindo o fortalecimento da base empresarial

do país, adoção de uma política industrial voltada para a

melhoria da competitividade das exportações de maior

valor agregado, desenvolvimento de uma infraestrutura

voltada para a competitividade sistêmica (incluindo o

desenvolvimento de um sistema nacional de inovação),

melhorias do nível de qualificação da mão-de-obra etc.

‘‘

‘‘

Embora a capacidade dos países de se inserir de forma mais efetiva nos mercados

internacionais dependa, em parte, de sua capacidade de acompanhar as tendências tecnológicas internacionais, para muitos países que não

estão na fronteira tecnológica, os retornos associados com a facilidade de transferência

da tecnologia podem ser maiores do que os retornos

de desenvolverem de forma pioneira pesquisa e

desenvolvimento.

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A aprendizagem tecnológica e o fortalecimento da

competitividade internacional requerem instituições

públicas dotadas de capacidade de articulação dos

diversos agentes produtivos, laborais, educativos, de

pesquisa e de financiamento. Como já assinalado, de

acordo com a visão novo desenvolvimentista, o Estado

necessário para impulsionar uma transformação produ-

tiva dessa natureza é diferente daquele que fomentou a

industrialização precedente.

Inserção internacional e redução da vulnerabili-

dade externa

A literatura empírica sobre liberalização financeira

e desempenho econômico é inconclusa em estabe-

lecer uma relação robusta entre essas duas variáveis,

enfraquecendo um dos pontos básicos do Consenso

de Washington, na versão das agências multilaterais. De

fato, há uma vasta literatura que buscou aferir a existên-

cia de uma relação positiva entre liberalização financeira

(ou controles de capitais) e crescimento econômico,

sendo difícil estabelecer uma relação causal robusta

entre integração financeira e desempenho do cresci-

mento do produto.

Estabilidade macroeconômica e desenvolvimento

de longo prazo requerem a existência de mercados

financeiros saudáveis. Daí a necessidade de se rede-

senhar o sistema regulatório do sistema financeiro: o

fortalecimento da regulação e supervisão financeira é

fundamental para assegurar a estabilidade do sistema

financeiro. Igualmente importante é o estabelecimento

de políticas que permita o governo enfrentar os proble-

mas relacionados à volatilidade dos fluxos de capitais em

mercados financeiros/cambiais pouco densos, podendo

incluir medidas de redução da vulnerabilidade externa,

política de formação de reservas cambiais, regulamenta-

ção de fluxos de capitais etc.

Acrescente-se, ainda, que o uso da poupança externa

como suporte a uma estratégia de crescimento deve

ser limitado, uma vez que as evidências recentes de

países em desenvolvimento mostram que a longo prazo

não há uma correlação clara entre poupança externa e

aumento na taxa de investimento, já que a maior parte

da poupança externa é canalizada para consumo, não

resultando num aumento da capacidade produtiva em

setores tradables. Como resultado, os países em desen-

volvimento passam a enfrentar uma restrição externa

ao crescimento, como atesta, por exemplo, uma elevada

relação exportações/dívida externa e na dívida externa/

PIB, no que resulta na manutenção de um ambiente de

instabilidade macroeconômica derivada da fragilidade

financeira do setor externo. Portanto, no longo termo

os saldos em conta corrente devem estar em equilíbrio,

uma vez que um país não pode tomar empréstimos

indefinidamente, dado a restrição de insolvência.

O equilíbrio no balanço de pagamentos requer a

manutenção de um superávit significativo na balança

comercial, para o que é necessária – como já assinalado

anteriormente - a manutenção de uma taxa de câmbio

subvalorizada, isto é, orientada sempre que possível para

o ajustamento da conta corrente e para a diminuição da

dependência dos capitais externos, acompanhada por

políticas industriais ativas voltadas para estimular expor-

tações e a substituição de importações de insumos que

tenham peso na pauta de importações do país de modo

a reduzir os efeitos do câmbio sobre o nível de preços

domésticos. Tais políticas são particularmente impor-

tantes em função da necessidade de se realizar uma

mudança estrutural na base produtiva do País, com vistas

a alterar a pauta das exportações brasileiras na direção

de produtos de maior elasticidade-renda. Por sua vez, a

substituição de importações em alguns segmentos mais

dinâmicos da indústria pode se tornar necessária devido

à alta elasticidade-renda das importações do País, o que

faz com que estas cresçam significativamente em perío-

dos de crescimento econômico continuado.

Papel do Estado na área social

Na perspectiva novo desenvolvimentista o cresci-

mento econômico é condição necessária mas não sufi-

ciente para resolver o problema da miséria e da desi-

gualdade social que marca a sociedade brasileira. Maior

crescimento econômico permite gerar mais empregos

e ao mesmo tempo elevar a arrecadação tributária que

pode ser utilizada na implementação de programas

sociais universalizantes (em particular em educação e

saúde) e programas mais focalizados (como programa

de renda mínima). Políticas sociais e educacionais –

entendidas como instrumentos para a inclusão formal

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a

de segmentos da população deseducados e a margem

da sociedade brasileira – são elementos centrais no

enfrentamento da questão das fortes desigualdades

presentes no País.

