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PREFÁCIO

É com enorme satisfação que verificamos que a Associação Internacional de

Estudantes de Agricultura (IAAS; UTAD), ao promover um curso sobre siderotecnia, está

sensibilizada para o facto de que cumpre às instituições de ensino incentivar, organizar e

desenvolver a arte do Ferrador nos seus diversos aspectos. Este ofício, em declínio há já

bastante tempo devido à substituição do cavalo pela mecanização como força motriz,

encontrou um forte apoio nos cavalos de desporto e lazer.

O saber desta arte foi, durante muitos séculos, transmitido entre gerações por artesãos

de aldeia, com o óbvio empirismo associado. Na região transmontana ainda é possível

encontrar quem abrace este trabalho como se pode constatar, por exemplo, na região de

Carlão onde a UTAD aí possui uma quinta agropecuária. Julgamos que esta resistência se

deva à ainda utilização de Mulas e Machos, onde o declive dos terrenos não permite o uso de

tractores ou outras máquinas motorizadas.

A preocupação de quem trabalha com equinos sobre os diversos aspectos da ferração

dos seus pés, seja como uma forma de maneio destes animais, seja como apoio ao tratamento

de diversas doenças com origem nos cascos, através da aplicação das chamadas ferraduras

ortopédicas (correctivas) já foi sentida no Hospital de Equinos de Mafra (Centro Militar de

Medicina Veterinária), o qual garante os cuidados zootécnicos e veterinários dos seus

animais, como atestou no seu relatório final de licenciatura (*) um nosso ex-aluno que aí

estagiou em 1999 e do qual recomendamos, em parte, a leitura.

Esta sensibilização necessita, em nosso entender, de ser acompanhada (na nossa

universidade) de um efectivo apoio à equinicultura, com a formação de alunos em maneio de

equinos e eventualmente em equitação, em espaço aberto para o exercício dos animais.

Da mesma forma é fundamental a acção médico veterinária responsável da saúde dos

pés destes animais, até porque possuímos os instrumentos de diagnóstico complementar

essenciais ao bom desempenho das nossas funções, como podemos verificar através de

qualquer tratado publicado sobre o sistema músculo-esquelético. Não devemos, no entanto,

descurar as novas tecnologias que em muito facilitam estes trabalhos.

É com este intento que nos apraz participar neste primeiro curso de siderotecnia.

(*) Ver o capítulo da bibliografia

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É nosso objectivo tentar explanar da forma mais compreensível possível as bases

teóricas de anatomia topográfica assim como outros conceitos que sirvam aos siderotécnicos.

Esperamos que em futuras reedições deste curso, outros colegas, com afinidade para “o

mundo dos equinos” possam contribuir para o aprofundamento deste tema.

UTAD, Abril de 2004

João Simões

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ÍNDICE

PREFÁCIO, 1

1- INTRODUÇÃO, 4

2- ANATOMIA E CONFORMAÇÃO NORMAL DO PÉ, 5

2.1- Estrutura óssea das partes distais dos membros anteriores e posteriores, 5

2.2- Articulações, ligamentos e tendões da parte distal dos membros, 6

2.2.1- Articulações, 6

2.2.2- Ligamentos, 7

2.2.3- Tendões, 8

2.3- Irrigação sanguínea e enervação dos dígitos, 10

2.3.1-Vascularização, 10

2.3.2- Enervação, 11

2.4- Casco, 12

3- CONFORMAÇÃO NORMAL E APRUMOS DO CASCO, 17

3.1- Eixo do pé e eixo da quartela (pé-quartela), aprumos e orientação lateromedial do pé, 17

3.2- Comprimento do casco, 20

3.3- Ângulo do casco, 21

4- CINÉTICA DO PÉ DO CAVALO, 24

5- DEFEITOS DOS CASCOS, 25

6- DEFINIÇÃO DE ALGUMAS AFECÇÕES, 28

7- CONTENÇÃO DE EQUÍDEOS, 31

8- BIBLIOGRAFIA, 32

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1- INTRODUÇÃO

A siderotecnia é um dos ofícios essenciais à perseveração da saúde dos pés dos

equinos e consequentemente ao seu bem-estar. A sua importância é redobrada quando se

considera que estes animais de trabalho (agropecuária, desporto e lazer) dependem fortemente

do seu sistema locomotor. 70 a 80 % das claudicações em equinos têm como origem ou

envolvem os pés, sendo os anteriores os mais afectados devido a que 60 a 65 % do peso

destes animais (mono)ungulados aí é suportado (dependendo da conformação deste).

As ferraduras podem e devem ser aplicadas, após correcção dos cascos nos equinos,

quando:

(a) surge a necessidade de promover uma melhor aderência dos seus pés ao terreno;

(b) a utilização destes animais provoca um desgaste excessivo dos seus cascos;

(c) os defeitos de andamento devem ser corrigidos.

Por outro lado, a aplicação de ferraduras ortopédicas (as mais simples e económicas),

com o objectivo de instaurar cuidados correctivos/paliativos consequentes a diversas afecções

do pé e defeitos dos equinos torna necessária uma comunicação eficaz entre o Veterinário e o

Ferrador [Adams (1990) (1) refere as folhas de prescrição]. O primeiro precisa de ter

conhecimentos gerais sobre a siderotecnia e o segundo sobre a anatomia do pé e do membro

assim como dos mecanismos da sua trajectória.

