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77 A importância da leitura no ensino superior Silmara de Jesus Bignardi dos Santos Mestre em Educação - PUCCAMP Professora do Centro Universitário Anhanguera - Unidade Pirassununga e-mail: [email protected] Resumo Considerando que a leitura é essencial para o aprendizado do aluno, e, conseqüentemente, tem implicações na sua formação acadêmica e no seu desempenho como futuro profissional, este trabalho destaca a importância do professor conhecer a fundamentação teórica sobre o ensino da leitura para fundamentar sua ação pedagógica pois além de ter os conhecimentos específicos de uma determinada disciplina, é preciso também ter conhecimentos sobre o ensino da leitura. Identificar as habilidades e estratégias envolvidas na leitura é decisivo para se realizar um bom trabalho em sala de aula, pois essa é uma ação que poderá contribuir para corresponder às necessidades emergentes do ensino atualmente, isto é, conduzir o aluno à produção de conhecimentos novos, sem perder de vista o conhecimento já elaborado. Assim, o ato de ler e o de aprender são duas realidades muito próximas, portanto indissociáveis, interferindo-se mutuamente. Dominar a leitura e ser um leitor proficiente conduz o aluno a uma atitude ativa, dinâmica e crítica em relação ao conhecimento. Palavras-chave: Leitura; Aprendizagem; Ensino Superior Abstract Considering that the reading is essential for the student’s learning, and, consequently, she has implications in her academic formation and in her acting as professional future, this work detaches the teacher’s importance to know the theoretical basis on the teaching of the reading to base her pedagogic action because besides having the specific knowledge of a certain discipline, it is necessary also to have knowledge on the teaching of the reading. To identify the abilities and strategies involved in the reading is decisive to accomplish a good work in classroom, because that is an action that can contribute to correspond to the emerging needs of the teaching now, that is, to drive the student to the production of new knowledge, without losing of view the knowledge already elaborated. Like this, the action of reading and the one of learning is very close two realities, therefore inseparable, interfering with mutually. To dominate the reading and being a proficient reader leads the student to an attitude activates, dynamics and critic in relation to the knowledge. Key-words: Reading; Learning; Academic Courses

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A importância da leitura no ensinosuperior

Silmara de Jesus Bignardi dos SantosMestre em Educação - PUCCAMPProfessora do Centro Universitário Anhanguera - Unidade Pirassunungae-mail: [email protected]

Resumo

Considerando que a leitura é essencial para oaprendizado do aluno, e, conseqüentemente, temimplicações na sua formação acadêmica e no seudesempenho como futuro profissional, este trabalhodestaca a importância do professor conhecer afundamentação teórica sobre o ensino da leitura parafundamentar sua ação pedagógica pois além de ter osconhecimentos específicos de uma determinadadisciplina, é preciso também ter conhecimentos sobre oensino da leitura. Identificar as habilidades e estratégiasenvolvidas na leitura é decisivo para se realizar um bomtrabalho em sala de aula, pois essa é uma ação quepoderá contribuir para corresponder às necessidadesemergentes do ensino atualmente, isto é, conduzir o alunoà produção de conhecimentos novos, sem perder de vistao conhecimento já elaborado. Assim, o ato de ler e o deaprender são duas realidades muito próximas, portantoindissociáveis, interferindo-se mutuamente. Dominar aleitura e ser um leitor proficiente conduz o aluno a umaatitude ativa, dinâmica e crítica em relação aoconhecimento.

Palavras-chave: Leitura; Aprendizagem; EnsinoSuperior

Abstract

Considering that the reading is essential for thestudent’s learning, and, consequently, she has implicationsin her academic formation and in her acting as professionalfuture, this work detaches the teacher’s importance toknow the theoretical basis on the teaching of the readingto base her pedagogic action because besides havingthe specific knowledge of a certain discipline, it isnecessary also to have knowledge on the teaching of thereading. To identify the abilities and strategies involvedin the reading is decisive to accomplish a good work inclassroom, because that is an action that can contributeto correspond to the emerging needs of the teaching now,that is, to drive the student to the production of newknowledge, without losing of view the knowledge alreadyelaborated. Like this, the action of reading and the oneof learning is very close two realities, thereforeinseparable, interfering with mutually. To dominate thereading and being a proficient reader leads the studentto an attitude activates, dynamics and critic in relation tothe knowledge.