Um dos grandes avanços do debate político do País

nos últimos anos é que políticas sociais compensatórias

vieram para ficar na agenda de política governamental,

dado o seu forte e comprovado efeito positivo sobre a

renda dos segmentos mais desassistidos, ensejando

melhorias na distribuição de renda. Programas como

bolsa-família devem ser ampliados e aprimorados, mas

deve-se ter consciência que têm efeitos limitados. Ou

seja, devem ser vistos como soluções emergenciais

necessárias e não soluções permanentes. Embora seja

correto afirmar, como dizia o sociólogo Betinho, que “a

fome tem pressa e não pode esperar”, políticas sociais

– como políticas de renda mínima – implementadas

em um contexto de crescimento baixo podem ter sua

eficácia limitada.

Programas de qualificação e capacitação de mão-

de-obra são fundamentais no atual estágio de desen-

volvimento tecnológico, mas não se deve ignorar os

problemas do lado da demanda por trabalho, que

depende, por sua vez, crucialmente da demanda

efetiva da economia: políticas ativas de emprego só

podem cumprir plenamente as funções quando existe

demanda pelas atividades que promovem.

Conclusão

Buscou-se aqui discutir algumas idéias que podem

compor uma estratégia nacional de desenvolvimento

para países de porte médio, como o Brasil. Em termos

gerais, procurou-se mostrar que uma estratégia novo-

desenvolvimentista deve procurar: (i) uma ação comple-

mentar entre Estado e mercado, cabendo ao Estado

arbitrar e estimular a concorrência e mesmo influir na

determinação das variáveis econômicas relevantes -

como desemprego e distribuição de renda; (ii) ter, ao

contrário do que preconiza a “ideologia globalizante”, um

Estado forte, capaz no plano político, regulatório e distri-

butivo, além de financeiramente sólido; (iii) adotar polí-

ticas macroeconômicas redutoras de incertezas que são

inerentes ao mundo globalizado, com especial atenção

ao problema da vulnerabilidade externa; (iv) adotar o

conceito mais amplo de estabilidade macroeconômica,

que busca compatibilizar crescimento econômico com

estabilidade de preços, ao invés de mera estabilidade

de preços; (v) realizar uma transformação produtiva que

dê sustentação a uma competitividade internacional

autêntica apoiada na incorporação de progresso técnico

e em práticas gerenciais inovadoras, sendo, para tanto,

necessária o fortalecimento da base empresarial do País

e a adoção de uma política industrial voltada para a

melhoria da competitividade das exportações de maior

valor agregado; (vi) o Estado ter um papel ativo na área

social, combinando políticas sociais abrangentes com

ações focalizadas.

Luiz Fernando de Paula

Professor de Economia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (FCE/UERJ), pesquisador do CNPq e vice-presidente da

Associação Keynesiana Brasileira (AKB).

34

Page 37: 38-revista

35

abril / junho / 2009

A atual crise financeira internacional – diga-se

de passagem, originada pelas perdas causadas pelo

crescente default dos empréstimos das hipotecas do

mercado norte-americano de subprime e dinamizada

mundialmente, uma vez que grande parte dessas hipo-

tecas foi securitizada e distribuída a investidores do

mercado global – tem afetado dramaticamente a ativi-

dade econômica, sejam das economias desenvolvidas,

em maior escala, sejam das economias emergentes,

pois os mercados financeiros liberalizados e integra-

dos, como os dos dias de hoje, enfrentam um trade-

off: por um lado, eles estimulam o desenvolvimento

da atividade econômica; por outro, eles aumentam as

possibilidades de ganhos especulativos, convertendo-

se, assim, em uma espécie de cassino global1.

No que diz respeito às repercussões da crise finan-

ceira internacional sobre a economia brasileira, a

Associação Keynesiana Brasileira, em uma publicação

de outubro do ano passado intitulada “Dossiê da Crise”,

sinalizava que nossa economia não passaria incó-

lume à crise, apesar das autoridades econômicas (AE)

e o presidente Lula da Silva a terem subestimado. No

corrente ano, a divulgação de alguns indicadores da

atividade produtiva colocou em xeque a idéia de que o

País estava “descolado do resto do mundo”, bem como

mostrou que a economia brasileira se encontra em uma

situação de recessão técnica: por um lado, o Produto

Interno Bruto (PIB) nos dois últimos trimestres (quarto

trimestre de 2008 e primeiro trimestre de 2009) acumu-

lou uma queda de aproximadamente 4,4%; por outro, a

taxa média de desemprego entre janeiro e abril de 2009

foi da ordem de 8,7%, ligeiramente superior àquela

ocorrida no mesmo período de 2008 que foi de 8,4%.

Os referidos resultados, por sua vez, geraram o temor

de uma forte desaceleração da economia brasileira para

2009 e 2010, justamente quando a atividade econômica

vinha passando por um dos seus mais longos ciclos de

crescimento das duas últimas décadas2.

As repercussões da crise internacional sobre a economia brasileira: o que

foi feito e o que fazer em termos de políticas econômicas contracíclicas?

Fernando Ferrari Filho

Artigo

1 J.M.Keynes, em sua The General Theory, of Employment, Interest and Money, publicada em 1936, já chamava a atenção para a conexão entre os mercados financeiro e real em economias monetárias da produção ao afirmar que “[w]hen the capital development of a country becomes a by-product of the activities of a casino, the job is likely to be ill-done” (Keynes, 1964, p.159).

2 Não é demais lembrar que o Fundo Monetário Internacional (FMI), em abril passado, sinalizou um crescimento negativo de 1,3% para o PIB brasileiro e os analistas de mercado, conforme o relatório Focus de 22/06/2009, prevêem um crescimento negativo da ordem de 0,6%.