Pelos motivos acima explanados, abordamos a anatomia e conformação do pé do

equino seguida de um capítulo sobre alterações de conformação do casco (defeitos) e da

definição das lesões mais importantes para as quais são indicadas as ferraduras ortopédicas.

Para outra aula, deixaremos os defeitos de aprumo, assim como a aparagem dos cascos e a sua

ferração, incluindo a utilização de ferraduras ortopédicas. Finalmente, descrevemos algumas

técnicas de contenção de equinos, uma vez que estes animais apresentam aspectos

comportamentais específicos que, associados ao seu porte, facilmente podem por em risco a

sua própria segurança e a daqueles com quem interagem.

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Colocámos em anexo a descrição de como proceder à retirada de ferraduras, situação

que muitas vezes o veterinário e o siderotécnico (ou o veterinário siderotécnico) se deparam e

que muito dificilmente se encontram abordados nos livros.

2- ANATOMIA E CONFORMAÇÃO NORMAL DO PÉ

Antes de nos introduzirmos na anatomia propriamente dita, relembramos as diferentes

regiões do equino (figura 1), no nosso caso com especial ênfase as extremidades comuns aos

membros anteriores e posteriores (canela, boleto, quartela, coroa e casco). Estes

conhecimentos de exognósia do cavalo são essenciais para uma efectiva compreensão do tema

em destaque e para quem pretenda se inserir no maneio destes animais.

Figura 1. Regiões do cavalo (6).

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2.1- Estrutura óssea das partes distais dos membros anteriores e posteriores

Nos membros anteriores, a canela ou cana localiza-se distalmente ao joelho e tem por

base óssea os 3 metacarpos. Nos membros posteriores situa-se distalmente ao curvilhão e

corresponde à área de projecção do mesmo número de metatarsos.

O boleto segue-se à canela e tem por base óssea a articulação metacarpo ou metatarso-

falângica e o sesamóide (grande sesamóide ou sesamóide proximal; figura 2).

A quartela, travadouro ou miúdo é a zona que segue ao boleto correspondendo à

área de projecção da primeira falange (falange proximal).

A coroa localiza-se entre a quartela e o casco e tem por base óssea a parte superior da

segunda falange (falange média).

O casco, unha ou pé é a zona terminal dos membros com o estojo córneo envolvente,

o qual protege a terceira falange (falange distal).

Na face palmar encontra-se o osso sesamóide distal (pequeno sesamóide ou navicular).

Figura 2. Constituição óssea das extremidades dos membros dos cavalos. Adaptado de (7).

Face

dorsal

Face

palmar ou plantar

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2.2- Articulações, ligamentos e tendões da parte distal dos membros

2.2.1- Articulações

Na parte distal de cada membro observamos (figura 3) a articulação metacarpo(tarso)-

falângica e as articulações interfalângicas proximal e distal. Estas duas últimas permitem

movimentos laterais, assim como ligeiros movimentos de rotação para além dos movimentos

de flexão e extensão. O movimento permitido à articulação interfalângica proximal é

consideravelmente maior que o permitido à articulação interfalângica distal. Enquanto a

articulação interfalângica proximal envolve somente as duas falanges (1ª e 2ª falange), a

articulação interfalângica distal envolve, além da 2ª e 3ª falange, o navicular.

Figura 3. Articulações presentes no digito. Adaptado de (7).

2.2.2- Ligamentos

Existem numerosos ligamentos na extremidade dos membros, os quais podem ser

agrupados em 5 categorias que se encontram descritas na figura 4. Estes ligamentos têm como

função manter correctamente unidas as articulações e orientar os seus movimentos. É

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necessário notar que nesta zona não existem outros tecidos volumosos, tais como os

músculos, que possam providenciar a necessária estabilização dessas articulações:

Grupo 1 – Ligamentos colaterais (pares) das articulações interfalângicas proximal e

distal e da articulação metacarpo-falângica.

Grupo 2 – Existem quatro pares de ligamentos sesamóideos distais e um par dos

ramos extensores do ligamento suspensor. São a inserção do ligamento suspensor, embora

também sirvam para a manutenção da integridade da articulação interfalângica proximal.

Figura 4. Ligamentos presentes no dígito (7).

Grupo 3 – Existem dois pares de ligamentos palmares. Estes ligamentos contribuem

para a restrição da flexão dorsal da articulação interfalângica proximal.

Grupo 4 – Existem três ligamentos que mantêm a posição do osso sesamóide distal

em relação à articulação interfalângica distal: ligamento sesamóideo colateral (um par) e o

ligamento sesamóideo ímpar.

Grupo 5 – Existem pelo menos 6 ligamentos (condropodais) que ligam a cartilagem

da úngula a estruturas adjacentes: um liga-se à falange proximal, um à falange distal, um ao

processo palmar (formado pelos ângulos da 3ª falange) ipsilateral, um ao processo palmar

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contralateral, um ao osso navicular (sesamóide distal) e um infiltra-se difusamente nas

almofadas digitais.

