2014. Escola de Gestão Pública – EGP. Todos os dire itos...
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2014. Escola de Gestão Pública – EGP. Todos os direitos reservados.
A responsabilidade pelo conteúdo e imagens desta obra é do(s) respectivo(s) autor(es). O conteúdo
desta obra foi licenciado temporária e gratuitamente para utilização no âmbito do Sistema Prefeitura
Municipal de Porto Alegre, através da EGP. O leitor se compromete a utilizar o conteúdo desta obra para
aprendizado pessoal, sendo que a reprodução e distribuição ficarão limitadas ao âmbito interno dos
cursos.
A citação desta obra em trabalhos acadêmicos e/ou profissionais poderá ser feita com indicação da
fonte. A cópia desta obra sem autorização expressa ou com intuito de lucro constitui crime contra a
propriedade intelectual, com sanções previstas no Código Penal, artigo 184, Parágrafos 1º ao 3º, sem
prejuízo das sanções cíveis cabíveis à espécie.
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Catalogação elaborada pela Bibliotecária Gicele Farias Gomes – CRB 10/2195
L269c Langaro, Nelson Barbieux. Contexto da Administração Pública. Prefeitura Municipal de Porto Alegre - PMPA / Secretaria Municipal de
Administração – SMA / Nelson Barbieux Langaro. -- Porto Alegre: PMPA/SMA/ EGP-Escola de Gestão Pública: PMPA, 2014.
92 p.il.
Módulo 2: Líder na Gestão Pública Inclui bibliografia 1. Administração Pública. 2. Estado. 3. Modelos de Estado, Governo e Administração Pública. 4. Serviços Públicos.
CDU 35
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PREFEITO DE PORTO ALEGRE José Fortunati
VICE-PREFEITO Sebastião Melo
SECRETÁRIO MUNICIPAL DE ADMINISTRAÇÃO Paulo Guimarães
SECRETÁRIO MUNICIPAL DE ADMINISTRAÇÃO ADJUNTO Carlos Fett
COORDENADOR DA ESCOLA DE GESTÃO PÚBLICA José Carlos Lucas Machado
Escola de Gestão Pública – EGP
Rua Siqueira Campos 1300, sala 955– 9o andar – Porto Alegre/RS – CEP: 90010-170
Tel: (51) 3289-1177
E-mail: [email protected]
Twitter: @EGft_ftortoAlegre
Facebook: facebook.com/escoladegestaopublica
ELABORAÇÃO Nelson Barbieux Langaro
COMISSÃO DE AVALIAÇÃO E ACOMPANHAMENTO Elisa Marcon Aquino Kerber
Denise Regina dos Santos Barcellos
Tanise Amália Pazzim
EQUIPE EGP
Adriana Beiler
Ana Claudia Aguiar Passos
Claudia Gloger
Eduardo da Cunha Fonseca
Fernando Telles de Paula
Gicele Farias Gomes
Giovane Pasqualito Fialho
Marcio Vedana
Natasha Duarte Amarante
Nelson Barbieux Langaro
Nissia Fortes Sauer
Roberto de Souza Del Frari
Simone Rosa da Matta
José Carlos Lucas Machado
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Secretaria Municipal de Administração (SMA)
A Secretaria Municipal da Administração - SMA é o órgão central dos sistemas
de pessoal e desenvolvimento de recursos humanos, documentação, transportes
administrativos e modernização administrativa do município. Cabe à SMA a criação de
órgãos, com suas respectivas estruturas organizacionais, racionalização e organização
dos processos de trabalho.
Entre as suas responsabilidades está a elaboração de legislação e
regulamentação de todo o sistema de pessoal, Estatuto dos Servidores Públicos (Lei
Complementar 133/85), Planos de Carreira no âmbito da administração centralizada,
orientação da administração descentralizada, e exame dos projetos de lei do Executivo
e do Legislativo.
Além de realizar a capacitação e promover o aprimoramento funcional dos
servidores, compete à SMA o desenvolvimento de pesquisas com vistas à fixação da
política salarial, a realização de concursos públicos, o ingresso e posse de servidores,
oferecendo, ainda, bolsas de estágios, bem como subsídios de alimentação e
transporte.
A SMA orienta, coordena e controla as atividades relativas à despesa de
pessoal, ao processamento do pagamento dos servidores, à elaboração de atos
administrativos, ao lançamento de registros funcionais, ao controle de gratificações,
aos benefícios e às aplicações da legislação no âmbito da administração centralizada.
A SMA também administra a documentação oficial do município, conservada no
Arquivo Municipal, devidamente controlada e numerada pelo Protocolo Central, realiza
a triagem e a microfilmagem dos papéis oficiais. Compete-lhe, ainda, estudar, elaborar,
organizar, coordenar e acompanhar as atividades relativas à organização, à
racionalização e à modernização administrativa, bem como às políticas de recursos
humanos, de qualificação e de desenvolvimento funcional no âmbito municipal.
Também é sua atribuição coordenar o sistema de transportes oficiais da
administração centralizada, além de administrar os serviços de divulgação oficial do
município - por meio do Diário Oficial de Porto Alegre - DOPA e os serviços de
manutenção, conservação e segurança do Edifício Intendente Montaury e demais
prédios ocupados pela Secretaria.
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Caracterização da Escola de Gestão Pública (EGP)
A EGP é a área da SMA responsável pelas práticas relacionadas à
aprendizagem no âmbito profissional, dentre elas, treinamento, desenvolvimento,
qualificação, atualização, aperfeiçoamento, aprimoramento e educação. Sua sede está
localizada na Rua Siqueira Campos, nº 1300, 9°andar, sala 955.
As atividades de formação e capacitação são desenvolvidas no 14º andar, que
contempla um auditório, uma sala de informática e três salas de aula.
Missão
Produzir e difundir conhecimentos científicos ligados à gestão pública e desenvolver
competências profissionais que potencializem a eficácia das estratégias do Município
de Porto Alegre.
Visão
Ser reconhecida, no âmbito municipal e nacional, pela excelência na qualificação
profissional de servidores e na produção de conhecimentos relevantes para a eficácia
da gestão pública municipal.
Valores
Visão estratégica
Inovação
Cientificismo
Excelência
Eficácia
Memória institucional
Objetivos Estratégicos
1. Qualificar a gestão pública municipal, através do desenvolvimento dos servidores,
nas competências necessárias ao exercício dos cargos, funções e ao serviço público;
2. Promover a construção de conhecimentos, no âmbito da gestão pública, e a
permanente qualificação dos servidores da Prefeitura Municipal de Porto Alegre;
3. Buscar maior resolutividade das políticas públicas, mediante a qualificação dos
servidores públicos municipais;
4. Atuar, com excelência, na qualificação e aperfeiçoamento profissional dos servidores
públicos e no desenvolvimento de metodologias gerenciais aplicáveis na administração
municipal.
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Apresentação do Curso
Módulo II – Líder na Gestão Pública
Curso 2: O Contexto da Administração Pública
Objetivos Específicos:
O Programa visa capacitar os participantes a:
• Conhecer os papéis e a responsabilidade das funções de liderança e sua relação com a prática
da gestão pública;
• Aplicar os princípios que dão base ao Serviço Público no exercício da gestão organizacional.
Impacto no desenvolvimento das seguintes Competênci as:
Comprometimento com o Serviço Público; Foco no Serviço ao Cidadão; Visão Estratégica.
Conteúdo Programático:
Estado
• Elementos do Estado
• Noção conceitual de Estado
• Público e o Privado
Administração Pública
• Conceito
• Natureza e Fins da Administração Pública
• Princípios da Administração
• Prestação dos serviços pela Administração Pública
• Poderes e Deveres do Administrador Público
Serviços Públicos
• Conceito de Serviço Público
• Classificação dos Serviços Públicos
• Servidores Públicos
• Cargos e Funções
Modelos de Estado, Governo e Administração Pública
• Administração Pública Patrimonialista
• Administração Pública Burocrática
• Administração Pública Gerencial
• Reforma do Estado no Brasil
• Proposta de um novo modelo de Gestão Pública
Carga Horária: 16 horas/aula.
Este curso integra o 2º Módulo – Líder na Gestão Pública que faz parte de um Programa composto por
cinco Módulos Temáticos por competências.
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SUMÁRIO
1 ESTADO......................................................................................................................... 10
1.1 Introdução: Elementos do Estado ......................................................................... 10
1.2 Noção Conceitual de Estado................................................................................. 10
1.3 Organização Fundamental do Estado na Constituição de 1988 e o Município ..... 13
1.4 Público e o Privado: .............................................................................................. 17
2 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA .............................. .......................................................... 21
2.1 Conceito................................................................................................................ 21
2.2 Natureza e Fins da Administração Pública............................................................ 23
2.3 Princípios da Administração.................................................................................. 24
2.3.1 Princípios expressos ...................................................................................... 24
2.3.2 Princípios não expressos ou implícitos:.......................................................... 27
2.3.3 Outros princípios que merecem destaque ...................................................... 29
2.4 Prestação dos Serviços pela Administração Pública............................................. 30
2.4.1 Administração Pública Direta (centralizada): .................................................. 31
2.4.2 Administração Pública Indireta (descentralizada): .......................................... 31
2.4.3 Outras formas de descentralização dos serviços públicos: ............................ 34
2.5 Poderes e Deveres do Administrador Público....................................................... 35
3. SERVIÇOS PÚBLICOS.................................. ................................................................ 39
3.1 Conceito de serviço público .................................................................................. 39
3.2 Classificação dos Serviços Públicos ..................................................................... 40
3.3 Servidores Públicos: ............................................................................................. 43
3.4 Cargos e Funções:................................................................................................ 44
3.5 Estabilidade do servidor público:........................................................................... 46
3.6 Seleção de pessoas no setor público:................................................................... 46
3.6.1 Concurso Público: .......................................................................................... 46
3.7 Exoneração e demissão:....................................................................................... 47
3.8 Responsabilidade dos Servidores: ........................................................................ 48
3.9 Responsabilidade por improbidade administrativa: ............................................... 48
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3.10 Lei de Responsabilidade Fiscal ...................................................................... 49
4 MODELOS DE ESTADO, GOVERNO E ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA . ....................... 51
4.1 Administração Pública Patrimonialista .................................................................. 52
4.2 Administração Pública Burocrática........................................................................ 53
4.3 Administração Pública Gerencial .......................................................................... 59
4.3.1 Reforma do Estado no Brasil:......................................................................... 63
4.3.2 A Nova Gestão Pública- NGP......................................................................... 70
4.3.3 Consenso de Washington:.............................................................................. 72
4.3.4 O movimento reinventando o governo............................................................ 73
4.3.5 Problemas e Contradições da Nova Gestão Pública – Administração Pública Gerencial ........................................................................................................ 78
4.3.6 Proposta de um novo modelo de Gestão Pública:.......................................... 80
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................... ....................................................85
GLOSSÁRIO.......................................... .......................................................................88
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1 ESTADO
1.1 Introdução: Elementos do Estado
Considerando grande parte dos estudiosos da área de direito administrativo, é
possível referir os principais elementos de Estado , quais são:
População: entende-se pela reunião de indivíduos num determinado local,
submetidos a um poder central. O Estado vai controlar essas pessoas, visando o bem
comum. A população pode ser classificada como nação, quando os indivíduos que
habitam o mesmo território possuem como elementos comuns a cultura, a língua, a
religião e sentem que há, entre eles, uma identidade; ou como povo, quando há
reunião de indivíduos num território e que, apesar de se submeterem ao poder de um
Estado, possuem nacionalidades, cultura, etnias e religiões diferentes.
Território: espaço geográfico onde reside determinada população. É limite de
atuação dos poderes do Estado. Vale dizer que não poderá haver dois Estados
exercendo seu poder num único território e os indivíduos que se encontram num
determinado território estão obrigados a se submeterem.
Soberania: é o exercício do poder do Estado, internamente e externamente. O
Estado, dessa forma, deverá ter ampla liberdade para controlar seus recursos, decidir
os rumos políticos, econômicos e sociais internamente e não depender de nenhum
outro Estado ou órgão internacional. A essa autodeterminação do Estado dá-se o nome
de soberania.
‘ 1.2 Noção Conceitual de Estado
Para compreendermos o significado de Estado, inicialmente faremos uma breve
descrição dos conceitos e, após, abordaremos como esse se organiza e se estrutura.
Para Meirelles (2012, p. 62),
10
[...] O conceito de Estado varia segundo o ângulo em que é considerado. Do ponto de vista sociológico, é corporação territorial dotada de um poder de mando originário (Jellinek); sob o aspecto político, é comunidade de homens, fixada sobre território, com potestade superior de ação, de mando e de coerção (Malberg); sob prisma constitucional, é pessoa jurídica territorial soberana (Biscaretti di Ruffia): na conceituação do nosso Código Civil, é pessoa jurídica Direito Público Interno (art. 41,I). Como ente personalizado, o Estado tanto pode atuar no campo do Direito Público como no do Direito Privado, mantendo sempre sua única personalidade de Direito Público, pois a teoria da dupla personalidade do Estado acha-se definitivamente superada. Esse é o Estado de Direito, ou seja, o Estado juridicamente organizado e obediente às suas próprias leis.
Para o autor, o Estado é constituído de três elementos originários e
indissociáveis: Povo (é o componente humano do Estado), Território (a sua base física)
e o Governo Soberano (elemento condutor do Estado, que detém e exerce o poder
absoluto de autodeterminação e auto-organização emanado do povo).
Segundo o Dicionário Houaiss (2009), o Estado é um conjunto das instituições
(governo, forças armadas, funcionalismo público, etc.) que controlam e administram
uma nação; também é país soberano, com estrutura própria e politicamente
organizado.
Para Matias–Pereira (2010, p. 01),
O Estado existe fundamentalmente para realizar o bem-comum. Os teóricos que cuidam da análise desta finalidade do Estado desdobram- se em três vertentes: o bem-estar, a segurança e a justiça. A interdependência dos fins do Estado assume particular importância em relação à grande e última finalidade do Estado: a promoção do bem- comum. O Estado, nesse sentido, enquanto forma de organização política por excelência da sociedade, pode ser aceito como espaço natural de desenvolvimento do poder político.
O autor correlaciona também o conceito de cidadão e o exercício da cidadania
com o Estado, ou seja, o Estado é o lugar no qual o cidadão exerce a sua cidadania1.
1 Segundo Dalmo Dallari (2008), "a cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo. Quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social".
11
Assim, toda a nova proposta de reforma do Estado deve considerar a premissa de
melhorar a qualidade da prestação de serviço público com a intenção de incrementar
cada vez mais essa cidadania e favorecer a sociedade. Já, para a Administração
Pública, o objetivo primordial é a promoção e desenvolvimento dos seus cidadãos,
mediante a garantia de seus direitos, os quais estão estabelecidos na CF/88.
De outra forma, ser cidadão é fazer valer seus direitos e cumprir seus deveres. A
cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de
participar ativamente da vida e do governo de seu povo.
Segundo Marshall (1967 apud SANTOS, 2009, p. 24):
a cidadania implica um sentimento de pertencimento e lealdade a uma civilização, que se constitui em patrimônio comum de uma dada coletividade. Tal pertencimento, por sua vez, se estabelece a partir dos deveres de cada indivíduo para com o Estado, mas também – e sobretudo – pelos direitos que este Estado lhe garante:[...] direitos civis [...] direitos políticos [...] direitos sociais2.
Matias–Pereira (2010), ao falar sobre o Estado e a reforma do mesmo ressalta
que é importante considerarmos que a Reforma de Estado precisa estar apoiada na
defesa deste enquanto coisa pública, no qual o patrimônio público deve ser de todos e
para todos, atendendo as demandas dos cidadãos. Além disso, o autor afirma que
mesmo que a Administração Pública se inspire no modelo de gestão privadas,
devemos ressaltar que nunca se deve perder a perspectiva de que o setor privado visa
ao lucro, enquanto a Administração Pública busca realizar sua função social.
Em outras palavras, o autor afirma que a existência do Estado ocorre para a
realização do bem comum, observando-se a três vertentes essenciais que são o bem-
estar, a segurança e a justiça.
Já para Cicco e Gonzaga (2011, p.47), o Estado é:
Uma instituição organizada política, social e juridicamente, ocupa um território definido e, na maioria das vezes, sua lei maior é uma Constituição. É dirigido por um governo soberano, reconhecido interna e
2 Consultar glossário.
12
externamente, sendo responsável pela organização e pelo controle social, pois detém o monopólio legítimo do uso da força e da coerção.
Outro autor, Coelho (2009a), comenta que o Estado exerce o poder supremo
sobre o conjunto de indivíduos que ocupam um determinado território e exerce
influência na ação e comportamento das pessoas.
O autor vai além, quando afirma que:
Estado e poder são, portanto, dois termos indissociáveis. Mas a capacidade de uma organização exercer o poder sobre o conjunto de indivíduos que ocupa um território não é suficiente para definir o Estado. Se isso bastasse, teríamos – por exemplo – de reconhecer como Estado as organizações criminosas que controlam algumas favelas do Rio de Janeiro e outros bairros das periferias de grandes cidades brasileiras, uma vez que são a força dominante que dita as regras de comportamento a serem seguidas por todos os seus habitantes. Ou então teríamos de reconhecer como Estado as organizações guerrilheiras que ocupam e controlam parte do território da Colômbia. (COELHO, 2009a, p. 14)
Assim, para que seja possível diferenciar o poder exercido pelo Estado do poder
de outros grupos que o exercem em territórios ou com alguns indivíduos mediante o
uso de força física, é necessário introduzir a noção fundamental da legitimidade, ou
seja, esse poder tem que ser outorgado pela sociedade. Dessa forma, o Estado não
admite concorrência e exerce de forma monopolista o poder político, que é o poder
supremo nas sociedades contemporâneas.
Norberto Bobbio (apud COELHO, 2009a), afirma que o poder do Estado também
apresenta duas características distintivas do poder estatal, que são:
• Universalidade: o Estado toma decisões em nome de toda a coletividade que ele
representa e não apenas da parte que exerce o poder.
• Inclusividade: em princípio, nenhuma esfera da vida social encontra-se fora do
alcance da intervenção do Estado.
Serrano, por sua vez, afirma:
Na concepção republicana democrática o Estado é um instrumento criado pela sociedade para realizar tarefas coletivas. A noção básica é muito simples de entender. A sociedade se reuniu, através de seus representantes eleitos, para criar ou constituir o Estado Brasileiro.
13
Constituir significa fazer nascer o Estado. Significa organizá-lo, estabelecer sua estrutura e modo de funcionamento e, fundamentalmente, oferecer poder e autoridade para realizar as tarefas coletivas (funções públicas) a que se destina. E, ao mesmo tempo, estipular os limites ao exercício deste Poder (direitos dos indivíduos submetidos a sua autoridade) (SERRANO, 1995).
Para o autor, tanto a estrutura, a finalidade e a forma de funcionamento do
Estado são estabelecidas em conjunto com outros valores sociais numa carta de regras
e princípios, a qual se tornará numa espécie de contrato para os cidadãos e
governantes que é a Constituição da República. Por outro lado, esta Constituição
espelha um conjunto de valores sociais básicos que criou o Estado, os quais nortearão
todas as suas ações.