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a

As perspectivas nada auspiciosas para a econo-

mia brasileira para os próximos dois anos, em especial

para 2009, decorrem, por um lado, do arrefecimento

de nosso saldo comercial3 – seja pelo esmorecimento

da demanda mundial, seja pela queda dos preços das

commodities, agrícolas e minerais – e do desaqueci-

mento do mercado doméstico (a formação bruta de

capital fixo e o consumo privado nos dois últimos trimes-

tres “cresceram” – 20,3% e – 1,1%, respectivamente), em

grande parte causado pelo “empoçamento” da liquidez

e do crédito da economia e pela elevação da preferên-

cia pela liquidez dos agentes econômicos. Em outras

palavras, a crise financeira internacional deteriorou a

dinâmica do setor externo e o estado de expectativas

dos consumidores, das firmas e do sistema financeiro,

travando, assim, as suas decisões de gastos (consumo e

investimento) e empréstimos, respectivamente.

Diante desse quadro, o que fazer?

A resposta à pergunta vai ao encontro do que as AE

dos governos dos países desenvolvidos estão fazendo,

qual seja: cientes de que a crise atual está relacionada à

ausência de atuação do Estado e não à sua suposta ação

ativa, as AE daqueles países têm atuado ativamente

para mitigar os impactos da crise financeira interna-

cional sobre o lado real da economia. Nesse sentido,

as políticas econômicas que têm sido implementadas

nos últimos meses pelos Estados Unidos, nos países da

zona do euro e no Japão mostram que a crise pode ser

“administrada” através da atuação de um Banco Central

(BC) como prestador de última instância e da adoção

de políticas fiscais contracíclicas. Em suma, as referidas

AE programam medidas econômicas de expansão da

demanda efetiva essencialmente keynesianas4.

No Brasil, as lições das AE dos governos dos países

desenvolvidos parecem ter chegado tardiamente e não

foram absorvidas integralmente pelas nossas AE, em

especial as monetárias. Vejamos.

Inicialmente, por mais que o Ministério da Fazenda

tenha reduzido algumas alíquotas de impostos (Imposto

de Renda de Pessoa Física, IOF sobre operações de crédito

ao consumidor e IPI para os setores automotivo e eletro-

doméstico da “linha branca”, entre outras) e “ampliado”

os investimentos públicos, principalmente os relaciona-

dos ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC),

os ministros Guido Mantega e Paulo Bernardo vinham

‘‘

‘‘

As políticas econômicas que têm sido implementadas nos últimos meses pelos Estados

Unidos, nos países da zona do euro e no Japão mostram que a crise pode ser “administrada”

através da atuação de um Banco Central (BC) como

prestador de última instância e da adoção de políticas

fiscais contracíclicas. Em suma, as referidas AE programam

medidas econômicas de expansão da demanda efetiva essencialmente keynesianas.

3 As exportações e importações acumuladas entre janeiro e a terceira semana de junho apresentaram, segundo o Ministério do Desenvolvimen-to, Indústria e Comércio Exterior (2009), uma forte desaceleração: as exportações somaram cerca de US$ 64,9 bilhões, uma queda de cerca de 22,1% em relação às exportações no mesmo período de 2008, ao passo que as importações alcançaram o montante de US$ 52,5 bilhões (28,5% menores que as importações observadas entre janeiro e a terceira semana de junho de 2008). Para o corrente ano, as expectativas do saldo da balança comercial são da ordem de US$ 16,0 bilhões, o que, caso esse resultado seja confirmado, representa uma queda de aproximadamente 34,0%, comparativamente ao saldo comercial de 2008.

4 Em linhas gerais, medidas econômicas de natureza keynesiana para enfrentar crises de demanda de efetiva são sinalizadas em Keynes (1964, capítulo 24) e H.Minsky (1986, capítulo 13).

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37

abril / junho / 2009

insistindo, até o início do ano, que a meta de superávit

primário para 2009 deveria ser mantida em 3,75% do

PIB5. Diante dos resultados do PIB do último trimestre de

2008 e das perspectivas de recessão da economia brasi-

leira prognosticadas por analistas de mercado no início

de 2009, os referidos ministros decidiram, então, reduzir,

em 15 de abril passado, a meta de superávit primário

para o corrente ano para 2,5% do PIB. Em nosso ponto

de vista, a decisão repentina de flexibilidade do superá-

vit primário deixa claro que a política fiscal do governo

Lula mostra-se dúbia, oscilando entre as necessidades

de, por um lado, expandir os gastos públicos e, por outro,

de preservar a austeridade fiscal6.

Em segundo lugar, o Banco Central, a despeito de

algumas iniciativas pontuais para injetar liquidez na

economia e reativar o mercado de crédito7, continua

sendo conservador na condução da política monetá-

ria. A taxa de juros básica, Selic, hoje em 9,25%, deveria

ter sido reduzida imediatamente após a constatação

do agravamento da crise financeira internacional e de

seus impactos sobre a economia mundial. Ao contrário

dos principais bancos centrais mundiais que cortaram

substancialmente as taxas de juros básicas8, o BC tomou

a decisão de reduzir a Selic somente nas reuniões do

Comitê de Política Monetária (COPOM) realizadas em

2009: nas primeira, terceira e quarta reuniões, a Selic foi

reduzida em 1,0%, ao passo que na segunda reunião a

redução foi de 1,5%. Se não bastasse tal conservado-

rismo, a Ata nº143 da última reunião do COPOM, reali-

zada nos dias 9 e 10 de junho, sinaliza que o processo de

redução da Selic está chegando ao fim. Algumas passa-

gens da referida Ata deixam claro essa posição:

“O Copom considera importante ressaltar (...) [que] a

avaliação de decisões alternativas de política mone-

tária deve concentrar-se, necessariamente, na análise

do cenário prospectivo para a inflação e nos riscos a

ele associados (...)