2.2.3- Tendões

Embora não existam músculos nesta região distal do membro, localizam-se aqui as

inserções tendinosas (tendões) de dois músculos extensores e dois músculos flexores do dígito

(figura 5). São eles o tendão extensor digital comum, o tendão extensor digital lateral, o

tendão flexor digital superficial (ou perfurado) e o tendão flexor digital profundo (ou

perfurante; passa a uma posição superficial nesta zona da quartela). O ligamento suspensor do

boleto está localizado mais profundamente, na região da canela.

Figura 5. Tendões presentes no dígito (7).

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De referir que após passar por cima das superfícies flexoras do sesamóide proximal,

através do túnel formado pelo tendão flexor digital superficial, o tendão flexor digital

profundo tem um percurso, na face palmar, distal em relação aos ligamentos sesamóideos e

por cima da superfície flexora do sesamóide distal até se inserir na superfície flexora da 3ª

falange. Ambos os tendões comparticipam na formação de uma bainha de um tendão flexor

comum que se estende desde a parte distal do metacarpo até à parte distal da bursa (bolsa) do

navicular. Os movimentos destes tendões flexores para fora do seu raio de acção são

contrariados pelos ligamentos anulares digital e palmar.

Ambos os tendões estão associados a ligamentos acessórios que restringem o

movimento e acumulam energia. O ligamento acessório do tendão flexor digital superficial

está sob tensão quando as articulações metacarpo-falângica e do carpo estão estendidas ou

flectidas dorsalmente. Por sua vez, o ligamento acessório do tendão flexor digital profundo

está sob tensão quando as articulações metacarpo-falângica e interfalângica distal estão

flectidas dorsalmente.

2.3- Irrigação sanguínea e enervação dos dígitos

2.3.1-Vascularização

A irrigação do dígito está assegurada pelas artérias digitais próprias. Estas são

originadas a partir da bifurcação da artéria digital comum palmar e originam diversos ramos

como podemos verificar na figura 6 e cuja descrição ultrapassa o nosso tema.

.

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Figura 6. Artérias do dígito (7).

De referir que o suprimento sanguíneo do casco pode ser dividido em 3 regiões

distintas: 1) a dermis laminar palmar e dermis coronária palmar; 2) a dermis coronária dorsal

e; 3) a dermis laminar dorsal e dermis solear dorsal. A dermis solear dorsal é a última a ser

irrigada e é a que sofre as alterações mais proeminentes quando existe redução do fluxo

sanguíneo. A dermis (derme) ou córion forma o estrato cutâneo intermédio do órgão digital.

É de natureza conjuntivo e vascular e tem como função a manutenção e nutrição da epiderme

cornificada que a envolve, assim como a união entre esta última e os tecidos profundos.

A drenagem venosa é complexa e é o espelho parcial do fluxo arterial com a existência

de anastomoses venosas (plexos venosos). É este sistema vascular complexo, o interveniente

principal das denominadas laminites (inflamação do tecido podofolhoso, laminas sensitivas

ou córion).

2.3.2- Enervação

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A enervação do pé é assegurada pelos ramos laterais e mediais dos nervos digitais

palmares próprios (figura 7). Estes dividem-se, na região do boleto, para formarem os ramos

digitais anteriores e posteriores. Existe, de forma geral, um 3º ramo (medial). No entanto,

quase metade dos cavalos apresentam pequenas variações a esta descrição.

Figura 7. Nervos do dígito (7).

2.4- Casco

Na sua vista dorsal e da parte anterior para a posterior, o casco divide-se em pinça ou

ponta do pé, seguida de ambos os lados pelos ombros ou encontros e depois os quartos os

quais são delimitados pelos talões (figura 8). Com excepção destes últimos, estas estruturas

representam o apoio do casco. Este deve apresentar-se de superfície lisa e sem saliências nem

depressões. É inclinado de cima para baixo e de dentro para fora, embora o seu lado interno

(axial) deve ser menos inclinado que o externo (parte abaxial).

Na face plantar (ou palmar) a sola deve ser ligeiramente côncava longitudinal e

transversalmente. No entanto, a sua excessiva convexidade é característica de afecção crónica

do pé. Enquanto os cascos dos membros anteriores tem uma conformação arredondada, os dos

membros posteriores apresentam-se mais pontiagudos na pinça.

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A. Descrição do casco dos membros anteriores. Vista plantar. B. Conformação do casco dos membros

posteriores.

Figura 8. Caracterização do casco do equino. Adaptado de (1).

O casco é constituído por 3 partes (epiderme córnea): a taipa, a palma e a ranilha. Não

é nem vascularizado nem enervado. A sua nutrição é assegurada pela derme (tecido

podofolhoso)

A) Taipa. Sinónimos: muralha, parede ou cinta.

O casco visível durante o apoio recobre (e protege) a 3ª falange. Na face posterior

inflecte-se dirigindo-se para o centro da face plantar (ou palmar), formando em cada um dos

ângulos o talão. O seu bordo superior insere-se no bordo coronário (perióplio) e o bordo

inferior relaciona-se com a palma. A parte da taipa entre a palma e a ranilha constitui as

barras. Estas últimas devem estar bem desenvolvidas.