Ainda, de acordo com Serrano, a nossa Constituição atribui ao Estado a
realização de três tarefas coletivas (funções públicas) básicas, ou seja, três tarefas ou
funções fundamentais, das quais, decorrem todas as outras. Estas três funções básicas
do Estado são as seguintes:
1) Administrar os interesses públicos ou coletivos;
2) Estabelecer normas de convivência entre os indivíduos e entre o indivíduo e o
Estado;
3) Aplicar essas normas de convivência, julgando quem tem razão, quando
houver um conflito de interesses entre indivíduos ou entre o indivíduo e o Estado
1.3 Organização Fundamental do Estado na Constituiç ão de 1988 e o
Município
Além disso, o Estado é dividido em três poderes: o Legislativo, o Executivo e o
Judiciário, independentes e harmônicos entre si e com suas funções reciprocamente
indelegáveis (CF, art. 2º). Cada poder tem suas atribuições, a saber: A função do
Legislativo é a elaboração da lei (função normativa), a função do Executivo é a
conversão da lei em ato individual e concreto (função administrativa) e a função do
Judiciário é a aplicação coativa da lei aos litigantes (função judicial).
14
Na Constituição Federal da República de 1988, a organização do Estado é
esboçada da seguinte maneira:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Art. 18º A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, Estados, o Distrito Federal, e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.
Outro aspecto importante que Serrano ressalta é o fato do Estado Brasileiro ser
organizado sob a forma de Federação, onde o exercício do poder é distribuído em três
instâncias: a União, os Estados e os Municípios. Cabe lembrar que uma instância não é
subordinada a outra, mas as três instâncias são subordinadas às regras da
Constituição. Por outro lado, cada instância tem uma competência diferente das outras,
ou seja, estas realizam tarefas coletivas diferentes entre si e só podem editar normas
(leis) e realizar atos que estejam previstos na sua competência. Quem estipula as
competências da União, dos Estados e dos Municípios é a Constituição.
Já para Santos (2006, p.37), “O Estado é uma entidade com poder de regular e
disciplinar as relações ente os membros de uma sociedade, visando a garantir a
sobrevivência e o bem-estar geral da população. É uma criação da própria sociedade
moderna, para servi-la”.
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O autor descreve a construção do Estado como uma delegação da sociedade:
Assim, a sociedade transferiu a essa instituição, por ela organizada, parte de seu poder de ação e de sua liberdade, para que, por meio das leis, da aplicação da justiça e do recolhimento de impostos, fosse garantida a ordem interna e promovido o atendimento às necessidades básicas de toda a população. (SANTOS, 2006, p. 37)
Continuando, o autor comenta que o Estado se organizou de diferentes
maneiras, mas manteve uma estrutura composta por órgãos públicos, um corpo de
servidores (civil e militar) um grupo de dirigentes. Toda essa estrutura é mantida por
arrecadação de impostos e tributos.
O autor distingue, também, as entidades estatais que organizam uma federação:
A União (pessoa jurídica de direito público, investida pela Constituição, que exerce, em
parte, a soberania nacional), Estado - Membro (é um Estado que tem seus próprios
órgãos com estatuto próprio e uma entidade estatal sobreposta aos Estados Federais),
Município (pessoa jurídica de direito público dotado de capacidade civil plena para
exercer direitos e obrigações em seu próprio nome).
Já, para Bächtold (2008, p. 17):
O conceito de Estado moderno está estreitamente vinculado com a noção de poder institucionalizado, isto é, o Estado se forma quando o poder se assenta em uma instituição e não em um indivíduo. Assim, podemos dizer que, no Estado moderno, não há poder absoluto, pois mesmo os governantes devem se sujeitar ao que está estabelecido na Lei.
Continuando, o autor descreve como se estrutura a Organização do Estado
brasileiro:
República – Forma de governo em que é eleito um representante para ser o
chefe de estado, com característica da eleição periódica desse representante.
Federação - é o nome atribuído à união de Estados diferentes em torno de uma
administração única, onde cada um dos Estados federados perde a sua
soberania em si, em face de uma soberania de um Estado Federal.
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A Administração Pública é exercida em cada um dos três níveis: Federal,
Estadual e Municipal. Para cada um dos níveis de administração há atribuições gerais
e específicas.
Considerando a nossa realidade mais próxima, a esfera municipal, descrevemos
a seguir as competências do município, conforme a Constituição Federal/88:
Art. 30 - Compete aos Municípios: I - legislar sobre assuntos de interesse local; II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber; III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei; IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual; V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial; VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação pré-escolar e de ensino fundamental; VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população; VIII - promover, no que couber adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano; IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.
Art. 31 - A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei.
É importante salientar que o aparelho de Estado é uma estrutura organizacional
do Estado, em seus três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) e três níveis
(União, Estados-membros e Municípios). O aparelho do Estado é constituído pelo
governo, pela cúpula dirigente nos três poderes, por um corpo de funcionários e pela
força militar. O Estado, por sua vez, é mais abrangente que o aparelho, porque
compreende adicionalmente o sistema constitucional-legal, que regula a população nos
limites de um território.
Por fim, devemos lembrar que o Estado Brasileiro está consolidado como um
Estado de Direito , ou seja, é aquele em que o poder exercido é limitado pela Ordem
Jurídica vigente, que irá dispor, especificamente, desde a forma de atuação do Estado,
17
suas funções e limitações, até as garantias e direitos dos cidadãos. Dessa forma, o
Estado e sua população estão submetidos ao Direito.
Em síntese, podemos concluir que o Estado é uma figura abstrata que foi criada
pela sociedade para atender e regulamentar a vida em sociedade e, essencialmente,
destinada a atender a coletividade e a preservar o interesse público. Pode ser
entendida também como uma criação humana destinada a manter a coexistência
pacífica dos indivíduos, a ordem social, de forma que os seres humanos consigam se
desenvolver, e proporcionar o bem estar a toda sociedade.
Hoje, de forma esquemática, podemos considerar que o Estado moderno tem
como Forma de governo a Monarquia e a República. E o Sistema de governo se
caracteriza por ser Presidencialista ou Parlamentarista. Já o Regime de governo pode
ser Democrático ou Autoritário (Totalitário)3.
1.4 Público e o Privado:
Conforme Coelho (2009b, p. 16)
[...] a clara separação entre esfera pública e esfera privada é a marca distintiva das sociedades capitalistas e democráticas contemporâneas em relação às demais. Dessa separação fundamental decorrem todas as outras diferenciações relevantes no interior dessas sociedades, como a existente entre um Direito Público e um Direito Privado; entre Estado e sociedade civil; e entre poderes do Estado e direitos do cidadão.
Para o autor, na esfera pública , os indivíduos são sempre concebidos como
cidadãos, seja servidores do Estado, usuários dos serviços públicos ou sujeitos
submetidos às leis e normas impostas pelo Estado.
Já na esfera privada , os indivíduos são concebidos como pessoas físicas e/ou
jurídicas que visam à satisfação de seus interesses particulares e objetivos –
econômicos, políticos, religiosos, culturais etc.
Diferenças entre Administração Pública e Privada
3 Ver Glossário.
18
Segundo Santos (2006), na Administração Pública o gestor tem a obrigação de
cumprir fielmente os preceitos do direito e da moral administrativa que regem a sua
atuação e essas ordens e instruções estão concretizadas nas leis, regulamentos. Daí o
dever indeclinável do gestor público de agir segundo os preceitos do direito e da moral
administrativa, porque tais aspectos é que expressam a vontade do titular dos
interesses administrativos – o povo – e condicionam os atos a serem praticados no
desempenho do munis público que lhe é confiado. Ao contrário, na administração
privada, o administrador recebe as ordens e instruções dono ou proprietário e os
objetivos são somente o lucro desses ou a satisfação de interesses particulares.
Para Meirelles (2012), na Administração particular e privada é lícito fazer tudo
que a lei não proíbe, mas na administração pública só é permitido fazer o que a lei
autoriza.
Santos (2006), elabora uma síntese sobre algumas diferenças básicas entre
administrações pública e privada.
Quadro 1
Aspecto Administração pública Administração privada
Político Funcionamento e resultados, bons ou maus, têm impacto político. O processo decisório sofre fortes ingerências políticas.
Há autonomia decisória. O impacto político é menor.
Econômico Orientada para o bem-estar social. Output em grande parte não mensurável. Organizações não competitivas no mercado. Rentabilidade dispensável (custo-benefício)
Orientada para o lucro. Output mensurável. Organização competitiva. Rentabilidade vital para o crescimento e sobrevivência.
Organizacional Grandemente afetada e/ou dirigida por forças externas. Objetivos econômicos e sociais. Alto grau de interdependência entre as organizações. Órgãos com funções múltiplas e concomitantes. Carência de bancos de dados. Gerência com grande rotatividade. Gerentes não assumem riscos próprios.
Tem controle mais amplo sobre ela mesma. Objetivos predominantemente econômicos. Maior autonomia em relação a outras organizações. Órgãos com funcionalidade específica e bem discriminada. Existência freqüente de bancos de dados. Gerências mais estáveis. Há riscos de emprego de capital se
19
houver insucesso.
Obs.: Para o funcionamento do setor público, outros aspectos relativos a recursos humanos (admissão, demissão, número, remuneração etc.), compras e contratações, obtenção de recursos financeiros etc. tem leis específicas
Fonte: SANTOS (2006, p. 19)
Sobre a natureza da gestão pública e da gestão privada, utilizamos os conceitos
desenvolvidos pelo Programa de Gestão da Secretaria de Gestão – Ministério do
Planejamento, Orçamento e Gestão, contidos no Instrumento para Avaliação da Gestão
Pública – Ciclo 2008-2009 (Brasil, 2009)4, onde são apontadas diversas características
que diferenciam as organizações da administração pública das organizações da
iniciativa privada, como:
• Enquanto as organizações do mercado são conduzidas pela autonomia da vontade
privada, as organizações públicas são regidas pela supremacia do interesse público e
pela obrigação da continuidade da prestação do serviço público.
• O controle social é requisito essencial para a administração pública contemporânea
em regimes democráticos, o que implica em garantia de transparência de suas ações e
atos e na institucionalização de canais de participação social, enquanto que as
organizações privadas estão fortemente orientadas para a preservação e proteção dos
interesses corporativos (dirigentes e acionistas).
• A administração pública não pode fazer acepção (predileção) de pessoas, deve tratar
a todos igualmente e com qualidade. O tratamento diferenciado restringe-se apenas
aos casos previstos em lei. Por outro lado, as organizações privadas utilizam
estratégias de segmentação de “mercado”, estabelecendo diferenciais de tratamento
para clientes preferenciais.
• As organizações privadas buscam o lucro financeiro e formas de garantir a
sustentabilidade do negócio. A administração pública busca gerar valor para a
sociedade e formas de garantir o desenvolvimento sustentável, sem perder de vista a
obrigação de utilizar os recursos de forma eficiente.
• A atividade pública é financiada com recursos públicos, oriundos de contribuições
compulsórias de cidadãos e empresas, os quais devem ser direcionados para a
4 O Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratização – GesPública – foi instituído pelo
Decreto nº 5.378 de 23 de fevereiro de 2005
20
prestação de serviços públicos e a produção do bem comum. A atividade privada é
financiada com recursos de particulares que têm legítimos interesses capitalistas.
• A administração pública tem como destinatários de suas ações os cidadãos, sujeitos
de direitos, e a sociedade, demandante da produção do bem comum e do
desenvolvimento sustentável. A iniciativa privada tem como destinatários de suas
ações os “clientes” atuais e os potenciais.
21
2 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 2.1 Conceito
A Administração Pública, conforme Matias–Pereira (2010), de forma geral,
designa o conjunto de serviços e entidades responsáveis pela realização de atividades
administrativas, ou seja, responsáveis pela execução das decisões políticas e
legislativas. Nesse caso, a Administração Pública tem como objetivo a gestão de bens
e interesses da comunidade no âmbito dos três níveis de governo: federal, estadual ou
municipal, sempre observando os preceitos do direito e da moral, orientados para o
bem comum.
De outra forma, o autor considera a Administração Pública como a totalidade da
estrutura de estado, que objetiva atingir, por meio da execução dos serviços públicos, a
satisfação das necessidades da população e o bem coletivo.
Conceito distinto nos traz Meirelles (2012, p. 66):
Administração Pública – em sentido formal, é o conjunto de órgãos instituídos para a consecução dos objetivos do Governo; em sentido material, é o conjunto das funções necessárias aos serviços públicos em geral; em acepção operacional, é o desempenho perene e sistemático, legal e técnico, dos serviços próprios do Estado ou por ele assumidos em benefício da coletividade. Numa visão global, a Administração é, pois, todo o aparelhamento do Estado preordenado à realização de serviços, visando à satisfação das necessidades coletivas [...].
Portanto, podemos afirmar que a Administração Pública é toda atividade
desenvolvida pelo Estado, através de seus órgãos públicos, destinados a executar
atividades de interesse coletivo que asseguram a satisfação das necessidades de toda
população, como, por exemplo, a segurança, a cultura, a saúde e o bem estar dessa
população.
Em outras palavras, Administração Pública é o conjunto de órgãos, serviços e
agentes do Estado que procuram satisfazer as necessidades da sociedade.
Administração pública é a gestão dos interesses públicos por meio da prestação de
serviços públicos, sendo dividida em administração direta e indireta.
Existem três níveis de atuação na Administração Pública: federal, estadual e
municipal. Cada um desses níveis tem um conjunto de órgãos para realização de
22
determinadas tarefas ou prestação de serviços, de acordo com a sua competência
definida constitucionalmente. Assim, administrar é comandar, dirigir, governar. Quando
os interesses são públicos, ou da coletividade, temos a Administração Pública.
Nesse sentido, conforme Bobbio (1998 apud Matias–Pereira, 2010, p. 63), “[...] a
expressão Administração Pública designa o conjunto das atividades diretamente
destinadas à execução das tarefas ou incumbências consideradas de interesse público
ou comum, numa coletividade ou numa organização estatal.”
Meirelles (2012, p. 66), por sua vez, chama a atenção para o uso incorreto do
conceito Governo como sinônimo de Administração Pública, ou seja, mesmo que eles
se confundam na medida em que se concretizam através de ações e serviços públicos,
somente o Governo representa a “[...] expressão política de comando, de iniciativa, de
fixação de objetivos do Estado e da manutenção da ordem jurídica vigente. O Governo
atua mediante atos de soberania na condução dos negócios públicos”.
O Governo é o conjunto de órgãos constitucionais responsáveis pela função
política do Estado, ou seja, compreende as atividades típicas dos três Poderes,
Executivo, Legislativo e Judiciário, onde a atividade típica do Executivo é administrar, a
do Legislativo é legislar e do Judiciário é exercer o Poder Jurisdicional.
Por outro lado, a administração não pratica atos de governo; pratica tão somente
atos de execução, com maior ou menor autonomia funcional, segundo a competência
dos órgãos e de seus agentes. Trata-se da atividade típica do Poder Executivo, mas
também pode ser exercido pelos Poderes Legislativo e Judiciário, ao exercerem
atividade administrativa.
Ao comparar Governo e Administração, enfatiza Meirelles (2012, p. 67):
Comparativamente, podemos dizer que o governo é atividade política e discricionária; administração é atividade neutra, normalmente vinculada à lei ou à norma técnica. Governo é conduta independente; administração é conduta hierarquizada. O Governo comanda com responsabilidade constitucional e política, mas sem responsabilidade profissional pela execução; a administração executa sem responsabilidade constitucional ou política, mas com responsabilidade técnica e legal pela execução. Administração é o instrumental.
23
É importante também diferenciarmos políticas públicas de Estado e de Governo,
sendo as primeiras definidas com finalidades estruturantes e/ou imprescindíveis do
Estado (educação, saúde, segurança, habitação, etc.) e, as segundas, aquelas que
encerram um conteúdo da diretriz política da administração (ex.: políticas de gênero).
A Administração Pública constitui um importante segmento da ciência da
administração. Ela representa o aparelhamento do Estado e funciona como o
instrumento do governo para planejar, organizar, dirigir e controlar todas as ações
administrativas, no sentido de dar plena e cabal satisfação das necessidades coletivas
básicas.
2.2 Natureza e Fins da Administração Pública
Conforme Meirelles (2012, p. 88), a natureza da administração pública é a de um
múnus público 5 para quem exerce, isto é, a obrigação de defender, conservar e
aprimorar os bens, serviços e interesses da coletividade.
Assim, o administrador público fica obrigado a cumprir fielmente aos preceitos do
direito e da moral administrativa que regem a sua atuação. Quando investido em cargo
ou função pública, todo administrador público assume o compromisso de bem servir a
coletividade, porque é o desejo do povo, como legítimo destinatário dos bens, serviços
e interesses administrados pelo Estado.
Conforme Bächtold (2008, p. 26),
A palavra administração vem do latim ad (direção) e minister (obediência), ou seja, o administrador dirige obedecendo à vontade de quem o contratou. Assim, o administrador público vai conduzir seu trabalho procurando atender à necessidade da população que o elegeu (obediência ao seu objetivo).
5 Conjunto de funções as quais são obrigação de um indivíduo; cargo, emprego; ofício. Múnus público, o que emana do poder público ou da lei e que é exercido em proveito da coletividade. O que procede de autoridade pública ou da lei, e obriga o indivíduo a certos encargos em benefício da coletividade ou da ordem social.
24
Para Meirelles (2012, p. 88), os fins da administração pública resumem-se num
único objetivo: o bem comum da sociedade. Portanto, toda atividade do administrador
público deve ser orientada para esse objetivo, porque a comunidade não institui a
administração senão como meio de atingir o bem-estar social. Todo ato administrativo
que se afaste desse objetivo é ilícito e imoral.
2.3 Princípios da Administração
O Direito Administrativo brasileiro pressupõe que os princípios da Administração
Pública estão consolidados em regras de observância permanente e obrigatória:
legalidade, moralidade, impessoalidade ou finalidade6, publicidade, eficiência,
razoabilidade, proporcionalidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica,
motivação e supremacia do interesse público. Conforme Meirelles, os cinco primeiros
encontram-se no art. 37, caput, da CF/88 e os demais, embora não mencionados,
decorrem do nosso regime político, tanto que, ao lado daqueles, fora textualmente
enumerados pelo art. 2º da Lei federal 9.784, de 29.199, e também podem ser
encontrados na Constituição do Estado/RS e Lei Orgânica do Município.
2.3.1 Princípios expressos
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE ESTRITA
Determina que todos os atos devam necessariamente estar em conformidade
com as leis. Só é permitido ao administrador fazer aquilo que a lei autoriza.
A legalidade está no alicerce do Estado de Direito, no princípio da autonomia da
vontade. Baseia-se no pressuposto de que tudo o que não é proibido, é permitido por
6 A Constituição/88 não se referiu expressamente ao princípio da finalidade, mas o admitiu sob a denominação de princípio da impessoalidade.
25
lei. Mas o administrador público deve fazer as coisas sob a regência da lei imposta.
Portanto, só pode fazer o que a lei lhe autoriza.
Adota-se o critério de subordinação à lei. A legalidade significa que a
Administração Pública, nos atos vinculados, não tem liberdade e nem vontade pessoal,
só pode fazer o disposto em lei;
PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA
Vincula o administrador à probidade administrativa. É um ajustamento a uma
composição ao que é ético, ao que deva o órgão público realizar. Para isto, o
administrador tem que ter conhecimento do que é administração pública e das normas
que regem a atividade pública que ele venha a desenvolver em um determinado órgão.
