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Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: <http://www.edicic.org/revista/>. ARQUIVOLOGIA, BIBLIOTECONOMIA E DOCUMENTAÇÃO: O LUGAR DA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO ENTRE AS CIÊNCIAS DA DOCUMENTAÇÃO Carlos Henrique Marcondes Departamento de Ciência da Informação Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação - Universidade Federal Fluminense (UFF) - Brasil RESUMO Apesar do reconhecimento generalizado de suas interfaces e entrelaçamentos históricos e epistemológicos, a configuração institucional para a gestão de C&T no Brasil, configurada na Tabela de Áreas do Conhecimento CAPES/CNPq, apresenta a CI como um grande guarda- chuva sob a qual estariam a subáreas como Arquivologia, a Biblioteconomia e mesmo a Museologia. Ao logo da trajetória histórico-epistemológica da CI, foram propostas várias teorias para dar conta do fenômeno informação, todas, no entanto, centradas ora em um, ora em outro aspecto específico. É esboçada uma teoria que integra os conceitos de documento e informação. É proposta uma visão analítica detalhada e fundamentada ontologicamente da noção de documento, com vistas a fornecer subsídios para a compreensão do funcionamento de documentos nos mais variados contextos específicos, incluindo aquelas subáreas e discutir a relação documento-informação. É reafirmada a visão do documento como um instrumento cujas funções estão ligadas a processos evolutivos, a linguagem e a cultura. É apresentada uma definição de documento que o considera fundamentalmente como um artefato, artificial, criado e usado com determinadas finalidades em contextos específicos. O objetivo é contribuir para fundamentar a Ciência da Informação. Palavras-Chave: Cultura; Linguagem; Documento; Informação; Ciência da Informação; Fundamentos; Epistemologia; Tabela de Áreas do Conhecimento CAPES/CNPq. ABSTRACT Despite the widespread recognition of its interface and interweaving historical and epistemological, the institutional setting for the management of S&T in Brazil, set in the Table of Knowledge Areas CAPES/CNPq, represents the Information Science (IS) as a large umbrella under which they would be subareas as the Archivology, Librarianship and even Museology. By then the trajectory of historical-epistemological IS have proposed several theories to account for the phenomenon information all, however, focused now on one, now another specific aspect. Is outlines a theory that integrates the concepts of document and information. The proposal is a detailed and analytical view of the notion of ontologically based document, aimed at providing data for understanding the operation of documents in various contexts, including those sub-areas and discuss the relation-document information. It reaffirmed the vision of the document as an instrument whose functions are linked to evolutionary processes, language and culture. It presented a document definition that considers as primarily an artifact, artificial, created and used with specific purposes in specific contexts. The aim is to support the Information Science. Keywords: Culture; Language; Document; Information; Information Science; Fundamentals; Epistemology; Table of Knowledge Areas CAPES/CNPq.

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Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . ARQUIVOLOGIA, BIBLIOTECONOMIA E DOCUMENTAO: O LUGAR DA CINCIA DA INFORMAO ENTRE AS CINCIAS DA DOCUMENTAO Carlos Henrique Marcondes Departamento de Cincia da Informao Programa de Ps-Graduao em Cincia da Informao - Universidade Federal Fluminense (UFF) - Brasil RESUMO Apesardoreconhecimentogeneralizadodesuasinterfaceseentrelaamentoshistricose epistemolgicos, a configurao institucional para a gesto de C&T no Brasil, configurada na Tabela de reas do Conhecimento CAPES/CNPq, apresenta a CI como um grande guarda-chuvasobaqualestariamasubreascomoArquivologia,aBiblioteconomiaemesmoa Museologia.Aologodatrajetriahistrico-epistemolgicadaCI,forampropostasvrias teoriasparadarcontadofenmenoinformao,todas,noentanto,centradasoraemum, oraemoutroaspectoespecfico.esboadaumateoriaqueintegraosconceitosde documentoeinformao.propostaumavisoanalticadetalhadaefundamentada ontologicamentedanoodedocumento,comvistasafornecersubsdiosparaa compreensodofuncionamentodedocumentosnosmaisvariadoscontextosespecficos, incluindo aquelas subreas e discutir a relao documento-informao. reafirmada a viso do documento como um instrumento cujas funes esto ligadas a processos evolutivos, a linguagemeacultura.apresentadaumadefiniodedocumentoqueoconsidera fundamentalmente como um artefato, artificial, criado e usado com determinadas finalidades em contextos especficos. O objetivo contribuir para fundamentar a Cincia da Informao. Palavras-Chave:Cultura;Linguagem;Documento;Informao;CinciadaInformao; Fundamentos; Epistemologia; Tabela de reas do Conhecimento CAPES/CNPq. ABSTRACT Despitethewidespreadrecognitionofitsinterfaceandinterweavinghistoricaland epistemological, the institutional setting for the management of S&T in Brazil, set in the Table ofKnowledgeAreasCAPES/CNPq,representstheInformationScience(IS)asalarge umbrellaunderwhichtheywouldbesubareasastheArchivology,Librarianshipandeven Museology.Bythenthetrajectoryofhistorical-epistemologicalIShaveproposedseveral theories to account for the phenomenon information all, however, focused now on one, now anotherspecificaspect.Isoutlinesatheorythatintegratestheconceptsofdocumentand information.Theproposalisadetailedandanalyticalviewofthenotionofontologically baseddocument,aimedatprovidingdataforunderstandingtheoperationofdocumentsin various contexts, including those sub-areas and discuss the relation-document information. It reaffirmedthevisionofthedocumentasaninstrumentwhosefunctionsarelinkedto evolutionaryprocesses,languageandculture.Itpresentedadocumentdefinitionthat considersasprimarilyanartifact,artificial,createdandusedwithspecificpurposesin specific contexts. The aim is to support the Information Science. Keywords: Culture; Language; Document; Information; Information Science; Fundamentals; Epistemology; Table of Knowledge Areas CAPES/CNPq. 207 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . 1 INTRODUO Apesardoreconhecimentogeneralizadodesuasinterfacese entrelaamentoshistricoseepistemolgicos,aconfiguraoinstitucionalparaa gesto de cincia e tecnologia (C&T) no Brasil, consubstanciada na atual Tabela de reasdoConhecimentodaCoordenaodeAperfeioamentodePessoaldeNvel Superior/ConselhoNacionaldeDesenvolvimentoCientficoeTecnolgico (CAPES/CNPq),representaaCinciadaInformao(CI)comoumgrandeguarda-chuvasobaqualestariamaArquivologia,aBiblioteconomia,aDocumentaoe mesmoaMuseologia,numarelaognero-espcie.Estaconfiguraonoreflete corretamentenemostrajetoshistrico/epistemolgicos,nemosobjetosdestas disciplinas, mas sim diferenas no processode constituio e institucionalizao da CI como disciplina cientfica no mundo e, em especial no Brasil, em contraste com os processos vividos por aquelas disciplinas.Desdeasuaconstituiocomodisciplinacientfica,emtornodaDcadade 60doSculoXX,aCIvmprocurandoconstruirumateoriaintegradaecoerente quedcontado fenmenoinformao.Na sua faseinicialaCIerapoucomaisdo queumconjuntodetcnicasquevisavamaotimizarousodocomputador,recm inventado,natarefaderecuperaoderegistrosquerepresentavamocrescente nmerodepublicaescientficas,criadosearmazenadosembasesdedados computacionais.AolongodasuaevoluoepistemolgicaaCIconstruiuvises cadavezmaisabrangentesdofenmenoinformao,associadasaoschamados paradigmas sistmico, cognitivo e scio-cognitivo. Nas intensas discusses que resultaramnaconstruodestasvisesaCItmosciladoentreconceituaes objetivas e subjetivas da informao;como questiona Hjrland (2004): Information: ObjectiveorSubjective/Situational?.Estasvisesparecemconflitantese excludentesediversosautoresnarea(FROHMANN,1995;BUCKLAND,1997; CAPURRO, 2003; HJRLAND, 2004) tm privilegiado uma ou outra. Apesar de reconhecimentos esparsos ao longo da sua histria do dbito da CI comaDocumentao,adiscussododocumentodentrodaCI foi,decertaforma, ofuscada e mesmo considerada ultrapassada frente a um objeto que parece ter um apelomuitomaior,ainformao(FREITAS,2003).Arecenterevalorizaodas discusses sobre o documento na CI Lund (2009, p.399) fala de a renaissance for 208 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . the document approach mostra como muita elaborao terica ainda necessria paracompatibilizareintegraraquestododocumentonoescopotericodaCI. necessrioavanarnaconstruodeumaconsistenteteoriadodocumento, incluindoasuarelaocomainformao,umaontologiadodocumento,no somente no sentido do que ele hoje, mas dos processos histricos que permitiram ele vir a ser o que , uma teoria que abranja seus usos sociais. Oobjetivodopresenteestudodiscutirobjetos,interfacesetrajetrias epistemolgicasdasreasdeArquivologia,Biblioteconomia,DocumentaoeCI, em especial no contexto brasileiro. So analisados os fundamentos sociais, culturais e ontolgicos do conceito de documento, a emergncia do conceito de informao e as possveis relaes entre ambos. esboada uma teoria que integra os conceitos dedocumentoeinformao;odocumentopropostocomopossvelbasecomum paraessasdisciplinas.Aanliseservedebaseparaidentificarosobjetosdessas disciplinasedelimitarseusescopos,diferenaseinterfacescomoobjetivode contribuir para fundament-las, potencializando suas sinergias. 2REFERENCIAL TERICO Halgumtempotemostrabalhado(MARCONDES,2010)esboandouma anlisequerelacionadocumentosesuasfunesnasociedadeatualeemoutras sociedadeslinguagemapartirdeaspectosantropolgicoseevolutivosda humanidade e do papel da linguagem e cultura nestes processos. Cognio, cultura elinguagemsopropostascomonoesfundamentaisparaumadiscussosobre os fundamentos da CI. A partir de vises recentes da Antropologia Cultural, Biologia EvolutivaePsicologiaEvolutivasopercorridasquestescomoaemergnciado pensamentosimblico,osurgimentodacultura,dalinguagem,daescrita,para culminarnodocumento.AutorescomoTatterasall,discutindoosurgimentoda cogniomoderna,NowakeKomarova(2001),discutindoosurgimentoda linguagem,Dunbar(1993)eKnightetal.(2000),discutindoopapelsocialda linguagem,MaturanaeVarela(2000),discutindoosfundamentosbiolgicosda cognio humana, lanam novas luzes para compreenso do papel dessas questes na evoluo humana. Dessas discusses tambm emergem a noo de articulao e cooperao social, essencial para a argumentao aqui desenvolvida. 209 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . Selinguagemeculturasoelementosfundamentaisparaexplicaras sociedadeshumanas,aontologiadePopper(1978),comsuadivisodarealidade emtrsmundos,importante.Segundoestaviso,oMundo1corresponderia realidadefsica,oMundo2realidadementalepsquica,e,emespecialparaas questes discutidasaqui,oMundo3corresponderiaaomundo dacultura.Popper afirmaqueByworld3Imeantheworldoftheproductsofthehumanmind.Mais ainda, Popper afirma que Of most though not of all world 3 objects it can be said that theyareembodied,orphysicallyrealized,inone,orinmany,world1physical objects. Um autor da CI, Brookes, resgata a viso de Mundo 3 de Popper e a prope comofundamentoparaaCI.OMundo3dePopperdesenvolvidoporBrookes (1980,p.209)noconceitodeobjetivao,comovisesdomundosocialmente condensadas. WersigeNeveling(1975),numatentativadedelimitaroescopodaCIainda