O casco é mais delgado na zona da pinça, alarga-se ligeiramente nas barras e adelgaça-

se em direcção aos talões.

A parede do casco é constituída por células epiteliais queratinizadas (é formada por 3

camadas de epitélio córneo) e contem por cerca de 25 % de água. Estas células (organizadas

em tubúlos paralelos entre si e perpendiculares à coroa) nascem ao nível do córion da coroa

(figura 9).

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Figura 9. Crescimento da muralha (1).

A muralha cresce uniformemente a partir da coroa. A parte mais recente é mais

elástica e situa-se a nível dos talões, conferindo a estes uma expansibilidade quando o pé toca

no solo. O seu crescimento é lento, cerca de 6 mm por mês [Adams (1990) (1) recomenda a

correcção do casco e a sua ferração cada 4 a 6 semanas]. São necessários 9 a 12 meses para

que toda a parede seja renovada. O seu crescimento é mais lento no Inverno e em climas frios.

De igual forma é mais lento em climas secos, quando a parede dos cascos se encontra mais

dessecada.

Idealmente a parede do casco deve ser suficientemente espessa para poder suportar o

peso do cavalo sem se desgastar excessivamente. Igualmente deve poder resistir à dessecação,

embora rija apresentar alguma flexibilidade e crescer de forma normal.

B) Palma ou sola.

Forma a maior parte da superfície plantar. Tem uma conformação semilunar, disposta

em abóbada e relaciona-se no bordo externo com a taipa. A linha de junção entre ambas as

estruturas é denominada de linha branca, linha plantar, saúco, broma ou cordão. O bordo

interno forma um ângulo agudo de abertura posterior inserindo-se nas barras e na forquilha

ranilha.

A sola é constituída por cerca de 33 % de água e tem uma estrutura semelhante ao

casco. Embora tenha um papel importante no suporte do peso interno, a sola nunca deve servir

de apoio no solo. O seu contacto com este dá origem a claudicações devido a contusões da

sola. A porção da sola localizada entre a parede e as barras é denominada de ângulo da sola,

originando-se aqui as bleimas (inflamações) dos talões.

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C) Ranilha. Sinónimos: Arnilha, forquilha ou forqueta.

Forma com a palma a face plantar do casco. Divide-se em ponta (parte mais avançada

que se insere no vértice do ângulo da sola), corpo (parte média dividida por um sulco

denominado fenda da ranilha ou lacuna média) e ramos. Estes últimos, divergem do corpo

da ranilha estando separados das barras por sulcos denominados candos, candados, cadeados

ou lacunas laterais. A extremidade dos ramos da ranilha na ligação com o perióplio, forma

relevos denominados glumas ou gomos.

A forqueta é constituída por cerca de 50 % de água sendo relativamente mole.

A ranilha deve ser larga e espessa e dividir o casco em duas partes iguais. A sua ponta

deve dirigir-se em direcção à pinça.

Outras estruturas do casco

A) Córion

Este tecido vascularizado, já acima referido, é dividido em 5 partes assegurando a

nutrição a cada uma delas:

1. Córion do perióplio. É uma faixa estreita localizada por cima do bordo superior da

parede. Prolonga o córion da pele e é separado do córion da coroa por um pequeno

sulco.

2. Córion da coroa. Forma com o anterior um espesso bordo. Assegura a maior parte da

nutrição e do crescimento da parede do casco. Esta estrutura é extremamente

vascularizada, ocorrendo hemorragias profusas em caso de laceração neste local.

3. Córion parietal. Está ligado à superfície dorsal da 3ª falange através de um periósteo

modificado.

4. Córion da sola. Como a anterior, provém de um periósteo modificado da 3ª falange.

5. Córion da ranilha. Estrutura semelhante à anterior.

B) Cartilagens ungulares

As cartilagens ungulares ou complementares (da 3ª falange) são formadas por

tecido fibroso e por cartilagem. Prolongam-se para o alto e para trás dos processos palmares

da 3ª falange e para cima da coroa onde podem ser palpados (figura 10).

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Figura 10. Cartilagens ungulares (1).

C) Almofada digital e almofada coronária

A almofada digital é uma estrutura piramidal localizada na parte posterior do pé. É

fibroelástico, relativamente avascularizado, contendo pequenas porções de cartilagem (figura

11). Serve, principalmente, como amortecedor.

A almofada coronária é uma porção elástica do córion coronário. Participa no

amortecimento dos choques. Mistura-se com a almofada digital na zona dos talões.

D) Coroa, bordo coronário ou banda coronária. Já anteriormente referida. Formada

por córion do perióplio, córion coronário e almofada coronária. Assegura a maior parte da

nutrição e do crescimento da parede. As lesões desta estrutura são graves e afectam,

geralmente de forma permanente o crescimento da parede do casco.

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E) Bulbos (bolbos) do talão. Localizam-se na região posterior do pé, onde o córion

do perióplio recobre os ângulos da face posterior da parede.

