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    PEDRO RAFAEL LIPAROTTI CHAVES

    DIREITOS DE PROPRIEDADE E DESMATAMENTO NA VELHA E NA NOVA

    FRONTEIRA AGRCOLA: O CASO DOS ESTADOS DO PARAN E DO PAR

    Dissertao apresentada como requisitoparcial para concluso do Curso de Mestradoem Desenvolvimento Econmico, doDepartamento de Cincias Econmicas, Setorde Cincias Sociais Aplicadas, da UniversidadeFederal do Paran.

    CURITIBA

    2008

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    PEDRO RAFAEL LIPAROTTI CHAVES

    DIREITOS DE PROPRIEDADE E DESMATAMENTO NA VELHA E NA NOVA

    FRONTEIRA AGRCOLA: O CASO DOS ESTADOS DO PARAN E DO PAR

    Dissertao apresentada como requisitoparcial para concluso do Curso deMestrado em Desenvolvimento Econmico,do Departamento de Cincias Econmicas,Setor de Cincias Sociais Aplicadas, daUniversidade Federal do Paran.

    ORIENTADOR: PROF. DR. MAURCIO AGUIAR SERRA

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    SUMRIO

    LISTA DE TABELAS ............................................................................................................................... V

    LISTA DE GRFICOS ............................................................................................................................ VI

    LISTA DE FIGURAS ............................................................................................................................. VII

    RESUMO............................................................................................................................................... VIII

    INTRODUO........................................................................................................................................... 9

    CAPTULO 1 - DIREITOS DE PROPRIEDADE: UMA REVISO DA LITERATURA ....................... 12

    1.1.ESCOLAINSTITUCIONALISTA E NOVOINSTITUCIONALISTA ............................... 12

    1.2DIREITODEPROPRIEDADE ........................................................................................ 16

    1.3DIREITODEPROPRIEDADEEMEIOAMBIENTE ...................................................... 20

    1.4DIREITODEPROPRIEDADEEDESMATAMENTO .................................................... 26

    1.4.1 Direito de propriedade e desmatamento no Brasil................................................ 32

    1.5CONSIDERAESFINAIS ............................................................................................ 37

    CAPTULO 2 - DIREITOS DE PROPRIEDADE E DESMATAMENTO NA VELHA FRONTEIRA: O

    CASO DO SUDOESTE DO PARAN ................................................................................................... 39

    2.1.ASPECTOSGEOGRFICOSEECONMICOSDOSUDOESTEPARANAENSE .. 39

    2.2.FORMAOHISTRICAEDIREITOSDEPROPRIEDADENOSUDOESTE

    PARANAENSE .................................................................................................................................... 42

    2.3DESMATAMENTONOSUDOESTEPARANAENSE ................................................... 52

    2.4POLTICASPBLICASELEGISLAOAMBIENTAL ................................................ 54

    2.5.CONSIDERAESFINAIS ........................................................................................... 58

    CAPTULO 3 - DIREITOS DE PROPRIEDADE E DESMATAMENTO NA NOVA FRONTEIRA: O

    CASO DA TERRA DO MEIO NO PAR ............................................................................................... 60

    3.1.DELIMITAODAREGIO .......................................................................................... 60

    3.2.POLTICASPBLICASEDESENVOLVIMENTONAAMAZNIA ............................. 64

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    3.2.1 Amaznia.................................................................................................................. 64

    3.2.2 Terra do Meio........................................................................................................... 73

    3.2.3 Questes Fundirias na Terra do Meio.................................................................. 76

    3.3.DESMATAMENTO ......................................................................................................... 83

    3.3.1 Razes do Desmatamento na Amaznia.............................................................. 83

    3.3.2 Dinmica do Desmatamento................................................................................... 87

    3.3.3 Desmatamento na Terra do Meio........................................................................... 88

    3.4.LEGISLAOEPOLTICAPBLICASAMBIENTAIS ................................................ 89

    3.5CONSIDERAESFINAIS ............................................................................................ 98

    CAPTULO 4 - AS DUAS FRONTEIRAS AGRCOLAS EM QUESTO: UMA ANLISE

    COMPARATIVA ENTRE O SUDOESTE DO PARAN E A TERRA DO MEIO NO PAR ........... 100

    4.1.

    DESMATAMENTO

    NAS

    FRONTEIRAS..................................................................... 101

    4.1.1 Caractersticas do Processo de Desmatamento nas Fronteiras........................ 111

    4.2DIREITOSDEPROPRIEDADENASFRONTEIRAS .................................................. 117

    4.3DIREITOSDEPROPRIEDADEEDESMATAMENTONASFRONTEIRAS.............. 125

    4.4CONSIDERAESFINAIS .......................................................................................... 129

    CONCLUSO ........................................................................................................................................ 131

    REFERNCIAS ..................................................................................................................................... 135

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    LISTADETABELAS

    Tabela 4.1 Dados correlacionados ao Desmatamento no Sudoeste Paranaense

    nos anos de 1920 a 1970

    P.102

    Tabela 4.2 Desmatamento e Populao em So Flix do Xingu de 2000 a 2007 P.107

    Tabela 4.3 Dados correlacionados ao Desmatamento em So Flix do Xingu

    nos anos de 1975 a 2006

    P.108

    Tabela 4.4 Dados correlacionados ao estabelecimento dos direitos de

    propriedade no Sudoeste Paranaense nos anos de 1920 a 1970

    P.117

    Tabela 4.5 Dados correlacionados ao estabelecimento dos direitos de

    propriedade em So Flix do Xingu nos anos de 1975 a 2006

    P.118

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    LISTADEGRFICOS

    Grfico 4.1 Correlao entre as taxas de crescimento da populao e

    crescimento das reas plantadas e de pasto artificial nos anos de 1940 a 1970 nosudoeste paranaense

    P.104

    Grfico 4.2 - Taxa de Desmatamento Anual na Amaznia Legal de

    1988 a 2007

    P.106

    Grfico 4.3 Correlao entre a taxa de crescimento da populao

    e a taxa anual de desmatamento de 2001 a 2007 em So Flix do Xingu.

