2009 - Artigo - Gêneros Cinematográficos Na Educação a Distância

10
Gêneros Cinematográficos na Educação a Distância Márcio Henrique Melo de ANDRADE 1 Marizete Silva SANTOS 2 Coordenação de Ensino a Distância - Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) Rua Dom Manuel de Medeiros, s/n – Dois Irmãos – CEP: 52171-900 – Recife – PE – Brasil [email protected] [email protected] Abstract. Analysis of audiovisual products from the Production Team of Didactic Educational Material Audiovisual Coordination of Distance Education of the Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), who use cinematographic genres to build materials for courses in exact sciences. Analyzing the methodologies of other universities and the results of UFRPE in teaching adults, they noted the facility of the students adhering to the cinematographic language in EAD, making it therefore more attractive to the course takers. Resumo. Análise dos produtos audiovisuais da Equipe de Produção de Material Didático Audiovisual da Coordenação de Educação a Distância da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), que usam os gêneros cinematográficos para construir materiais didáticos de cursos de ciências exatas. Ao analisar as metodologias de outras universidades e os resultados da UFRPE no ensino de adultos, percebeu-se a fácil adesão dos alunos à linguagem cinematográfica aplicada à EAD, tornando-a, portanto, mais atrativa para os cursistas. Audiovisual na Educação a Distância Através deste universo trazido pelas novas tecnologias de informação e comunicação, o ser humano conseguiu desenvolver diversas habilidades das quais não tinha conhecimento de ser capaz de realizar, mas que, nesse momento, precisam fazer parte do seu cotidiano. Vê-se o nascimento de um novo tipo de indivíduo: capaz de organizar seu próprio trabalho, de resolver problemas, de adaptar-se a novas responsabilidades de maneira corporativa (Belloni, 2001, 22). A educação tem evoluído para aderir a este novo universo, utilizando métodos variados para tal necessidade. Ou

description

Artigo

Transcript of 2009 - Artigo - Gêneros Cinematográficos Na Educação a Distância

Gêneros Cinematográficos na Educação a Distância

Márcio Henrique Melo de ANDRADE1

Marizete Silva SANTOS2

Coordenação de Ensino a Distância - Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE)

Rua Dom Manuel de Medeiros, s/n – Dois Irmãos – CEP: 52171-900 – Recife – PE – Brasil

[email protected]

[email protected]

Abstract. Analysis of audiovisual products from the Production Team of

Didactic Educational Material Audiovisual Coordination of Distance

Education of the Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), who

use cinematographic genres to build materials for courses in exact sciences.

Analyzing the methodologies of other universities and the results of UFRPE in

teaching adults, they noted the facility of the students adhering to the

cinematographic language in EAD, making it therefore more attractive to the

course takers.

Resumo. Análise dos produtos audiovisuais da Equipe de Produção de

Material Didático Audiovisual da Coordenação de Educação a Distância da

Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), que usam os gêneros

cinematográficos para construir materiais didáticos de cursos de ciências

exatas. Ao analisar as metodologias de outras universidades e os resultados

da UFRPE no ensino de adultos, percebeu-se a fácil adesão dos alunos à

linguagem cinematográfica aplicada à EAD, tornando-a, portanto, mais

atrativa para os cursistas.

Audiovisual na Educação a Distância

Através deste universo trazido pelas novas tecnologias de informação e comunicação, o ser humano conseguiu desenvolver diversas habilidades das quais não tinha conhecimento de ser capaz de realizar, mas que, nesse momento, precisam fazer parte do seu cotidiano. Vê-se o nascimento de um novo tipo de indivíduo: capaz de organizar seu próprio trabalho, de resolver problemas, de adaptar-se a novas responsabilidades de maneira corporativa (Belloni, 2001, 22). A educação tem evoluído para aderir a este novo universo, utilizando métodos variados para tal necessidade. Ou

seja, visualiza-se a ascensão da internet como um dos principais catalisadores de um novo tipo de educação - devido à sua rapidez e facilidade de comunicação, habilidade que os correios no início da EAD não possuíam igual escala. Contudo, este instrumento educacional pode apresentar algumas desvantagens: a extrema agilidade e o volume das informações que se recebem diariamente fazem com que estas sejam esquecidas com mesma facilidade com que foram obtidas. Da mesma maneira que se recebe informações válidas para o crescimento intelectual, entra-se em contato com produtos de uma cultura fugaz, mas que, com sua linguagem atrativa e sedutora, exigem dos usuários a mesma atenção que se deseja oferecer aos produtos educacionais. Desse modo, as práticas de ensino a distância necessitam de metodologias de ensino-aprendizagem que ultrapassem as técnicas perpetuadas nos ambientes virtuais de aprendizagem – fóruns de discussão online, chats (bate-papo) e material didático impresso ou eletrônico -, empregando linguagens tão sedutoras quanto: vídeos, animações, histórias em quadrinhos online, programas de rádio, jogos eletrônicos, dentre outros.