Nos casos de improbidade administrativa, os governantes podem ter suspensos
os seus direitos políticos, além da perda do cargo na administração, seguindo-se o
ressarcimento dos bens e a nulidade do ato ilicitamente praticado. Há um sistema de
fiscalização (interno e externo) ou mecanismo de controle de todos os atos
administrativos praticados. Por exemplo, o Congresso Nacional exerce esse controle
através de uma fiscalização contábil externa ou interna sobre toda a Administração
Pública.
A administração deve ter não apenas uma atuação legal, mas também moral,
pautada na ética, honestidade, lealdade, boa fé. No entanto, a moralidade a ser
obedecida é a administrativa e não a moralidade comum que trata da distinção entre o
bem e o mal.
PRINCÍPIO DA FINALIDADE OU DA IMPESSOALIDADE
Não pode haver privilégios ou discriminação na administração pública. Também
é vedado praticar atos sem finalidade pública.
Trata-se da ausência de subjetividade. A atividade administrativa deve ser
dirigida com finalidade pública, aos cidadãos em geral, sem favoritismos,
discriminações benéficas e ou detrimentos. A norma administrativa deve ser
26
interpretada e aplicada de forma que melhor garanta a realização do fim público a que
se dirige.
Está dirigido ao interesse coletivo. A finalidade do Estado é dar às condições
básicas de vida à população em termos de saúde, educação etc. e não privilegiar
alguém ou algum grupo.
Conforme Meirelles (2012, p. 89), ”O ato ou contrato administrativo realizado
sem interesse público configura desvio de finalidade”.
É importante ressaltar que o princípio da Impessoalidade pode ser visto como
um desdobramento do princípio da Igualdade , ou seja, no art. 5º da CF/88, prevê-se
que todos têm direitos iguais sem qualquer distinção. Para o administrador não é
diferente. Ele não pode distinguir as situações, sendo obrigado, por lei, a agir de
maneira igual em situações iguais, desigual em situações desiguais (como no caso de
tratamento diferenciado, ou de maneira compensatória, dados alguns segmentos como
as Pessoas com Necessidades Especiais - PNE).
PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE OU DA DIVULGAÇÃO E DA
TRANSPARÊNCIA
Determina que todo ato administrativo seja divulgado oficialmente
(transparência), para conhecimento público e para início de seus efeitos. O que é feito
na administração pública são atos administrativos e para que tenham validade no
direito é necessário que esse ato seja divulgado nos órgãos próprios para essa
divulgação, por exemplo, Diário Oficial.
Não confundir publicidade de ato administrativo com propaganda do governo,
que é prevista pela CF/88, no art. 37, em seu parágrafo 1º, 7. O ato está contido no
princípio da legalidade, porque nesse princípio o administrador só fará o que a lei
determina e autoriza.
Esse princípio visa garantir o controle através da sociedade da gestão
administrativa, a fim de conferir à mesma validade e eficácia.
7 § 1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos
27
O princípio da transparência é expresso em lei e é de aplicação obrigatória para
os Municípios, conforme a Lei 12.527 de 18 de novembro de 2011, conhecida como a
Lei de Acesso à Informação, a qual dispõe sobre os procedimentos a serem
observados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, com o fim de garantir o
acesso a informações, previstos na Constituição Federal.
PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA
Exige que a administração atue com presteza, perfeição e sempre tenha por
objetivo o atingimento de resultados práticos (busca pelo interesse público). Também
chamado de princípio da boa-administração. Aqui, a administração não deve se
contentar em exercer seus atos dentro da legalidade, mas buscando resultados
positivos para o serviço público. Esse princípio deve nortear a atuação da
Administração Pública no sentido de produzir resultado de modo rápido e preciso, de
maneira que os resultados de suas ações satisfaçam plenamente as necessidades da
população. Tal princípio refuta a lentidão, o descaso, a negligência e a omissão,
práticas que, não raramente, são observadas nas ações da Administração Pública
brasileira.
Para esses 5 princípios, existe uma forma de agrupá-los ou de lembrá-los
utilizando-se da expressão – LIMPE, que é uma combinação das primeiras letras
desses princípios, ou seja, os princípios da: Legalidade, Impessoalidade, Moralidade,
Publicidade e Eficiência. Existem alguns slogans relacionados à sigla, como “Limpe a
administração pública”, “Se deseja uma boa administração pública, limpe!”, “Vamos
manter limpa a administração pública”.
2.3.2 Princípios não expressos ou implícitos:
Conforme alguns dos principais especialistas em direito administrativo, existem
outros princípios, como os princípios não expressos, ou implícitos na Constituição
Federal e Expressos na Lei nº. 9.784/99. São eles:
28
PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE
É o princípio da proibição de excesso, que tem por objetivo aferir a
compatibilidade entre os meios e os fins, de modo a evitar restrições desnecessárias
ou abusivas por parte da Administração Pública.
As competências da administração pública devem ser feitas proporcionalmente,
sendo ponderadas, segundo as normas exigidas para cumprimento da finalidade do
interesse público. Tanto o principio da proporcionalidade e da razoabilidade constituem
instrumentos de controle dos atos estatais abusivos, seja qual for a sua índole.
SEGURANÇA JURÍDICA
É a exigência de estabilidade nas situações jurídicas, mesmo daquelas que, em
sua origem, apresentam vícios de ilegalidade.
A segurança jurídica existe para que a justiça, finalidade maior do Direito, se
concretize e pode-se afirmar que a segurança jurídica concede aos indivíduos a
garantia necessária para o desenvolvimento de suas relações sociais, tendo, no Direito,
a certeza das consequências dos atos praticados.
MOTIVAÇÃO
Por princípio, as decisões administrativas devem ser motivadas formalmente, ou
seja, a parte dispositiva deverá vir precedida por uma explicação ou fundamentos de
fato e de direito. Nos processos e nos atos administrativos a motivação é entendida
como a indicação dos pressupostos de fato e de direito.
Para todas as ações dos servidores públicos, deve existir uma explicação, um
fundamento de base e direito. O princípio da Motivação é o que vai fundamentar todas
as decisões que serão tomadas pelo agente público.
É importante ressaltar que, por força da Teoria dos Motivos Determinantes, o
agente fica vinculado aos motivos que fundamentaram a prática do ato, segundo a qual
só é valido o ato se os motivos enunciados efetivamente aconteceram. Nesse sentido,
pois, a menção de motivos falsos ou inexistentes nulifica irremediavelmente o ato
29
praticado. Ou seja, os atos que serviram de suporte à decisão do agente integram a
validade do ato.
AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO
Assegura aos litigantes em processos administrativos, sejam eles disciplinares
ou não, a possibilidade de expor seus argumentos através de ampla defesa, com todos
os meios e recursos a ela inerentes. Dessa forma, garante aos administrados o direito
de refutar alegações, produzir provas próprias, desde que lícitas, e recorrer de
decisões que ameacem ou lesem direito seu.
SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO
Também conhecido como princípio da primazia do interesse público, ou
simplesmente, princípio do interesse público. Consiste na premissa de que todos os
atos administrativos devem ser praticados com um único fim: o atendimento do
interesse público.
No entanto, o princípio da supremacia do interesse público também determina
que, em caso de contraposição entre interesses particulares e interesses públicos, os
últimos devem prevalecer sobre os primeiros.
Segundo a própria Constituição, “todo o poder emana do povo”, por isso o
interesse público irá trazer o benefício e bem-estar à população.
2.3.3 Outros princípios que merecem destaque
A legislação brasileira, principalmente através da Constituição Federal, traz
também outros princípios e garantias que merecem destaque, tais como:
DURAÇÃO RAZOÁVEL DOS PROCESSOS
A CF/88, em seu art.5º, inciso LXXVIII, determina: “ A todos, no âmbito judicial e
administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que
garantam a celeridade da sua tramitação”.
30
Dessa forma, em atendimento a essa regra constitucional, é inconcebível o
prolongamento desnecessário dos processos, os sobrestamentos inúteis e os
burocratismos estéreis.
PRINCIPIO DA CONTINUIDADE DOS SERVIÇOS PÚBLICOS
Visa evitar solução de descontinuidade na prestação dos serviços públicos,
impedindo que a coletividade sofra prejuízos em razão de eventual destaque a
interesses particulares, a exemplo das greves. O serviço público deve ser prestado de
forma continua e sem interrupção para não prejudicar os usuários e/ou a sociedade.
Quando existe a paralisação do serviço, no caso de ocorrência de greve, existem
serviços que não podem sofrer solução de continuidade (interrupção), conforme
previstos na Constituição e leis correlatas, que estipulam quais os serviços essenciais e
que não podem paralisar totalmente como, por exemplo: tratamento e abastecimento
de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis; assistência
médica e hospitalar; distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos;
serviços funerários e transporte coletivo; captação e tratamento de esgoto e lixo, etc.
2.4 Prestação dos Serviços pela Administração Públi ca
Para Meirelles (2012. p. 67), “o Governo e a administração, como criações
abstratas da Constituição e das Leis, atuam por intermédio de suas entidades (pessoas
jurídicas), de seus órgãos (centros de decisão) e de seus agentes (pessoas físicas
investidas em cargos e funções)[...]”.
O autor descreve entidade como pessoa jurídica, pública ou privada e órgão
como um elemento despersonalizado que tem por objetivo a realização das atividades
da entidade, através de seus agentes. Para o autor, as entidades classificam-se em
estatais, autárquicas, fundacionais, empresariais e paraestatais.
31
Sob o aspecto operacional, a Administração Pública é o desempenho perene e
sistemático, legal e técnico dos serviços próprios do Estado, em benefício da
coletividade. Ela pode ser direta ou indireta.
2.4.1 Administração Pública Direta (centralizada):
É composta pelas suas entidades estatais (União, Estados, Municípios e Distrito
Federal), consideradas pessoas jurídicas de Direito Público.
É constituída pelos serviços integrados na própria estrutura administrativa do
Estado, por meio das entidades políticas (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios), de seus órgãos e de seus agentes, todos integrantes da própria estrutura
estatal ou Poder Central.
Órgãos Públicos são centros especializados de competência, ou rol de
atribuições e responsabilidades estabelecidos dentro da própria estrutura administrativa
estatal. Pode-se assim dizer, também, que são unidades de atuação do Estado
desprovidas de personalidade jurídica.
São exemplos de órgãos públicos: ministérios, secretarias, departamentos,
comissões, repartições, etc.
No município, a Administração Direta (centralizada) é aquela composta por
órgãos ligados diretamente ao poder municipal. São os próprios organismos dirigentes
e suas secretarias.
As pessoas que trabalham na Administração Pública direta são chamadas de
funcionários públicos ou servidores públicos.
2.4.2 Administração Pública Indireta (descentralizada):
É aquela composta por entidades com personalidade jurídica própria, que foram
criadas para realizar atividades de Governo de forma descentralizada. São exemplos
as autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista.
A ideia de administração indireta funda-se no conceito da descentralização da
Administração Pública, que vem a ser a distribuição de competências e atribuições do
Estado para outras pessoas jurídicas.
32
A administração indireta pode ser observada quando o poder público cria uma
nova pessoa jurídica, seja ela de direito público ou privado, e a ela atribui a titularidade
e a incumbência da execução de determinado serviço público, ou de interesse público,
exercendo, assim, a descentralização administrativa.
Todas as entidades da administração indireta apresentam as seguintes
características: personalidade jurídica própria, seja ela de direito público ou privado;
patrimônio próprio; vinculação a órgãos da administração direta.
Os órgãos da administração indireta são autônomos, sujeitando-se, contudo, à
supervisão do ministério respectivo (ou secretaria), através de uma série de medidas,
como indicação ou nomeação dos dirigentes da entidade, aprovação de suas contas e
outros, não significando, contudo, que estejam hierarquicamente subordinados à
administração direta. As entidades da administração indireta são:
Autarquia: serviço autônomo criado por lei, com personalidade jurídica,
patrimônio e receita próprios para executar atividades típicas da Administração Pública,
atividades que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e
financeira descentralizada.
Em suma, as autarquias são entes administrativos autônomos, criados por lei
específica, com personalidade jurídica de direito público interno, para a consecução de
atividades típicas do poder público, que requeiram, para uma melhor execução, gestão
financeira e administrativa descentralizada.
No município de Porto Alegre, temos as seguintes autarquias: DMAE, DEMHAB,
DMLU e PREVIMPA.
Empresa Pública: entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado,
com patrimônio próprio e capital exclusivo da União, do Estado ou do Município, criada
por lei para a exploração de atividade econômica que o Governo seja levado a exercer
por força de contingência ou de conveniência administrativa, podendo revestir-se de
qualquer das formas admitidas em direito.
Muito embora as empresas públicas sejam pessoas jurídicas de direito privado,
submetem-se a algumas normas de direito público, como a obrigatoriedade de
realizarem licitações e concursos públicos e a vedação de seus servidores acumularem
cargos públicos de forma remunerada.
33
O regime de trabalho predominante nas empresas públicas é o celetista. No
entanto, nos cargos de gestão, cuja nomeação se dá por indicação dos chefes do
Poder Executivo a que se vinculam, temos a presença de servidores comissionados,
submetidos ao regime estatutário, lembrando que não é admitido o provimento de
empregos públicos em comissão.
No município de Porto Alegre, a EPTC é considerada uma empresa pública.
Fundação Pública: entidade criada por lei e dotada de personalidade jurídica de
direito público ou privado. É o patrimônio público personalizado destinado à persecução
de finalidades de interesse público.
Seu patrimônio é exclusivamente público e estão submetidas ao controle da
administração direta, e/ou do Ministério Público e do Tribunal de Contas.
A FASC é a fundação de direito público e o IMESF é a fundação de direito
privado no âmbito municipal.
Sociedade de Economia Mista: entidade dotada de personalidade jurídica de
direito privado, instituída mediante autorização legislativa e registro em órgão próprio
para exploração de atividade econômica, sob a forma de sociedade anônima, cujas
ações com direito a voto pertençam, em sua maioria, ao município ou a entidade da
administração indireta.
Sua administração com participação do Poder Público está encarregada da
realização de atividade econômica ou serviço de interesse coletivo outorgado ou
delegado pelo Estado (ex.: Petrobrás).
No município, a PROCEMPA e a CARRIS são as sociedades de economia
mista.
Seu patrimônio é formado com bens públicos e subscrições particulares. Não
está ela sujeita à falência, mas seus bens são penhoráveis e executáveis e a entidade
pública que a instituiu responde, subsidiariamente, pelas suas obrigações. Regem-se
pelas normas aplicáveis às empresas privadas, inclusive quanto às obrigações
trabalhistas e tributárias. Seu pessoal é constituído de empregados regidos pela
legislação trabalhista, previdenciária e acidentária comum.
As pessoas que trabalham na Administração Pública indireta são chamadas de
funcionários públicos ou servidores públicos e/ou empregados públicos.
34
2.4.3 Outras formas de descentralização dos serviços públ icos:
Outra forma de descentralização dos serviços públicos são as concessões, as
permissões e as autorizações.
A Concessão que o Estado dá ao concessionário deve ser feita sempre através
de licitação, um processo de análise das propostas mais vantajosas para o Estado,
significando, portanto, uma medida de uso racional dos recursos públicos.
Para Meirelles (2012), a concessão é a delegação contratual da execução do
serviço, sendo autorizado e regulamentado pelo Executivo; o contrato implica encargos
e vantagens recíprocos; não há transferência de propriedade pública ao concessionário
e não há privação de qualquer direito ou prerrogativa pública. Também deve ser
conferida sem exclusividade.
A Concessão é sempre feita no interesse da coletivida de, tendo o dever
(concessionário) de prestar o serviço em condições adequadas para o público. (art.
175. CF).
Toda concessão fica submetida às normas de natureza regulamentar
(disciplinam o modo e a forma) e as de ordem contratual (condições de remuneração);
o poder de regulamentar as concessões é inerente e indespojável do concedente
(Executivo). O transporte coletivo é um exemplo de concessão.
Além dessa modalidade, o poder público pode se valer de serviços permitidos.
Permissões são todos aqueles serviços em que a administração estabelece os
requisitos para sua prestação ao público e, por ato unilateral (termo de permissão ),
comete a execução aos particulares que demonstrarem capacidade para seu
desempenho; a permissão é em princípio discricionária e precária, mas admite
condições e prazos para exploração do serviço, a fim de garantir rentabilidade e
assegurar a recuperação do investimento do permissionário visando atrair a iniciativa
privada.
As permissões estão regulamentadas pela Lei nº. 8.987, de 13 de fevereiro de
1995, Capítulo XI, art. 40. No município, o serviço de táxis e sepultamento ou cremação
são exemplos de serviços permitidos.
35
2.5 Poderes e Deveres do Administrador Público
Conforme Meirelles (2012, p. 111): “Os poderes e deveres do administrador
público são os que estão expressos em lei, os impostos pela moral administrativa e os
exigidos pelo interesse da coletividade”.
Para ele, o poder administrativo é atribuído à autoridade para remover interesses
particulares que se opões ao interesse público.
Cada gestor público ou agente da administração é investido de uma parcela de
poder público e deveres específicos do cargo, função, serviço ou atividade pública que
exerça, com responsabilidades próprias de suas atribuições. Em função de serem
poderes instrumentais, trazem em si a característica de dever, sendo de realização
obrigatória sempre que objetivem interesse público.
Diferente do direito privado em que o poder de agir é uma faculdade, no direito
público é uma imposição, um dever para o agente que detém o poder, não se
admitindo a omissão da autoridade diante de situações que exigem sua atuação. A
Administração responde, civilmente, pelas omissões ou comissões lesivas de seus
agentes.
Esses poderes da Administração Pública são prerrogativas que viabilizam e
fazem valer a supremacia do interesse público em relação ao interesse individual.
Estes poderes dão autoridade ao agente público, quando, por lei, recebe competência
decisória e força para impor suas decisões aos administrados. Só podem ser usados
como atributos do cargo ou função, e não como privilégio da pessoa que o exerce. O
agente público fora do exercício do cargo ou da função não pode usar da autoridade
pública nem invocá-la por vontade própria para superpor-se aos demais cidadãos, pois,
se não está no exercício de suas funções, deixa de ser autoridade, igualando-se aos
demais. Tal conduta caracterizaria abuso de poder, acarretaria na ilegalidade do ato e,
conforme o caso tipificaria o crime de abuso de autoridade.
Para Meirelles (2012), os principais poderes do administrador público são:
poder-dever de agir; dever da eficiência; dever da probidade e dever de prestar contas.
A seguir veremos mais detalhadamente esses poderes e deveres do
administrador público:
PODER-DEVER DE AGIR: O poder tem para o agente público o significado de
dever para com a comunidade e para com os indivíduos. Para o cidadão o poder de
36
agir é facultativo, para o administrador público é uma obrigação de atuar, sempre
observando o princípio de exercitá-lo em benefício da comunidade. Quando ocorre a
omissão da autoridade ou o silêncio da administração, gera responsabilidade e
penalização para o agente omisso e/ou administração negligente.
DEVER DE EFICIÊNCIA: é o que se impõe a todo agente público de realizar
com suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento funcional. A eficiência
funcional é, pois, considerada em sentido amplo, abrangendo não só a produtividade
de quem ocupa o cargo ou a função como perfeição do trabalho e sua adequação
técnica aos fins visados pela administração. A verificação de eficiência atinge aspectos
quantitativo e qualitativo do serviço.