numaetapadeformulaodosseusobjetos,afirmamserinformaoumconceito muitoamplo,queperpassavriasdisciplinascientficas.Noqueestesautores denominamdebroadsolution,informaopoderiaserassociadaaoselementos fundamentais do universo, juntamente com matria e energia (MADL; YIP, [s.d.]). No entanto, os autores tratam de afirmar que o conceito de informao que interessa CI no estava neste escopo mais amplo: no que eles chamam de medium solution, osautoresdefinemThebasicnotionisinformationasrecordedknowledge.E finalmente,noqueosautoresdefinemcomonarrowsolution,informaoseria: [] the only phenomenon of information,usually defined as recorded knowledge in the context of scientific and technological work. A medium solution o escopo que osautorespropecomomaisadequadoparaaCI.Esteescopoestarelacionado com as vises de Mundo 3, de Popper e de sua objetivao, de Brookes. Belkin um dos primeiros autores no campo da CI que formula o paradigma cognitivo,assimchamadoaodeslocamentoeampliaodoespectrodeinteresse daCIparaquestesqueenvolvemosaspectoscognitivosdosusurios(e produtores) de informao. Introduz diversas questes e aspectos caractersticos do fenmenoinformao,deinteresseparaumaanlisedoconceito.Aodefinir informaocomo[...]isthatwhichiscapableoftransformingstructure(BELKIN; ROBERTSON, 1976, p.198), se referindo s estruturas mentais do receptor de uma 210 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . mensagem,Belkinintroduztambmaquestodestamudanaserintencionalpor partedoemissordamensagem.Chamaa atenoparao fatodequeofenmeno informaoextrapolaeincluirelaescomoconhecimentoindividual,com estruturassociaisconceituaisecomoconhecimentoformalizado.Naesteiradas formulaesdeBelkin,apropostadoparadigmacognitivoampliadaparao paradigmascio-cognitivo(CAPURRO,2003;HJRLAND,2004),aformulao atual e mais ampla do escopo da CI, caracterizada como uma cincia cognitiva, que discuteascondiesdeinterpretaodefenmenosinformativosporusuriosem contextos sociais e histricos definidos. OaspectocognitivodainformaoremeteparaaSemiticacomoacincia bsicainteressadanofenmenohumanodainterpretaodaspercepesdo mundo.nohomemepelohomemqueseoperaoprocessodealteraodos sinais (qualquer estmulo emitido pelos objetos do mundo) em signos ou linguagens (produtosdaconscincia)(SANTAELLA,1990).Foucault(2002,p.81)enfatiza categoricamenteesteaspectoquandoafirmaqueOsignonoespera silenciosamente a vinda daquele que pode reconhec-lo: ele s se constitui num ato deconhecimento.Vriosautores(RABER;BUDD,2003;BRIER,2004;HUANG, 2006) tm buscado aportes da Semitica para chegarem a definies de informao.Buckland(1997)faladaambiguidadedotermoinformaoedistinguetrs possveisfacesparainformao:informaocomoprocesso,informaocomo conhecimentoeinformaocomocoisa.Associadocumentos,comoobjetos informativos,informaocomocoisa.Enquantonasacepesdeinformao comoprocessoeinformaocomoconhecimentoestoenvolvidosaspectos cognitivosepsicolgicos,informaocomocoisaanicaquepodeser apropriada pelos sistemas de informao e ser objeto do trabalho informativo.Outra vertente de interesse para a proposta deste trabalho a compreenso do papel dos documentos e da informao nas sociedades humanas.Barry Smith (2005)fazalusoaotextodeJohnSearleintituladoSpeechActsiquandoprope uma teoria do que este autor chama de document acts, para explicar o papel que os documentos jogam nas relaes sociais: [...] it might be used to provide a better understandingoftheroleofdocumentsinthecoordinationofhumanactions. Frohmann(1995)propeeliminarasubjetividadeinerenteaoconceitode informao, ao propor uma anlise fenomenolgica, baseada na maneira como este 211 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . fenmenoseapresentaemmomentoshistricosespecficos;propeumaanlise baseada nos jogos da linguagem, de Wittgenstein, na qual os usos da informao, materializadaemprticasdocumentaisconcretas,emsituaeshistrico-sociais definidas, so o objeto privilegiado.Baker(2004)propeumaanliseontolgicadeartefatos,queinclui caractersticascomoobjetoartificial,intensionalidade/propsito,funcionalidade, entre outras, que serve de base para caracterizar documentos como artefatos. 3PROCEDIMENTOS METODOLGICOS Trata-sedeumapesquisadecarterqualitativo,queutilizaomtodo bibliogrfico.ForambuscadostextosoriundosdereascomoAntropologiaCultural, Biologia Evolutiva e Psicologia Evolutiva, alm de reas como Semitica e Ontologia, alm detextoscomorigemnaprpriaCI.Soanalisadososfundamentosantropolgicos, sociaiseculturaisda noode documento parasechegaraoseupapelsocial nas sociedades humanas primitivas; este papel extrapolado para as sociedades atuais. Apartirdestepapelfeitaumaanliseontolgicadodocumento,discutidaa emergnciadoconceitodeinformao,incluindoseusfundamentosontolgicos,e as possveis relaes entre ambos os conceitos. esboada uma teoria que integra osconceitosdedocumentoeinformao;odocumentopropostocomopossvel base comum para essas disciplinas. 