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Introdução

A leitura no âmbito universitário tem sido objetode estudo realizado por educadores e pesquisadores.Muitos desses estudos destacam a sua importância comoum dos caminhos que levam o aluno ao acesso e àprodução do conhecimento, enfatizando a leitura críticacomo forma de recuperar todas as informaçõesacumuladas historicamente e de utilizá-las de formaeficiente. Entretanto, tem sido demonstrado que os alunosingressam no curso superior apresentando grandesdificuldades em relação à leitura, isto é, não conseguemcompreender os textos lidos, textos esses que sãosolicitados pelos professores e, portanto, imprescindíveispara uma sólida formação acadêmica.

Essa dificuldade, no contexto universitário, podeser perfeitamente compreendida. Ela se deve,principalmente, à ausência de tradição no ensino do paísde práticas docentes que conduzam à formação de umleitor proficiente.

Se a dificuldade existe, não adianta reclamar, ouatribuir a culpa aos professores do Ensino Básico,esperar que a dificuldade desapareça como num passede mágica, ou ignorar o fato e prosseguir com a aulaacreditando que se está ensinando e o aluno aprendendo.É preciso oferecer condições para que o aluno tenhaoportunidades para sanar suas deficiências e issodepende do professor, não acontecerá por acaso,espontaneamente.

O aprender a aprender já se tornou um pontofundamental e indiscutível em Educação, mas para tantoé imprescindível um leitor proficiente, um leitor que sejacapaz de compreender um texto escrito, que seja capazde se posicionar diante dele com criticidade e que tenhaautonomia intelectual. Senão, como buscar novosconhecimentos? Como aprender sem a leitura? Comoencontrar soluções para os problemas sem afundamentação teórica proporcionada através da leitura?

Refletir sobre a dimensão da importância da leiturano contexto universitário nos conduz a uma análise deconceitos e objetivos que servem de referência para oagir pedagógico.

A ação docente deve pautar-se pelos quatropilares da educação superior contemporânea,estabelecidos no relatório para a UNESCO, daComissão Internacional sobre a Educação para o SéculoXXI, assim estabelecidos: aprender a conhecer, aprendera fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser.

No interior da discussão sobre a importância doagir pedagógico nesse novo paradigma, Rios (1999)afirma que:

(...) o saber fazer bem tem uma dimensãotécnica, a do saber e do saber fazer, isto é, dodomínio dos conteúdos de que o sujeito necessitapara desempenhar o seu papel, aquilo que serequer dele socialmente, articulado com odomínio das técnicas, das estratégias quepermitam que ele, digamos, “dê conta de seurecado” em seu trabalho. (RIOS, 1999, p.47)

Com todas as transformações que estãoocorrendo no mundo, é preciso desenvolver a autonomianos alunos levando-os a aprender a aprender. Isso implicaoferecer-lhes a condição de refletir, analisar e tomarconsciência do que sabe e a mudar os conceitos, sejapara processar novas informações, seja para substituirconceitos adquiridos no passado e adquirir novosconhecimentos.

Nessa concepção, a educação visa a preparar oaluno para a vida sócio-política e cultural, cumprindoseu ideal político que é a emancipação do homem.Conforme Saviani:

(...) a compreensão da natureza da educaçãoenquanto um trabalho não material cujo produtonão se separa do ato de produção nos permitesituar a especificidade da educação comoreferida aos conhecimentos, idéias, conceitos,valores, atitudes, hábitos, símbolos sob o aspectode elementos necessários à formação dahumanidade em cada indivíduo singular, na formade uma segunda natureza, que se produz,deliberada e intencionalmente, através derelações pedagógicas historicamentedeterminadas que se travam entre os homens.(SAVIANI, 1992, p. 29)