Num momento em que a lógica capitalista pós-moderna exige velocidade e praticidade nas atitudes do ser humano, o investimento financeiro e humano em novas metodologias que envolvam o deleite visual dos estudantes e uma nova forma de aprendizado, contudo, ainda não tem sido o foco das instituições de educação. Este senso comum de que o conhecimento se transmite de maneira unidirecional e formal ainda vigora tanto na educação presencial como a distância, mesmo que os formatos e as possibilidades tenham se ampliado:

“A maior parte das instituições utiliza o material impresso como mídia predominante (84%). A Internet [...] ocupa o segundo lugar, com 63% de instituições que a utilizam em EAD. O auxílio mais oferecido como suporte aos alunos é o e-mail, com 87%; na seqüência vem o telefone, com 82%; depois destaca-se o auxílio do professor presencial; com 76%; e do professor on-line, com 66%. Alternativas como o fax chegam a 58%; cartas, a 50%; reuniões presenciais, a 45%; e reuniões virtuais, por último, com 44%.” (Moran, online)

Além das formas de comunicação típicas da telemática, as universidades e cursos livres usam, em sua maioria, os seguintes materiais didáticos:

• Material Escrito (impresso ou digitalizado): Numa herança da educação presencial, o livro adapta-se às necessidades básicas dos alunos, que precisam de materiais que os apóiem na ausência do professor. Apesar das vantagens - a adaptabilidade ao ritmo de leitura do aluno e a facilidade de exploração pelo mesmo -, não aguça os sentidos da mesma forma que outras mídias sensoriais.

• Vídeo ou teleconferência: Transmissão em tempo real de aula em que o professor “se aproxima da situação face a face da educação tradicional, mas se diferencia por utilizar a tecnologia audiovisual” (Cruz, 2007, 34), em que o mesmo pode também se valer de outros recursos - imagens fixas (fotos, gráficos etc), em movimento (vídeo ou multimídia) e de interação (e-mail, telefone) – para complementar suas explanações e sanar dúvidas.

• Produção Multimídia ou Hipermídia: Segmento que abrange apresentações no formato de Power Point, softwares educativos e realidades virtuais, pode render muito para envolver os estudantes de maneira que os mesmos nem percebam o aprendizado.

• Teleaula ou Videoaula: Programa de vídeo educativo, em que o professor-apresentador emprega recursos visuais e sonoros para substituir o quadro-de-giz, (Carneiro, 2003, 98-99) além da linguagem espontânea e coloquial, porém mantendo as características intrínsecas à educação – como precisão e correção. (Timm, 2003, 13). Diferente da vídeo ou teleconferência, este recurso não permite a interação dos estudantes em tempo real, não se desvinculando da exposição formal da educação de maneira geral.

• Série Ficcional Didática: Programa de formato televisual com proposta educativa, empregando a dramatização e a estrutura em capítulos/episódios independentes ou não. Tendo como principal exemplo de experiência bem-sucedida no Brasil o Telecurso 2000 – realização da Fundação Roberto Marinho para a Rede Globo de Televisão -, este formato contesta a falácia da sociedade: a de que a informação convence somente pelo fato de ser apresentada com argumentos racionais, e não de uma maneira clara e precisa, mas, ainda assim, descontraída. (Carneiro, 2003, 101) Transmissões educativas podem se valer de ferramentas como a encenação, o humor, o ritmo rápido e o toque pessoal para obterem sucesso, assim como programas educativos na América Latina – que se utilizam do drama das radio e telenovelas para envolver seus espectadores. (White e Thomas, 1996, p. 52 apud Carneiro, 2003, 101).