A despeito de haver margem residual para um

processo de flexibilização, a política monetária deve

manter postura cautelosa, visando assegurar a conver-

gência da inflação para a trajetória de metas (...)

O Comitê concorda que qualquer flexibilização

monetária adicional deverá ser implementada de

maneira mais parcimoniosa”

Diante das circunstâncias atuais em que estamos

longe de encontrar uma solução para a crise financeira

internacional, revertendo, assim, a recessão mundial, e

as políticas contracíclicas, fiscal e monetária, do governo

Lula foram articuladas tardia e cautelosamente, é muito

pouco provável que a economia brasileira escape de

uma recessão em 2009. Todavia, para evitarmos que o

nosso PIB tenha uma performance pífia em 2010 e volte

a trilhar o rumo do crescimento econômico que vinha

sendo observado até o terceiro trimestre de 2008,

são necessárias medidas de cunho fiscal, monetária e

cambial mais ousadas.

No que diz respeito à política fiscal, são fundamen-

tais: (I) redução de impostos, principalmente aqueles

incidentes sobre a cadeia produtiva, (II) maior dinamiza-

ção dos investimentos públicos em infraestrutura, pois

eles têm um impacto multiplicador sobre a renda e o

emprego9, (III) incentivos aos investimentos privados,

essencialmente aqueles geradores de emprego, tais

5 A referida meta de superávit incluía 0,5% destinado às obras prioritárias em infraestrututra contempladas no Projeto Piloto de Investimentos.

6 É importante ressaltar que os superávits primários obtidos ao longo dos últimos anos (entre 2003 e 2008, o resultado fiscal médio foi da ordem de 4,2% do PIB) geram um mecanismo de distribuição de renda perversa: o governo, em prol da austeridade fiscal, reduz os gastos públicos e seus efeitos multiplicadores sobre a renda e o emprego, gerando, em contrapartida, um volume de poupança que tem como objetivo assegurar o fluxo de rolagem da dívida pública. Em outras palavras, há uma substituição de investimentos públicos por pagamentos aos rentistas.

7 As principais medidas implementadas pelo BC foram: mudanças e reduções no recolhimento de depósitos compulsórios para pequenos e médios bancos e grandes bancos, respectivamente; e criação de uma linha de crédito internacional para financiar as exportações, a partir de recursos disponibilizados pelas reservas internacionais.

8 Atualmente, as taxas de juros básicas dos bancos centrais dos Estados Unidos, da Inglaterra, Europa e do Japão são, respectivamente, 0,25% ao ano, 0,5% ao ano, 1,0% ao ano e 0,1% ao ano.

9 De acordo com a estimativa padrão do multiplicador keynesiano, um estímulo fiscal de $ 1,0, sob a forma de transferência, possui um impacto de $ 0,3, ao passo que um aumento de $ 1,0 nos gastos governamentais possui um impacto de $ 1,3.

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como os da construção civil10 e os vinculados às peque-

nas e médias empresas, e (IV) ampliação dos recursos

para os programas sociais de geração de renda.

Em relação à política monetária e à expansão do

crédito, é necessário que o BC:

I) reduza abruptamente a taxa de juros básica11;

II) injete mais liquidez na economia, através, por

exemplo, da redução dos depósitos compulsórios e

III) “induza” o sistema financeiro a converter a liquidez

em crédito, condições imprescindíveis para expandir o

consumo e o investimento privados. Ademais, os bancos

públicos, por exemplo, BNDES e Banco do Brasil, podem

ter um papel importante na expansão do crédito.

Como desde o início da crise financeira internacional

a taxa de câmbio tem sido muito volátil – inicialmente, ela

passou por um processo de overshooting e, atualmente,

voltou a apresentar uma ligeira tendência de valoriza-

ção –, o que acaba gerando efeitos deletérios sobre a

inflação, o balanço de pagamentos e o crescimento da

economia, a operacionalização da política cambial deve

estar centrada tanto na administração da taxa de câmbio,

quanto na adoção de mecanismos de controle de capi-

tais no curto prazo. É importante ressaltar que controles

de capitais asseguram uma maior autonomia da política

monetária, reduzem o grau de vulnerabilidade externa

da economia (caso a deterioração do balanço de paga-

mentos recrudesça) e estabilizam a taxa de câmbio.

Em suma, o que se espera das AE brasileiras é mais

ousadia e rapidez na implementação de políticas fiscal e

monetária contracíclicas e políticas e medidas cambiais

que assegurem a estabilidade da taxa de câmbio e as

posições das reservas cambiais, fundamentais para criar

um ambiente institucional favorável à tomada de decisão

de gastos dos agentes econômicos, sejam de consumo,

sejam de investimento. Em outras palavras, é necessária

a ação de um Estado-Keynesiano para orientar e ampliar

as atividades econômicas voltadas para os mercados

interno e externo e assegurar a estabilidade econômica.

Referências

Associação Keynesiana Brasileira (2008). Dossiê da

Crise. http://www.ppge.ufrgs.br/akb.

Banco Central do Brasil (2009). http://www.bcb.gov.br

(acessado em 23 de junho).