Considerando que a leitura é essencial para oaprendizado do aluno, e, conseqüentemente, temimplicações na sua formação acadêmica e no seudesempenho como futuro profissional e, além disso, deser a base de toda ação pedagógica, este trabalho destacao que os pesquisadores têm ressaltado sobre o ensinoda leitura, pois além de ter os conhecimentos específicosde uma determinada disciplina, é preciso conhecer afundamentação teórica sobre o ensino da leitura paratrabalhá-la em sala de aula. Identificar as habilidades eestratégias envolvidas na leitura é decisivo para se realizarum bom trabalho em sala de aula, pois essa é uma ação

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que poderá contribuir para corresponder às necessidadesemergentes do ensino atualmente, isto é, conduzir o alunoà produção de conhecimentos novos, sem perder de vistao conhecimento já elaborado.

Embora a leitura tenha muitos aspectos, lê-se pormuitas razões como, por exemplo, para obterinformações ou para entretenimento, neste trabalho suaimportância é dada por considerá-la fundamentalmentecomo fonte de conhecimento indispensável para aformação acadêmica e, posteriormente, para o exercícioprofissional.

O cenário: práticas de leitura na graduação

Após a indicação da bibliografia, o professorsolicita aos alunos a leitura dos textos que serão discutidosna sala de aula. A aula do professor está diretamentearticulada à realização dessa leitura prévia dos textos.Porém, como os alunos demonstram dificuldades paracompreendê-los, o que se percebe é que não hápropriamente uma discussão em sala de aula sobre asidéias apresentadas pelo autor e sim a exposição, peloprofessor, daquilo que considera importante. Ou então,a partir da leitura do texto, passa-se a discutir um tema;porém não se dialoga com as idéias do autor. O alunoafasta-se do texto lido passando a comentar o temaconforme o seu conhecimento prévio, extrapolando paraoutras questões paralelas.

Além disso, a leitura dos textos também é utilizadapara a realização de resumos, sendo que, muitas vezes,não há explicitação de um objetivo para essa atividade,bem como não há o retorno para o aluno sobre o textoque produziu.

O problema se agrava quando o professor solicitauma resenha. Não há como o aluno posicionar-secriticamente diante de um texto quando ele sequercompreendeu as idéias apresentadas. O texto do aluno,geralmente, revela a sua incompreensão e se caracterizacomo uma colagem do texto original, isto é, revela queainda não se constituiu como um leitor proficiente.

Em relação a não compreensão dos textos pelosalunos, não há uma ação pedagógica planejada paraorientá-los quanto ao desenvolvimento das suashabilidades e de estratégias cognitivas utilizadas na leituraproficiente. Não é realizado nenhum trabalho pedagógicocom desenvolvimento de atividades cognitivas dereflexão, com ativação do conhecimento prévio e análisecrítica do conteúdo lingüístico que possa levar os alunos

à compreensão do texto.Os resultados obtidos das práticas empregadas

parecem conduzir o aluno à reprodução e àmemorização, não ocorrendo a aprendizagemsignificativa.

Certamente, o professor tem papel fundamentalno processo ensino-aprendizagem, é fundamentalconhecer os conceitos teóricos sobre processamento detextos escritos para uma ação pedagógica bem informadae fundamentada.

Sendo assim, se o aluno ainda não desenvolveuas habilidades necessárias e não sabe utilizar estratégiaspara a compreensão de textos, o professor deve criaroportunidades em sala de aula para que isso ocorra. Oprofessor tem um papel determinante na formação e nodesenvolvimento das habilidades e competências que osalunos ainda não adquiriram. Deve criar situações paradespertar a curiosidade, desenvolver a autonomia; deve,enfim, criar as condições necessárias para a formaçãode um leitor proficiente.

Leitura: compreensão e criticidade

A dificuldade dos alunos para compreender osdiferentes textos que são necessários para a suaformação acadêmica, principalmente os propostos nostrabalhos de leitura em sala de aula, requer uma reflexãosobre a prática efetiva de ler, compreender e criticar.