4RESULTADOS 4.1 Linguagem, Cultura e Documento Ohomemumserprofundamentedependentedavidasocial;esta dependnciaassumeumcarterestrutural(MATURANA;VARELA,2000).Manter osvnculossociaiseraquestodevidaoumorteparaosfrgeisbandosde ancestrais humanos (DUNBAR, 1993). No contexto evolutivo humano a emergncia dopensamentosimblicotemseusprimeirosindciosremontandoamaisde 100.000anos(WONG),conformeindicamosdesenhos,ossoseasconchas perfuradascomocontas,encontradasnafricadoSul.deseesperarquea 212 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . linguagemtenhaemergidoumpoucoantes.Anatomicamente,osurgimentoda linguagemestassociadoevoluoedesenvolvimentodamesmaregiodo crebro responsvel por nossas habilidades manuais (NEUWEILER, 2010).Aemergnciadalinguagemrepresentouparaaespciehumanaum diferencialevolutivodecisivo(ENARDetal.,2002),(KNIGHT,2000).Nowake Komarova (2001, p.288) resumem o significado da emergncia da linguagem para a espcie humana:Osignificadoadaptativodalinguagemhumana bvio.vantajoso falar.Cooperaonascaadas,coordenaodeatividades, compartilhamentodetarefas,manutenodevnculossociais, manipulaesetrapaas,todasestasatividadessebeneficiamde umcrescentepoderexpressivodalinguagem.Aseleonatural (incluindoaseleosexual)podecertamentedemonstrar consequncias da comunicaoii. Nenhum sistema de comunicao encontrado no reino animal se compara, no entanto,linguagemhumana,sfunessimblicasquesocaractersticasda linguagemhumana.Vriasteoriasatribuemaorigemdalinguagemhumana existnciadeumaprotolinguagem(NOWAK;KOMARONOVA,2001).Apartirde sonsisoladospalavrasassociadosasignificadosnumarelaoumparaum,a linguagemhumanaevoluiu,incorporandofunessintticas(CHOMSKY,2002),a serializaodepalavras(NOWAK;KOMARONOVA,2001).Nalinguagemhumana significados no so somente dados por palavras isoladas, mas por combinaes de palavras. Desta forma podiam ser criadas possibilidades infinitas de combinaes e denovossignificados.Estesautoresmostramcomoestacrescenteflexibilizao, juntocomopotencialcomunicativoeaeconomiadeenergiaproporcionadapela linguagem humana acabaram tornando-se diferenciais evolutivos decisivos.Alinguagem,comoumprimeirograudeexternalizaodopensamento simblico, permite maior cooperao e articulao social. Dunbar (1993) ao discutir a vidasocialdosprimataschamaatenoparaotempogastonoscontatossociais necessriosparamanteraestabilidadeeosvnculosdogrupo:macacospassam grande parte do seu tempo coando uns aos outros ou catando piolhos. Ao discutir oscontatossociaisemgruposdehumanosprimitivos.Esseautorafirmaquea possibilidade de grupos sociais maiores dependia de mecanismos mais eficientes de manteroscontatossociaisindispensveiscoesodogrupoeafirmaquesa linguagem cumpria esta finalidade.213 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . Comcertezaumamutaogenticaporsisnocrioualinguagem,mas esta habilidade encontrou nos grupos sociais humanos cada vez mais complexos a possibilidade de desenvolver-se. As mutaes que viabilizaram a linguagem humana foramasltimasalteraesbiolgicassignificativasemnossaespcie. Biologicamentehojesomospraticamenteidnticosaosnossosantepassadosde 100.000 anos atrs. A partir deste perodo o grande vetor evolutivo da humanidade tem sido a cultura.A linguagem uma caracterstica humana que pr-requisito para a evoluo daculturacomonsaentendemos(FLYNN,1997)umaculturacrescentemente acumulativa. Uma linguagem cada vez mais sofisticada no sentido de ser capaz de expressarpensamentosimblico,ouseja,capazdecontar,descrever,re-apresentar, socializar situaes na ausncia delas, argumentar, convencer, se torna um forte mecanismo de cooperao e articulao social e garante espcie humana um diferencial evolutivo decisivo.Aevoluohistricadasociedadehumanaparaformascadavezmais complexas, um imperativo evolutivo e de sobrevivncia da prpria espcie humana, demanda pari passu mecanismos de articulao social e de reuso do conhecimento cadavezmaiscomplexos;estessoprovidos,numprimeiromomento,pela linguagem. No homem, a cultura transcende instintos, independe dos corpos individuais, sematerializaeseautonomizanosprodutosdacultura.Associedadeshumanas vivemesobrevivemnacultura.Manteredesenvolveraculturaumaquestode sobrevivncia.Nummomentohistricomaisrecente,hcercade5.000anosA.C., nocontextodesociedadeshumanasjbastantecomplexas,alinguagemfalada externalizada,fixada,tmsuperadasuafragilidadeeperenidadecomomecanismo de comunicao intersubjetivo, materializada atravs de artefatos na escrita e desta no documento.Oqueumdocumento?Qualsuanatureza?Nodocumentoessasfunes dalinguagem,decooperaoearticulaosocial,seampliam,ganhamnovas funcionalidades e potencialidades sociais; o documento representa um avano sobre as potencialidades da linguagem para a consecuo dessas funes. O documento ganhaemrelaolinguagem,almdascapacidadesdeexternalizaoe intersubjetividade,tambmautonomia,registrodemensagens,suapermannciae 214 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . portabilidade capacidade destas mensagens de atravessar o tempo e o espao. O documento um produto da cultura, construdo pelo homem, um artefato. Inteno e funo so caractersticas essenciais de qualquer artefato. Todo o artefato, entre os quaisestaarroladoodocumento,segundoBaker(2004,p.99),[]areobjects intentionallymadetoserveagivenpurpose;esteautoracrescentaaindaque: Thus,an artifacthas itsproperfunctionessentially:The nature ofanartifactliesin its proper function-what it was designed to do, the purpose for which it was produced (BAKER,2004,p.105).Enquantotalodocumentopermiteviabilizaraintenode seucriadorderealizarafunodetransferirmensagens(paraalgum),graasa sua permanncia e portabilidade, em contextos sociais definidos, atravs do tempo e do espao. Documentosenquantoprodutosdacultura,enquantoartefatos,ampliamas funesdalinguagemeseupapelnaculturahumanaviabilizarpraticamente,de forma mediada, a intersubjetividade, permitindo a fixao e transmisso mensagens atravs do tempo e do espao. Estas mensagens visam: 1 articulao, cooperao, coordenaodeatividadessociais;2registrodeexperincias,utilizao, reutilizao,recontextualizaodoconhecimento.Asobrevivnciadaespcie humanaesuahistriasocialvmobrigandoaodesenvolvimentodeambasas funes.Osurgimentodedocumentosresultaemmaisemaiorespossibilidadesde armazenamento, recuperao, reuso em larga escala, funcionando como base slida paraacultura,paraarticulaodesociedadescadavezmaiscomplexasemais dependentes de articulao social e conhecimento para se manterem. 