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2009).

http://www.ibge.gov.br (acessado em 23 de junho).

International Monetary Fund (2009). http://www.imf.

org (acessado em 23 de junho).

Keynes, J.M. (1964). The General Theory, of Employment,

Interest and Money. New York: HBJ Book.

Minsky, H. (1986). Stabilizing an Unstable Economy.

New Haven: Yale University Press.

Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio

Exterior (2009). http://www.mdic.gov.br (acessado em

23 de junho).

Fernando Ferrari Filho

Professor Titular do Departamento de Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e pesquisador do CNPq. Doutor em Eco-

nomia pela Universidade de São Paulo e pós-doutorado em Economia pela University of Tennessee. Ex-professor visitante na University of

Illinois e Visiting Fellow in Economics no Centre for Brazilian Studies, University of Oxford. Autor de artigos publicados em periódicos nacio-nais e internacionais (tais como Revista de Economia Contemporânea,

Revista de Economia Política, Ensaios FEE, Nova Economia, Revista Análise Econômica, Journal of Post Keynesian Economics, Journal of

Economic Issues e Investigación Económica), de capítulos de livros (editados no Brasil e no exterior) e de livros (tanto em autoria quanto

em co-autoria), relacionados aos seguintes tópicos: teoria pós-key-nesiana, macroeconomia aberta, políticas de estabilização e sistema

monetário internacional.

10 O lançamento do programa “Minha Casa, Minha Vida” é uma iniciativa interessante, mas ainda muito tímida diante do déficit habitacional existente no País.

11 Por mais que a redução da Selic possa não ter um efeito imediato sobre as taxas de juros de mercado e, por conseguinte, sobre a oferta e a demanda por créditos, visto que, em um contexto de expectativas adversas acerca do futuro, os agentes preferem liquidez, a sua queda é funda-mental para reduzir o custo de rolagem da dívida pública, viabilizando, assim, a flexibilidade do superávit fiscal.

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abril / junho / 2009

Em matéria publicada recentemente no jornal

“O Globo” (”Ninguém segura esse dólar”, O Globo,

30/05/2009, p. 27) podemos constatar que, em 2009, o

real foi a moeda que mais se valorizou frente ao dólar

americano. Com efeito, o dólar se depreciou, 15.59%

com respeito ao real, 10.20% com respeito ao dólar

canadense, 9.77% frente a libra esterlina, 3.61%, frente

ao peso mexicano e 1.13% frente ao euro. Isso significa

que, ao contrário do que foi dito pelo ministro Guido

Mantega, o movimento recente de apreciação do real

não está restrito ao dólar americano, mas trata-se de

uma apreciação face às demais moedas do mundo. Em

outras palavras, a economia brasileira vem perdendo

competitividade de forma acelerada nos últimos meses.

A atual onda de apreciação da taxa real de câmbio

está sendo motivada pela forte entrada de capitais na

economia brasileira, em função da redução da aversão

ao risco dos investidores internacionais, a qual tem sua

origem nas boas notícias a respeito do desenrolar da

crise financeira internacional. Nesse contexto, ocorre

uma realocação internacional de portfólio, na qual os

investidores internacionais buscam maior rentabili-

dade para a sua carteira de ativos por intermédio de

investimentos mais arriscados em países emergentes,

em particular no Brasil.

Essa redução da aversão global ao risco está produ-

zindo um grande fluxo de entrada de capitais externos

na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Segundo

dados da Bovespa, divulgados na matéria publicada

no jorna “O Globo”, durante o mês de maio (até o dia

26) entraram R$ 5,059 bilhões (saldo entre as compras

e vendas de investidores estrangeiros). Em abril, as

entradas de capital externo na Bovespa foram de R$

3,778 bilhões, ao passo que em março haviam sido de

R$ 1,441 bilhões.

A apreciação cambial ocorrida nos últimos meses

é bastante preocupante. Um dos motivos de preocu-

pação, embora este seja o menos relevante, refere-se

ao fato de que a economia brasileira encontra-se no

meio de uma forte recessão, o que seria motivo sufi-

ciente para que o governo adotasse medidas de polí-

tica econômica para reverter o movimento de aprecia-

ção cambial. Isso porque a apreciação da taxa real de

câmbio tem forte impacto negativo sobre as exporta-

ções líquidas (uma vez dissipado o efeito da Curva J),

dificultando assim a recuperação da demanda agre-

gada, a qual é absolutamente necessária para a reto-

mada do crescimento da economia brasileira.

O problema fundamental da apreciação cambial,

contudo, é o impacto que a mesma tem a longo prazo

Apreciação cambial, crescimento de longo prazo, controles de capitais

e doença holandesa: análise e propostas para o caso brasileiro

José Luis Oreiro

Artigo

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a

sobre a estrutura produtiva da economia, induzindo

a especialização perversa da mesma em atividades

com baixo valor adicionado e baixa elasticidade renda

das exportações. Dessa forma, a apreciação da taxa real

de câmbio produz uma redução permanente da taxa

de crescimento que é compatível com o equilíbrio do

balanço de pagamentos1, condenando assim a econo-

mia a uma situação de semiestagnação.