Os diversos conceitos de leitura existentes podemser agrupados em duas grandes concepções, geralmentevistas como antagônicas.

Uma primeira tendência é a que prioriza o texto,conseqüentemente, a leitura é vista como produto, comoreconhecimento de sentidos materializados na superfícietextual. Essa posição não considera a importância doleitor e preconiza a noção de texto como objetoautônomo e fechado de sentidos estáveis.

Essa postura provém de uma visão estruturalistae mecanicista da linguagem, entendendo que o sentidoestá no texto. Portanto, caberia ao leitor a tarefa dedecodificar e reconhecer os elementos lingüísticos jáconhecidos e descobrir o significado dos elementosdesconhecidos.

Uma segunda tendência prioriza o leitor, ele é vistocomo fonte de sentidos. Segundo essa posição, a leituraconsiste justamente em um processo de atribuição desentidos ao texto cuja materialidade lingüística tem asignificação que lhe for atribuída pelo leitor.

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Essa segunda concepção de leitura estáfundamentada na psicologia cognitivista e considera queo leitor é a fonte de sentido, portanto opõe-se, em parte,à concepção anterior.

O que se pode perceber é que essas duastendências têm se revelado incapazes de produzir umleitor crítico, um leitor capaz de construir suacompreensão a partir das palavras do autor e posicionar-se com sua contra-palavra.

É importante ainda refletir a respeito de umaterceira posição teórica sobre leitura, intermediária emrelação às duas tendências e que supera essa dicotomiatexto-leitor, denominada sociointeracionista edesenvolvida a partir do conceito Vygotskyano deinteração na aprendizagem.

Essa posição entende que a construção desentidos se dá através de um processo ativo e dinâmicode negociação entre autor e leitor no espaçocompartilhado do texto. Portanto, o leitor para construiro significado durante a leitura mobiliza seu conhecimentoprévio, socialmente adquirido e armazenado emesquemas mentais, confrontando-os com as pistaslingüísticas impressas pelo autor no texto, entende-se,portanto, que a leitura se processa na interação autor-texto-leitor.

Conforme as recentes correntes teóricas, o textojá não pode ser considerado como um objeto lingüísticocujos sentidos existem fora de um contexto sócio-histórico e discursivo. Koch (1997) define texto comoevento discursivo, que vai além da sua materialidadelingüística, encaminhando-se, assim, para umaperspectiva interacional com inclusão do aspecto sócio-histórico.

Também Kleiman (1998), ao discutir sobrequestões de letramento, adota uma concepção de textoescrito como evento discursivo que não pode serdesvinculado do contexto sócio-cultural em que éproduzido. Assim, reivindica a necessidade de se legitimaroutros modos de ler, diferentes do padrão escolar, osquais se constituem em função do contexto em que seusparticipantes estão inseridos.

É através da leitura e sua respectiva compreensãoque se consegue entender a realidade. Compreender umtexto é estabelecer uma relação dinâmica com umdeterminado contexto, bem como perceber criticamentea objetividade dos fatos desse contexto. Assim, a leiturade um texto precisa transcender os limites dele mesmo eremeter o leitor à percepção e análise da realidade.

Discorrendo sobre a importância do ato de ler -a realidade e a palavra, Freire (1999) enfatiza que a leituranão deve ser apenas um processo mecânico de repetiçãodas palavras, mas da compreensão destas e do contextoque as envolve. Para ele, o aprendizado da leitura estápresente em todas as fases da vida, iniciando-se nainfância, quando se tem a primeira percepção de mundoe segue através da leitura da palavra propriamente dita.Afirma o autor “A compreensão do texto a ser alcançadapor sua leitura crítica implica a percepção das relaçõesentre o texto e o contexto” (FREIRE, 1999, p.11).

Ao narrar suas primeiras experiências de leituracomo “momentos em que os textos se ofereciam à nossainquieta procura” (op.cit, p.16), Freire coloca uma outraidéia interessante que é a do ato de ler como engajamento,como busca interessada e significativa por parte do leitorem oposição à recepção passiva e indiferente quecaracteriza a leitura no contexto escolar.