DEVER DE PROBIDADE : esse dever está previsto pela CF/88 como essencial
na conduta do administrador público como elemento necessário à legitimidade de seus
atos. O dever de probidade deve ser entendido como o dever que todo administrador
público tem de pautar suas atividades no estrito cumprimento dos princípios da
honestidade e moralidade pública. Quando existe o ato administrativo praticado com
lesão aos bens e interesses públicos também fica sujeito à invalidação pela própria
administração ou pelo poder judiciário, por vício de improbidade, que é uma
ilegitimidade.
DEVER DE PRESTAR CONTAS: Constitui dever do administrador público a
prestação de contas referente à gestão dos bens e interesses da coletividade. Nota-
se que a prestação de contas se refere a todos os atos do administrador público no
trato dos bens e interesses da coletividade. Quando se refere ao dinheiro público, a
obrigação da prestação de contas se torna obrigatória. Para o administrador público é
uma decorrência natural da administração como encargo de gestão de bens e
interesses alheios; a gestão se refere aos bens e interesses da coletividade e assume
o caráter de múnus público, isto é, de um encargo para com a comunidade.
37
Atualmente, essa prestação de contas feitas pelo administrador público a instâncias controladoras ou à sociedade civil é também conhecida como
Accountability8.
Para a ENAP (c2006), Accountability pode ser caracterizada pela situação onde
todo o individuo que ocupa um cargo público tem o compromisso da prestação pública
de contas (no inglês, accountability) e que envolve um amplo conjunto de formas de
controle dos cargos pela comunidade, pois todo cargo público envolve certas
expectativas a respeito de sua função e daquilo que promete ser capaz de realizar em
prol da comunidade. Também é importante lembrar que todo cargo público requer um
considerável investimento da comunidade: entre outros, pagamento de salários,
treinamento, aperfeiçoamento e recursos adicionais no ambiente do trabalho para o
bom exercício da função. Esse investimento deve retornar na forma de serviços
adequados e a comunidade tem que ser capaz de controlar se esse objetivo está
sendo satisfeito.
Quanto à utilização do poder por parte dos administradores públicos, podem
ocorrer as situações de USO E ABUSO DE PODER .
O uso do poder é a prerrogativa da autoridade, mas esse poder tem que ser
usado normalmente, sem abuso. O uso normal do poder implica a observância das
normas legais, a moral da instituição, a finalidade do ato e as exigências do interesse
público. O poder que é conferido ao administrador público deve ser para ser utilizado
em benefício da coletividade administrada, mas usado nos justos limites que o bem-
estar social exigir.
O abuso de poder ocorre quando a autoridade ultrapassa os limites de suas
atribuições - excesso de poder, ou se desvia das finalidades administrativas - desvio de
finalidade. O abuso de poder pode tanto ocorrer na forma da ação como na da
omissão, já que as mesmas são capazes de afrontar a lei e causar lesão a direito
individual do administrado.
8 É um termo da língua inglesa, sem tradução exata para o português, que remete à obrigação de
membros de um órgão administrativo ou representativo de prestar contas a instâncias controladoras ou
a seus representados. Outro termo usado numa possível versão portuguesa é responsabilização.
38
Outra distorção no uso do poder é quando ocorre a omissão da administração,
ou seja, a autoridade pública tem o dever de agir frente a uma situação determinada e
não o faz, implicando em prejuízos à coletividade ou particulares. Esse fato acarreta a
correção judicial, indenização ao prejudicado e responsabilização civil, penal,
administrativa e política do agente público.
39
3. SERVIÇOS PÚBLICOS
3.1 Conceito de serviço público
Conforme Meirelles (2012, p. 376):
A Constituição Federal dispõe expressamente que incumbe ao Poder Público, na forma da lei, a prestação de serviços públicos. Dessa forma, a lei disporá sobre o regime de delegação, os direitos dos usuários, a política tarifária, a obrigação de manter serviço adequado e as reclamações relativas à prestação (arts. 175, parágrafo único, e 37, § 3.°).
Para o autor, a atribuição primordial da Administração Pública é prestar serviços
essenciais ou secundários à coletividade, através de seus funcionários ou
administrados. Esses serviços podem ser essenciais (serviços públicos) ou apenas
úteis à comunidade (serviços de utilidade pública). De forma geral, quando falamos de
serviço público, incluímos ambas as categorias.
Pietro (2006), define serviço público como toda atividade material que a lei
atribui ao Estado com o objetivo de satisfazer as necessidades coletivas, seja através
da prestação direta de serviços ou da delegação de serviços, mas sob regime jurídico
total ou parcialmente público.
A autora também ressalta que cabe ao Estado a escolha, por meio da lei, de
quais atividades são consideradas serviços públicos.
Outro autor, Mello (2002, p. 600), define o serviço público como:
Toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça às vezes, sob um regime de Direito Público, portanto consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais, instituído em favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo.
40
Em outras palavras, o Serviço Público é criado por lei e é uma obrigação do
Estado. O Estado por sua vez pode realizar a sua gestão de forma direta, por meio dos
órgãos da Administração Pública ou de forma indireta, por meio de concessão ou
permissão. O regime jurídico pode ser público ou privado de acordo com o que estiver
disposto em lei. É importante salientar, que todo o serviço público corresponde a uma
atividade de interesse público, mas que nem toda atividade pública é serviço público.
Outro aspecto importante a ser destacado acerca dos serviços públicos são os
requisitos do serviço e os direitos do usuário, amplamente difundidos entre os
cidadãos. Conforme Meirelles (2012), os requisitos do serviço são sintetizados em 5
princípios que a administração deve exigir de quem realiza os serviços, que são o
princípio da permanência (impõe continuidade do serviço), o da generalidade (serviços
iguais prestados a todos), o da eficiência, o da modicidade (tarifas razoáveis) e o da
cortesia (bom tratamento).
É importante lembrarmos que os direitos do usuário são essenciais na prestação
de serviços, mediante os regulamentos estabelecidos em lei. Esses serviços só podem
ser oferecidos se realmente atenderem aos direitos dos usuários.
Para Matias–Pereira (2010, p. 216):
As necessidades coletivas são satisfeitas por meio de serviços de interesse geral, que são denominados públicos. Dessa forma, sempre que o Estado presta um serviço de interesse geral, mobilizando pessoas e bens para satisfazer às necessidades coletivas, realiza serviço público. Assim, serviço público é todo aquele imprescindível à coletividade e, como tal, declarado pelos poderes competentes, cuja prestação está a cargo do Estado. Observe-se que, mesmo que instituições privadas atuem em uma dessas áreas, o governo tem a obrigação de colocar à disposição da população esses tipos de serviços.
3.2 Classificação dos Serviços Públicos
Meirelles (2012, p. 379) propõe a classificação dos serviços públicos levando-se
em conta a essencialidade, a adequação, a finalidade e os destinatários dos serviços,
41
classificando-os em públicos e de utilidade pública; próprios e impróprios do Estado;
administrativos e industriais; “uti universi” e "uti singuli”.9
Serviços Públicos : são os serviços que a administração presta diretamente à
comunidade, por reconhecer sua essencialidade e necessidade para a sobrevivência
dos membros da coletividade e do próprio Estado. Por essa razão, são considerados
privativos do poder público, no sentido de que só a administração deve prestá-los, sem
delegação a terceiros, mesmo porque, geralmente, exigem atos de império e medidas
compulsórias em relação aos administrados. Exemplos desses serviços são os de
defesa nacional, os de polícia e os de preservação da saúde pública.
Serviços de utilidade pública : são os serviços que a administração,
reconhecendo sua conveniência (não essencialidade, nem necessidade) para os
membros da coletividade, presta-os diretamente ou concorda em que sejam prestados
por terceiros (concessionários, permissionários ou autorizatários), nas condições
regulamentadas e sob seu controle, mas por conta e risco dos prestadores, mediante
remuneração dos usuários. São exemplos dessa modalidade os serviços de transporte
coletivo, gás, telefone e energia elétrica.
De acordo com Meirelles (2012, p. 380):
No primeiro caso (serviço público), o serviço visa a satisfazer necessidades gerais e essenciais da sociedade, para que ela possa subsistir e desenvolver-se como tal; na segunda hipótese (serviço de utilidade pública), o serviço objetiva facilitar a vida do indivíduo na coletividade, pondo à sua disposição utilidades que lhe proporcionarão mais conforto e bem-estar. Daí se denominarem, os primeiros, serviços pró-comunidade e, os segundos, serviços pró-cidadão, fundados na consideração de que aqueles (serviços públicos) se dirigem ao bem comum e estes (serviços de utilidade pública), embora reflexamente interessem a toda comunidade, atendem precipuamente às conveniências de seus membros individualmente considerados.
Serviços próprios do Estado: são aqueles que se relacionam intimamente com
as atribuições do poder público (segurança, polícia, higiene, saúde públicas, etc.) e
para a execução dos quais a Administração usa da sua supremacia sobre os
9 Consultar glossário
42
administrados. Por essa razão, só devem ser prestados por órgãos ou entidades
públicas, sem delegação a particulares. Esses serviços, por sua essencialidade,
geralmente são gratuitos ou de baixa remuneração, para que fiquem ao alcance de
todos os membros da coletividade.
Serviços impróprios do Estado: são os serviços que não afetam
substancialmente as necessidades da comunidade, mas satisfazem ao interesse
comum de seus membros, e, por isso, a administração os presta remuneradamente,
por seus órgãos ou entidades descentralizadas (autarquias, empresas públicas,
sociedades de economia mista, fundações governamentais), ou delega sua prestação a
concessionários, permissionários ou autorizatários. Esses serviços, normalmente
rentáveis, podem ser realizados com ou sem privilégio (não confundir com monopólio),
mas sempre sob regulamentação e controle do poder público competente.
Serviços administrativos: são os serviços que a administração executa para
atender às suas necessidades internas ou preparar outros serviços que serão
prestados ao público, tais como os da imprensa oficial, das estações experimentais e
outros dessa natureza.
Conforme já visto no capítulo sobre Administração Pública, no que se refere à
prestação dos serviços pela Administração Pública, pode ser direta (centralizada),
através de órgãos públicos como, ministérios, secretarias, departamentos, repartições,
etc., ou pode ser Indireta (descentralizada), através de entidades com personalidade
jurídica própria, que foram criadas para realizar atividades de governo de forma
descentralizada como, as autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de
economia mista.
Também é importante lembrarmos que esses serviços públicos prestados de
forma descentralizada exigem a regulamentação e controle pelo poder público,
qualquer que seja a modalidade de sua prestação aos usuários, ou seja, o fato de tais
serviços serem delegados a terceiros, particulares, não retira do Estado seu poder de
regulamentá-los e controlá-los.
43
Portanto, "Deve o Estado [...], no exercício do poder inerente à sua soberania,
fixar tarifas, determinar standards de serviço, fiscalizar a estrutura financeira de todas
as empresas de serviços de utilidade pública”. (MEIRELLES, 2012. p. 385),
3.3 Servidores Públicos:
Conforme Bergue (2010, p. 20), são agentes públicos as pessoas que prestam
serviços ao Estado e às pessoas jurídicas da administração indireta. O autor divide
estes agentes públicos em três categorias, a saber:
• Agentes Políticos: são os componentes do governo em seus primeiros
escalões, como presidente, governador, prefeitos e seus imediatos como
ministros e secretários no poder executivo, senadores, deputados, vereadores
no poder legislativo e juízes e desembargadores no poder judiciário, além de
promotores e procuradores no Ministério Público e ministros e conselheiros nos
tribunais de Contas;
• Servidores Públicos: são as pessoas que prestam serviços ao ente estatal10 e
são divididas em:
o Servidores Estatutários: são as pessoas que e ocupam cargos públicos
e seu vínculo laboral é regulado por estatuto próprio.
o Empregados Públicos: são aquelas pessoas cuja relação laboral com o
ente estatal é regida pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT e
ocupam empregos públicos.
o Servidores Temporários: são agentes admitidos por prazo determinado
para atender necessidades temporárias. Exercem funções públicas, sem
estarem vinculados a empregos públicos.
• Particulares em colaboração com o Poder Público: são pessoas que prestam
serviços ao Estado e não têm vínculo empregatício, como, por exemplo, os
10 Ente Estatal são pessoas jurídicas de Direito Público que integram a estrutura constitucional do Estado e têm poderes políticos a administrativos, tais como a União, os Estados-membros, os Municípios e o Distrito Federal
44
empregados de empresas concessionárias e permissionárias ou aquelas
pessoas que são convocadas para prestação de serviços ao Estado como os
jurados ou convocados para o serviço militar e/ou eleitoral.
Ser servidor público é uma vocação, como destacado pela ENAP (c2006), pelo
caráter nobre da atividade. A missão de servir a uma comunidade promovendo o bem
comum é honrada e dignificante. Essa vocação exige desprendimento: por mais bem
pago que seja o servidor, o serviço público jamais será o lugar ideal para quem busca o
mais alto retorno que o mercado de trabalho pode oferecer.
Normalmente, o Estado convoca seus quadros de carreira para uma dedicação
plena e, em muitas vezes, com dedicação exclusiva. O profissionalismo do serviço
público é mais do que o exercício de uma função, pois exige uma conduta adequada
baseada em valores éticos, direcionados ao bem-estar comum, exigindo também
competências como imparcialidade, objetividade e excelência, dedicação, empenho em
servir à comunidade, etc.
Também devemos ressaltar que, além dessas competências e qualidades
profissionais, é necessário adotar-se uma postura de decoro. Essa postura
compreende não apenas a retidão de uma ação, mas também a visão que a sociedade
tem dessa ação como sendo correta.
3.4 Cargos e Funções:
Conforme Meirelles (2012, p. 477):
Cargo público é o lugar instituído na organização do serviço público, com denominação própria, atribuições e responsabilidades específicas e estipêndio correspondente, para ser provido e exercido por um titular, na forma estabelecida em lei; função é a atribuição ou o conjunto de atribuições que a Administração confere a cada categoria profissional ou comete individualmente a determinados servidores para a execução de serviços eventuais, sendo comumente remunerada através de pro labore. Diferencia-se, basicamente, do cargo em comissão pelo fato de não titularizar cargo público.
45
O autor salienta que as funções de confiança só podem ser exercidas por
servidores ocupantes de cargo efetivo e podem ser destinadas apenas às atribuições
de direção, chefia e assessoramento (CF, art.37, V).
Bergue (2010, p. 326), diferencia cargos comissionadas e funções de confiança
da seguinte forma:
Assim, os cargos comissionados são estruturas funcionais autônomas, passíveis de serem ocupadas por indivíduo que não detém vínculo laboral anterior e permanente com o ente ou órgão. As funções de confiança, por seu turno, constituem um agregado de atribuições que são adicionadas à pessoa designada, já investida em cargo de provimento efetivo.
Para o autor, a designação de pessoas para os cargos em comissão e funções
de confiança deve observar a convergência entre a confiança pessoal e os critérios
técnicos, ou como ele mesmo descreve, “[...] a escolha do designado para o exercício
dessas atividades deve combinar confiança e competência em medidas proporcionais,
jamais em prejuízo da última”. (BERGUE, 2010, p. 327)
Por outro lado, considerando-se as características do Estado Patrimonialista11
ainda existente na Administração Pública Brasileira, devemos dar ênfase aos critérios
técnicos também para evitarmos as distorções como aquelas onde se valorizam mais a
natureza das relações pessoais existentes entre quem pode fazer a designação e o
designado, como nos casos semelhantes ao nepotismo.
Cabe também aqui destacar a definição apresentada pela Escola Nacional de
Administração Pública - ENAP (c2006, p. 12):
“Cargo público é o conjunto de atribuições e responsabilidades, previstas em uma estrutura organizacional, as quais são assumidas pelos servidores públicos. A ocupação de um cargo público implica graus distintos de poder de mando e decisão”. [...] “a missão do servidor público é, necessariamente, zelar pela res publica e estar a serviço dos interesses e aspirações dos cidadãos”.
11 Estado patrimonialista caracterizado como aquele onde os bens patrimoniais do Estado estão misturados com os dos dirigentes. Este assunto será abordado de forma mais aprofundada no capítulo 4.
46
Dessa forma, o servidor público faz pela comunidade o que esta não pode fazer
por si mesma e representa-a na medida em que faz o que essa necessita e exige.
Em síntese, a responsabilidade do servidor público será norteada por três
aspectos da consciência político-moral:
• o servidor público zela por algo que não lhe pertence.
• o servidor público tem poder e autonomia proporcionais à sua missão.
• o servidor público faz coisas importantes, não em seu próprio nome, mas em
nome de uma coletividade.
3.5 Estabilidade do servidor público:
Conforme Bergue (2010), a estabilidade é uma garantia constitucional que os
servidores adquirem depois de aprovados no estágio probatório12. Esta possibilidade
de aquisição de estabilidade constitui uma das principais características dos cargos
públicos, sendo que a mesma não existe em empregos públicos, mas, por outro lado,
estes empregados públicos têm o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS.
Por fim, o autor ressalta que, a partir da promulgação da CF/88, a estabilidade não
ocorre mais no serviço público e sim no cargo.
3.6 Seleção de pessoas no setor público:
3.6.1 Concurso Público:
Conforme Meirelles (2012, p. 494):
A obrigatoriedade de concurso público, ressalvados os cargos em comissão e empregos com essa natureza, refere-se à investidura em cargo ou emprego público, isto é, ao ingresso em cargo ou emprego isolado ou em cargo ou emprego público inicial da carreira na administração direta e indireta. O concurso é o meio técnico posto à disposição da Administração Pública para obter-se moralidade,
12 Art. 41 da CF/88.
47
eficiência e aperfeiçoamento do serviço público e, ao mesmo tempo, propiciar igual oportunidade a todos os interessados que atendam aos requisitos da lei [...].
Ressaltamos que, tanto para servidor público (estatutário) e quanto para
empregado público, a única forma de admissão no serviço público é através de
concurso público. Excetuam-se aqui os cargos em comissão.
Desde a CF/67, os concursos públicos só podem ser através da realização de
provas ou da realização de provas e apresentação de títulos. A Administração Pública
pode utilizar-se do processo seletivo , que é um expediente menos complexo, mas
com o qual deve também observar os princípios da isonomia, da igualdade e permitir a
competição entre todos os interessados. Cabe ressaltar que o processo seletivo é
utilizado nas contratações do regime celetista enquanto o concurso público refere-se ao
regime estatutário.
O concurso público, conforme Bergue (2010, p. 537), presta-se à garantia e
eficiência e moralização no processo de ingresso de pessoal no serviço público. Diz-se
que esse instrumento é moralizador, em essência, pelo fato de ser público. Mais que
isso, por garantir igualdade relativa de acesso aos cargos e empregos públicos àqueles
que atendam aos requisitos estabelecidos em lei para seu provimento.
Bem implementado, o certame de caráter público, contribui significativamente
para escolha do profissional mais apto dentre aqueles disponíveis no mercado de
trabalho, segundo os critérios de seleção definidos. Nesse sentido é fator de eficiência.
Outra maneira de acesso ao serviço público é através da contratação por prazo
determinado, o que, conforme Bergue (2010), caracteriza uma exceção à norma
instituída para o ingresso ao serviço público, que se dá somente através de concurso.
Essa exceção está contida no Art.37, IX, da CF/88, que regulamenta as contratações
por tempo determinado e deve ser utilizada apenas para atender à necessidade
temporária de excepcional interesse público.
3.7 Exoneração e demissão:
A exoneração do servidor público pode ocorrer no estágio probatório seja por
desempenho ou inadequação ao serviço público. Também pode ocorrer quando for de
iniciativa do servidor, ou, no caso de servidor estável, quando for motivada por
48
insuficiência de desempenho, ou quando do limite de despesa com pessoal (art. 169,
CF/88).