A respeito da relação entre a taxa real de câmbio e a

elasticidade renda das exportações, um estudo recente

feito por Oreiro, Nakabashi e Lemos (2007) constatou a

existência de uma relação não-linear entre as variáveis

em consideração. Mais precisamente, percebe-se que

enquanto para os países desenvolvidos prevalece uma

relação inversa entre a elasticidade renda das exporta-

ções e a taxa de câmbio real; para os países em desenvol-

vimento a relação entre ambas as variáveis é direta, indi-

cando com isso que um câmbio real depreciado é um

instrumento de importância fundamental para aumen-

tar a taxa de crescimento do produto real que é compa-

tível com o equilíbrio do balanço de pagamentos. Essa

relação pode ser visualizada por intermédio da Figura 1.

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IFS e da base de dados de Maddison (2007)

FIGURA 1 - Elasticidade renda das exportações versus câmbio real (1995-2005)

1 O conceito de taxa de crescimento compatível com o equilíbrio do balanço de pagamentos é devido a Thirwall (1979). Na versão seminal de Thirwall, esse conceito é definido como a taxa de crescimento do produto real para a qual a taxa de crescimento das exportações é igual à taxa de crescimento das importações. No equilíbrio de longo prazo do sistema, onde a taxa real de câmbio deve permanecer constante, a taxa de cresci-mento das exportações é igual ao produto entre a elasticidade-renda das exportações e a taxa de crescimento da renda do resto do mundo; ao passo que a taxa de crescimento das importações é igual ao produto entre a elasticidade-renda das importações e a taxa de crescimento da renda doméstica. Dessa forma, a taxa de crescimento da renda/produto doméstico que garante o equilíbrio do balanço de pagamentos é igual à razão entre as elasticidades-renda das exportações e das importações multiplicada pela taxa de crescimento da renda do resto do mundo. Essa relação ficou conhecida na literatura como “Lei de Thirwall”. A extensão do modelo de Thirwall para o caso de uma economia com conta de capitais aberta foi feita, entre outros, por Moreno-Brid (1998-1999). O resultado fundamental do modelo de Moreno-Brid é que a inclusão dos fluxos de capitais externos não altera de forma significativa a taxa de crescimento que é compatível com o equilíbrio do balanço de pagamentos, de tal forma que a “Lei de Thirwall” pode ser considerada uma hipótese geral e robusta a respeito do crescimento de longo prazo das economias capitalistas.

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abril / junho / 2009

A idéia de que existe uma relação inversa entre a

taxa real de câmbio e a taxa de crescimento de longo-

prazo é corroborada por um estudo empírico recente

feito por Rocha e Oreiro (2009) para países emer-

gentes. Nesse estudo, a partir de uma amostra de 73

países emergentes no período 1980-2000, estima-se

um modelo de painel dinâmico no qual o log da renda

per-capita é regredido contra o valor defasado dessa

variável, a formação bruta de capital fixo como propor-

ção do PIB, a poupança externa como proporção do

PIB, um índice de competitividade externa da econo-

mia (o qual depende fundamentalmente da evolução

da taxa de câmbio) e o grau da abertura da economia

(exportações + importações/PIB). A conclusão obtida

pelos autores é que tanto o déficit em conta corrente

como a apreciação da taxa real de câmbio tem efeitos

negativos e estatisticamente significativos sobre o cres-

cimento de longo prazo dos países emergentes. Dessa

forma, países emergentes – como o Brasil – não devem

permitir a ocorrência de déficits em conta-corrente e/

ou a apreciação da taxa real de câmbio.

Os resultados obtidos a partir do modelo economé-

trico utilizado por Rocha e Oreiro (2009) são apresenta-

dos na Tabela 1.

Para lidar com o problema posto pela apreciação

cambial, o governo federal estuda a introdução de uma

Tabela 1 – Crescimento e poupança externa

System-GMM estimates (I) (II) (III) (IV)

ln(PIB per capita_1)1.006

(0.002)1.003

(0.002)0.996

(0.005)0.987

(0.010)

Poupança externa-0.614(0.114)

-0.778(0.205)

-0.663(0.232)

-0.775(0.345)

ln(competitividade externa)……

0.010(0.001)

0.011(0.003)

0.012(0.005)

ln(investimento/PIB)……

……

0.021(0.004)

0.023(0.006)

Dummies de Ano … … … Sim

Constante-0.032(0.016)

-0.009(0.016)

-0.004(0.044)

0.074(0.082)

AR(1) Teste 0.000 0.000 0.000 0.000

AR(2) Teste 0.143 0.125 0.168 0.158

Hansen J Test 0.99 0.99 0.99 0.99

Difference-in-Hansen Test 0.99 0.99 0.99 0.99

Numero de observações 1195 1195 1195 1195

Número de países 73 73 73 73

* Entre parênteses, o desvio padrão das variáveis.Obs: (1) na especificação (I), Conta Corrente/GFP é variável endógena, instrumentalizadas por suas defasadas e diferenciadas; (2) na especificação (II), Conta Corrente e o Índice de Competitividade das Exportações são variáveis tratadas como endógenas, instrumentalizadas por suas defasadas e diferenciadas; (3) nas especificações (III) e (IV), a Conta Corrente/GDP, Índice de Competitividade das Exportações e o ln(Investimento/GDP) são tratadas como endógenas instrumentalizadas por suas defasadas e diferenciadas.

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a

alíquota de IOF de 1,5% sobre as compras de títulos

públicos feitas por residentes no exterior. Essa medida

teria por objetivo reduzir os ganhos de arbitragem

derivados do diferencial entre a taxa de juros domés-

tica (em 9,25% a.a) e as taxas de juros prevalecentes

nos países desenvolvidos (em torno de 1% a.a). Dessa

forma, o governo espera reduzir o fluxo de entrada de

capitais no Brasil e assim diminuir o ritmo de aprecia-

ção da taxa nominal de câmbio, a qual já está preju-

dicando o esforço exportador brasileiro, ao afastar as

pequenas e as médias empresas do mercado externo

(761 empresas brasileiras deixaram de exportar no

primeiro trimestre de 2009, das quais 449 eram peque-

nas e médias).