• Audiovisual ou Vídeo Didático: produto audiovisual que consiste na combinação de linguagens de cinema, televisão, vídeo, rádio, história em quadrinhos, computação gráfica etc, empregando imagens fixas, letreiros escritos na tela, ou seja, variados recursos visuais e sonoros. Exemplos deste tipo de empreitada encontram-se nos produtos criados pelo equipe do Núcleo de Educação a Distância da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Numa breve análise destes produtos, pode-se angariar uma série de aspectos que necessitam ser melhorados: ainda que utilize as palavras combinadas à imagem, estes formatos, em geral, integram uma grande quantidade de texto escrito e poucas ilustrações, ou seja, ainda exploram escassamente as possibilidades estéticas das linguagens cinematográfica e televisual. Pode-se criar estes produtos audiovisuais educativos pensando-se no padrão de linguagem visual e de composição de elementos que se encontram consagradas na mente do telespectador, para que essa expectativa em relação à qualidade visual não se perca.

Na intenção de registrar as metodologias de educação a distância empregadas pelas universidades e agregar dados para o ampliar deste estudo, realizou-se uma pesquisa entre 14/07/08 e 30/09/08 nas instituições de ensino autorizadas pelo Ministério da Educação (MEC) a ministrar cursos de graduação a distância – conforme dados coletados no site da Secretaria de Educação a Distância (SEED) do MEC (www.portal.mec.gov.br/seed), no dia 14/07/08. Seu objetivo foi verificar quais destas utilizavam produtos audiovisuais (animações ou vídeos) que empregassem situações narrativas com personagens, na tentativa de aplicar criativamente o conteúdo ao cotidiano dos alunos de maneira descontraída.

A pesquisa se baseou no acesso às home pages de cada universidade – na área exclusiva aos núcleos/centros de ensino a distância -, verificando se, na descrição das metodologias de ensino vigentes, constava o uso de produtos audiovisuais citados anteriormente. Além disso, a fim de obter dados mais precisos, também foi enviado um questionário à assessoria de comunicação destes núcleos de EAD e às universidades que

não informassem os formatos utilizados. Das 107 instituições registradas no site do SEED, foi enviado o questionário a 27 destas, das quais 11 responderam.

Pelos dados angariados através da pesquisa, confirma-se que somente 4,6% das universidades, ou seja, cinco – nessa contagem, exclui-se a Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) – dentre as 107 registradas utilizam ao menos um destes modelos nos cursos de graduação a distância e, mesmo assim, estes não exploram criativamente os recursos da televisão e do cinema herdados pelo multimídia. Isso pode gerar a desistência pela falta de envolvimento do aluno com a forma como o conhecimento é transmitido, ou seja, é necessário “questionar procedimentos internos e externos, avaliando ideologias, revendo metodologias ineficientes” (Ferreira, Silva, 2005, 4) para que a EAD – e a educação como um todo - possa evoluir.

Educação a Distância e Andragogia

A educação de adultos requer um maior esmero por parte das universidades engajadas nessa empreitada, pensando nas particularidades que esta modalidade traz. Nos idos de 1930 e até a atualidade, estudiosos como Malcolm Knowles, John Dewey e Stephen Brookfield trouxeram à luz o conceito de andragogia, que funciona como antítese do ato de ensinar crianças, pois os adultos “aprendem melhor em ambientes informais, confortáveis, flexíveis e não ameaçadores” (Chotguis, online). Estes modelos herméticos podem ser eficientes na sua estratégia de tratar seus conteúdos com seriedade e buscando ao máximo o rigor científico e racional, mas a descontração e a informalidade tendem a fazer com que esse conhecimento faça parte da vida do aprendente de maneira mais envolvente. Na aprendizagem adulta,

“o sujeito demanda não apenas o conhecimento que lhe seria de alguma forma necessário para o enfrentamento (urgente) das situações de sua vida (e de sua luta diária [...], mas também a explicitação da utilidade desse conhecimento, não só porque o justifica, mas porque lhe fornece, à sua relação adulta com o objeto do conhecimento, algumas chaves de interpretação e produção de sentido” (Fonseca, 2002, 24)