Figura 11. Corte sagital da parte distal do membro anterior do equino: estruturas globais.

Adaptado de (1).

3 – CONFORMAÇÃO NORMAL E APRUMOS DO PÉ

A conformação e aprumos do casco devem garantir um sólido apoio e uma boa

distribuição de forças. De facto, a conformação do pé é um critério essencial da aptidão do

cavalo ao trabalho. A aparagem e a ferração têm como objectivo principal corrigir estes

caracteres. É necessário ter em consideração que a conformação do casco deve estar ligada à

do resto do membro, o que justifica o conhecimento dos bons aprumos dos membros dos

animais e os seus defeitos.

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Embora exista alguma confusão entre conceitos, escolas inglesas usam termos como o

hoof balance e natural balance, entre outros para definir o equilíbrio (dinâmica) do pé.

De facto, contribuem para o desequilíbrio do casco, principalmente, 3 factores:

comprimento do casco, ângulo do casco e orientação lateromedial (axial-abaxial) do

casco.

3.1- Eixo do pé e eixo da quartela (pé-quartela), aprumos e orientação lateromedial do

Visto de perfil (vista lateral), o eixo da quartela é uma linha fictícia que atravessa,

medianamente, a quartela (figura 12) e a qual deverá dividir a 1ª e 2ª (e 3ª) falange em duas

partes iguais. O eixo do pé é uma linha fictícia que atravessa a pinça na sua parte mediana

(vista dorsal) estendendo-se da coroa até à superfície de apoio da pinça e prolongando-se, a

partir da coroa, com o eixo da quartela (figura 13).

Figura 12. Eixo do pé – quartela normal (a) e de diferentes declives (B;C) (1).

Vistos de lado e dorsalmente, os eixos do pé e quartela devem ser linhas contínuas que

formam, idealmente o mesmo ângulo com o solo. A linha do eixo pé-quartela, vista

dorsalmente deve formar um ângulo perpendicular (90º) com a linha imaginária que a cruza

ao nível do solo.

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Figura 13. Eixos do pé e da quartela (1).

Para apreciar o aprumo do pé é necessário posicionar este de forma a visualizar o seu

eixo longitudinal (imagem da esquerda da figura 13; orientação ou equilíbrio lateromedial).

De facto, o pé está bem aprumado quando as paredes medial e lateral são do

mesmo comprimento: uma linha fictícia que divide a canela, o boleto e a quartela forma

um ângulo recto com uma linha transversal formada pelos pontos de apoio ao solo dos

dois talões.

Se um cavalo aterra primeiro com a parte medial da muralha esta será a mais

desgastada ou mesmo sucedendo com a parte lateral. Um pé pode ser ferrado se estiver

suficientemente nivelado sem todavia estar bem aprumado. Neste caso a ferração deve ser

efectuada de modo a restabelecer o equilíbrio.

Os eixos acima referidos estão directamente relacionados com o ângulo do casco.

Desta forma, as alterações deste ângulo determinam alterações a estes eixos, assim como a

tensão exercida em diversas estruturas do pé.

É importante referir que devem ser tidos em consideração, quer na correcção do casco

(figura 14) quer na sua ferração.

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Figure 6 - Dorsopalmar (dorsoplantar) and lateral views

of distal portions of limbs with abnormal walls and weight-bearing surfaces. The dashed lines represent the ideal axes of the limbs; the dotted sections of the hooves are the portions to be removed by trimming. Limb A is shod to center the weight-bearing surface under the axis; the length of a' equals that of a''. Limb B has a dished dorsal surface that, when straightened (rasped), will shift the weight-bearing surface to a more normal palmar (plantar) position. (From Butler D: The Principles of Horseshoeing. II. Laporte, CO, Doug Butler, 1985, p 290. Reprinted with permission.)

Figura 14. Remoção de córnea considerando os eixos imaginários da parte distal do pé (4).

De referir, ainda, que desequilíbrios da parede medial e lateral do casco estão

associados a diversas causas de claudicação com origem no casco (estas formas de

claudicação podem ser atribuídas a forças desproporcionais exercidas na parte medial e lateral

do casco):

Deformações do casco;

Cortes da pinça e dos talões;

Fissuras da pinça, dos quartos e das barras;

Úlceras crónicas dos talões;

Síndrome do navicular;

Sinovite crónica da articulação metacarpo-falângica;

Inflamações profundas da ranilha;

3.2- Comprimento do casco

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A medida global do comprimento do casco é-nos dada pelo comprimento até à

ponta da pinça. Este é medida com um compasso (figura 15), na parte mediana e dorsal do

casco, desde o bordo coronário (parte mais proximal) até à ponta da pinça.

Figura 15. Medição do comprimento do casco (2).

A determinação do comprimento do casco mais apropriado é obtida tendo em

consideração o peso do animal (tabela 1), não descurando as variações anatómicas da inserção

da 3ª falange no casco, a espessura e durabilidade das estruturas córneas, a conformação do

casco e a ocupação (uso) do cavalo.