Já a demissão poderá ocorrer quando houver infração disciplinar punida com
essa pena, mas essa só pode ocorrer após a utilização da ampla defesa por parte do
servidor.
3.8 Responsabilidade dos Servidores:
A responsabilização dos servidores é um dever da administração e específico de
todo chefe em relação a seus subordinados.
Esta responsabilização pode ser classificada em Responsabilidade
Administrativa, Responsabilidade Civil e Responsabilidade Criminal:
Responsabilidade Administrativa : é a que resulta da violação de normas
internas pelo servidor sujeito ao estatuto e disposições complementares estabelecidas
em lei, decreto ou regulamento relativo à função pública.
Responsabilidade Civil : é a obrigação que se impõe ao servidor de reparar o
dano causado à administração por culpa ou dolo no desempenho de suas funções e é
apurada através da Justiça Comum.
Responsabilidade Criminal : é a que resulta do ato cometido que resulta em
crimes funcionais, definidos em lei federal.
3.9 Responsabilidade por improbidade administrativa :
Como já visto no capítulo referente à Administração Pública, todo agente público
deve agir com probidade13, ou seja, deve adotar uma conduta ética e moral que zele
pelos bens e interesses públicos. Quando isso não ocorre, esses atos são conhecidos
como os de improbidade administrativa.
13 Probidade é a qualidade de quem é probo e significa retidão, honradez, brio e observância rigorosa
dos deveres da justiça e da moral. Integridade tem significado semelhante e é uma qualidade atribuída a uma pessoa honesta, incorruptível, cujos atos são irrepreensíveis.
49
A Lei nº. 8.429, de 2 de junho de 1992, dispõe sobre as sanções aplicáveis aos
agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo,
emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras
providências. Essa lei trata dos atos de improbidade praticados por qualquer agente
público e estabelece três espécies de atos de improbidade:
• os que importam enriquecimento ilícito (art. 9º);
• os que causam lesão ao patrimônio público (art. 10); e
• os que atentam contra os princípios da Administração Pública (art.11).
As disposições dessa lei alcançam todas as pessoas qualificadas como agentes
públicos, na administração direta, indireta e fundacional, ainda que transitoriamente,
com ou sem remuneração.
Além dessa lei, a própria CF/88 prevê no art. 37, XXI, § 4º “Os atos de
improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da
função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e
gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.”
3.10 Lei de Responsabilidade Fiscal
A Lei complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, conhecida com a Lei de
Responsabilidade Fiscal, estabelece em seu art. 1º as normas de finanças públicas
voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências. Em seu
parágrafo 1º :
§ 1o A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar.
50
Portanto, todos os gestores públicos são responsáveis por manter o equilíbrio
das contas públicas, bem como por cumprir as metas estabelecidas, sendo
responsabilizados caso não consigam.
51
4 MODELOS DE ESTADO, GOVERNO E ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA
Matias-Pereira (2010, p. 129), ao abordar sobre a vinculação entre Estado e
Administração Pública:
O debate sobre a articulação entre Estado e a Administração Pública é tão importante que necessita ser situado de acordo com o conceito de Estado. O Estado pode ser aceito como um conjunto de instituições criadas, recriadas e ajustadas para administrar conflitos e tensões em um determinado território, ou seja, a noção de conflito e tensão é essencial a esse conceito. Por ser um ente abstrato, o Estado se materializa por meio de instituições, que são o Executivo, o Legislativo, o Judiciário, as forças militares, os governos subnacionais e a Administração Pública. Todas essas instituições vão materializar e arbitrar esses conflitos e tensões que são levados para o Estado.
Conforme o autor, a Administração Pública seria o aparelho de estado
organizado com a função de executar serviços que satisfaçam as necessidades da
população, ou seja, é um conjunto de atividades destinadas à execução de obras e
serviços para o interesse da sociedade. O autor refere que, partir da criação do Estado
moderno, existe na trajetória da administração pública três formas de atuação:
Administração Pública patrimonialista, a burocrátic a e a gerencial.
Conforme Bresser-Pereira (2006a, p. 42):
O Estado moderno começa, em termos políticos, como absoluto; em termos econômicos, como mercantilista; e em termos administrativos, como patrimonialista. A monarquia, que se confundia com o Estado, era um importante patrimônio econômico e político, recebendo receitas de impostos e da participação em empresas monopolistas. [...] No estado patrimonial não havia distinção nítida entre patrimônio público e patrimônio privado.
A seguir, trataremos de cada uma das três formas de atuação da Administração
Pública.
52
4.1 Administração Pública Patrimonialista
Assim, na Administração Pública patrimonialista, conforme Matias–Pereira
(2010, p. 113), o aparelho de Estado atua como uma extensão do poder do monarca.
Os servidores públicos possuem status de nobreza real. Os cargos funcionam como
recompensas, o que gera nepotismo. Isso contribui para a prática de corrupção e do
controle do órgão público por parte dos soberanos.
Já, conforme o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado – MARE14
(1995), no patrimonialismo, o aparelho do Estado funciona como uma extensão do poder do
soberano, e os seus auxiliares, servidores, possuem status de nobreza real. Os cargos são
considerados prebendas. A res publica não é diferenciada da res principis, ou seja, é uma
forma da administração pública que se caracteriza pela privatização do Estado, pela
interpermeabilidade dos patrimônios público e privado. O príncipe não faz clara distinção entre
patrimônio público e seus bens privados.
Para Bergue (2010), a Administração Patrimonialista tem os seguintes traços
característicos:
• a propriedade pública confundindo-se com a propriedade privada do administrador;
• o aparelho administrativo do Estado como extensão do poder do dirigente;
• a tendência ao nepotismo, alicerçada em geral nos seguintes valores:
✓ crença de que laços familiares constituem a mais plena garantia de lealdade;
✓ oportunidade de distribuição de oportunidade profissional ou riqueza para a
família;
✓ e garantia de maior probabilidade e conivência com eventuais desvios.
• os cargos, especialmente os comissionados, são considerados feudos passíveis de
distribuição na forma de reconhecimento pessoal ou como moeda.
A característica fundamental do patrimonialismo é a dificuldade que têm alguns
gestores de definir precisamente os limites de fronteira entre o público e o privado,
diferenciando o patrimônio público do patrimônio do governante. Nesse modelo, os
14 O Plano Diretor da Reforma do Estado foi elaborado pelo Ministério da Administração Federal e da Reforma do Estado – MARE.
53
servidores públicos são considerados “empregados” do administrador e não do ente
estatal.
Em síntese, no Patrimonialismo, o Estado existe como uma extensão do poder
dos governantes e os seus servidores são servidores dos governantes. Os cargos são
considerados benesses para os amigos dos que governam. Nessa forma de
Administração Pública, existe uma total confusão entre o que é público e o que é
privado, pois o patrimônio público (res publica) se mistura com os bens do governante
(res principis). Essa forma foi predominante no período dos estados absolutistas que
vigoraram até o século XIX (Monarquias absolutistas européias).
Assim, o patrimonialismo utiliza o patrimônio público para atender as demandas
e necessidades pessoais dos governantes, incorrendo em mau uso dos recursos
públicos, como nos casos de corrupção, nepotismo etc., em vez de proteger o
patrimônio público contra os interesses privados.
4.2 Administração Pública Burocrática
Segundo Matias-Pereira (2010), a Administração Pública Burocrática surge na
segunda metade do século XIX, com o propósito de combater a corrupção e o
nepotismo comuns na Administração Patrimonialista. Tinha como diretrizes a
profissionalização, uma carreira pública, hierarquia funcional, impessoalidade,
formalismo. Dessa forma, procurava controlar os processos e o ingresso à carreira
pública, com regras na admissão, controle nas compras, buscando maior eficiência do
Estado.
Essa forma de administração era adequada para responder às demandas de um
Estado pequeno como era o caso do Estado vigente na época. Apoiava-se em normas
rígidas, o que não exigia um sistema descentralizado de gestão. Nesse modelo
burocrático, o Estado não tinha dificuldade de executar diretamente os serviços sob
sua responsabilidade. Portanto, o Estado era eficiente enquanto os serviços oferecidos
eram ainda muito reduzidos e o Estado limitava-se a manter a ordem e administrar a
justiça, a garantir os contratos e a propriedade.
54
Conforme Bresser–Pereira (2006, p. 241):
A administração pública burocrática foi adotada em substituição à administração patrimonialista, que definiu as monarquias absolutas e na qual o patrimônio público e o privado eram confundidos. Nesse tipo de administração, o Estado era entendido como propriedade do rei. O nepotismo e o empreguismo, se não a corrupção, eram a norma. Esse tipo de administração revelar-se-ia incompatível com o capitalismo industrial e as democracias parlamentares que surgiram no século XIX. É essencial para o capitalismo a clara separação entre o Estado e o mercado; só pode existir democracia quando a sociedade civil, formada por cidadãos, distingue-se do Estado ao mesmo tempo que o controla. Tornou-se assim necessário desenvolver um tipo de administração que partisse não só da clara distinção entre o público e o privado, mas também da separação entre o político e o administrador público. Surgiu então a administração burocrática moderna, racional-legal.
A Administração Burocrática está embasada pelos conceitos da teoria
burocrática de Max Weber15, os quais postulavam que a organização poderia ser
eficiente por excelência, se essa conseguisse detalhar antecipadamente e nos
mínimos detalhes como as coisas deverão ser feitas, ou seja, a organização
burocrática é uma organização cujas consequências desejadas se resumem na
previsibilidade do seu funcionamento.
Segundo Bächtold (2008), no sistema burocrático, a subordinação não é às
pessoas e sim às normas estabelecidas dentro da organização. Os cargos devem ser
preenchidos por mérito (concurso, eleição, nomeação), baseando-se em
procedimentos formais revestidos de legalidade. Assim, qualquer pessoa dentro da
estrutura pode aspirar a uma ascensão profissional.
Dessa forma, podemos caracterizar o paradigma organizacional burocrático
como um sistema que privilegia a padronização e formalização de procedimentos em
nome da eficiência e, entre suas inúmeras características, podemos elencar algumas
que podem ser associadas ao modelo burocrático de gestão pública:
• obediência a normas e regulamentos;
15 Max Weber - Sociólogo, historiador e político alemão que estudou as grandes organizações da sua época. É considerado um dos fundadores do estudo moderno da sociologia, mas sua influência também pode ser sentida na economia, na filosofia, no direito, na ciência política e na administração. Foi um dos principais autores sobre a Teoria Organizacional conhecida como Burocrática.
55
• racionalidade e divisão do trabalho;
• hierarquização da autoridade (organizações militares);
• a eficiência;
• a profissionalização;
• os controles administrativos e rotinas e procedimentos padronizados
(controles rígidos dos processos, como, por exemplo, na admissão de
pessoal, nas compras);
• formalidade das comunicações (por escrito, com vistas à comprovação e à
padronização);
• impessoalidade nas relações (valorização do cargo ou da função em
detrimento do indivíduo);
• competência técnica e meritocracia (difere da Administração Patrimonialista,
pois privilegia os critérios mérito e competência técnica, em vez de critérios
particulares);
• previsibilidade do funcionamento;
• a profissionalização do servidor público e a ideia de carreira pública.
Matias-Pereira (2010, p. 53) descreve o que é burocracia:
A burocracia16 é o tipo de administração caracterizada por uma hierarquia formal de autoridade, na qual existem regras definidas para a classificação e solução de problemas, que devem ser estendidas às comissões e aos organismos coletivos de decisão e formas escritas de comunicação. Em geral, é peculiar das repartições e instituições estatais; porém, em certa medida, pode ser verificada nas grandes corporações privadas. O termo burocracia é utilizado também em outros sentidos: serve para designar tanto o conjunto de funcionários – ou burocratas – como para qualificar uma forma de proceder lenta, rotineira, que dificulta e entrava toda decisão.
16 Segundo Weber, a burocracia, enquanto forma de dominação, se sustenta sobre o conhecimento técnico que, além de conferir caráter racional, a transforma em instrumento capaz de assegurar alta eficiência administrativa. Isso pressupõe certa racionalidade impessoal que, guiada por regras formais que padronizam e conferem igualdade no tratamento dos casos, define com precisão as relações de mando e subordinação, mediante a distribuição das atividades a serem executadas e de acordo com os fins a que se visa.
56
Muitas dessas características adotadas na administração do Estado foram um
avanço em relação à antiga Administração Patrimonialista, uma vez que deram um
caráter mais profissional à organização e tornaram-na mais eficiente. Entre tantas
vantagens desse novo paradigma burocrático, podemos citar:
• Racionalidade em relação ao alcance dos objetivos da organização;
• Precisão na definição do cargo e na operação, pelo conhecimento exato dos
deveres;
• Rapidez nas decisões, pois cada um conhece o que deve ser feito e por quem;
as ordens e papéis tramitam através de canais preestabelecidos;
• Uniformidade de resposta (está prescrita na norma);
• Uniformidade de rotinas e procedimentos, favorecendo a padronização, a
redução de custos e erros, pois as rotinas são definidas por escrito;
• Redução de atrito entre as pessoas, todos conhecem os limites de
responsabilidade e o que é exigido da função;
• Confiabilidade, pois as decisões são previsíveis e impessoais (seguem as
normas);
• Benefícios para os funcionários, pois são motivados a seguir carreira na
organização;
• Critérios de seleção e escolha de pessoal estão baseados na capacidade e na
competência técnica, implicando melhor quadro funcional.
Já no Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado – MARE (1995), a
qualidade fundamental da administração pública burocrática é a efetividade no controle
dos abusos; seu defeito, a ineficiência, a auto-referência, a incapacidade de voltar-se
para o serviço aos cidadãos vistos como clientes. Esse defeito só vai ser constatado
quando o Estado precisa aumentar a oferta de serviços, uma vez que, no inicio da
administração burocrática, os serviços do Estado eram muito reduzidos, onde o Estado
A palavra burocracia vem do francês bureau – oficina (escritório) + c ratie
(poder, autoridade).
57
limitava-se a manter a ordem e administrar a justiça, a garantir os contratos e a
propriedade.
A administração pública burocrática distingue claramente o público e o privado e
o combate à corrupção e o nepotismo patrimonialista foi um de seus maiores objetivos.
Para isto foram consolidadas as idéias de profissionalização, carreira, hierarquia
funcional, impessoalidade e formalismo. A organização se caracterizava por ser
racional e eficiente e preocupada com o controle e não se preocupando com a
ineficiência promovida.
Apesar de inúmeras vantagens em relação à administração patrimonialista na
prática, a organização e a administração burocrática apresentaram alguns problemas,
ou disfunções nas suas características, como, por exemplo, nos casos de excesso de
apego às normas ou a substituição dos fins pelos meios.
A seguir, descreveremos algumas dessas disfunções, mais conhecidas da
organização burocrática.
Disfunções da burocracia
• Internalização das regras e apego excessivo aos regulamentos, como no caso
em que cumprir as normas passa a ser mais importante que atingir os objetivos.
A atividade -meio passa a ser o resultado a ser alcançado e não a atividade fim
que atende o usuário.
• Excesso de formalismo e de documentação, tornando os prazos de execução
muito demorados.
• Resistência a mudanças, isto é, na medida em que tudo é padronizado e
previsto com antecipação, o funcionário se acostuma a uma estabilidade,
proporcionando-lhe segurança a respeito de seu trabalho. Qualquer mudança
tende a ser interpretada como algo que desconhece, tornando-se indesejável.
• A base do processo decisorial – quem toma decisões é aquele que ocupa o
posto hierárquico mais alto, mesmo que nada saiba sobre o tema.
• Conformidade às rotinas – com o tempo, as regras tendem a se tornar
absolutas, sagradas, conduzindo a uma rigidez no comportamento do burocrata
58
que se restringe ao desempenho mínimo. Perde iniciativa, criatividade e
inovação.
Segundo Matias-Pereira (2010), as duas principais causas do desvirtuamento da
burocracia são a centralização e verticalização do processo decisório, tendo como
consequência a morosidade dos trâmites processuais na estrutura hierárquica em
sentido ascendente; e a falta de flexibilidade, quando existe uma preocupação
excessiva, obsessiva em seguir regras. Assim, quando surgem casos que não se
encaixam com precisão às regras, não há lugar para modificação. Dessa forma, a
burocracia transforma-se no emperramento do processo decisório, conectado a um
emaranhado de regras que não permitem a sua transposição.
Hoje em dia, o termo burocracia, assumiu diversos significados, sendo muito
comum estar associada a uma conotação pejorativa, uma vez que tende a ser
relacionada à ineficiência, atrasos, confusão, autoritarismo, privilégio, entre outras
expressões sempre de caráter negativo. Passamos a chamar de burocracia os defeitos
do sistema, ou seja, suas disfunções, como o exagerado apego aos regulamentos,
excesso de formalismo, resistência mudanças, despersonalização do relacionamento,
conformidade às rotinas e procedimentos, etc. e não os aspectos positivos em relação
ao patrimonialismo.
O desgaste da organização burocrática começa no momento em que o Estado
começa a prestar mais serviços e a população passa a exigir mais serviços e melhor
atendimento das demandas coletivas, ou nas palavras de Matias-Pereira (2010, p.
113):
Assim, em função da adoção do modelo de Estado burocrático, impõe- se a reforma do serviço público, por ser um pré-requisito para tornar efetiva a ação da organização estatal. Neste contexto, quando o Estado passa a ser democrático (século XX), e tem como responsabilidade gerar o bem comum, por meio do atendimento adequado das crescentes demandas da população, ocorre significativa ampliação das suas funções nos campos socioeconômico e político. O aumento dessas pressões e a incapacidade do estado burocrático de atendê-las de maneira satisfatória colocam em xeque o Estado burocrático. Tem- se, portanto, início do processo de transformações, com a introdução da reforma da gestão pública, que busca transformar o modelo de Estado burocrático em Estado gerencial.
59
Para Bresser–Pereira (2006, p. 242):
Após a II Guerra Mundial houve uma reafirmação dos valores burocráticos, mas, ao mesmo tempo, a influência da administração de empresas começou a se fazer sentir na administração pública. As idéias de descentralização e de flexibilização administrativa ganharam espaço em todos os governos. Entretanto, a reforma da administração pública só ganharia força a partir dos anos 1970, quando teve início a crise do Estado, que levaria à crise também sua burocracia. Em consequência, nos anos 1980 iniciou-se uma grande revolução na administração pública dos países centrais em direção a uma administração pública gerencial.
Segundo Abrucio (2006), nos anos 70, devido à crise financeira mundial e os
exemplos de ineficiência na gestão pública buscaram-se soluções para esse quadro,
entre as quais, a adoção de instrumentos de gestão orçamentária, tornando as finanças
públicas mais vinculadas a objetivos do que a regras rígidas do serviço público. Assim,
a solução foi introduzir mecanismos gerenciais na administração pública. Mas somente
nos anos 80, em função do clima intelectual e político reinante e do esfacelamento do
aparato estatal estruturado no pós-guerra, que o modelo de administração burocrática
sofreu seu maior desgaste. Nesse momento, o modelo gerencial, importado das
práticas do setor privado, foi a base norteadora para a execução das reformas.