4.2 Funes Sociais dos Documentos: documento e conhecimento, documento e ao primeirafunodosdocumentoscorrespondegrossomodosatividades daArquivologiatradicional;segunda,sdaBiblioteconomia,Documentaoe Cincia da Informao tradicionais. Pelo lado da Cincia da Informao, esta sempre estevepreocupadacominformaoenquantoconhecimento(BUCKLAND,1991). Esta,atrecentemente,vinhanegadoseulegadocomaDocumentaoe menosprezadoopapeldodocumentonasprticasinformacionais;aodocumento erarelegadoumlugarmenor,comoseasquestesrelativasaodocumento 215 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . representassemumestgioembrionriodaCinciadaInformao,encerrado definitivamentecomareificaodainformaoumobjetodiferente,quepode ser processado por computador. S pouco a pouco aportes recentes da Cincia da Informaoesboamvisesqueprivilegiamdocumentosnocomoportadoresde conhecimento, mas que tm uma funo social e um funcionamento definido dentro de contextos sociais especficos (FROHMANN, 1995), (BROWN;DUNGUID,1996). Hoje este legado vem sendo cada vez mais reconhecido (LUND, 2009). Estas vises enfatizam o papel social dos documentos, inseridos em relaes sociais definidas e historicamentesituadas;servemdebasesparaoesboodeumateoriageralque integredocumentoseinformao.Frohmannafirmaoprimadoontolgicodo documentosobreainformaoeafirmaqueseucarterinformativodependedas prticas sociais. Buckland(1997),fazendoumretrospectodasdefiniesdedocumentos desde os primrdios da Documentao at aos documentos digitais, chama ateno para o fato de que, antes de tudo, documentos devem funcionar como documentos: Theevolvingnotionof"document"amongOtlet,Briet,Schrmeyer, andtheotherdocumentalistsincreasinglyemphasizedwhatever functionedasadocumentratherthantraditionalphysicalformsof documents.Theshifttodigitaltechnologywouldseemtomakethis distinctionevenmoreimportant.Levy'sthoughtfulanalyseshave shownthatanemphasisonthe technologyofdigitaldocumentshas impededourunderstandingofdigitaldocumentsasdocuments(e.g. Levy, 1994) (BUCKLAND, 1997, p.6). O desenvolvimento da Filosofia vem mostrando um interesse crescente com a questodoconhecimento,edalinguagemcomomecanismodeacessoaeste. Dummett,citadoporMarcondes(2004,p.9),divideatradiofilosficadesdeos gregos em trs grandes perodos: o primeiro vai da filosofia antiga (Sc. VII a.C.) at o final do pensamento medieval (Sc. XIV), e tem como interesse central a questo ontolgica,anaturezadouniversoedosseres;osegundocaracteriza-seporuma ruptura radical com o primeiro e marca o surgimento da filosofia moderna (Sc. XVI-XVII),tendocomoquestocentralaepistemologia,ainvestigaosobreo conhecimento;oterceiroperodomarcaaruptura,porsuavez,dafilosofia contempornea (final do Sc. XIX incio do Sc. XX) com a filosofia moderna; essa nova ruptura introduz a questo lgico-lingustica, ou seja, o conhecimento no pode serentendidoindependentementedesuaformulaoouexpressoemuma linguagem. 216 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . A filosofia da linguagem que se delineia a partir do fim do Sculo XIX e incio do Sculo XX pode ser dividida em duas vertentes: a filosofia da linguagem ideal e a filosofia da linguagem ordinria (COSTA, 2003, p.8). A primeira, preocupada com o usolgico-semnticodalinguagemcomoinstrumentoparaoconhecimento,em especial, para a cincia; a segunda, com o uso da linguagem para fins pragmticos, como instrumento de interao social, como seu uso no dia a dia. Navertentelgico-semnticatemosascontribuiesimportantesdeFrege, deCarnap,deBar-Hillel,deRussel,doprimeiroWittgensteinedospositivistas lgicos. Estes pensadores tinham como preocupao instrumentar a linguagem com vistas preciso de significados necessria para se atingir a verdade, necessria Cincia.Aoprimeirousodalinguagemcorrespondefunododocumento enquanto registro de conhecimento. Ousodalinguagem,porpermitiraexternalizaodemensagensesua intersubjetividade,colocaaquestodasubjetividade,dainterpretaodeuma mensagem.Quandoalinguagemutilizadaparatransferirmensagensatravsde documentos,queatravessamotempoeoespao,estaquestotorna-semais dramtica,poisosinterlocutoresnoestomaiscaraacaraparatiraras ambiguidades da mensagem. O uso da linguagem na Cincia, com sua pretenso universalidadeenecessidade,impeocontroledasubjetividade,ocontroledos significados.AspropostasfundadorasdaDocumentaodeOtlet,passandopela proposta inicial do que seria denominada CI, se vinculam a este uso da linguagem. Buscam o controle dos significados necessrio Cincia, o controle terminolgico, a construodeinstrumentosparafixarsignificados,comotesaurosetabelasde classificao.Osegundousodalinguagem,ousopragmticonodiaadia,temcomo representantesnaFilosofiadaLinguagemosegundoWittgenstein,Austin,Searle, Habermas,comsuapropostadepragmticauniversal.Aesteusocorrespondea funododocumentocomomeioeinstrumentodeinteraosocialmediada,em correspondncia s funes da linguagem de articulao, cooperao, coordenao deatividades.Nesteusodocumentos(s)funcionamdentrodecontextossociais bemdefinidos:aosatosdafala(SEARLE,1971)correspondemosassim denominadosatosdosdocumentos(SMITH,2005).Documentosinstaurameso 217 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . instaurados por protocolos sociais; seu uso referendado/institucionalizado/validado por uma rede de acordos explcitos ou implcitos a que o documento se refere. 