O comprimento excessivo do casco (ou peso da ferradura) causa stresse no sistema

músculo-esquelético, aumentando a pressão mecânica do córion podendo provocar, o grande

comprimento da parede, algumas afecções. Do mesmo modo um cumprimento demasiado

curto (por ex.: excesso de correcção) proporciona maior trauma da sola com a eventual

formação da sua protusão.

Tabela 1. Comprimento do casco (3).

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3.3- Ângulo do casco

O ângulo do casco, medido com um compasso de angulosidade (angulómetro), é-nos

dado pelo ângulo formado entre a parte dorsal e a parte palmar (solear) da ponta da pinça

(figura 16).

Figura 16. Medição do ângulo do casco (2).

A recomendação de que o ângulo podal deve ser de 45º a 50º ou mesmo entre 48º a 55º

nos membros anteriores dos equinos de 50º a 55º ou de 52º a 60º nos membros posteriores é

errónea, uma vez que não têm em consideração a conformação individual dos membros. O

ângulo correcto (ideal), para cada equino, é determinado quando a linha imaginária da

face dorsal do casco e a da face plantar (altura dos talões; esta deve ser metade do

comprimento do casco) é paralela são paralelas à linha imaginária obtida quando as 3

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falanges estão alinhadas (figura 17). Este alinhamento constitui o eixo da quartela, isto é, o

eixo pé-quartela.

Figura 17. Alinhamento do pé do equino (7).

A confirmação visual, do paralelismo destes eixos, é realizada mantendo o animal numa

superfície dura, com o animal apoiado nos 4 membros (em aprumo) e os ossos das canelas

(metacarpos / metatarsos) posicionados verticalmente (figura 18). É necessário ter em

consideração que, invariavelmente, a articulação interfalângica distal está ligeiramente

estendida anteriormente.

Figura 18. Determinação do ângulo do casco (2).

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O ângulo do casco tem uma grande importância na variação da tensão de

articulações, ligamentos e tendões (figura 19).

Figura 19. Efeito de diversos ângulos do casco nas articulações, nos tendões e nos ligamentos

(3).

De facto, um ângulo maior que o correcto provoca a flexão da articulação

interfalângica distal, ligeira flexão da articulação interfalângica proximal e ligeira extensão da

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articulação metacarpo-falângica. Elevando os talões (diminui o ângulo), diminui-se a tensão

do tendão flexor digital profundo e aumenta-se a do tendão flexor digital superficial assim

como a do ligamento suspensor do boleto. O oposto também se verifica.

Estas alterações de ângulos podais podem ser utilizadas no tratamento de algumas

patologias, aparando o casco de forma a aumentar este ângulo.

Diminuição da tensão do tendão flexor digital profundo:

1. Tendinite do flexor digital profundo.

2. Instabilidade da 3ª falange consecutiva a laminite (reduz a possibilidade de

rotação).

É necessário ter em atenção que ângulos demasiado elevados podem provocar

traumatismos da ponta dorso-palmar da 3ª falange e uma osteíte podal (principalmente em

casos de laminite crónica).

4- CINÉTICA DO PÉ DO CAVALO

Visto de perfil e segundo Adams (1990) (1), o pé deve deixar o solo pela extremidade

central da pinça, a sua trajectória descrever um arco regular e a sua aterragem ser aprumada: a

pinça deve tocar o solo imediatamente antes dos talões e o centro de gravidade deve estar

situado ao nível da ponta da ranilha.

Um pé normal deve atingir o pico da sua trajectória quando se cruza com o pé

simétrico, o qual está apoiado no solo (figura 20-A).

Quando um equino apresenta as pinças curtas e talões altos (altura do talão elevada) o

pé balança rapidamente e atinge o pico da trajectória após cruzar o membro oposto (figura 20-

B). O centro de gravidade passa a situar-se mais posteriormente.

Embora esta conformação não sobrecarregue os tendões flexores ou o pequeno

sesamóide a comoção (pressão) está aumentada e pode favorecer a síndrome navicular,

artrites (atraumáticas) do boleto e neoformações ósseas.

Quando um equino apresenta as pinças compridas e talões baixos, a inclinação da

parede é geralmente inferior a 45º.

Uma pinça comprida ocasiona um atraso do momento em que o pé deixa o solo

exercendo um efeito de alavanca, o que obriga a que atinja o pico da trajectória antes de

cruzar o pé oposto (em repouso; figura 20-C). O centro de gravidade passa a situar-se mais

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anteriormente e o cavalo apresenta passos mais compridos e mais baixos que um animal

normal.

Figura 20. Cinética do pé do cavalo (2).

5- DEFEITOS DOS CASCOS

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A inclusão deste capítulo justifica-se pela necessidade do reconhecimento das

alterações do casco, com o objectivo de proceder à sua correcção (se possível) através da

aparagem e da ferração. Do mesmo modo, deve proceder-se à sua distinção de patologias ou

avaliar se são consecutivas a estas (caso de defeitos adquiridos).

Seguimos a classificação apresentada por Miranda do Vale (6).

A- Defeitos de volume

Pé grande

Pé pequeno

Pés desiguais

B- Defeitos de comprimento

Pé comprido ou alto

Pé curto ou baixo

C- Defeitos de aprumo

D- Defeitos de forma

Pé de pinça comprida ou de talões baixos – Sobrecarga os talões e o tendão

perfurante (figura 21).