Essas duas noções são fundamentais paraconfigurar uma leitura crítica. São igualmente necessáriasa percepção das relações texto-contexto e a ida ao textocom uma disposição de procura significativa, em umaatitude de engajamento reflexivo. Faz-se necessárioressaltar que a palavra contexto está sendo utilizada emum sentido bastante abrangente, isto é, como contextosócio-histórico (situação social, cultural, histórica eideológica que envolve a produção), discursivo (situaçãode enunciação) e intertextual (relação do texto lido comoutros textos com os quais ele dialoga).

Para Freire (1982) não se pode fazer apenas umaleitura mecânica do texto, na qual se memoriza oconteúdo, sem compreendê-lo. É imprescindível terpostura crítica para que o estudo possa ser produtivo.Essa postura crítica necessária ao ato de estudar requerque se “assuma o papel de sujeito desse ato”. Logo, umdeterminado trecho de um texto pode suscitar reflexõesno sujeito que o levem a novos caminhos, às novasdescobertas.

É, portanto, necessário, na leitura de um texto,além da compreensão do seu conteúdo, ter posturaconstante de busca.

Também o ato de estudar um texto implica numarelação dialógica com o seu autor, em que se evidenciaseu posicionamento histórico-sociológico e ideológico.É função do sujeito leitor perceber esse posicionamentoque, muitas vezes, está implícito no texto.

Leitura e compreensão são atividades de grandeimportância na aprendizagem; portanto, o trabalho em

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sala de aula desencadeado a partir da leitura deveprivilegiar o desenvolvimento do processo decompreensão e criticidade. A leitura dos alunos não podelimitar-se à decodificação. Formar um aluno que realizeuma leitura proficiente e seja crítico, supõe formar alguém,cuja compreensão da leitura ultrapasse a simplesdecodificação, alguém que construa um significadoatravés dos elementos lingüísticos e dos elementosimplícitos no texto, que estabeleça relações com outrostextos já lidos posicionando-se diante das idéias do autor.

Aprendizagem, ensino e leitura

Kleiman (1989) abordando aspectos da leitura eda compreensão de textos afirma que esta é umaatividade complexa, pois envolve uma multiplicidade deprocessos cognitivos, nos quais o leitor se engaja paraconstruir o sentido de um texto escrito. A autora enfatizaa importância de conhecer tais aspectos, pois são elesque constituem e contribuem na formação do leitor.Assim, tece esclarecimentos sobre o conhecimento prévioque se tem ao ler, os objetivos e as expectativas, asestratégias de processamento do texto e a interação naleitura.

Considera os conhecimentos que o aluno possui,denominando-os de conhecimentos prévios, como umdos fatores essenciais para a compreensão de um texto.O leitor, durante a leitura, utiliza-se do conhecimento queele já tem, como o conhecimento lingüístico, o textual eo conhecimento de mundo para construir o significadode um texto. Dessa forma, a compreensão de um textoé um processo que se caracteriza pela utilização doconhecimento já adquirido pelo leitor, pois sem esseconhecimento ou com a sua limitação, não haverácompreensão, ou pelo menos, haverá umcomprometimento em relação ao seu significado.

Fazem parte desse conhecimento prévio do leitoro conhecimento lingüístico, o conhecimento textual e oconhecimento de mundo. Segundo a autora, é nainteração desses níveis de conhecimento que o leitorconsegue construir o sentido do texto; por isso, essesconhecimentos devem ser ativados durante a leitura parase atingir o momento da compreensão.

Aquilo que é individual na leitura, os aspectos quesão únicos e que são determinados pelos objetivos epropósitos específicos do leitor também são relevantesno processo de compreensão. Segundo Kleiman (1989,p. 36) “(...) uma das atividades do leitor, fortemente

determinada pelos seus objetivos e suas expectativas éa formulação de hipóteses de leitura”. Essas atividadessão de natureza metacognitiva e opõem-se aosautomatismos e mecanismos típicos de uma leiturasuperficial.