    P.108

    Grfico 4.4 Correlao entre a taxa de crescimento da populaoe a taxa de crescimento da rea plantada e de pastos artificiais de 1980 a 2006

    em So Flix do Xingu.

    P.109

    Grfico 4.5 Correlao entre reas plantadas e de pasto artificial e rea dos

    estabelecimentos com direitos de propriedade reconhecidos no sudoeste

    paranaense nos anos de 1920 a 1960.

    P.124

    Grfico 4.6 Correlao entre as taxas de crescimento das reas plantadas e de

    pasto artificial e das reas dos estabelecimentos com direitos de propriedadereconhecidos no sudoeste paranaense nos anos de 1950 a 1970.

    P.125

    Grfico 4.7 Correlao entre reas plantadas e de pasto artificial e rea dos

    estabelecimentos com direitos de propriedade reconhecidos em So Flix do

    Xingu nos anos de 1975 a 1996

    P.126

    Grfico 4.8 Correlao entre as taxas de crescimento das reas plantadas e de

    pasto artificial e das reas dos estabelecimentos com direitos de propriedade

    reconhecidos em So Flix do Xingu nos anos de 1975 a 1996

    P.127

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    LISTADEFIGURAS

    Figura 2.1 Sudoeste e Paran P.39

    Figura 2.2 Municpios que atualmente formam o Sudoeste Paranaense P.40

    Figura 3.1 Terra do Meio, Par e Brasil P.61

    Figura 3.2 Rios, estradas e cidades na Regio da Terra do Meio P.62

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    RESUMO

    DIREITOS DE PROPRIEDADE E DESMATAMENTO NA VELHA E NA NOVA

    FRONTEIRA AGRCOLA: O CASO DOS ESTADOS DO PARAN E DO PAR

    A dissertao apresenta uma discusso sobre a relao entre o maufuncionamento das instituies e a degradao ambiental em regies de fronteira,mais especificamente a definio dos direitos de propriedade e o desmatamento.Utilizou-se para tanto as fronteiras agrcolas do sudoeste paranaense em meadosdo sculo XX e a Terra do Meio no Par do final do sc. XX. Primeiramente foirealizado um resgate na literatura econmica sobre o tema. A Escola dos Direitosde Propriedade est inserida na Economia Novo Institucionalista e tem comofundamento central a idia que um ambiente onde os direitos de propriedade

    estejam mal definidos proporciona forte incentivo explorao excessiva dorecurso. A anlise histrica e institucional das regies de fronteira nos permiteverificar que, de fato, direitos de propriedade mal estabelecidos funcionam comoincentivo ao desmatamento. Alguns resultados foram obtidos atravs de grficos eapontam na mesma direo, embora poucos sejam os dados disponveis.

    Palavras chaves: direitos de propriedade; desmatamento; Sudoeste Paranaense;Amaznia; Terra do Meio.

    ABSTRACTThe dissertation presents a discussion on the relationship between the institutionsbad functionality and environmental degradation in regional borders, morespecifically the property rights definition and the deforestation. For that, were usedthe both issues: agricultural frontiers in southwest of Paran in the middle of thetwentieth century and Terra do Meio in Par in the end of the twentieth century.First of all, we had performed a research in the economic literature about the mainissue. The Property Rights School is inserted on the New Institutional Economicsand the main idea is that an environment which has the owners rights poorlydefined provides a strong incentive for resources overexploitation. The both

    historical and institutional analysis of the regional border allows us to see that, infact, property rights, poorly established act as incentive to deforestation. Someresults were obtained using graphics and point in the same direction, although thefew data available.

    Key Words: property rights; deforestation; southwest of Paran; Amazon; Terra doMeio

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    INTRODUO

    Nas ltimas dcadas os problemas ambientais tm se mostrado cada vezmais evidentes e, conseqentemente, tornaram-se preocupao de muitos. Com a

    degradao acelerada resultante da Revoluo Industrial, a sociedade comeou a

    observar os limites do meio ambiente. Percebeu-se que o meio ambiente no

    suportaria por muito mais tempo todo o desgaste a que estava sendo submetido, e

    disso dependeria a qualidade de vida das pessoas e o futuro das espcies.

    A Natureza possui sistema ecolgico j estabelecido que se demonstra

    incompatvel com o sistema econmico criado pelo homem. H a necessidade de

    que os homens se adaptem aos limites naturais. nesse nterim, que as Cincias

    Econmicas passam a se preocupar com as questes ambientais. A Economia

    trata de recursos, sendo que a natureza a principal fonte de recursos para os

    homens.