4.3 Administração Pública Gerencial
Conforme Coelho (2009a, p. 100):
Na virada dos anos 1970 para a década de 1980, o modelo de desenvolvimento econômico e social até então vigente, marcado pela forte intervenção do Estado em praticamente todas as esferas da vida social, parecia ter-se esgotado. Nesse contexto, ressurgiram, com força, as idéias liberais até então adormecidas, para reativar as economias e colocar novamente o mundo na rota do crescimento. O renascimento desse ideário convencionou-se chamar de neoliberalismo e seria protagonizado no mundo pelos governos de Margaret Thatcher, no Reino Unido (1979-1990), e de Ronald Reagan, nos Estados Unidos (1981-1989).
60
Ainda segundo Coelho (2009a), a agenda neoliberal, inicialmente adotada pela
Inglaterra e Estados Unidos e, posteriormente, em diversos países do mundo, estava
alicerçada no tripé: desregulamentação, privatizações e abertura dos mer cados.
Assim, os defensores dessa proposta argumentavam que era necessário
desregular os mercados, porque o número excessivo de regras e controles estatais
sobre a economia inibia os investimentos privados, comprometendo o crescimento
econômico. Dentre inúmeras medidas adotadas, o plano centrou-se nas relações de
trabalho, buscando reduzir a quantidade de leis e de restrições trabalhistas criadas pelo
Estado, favorecendo dessa maneira a novas contratações e/ou a criação de empregos.
Também eram favoráveis à privatização de empresas, pois alegavam que as
empresas estatais eram ineficientes e deficitárias. A consequência disso resultaria em
crescentes déficits a serem cobertos pelos contribuintes.
Dessa forma, a privatização buscava tornar essas empresas eficientes e
lucrativas, além de possibilitar que o Estado não arcasse mais com esse prejuízo e,
também, que pudesse aplicar seus recursos em áreas de competências obrigatórias
como educação, saúde e assistência social.
No Brasil, a privatização se torna parte integrante das reformas econômicas
iniciadas pelo Governo Collor. Para tanto, foi instituído o Programa Nacional de
Desestatização (PND), através da Lei nº 8.031, de 12.04.90, alterada pela Lei 9.491, de
09.09.1997. Nessa época, são concentrados esforços na venda de estatais produtivas,
pertencentes a setores estratégicos, o que permite a inclusão de empresas
siderúrgicas, petroquímicas e de fertilizantes no PND. Nos anos seguintes, são
incluídos os setores elétrico, financeiro e as concessões das áreas de transporte,
rodovias, saneamento, portos e telecomunicações.
. O terceiro eixo da estratégia demandava a abertura dos mercados nacionais
para a concorrência internacional, única forma de produzir uma modernização de todos
os setores da atividade econômica, conferindo-lhes eficiência e competitividade.
É importante contextualizarmos aqui o Estado como Burocrático em suas três
dimensões mais significativas, como a econômica, a social e a administrativa, conforme
descrevermos a seguir:
61
• Econômica: significativa intervenção do Estado na economia. Objetivava
garantir emprego e atuar em setores estratégicos para o desenvolvimento
nacional.
• Social: conhecido como o Estado do Bem-Estar Social (Welfare State), com
suas políticas públicas na área social, para garantir as necessidades básicas da
população, de forma a garantir ao cidadão os direitos sociais, como educação,
saúde e habitação.
• Administrativa – Estado de modelo burocrático, onde predomina em sua forma
de funcionamento a impessoalidade, neutralidade e racionalidade do aparato
governamental.
No entanto, no novo modelo de Estado, o Gerencial, buscou desde o inicio a
adoção de uma postura empresarial (empreendedora) e focada no aumento de receitas
e no maior controle dos gastos públicos. Esse novo modelo é facilitado pelo momento
em que se encontrava a economia mundial, ou seja, em uma enorme crise, o que não
possibilitava a viabilização da manutenção do Estado de Bem Estar Social, o qual
proporcionava à população uma vasta oferta de serviços como educação, saúde,
habitação, etc. A partir desse momento, começam a ser repensadas quais as
finalidades do Estado, já que esse não consegue mais se manter e, portanto, tem que
ser reformado.
Assim, surge a proposta de devolução ao setor privado, daqueles serviços que o
poder público não tem condições de prestar com eficiência, sobrando ao Estado
aqueles que são exclusivos a ele, como segurança/defesa, diplomacia, fiscalização,
etc.
Já o Centro Latino Americano de Administração para o Desenvolvimento - CLAD
(1998)17, quando expõe os motivos para a reforma do Estado, afirma:
A reforma do Estado tornou-se o tema central da agenda política mundial. A origem deste processo ocorreu quando o modelo de Estado montado pelos países desenvolvidos no pós-guerra, responsável por uma era de prosperidade sem igual no capitalismo, entrou em crise no
17 Este documento foi preparado pelo Conselho Científico do CLAD e aprovado na sua sessão de 14 de Outubro de 1998 pelo Conselho Diretor do CLAD, que é composto pelas máximas autoridades governamentais responsáveis pela modernização da Administração Pública e da reforma do Estado dos 25 países membros.
62
final da década de 70. Num primeiro momento, a resposta foi a neoliberal-conservadora. Dada a imperiosa necessidade de reformar o Estado, restabelecer seu equilíbrio fiscal e equilibrar o balanço de pagamento dos países em crise, aproveitou-se a oportunidade para se propor, simplesmente, a redução do tamanho do Estado e o predomínio total do mercado. A proposta, entretanto, fazia pouco sentido econômico ou político. Depois de algum tempo, constatou-se que a solução não estaria no desmantelamento do aparelho estatal, mas em sua reconstrução.
Sobre a crise do Estado, Matias-Pereira (2010) considera quatro fatores que
foram fundamentais para agravar a crise do modelo do Estado de Bem-Estar: os
crescentes desequilíbrios internos, evidenciados nos déficit fiscais; a espiral
inflacionária, que repercutiu na dinâmica do comércio internacional; o crescimento da
dívida externa; a crise de legitimidade social, impulsionada pelo processo de
segmentação da sociedade em que se confrontaram setores minoritários enriquecidos
com uma crescente classe média.
Frente a essa crise, o CLAD enfatizava que a proposta seria a de construir um
Estado para enfrentar os novos desafios da sociedade do século XXI, que além de
garantir o cumprimento dos contratos econômicos, este deveria ser forte o suficiente
para assegurar os direitos sociais e a competitividade de cada país no cenário
internacional. Dessa forma, entendiam que a Reforma Gerencial aumentaria a
capacidade do Estado em ser eficiente no atendimento de demandas da sociedade.
Contudo, existia uma preocupação em não eliminar ou privatizar o Estado,
deixando somente o mercado como referência, conforme veremos abaixo:
Desse modo, a Reforma gerencial não opta pelos princípios do mercado como o ordenador por excelência dos novos rumos do setor público. A proposta do CLAD é de que o caminho para modernizar a administração pública passa pela redefinição das relações entre a sociedade e o Estado, construindo uma esfera pública que de fato envolva a sociedade e os cidadãos na gestão das políticas públicas. – (CLAD, 1998)
Em síntese, a proposta do CLAD de Reforma Gerencial busca aumentar a
eficiência, a efetividade e a democratização do Poder público e, a partir disso,
fortalecer a capacidade do Estado para promover o desenvolvimento econômico e
social.
63
Conforme o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (MARE, 1995) a
crise do Estado era caracterizada pelos seguintes fatos:
• Como uma crise fiscal, caracterizada pela crescente perda do crédito por parte
do Estado e pela poupança pública que se torna negativa;
• O esgotamento da estratégia estatizante de intervenção do Estado, a qual se
reveste de várias formas: o Estado do bem-estar social nos países
desenvolvidos, a estratégia de substituição de importações no terceiro mundo e
o estatismo nos países comunistas;
• A superação da forma de administrar o Estado, ou seja, a superação da
administração pública burocrática.
Segundo Bresser–Pereira (2006b, p. 264),
O objetivo geral da reforma administrativa será transitar de uma administração pública burocrática para a gerencial. Essa mudança, porém, não pode ser realizada de um dia para o outro. Nem deve ocorrer com a mesma intensidade nos diversos setores. Na verdade, a administração pública gerencial deve ser construída sobre a administração pública burocrática. Não se trata de fazer tábula rasa desta, mas de aproveitar suas conquistas, os aspectos positivos que ela contém, ao mesmo tempo que se vai eliminando o que já não serve.
4.3.1 Reforma do Estado no Brasil:
No Brasil, seguindo esta tendência mundial do questionamento sobre o tamanho
e o papel do Estado, bem como a necessidade de reformá-lo, nos anos 90, o Ministério
da Administração Federal e da Reforma do Estado – MARE propôs um Plano Diretor
da reforma do Aparelho do Estado que definia os objetivos e estabelecia as diretrizes
para a reforma da administração pública brasileira, o qual veremos a seguir:
O novo plano justificava-se uma vez que o Estado estava esgotado, ou seja,
A crise do Estado teve início nos anos 70, mas só nos anos 80 se tornou evidente. Paralelamente ao descontrole fiscal, diversos países passaram a apresentar redução nas taxas de crescimento econômico, aumento do desemprego e elevados índices de inflação. Após várias tentativas de explicação, tornou-se claro, afinal, que a causa da
64
desaceleração econômica nos países desenvolvidos e dos graves desequilíbrios na América Latina e no Leste Europeu era a crise do Estado, que não soubera processar de forma adequada a sobrecarga de demandas a ele dirigidas. A desordem econômica expressava agora a dificuldade do Estado em continuar a administrar as crescentes expectativas em relação à política de bem-estar aplicada com relativo sucesso no pós-guerra. (PLANO DIRETOR DA REFORMA DO ESTADO, 1995, p. 10)
O Plano Diretor objetivava a reconstrução da Administração Pública em bases
modernas e racionais. Mesmo reconhecendo que o modelo de administração
burocrática tinha produzido um grande avanço em relação ao modelo de administração
patrimonialista, uma vez que a administração pública formal, baseada em princípios
racional-burocráticos, se contrapunha ao patrimonialismo, ao clientelismo, ao
nepotismo. Contudo, esse modelo burocrático, ao limitar-se a padrões hierárquicos
rígidos e ao concentrar-se no controle dos processos e não dos resultados, revelou-se
ineficiente para resolver os novos desafios que o país passou a enfrentar diante de
toda a crise do Estado e às novas demandas surgidas com o novo cidadão que exigia
muito mais eficiência do Estado.
Dessa forma, a proposta era a de buscar uma nova maneira de administração
pública, aqui conhecida como Administração Pública Gerencial, a qual embasada em
conceitos atuais de administração e eficiência, voltadas para o controle dos resultados
e descentralizada para poder chegar ao cidadão, que seria um cliente privilegiado dos
serviços prestados pelo Estado. Para tanto, seria necessário reorganizar as estruturas
da administração pública, com ênfase na qualidade e na produtividade do serviço
público e na profissionalização do servidor.
Conforme o Plano Diretor, a reação inicial à crise foi a inadequada proposta
neoliberal, caracterizada pela ideologia do Estado mínimo e só no início dos anos 90
surge uma resposta consistente com o desafio de superação da crise: a ideia da
reforma ou reconstrução do Estado, em vez do estado mínimo proposta inicialmente.
Assim, a reconstrução do Estado trazia em sua proposta os seguintes
pressupostos:
• O ajustamento fiscal duradouro;
• Reformas econômicas orientadas para o mercado, que, acompanhadas de
uma política industrial e tecnológica, garantam a concorrência interna e criem
as condições para o enfrentamento da competição internacional;
65
• A reforma da previdência social;
• A inovação dos instrumentos de política social, proporcionando maior
abrangência e promovendo melhor qualidade para os serviços sociais;
• A reforma do aparelho do Estado, com vistas a aumentar sua “governança”,
ou seja, sua capacidade de implementar de forma eficiente políticas públicas.
O Plano Diretor chama a atenção para a importância de se distinguir a reforma
do Estado da reforma do aparelho do Estado, ou seja, enquanto a reforma do Estado é
um projeto amplo que diz respeito às várias áreas do governo e ao conjunto da
sociedade brasileira, a reforma do aparelho do Estado tem um escopo mais restrito:
está orientada para tornar a administração pública mais eficiente e mais voltada para a
cidadania.
A reforma do Estado deveria ser compreendida dentro do contexto da
redefinição do papel do Estado, o qual deveria deixar de ser o responsável direto pelo
desenvolvimento econômico e social pela via da produção de bens e serviços, para
fortalecer-se na função de promotor e regulador desse desenvolvimento. Além dessas
premissas, o plano propunha a descentralização para o setor público não-estatal da
execução de serviços que não envolvem o exercício do poder de Estado, mas devem
ser subsidiados pelo Estado, como é o caso dos serviços de educação, saúde, cultura
e pesquisa científica.
Conforme o Plano Diretor, no Aparelho do Estado é possível distinguir quatro
setores, a saber:
Núcleo Estratégico : Corresponde ao governo. É o setor que define as leis e as
políticas públicas, e cobra o seu cumprimento. É, portanto, o setor onde as decisões
estratégicas são tomadas. Corresponde aos Poderes Legislativo e Judiciário, ao
Ministério Público e, no poder executivo, ao Presidente da República, aos ministros e
aos seus auxiliares e assessores diretos, responsáveis pelo planejamento e formulação
das políticas públicas.
Atividades Exclusivas: É o setor em que são prestados serviços que só o Estado
pode realizar. São serviços em que se exerce poderes exclusivos do Estado como os
66
poderes de regulamentar, fiscalizar e fomentar, bem como a cobrança e fiscalização
dos impostos, a polícia, a previdência social básica, o serviço de desemprego, a
fiscalização do cumprimento de normas sanitárias, o serviço de trânsito, a compra de
serviços de saúde pelo Estado, o controle do meio ambiente, o subsídio à educação
básica, o serviço de emissão de passaportes, etc.
Serviços Não Exclusivos : Corresponde ao setor onde existe uma parceria entre o
Estado com outras organizações públicas não-estatais e privadas, mas o Estado está
presente na medida em que regulamenta e controla os serviços, já que esse envolvem
direitos humanos fundamentais, como os da educação e da saúde. Além disso, os
recursos produzidos não podem ser transformados em lucros. São exemplos deste
setor: as universidades, os hospitais, os centros de pesquisa e os museus.
Produção de Bens e Serviços para o Mercado: Corresponde à área de atuação das
empresas. É caracterizado pelas atividades econômicas voltadas para o lucro que
ainda permanecem no aparelho do Estado como, por exemplo, as do setor de infra-
estrutura. Havendo privatização, deve existir uma regulamentação rígida.
Em síntese, conforme o documento do Plano Diretor,
[...] o Estado reduz seu papel de executor ou prestador direto de serviços, mantendo-se, entretanto, no papel de regulador e provedor ou promotor destes, principalmente dos serviços sociais como educação e saúde, que são essenciais para o desenvolvimento, na medida em que envolvem investimento em capital humano; para a democracia, na medida em que promovem cidadãos; e para uma distribuição de renda mais justa, que o mercado é incapaz de garantir, dada a oferta muito superior à demanda de mão-de-obra não-especializada. Como promotor desses serviços o Estado continuará a subsidiá-los, buscando, ao mesmo tempo, o controle social direto e a participação da sociedade. (PLANO DIRETOR DA REFORMA DO ESTADO, p. 13)
Outras ações merecem destaque na reforma de Estado brasileiro como, a
criação de Agências Reguladoras que permitiram ao Estado desempenhar o papel de
regular em detrimento do papel do Estado produtor de bens de serviços. A criação
destas agências ocorreu através do Programa Nacional de Desestatização, no governo
Collor e, posteriormente, revogada pela Lei nº 9.491, de 9 de dezembro de 1997.
67
Segundo Matias–Pereira (2010, p. 169),
[...] O que se torna relevante para o advento da atividade regulatória estatal não é mais a supressão da intervenção estatal direta na ordem econômica, mas basicamente: (i)a separação entre o operador estatal e o ente encarregado da regulação do respectivo setor; e (ii) a admissão do setor regulador da existência de operadores provados competindo com o operador público (introdução do conceito de competição em setores sujeitos à intervenção estatal direta).
Atualmente, existem muitas agências reguladoras no Brasil e, entre elas,
destacamos algumas como, a ANATEL (Agencia Nacional de Telecomunicações,
ANVISA (Agencia Nacional de Vigilância Sanitária) ANAC (Agencia Nacional de
Aviação Civil).
.
Bresser Pereira (1997), ao falar da Reforma de Estado define as principais
características da Administração Pública gerencial, também chamada de nova
Administração Pública:
• orientação da ação do Estado para o cidadão-usuário ou cidadão-
cliente;
• ênfase no controle dos resultados através dos contratos de gestão
(ao invés de controle dos procedimentos);
• fortalecimento e aumento da autonomia da burocracia estatal,
organizada em carreiras ou corpos de Estado, e valorização do
seu trabalho técnico e político de participar, juntamente com os
políticos e a sociedade, da formulação e gestão das políticas
públicas;
• separação entre as secretarias formuladoras de políticas públicas,
de caráter centralizado, e as unidades descentralizadas,
executoras dessas mesmas políticas;
• distinção de dois tipos de unidades descentralizadas: as agências
executivas, que realizam atividades exclusivas de Estado, por
definição monopolistas, e os serviços sociais e científicos de
caráter competitivo, em que o poder de Estado não está
envolvido;
68
• transferência para o setor público não-estatal dos serviços sociais e
científicos competitivos;
• adoção cumulativa, para controlar as unidades descentralizadas,
dos mecanismos (1) de controle social direto, (2) do contrato de
gestão em que os indicadores de desempenho sejam claramente
definidos e os resultados medidos, e (3) da formação de quase-
mercados em que ocorre a competição administrada;
• terceirização das atividades auxiliares ou de apoio, que passam a
ser licitadas competitivamente no mercado.
Conforme Abrucio (2006, p. 176):
A crise do Estado afetou diretamente a organização das burocracias públicas. Por um lado, os governos tinham menos recursos e mais déficits. O corte de custos virou prioridade. No que tange à Administração Pública, isso produziu dois efeitos. Primeiro, a redução dos gastos com pessoal, que era vista como uma saída necessária — os discursos das administrações de Thatcher e Reagan representaram o ponto máximo dessa tendência. Segundo, a necessidade de aumentar a eficiência governamental, o que, para boa parte dos reformadores da década de 80, implicava uma modificação profunda do modelo weberiano, classificado como lento e excessivamente apegado a normas. Em suma, considerava-se o antigo modelo ineficiente.
Segundo Matias-Pereira (2010), a reforma e modernização do Estado começam
a ser implantadas quando o modelo de Estado de Bem-Estar entrou em crise no final
da década de 1970. A proposta foi a adoção de um modelo neoliberal-conservador. As
políticas propostas na década de 1980 visavam o restabelecimento do equilíbrio fiscal e
do balanço de pagamentos dos países em crise. Assim, as medidas tomadas foram
orientadas com a única preocupação: reduzir o tamanho do Estado e viabilizar o
predomínio total do mercado. Após algum tempo, constatou-se que a melhor medida a
ser tomada não é o desmantelamento do Estado e sim, a sua reconstrução. Desse
modo, o entendimento foi a necessidade de se construir um novo Estado capaz de
enfrentar os novos desafios vigentes à época. Esse Estado deveria ser capaz de
garantir o cumprimento dos contratos econômicos e ser forte o suficiente para
assegurar os direitos sociais e a competitividade de cada país no cenário internacional.
