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Margarida Costa Pereira, nº 15, 9º A Escola Básica e Secundária de Anadia Concurso Ler & Aprender Stop!

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Margarida Costa Pereira, nº 15, 9º A

Escola Básica e Secundária de Anadia

Concurso Ler & Aprender

Stop!

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“Foi encontrado o corpo de um rapaz de apenas 15 anos, enforcado na sua própria casa. A polícia já

está a investigar o acontecimento e não quer prestar declarações sobre o trágico acidente que tirou a vida a

este jovem…”

A televisão era o único barulho que preenchia a casa. O corpo de Carlota caíra desfalecido no chão.

Sentia em si uma angústia profunda mas também um sentimento de revolta que a cobria, não entendia o

porquê, sabia que nada ia bem mas, de facto, não compreendia porque é que ele tinha sido egoísta e não

pensou, em momento algum, nos que lhe queriam bem como ela.

Passaram-se duas horas e os telefones não paravam de tocar. Ela continuava caída no mesmo sítio.

Na verdade, Carlota estava sem energia e sentia-se cansada porém, momentos depois, decidiu ir deitar-se.

Já eram nove horas da noite, quando a sua mãe chegou a casa. A preocupação desta era extrema.

Tinha enviado dezenas, senão centenas de mensagens para a sua filha e nunca tinha obtido resposta. Não

queria sequer pensar no que poderia ter acontecido. Carlota já tivera depressões antes e tinha medo que esta

tivesse uma recaída com a morte do seu melhor amigo. Na realidade, era o único que ela tinha, uma vez que

nunca fora uma pessoa muito social e não era propriamente uma “pop star” com a fama no topo de tudo e de

todos.

Quando chegou a casa, esta estava mais escura que nunca, para além de estar inundada num silêncio

perturbador. Correu, então, toda a habitação. As lágrimas escorriam pela sua face. Finalmente entrou no seu

quarto e viu a sua filha agarrada ao seu peluche de criança. Este fora-lhe oferecido por Sebastião, o melhor

amigo, quando eram apenas crianças. Carlota, nos momentos mais difíceis da sua vida, sempre gostou de

estar recolhida no quarto de sua mãe e, de facto, como não queria passar aquela noite no seu respetivo

quarto, decidiu assim procurar aconchego mais uma vez no quarto de sua progenitora. Esta não quis de

maneira nenhuma acordá-la, por isso aconchegou a filha e foi-se deitar no sofá da sala de estar.

Entretanto, já passava da uma da manhã quando Júlia, mãe de Carlota, acordou com os gritos da sua

filha e de imediato correu para o seu quarto para perceber o que se passava.

- Tem calma, meu amor! A mãe já está aqui. - afirmou Júlia, tentando embalar a sua filha no seus

braços.

A rapariga não respondeu, apenas abraçou a mãe. Esta tinha percebido o que se passara, Carlota

tivera sonhado com Sebastião. Sendo assim, como não queria perturbar a filha naquele momento,

preocupou-se em não puxar o assunto. Estiveram assim abraçadas e caladas por cerca de vinte minutos.

- Mãe, podes ficar aqui comigo? - interrogou finalmente a jovem

- Claro, minha querida! - respondeu a sua mãe com uma certa calma na sua voz.

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As duas acordaram juntas na manhã seguinte. Era dia de escola, mas na verdade Carlota não queria ir.

Não sabia como iria ser capaz de aguentar a escola sem o apoio do amigo. Ele era o seu porto de abrigo e o

único que a compreendia.

No dia seguinte, era o velório do seu amigo e Carlota insistiu em estar presente. Sabia que poderia

aumentar a sua dor e a sua revolta, mas mesmo assim foi.

Passara-se uma semana e a jovem não reagia a nada. Júlia começava a ficar seriamente preocupada

com a sua filha. Cada dia que passava, a situação não melhorava. Mas o que pegava Carlota à cama e ao

choro eram os motivos da morte do amigo. Este não tinha morrido por simples desilusões da adolescência,

era bem mais grave o seu problema. Sebastião era uma vítima de bullying na escola e sempre tentou afastar

a amiga do problema, pois não queria que esta sofresse por sua culpa. As agressões eram constantes quer

psicológicas quer físicas. Ela, por sua vez, sentia-se culpada por nada ter feito. Uma simples queixa poderia

ter dado um rumo diferente à situação, pois nunca pensou que fosse acabar assim. Todos julgavam que tinha

sido uma birra de menino e uma crise da adolescência, ninguém pensava no óbvio.