É necessário refletir sobre as dificuldades que surgiram e ainda permanecem devido a esse formalismo da linguagem científica – tanto no modelo político-econômico vigente como na instituição escola -, tentar equilibrá-lo com uma visão despretensiosa da vida, ligada ao humor e aos prazeres. A informalidade e o humor permitem “uma visão especial da vida, uma nova visão do mundo pela transposição de conceitos, uma ampliação dos contatos com nossas realidades” (Ziraldo apud Silveira, online). Não significa que a seriedade da ciência deve ser desprezada em favor de tentativas bem-humoradas de ensinar que possam sobrepujar seu rigor e precisão, mas que este conhecimento gerado possa fazer parte das experiências emocionais dos cursistas, utilizando como ferramenta a leveza e a descontração do dia-a-dia. O processo de conhecimento nos adultos é permeado por suas vivências e pode ser construído “na experiência das possibilidades, das responsabilidades, das angústias, até um quê de nostalgia, próprios da vida adulta” (Fonseca, 2002, 28). Vinculando à educação de adultos essa possibilidade de se criar memórias afetivas através de produtos audiovisuais e do diálogo com outras pessoas, pode-se elevar a EAD a um patamar próximo ao ensino presencial. O trabalhar ideal de uma educação bem sucedida é

“aprender com prazer ou o prazer de aprender e isso relaciona-se com a postura filosófica do professor, sua maneira de ver o conhecimento, e do aluno[...]. Essa é a essência da filosofia da educação” (D’Ambrosio, 2003, 84)

Percebe-se que estes veículos de expressão e comunicação – cinema e televisão - podem ter suas linguagens e metodologias de atração do espectador empregadas na transmissão de conteúdos na educação a distância e se tornar uma de suas ferramentas mais eficientes. Afinal, os produtos da linguagem audiovisual, ao entrarem no cotidiano, se “inserem na linguagem ordinária da oralidade, nela rearticulando-se, num mesmo sistema de afinidades, com os morfemas pronunciados/ouvidos, os gestos, as expressões fisionômicas, as posturas corporais” (Marques, 1999, 155 apud Bonilla, 2005, 147). Dessa maneira, pode-se retomar o propósito dos meios audiovisuais de comunicação na sociedade de investir em produtos educacionais para o crescimento intelectual e emocional dos espectadores – objetivo primordial no início do cinema e da televisão, mas perdido com o desenvolver destas intenções mercadológicas da venda do entretenimento fácil e estimulante dos sentidos.

Gêneros Cinematográficos na EAD

O uso de uma taxionomia – os gêneros cinematográficos - que guiasse a maneira de receber os produtos audiovisuais forjados pelos estúdios de cinema denota a intenção de oferecer diversas opções a seu público: comédia, drama, aventura, western, noir, policial, terror, fantasia, ficção científica, musical, desenho animado etc. Utilizando nomenclaturas, universos figurativos e estratégias narrativas específicas, expressam cosmovisões e concepções estéticas e ideológicas e apresentam elementos constituintes e constitutivos que conduzem às funções de seus personagens no enredo (1985, 94, 97).

Pode-se, então, observar como a Coordenação de Educação a Distância da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) – liderado pela Professora Doutora Marizete Silva Santos - utiliza os gêneros cinematográficos com propósitos educacionais. Na UFRPE, em parceira com a Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), desenvolve-se desde 2006 uma metodologia que procura unir material impresso e audiovisual, através de: Programa Radiofônico, Animações, Vídeos e Histórias em Quadrinhos. Objetivando lecionar disciplinas de Ciências Exatas por meio destes formatos, a equipe criou produtos envolvendo os gêneros noir – nos misteriosos casos de um detetive particular – e ficção científica – no dia-a-dia de uma universidade futurista – e épico – com histórias em quadrinhos sobre gladiadores e piratas.

Ilustração 1 - Uso dos Gêneros Ficção Científica e Noir nas animações EAD Jr. e os Programadores e Detetive Paiva

Os produtores – roteiristas, desenhistas e animadores - da equipe, então, utilizam

seu capital cultural para trazer novas referências imagéticas aos assuntos das disciplinas, ou seja, a união entre um gênero cinematográfico e o ensino de temas matemáticos que pertencem a uma dimensão diametralmente oposta à sétima arte. Referenciando-se ao universo cultural dos alunos, pode-se criar produtos voltados para um sujeito que participa e apreende as diversas ideologias da atualidade. Aderindo a estas propostas educativas o uso das imagens, é possível que um acontecimento histórico ou um fato não experimentado seja visualizado e, por conseqüência, vivenciado (Roesler, 2005, 29) por quem entra em contato com um material audiovisual que o represente.