    A avaliao do meio ambiente sob o enfoque da Economia objetiva diminuir

    a degradao ambiental atravs de valorao ambiental, utilizando normalmente o

    instrumental neoclssico. Tais condutas so importantes, pois dimensionam os

    impactos ambientais internalizando-os economia e evidenciando custos e

    benefcios da expanso da atividade humana.

    Valorar os impactos ambientais tem como objetivo garantir recursos

    naturais para as geraes futuras, o chamado desenvolvimento sustentvel.

    Assim, para que haja desenvolvimento sustentvel preciso que, do ponto de

    vista econmico, o crescimento seja definido de acordo com a capacidade de

    suporte dos ecossistemas.

    Surge, na Teoria Novo Institucionalista, um novo enfoque acerca dequestes ambientais que utiliza, em grande medida, a Teoria Neoclssica. A

    inovao dos novos institucionalistas a idia de que os direitos de propriedade

    so cruciais para a criao de incentivos conservao de recursos naturais.

    Alguns tericos da Escola Novo Institucionalista levam essa idia ao extremo e

    passam a prescrever uma estrutura rgida de direitos de propriedade como forma

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    de resolver todos os problemas ambientais, desconsiderando outros fatores

    causadores de degradao. Outros autores creditam poder limitado aos direitos de

    propriedade.

    O papel das instituies de governo no processo de expanso da fronteira

    agrcola sobre reas florestais fundamental. reas de fronteira agrcola e

    econmica, como ocorreu no sudoeste do Paran e ocorre na Terra do Meio no

    Par, sofrem com uma fraca estrutura de direitos de propriedade e pouca

    presena estatal. provvel, e esta a suposio, que tanto o desmatamento

    quanto a violncia sofrem influncia de uma estrutura falha de direitos de

    propriedade.

    Essa nova abordagem acerca dos problemas ambientais proporcionada

    pela Escola Novo Institucional leva a realizao do presente trabalho, onde sepretende verificar a relao entre direitos de propriedade e o desmatamento em

    regies de fronteira, especificamente a velha fronteira representada pelo Paran

    de meados do sc. XX e a nova fronteira, o Par do final do sc. XX.

    O trabalho ser realizado utilizando-se a abordagem Novo Institucionalista,

    no obstante, deve-se reconhecer que existe literatura que contesta tal referencial

    terico. Porm, essa questo no ser tratada nessa dissertao, podendo ser

    fruto de estudos posteriores.

    A presente dissertao est dividida em quatro partes. No primeiro captulo,

    ser apresentada uma reviso da literatura existente acerca das questes

    ambientais e direitos de propriedade, partindo da Escola Velho Institucionalista e

    chegando ao Novo Institucionalismo. No mbito da Nova Economia Institucional,

    ser apresentada a Escola dos Direitos de Propriedade. Em seguida, as

    aplicaes prticas dessa definio, iniciando com trabalhos que utilizam os

    direitos de propriedade em situaes diversas, para, ao final, apresentar os

    trabalhos que envolvem questes ambientais e desmatamentos em florestas

    tropicais e no Brasil.

    Na segunda seo, ser apresentada a situao da velha fronteira, ou

    seja, o sudoeste paranaense nas dcadas de 1940 e 1950. A anlise institucional

    abranger a formao histrica, a legislao regional e brasileira, o desmatamento

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    e as polticas pblicas para a regio. No terceiro captulo, a mesma anlise ser

    desenvolvida, agora, levando-se em conta a nova fronteira, a Terra do Meio no

    Par.

    No ltimo captulo, ser realizada uma anlise comparativa entre a velha

    fronteira representada pelo sudoeste do Paran de meados do sc. XX e a nova

    fronteira, a Terra do Meio no Par atual, verificando a relao entre os direitos de

    propriedade e o desmatamento em reas de fronteira. Pretende-se apontar as

    diferenas e similaridades entre a nova e a velha fronteira agrcola. Os agentes

    envolvidos e suas formas de ao, bem como a atuao do Estado e a

    colonizao sero analisados no captulo quarto, em virtude de seus importantes

    papis nesse contexto.

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    CAPTULO1-DIREITOSDEPROPRIEDADE:UMAREVISODALITERATURA

    No trato de questes relacionadas ao meio ambiente, duas diferentes

    perspectivas passam a tratar do tema, a Economia Ambiental Neoclssica e a

    Economia Ecolgica. A abordagem ambiental e a abordagem ecolgica da

    economia no tm obtido sucesso em explicar e resolver alguns dos problemas

    advindos da crise ambiental. Uma terceira abordagem, que a derivada da Escola

    Institucionalista, surge para tentar explicar as questes relativas a degradao

    ambiental, atravs da Economia dos Direitos de Propriedade, tema tratado nesse

    captulo.Segundo a Escola dos Direitos de Propriedade, a m definio destes tem

    forte correlao com o desflorestamento. Um ambiente onde os direitos de

    propriedade estejam mal definidos proporciona forte incentivo depredao

    irresponsvel do meio ambiente.

    Nesse captulo ser apresentada uma reviso da literatura acerca dos

    direitos de propriedade e das questes ambientais, partindo desde a origem da

    Escola Institucionalista at trabalhos aplicados aos casos brasileiros de

    desmatamento.