Entendendo leitura como um ato individual deconstrução de significado num contexto que se apresentamediante a interação entre autor e leitor, a autoraconsidera necessário o ensino de “estratégias de leitura”,entendendo-as como “operações regulares para abordaro texto”. Estratégias em leitura é uma ação, ou uma sériede ações, utilizadas com a finalidade de construirsignificados. Assim, Kleiman (1989), e também Koch(1997) conceituam estratégias como formas deliberadasde construção de significado, quando a compreensão éinterrompida. Classificando-as em “estratégiasmetacognitivas” e “estratégias cognitivas”, o ensinoestratégico de leitura consistiria no desenvolvimentodessas e na modelagem daquelas.

As estratégias metacognitivas são definidas como“operações (não regras) realizadas com algum objetivoem mente, sobre as quais temos controle consciente, nosentido de sermos capazes de dizer e explicar a nossaação” (Kleiman, 1998, p. 50). Assim, se o leitor tivercontrole consciente sobre essas operações, saberá dizerpara que ele está lendo um texto e saberá dizer quandonão está entendendo um texto. Essas são ascaracterísticas básicas apontadas para que um leitor sejaconsiderado proficiente.

Já as estratégias cognitivas da leitura regem oscomportamentos automáticos, inconscientes do leitor,são aqueles processos através do qual o leitor utilizaelementos formais do texto para fazer as ligaçõesnecessárias à construção de um contexto.

Através de estratégias de processamento de texto,o leitor interpreta as suas marcas formais, que sãopercebidas como elementos de ligação entre as formascontíguas de suas micro e macroestruturas. É uma tarefaque pode ser complexa em função da rede de relações(sintáticas, lexicais, semânticas e pragmáticas) que sesustentam no texto e que o tornam um objeto rico demaispara uma percepção rápida, imediata e total. Essasrelações estabelecem o processo de compreensão eorientam o leitor na organização de formas e regrasutilizadas para o estabelecimento da coesão e daconstrução de uma macroestrutura.

Apresentando algumas considerações sobre ocaráter interacional da leitura, afirma a autora que existe

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uma responsabilidade mútua entre autor e leitor, poisambos devem zelar para que os pontos de contato sejammantidos, apesar das possíveis divergências de opiniões.Esse caráter interacional da leitura pressupõe a presençado autor no texto, caracterizado pelas marcas formais,que atuam como pistas para a reconstrução do caminhopercorrido por ele durante a produção do texto. Acompetência do leitor para análise dessas pistas éconsiderada como pré-requisito para o seuposicionamento crítico frente ao texto.

Logo, o trabalho com a leitura deve estarfundamentado numa concepção teórica consistentesobre os aspectos cognitivos envolvidos na compreensãode textos.

A proposta da autora para o ensino de leituraconsiste no modelamento de estratégias metacognitivas,mediante a formulação de objetivos prévios à leitura e àelaboração de hipóteses sobre o conteúdo do texto. Noinício, ou até que o aluno adquira autonomia, o professorpode elaborar atividades visando a ensinar o aluno,através de um modelo, a ler com objetivos pré-determinados.

Para Koch (1997), o processamento textual deveser visto como uma atividade tanto de caráter lingüístico,como de caráter sociocognitivo. Para o seuprocessamento contribuem três grandes sistemas deconhecimento: o lingüístico, o enciclopédico e ointeracional. As estratégias de processamento textualimplicam na mobilização “on-line” dos diversos sistemasde conhecimento e podem ser divididas em três tipos:estratégias cognitivas, sócio-interativas e textuais.

Segundo essa autora, uma boa leitura seria aquelaem que o leitor conseguisse perceber que além dasignificação explícita, existe a significação implícita queestá ligada a intencionalidade do “emissor”. Assim,defende a idéia de que o texto apresenta umamultiplicidade de interpretações ou de leituras, não sendopossível atribuir apenas uma interpretação como única everdadeira. Porém, nem toda compreensão é válida; poisa compreensão de um texto consiste na apreensão dassignificações possíveis que são representadas através de“marcas lingüísticas” que funcionam como “pistas” paraque o leitor faça a “decodificação” adequada.