Carlota tinha a certeza que a próxima vítima seria ela, por isso no meio do mar de sentimentos que

pairavam na sua pobre alma existia uma onda de medo. Mas sabia que tinha de enfrentar a realidade e

encarar todos, apesar dos comentários e de tudo o que a preocupava.

No dia seguinte, Carlota acordou cedo para um dia normal de aulas, apesar de saber que nada seria

igual. Foi, pela primeira vez desde sempre, para a escola sozinha.

Quando chegou à sala, todos ficaram a olhar para ela. Uns comentavam a sua entrada com um olhar

observador, outros estavam chocados e não conseguiam desviar o seu olhar.

Assim que se sentou, sentiu um enorme arrepio de frio. O lugar do seu lado direito estava vazio,

Sebastião não estava lá.

A aula passou e, apesar de a rapariga não ter conseguido prestar atenção alguma, sentia que tinha de

sair dali o mais rapidamente possível.

No momento em que chegou o intervalo, a jovem não tinha ninguém com quem ficar. Por este motivo, o

grupo de rapazes e raparigas que a olharam de lado na aula decidiram aproximar-se.

- Bem! Parece que o teu amiguinho foi desta para melhor. - comentou Jorge, o chefe do grupo, num

tom frio e de riso.

Carlota decidiu levantar-se e sair, mas foi agarrada pelo braço por Jorge.

- Ouve, tu vê bem o que vais dizer! Não queres arrepender-te, pois não?!

- Larga-me, estás a magoar-me.

- Se achas que isto te magoa, pensa então no que vai acontecer, se decidires contar o que se passou

com o teu amiguinho. Vais dizer que éramos todos amigos, ouviste!

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Carlota saiu dali com os olhos inundados de lágrimas. Sentia que devia ter dito algo, mas não podia

voltar atrás.

Os dias foram passando e nada mudava até que ela foi chamada a depor sobre o caso do amigo. Não

teve, pois, coragem de dizer a verdade, uma vez que tinha demasiado medo. Limitou-se assim a dizer que

não sabia de nada. Sentira uma enorme raiva consigo, já que achava que tinha sido fraca a não contar a

verdade.

No dia seguinte, foi para a escola e deu com os colegas à entrada do portão. Foram ao pé dela e

disfarçadamente perguntaram-lhe:

- Então, o que foi a menina dizer ao senhor polícia?

- Não têm nada a ver com isso. - afirmou ela.

- Vê como falas! - aconselhou Jorge, agarrando-lhe o braço com uma força extrema.

- Não! - gritou Carlota, a arrancar-lhe a mão do seu braço à frente de toda a comunidade escolar -

Chega! O Sebastião não conseguiu defender-se, mas eu vou defendê-lo. Chega de chantagem! Foram vocês

que o mataram. Vou fazer com que parem com isso, mais ninguém tem de sofrer, ninguém tem de se sentir

menor, porque vocês não prestam e eu não vos vou permitir que me façam o mesmo. Acabou!

Quando Carlota terminou de falar, todos estavam chocados com toda aquela informação. Nunca

ninguém tinha pensado que aquele grupo de jovens tivesse feito tanto. Nunca ninguém acreditara. Mas a hora

da verdade tinha chegado.

O grupo foi encaminhado para a direção e no intervalo, toda a escola sabia que os membros daquele

grupo tinham sido suspensos das aulas e corriam o risco de serem expulsos da escola.

Carlota ainda não tinha percebido o como lhe ocorrera uma força interior para contar tudo. Sabia

apenas uma coisa, o seu amigo estaria a sorrir-lhe nesse preciso momento.

No fim do dia, a rapariga foi à polícia e contou tudo. Avisaram-na que provavelmente os colegas

poderiam ser acusados da morte do amigo e poderiam ir para um reformatório, apesar de ser um processo

demorado. Carlota sabia que a justiça tinha de ser feita, mas será que a justiça é assim tão justa? Nunca

seria justa o suficiente para compensar uma morte e nunca poderia trazer Sebastião de volta.

Podia até dizer-se que a história acabou muito bem, mas nunca acaba bem, pois as feridas ficam e

existem muitos mais casos como o de Sebastião que ninguém quer saber, ninguém admite, ninguém acredita.

Margarida Costa Pereira, nº 15, 9º A

Escola Secundária de Anadia

Concurso Ler & Aprender