69
Para o autor, a partir do início da década de 1980, houve uma tendência mundial
em favor da Reforma do Estado, com uma nítida preocupação dos governos em
empreender esforços para modernizar e agilizar a Administração Pública. Esse
movimento pode ser considerado como a construção de novo paradigma da
Administração Pública Gerencial.
Para ele, a Reforma do Estado foi a substituição do modelo burocrático pelo
modelo gerencial. Modelo este, baseado em princípios e conceitos da administração
das empresas privadas como: administração por objetivos, downsizing18, serviços
públicos voltados para o consumidor, pagamento por desempenho, qualidade total,
formas de descentralização, etc.
A retomada de teorias críticas às burocracias estatais e favoráveis aos ideais liberais do Estado-mínimo foi reforçada coma chegada dos governos conservadores na Grã-Bretanha, em 1979 (Margaret Thatcher), e dos republicanos nos Estados Unidos em 1980 (Ronald Reagan). Coube aos governantes daqueles dois países implantarem as primeiras reformas no antigo modelo, logo no início da década de 1980. (MATIAS–PEREIRA, 2010, p. 100)
Bresser–Pereira (2006a, p. 36), ao referir sobre os objetivos da reforma de
Estado, comenta:
Depois da grande crise dos anos 80, na década dos 90 está se construindo um novo Estado. Esse novo Estado resultará de reformas profundas. Tais reformas habilitarão o Estado a desempenhar as funções que o mercado não é capaz de executar. O objetivo é construir um Estado que responda às necessidades de seus cidadãos; um Estado democrático, no qual seja possível aos políticos fiscalizar o desempenho dos burocratas e estes sejam obrigados por lei a lhe prestar contas, e onde os eleitores possam fiscalizar o desempenho dos políticos e estes também sejam obrigados por lei a lhes prestar contas. Para tanto, são essenciais uma reforma política que dê maior legitimidade aos governos, o ajuste fiscal, a privatização, a desregulamentação – que reduz o “tamanho” do Estado – e uma reforma administrativa que crie meios de se obter uma boa governança. Neste trabalho, descrevi as características desta última reforma – a reforma do aparelho do Estado-, uma reforma que propiciará que se estabeleça, no setor público, uma administração pública gerencial.
18 Ver glossário
70
Para o Plano Diretor da reforma do Estado (1995), a reforma deve ser
compreendida no contexto da redefinição do papel do Estado, que deixa de ser o
responsável direto pelo desenvolvimento econômico e social através da produção de
bens e serviços para tornar-se um promotor e regulador do desenvolvimento. Dessa
forma, o Estado deveria reduzir seu papel de prestador de serviços e preocupar-se
mais com o papel de regulador e promotor desses serviços, principalmente dos
serviços sociais como educação e saúde.
Além disso, a proposta de reforma do Estado deveria predominantemente estar
orientada pelos valores da eficiência e qualidade na prestação de serviços públicos e
pelo desenvolvimento de uma cultura gerencial nas organizações.
Na apresentação do Plano Diretor de Reforma do Estado (1995, p. 7) pelo
mandatário da Nação, a proposta do mesmo se caracterizava por:
[...] organizar as estruturas da administração com ênfase na qualidade e na produtividade do serviço público; na verdadeira profissionalização do servidor, que passaria a perceber salários mais justos para todas as funções. Esta reorganização da máquina estatal tem sido adotada com êxito em muitos paises desenvolvidos e em desenvolvimento.
4.3.2 A Nova Gestão Pública- NGP
O aumento das expectativas e das demandas dos cidadãos em uma parcela significativa dos países passou a exigir uma nova forma de orientação na prestação de serviços por parte da Administração Pública para responder a esta crescente exigência da população. A qualidade dos serviços que são ofertados e o nível de satisfação do cidadão/cliente é o referencial na NGP (fortemente embasada em um modelo gerencial), que se apresenta, em escala mundial, como novo paradigma do final do século XX. Essas transformações ocorriam num contexto de globalização e difusão de Tecnologia da Informação, que por sua vez, refletiam profundamente no ambiente de negócios, exigindo das organizações mais flexibilidade nas suas operações.” (MATIAS–PEREIRA, 2010, p. 104)
Conforme o autor (2010), as reformas na Administração Pública, adotadas pelos
países que necessitavam melhorar a eficiência, a eficácia e a efetividade das suas
prestações de serviços, foram denominadas como New Public Management – Nova
71
Gestão Pública (NGP)19, a qual propunha em seu escopo teórico algumas medidas
como:
• Redução do tamanho do setor público;
• Maior autonomia e responsabilidade dos gestores (agência);
• Empowerment (delegação e descentralização);
• Reengenharia;
• Ênfase nos resultados e na necessidade de serem medidos (indicadores de
avaliação);
• Orientação para os clientes;
• Desregulamentação das leis trabalhistas, tornando a contratação de pessoal
mais flexível;
• Qualidade na prestação dos serviços públicos;
• Transparência da informação (accountability).
• Governança20
Bergue (2010, p. 189), também trata do modelo gerencial:
O traço central capaz de diferenciar esse modelo, em relação ao padrão burocrático de gestão, é a acentuada ênfase nos resultados. Enquanto a organização burocrática – veja-se a estrutura geral de Estado vigente – tem sua tônica na definição de processos e rotinas de operação, com o propósito de alcançar um fim específico, e deposita preponderantemente sobre o processo (meios) os esforços de gestão, na perspectiva gerencial essa ênfase é concentrada no alcance dos resultados da ação do poder público. Assim, segundo a lógica gerencial, a administração deve concentrar recursos na gestão, com vistas a resultados, ou seja, o planejamento da ação, a organização dos recursos necessários, a condução do processo (direção) e o controle devem privilegiar, como parâmetro de elaboração, a avaliação, o resultado das ações.
O mesmo autor faz um resumo sobre os principais valores do modelo de
Administração Pública Gerencial, conforme quadro abaixo:
19 Tradução de New Public Management – NPM. No Brasil, a Nova Gestão Pública também foi denominada como Nova Administração Pública - NAP, mas, atualmente, ambas são mais conhecidas por Administração Pública Gerencial.
20 Ver Glossário
72
Quadro 2 - Valores da nova administração pública, tecnologias gerenciais e correspondentes práticas de governo
Valores da nova administração pública
Conceitos e/ou tecnologias gerenciais
Prática adotada administração pública
na
1. Descentralização política: transferência de recursos e atribuições aos níveis regional e local.
Descentralização: delegação de autoridade.
Gestão de PSF, etc.
programas: PACS,
2. Descentralização administrativa: delegação de autoridade e autonomia par agentes.
Empowerment; delegação de autoridade; controle sutil (social).
Delegação de bens e serviços públicos; empregados públicos; terceirização.
3. Organizações flexíveis ao invés de autoritárias e monolíticas.
Downsizing; eficiência; terceirização; reengenharia.
Terceirização; programas de demissão voluntária; privatizações; delegações.
4. Organizações flexíveis ao invés de autoritárias e monolíticas.
Adhocracia; organizações flexíveis; participação; flexibilidade das relações.
Gestão por programas OSCIP’s; organizações sociais; delegação de bens e serviços públicos; empregos públicos.
5. Confiança limitada. Descentralização; delegação de autoridade; controle sutil (social).
Gestão por programas; avaliação de desempenho permanente de servidores.
6. Controle por resultados. Gestão por processos; eficácia gerencial; avaliação de desempenho; accountability; transparência.
Gestão por programas; delegação de bens e serviços públicos; avaliação de desempenho permanente dos servidores; contratos de gestão.
7. Administração voltada para o atendimento do cidadão.
Foco no cliente: gestão pela qualidade; gestão por processos.
Gestão por programas; ouvidoria; prestação de contas; audiências públicas.
Fonte: BERGUE (2010, p.193).
Conforme o autor, os principais valores gerenciais são: racionalidade, primazia
do privado frente ao público, eficiência, produtividade, competências, gestão e
avaliação de desempenho.
4.3.3 Consenso de Washington:
Conforme Paula (2005), o ano de 1989 foi marcado pela reunião realizada
em Washington, com representantes do governo norte americano, altos funcionários
dos organismos financeiros internacionais e economistas de diversos países, reunião
que sacramentou o famoso Consenso de Washington, do qual surgiram as principais
ideias sobre a reforma de Estado e a Nova Administração Púbica - Administração
Pública Gerencial.
Na reunião realizada em Washington, o economista John Williamson fez uma síntese delas, apresentando um receituário de 10 medidas: o
73
ajuste estrutural do déficit público, a redução do tamanho do Estado, a privatização das estatais, a abertura ao comércio internacional, o fim das restrições ao capital externo, a abertura financeira às instituições internacionais, a desregulamentação da economia, a reestruturação do sistema previdenciário, o investimento em infra-estrutura básica e a fiscalização dos gastos públicos”. (PAULA, 2005, p. 113)
4.3.4 O movimento reinventando o governo
Continuando, a autora relata que, concomitante a esse período de propostas
para novas formas de gestão pública, surgiu também nos anos 1990 o movimento
gerencialista e a cultura do management21, originárias da área privada, adaptadas para
o setor público, originando o movimento reinventando o governo, elaborado pelos
consultores David Osborne e Ted Gaebler.
Conforme esses autores, os 10 princípios que levariam a uma reinvenção do
governo seriam:
• o governo catalisador, navegando em vez de remar – a prestação de serviços
públicos não é uma tarefa governamental, mas algo que se deve assegurar aos
cidadãos. Logo, é muito importante a habilidade do Estado em formar parcerias com
a iniciativa privada para realizar privatizações e também mobilizar grupos
comunitários para a prestação de serviços públicos;
• governo que pertence à comunidade, dando responsabilidade ao cidadão em vez
de servi-lo - a transferência de responsabilidades da burocracia para as
comunidades deve ser incentivada, pois estas são mais flexíveis e estão mais
próximas dos problemas;
• governo competitivo, introduzindo a competição na prestação de serviços – a
introdução da competição no setor público é vantajosa porque aumenta a eficiência,
melhora a qualidade do atendimento, além de encorajar a inovação e o
engajamento dos serviços públicos;
• governo orientado por missões, transformando órgãos burocratizados – tal como no
setor privado, o governo deve se orientar por missões tal como empresas privadas
fazem ao utilizar princípios do planejamento estratégico, pois isso ajuda a tornar as
organizações mais eficientes do que aquelas que se orientam por normas e regras;
21 Ver Glossário
74
• governo de resultados, financiando resultados, não recursos – uma constante
avaliação de resultados e desempenhos facilita a distinção entre o sucesso e o
fracasso, além de possibilitar a recompensa dos bons resultados e a correção dos
problemas;
• governo e seus clientes, atendendo às necessidades dos clientes e não da
burocracia – os cidadãos estão cansados da burocracia e querem ser mais
valorizados como clientes. Logo, é recomendável o uso da administração da
qualidade e a criação de sistemas de prestação de serviços mais simples e
transparentes;
• o governo empreendedor, gerando receitas e não despesas – seguindo o espírito
empreendedor, o governo deveria poupar mais, criar meios de gerar novas receitas,
vincular a dotação orçamentária ao desempenho de cada departamento e criar
remunerações variáveis para os administradores públicos;
• o governo preventivo, a prevenção em lugar da cura – os governos devem investir
em programas de prevenção e atuar de forma mais estratégica, planejando suas
ações e a dotação orçamentária;
• o governo descentralizado, da hierarquia à participação e trabalho de equipe – as
organizações descentralizadas são mais rápidas em responder às necessidades
dos clientes e também mais motivadoras para os funcionários, pois permitem a
inserção da administração participativa e do empowerment;
• governo orientado para o mercado, induzindo mudanças através do mercado – os
programas governamentais apresentam uma série de defeitos quando comparados
com similares realizados pelo mercado e poderiam ser mais bem-sucedidos se
fossem oferecidos por ele.
Conforme a autora, Paula (2005, p. 53):
O movimento reinventando o governo está diretamente relacionado com a emergência da indústria do management, que é composta pelos seguintes pilares que se inter-relacionam e se reforçam: as escolas de administração, as empresas de consultoria, os “gurus” empresariais e a mídia de negócios. Durante os anos de 1980 e 1990, os agentes da indústria do management ajudaram a consolidar o movimento das organizações burocráticas e a valorização da cultura do management e a conversão de técnicas e práticas administrativas em “modismos gerenciais”.
75
Para autora, nos Estados Unidos, o movimento gerencialista também contribuiu
para criar um novo imaginário organizacional e social: a cultura do management22.
Essa cultura ficou caracterizada e consolidada, através da produção de livros, revistas
e outros objetos de consumo presentes no mundo de negócios. Além disso, produziu
uma cultura repleta de símbolos organizacionais como os “gurus”, “gerentes -heróis” e
os consultores.
A cultura do management pode ser definida como um conjunto de pressupostos
compartilhados pelas empresas, quais sejam:
• a crença numa sociedade de mercado livre:
• a visão do indivíduo como auto - empreendedor;
• o culto da excelência como forma de aperfeiçoamento individual e
coletivo;
• o culto de símbolos e figuras emblemáticas, como palavras de efeito
(inovação, sucesso, excelência), “gerentes heróis”;
• a crença em tecnologias gerenciais que permitem racionalizar as
atividades organizacionais grupais.
Já no modelo britânico de gestão publica, que teve seu início em 1979, com a
chegada ao poder de Margaret Thatcher, o foco foi direcionado à reprodução de
técnicas administrativas do setor privado e na questão da eficiência, além da
privatização de serviços públicos, bem como a utilização de técnicas e práticas da
administração do setor privado e delegação de responsabilidades públicas para a
comunidade.
Algumas medidas estabelecidas foram a descentralização do aparelho de
Estado, que separou as atividades de planejamento e execução do governo e
transformou as políticas públicas em monopólio dos ministérios; privatização das
estatais; terceirização dos serviços públicos; regulação estatal das atividades públicas
conduzidas pelo setor privado; e uso de ideias e ferramentas gerenciais advindas do
setor privado.
A autora descreve que as recomendações feitas pelo Consenso de Washington
e pelos organismos internacionais, ou seja, as reformas orientadas para o mercado se
transformaram em um parâmetro para a América Latina e foram adotadas como
22 Conceito desenvolvido pela própria autora em conjunto com Wood Jr (2002)
76
modelo de gestão pelo Centro Latinoamericano de Administración para el Desarrollo –
CLAD e outros pesquisadores e centros acadêmicos.
Por fim, para a autora, a reforma gerencial ocorrida no Brasil foi um
desdobramento do ajuste estrutural da economia, que teve início com a adesão do
governo Collor às recomendações do Consenso de Washington para a crise latino-
americana. Inicialmente, o discurso reformista incorporou as recomendações
neoliberais, propondo uma redução do tamanho do Estado brasileiro e outras medidas
de restrição da atuação estatal. Em 1995, o ministro Bresser Pereira apresentou o
Plano Diretor da Reforma de Estado - MARE, que foi debatido nas reuniões do
Conselho da reforma de Estado e também integrou a pauta de discussões da reforma
constitucional no Congresso Nacional.
Assim em 1998, foi aprovada a emenda da reforma administrativa que efetivou
as mudanças estruturais necessárias para legitimar a reforma gerencial. Conforme
Bresser-Pereira, (2006b), a reforma gerencial teve três dimensões: a institucional, a
cultural e a gestão, onde a dimensão institucional se refere à reestruturação do
aparelho de Estado, que previa que as atividades estatais fossem divididas em dois
tipos: Atividades exclusivas do Estado e Atividades não exclusivas de Estado. Já na
dimensão cultural a estratégia era transformar a cultura burocrática do Estado em
cultural gerencial. Por fim, a dimensão da gestão previa a utilização das ideias e
ferramentas de gestão do setor privado criticamente adaptadas ao setor público, como
os programas de qualidade, a reengenharia organizacional, a administração
participativa e outras.
A partir desses parâmetros, foram elaborados pelo governo alguns programas e
projetos como o Programa de Qualidade e Participação, o Programa de Reestruturação
e qualidade dos Ministérios e a implementação de uma nova política de recursos
humanos. Para a implementação de alguns desses programas, a partir de 1998, foram
utilizados ferramentas gerencialistas como o Ciclo de Melhoria Continua (Ciclo PDCA –
planning-doing-checking-acting) formulado no contexto do método Deming de
gerenciamento e o benchmarking, que significa a imitação e reprodução de processos,
técnicas e praticas administrativas bem- sucedidas.
Os programas visavam integrar os cidadãos à ação pública, definir indicadores
de desempenho para avaliar resultados e níveis de satisfação de clientes-cidadãos e
estimular a criatividade, o trabalho em equipe, a cooperação, etc.
77
No Brasil, a reforma de Estado pode ser sintetizada no quadro a seguir com
autoria de (Matias-Pereira, 2010, p. 96)
Quadro 3: Síntese da trajetória das reformas administrativas, modernização
administrativa e reforma do Estado no Brasil
Ações Casos Medidas orientadoras Processos adotados
Reforma Administrativa
DASP O Problema está nos meios. Reforça o papel da burocracia. Princípios – centralização e padronização
Soluções (a burocracia ortodoxa); busca de problemas (burocracia patrimonial). Projeto Maurício Nabuco – implantado de maneira autoritária.
Modernização Administrativa
Administração paralela (Governo JK)
O problema está na adequação entre meios e fins – necessidade de uma burocracia flexibilizada para fins de desenvolvimento respectivamente
Problemas (rigidez e incapacidade) em busca de soluções (grupos executivos e Decreto-lei nº 200, respectivamente). Elabora-se diagnóstico (Comissão de Simplificação Burocrática – COSB; e Comissão Amaral Peixoto, respectivamente); proposições legais; e implementa-se mediante forte liderança top-down (grupos executivos) ou de forma autoritária (Decreto-lei nº 200).
Reforma do Estado
Governo Collor - 1990/1991
Princípios – descentralização e flexibilização. O Estado como problema.
Soluções (desmonte e enfraquecimento do papel do Estado).
Reforma do Estado
Governo FHC - 1995/2002
O Estado como problema (a crise do Estado e da administração burocrática segundo a visão neo- institucionalista econômica). Construção do Estado regulador. Deslocamento entre planejamento e gestão – um plano de adequação do Estado (Plano Diretor) não atrelados a metas de desenvolvimento; um plano de desenvolvimento (PPA 2000 -2003) sem um modelo de adequação do Estado para sua implementação. Orientação dominante do ajuste fiscal obstruiu tanto o Plano Diretor quanto o PPA. Princípios – desestatização, flexibilidade, foco no cliente, orientação para resultados, controle social.
Soluções (nova gestão pública; “administração gerencial”) em busca de problemas (a “administração burocrática”). Elaboram-se planos (PD, PPA) com baixo envolvimento e participação dos atores envolvidos, o que gera baixo grau de implementação. As políticas de gestão se fragmentam e prevalece a orientação do ajuste fiscal.
Revitalização do Estado
O Plano de Gestão Pública do Governo Lula 2003/2006 e
20007/2010
O Estado como solução – papel ativo na redução das desigualdades e promoção do desenvolvimento. A Administração Pública pode e deve ser otimizada para aumentar a capacidade de governo. Princípios – redução do déficit institucional; fortalecimento da capacidade de formular e implementar políticas; otimização de recursos; participação, transparência e ética.