Assim sendo, o aluno precisa ser preparado parareconhecer essas marcas e alertado para o fato de queelas estão inseridas na própria gramática da língua. Épreciso também fazer com que o aluno saiba que atravésdas pistas que são fornecidas pelo texto é possível não

só “reconstruir o evento da enunciação”, como tambémrecriá-lo a partir do conhecimento e da visão de mundode cada um. Conseqüentemente, em cada nova leiturade um texto poder-se-á descobrir novas significações.

Enfatiza que se essas habilidades foremdesenvolvidas elas constituir-se-ão na competência deleitura e, conseqüentemente, o aluno deixará de ser um“elemento passivo” e participará como “sujeito ativo”do ato de ler.

Citando Paulo Freire, Koch (1996, p.160) ressaltaa importância do ensino da leitura para que o aluno torne-se “sujeito do ato de ler” e seja capaz de “ler o mundo”,demonstrando criticidade diante da realidade em que estáinserido. Para que o aluno torne-se apto para isso, oprofessor exerce papel fundamental. Durante asatividades na sala de aula, o professor deve mostrar aoaluno que um texto apresenta diversos níveis designificação.

Orlandi (1996, p. 35), para quem a leitura deveter uma importante função no trabalho intelectual,considera-a como uma questão lingüística, pedagógicae social ao mesmo tempo. Diz que a leitura não deveficar restrita ao seu caráter mais técnico, pois issoconduziria o seu tratamento em termos de estratégiaspedagógicas imediatistas.

Assumindo a perspectiva da Análise do Discurso,afirma que na leitura de um texto não há apenas adecodificação e a constatação de um sentido que já estádado nele. Para Orlandi o texto não deve ser entendidoapenas como um produto, deve-se observar o processode sua produção, da sua significação.Conseqüentemente, o leitor não apreende um sentidoque está no texto, mas sim atribui sentidos ao texto. Logo,a leitura é produzida e procura-se determinar o processoe as condições de sua produção. São mencionadoscomo componentes das condições de produção daleitura: os sujeitos (autor e leitor), a ideologia, os diferentestipos de discurso e a distinção entre leitura parafrásticae a polissêmica.

Considerações finais

A partir do que se coloca atualmente comoobjetivos e finalidades do ensino superior, a importânciado domínio do ato de ler assume posição de destaque,pois estabelece uma relação direta com a aprendizagem.

O domínio da capacidade de ler é condição parase efetivar a aprendizagem e o “aprender a aprender”.

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O aluno que aprende a aprender é aquele que é leitor. Oleitor que aprende a aprender é aquele que primeirodomina uma técnica de leitura e tem, diante do texto,uma posição de aprendizagem, de busca e uma posturacrítica.

O ato de ler e o de aprender são duas realidadesmuito próximas, portanto indissociáveis, interferindo-semutuamente. Dominar a leitura conduz o aluno a umaatitude ativa, dinâmica e crítica em relação aoconhecimento.

Reitero as palavras de Severino (1998) quandose refere à Universidade “como lugar de construção deconhecimento científico, filosófico e artístico”, ondeprofessor e aluno são desafiados a buscar oconhecimento novo de forma crítica, reflexiva e criativae isso só é possível para um leitor proficiente.

Repensar o ensino superior a partir do trabalhocom leitura significa primeiro definir a clientela a quemse destina, implica considerar os conhecimentos que osalunos já possuem e as suas dificuldades. Realizar umtrabalho que desenvolva no aluno a capacidade deaprender a aprender - lendo, compreendendo einterpretando é um grande desafio, porém constitui-senum dever do professor. O que é novo hoje pode estarsuperado amanhã, portanto há a necessidade de se criare inovar sempre. A sociedade atual requer um pesquisare construir constantes. E a leitura tem sua parcela decisivade contribuição, pois é ela que nos permite buscar novosconhecimentos.

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