Figure 3 - Lateral view of the distal portion of limbs with normal, underrun, and correctively shod hooves. The dashed lines represent the axes of the limb, the dotted lines beneath the hooves indicate the weight-bearing surfaces, and the short lines within the hoof represent the hoof tubules. Limb A typifies correct conformation; the axis is appropriate, and the palmar (plantar) face (a') of the hoof parallels the dorsal surface (a''). Limb B exemplifies underrun heels; the hoof tubules are bent dorsally, decreasing heel resistance to compression and reducing palmar (plantar) support for the limb. Limb C is an example of underrun heels and corrective use of pads to extend the ground-contact surface under the axis of the limb. In addition to severe rasping of the dorsal hoof wall, wedged pads or thick-heeled shoes may be necessary to reestablish a normal hoof angle.

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Figura 21. Vista lateral de talões baixos e da sua correcção (4).

Pé de pinça curta ou de talões altos (entaloados) – Prejudica o apoio da forquilha.

Pé de talões inclinados – Falseia o apoio do casco.

Pé chato, raso, palmiplano, palmirraso ou palmiteso – Aquele em que a

concavidade da face plantar se deformou originando uma superfície plana. È

predisponente de várias afecções.

Pé palmicheio – Exagero do defeito anterior, apresentando-se a palma convexa.

Pé caloso ou de joanetes – Apresenta saliências em vários pontos da palma. Necessita

de ferradura apropriada.

Pé côncavo – concavidade excessiva da palma. Impede o bom apoio da ranilha

predispondo para o aperto dos talões.

Casquímulo – Quando o diâmetro transversal do casco é menor que o normal.

Pé de talões apertados – A distância entre os talões é inferior à normal. Talões

chupados: aperto em baixo. Talão sobreposto: um dos talões tende a cobrir o outro.

Encastelamento, encasteladura ou casco enchapinhado: talões excessivamente

apertados.

Pé refegado ou rofegado – Apresenta vários relevos e sulcos horizontais ao longo da

taipa. Sinal de doença: laminite.

Pé de bordo superior irregular – lesões que provocam o levantamento do bordo

coronário (ex.: exostoses).

E- Defeitos da qualidade da substância córnea

Pé carnudo – É mole. Não protege suficientemente os tecidos vivos. Palmipode:

defeito acentuado principalmente na sola. Fraco dos talões: defeito acentuado

principalmente na parte posterior do casco.

Casco envidraçado, vidrento, vidrino ou vidroso – De córnea seca e quebradiça.

Casco falhoso ou falhado – Bordo plantar irregular por perda de substância.

Casco de taipa desunida – Taipa separada da sola por destruição da linha branca.

Casco esboroadiço – Desfaz-se com o atrito da ferragem.

6- DEFINIÇÃO DE ALGUMAS AFECÇÕES

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Definimos aqui algumas patologias e lesões, algumas das quais já referidas

anteriormente.

No nosso ponto de vista, é necessário, aquando da correcção funcional do casco e da

ferração, o reconhecimento de algumas lesões incipientes muito comuns que eventualmente

sejam eliminadas aquando da paragem normal ou correctiva. Do mesmo modo, é conveniente

por parte do ferrador o conhecimento sobre a especifica utilização de algumas ferraduras

ortopédicas. Muitas das denominações específicas de alguns defeitos ou afecções podem ser

encontradas em Miranda do vale (1990) (1).

Desvio dos aprumos do casco

São alterações aos aprumos apresentados. Frequentemente os cavalos apresentam uma

conformação de pinça comprida e talões baixos.

De referir as alterações lateromediais com deformações angulares e rotacionais dos membros.

Utilização de ferraduras banhadas em caso de taipa excessivamente vertical.

Podridão (necrose) da ranilha

Corresponde a um processo de degenerescência (necrose) das lacunas mediais e

laterais da ranilha e que podem atingir tecidos mais profundos (córion). Exsudado escuro a

partir das lacunas. As causas predisponentes são a má higiene dos locais, pés encastelados, má

correcção ou má ferração dos cascos.

Utilizam-se de ferraduras fechadas após controlo do processo.

Laminite

Inflamação do tecido podofolhoso (córion) pode assumir duas formas clínicas

principais: aguda e crónica. De etiologia múltipla. Claudicação intermitente, principalmente

dos membros anteriores, embora possa atingir os 4 membros simultaneamente.

Síndroma do navicular

Afecta o sesamóide distal, a bolsa podotroclear (podotrocleíte) e o tendão flexor

digital profundo. Tendência hereditária (fragilidade do osso), traumas, má correcção dos

cascos, entre outros. Utilização de ferraduras ovais.

Feridas penetrantes, abcessos podais e fractura da 3ª falange

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As feridas penetrantes da sola são bastante frequentes nos cavalos. Podem ser

provocadas por inúmeros corpos estranhos e são de difícil localização, uma vez que é

frequente o desaparecimento do objecto cortante. A infecção pode originar abcessos podais

com graves consequências.