Dessa maneira, esse projeto tenta integrar a racionalidade matemática no ensino superior às emoções dos aprendentes, propondo um modo informal de se aplicar os conhecimentos adquiridos ao resgatar fatos cotidianos e expô-los aos alunos. Empregando técnicas presentes nos problemas matemáticos e no roteiro cinematográfico, deseja-se extrapolar o formalismo didático e informativo, e atravessar para uma fase onde os conhecimentos fruem através do prazer estético, do embelezamento de uma conversa trocada através de uma história, do exercício de linguagem que procura a maneira adequada de retratar a si mesmo. (Sisto, 2007, 2).

Através desse encantamento das palavras e das linguagens empregadas na educação, é possível “compreender a articulação destes [forma e conteúdo] dentro das estruturas cognitivas [do ser humano], para [...] transformar a escola em um lugar privilegiado de interações que contribuam para o desenvolvimento cognitivo de seus alunos” (Franco, online) É possível e necessário superar um modelo distante e hermético de educação, como Roesler (2005) se propõe: empregando estratégias típicas do imaginário na educação e permitindo a atuação destas neste viés “em prol da criatividade, da imaginação, das produções individuais e coletivas”, conciliando, dessa maneira, “o senso estético e as linguagens midiáticas ao processo de ensinar e aprender, pois estas são fonte de desenvolvimento de novas aprendizagens” (2005, 30).

Ilustração 2 - Uso de Gênero Épico - Gladiadores - nas Histórias em Quadrinhos

Ilustração 3 - Uso de Gênero Épico - Piratas - nas Histórias em Quadrinhos

Contrariando muitas situações que se observam no cotidiano do ensino de matemática no Brasil, a Matemática precisa ser considerada pelo aluno como “um conhecimento que pode favorecer o desenvolvimento do seu raciocínio, de sua sensibilidade expressiva, de sua sensibilidade estética e de sua imaginação” (Daher; Morais, 2007, 13; grifo meu), de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais, PCN (1998). Dessa maneira, é possível “propiciar aquela dose de alucinação consensual entusiástica requerida para que o processo de aprender aconteça como mixagem de todos os sentidos” (Assman, 1998, 29 apud Roesler, 2005, 32), dando ao aluno a “oportunidade de interpretar, imaginar e compartilhar os conhecimentos em contato com linguagens que suplantam o falar/ditar tradicional” (Roesler, 2005, 32). Considerando esta ótica pelo viés das teorias da aprendizagem, que, após o advento das vertentes associacionistas – consagrada por estudiosos como Gagné, Pavlov e Skinner -, ganha novos contornos na década de 80 com a hipótese da existência de dois tipos básicos de aprendizagem: por recepção ou por descoberta.

Destacando aquele primeiro tipo, obtém-se um processo educativo em que o conteúdo é transmitido ao aluno em sua forma final, a fim de tornar-se acessível ou reproduzível em outros momentos, seja durante ou depois da internalização daquele conhecimento. Quanto ao segundo tipo, sua principal característica reside no descobrimento e conseqüente incorporação de um conteúdo à estrutura cognitiva do aprendiz e não na apresentação do assunto ao aprendente (JESUS, online). Analisando os produtos audiovisuais realizados pela equipe, vê-se que o mesmo se encaixa no primeiro tipo, pois, tendo por base as teorias associacionistas de aprendizagem, acredita-se que a apreensão de temas complexos – como funções, gráfico de funções e funções do segundo grau – podem ser melhor apreendidos através de sua conceituação simplificada por meio dos recursos audiovisuais, mas, ao mesmo tempo, conectando-se à realidade cotidiana dos alunos.

Os produtos audiovisuais da UFRPE, por si só, não restauram o painel da educação matemática no Brasil e todas as problemáticas que apresenta, mas traz a iniciativa de enxergá-la sob um novo paradigma – de integração entre o conteúdo matemático e as formas criativas de ensino-aprendizagem que podem surgir com o advento das NTICs. Conforme a própria SEED – numa série de credenciais para a realização de um curso de Educação Superior a Distância no Brasil de qualidade -, no que concerne à produção de material didático, recomenda-se que as instituições procurem “integrar as diferentes mídias, explorando a convergência e integração entre materiais impressos, radiofônicos, televisivos, de informática, de videoconferências e teleconferências, dentre outros, sempre na perspectiva da construção do conhecimento e favorecendo a interação entre os múltiplos atores” (MEC, 2005, 14). Apesar de não constar a necessidade de uso de recursos estéticos intrínsecos ao cinematográfico e ao televisual, crê-se ser preciso explorar outras vertentes da educação que não se restrinjam à simples eficiência tecnológica dos equipamentos ou à qualidade de conteúdo e da plasticidade do material didático. A educação superior a distância pode evoluir bastante no momento em que se enfrenta os desafios que surgem quando existe a intenção de aderir a questões referentes ao emocional e ao imaginário do público-alvo. Afinal, o cinema, valendo-se das mais variadas possibilidades de composição de imagem com propósitos conceituais e/ou narrativos, busca representar uma realidade interpretada e imaginada pelo espectador de acordo com sua experiência de vida (Roesler, 2005, 26). Ao utilizá-la como subtexto dos diálogos de uma narrativa educacional, o cursista-