    1.1. ESCOLA INSTITUCIONALISTA e NOVO INSTITUCIONALISTA

    A Escola Institucionalista da Economia teve sua origem nos Estados Unidos

    no sculo XIX. Os principais autores desta Escola so: Thorstein Veblen, John

    Commons, Wesley Mitchel, Ayres e Galbraith. Essa Escola percebe que as

    instituies tm forte importncia na anlise econmica. As instituies modelam o

    processo poltico e influenciam o andamento da economia, razo pela qual elas

    devem ser incorporadas anlise. Eles defendem o princpio de que a anlise

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    As limitaes ao comportamento humano e s organizaes podem ser

    oriundas de regras formais e informais. Instituies informais so aquelas

    passadas hereditariamente como parte da cultura enraizada de uma coletividade,

    como as convenes.

    J as instituies formais so, por exemplo, as regras judiciais, econmicas

    e sociais, tais como o direito de propriedade da terra e as leis de proteo ao Meio

    Ambiente, que sero objeto de estudo do presente trabalho.

    Quando os custos de transao so baixos ou inexistentes, os agentes so

    capazes de obter a melhor forma de coordenao e cooperao, alcanando a

    soluo competitiva eficiente da teoria neoclssica. No entanto, como cita Coase

    (1937), quando existem custos de transao considerveis, as instituies

    emergem e passam a importar. E, ainda segundo Coase (1937), no mundo real oscustos de transao importam.

    As instituies so criadas freqentemente para servir aos interesses

    daqueles que tm maior poder de barganha, visto que no buscam

    necessariamente a eficincia social. No caso de baixo custo de transao, o poder

    de barganha no afeta os resultados. O contrrio ocorre quando os custos de

    transao no podem ser desprezados, e as instituies passam a influenciar as

    mudanas de longo prazo.

    Com Ronald Coase e seu artigo The Nature of the Firm de 1937, inicia-se

    a Nova Economia Institucional, nome dado por Oliver Williamson em 1975. Os

    principais autores dessa Escola so: Douglas North, Richard Posner, Ronald

    Coase, Oliver Williamson, James Buchanan, Gordon Tulloc e Harold Demsetz. A

    Escola Novo Institucionalista incorpora anlise econmica as instituies sob um

    enfoque interdisciplinar, utilizando o Direito, a Economia e a Teoria das

    Organizaes, na mesma linha que a Velha Economia Institucional.

    A Escola Novo Institucionalista, em geral, mais voltada para o mercado e

    menos propensa a aceitar intervenes do Estado no andamento Economia.

    A diferena entre as duas escolas, segundo Coase (1960), que, embora

    os velhos institucionalistas tenham importncia, eles no possuam base terica e,

    por isso, no legaram muitas contribuies.

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    fundamental da escassez e, conseqentemente, da concorrncia, que princpio

    da teoria da escolha subjacente microeconomia.

    Para Hodgson (1998), o novo institucionalismo pressupe serem exgenos

    os gostos e tecnologias, ao contrrio do velho que toma esses parmetros como

    endgenos. O novo institucionalismo, de razes neoclssicas, insiste no equilbrio

    e nas concepes mecanicistas de processo, em contraste com o evolucionismo

    inspirado na biologia do velho institucionalismo.

    O mesmo enfoque neoclssico utilizado pelos novos institucionalistas com

    relao anlise dos problemas ambientais. A inovao dos novos

    institucionalistas a idia de que os direitos de propriedade so cruciais para a

    criao de incentivos conservao de recursos naturais.

    Muitos representantes da Escola Novo Institucionalista levam essa idia aoextremo e passam a prescrever uma estrutura rgida de direitos de propriedade

    como forma de resolver todos os problemas ambientais, desconsiderando outros

    fatores causadores de degradao. Outros autores creditam poder limitado aos

    direitos de propriedade.

    1.2 DIREITO DE PROPRIEDADE

    Bromley (2003) definiu direitos como sendo the capacity to call upon the

    collective to stand behind ones claim to a benefit stream (p. 15). Segundo essa

    definio, direito no a relao entre uma pessoa e um objeto, mas sim a

    relao entre vrias pessoas com respeito a um objeto. Pode-se exercer o direito

    contra algumas pessoas, como por exemplo, um contrato, ou contra todas as

    pessoas, por exemplo, o direito de propriedade. o Estado que garante o respeitoaos direitos.

    Propriedade, segundo o mesmo autor, is the benefit stream. Assim direito

    de propriedade seria a triadic social relation involving the relationship between the

    individual Who possesses the right, others that have to refrain from interfering with

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    the right holders exercise of those rights, and an institution to backup the claim

    (BROMLEY, 2003, p. 15).

    Para Randall (1981) outra importante caracterstica dos direitos de

    propriedade so as penalidades impostas ao desrespeito desses direitos,

    normalmente pelo Estado.

    Do ponto de vista econmico, direito de propriedade a capacidade que um

    indivduo possui de consumir determinado recurso de forma direta ou de forma

    residual por meio de sua troca. A forma residual, ou seja, a possibilidade de

    transferncia do direito de propriedade garante que o mesmo possa ser utilizado

    de forma eficiente, visto que ser utilizado por quem mais o valoriza. Portanto,

    para que o estabelecimento de direitos de propriedade privados seja suficiente

    para garantir a utilizao eficiente dos recursos necessrio que os direitos depropriedade possam ser comercializados. Na impossibilidade de transacionar os

    direitos de propriedade, os recursos seriam utilizados em nvel no eficiente. Da

    mesma forma, quando o direito de propriedade concede ao seu detentor a

    possibilidade de consumir o bem, simultaneamente incentiva a manuteno

    apropriada do mesmo. o caso do detentor de direito de propriedade sobre uma

    rea florestada, questo a ser analisada nesse trabalho. Assim, se os direitos de

    propriedade no so garantidos, ento os seus proprietrios no se sentiro

    incentivados a realizar investimentos.