As fracturas da 3ª falange são devidas a trauma (choque violento) principalmente

quando os pés anteriores aterram.

Bleima dos talões

As bleimas são pisaduras da sola pondo em causa a formação de córnea ao nível do

ângulo formado pelas barras e pela taipa. Afecta principalmente os membros anteriores e em

animais ferrados (ao contrário das contusões da sola).

Artrites, osteoartrite e osteítes

As artrites são inflamações de uma articulação. Pode afectar qualquer constituinte da

articulação ou do conjunto de articulações: extremidades ósseas, cartilagens articulares,

cápsula articular e ligamentos. Se afectam, de forma significativa o osso denominam-se

oesteoartrites. Existem numerosas causas e classificações. Lesões da articulação interfalângica

proximal e da distal.

As osteítes afectam os espaços e canais de Havers (do osso) assim como os seus

ramos. A osteíte do pé corresponde a uma desmineralização da 3ª falange com origem

inflamatória (e tensão).

Exostoses

Saliências ósseas anormais que se estendem para fora dos contornos normais dos

ossos. Existem múltiplos tipos.

Tendinites e desmites

As tendinites correspondem a uma inflamação intrínseca do tendão. Exemplo: Tendinite do

flexor digital profundo

Quando se desenvolve em zonas em que o tendão é recoberto por um bainha

(membrana) sinovial denomina-se de tenosinovite; ou nas bolsas (bursas; sinóvias)

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subtendinosas – bursite. O hygroma é uma bursite adquirida da face cranial do carpo

(joelho).

As desmites são inflamações dos ligamentos. Exemplo: desmite do suspensor do

boleto.

Distensões e rupturas de ligamentos

A distensão pode ser definida como uma lesão (alongamento) de um ligamento (ou da

sua inserção) após pressão (tracção) violenta ou excessiva. Podem ocorrer diversos graus de

rupturas de fibrilhas que podem culminar com a ruptura do ligamento.

Pés com sola friável

Devidos, frequentemente a uma atmosfera ou solo secos e são encontrados

principalmente em cascos não pigmentados. Pode-se complicar com fissuras nas pinças, nos

quartos (e da substância córnea em geral). Suplementação com biotina (necessária à

queratinização do casco).

7- CONTENÇÃO FÍSICA DE EQUÍDEOS

As boas práticas de contenção dos equídeos são essenciais para que estes se possam

manejar de forma a garantir a segurança de todos os interveniente, incluindo os próprios

animais. Antes de nos dirigirmos ao animal devemos obter informações, junto do encarregado

do equino sobre o seu temperamento. A aproximação ao cavalo deve ser feita com

tranquilidade de frente ou de lado em ambiente calmo e falando com ele. Não se deve

deixar o animal virar-se com os membros posteriores para o indivíduo que se aproxima

(nesse caso deve proceder-se à retirada). A pessoa que intervém deve posicionar-se no

lado esquerdo (do animal). Exactamente para evitar que o equino tome uma posição de

ataque devemos observar comportamento através das expressões do seu olhar e do

posicionamento das orelhas, assim como qualquer movimento por ele efectuado.

Podem ser usados vários métodos e instrumentos de contenção física de acordo com a

agressividade do animal, o meio ambiente em que nos situamos, a região que queremos

explorar, os objectivos que se pretende alcançar e ainda da experiência do indivíduo que

executa a contenção e ainda experiência e temperamento do dono ou encarregado do animal.

A provocação moderada de dor pode ser o suficiente para distrair o animal de

modo a que este se deixe manipular em outras zonas do corpo.

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Podem ainda ser utilizados troncos de contenção. Nunca se devem utilizar laçadas no

pescoço do animal, uma vez que podem originar a sua asfixia, debatendo-se durante a

tentativa de libertação, principalmente e animais de carácter agressivo. A alternativa aos

métodos de contenção física é a denominada contenção química com a utilização de agentes

tranquilizantes ou outros.

Os principais métodos de contenção física são:

1- Uso de cabeçada

A cabeça do animal deve ser mantida levantada.

2- Tapar dos olhos

Os olhos podem ser cobertos com as mãos ou em alternativa pode utilizar-se um

capuz.

3- Torcer a orelha

A orelha pode ser agarrada e torcida com as mãos ou com uma alça de corda macia.

4- Efectuar uma prega da pele da tábua do pescoço

A ser realizada com a mão.

5- Uso de aziar

Este deve ser colocado não lábio superior e torcido.

6- Levantamento de uma extremidade anterior.

Deve ser realizada do mesmo lado da região em que se pretende trabalhar. Evita que o

animal escoiceie com o membro posterior do mesmo lado.

De referir que tanto os membros anteriores como os posteriores podem ser flectidos ou

estendidos com relativa segurança, para que se possa observar e realizar as acções necessárias

ao casco do cavalo.

Tenha sempre presente as regras enunciadas!

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8- BIBLIOGRAFIA

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toe length, hoof angle, and mediolateral balance. Comp. Contin. Educ. 17(10): 1275-1283.

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Estágio, UTAD, PP. 92.

9- Sandoval, J., 1994. Tratado de anatomia veterinária. Tomo II.