4.3 Documento e Informao Buckland,noseutrabalhoInformationasthing,aobuscarchegaraum conceito de informao, identifica trs perspectivas sob as quais a informao pode servista:1-Information-as-process,2-Information-as-knowledgee3-Information-as-thing. Ao analisar e relacionar estas perspectivas prope como caminho, ao invs de responder o que seria informao, investigarque coisas so informativas, e sob que circunstncias: We conclude that we are unable to say confidently of anything that it could not be information. Thisleadsustoanunhelpfulconclusion:Ifanythingis,ormightbe, informative, then everything is, or might well be, information. In which case calling something "information" does little or nothing to define it. If everything is information, then being information is nothing special. (BUCKLAND, 1991). AconclusodeBucklandnosdeixaperplexos.Sequalquercoisapodeser informao,emquecircunstnciasistosed,quandonotemosinformao? Buckland responde a esta questo afirmando que: Being information is situational. Information-as-process is situational. Therefore, evidence involved in information-as-processissosituationallyalso.Hence,whetherany particular object, document, data, or event is going to be informative depends on the circumstances, just as the "relevance" of a document or a fact issituational depending on the inquiry and on the expertise of the inquirer (Wilson, 1973) (BUCKLAND, 1991). NoseutextoBucklanddestacaopapeleashabilidadesdousuriothe expertiseoftheinquirer.Seinformaosituacional,comoafirmaBuckland,a pergunta anterior pode ento ser recolocada: em que situaes qualquer fenmeno podeserinformao?ASemitica,acinciadossignos,forneceelementospara responder a questo deixada por Buckland, a partir da relao que estabelece entre percepo, pensamento e signo: Qualquer coisa que esteja presente mente est no lugar de alguma outra coisa (SANTAELLA, 2008, p.58). Perceber se defrontar com algo (SANTAELLA, 2008, p.60). nohomemepelohomemqueseoperaoprocessodealterao dossinais(qualquerestmuloemitidopelosobjetosdomundo)em 218 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . signos ou linguagens (produtos da conscincia) (SANTAELLA, 1990, p.15).Assim,aprpriapercepohumanadosmaisvariadosfenmenosseriaum processosgnico.UmbertoEcodefineassimoscomponentesdeumprocesso sgnico ou semiose, ressaltando sua especificidade de ser tpica dos seres humanos:Asemioseofenmeno,tpicodossereshumanos(e,segundo alguns,tambmdosanjosedosanimais),peloqualcomodiz Peirceentramemjogoumsigno,seuobjeto(oucontedo)esua interpretao (ECO, 1989, p.11, nota). O aporte da Semitica na conceituao de informao j tem sido observado por vrios autores no campo da Cincia da Informao, como Raber e Budd (2003) e Huang (2006). Os primeiros afirmam: []andthewordinformationisforcedtododoubleduty,signifying bothspeech(regardlessofitsmedium)andthought,bothtextand content.Thiscontributestotheoreticalconfusionininformation science (RABER; BUDD, 2003, p.3). [] text, regardless of its medium, is the tangible form of information. Informationisakindofsignthatunitestextandcontent(RABER; BUDD, 2003, p.3).Estesautoresapontamcorretamenteaconfusoconceitualsurgidaporse tratar a informao ora como speech ou como thought. Segundo eles, recorrer Semitica e definir informao como signo poderia resolver o impasse. colocao de Buckland (1991) de que tudo pode ser informao everything is, or might well be, information, preferimos o conceito de potencialidade informativa, para no referendar o uso corriqueiro do termo informao como coisa. Ou seja, a realidadeplenadefenmenospotencialmenteinformativos,umfenmeno informativoquandointerpretadoporalgum,quandoalgofazalgumsentidopara algum.Floridi(2006),noseutrabalhothelogicofbeinginformed,reconhece claramente queinformar(-se) um processo, no qual algum informado por algo. Issocoloca asquestesdainterpretao,dosintrpretes,ouseja,dosusurios da informao para usar um termo mais comum em nossa rea, como central para a CI. Capurro (2003) coloca esta questo com todas as letras, ressaltando o dbito da CI comaHermenutica.NosgrandesprocessosreflexivosporquetempassadoaCI desde sua constituio enquanto disciplina, o hoje chamado paradigma cognitivo e, posteriormente,oparadigmasociocognitivo(HJRLAND,2004),aquestodo usurio vem se tornar central. 219 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . OaportedaSemiticalevantadoisoutrosproblemasquedevemser discutidos e contextualizados para que a Semitica possa ser apropriada e utilizada emnossadisciplina.Primeiro,naSemiticaestimplcitoqueainterpretao somente do intrprete, que para ns seria o usurio; nada dito sobre o produtor ou autordosigno,desuasintenesaofaz-lo.Segundo,aointroduziraquestoda interpretao,conduznecessariamenteaumsubjetivismo,inerenteaosprocessos humanos de interpretao. A CI uma cincia social aplicada, que tem como campo deaplicaoossistemasdeinformao,aosquaiscobradoumaltograude eficciaeeficincia.Comolidarcomosubjetivismonagestodesistemasde informao? novamenteBucklandqueofereceumaportefundamentalnestaquesto, comsuasnoesdeinformation-as-thingeinformationbyconsensus:[]and wenotedthatinformationsystemscandealdirectlyonlywith"information-as-thing" (BUCKLAND, 1991). Alm disso: Wherethereisaconsensusofjudgement,theconsensusis sometimes so strong that the status of objects, especially documents, beinginformationisunquestioned,e.g.telephonedirectories,airline timetables,andtextbooks.Inthesecasesargumentsareonlyover nicetiessuchasaccuracy,currency,completeness,andcost.Asa practicalmattersomeconsensusisneededtoagreeonwhatto collectandstoreinretrieval-basedinformationsystems,inarchives, databases,libraries,museums,andofficefiles.Butbecausethese decisionsarebasedonacompoundingofdifferentjudgements,as notedabove,itisnotsurprisingthatthereshouldbedisagreement. Nevertheless,itisonthisbasisthatdataarecollectedandfedinto databases,librariansselectbooks,museumscollectobjects,and publishers issue books (BUCKLAND, 1991). SegundoBelkin(1976,p.198),umdospaisdavisocognitivanaCI, Informationisthatwhichiscapableoftransformingstructure.Oquecapazde transformar estruturas um processo; o aporte da Semitica (BRIER, 2004) permite identificar informao com o processo de interpretao de um fenmeno por algum. Umprocessodeinterpretaobastantecomplexo,noentanto,emqueentramem jogo, por parte do intrprete ou usurio, a necessidade de informar-se, a capacidade de interpretar, entre outras questes, e por parte do produtor ou autor do signo, sua intencionalidade,entreoutrasquestes.Entramemao,tambm,diferentes processosdeintermediaonosquais,tantoocontextooriginalmantido,como novas recontextualizaes so produzidas. 