    No enfoque jurdico, os direitos de propriedade so os direitos reconhecidos

    e garantidos pelo Estado. Para o detentor do direito de propriedade o Estado

    garante 3 prerrogativas:

    o direito de usar um ativo;

    o direito de se apropriar dos retornos de um ativo e,

    o direito de mudar sua forma.

    Para Wong (2004) Jeremy Bentham foi o primeiro a reconhecer a

    importncia do Governo para definio de direitos de propriedade atravs de leis.

    Direitos de propriedade determinam quem tem acesso a bens e servios, quem se

    beneficia dos seus frutos e quem deve pagar para utiliz-los (DEMSETZ, 1967). A

    forma como as pessoas disputam os recursos ou se unem em cooperao e

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    comrcio depende de como os direitos de propriedade esto definidos.

    (DEMSETZ, 1967).

    Para Coase (1960) a eficincia econmica est relacionada com a correta

    definio e a garantia dos direitos de propriedade. Na hiptese de os custos de

    transao serem nulos, a alocao dos recursos eficiente, independente da

    forma de direitos de propriedade adotada. Na inexistncia de custos de transao,

    os agentes, com o passar do tempo, realocaro os direitos de forma eficiente. No

    obstante, no mundo real, os custos de transao so significativos e os direitos de

    propriedade no so definidos de forma perfeita e nem completamente seguros,

    havendo custos para a sua aquisio e proteo. Para Williamson (1987), os

    custos de transao so os custos relacionados especificao, monitoramento,

    proteo e comercializao dos direitos de propriedade.Os custos de transao fazem com que seja mais custoso para as pessoas

    cooperarem, pois recebero menos nas transaes e mais conflitos ocorrero. Da

    a importncia de diretos de propriedade bem definidos, diminuir os conflitos e

    aumentar as vantagens dos bens e servios.

    The fundamental purpose of property rights, and their fundamental accomplishment, is thatthey eliminate destructive competition for control of economic resources. Well-defined andwell-protected property rights replace competition by violence with competition by peaceful

    means. (ALCHIAN, 2007, p. 2)Quando surgem externalidades, positivas ou negativas, surge a

    necessidade de definio de direitos de propriedade. Externalidade o efeito de

    determinada ao sobre terceiros que no tem responsabilidade alguma pela

    ao. Uma externalidade negativa surge quando um agente, no exerccio de seu

    direito do uso da propriedade, impe custos a outros agentes. Externalidade

    positiva representa os benefcios auferidos por um agente em razo da presena

    de recursos ou facilidades disponveis pela ao do Estado ou de outro agente

    econmico.

    A correta definio dos direitos de propriedade privados permite que o

    agente internalize as externalidades decorrentes da ao, sempre que os ganhos

    da internalizao forem maiores do que o seu custo.

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    Num sistema de propriedade privada, os valores de mercado da

    propriedade refletem as preferncias e demandas do restante da sociedade.

    No matter who the owner is, the use of the resource is influenced by what the rest of thepublic thinks is the most valuable use. The reason is that an owner who chooses some

    other use must forsake that highest-valued use - and the price that others would pay him forthe resource or for the use of it. This creates an interesting paradox: although property iscalled private, private decisions are based on public, or social, evaluation. (ALCHIAN,2007, p. 2).

    Uma parbola escrita por Garrett Hardin chamada a Tragdia dos Comuns

    explica por que o livre acesso aos recursos gera externalidades negativas e

    produz o gerenciamento ineficiente e a conseqente exausto dos mesmos. A

    questo principal nessa parbola que com o livre acesso aos recursos, os

    indivduos no tm incentivos a agir de forma socialmente eficiente.

    A histria ambientada numa cidade medieval cuja atividade econmica

    mais importante a criao de ovelhas. As ovelhas de todas as famlias pastam

    gratuitamente em terras de propriedade coletiva, visto que as mesmas so

    abundantes. Com o passar do tempo, cada famlia, agindo individualmente, tem

    um incentivo para criar ainda mais ovelhas. Assim cresce o nmero de ovelhas,

    mas no cresce o tamanho do pasto. Cada um dos agentes ir extrair os

    benefcios do pasto at o ponto em que seu benefcio marginal iguale seu custo

    marginal. Uma vez que cada usurio no tem preocupao com os custos de suaextrao impostos a outros usurios, o total extrado ser maior que a extrao em

    nvel timo. In essence each party is imposing an externality on the other party,

    which leads to a sub-optimal outcome (MUELLER e MUELLER, 2002, p. 4). Com

    isso, o pasto perde a capacidade de se recuperar, impossibilitando a criao de

    ovelhas na cidade.

    Outro ponto importante se refere escassez do recurso. Somente haver

    demanda pelos direitos de propriedade de determinado recurso se houverescassez do mesmo. Quando h escassez, ocorre competio entre os agentes

    econmicos para a apropriao dos diversos retornos do recurso, de forma que a

    ausncia de direitos de propriedade seguros leva dissipao das rendas. Os

    direitos de propriedade surgem visando eliminar essa dissipao de rendas.