espectador realiza um constante feedback dos seus conhecimentos – influenciando as maneiras de ensino e sendo influenciado ao mesmo tempo, pois “todo sujeito reúne as possibilidades de produzir e receber discursos, [...] dimensão que lhe fornece as faculdades de construir as ‘gramáticas de recepção’ de mensagens” (Neto, 1995, 196).

Para que essa mútua influência do e no receptor fosse o mais universal possível, a equipe de roteiristas – constituída pelos graduandos de Comunicação Social Márcio Henrique Andrade, Fabiane Amorim e Gustavo Amorim - procurou, nas referências culturais legadas pelo cinema, gêneros facilmente reconhecíveis – imagética e lingüisticamente -, como noir e ficção científica. Estes gêneros podem trazer elementos visuais e sonoros facilmente identificáveis e, por isso mesmo, parodiáveis, na possibilidade de torná-los mais adequados temática e formalmente, seguindo uma proposta diferenciada no emprego de novas metodologias de ensino-aprendizagem da matemática.

Numa pesquisa posterior à criação dos produtos audiovisuais que empregavam estes gêneros, entre 03/10/2008 e 31/10/2008, um total de 104 estudantes - dos pólos de educação a distância em que o curso de Licenciatura em Física atua - respondeu a um questionário que, além de analisar os audiovisuais já construídos, procurou registrar novos gêneros a serem usados, conforme no gráfico a seguir.

Conforme se observa, a maioria dos alunos – 44% - optou por manter o uso da ficção científica para tratar de temas próprios das ciências exatas, seguido por aventura - 30% -, documentário – 27% -, musical – 25% -, suspense – 21% -, e romance – 17% - e faroeste – 20% -, num movimento de adesão aos gêneros cinematográficos como catalisadores da evolução dos produtos audiovisuais voltados para educação a distância.

Conclusão

Áreas complexas do conhecimento humano, como Matemática e Física, podem ter seu ensino incrementado com a implementação da linguagem cinematográfica de maneira criativa e envolvente, forjando enredos e personagens que cativem os cursistas/telespectadores. Conforme os estudos de Christopher Vogler, os roteiristas de ficção se utilizam de estruturas arquetípicas características de toda e qualquer história, através das quais se podem criar situações que incentivem a investigação matemática por parte dos alunos. A experiência de aprendizado pode ser complementada com o uso de uma estética visual e sonora adequadas ao universo traçado pelo roteirista. Através

051015202530354045

Que outros gêneros você gostaria de vernas animações?

Faroeste

Ficção Científica

Romance

Musical

Suspense

Aventura

Espionagem

Documentário

Outro

da análise das características da nova EAD no Brasil e das possibilidades que o multimídia permite, desvendou-se as estratégias de criação dos materiais produzidos pela Equipe de Produção de Material Didático Multimídia do Departamento de Educação a Distância da UFRPE. Acredita-se que este projeto pode contribuir na melhoria dos índices de ensino-aprendizagem de matemática no Brasil, que carecem do desenvolvimento de novas maneiras de lecionar, como Ubiratan D’Ambrósio, Guilherme de Morais e Álvaro Daher têm trabalhado nos seus estudos.