220 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . AcrescentaramosformulaodeFloridi,queumprocessoinformacional incluiriaumprodutor,comsuaintensionalidade,umartefatoondeestaregistrada umamensagemparaviabilizarqueelaatravesseespaoetempo,umusurio tambm com sua intensionalidade/necessidade. Informao assim um processo, no uma coisa, o processo de informar(-se) atravs de coisas que so potencialmente informativas, em especial, de artefatos criados com a inteno precpua de informarem de modo mediado (atravs do tempo e do espao), os documentos. Entre estas coisas, h muito que a sociedade humana criouumartefato,informativoporexcelncia,odocumento.Naverdade,o mecanismoqueahumanidadevemutilizandoparainformar(-se)mediadamentee emlargaescalasedatravsdedocumentos.Documentostmpotencialidades sociaiseculturaismuitomaisamplasquesimplesmentealinguagem,umavez criadossoindependentesdoprodutor,diferentesmecanismosdemediao (armazenamento, transferncia, recuperao) podem ser criados entre o produtor e ousurio.Comoinformar(-se)?Atravsdedocumentos,artefatoscriados especificamente para este fim. Briet(2006,p.10)em1951jhaviaobservadoessecartersgnicodos documentos,aodefini-loscomo:[]anyconcreteorsymbolicindexicalsign (ndice), preserved or recorded towards the ends of representing, of reconstituting, or ofprovingaphysicalorintellectualphenomenon.Noentanto,estecartersgnico no est sempre na mensagem em si, no contedo, como a CI tradicional enxerga. O carter sgnico ou significado varia entre dois plos, o da mensagem em si e o do contexto onde o documento funciona; se pode empregar a as noes de denotao e conotao; sua denotao seria seu significado literal, o significado da mensagem emsi,doseucontedo;suaconotaoseriaosignificadoqueadquireaoser empregado em determinado contexto, que extrapola sua mensagem.Emdeterminadosusossociais,namaioriadasvezes,ocontextomais informativoqueocontedododocumentoemsi;istopodeserexemplificadose pensarmos numa senha como as distribudas nas agncias bancrias para ordenar o atendimentocomoumdocumento;ocontedooumensagememsipraticamente notemsignificado;osignificadoestnocontextoemqueasenhautilizada.Na maioriadosusosdedocumentosnoqueaArquivologiatradicionalchamadeuso corrente, o carter sgnico do documento funciona desta maneira. 221 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . Em outros usos dos documentos o plo da mensagem em si predomina, nos usosrelacionadoscomonaleituradeumpaperporumpesquisador,nas aplicaesemquepriorizamepraticamenteidentificamumdocumentocomseu contedo,comoaBiblioteconomiaeCItradicionais.Nestas,arelaoinformao (via documentos) e conhecimento direta. 4.4 Arquivologia, Biblioteconomia e Cincia da Informao Pode-se traar um quadro das relaes da Arquivologia, Biblioteconomia e CI comodocumento.AArquivologiatemcomoobjetodiretamentearquivosenquanto conjuntosdedocumentos(ARQUIVONACIONAL,2005,p.27),(SCHELLEMBERG, 2005,p.41),suapreservao,incluindoa,almdapreservaofsica,adasua proveninciaeordemorgnicas,numavisopatrimonialista.Maisrecentemente, diantedofenmenodaexplosoinformacionaledoacmulodepapeisnas administraespblicaseprivadas,nopodefecharosolhosparaaquestoda gesto de documentos, de informao e de conhecimento, onde, de alguma forma, a questo do usurio esta colocada.A Biblioteconomia tem relao com o documento na questo da formao de colees,onde,deumaformaoudeoutra,umpossvelusuriocomsuas necessidades,pressuposto.Estaquesto,naturalmentemaisntidanas bibliotecasespecializadasemoposiosbibliotecaspblicasenacionais,que guardam um usurio quase annimo, uma viso iluminista, de promoo da cultura e do saber, tambm patrimonialista. Uma grande contribuio da CI para alm da manipulao de documentos em si,comoocasodaArquivologiaetambmdaBiblioteconomia,apreocupao comoprocessocognitivodousuriodainformao,quesurgecomoque conhecidocomoparadigmacognitivo.Naverdadearelaomaisgenricae fundamental,capazdeunificarasvisesdedocumentosdasdiferentesdisciplinas analisadasanteriormenteseriaentreodocumentoeoinformar(-se)enquanto processocognitivo,odocumentocomo mecanismoparainformar(-se)comvistasa umagirinformadodealgum,deumusurio.Estatalvezsejaumaponteslida entre documento e informao (e possivelmente, entre a CI). 222 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . Arquivologia,Biblioteconomia,DocumentaoeCI,cadaumadelastratade objetosdistintos:documentoseinformao;mesmoquandoessesobjetosso comuns, trata-os de maneiras diversas. Documentos e informao, enquanto objetos destasreasdeconhecimento,tminterfaces,participamdeprocessoscomuns, masnorelaesdegnero-espcie,comopodefazercreraTabeladereasdo Conhecimento CAPES/CNPq. SeaArquivologiaeaBiblioteconomiasecolocamcomoprticasemesmo comoprticasprofissionais(paraasquaisaquinoBrasilexistemassociaes profissionais), a CI a primeira a se reivindicar, desde seu surgimento, no exterior e tambmnoBrasil,ostatusdeCincia.Ostatusdecinciaessencialnomeio acadmico.AbiblioteconomiaespecializadaamericanaumadasrazesdaCI.A Biblioteconomialogopercebeuaimportnciadereivindicarparasiostatusde Cincia;desdeaDcadade60,quemarcaainstitucionalizaodaCIapartirdo EncontronoGeorgiaInstituteofTechnology,EUA(SHERA,1980),vrios departamentos,institutoseescolasdebiblioteconomiaamericanosnasuamaior parte, mas