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    A tragdia dos comuns ocorre devido a diferenas entre os incentivos

    individuais e os sociais. A lio, segundo Garret Hardin, que se os direitos de

    propriedade fossem corretamente estabelecidos, o pasto da cidade no teria

    acabado. Em suma, quando h abundncia de determinado recurso, no h

    competio. Quando h presso sob o recurso, causando escassez, aumenta a

    incidncia de externalidades entre os agentes.

    Para resolver o problema, passa-se a restringir o acesso de agentes

    externos ao recurso. However, under a growing population, this strategy is rarely

    sufficient and, to prevent efficiency losses and resource depletion, two institutional

    evolutions are available (BALAND e PLATTEAU, 1998, p. 2). A primeira

    regulando o uso comum do recurso por todos os agentes. A segunda criando

    direitos de uso individualizados. So os direitos de propriedade coletivos ouindividuais.

    Os direitos de propriedade bem estabelecidos e garantidos permitem que a

    utilizao dos recursos ocorra de forma eficiente, por essa razo, a Economia dos

    Direitos de Propriedade tem sido largamente utilizada em questes concernentes

    a degradao ambiental.

    1.3 DIREITO DE PROPRIEDADE E MEIO AMBIENTE

    O papel dos direitos de propriedade tem sido enfatizado na teoria

    econmica pelos tericos da nova economia institucional, como sendo crucial para

    a criao de incentivos conservao de recursos naturais. Para essa teoria, o

    livre acesso a recursos naturais gera externalidades negativas sociedade, alm

    de produzir o gerenciamento ineficiente de recursos naturais com a provvel

    exausto dos mesmos. O problema principal que o livre acesso no produz uma

    estrutura de incentivos apropriada para que os indivduos ajam de uma maneira

    socialmente eficiente.

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    Na ausncia de direitos de propriedade corretamente estabelecidos os

    incentivos financeiros favorecem a explorao de curto prazo, uma vez que no

    existe certeza quanto apropriao de retornos de longo prazo. Para Coase

    (1960), a proteo legal dos direitos de propriedade cria, atravs da exclusividade

    de uso por alguns membros da sociedade, os incentivos individuais para o uso

    eficiente e proteo.

    O estabelecimento de direitos de propriedade seria suficiente para

    internalizar as externalidades e garantir o uso eficiente dos recursos, desde que

    algumas circunstncias estejam presentes. Tais circunstncias incluem a ausncia

    de custos na garantia dos contratos, que os direitos de propriedade estejam bem

    definidos e os que os mercados sejam competitivos e completos. No entanto,

    quando algumas dessas condies descritas no estiverem presentes, no possvel garantir que direitos privados sejam superiores a arranjos coletivos ou

    comunais.

    O raciocnio central da Economia do Direito de Propriedade que quando

    os usurios so mais que simples usurios, mas tambm donos dos recursos,

    eles tero mais incentivos para gerenciar eficientemente os recursos naturais. E

    eles somente so donos dos recursos em virtude de um sistema que aloque

    direitos de propriedade.

    Os direitos de propriedade que visam o gerenciamento dos recursos

    naturais podem tomar diferentes formas. Esses regimes de propriedade variam em

    relao ao tipo de propriedade, acesso aos recursos e mecanismos de revogao

    do direito.

    Segundo Berkes (1996), os sistemas sociais e os sistemas naturais

    interagem de diferentes maneiras dependendo do regime de propriedade que

    vigora. A maioria dos autores divide em quatro os principais tipos de regime de

    propriedade. (Hanna, Folke e Maler, 1996; Browley, 2003; Berkes, 1996; Feeny,

    Berkes, McCay e Acheson, 1990). Abaixo, uma breve descrio dos principais

    regimes de propriedade:

    1. Livre Acesso

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    Nesse caso, o acesso aos recursos aberto a todos que se

    interessarem e qualquer pessoa pode explorar os recursos sem que haja

    limite para tanto. Nesse regime, uma vez que no h excluses, as

    possibilidades de degradao so maiores. Esse regime somente

    eficiente quando no h escassez do recurso ou quando a demanda pelo

    mesmo muito reduzida, de forma que no h presso da economia e da

    populao sobre o recurso.

    Esse o caso da Tragdia dos Comuns de Garrett Hardin, que

    explica por que o livre acesso aos recursos naturais gera externalidades

    negativas e produz o gerenciamento ineficiente e a conseqente exausto

    dos mesmos. Isso ocorre porque com o livre acesso aos recursos, os

    indivduos no tm incentivos a agir de forma socialmente eficiente. Assim,cada um age de forma a maximizar individualmente seu lucro em

    detrimento do timo sociamente estabelecido.

    2. Propriedade do Estado

    Nesse regime, o recurso natural esta sob a responsabilidade total

    do Estado, de forma que o mesmo controla o acesso e regula o uso do

    recurso. O Estado pode excluir qualquer um do uso do direito, contanto que

    siga padres polticos aceitos para determinar quem pode e quem no pode

    usar a propriedade do Estado.

    Essa forma de proteo de recursos naturais se d de duas

    maneiras. A primeira nacionalizando grande quantidade de recursos

    naturais para a criao de parques ou reservas nacionais. A outra

    possibilidade criando leis que objetivam proteger os recursos naturais.