No entanto, com base nos dados apresentados sobre

o fluxo de capitais externos para a Bovespa, segue-se

que a introdução do IOF sobre aplicações em renda

fixa terá um efeito muito pequeno – se tanto – sobre

o movimento atual de apreciação da taxa de câmbio.

Além disso, dada a característica de fungibilidade do

capital, a taxação de uma forma específica das entra-

das de capitais no Brasil fará apenas com que o sistema

financeiro brasileiro, altamente sofisticado, descubra

formas de burlar os controles, disfarçando a entrada de

capitais para investimento em renda fixa como opera-

ções para aplicação em renda variável.

A única saída possível é introduzir um controle

abrangente a entrada de capitais no Brasil, ou seja,

devem-se controlar todas as entradas de capitais no

Brasil. Uma proposta concreta nesse sentido seria apro-

veitar a bem sucedida experiência chilena da década

de 1990 e introduzir um requerimento compulsório de

depósito não remunerado pelo prazo de um ano para

todas as entradas de capitais no Brasil (renda fixa, renda

variável, empréstimos e IED). Esse requerimento pode-

ria ser fixado, inicialmente, em 30%, podendo ser ajus-

tado posteriormente, para cima ou para baixo, a depen-

der do seu impacto sobre o saldo da conta financeira.

Se esse controle for bem sucedido, então devere-

mos observar tanto uma interrupção do movimento

de apreciação do câmbio, pelo menos no curto-

prazo, como também uma redução do movimento de

aumento do Ibovespa. Alguns economistas poderão

dizer que este último efeito é indesejável, haja vista que

o “mercado de capitais” é importante para o financia-

mento do investimento e, portanto, para o crescimento

da economia brasileira. Dessa forma, impor contro-

les generalizados à entrada de capitais no Brasil seria

indesejável do ponto de vista do crescimento de longo

prazo.

Essa crítica desconsidera, no entanto, alguns

elementos de fundamental importância para o caso

brasileiro. Em primeiro lugar, o sistema financeiro brasi-

leiro é predominantemente do tipo “credit-based” e não

“capital market based”. Isso significa que a maior parte

do financiamento do investimento em capital fixo é

feito por intermédio de empréstimos do BNDES. Daqui

se segue, portanto, que a cotação de mercado das

ações, por intermédio do assim chamado q de Tobin,

tem um efeito muito pequeno sobre o investimento

em capital fixo. Em segundo lugar, uma parte conside-

rável dos projetos de investimento em capital fixo no

Brasil são voltados para o atendimento do mercado

externo. Dessa forma, uma apreciação permanente da

taxa de câmbio irá atuar no sentido de desestimular as

‘‘

‘‘

Dada a característica de fungibilidade do capital, a taxação de uma forma específica das entradas de capitais no Brasil fará

apenas com que o sistema financeiro brasileiro,

altamente sofisticado, descubra formas de burlar os controles, disfarçando a entrada de capitais para

investimento em renda fixa como operações para

aplicação em renda variável.

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abril / junho / 2009

decisões de investimento. Nesse contexto, medidas que

evitem a apreciação da taxa de câmbio devem produ-

zir resultados favoráveis em termo de estímulo às deci-

sões privadas de investimento e, portanto, sobre o cres-

cimento de longo prazo.

No entanto, a imposição de controles de capitais,

ainda que de caráter abrangente, terá efeitos temporá-

rios sobre a trajetória da taxa real de câmbio no Brasil.

Isso porque nos próximos anos, em função do início da

exploração das reservas de petróleo do pré-sal, o Brasil

deverá incorrer em superávits crescentes da conta

de transações correntes do balanço de pagamentos.

Dessa forma, o cenário que se pode vislumbrar para

a economia brasileira num horizonte de 10 a 15 anos

é de excesso estrutural de divisas, o qual deverá pres-

sionar para baixo a taxa real de câmbio, induzindo a

especialização da economia em setores intensivos em

recursos naturais. Em outras palavras, o Brasil enfren-

tará, em breve, o problema da “doença holandesa”.

Nesse contexto, a apreciação da taxa real de câmbio,

motivada pelos superávits crescentes na conta de tran-

sações correntes, poderá resultar numa desindustria-

lização da economia brasileira, reduzindo assim o seu

potencial de crescimento de longo prazo e, consequen-

temente, o ritmo de criação de empregos.

A importância da indústria para o crescimento de

longo prazo foi estabelecida por Lord Nickolas Kaldor

por intermédio das assim chamadas “Leis de Kaldor”.