tambm britnicos e mesmo de outrospases europeus, alteraram suas denominaes para Library and Information Science. conhecido o fato de que a AmericanDocumentationInstituteteralteradosuadenominaoparaAmerican Society for Information Science (ASIS) (BUCKLAND, 1998). Este processo se repete tambmaquinoBrasil.EmumpassadonomuitodistanteaEscolade BiblioteconomiadaUniversidadeFederaldeMinasGerais(UFMG)passoua denominar-se Escola de Cincia da Informao, o Departamento de Documentao daUFFpassouadenominar-seDepartamentodeCinciadaInformao,spara citar alguns casos.Ainda no caso brasileiro, j as escolas de Arquivologia isoladas, isto,noassociadasacursosouescolasdeBiblioteconomia,ficarammargem deste processo, como o caso da Escola de Arquivologia da UNIRIO e do Curso de ArquivologiadaUFSM.Estaquestofaztodaadiferenanodesenvolvimento ulteriordareacomoumtodoeexplica,emgrandeparte,aatualconfiguraoda Tabela de reas do Conhecimento CAPES/CNPq. 223 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . 5 CONSIDERAES FINAIS A necessidade do agir informado foi e essencial para a espcie humana.A problematizao do agir informado mediado por documentos, da qual se ocupam de forma ampla o que poderiam ser chamadas de Cincias da Documentao, remota, como foi visto, s origens da humanidade, sua evoluo, cultura e linguagem. EstavisoprximadeWersigeNeveling(1975,p.136),quandopropeoque eles chamam de medium solution para o escopo da CI. AsvisesoriundasdaCIedaDocumentaoaindahojerelutamem enxergaremoutrosusosdosdocumentosquenosejamosderegistrode conhecimento.EstajustamenteavisodaArquivologia.Ousopragmticodos documentosemfunesdearticulao,cooperao,comunicaocomvistas coordenao de atividades, tm pouco a ver com a questo do conhecimento como privilegiadopelaCI(anoser,talvez,quandofalamosnumapragmtica informada, num agir informado). ACI, aosuperaroassimchamadoparadigma fsicodos primrdiosdesua constituio,incorpora,pelomenosemparte,avisodoinformar(-se)comoum processocognitivo.Noentanto,estaincorporaoinconsistente,pornoser consensual(aindahoje,mesmoentreautoresdaCI,usa-seordinariamenteo conceitodeinformaocomocoisaenocomoo processodeinformar(-se))epor no incorporar e no trabalhar a intencionalidade do produtor do documento.Informao enquanto processo informativo , sim, trabalhado em autores da CIcomoFrohman(1995)eGonzlezdeGmez(2003)soboconceitoderegimes de informao, fluxos de informao inseridos em processos sociais. Floridi (2006) trabalha o conceito de uma lgica de algum ser informado de algo. Assim, umprocessoinformacional,noqueinteressaCI, umprocesso de transmissointencionaldemensagensoucontedodedocumentosmediadas, isto , atravs do tempo e do espao. Este processo informacional desencadeado porumprodutor(algumasvezes,porumautor)segundoumadeterminada intencionalidade ou significado pretendido. De um modo muito geral, este significado est ligado inteno do produtor de coordenar suas atividades com a de usurios a quemo produtordirigea mensagem ou apermitirtransmitir-lheconhecimento para queestespossamreutiliz-lo.Estesignificadotantopodeestarligadoaocontedo 224 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . emsidamensagemquantoaocontextoemqueamesmaemitidaouqueo destinatrio/usurio a encontra. Ainvenodedocumentos,comsuaautonomiaemrelaoaoprodutor, permitequeesteprocessosejamediadoatravsdotempoedoespao.Permite tambmmanipulardediferentesmaneiras,documentos,acumul-losnosmais diferentessistemasdeinformao,intermediandoefacilitandoseuacessoa potenciais usurios. Dadaasuperofertademensagens,associedadesorganizamsistemasde intermediao,ondedocumentoseseuscontextossodisponibilizados.Numa sociedadecomplexacomoaatual,amediaotambmumprocessocomplexo. Usuriosinterpretamcontextosintencionalmenteepotencialmente(masno necessariamente)informativospara(eventualmente)informar-seeparaumagir informado no mundo.Documentossoassimobjetos(inclusiveosdigitais),artefatosatravsdos quaisasociedadepodeseapropriaremlargaescalaatravsdeprocessosde produo,armazenamento,transferncia,recuperaodepotencialidades informativas que ela utiliza para seu agir informado. Documentos, entendidos como o cerne de contextos sociais potencialmente informativos so, portanto, a base para o estudo dos mesmos. O arranjo da rea de CI na Tabela de reas CAPES/CNPq hoje desastroso, confusoeepistemologicamenteincorreto.Adiscussodasrelaesentreuma possvelCinciadaDocumentaoquetivessenodocumentopilareseinterfaces paraaArquivologia,aBiblioteconomia,aDocumentaoeprpriaCIcomoreas que tm como objeto o documento segundo diferentes aspectos, alm de uma forte interface com a Museologia, hoje se coloca como essencial e inadivel. A afirmao da rea no cenrio de C&T e seu reposicionamento diante da comunidade cientfica brasileiravosedaratravsdeumaclarezadestasinterrelaes,nasquaiso documento assume um papel central. REFERNCIAS ARQUIVO NACIONAL. Dicionrio brasileiro de terminologia arquivstica. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2005. BACKER, L. R. The ontology of artifacts. Philosophical Explorations, v.7, p.99-112, 2004. Disponvel em: . Acesso em: 14 abr. 2011. 225 Revista EDICIC, v.1, n.1, p.206-227, Ene./Mar. 2011. Disponible en: . BELKIN, N. J.; ROBERTSON, S. E. Information Science and the phenomenon of information. Journal of the American Society for Information Science, Jul./Aug. 1976. BRIER, S. Cybersemiotics and the problems of the information processing paradigm as a candidate for an unified science of information behind library information science. Library Trends, v.52, n.3, 2004. p.629-658. Disponvel em: . Acesso em: 1 ago. 2004. BRIET, S. What is documentation? S.l.p.: Scarecrow Press, 2006. 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