O desenvolver de um projeto como este promove a evolução concomitante de várias áreas do conhecimento: dos profissionais de audiovisual multimídia (Comunicação Social, Design, Computação Gráfica etc), que podem descobrir neste campo um novo segmento de atuação; dos educadores de Ciências Exatas, que encontrarão novas formas de ensinar a disciplina; dos alunos, que irão, certamente, compreender os assuntos de maneira contextualizada, divertida e simples. Apesar das críticas que foram dirigidas ao produto final, tendo em vista as dificuldades financeiras e as limitações típicas de um projeto pioneiro, acredita-se na extrapolação cada vez maior dos limites que as pessoas que fazem uso destas tecnologias podem encontrar quando se dispõem a tê-las como instrumento de aprendizado. Através das pesquisas realizadas para a construção deste trabalho, foi possível idealizar outras maneiras de forjar um produto audiovisual, utilizando outras referências culturais - gêneros como faroeste, aventura, musical e ficção científica, ou outros domínios artísticos como circo, televisão e literatura – e histórias pelos próprios alunos do curso, incentivando cada vez mais a busca pelo conhecimento de maneira ativa, remontando os conceitos construtivistas da construção do conhecimento. Referências Bibliográficas

BELLONI, Maria Luiza. O Que é Mídia-Educação. Campinas; Autores Associados, 2001.

CARNEIRO, Vânia Lúcia. (2003), Televisão, vídeo e interatividade em educação a distância: aproximação com o receptor-aprendiz. In: FIORENTINI, Leda; MORAES; Raquel (orgs) Linguagens e interatividade na educação a distância. Rio de Janeiro: DP & A. pp. 75 – 110.

CHOTGUIS, José. Andragogia: arte e ciência na aprendizagem do adulto. [online] Disponível na Internet via URL: http://www.nead.ufpr.br/conteudo/artigos/andragogia.pdf Acessado em: 03/09/08.

COSTA, Antonio. (1985), Compreender o cinema. Rio de Janeiro: Globo,.

CRUZ, Dulce Maria. (2007), A produção audiovisual na virtualização do ensino superior: subsídios para a formação docente. Educação e Temática Digital. Santa Catarina, v. 8, n° 2, p. 23 – 44, jun.

D'AMBROSIO, Ubiratan. (2007), Educação matemática: da teoria à prática. 10ª ed. Campinas, SP: Papirus.

FERREIRA, Edwiges; SILVA, Betty. (2005), A linguagem cinematográfica, a dramaturgia universal e os contos de tradição oral. In: V Colóquio Internacional Paulo Freire, 2005, Recife. V Colóquio Internacional Paulo Freire.

FONSECA, Maria da Conceição. (2002), Educação Matemática de Jovens e Adultos. Belo Horizonte: Autêntica.

FRANCO, Sérgio Roberto. (2008), As construções cognitivas do adulto e suas repercussões no processo educativo. [online] Disponível na Internet via URL: http://168.96.200.17/ar/libros/anped/1810T.PDF.

JESUS, Marcos Antonio S. de. (2008), A psicologia. [online] Disponível na Internet via URL: http://sites.unisanta.br/teiadosaber/apostila/matematica/A_PSICOLOGIA-Marcos2808.pdf.

MEC – GRUPO DE TRABALHO EAD NO ENSINO SUPERIOR. (2005), Ações Estratégicas em Educação Superior a Distância em Âmbito Nacional. Brasília.

MORAIS, Guilherme de; DAHER, Álvaro. (2007), Os desafios da aprendizagem matemática. 45f. Monografia (Graduação em Matemática) – Centro Universitário de Lavras – UNILAVRAS, Lavras.

MORAN, José Manuel. (2008), Avaliação do Ensino Superior a Distância no Brasil. [online] Disponível na Internet via URL: http://www.eca.usp.br/prof/moran/avaliacao.htm.

NETO, Antonio Fausto. (1995), A deflagração do sentido. Estratégias de produção e de captura da recepção. SOUSA, Mauro Wilton de Sousa. (org) Sujeito, o lado oculto do receptor. São Paulo - SP Brasiliense.

ROESLER, Jucimara. (2005), Narrativa fílmica, imaginário e educação. Famecos, Porto Alegre, n° 13, 26 – 32, set.

SILVEIRA, Márcia Castoglio da. (2008), A produção de significados sobre matemática nos cartuns. [online] Disponível na Internet via URL: http://www.anped.org.br/reunioes/24/T1379507291582.htm.

SISTO, Celso. Contar histórias, um arte maior. In: MEDEIROS, Fábio Henrique; MORAES, Taiza Maria Rauen (orgs). Memorial do Proler: Joinville e resumos do Seminário de Estudos da Linguagem. Joinville, UNIVILLE.

TIMM, Maria Isabel et al. (2003), Tecnologia Educacional: mídia e suas linguagens. Novas Tecnologias de Educação, Rio Grande do Sul, v. 1, n° 1, fevereiro.