Segundo Kaldor (1966, 1970), o crescimento de longo-

prazo das economias capitalistas é caracterizado pela

existência das seguintes regularidades:

I) Existência de uma forte correlação positiva entre

o crescimento do PIB e o crescimento da produção

industrial, ou seja, os países que apresentam maior taxa

de crescimento econômico são precisamente aqueles

nos quais a produção industrial cresce mais rápido;

II) Existência de uma forte correlação entre o cres-

cimento da produção industrial e o crescimento da

produtividade na indústria, ou seja, uma aceleração do

ritmo de crescimento da produção industrial está asso-

ciada a um aumento da taxa de crescimento da produti-

vidade na indústria. A presença de economias de escala,

estáticas e dinâmicas, nos permite afirmar que a rela-

ção de causalidade ocorre do crescimento da produção

industrial para o crescimento da produtividade, isto é,

um aumento da taxa de crescimento da produção

industrial deverá causar um aumento da taxa de cresci-

mento da produtividade na indústria;

III) Existência de uma forte correlação positiva entre

o crescimento da produção industrial e dos serviços

voltados para a indústria, e o crescimento da produtivi-

dade fora da indústria, notadamente no setor de servi-

ços em geral, na agricultura e setores extrativistas. Isso

porque tais setores estão sujeitos a rendimentos margi-

nais decrescentes, ao passo que na indústria prevale-

cem rendimentos marginais constantes ou crescen-

tes. Dessa forma, uma realocação da força de trabalho

disponível da agricultura e do setor de serviços para a

indústria deverá resultar num aumento da produtivi-

dade do trabalho no setor agrícola e de serviços, contri-

buindo assim para um aumento da produtividade do

trabalho na economia como um todo.

Nesse contexto, para evitar a desindustrialização da

economia brasileira em função do problema causado

‘‘

‘‘

A imposição de controles de capitais, ainda que de caráter abrangente, terá

efeitos temporários sobre a trajetória da taxa real

de câmbio no Brasil. Isso porque nos próximos anos,

em função do início da exploração das reservas de petróleo do pré-sal, o Brasil

deverá incorrer em superávits crescentes da conta de transações correntes do balanço de pagamentos.

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Rev

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a

pela “doença holandês”, propomos a criação de um

Fundo de Estabilização Cambial, com recursos forne-

cidos pelo Tesouro Nacional, com um aporte inicial

de capital de R$ 300 bilhões (aproximadamente US$

150 bilhões, a taxa de câmbio de junho de 2009). O

Fundo de Estabilização Cambial deverá atuar como

um market-maker no mercado de câmbio, adquirindo

moeda estrangeira toda a vez que a taxa de câmbio

se apreciar de maneira persistente com respeito ao

valor estimado da taxa real de câmbio de equilíbrio; e

vendendo moeda estrangeira toda vez que a taxa de

câmbio se apreciar de forma persistente com respeito

ao valor de equilíbrio dessa taxa. Deve-se ressaltar que

não haveria nenhuma incompatibilidade entre a admi-

nistração da taxa de câmbio e a obtenção das metas

de inflação, uma vez que as operações de compra e

venda de moeda estrangeira seriam feitas com recur-

sos do Tesouro Nacional, não tendo nenhum impacto

sobre a base monetária. Sendo assim, propomos que o

regime cambial brasileiro continue sendo um regime

de câmbio flutuante, mas no qual o governo possui um

papel importante como demandante e/ou ofertante

final de moeda estrangeira.

Referências

KALDOR, N. (1966). Causes of the Slow Rate of

Economic Growth of The United Kingdon. Cambridge

University Press: Cambridge.

---------------- (1970). The Case for Regional Policie.

Scottish Journal of Political Economy, Novembro.

KENNEDY, C; THIRWALL, A.P. (1979). Import Penetration,

Export Performance and Horrod´s Trade Multiplier.

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World Economy: 1 – 2003 AD. Disponível em: www.

ggdc.net. Acesso em: 01/03/2007.

MORENO-BRID, J.C. (1998-1999). On Capital Flows and

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OREIRO, J.L; NAKABASHI, L; LEMOS, B.P. (2007). A

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Agregada: Teoria e Aplicações ao Caso Brasileiro.

Texto para Discussão 01/2007, Centro de Pesquisas

Econômicas, Universidade Federal do Paraná. Disponível

para download no sítio: http://www.economia.ufpr.br/

publica/textos/2007/texto_01_2007.pdf.

ROCHA, M; OREIRO, J.L. (2009). Capital Accumulation,

External Indebtedness and Macroeconomic

Performance of Emerging Economies. Anais do 6th

International Conference Developments in Economic

Theory and Policy, Universidade do País Basco, Bilbao.

José Luis Oreiro

Doutor em Economia da Indústria e da Tecnologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2000). Tem experiência

na área de Economia, com ênfase em Dinâmica Macroeconômica, atuando principalmente nos seguintes temas: Acumulação de

capital, crescimento econômico, autonomia de política monetária, taxa de juros e dinâmica não linear. Publicou cerca de 50 artigos em revistas cientificas no Brasil e no exterior como, por exemplo,

o Journal of Post Keynesian Economics, Investigacion Economica, Revista Brasileira de Economia, Revista de Economia Política e Estudos Econômicos. É co-organizador do livro “Agenda Brasil - políticas econômicas para crescimento com estabilidade de

preços” publicado pela Monole em 2003, bem como o livro “Sistema Financeiro: uma analise do setor bancário brasileiro”

publicado pela Campus em 2007. Leciona as disciplinas de Evolução das Idéias Econômicas e Sociais (EVIES) e Macroeconomia

do Desenvolvimento nos cursos de graduação e pós-graduação em economia da FACE/UNB. Recebeu duas vezes o Prêmio Brasil

de Economia (Cofecon), em 2005, e em 2º lugar na categoria artigo, e o Prêmio SOF de Monografias 2007 (2º lugar). Está classificado entre os 20% mais produtivos economistas do Brasil segundo o

critério REPEC da Universidade de Connecnicut.

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