    Frequentemente o Estado gerencia seus recursos naturais atravs de

    organizaes especializadas (WONG, 2004).

    O grande risco dessa forma de regime que na prtica os recursos

    sob a propriedade do Estado frequentemente se transformam em recursos

    de livre acesso. Isso ocorre devido ao fraco poder de gerenciamento e

    fiscalizao do Estado, que normalmente tende a priorizar objetivos

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    econmicos a preservao da natureza. Nevertheless, it has to be

    mentioned that many state property regimes have transformed themselves

    into open access regimes due to the lack of effective management and

    enforcement (WONG, 2004, p. 9). Esse exatamente o caso brasileiro,

    onde faltam recursos financeiros e informaes para gerenciar os recursos

    naturais de propriedade do Estado, como veremos adiante no presente

    trabalho.

    3. Propriedade privada

    Nesse caso, a comunidade reconhece ao proprietrio do direito o

    poder de excluir outros da utilizao dos recursos. Uma pessoa fsica ou

    jurdica regula o uso dos recursos naturais. Bromley (2003) explica queprivate property regimes appear to be stable and adaptive because they

    have the social and legal sanction to exclude excess population, and

    effectively to resist through the power of the state unwanted intrusions

    (p. 13).

    Do ponto de vista individual, esse sistema eficiente, visto que

    cada um maximiza sua utilidade (ACHESON, 2000). No entanto, no

    necessariamente haver o mesmo resultado eficiente do ponto de vista da

    sustentabilidade. Essa questo da sustentabilidade depende das

    caractersticas do mercado e do recurso em si. Pode ocorrer de o valor do

    recurso crescer menos rapidamente que os custos de extra-lo, fazendo

    com que o proprietrio tenha incentivo para extra-lo todo de uma s vez.

    Incertezas com relao ao valor do recurso no futuro podem levar tambm

    a uma super utilizao do recurso. Outra questo importante que pode levar

    a explorao despreocupada com a sustentabilidade do recurso a longo

    prazo so as condies econmicas do detentor do direito de propriedade,

    que muitas vezes o fora a sobre explorar determinado recurso.

    4. Propriedade Comum

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    Trata-se de um regime onde o direito pode ser exercido por todos

    os membros de uma comunidade. O grupo proprietrio do direito pode

    excluir outros e regular o uso do recurso. O Estado e os cidados no

    podem interferir no exerccio individual de cada um no uso, no usufruto ou

    no abuso de determinado bem ou direito. A propriedade comum a mais

    antiga forma de regulao que existe.

    Normalmente, a comunidade responsvel pela propriedade comum

    tem conhecimento de longos anos no gerenciamento sustentvel do

    referido recurso natural, e o fazem, muitas vezes, melhor que o Estado.

    Sabendo que os direitos de propriedade podem beneficiar a preservao do

    meio ambiente, governos em diferentes partes do mundo tomam o controle

    de recursos naturais que anteriormente eram administrados por usurioslocais em regime de propriedade comum. Entretanto, conforme explica

    Meinzen-Dick e Knox (2001) e Udaya (2000), os governos esquecem que,

    os usurios locais que utilizaram os recursos por longos perodos de tempo,

    e os conhecem bem, podem ser os melhores gerenciadores dos recursos.

    s vezes, no obstante, pode ocorrer de o sistema de propriedade

    comum de usurios locais entrar em colapso. De acordo com Acheson

    (2000), isso pode ocorrer quando groups are large, when people have not

    built up social capital and know who to trust, where boundaries cannot be

    enforced, and where people do not have to live with the consequences of

    their actions (p. 19).

    O risco desse sistema que quando muitos tm o direito de usar

    um recurso comum, existe incentivo para que ele seja super utilizado e,

    conseqentemente, quando muitos dividem a obrigao de suprir um bem,

    ele tende a ser sub oferecido. Quando o retorno residual muito dividido,

    ningum tem o interesse de investir para aumentar o valor. Fuchs (2003)

    explica que para solucionar estes problemas necessrio que o Estado (ou

    um rgo superior qualquer) assegure que as expectativas para controlar o

    uso do recurso sejam conhecidas. Sem o controle do Estado, h grandes

    chances de o regime de propriedade comum se degenerar em um regime

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    de acesso livre. Assim, ainda segundo Fuchs (2003), o status legal de

    propriedade extremamente importante para o meio ambiente.

    So raros os casos de recursos que tenham regimes puros de direitos de

    propriedade de recursos naturais. Na maior parte das vezes h uma mistura de

    caractersticas de vrios tipos.

    First it is important to determine the characteristics of the resources and the problems theyface; then it may be important to match them with the institutions capable of solving thoseproblems. Finally, this endeavor might need to combine various elements of the differentregimes. (WONG, 2004, p. 13).

    Ainda em Wong (2004), in general, policies to establish property rights

    regimes should consider the ecological, cultural, geographical, and economic

    context in which property rights are to function. (p. 5).

    A maioria dos estudos indica como melhor forma de conservao do meio

    ambiente a propriedade privada e a estatal (WADE, 2003; NICITA, 2002).