Problemas (diagnóstico institucional da APF) em busca de soluções (um plano de gestão pública). O Plano de Gestão como uma agenda positiva – implementação dos PPAs 2004 –2007 e 2008-2011, inovações gerenciais e equacionamento de problemas estruturais da administração federal. Busca-se elaborar um diagnóstico participativo; debatem-se os problemas; elabora-se um plano coletivo de governo; constrói-se uma rede de implementação com ampla sustentação. Os resultados do primeiro mandato (2003- 2006) ficam abaixo do esperado, em termos de eficiência, eficácia e efetividade, bem como na transparência e ética. Pretende-se no período de 2007-2011 reforçar a governança, com a superação das
78
dificuldades encontradas para se implantarem as políticas públicas, devido à rigidez e ineficiência da máquina administrativa.
Fonte: MATIAS-PEREIRA (2010, p. 96)
4.3.5 Problemas e Contradições da Nova Gestão Pública – A dministração
Pública Gerencial
Para Matias–Pereira (2010, p. 107):
Em termos teóricos, o gerencialismo (NPM/NGP) levanta sérios problemas e contradições. Em primeiro lugar, parte de suposições que não demonstra e que são autênticas falácias, como o pressuposto de que a gestão empresarial é inerentemente superior à gestão pública e de que o papel dos cidadãos pode ser reduzido ao de consumidores. Em segundo lugar, o new public management insiste, por um lado, na descentralização e no desaparecimento dos escalões intermédios, mas, por outro, acentua a necessidade de controle financeiro e coordenação orçamental, o que gera incoerências e contradições no processo de decisão e implementação das políticas públicas. Os governos alijam as responsabilidades de funcionamento dos serviços públicos e, simultaneamente, querem controlar esse funcionamento. Finalmente, muitos serviços públicos são difíceis de serem medidos em termos de eficiência e avaliação de performance, o que torna a aplicação da new public managemet muito problemática.
Já para Hood (1991 apud Matias–Pereira, 2010, p. 107), as criticas a esse novo
modelo de gestão são:
• A primeira crítica é de que o new public managemet não tem qualquer
conteúdo teórico, é uma roupagem vazia.
• A grande consequência do gerencialismo (NPM/NGP) tem sido o aumento
exponencial dos controladores orçamentais e de performance, sem que o
fato se tenha traduzido em melhorias dos serviços públicos, como vem sendo
constatado pelos cidadãos.
• Embora se apresente como promotor do bem comum, o manageralismo, na
realidade, tem servido de veículo para interesses particulares, criando uma
elite de novos gestores públicos, cujos privilégios são muito superiores aos
dos antigos administradores.
79
• Além disso, a new public managemet deve ser entendida como um modelo
de gestão pública de matriz britânica, dificilmente exportável para outras
estruturas e culturas administrativas.
Para Paula (2005, p. 82), os limites da nova administração pública seriam:
• formação de uma nova elite burocrática;
• centralização do poder na instâncias executivas;
• inadequação da utilização das técnicas e práticas advindas do setor
privado no setor público;
• dificuldade de lidar com a complexidade dos sistemas administrativos e a
dimensão sociopolítica da gestão:
• incompatibilidade entre a lógica gerencialista e o interesse público.
Segundo Abrucio (2006), na metade da década de 1980 a discussão em torno do
modelo gerencial tornou-se mais complexa e ganhou novos rumos. A mais importante
mudança foi a tentativa de se constituir de serviços públicos voltados para os anseios
dos clientes/consumidores. Neste momento, surge o Consumerism23 como uma
evolução do modelo gerencial. É nesse ponto que o modelo gerencial sem abandonar
o conceitual empresarial vinculado à eficiência e à busca da qualidade dos serviços
também começa a envolver o aspecto público da administração pública.
Em artigo anterior, Abrucio (1997, p. 24), ressalta algumas questões sobre a
relação entre o governo como prestador de serviços públicos e a população como:
A crítica mais geral é direcionada ao conceito de consumidor de serviços públicos. Em primeiro lugar, com relação à diferença que existe entre o consumidor de bens no mercado e o “consumidor” dos serviços públicos. Como aponta Pollitt, é mais complexa a relação do prestador de serviço público com o consumidor, já que ela não obedece ao puro modelo de decisão de compra vigente no mercado. Aliás, há determinados serviços públicos cujo caráter é compulsório, isto é, não existe a possibilidade de escolha, como provam a utilização em determinados momentos dos hospitais e dos serviços policiais”.
23 Ver Glossário
80
O autor também salienta que, para vários autores24, o conceito de consumidor
deve ser substituído pelo de cidadão, em razão de que o conceito de cidadão é mais
amplo do que o de cliente/ consumidor, uma vez que a cidadania implica direitos e
deveres e não só liberdade de escolher os serviços públicos.
4.3.6 Proposta de um novo modelo de Gestão Pública:
Após muitas críticas ao modelo Gerencial e suas evoluções como o
Consumerism e outros, algum teóricos começaram a propor novos caminhos, seja
reelaborando o modelo gerencial ou, também, incluindo conceitos novos ao mesmo.
Entre estas novas propostas destacamos algumas relevantes.
Conforme Abrucio (2006), o modelo de administração conhecido como Public
servive orientation – PSO, é um modelo que procura encontrar os novos caminhos
abertos pela discussão gerencial, explorando suas potencialidades e preenchendo
suas lacunas. Esta nova proposta dá ênfase aos temas do republicanismo e da
democracia, utilizando-se de conceitos como accountability, transparência, participação
política, equidade e justiça, questões praticamente ausentes do debate no modelo
gerencial. O foco inicial foi a problemática da descentralização e a inclusão das virtudes
políticas da descentralização diferentemente do gerencialismo puro, onde a
descentralização era valorizada como meio de tornar mais eficazes as políticas
públicas, ou no consumerism, onde a descentralização era um meio de conferir aos
consumidores o direito de escolher os equipamentos sociais que lhes oferecessem a
melhor qualidade.
Já na nova proposta, o fundamental é o conceito de cidadão, pois esse tem
conotação coletiva (cidadania como um conjunto de cidadãos com direitos e deveres)
ao contrário do termo consumidor (ou cliente) que tem um referencial individual, que na
maioria das vezes privilegia a proteção dos direitos do indivíduo, ou então dá mais
valor ao mercado do que à esfera pública. Por fim, é a partir do conceito de esfera
pública (domain public) que se estrutura o conjunto de ideias da public service
orientation, sem, contudo, descartar as ideias desenvolvidas no âmbito do public
management. As concepções a respeito de eficiência, qualidade, avaliação de
24 Ver, entre outros, WALSH, 1991; POLLITT, 1990; CLARKE, 1993; STEWART & RANSON, 1988; FREDECKSON, 1992
81
desempenho, flexibilidade gerencial, planejamento estratégico continuam relevantes,
mas há a tentativa de aperfeiçoá-las em um contexto em que o referencial da esfera
pública é o mais importante.
Essas questões, referentes às contradições do novo modelo gerencial, deverão
servir para uma reflexão mais aprofundada sobre esse modelo, principalmente, as que
questionam a simples e indiscriminada importação de técnicas e ferramentas da
administração privada, adaptadas à administração pública sem serem observadas as
peculiaridades desta última. Essa questão é trazida por alguns autores, entre os quais
podemos destacar Bergue e Klering (2010).
No Brasil, as ações mais importantes para a melhoria da qualidade da gestão
pública foram:
• Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade – PBQP, criado em 1990.
• Programa Qualidade e Participação na Administração Pública – QPAP, criado
em 1995, com a Reforma do Estado.
• Programa da Qualidade no Serviço Público – PQSP, foi criado em 1999, no
Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.
• Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratização – GESPÚBLICA ,
que unificou o Programa da Qualidade com o Programa Nacional de
Desburocratização, criado em 2005 pelo Governo Federal (Decreto No. 5378, de
23/02/2005).
O Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratiz ação –
GESPÚBLICA , conforme documento da Secretaria de Gestão do Ministério do
Planejamento, Orçamento e Gestão é o resultado da evolução histórica de diversas
iniciativas do Governo Federal para a promoção da gestão pública de excelência, que
objetivam contribuir para a qualidade dos serviços públicos prestados ao cidadão e
para o aumento da competitividade do País. Esse programa buscava a mudança de
paradigma administrativo, ou seja, da administração burocrática para a administração
gerencial.
Essa proposta renovou os paradigmas da administração pública brasileira e
exigiu a busca de novos métodos e práticas de gestão.
82
Assim, houve a necessidade da construção de um Programa de Qualidade no
serviço público que estivesse alinhado com as novas propostas, onde as organizações
públicas tivessem foco em resultados e no cidadão.
Para Ferreira (2009), com a publicação do Documento de Referência/2009, ficou
estabelecido que o GESPÚBLICA é uma política pública formulada para a gestão, que
baseia-se em um modelo de gestão pública singular, que incorpora à dimensão técnica,
própria da administração, a dimensão social, até então restrita à dimensão política.
Assim, pode–se dizer que o GESPÚBLICA busca promover a participação da
sociedade no seu movimento e suas principais características são: ser essencialmente
pública; estar focada em resultados para o cidadão; ser federativa.
Atualmente, está em processo de consolidação um Modelo de Excelência para a
Gestão Pública - MEGP, o qual considera como essenciais os princípios, conceitos e
linguagem que caracterizam a natureza pública das organizações e que impactam na
sua gestão. Visa entender, respeitar e considerar os principais aspectos inerentes à
natureza pública das organizações e que as diferenciam das organizações da iniciativa
privada, sem prejuízo do entendimento de que a administração pública tem que ser
excelente e eficiente.
O Modelo de Excelência em Gestão Pública está alicerçado nos seguintes
fundamentos: Pensamento sistêmico; Aprendizado Organizacional; Cultura da
Inovação; Liderança e constância de propósitos; Gestão baseada em processos e
informações; Visão de Futuro; Geração de Valor; Comprometimento das pessoas; Foco
no cidadão e na sociedade; Desenvolvimento de parcerias; Responsabilidade social;
Controle Social; Gestão participativa.
Juntamente a esse modelo de Gestão Pública, podemos ressaltar outro aspecto
muito relevante para a construção de um novo modelo de Estado. Para tanto,
utilizamos a proposta ou entendimento de Bresser-Pereira (2009, p. 126):
Os cidadãos necessitam de um Estado forte para proteger seus direitos, garantir sua segurança: não só a segurança pessoal e política, mas, também, a segurança resultante de um bom sistema educacional, um sistema efetivo de assistência à saúde, um sistema de renda mínima e um sistema de aposentadoria. Os mercados asseguram uma alocação de recursos relativamente eficiente, mas não protegem os cidadãos. Os mercados globais e a competição generalizada tornam a insegurança ainda mais manifesta. Para atingir a segurança necessária, os cidadãos não têm alternativa se não organizar a ação coletiva na forma de um
83
Estado democrático forte - um Estado que, no século XXI, será social- liberal e republicano.
O autor, em seu livro Construindo o Estado Republicano, inova quando fala de
direitos dos cidadãos, pois além dos direitos do cidadão já conhecidos, como os
direitos civis, políticos e sociais, ele propõe uma nova categoria, a dos direitos
republicanos:
Assim como os cidadãos têm direito à liberdade e à propriedade (direitos civis), direitos de votar e de serem eleitos (direitos políticos), direito ao trabalho, à educação, à saúde e uma renda mínima (direitos sociais), tem direito a que a res pública continue a serviço de todos em vez de ser controlada por interesses privados (direitos republicanos)”. (BRESSER-PEREIRA, 2009, p. 129).
Para Matias–Pereira (2010), a modernização da Administração Pública
deve buscar de forma permanente a estruturação de um modelo de gestão que possa
alcançar diversos objetivos, como a melhoraria na qualidade da oferta de serviços à
população, juntamente com o aperfeiçoamento do sistema de controle social da
Administração Pública, combater a corrupção, privilegiar a transparência, promover a
valorização do servidor público, entre outros.
Quando o autor trata sobre os objetivos e fundamentos principais que devem
constar na reforma do Estado ele propõe:
A reforma do Estado não pode se restringir à reestruturação administrativa e à busca do equilíbrio fiscal. Deve ter como objeto principal a consolidação do processo democrático, a estabilidade econômica e o desenvolvimento sustentável com justiça social. Assim, a priorização da reforma de Estado é uma medida necessária para que o governo possa atender de forma adequada às demandas da sociedade. O atendimento dessa demandas exige que o Estado se torne cada vez mais eficiente, eficaz e efetivo na prestação de serviços públicos, com qualidade e menores custos para a sociedade. (Matias–Pereira, 2010, p. 246)
A modernização da Administração Pública e a reforma do Estado devem sempre
levar em consideração a natureza da esfera pública e a esfera privada, como bem
lembrado por Bresser-Pereira (2009, p. 343), quando enfatiza a necessidade de
84
estarmos atentos às diferenças entre gestão pública e privada, quando da importação
de práticas e conceitos da administração privada para a Administração Pública, porque
na gestão privada o mecanismo de coordenação é o mercado e o objetivo é o lucro, e
na gestão pública o mecanismo é o político e o objetivo é o interesse público. Ele
propõe que, em vez de importar as práticas e conceitos organizacionais de um setor
para o outro, o importante é filtrar e reelaborar criticamente os conceitos e técnicas.
Ao finalizar, utilizamos os questionamentos levantados por Kettl (2006) sobre o
dilema que existe frente à reforma do Estado, pois se por um lado os reformadores
desejam um Estado menor e mais eficiente, inspirado nas regras do mercado e
administrado por profissionais com experiência no setor privado, por outro lado, a
administração pública não é uma simples função de produção e o administrador público
tem que ser sensível ao interesse público.
Lembrando que a regra do mercado não coincide com desejo de promover o
bem público, o autor faz uma advertência e conclui: “Uma reforma genuína deve
procurar sempre o equilíbrio entre os novos mecanismos geradores de eficiência, sem
jamais perder de vista as eternas questões relativas a res publica” (KETTL, 2006, p.
105).
85
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: ABRUCIO, Fernando Luiz. Os avanços e os dilemas do modelo pós-burocrático: a reforma da administração pública à luz da experiência internacional recente. In: BRESSER-PEREIRA, L. C.; SPINK, P. K. (Org). Reforma do Estado e administração pública gerencial . Rio de Janeiro: FGV, 2006.
ABRUCIO, Fernando Luiz. O impacto do modelo gerencial na Administração Pública Um breve estudo sobre a experiência internacional recente. Cadernos ENAP . Brasília, n. 10, c1997, 52 p. Disponível em: <www.enap.gov.br/index.php?option=com_docman&task=doc/> . Acesso em: 20 out 2013.
BACHTOLD, Ciro. Noções de Administração Pública . Cuiabá: EdUFMT; Curitiba: UFPR, 2008.
BERGUE, Sandro Trescastro. Gestão de pessoas em organizações publicas . Caxias do Sul: EDUCS, 2010.
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GLOSSÁRIO: Accountability:
É o conjunto de mecanismos e procedimenos que levam os decisores
governamentais a prestarem contas dos resultados de suas ações, garanindo-se maior
transparência e a aexposição das políticas públicas. (Matias – Pereira, 2010, p.71)
É um termo da língua inglesa, sem tradução exata para o português, que remete
à obrigação de membros de um órgão administrativo ou representativo de prestar
contas a instâncias controladoras ou a seus representados. Outro termo usado numa
possível versão portuguesa é responsabilização .
Accountability pode ser traduzida também para o português, deficientemente,
por "prestar contas". «Accountability» significa que quem desempenha funções de
importância na sociedade deve regularmente explicar o que anda a fazer, como faz, por
que faz quanto gasta e o que vai fazer a seguir. Não se trata, portanto, apenas de
prestar contas em termos quantitativos mas de auto-avaliar a obra feita, de dar a
conhecer o que se conseguiu e de justificar aquilo em que se falhou.
Consumerism:
O consumerism seria uma evolução do modelo gerencial puro, que se
caracterizou principalmente, pelo conceito de cliente/consumidor nos serviços públicos.
Contudo, houve muitas críticas ao conceito, uma vez que existe uma grande diferença
entre cliente e consumidor do usuário dos serviços públicos, pois no último caso, o
modelo de usuário não obedece ao modelo de decisão de compra vigente no mercado.
Formas e Regime de Governo:
Monarquia : O poder do governo é concentrado em uma única pessoa, nessa forma de
governo o poder é repassado hereditariamente, e as propriedades inerentes a
soberania é concebida diante dos poderes especiais, além da tradição existente.
Oligarquia : Corresponde a um regime de governo vinculado ao controle de uma
quantidade restrita de pessoas e essas desfrutam de uma série de vantagens devido a
sua condição alicerçada no poder.
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República : Na República os representantes do povo são eleitos pelos próprios, de
forma direta ou indireta, a principal característica da República é de estabelecer a
justiça e o bem estar comum.
Aristocracia : São governos centralizados nas mãos de poucas pessoas, podendo ser
nobres ou não.
Democracia : Na democracia o representante é escolhido pelo povo através de votação
para que assegure primordialmente a vontade popular. Atualmente a democracia é
dividida em três poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário, que devem ser autônomos
e harmônicos.
Parlamentarismo : No parlamentarismo as decisões sofrem maior influência pelo
parlamento, são eles os responsáveis por indicar um chefe de governo e também um
primeiro ministro, sendo assim é possível que o chefe do governo seja um presidente
ou um monarca.
Presidencialismo : No presidencialismo o Presidente e seus ministros compõem o
Poder Executivo, já os deputados federais e os senadores compõem o Poder
Legislativo e por fim todo juiz e magistrado compõem o Poder Judiciário. Os poderes
citados devem controlar uns aos outros de forma equilibrada, o chefe do governo nesse
caso é o presidente.
GesPública:
O Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratização – GesPública – foi
instituído pelo Decreto nº 5.378 de 23 de fevereiro de 2005 e é o resultado da evolução
histórica de diversas iniciativas do Governo Federal para a promoção da gestão pública
de excelência, visando a contribuir para a qualidade dos serviços públicos prestados ao
cidadão e para o aumento da competitividade do País. (Secretaria de Gestão –
Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão/Governo Federal).
Governança:
Governança Corporativa
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Governança Corporativa é o sistema pelo qual as organizações são dirigidas,
monitoradas e incentivadas, envolvendo as práticas e os relacionamentos entre
proprietários, conselho de administração, diretoria e órgãos de controle. As boas
práticas de Governança Corporativa convertem princípios em recomendações
objetivas, alinhando interesses com a finalidade de preservar e otimizar o valor da
organização, facilitando seu acesso ao capital e contribuindo para a sua longevidade.
Instituto Brasileiro de Governança Corporativa - IBGC) Management:
É um modelo de gestão que geralmente está associado ao setor privado e é uma
abordagem racional para a tomada decisões. Os administradores são agentes que
maximizam o uso de recursos para atingir metas organizacionais e alimentar o
crescimento corporativo. Paula, (2005)
Serviços Públicos:
Serviços Gerais ou “uti universi” - são aqueles que a Administração presta sem Ter
usuários determinados, para atender à coletividade no seu todo. Ex.: polícia,
iluminação pública, calçamento. Daí por que, normalmente, os serviços uti universi
devem ser mantidos por imposto (tributo geral), e não por taxa ou tarifa, que é
remuneração mensurável e proporcional ao uso individual do serviço.
Serviços Individuais ou “uti singuli” - são os que têm usuários determinados e
utilização particular e mensurável para cada destinatário. Ex.: o telefone, a água e a
energia elétrica domiciliares. São sempre serviços de utilização individual, facultativa e
mensurável, pelo quê devem ser remunerados por taxa (tributo) ou tarifa (preço
público), e não por imposto.