    Inmeros trabalhos tm aplicado a teoria dos direitos de propriedade a casos de

    recursos naturais especficos visando benefcios ao meio ambiente. Trabalhos,

    tais como Alesi (1998), Wilen e Homans (2000) e Repeto (2001), sugerem que o

    Governo elabore regulamentos visando a conservao de recursos de propriedade

    comum, caso das comunidades dependentes da pesca.Norton-Griffiths (1995) chegou a concluso que em pases pouco

    desenvolvidos a diviso das florestas em propriedades privadas no suficiente

    para garantir a conservao da vida selvagem. necessrio tambm que o

    Governo atue criando zoneamentos e restries ao desenvolvimento evitando

    especialmente a transformao de florestas em reas agrcolas.

    Os direitos de irrigao de gua nas Filipinas foram analisados por Wong

    (2004), que salientou que a melhor maneira de gerenciar recursos naturais uma

    combinao entre a propriedade estatal e a propriedade comum na medida em

    que ambas possuem caractersticas nicas que permitem, quando combinadas,

    um gerenciamento de sucesso dos recursos naturais.

    Udaya (2000), na ndia, e Gibson e Becker (2000), no Equador, analisaram

    de maneira mais genrica os benefcios dos direitos de propriedade bem definidos

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    Os termos desflorestamento e desmatamento sero utilizados aqui como

    sinnimos, embora exista diferena entre eles. Em geral desflorestamento

    definido como a derrubada de reas de florestas e desmatamento, num sentido

    mais genrico, refere-se derrubada de reas de floresta e outros tipos de

    vegetao, como os cerrados e os campos naturais.

    O desmatamento pode ocorrer por meios naturais ou como resultado de

    atividade humana, meio este em que o presente trabalho ser focado. Uma

    importante questo que se faz presente verificar quais as razes de promover

    um gerenciamento sustentvel do meio ambiente ao invs de explor-lo

    completamente de uma vez. Quais so os custos de oportunidade envolvidos

    nessa questo.

    A degradao ambiental e o desmatamento provocam custos sociais aos

    agentes locais bem como aos indivduos distantes da regio afetada diretamente.

    As possibilidades de crescimento futuro da regio ficam seriamente

    comprometidas pela degradao ambiental. Alm dos evidentes benefcios sociais

    e econmicos, importantes tambm so as funes ecolgicas da floresta.

    Grande parte do desflorestamento ocorre por presso de atividades

    econmicas como pecuria ou agricultura. Essa converso de florestas em pastos

    ou plantaes muitas vezes irreversvel, pois exaure os nutrientes do solo

    deixando-o em condies muito pobres (MOTTA e FERRAZ, 2000). O processo

    de desmatamento prejudica outras atividades que poderiam ser, no futuro, fruto de

    renda e sustentabilidade da floresta. The possibilities of future income with

    sustainable forestry, use of biodiversity, eco-tourism, carbon sequestration and

    other environmental services decrease considerably with the current deforestation

    rate. (FERRAZ, 2001, p. 14).

    Diversas so as formas de explorao sustentvel da floresta que soprejudicadas pelo desmatamento. Atividades relacionadas s funes de produo

    no vinculadas ao corte da madeira na floresta, como alimentos, adubos e

    remdios. Atividades relacionadas s funes de regulao, como mata ciliar,

    fornecimento de gua, manuteno do solo e equilbrio do clima, atravs da

    remoo do dixido de carbono do ar e outros benefcios.

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    As perdas com o desmatamento so enormes. Segundo o estudo A

    Economia dos Ecossistemas e Biodiversidade - Teeb" (Sukhdev, 2008), divulgado

    em meados de 2008 e realizado pela Unio Europia e o Deutsche Bank, os

    desperdcios anuais com o desmatamento vo de US$ 2 trilhes a US$ 5 trilhes.

    O nmero inclui o valor de vrios servios oferecidos pelas florestas, como gua

    limpa e a absoro do dixido de carbono.

    Uma das mais srias conseqncias do desmatamento a perda da

    biodiversidade. A biodiversidade tem importncia fundamental para a humanidade.

    Segundo o Ministrio do Meio Ambiente (2002a), biodiversidade refere-se

    variedade de vida encontrada em uma regio (ou no mundo), incluindo a

    variedade gentica dentro das populaes e espcies, a variedade de espcies da

    flora, da fauna e de microorganismos, a variedade de funes ecolgicasdesempenhadas pelos organismos nos ecossistemas; e a variedade de

    comunidades, habitats e ecossistemas formados pelos organismos. A

    biodiversidade inclui assim, a totalidade dos recursos vivos, ou biolgicos, e dos

    recursos genticos e seus componentes. A diversidade gentica original serve de

    base, no s para a segurana alimentar, mas para a prpria sobrevivncia da

    humanidade.

    A perda de biodiversidade ocorre em razo de trs principais causas. A

    primeira causa a super explorao que leva extino de espcies individuais.

    A segunda a degradao e a modificao dos habitats naturais em razo do

    desenvolvimento econmico, como a poluio e infra-estrutura de transportes. Por

    fim, a terceira causa a converso por atacado de habitats naturais e virgens em

    estado desenvolvido. Atualmente essa causa considerada a mais devastadora,

    pois transforma reas de florestas virgens em reas para a agricultura ou pecuria

    (NORTON-GRIFFITHS, 1995).

    Existe uma considervel literatura que aponta para o fato de que quando h

    m definio dos direitos de propriedade h um favorecimento ao desmatamento,

    principalmente em reas de fronteira (ALTON, LIBECAP e MUELLER, 1999a e

    1999b; ANGELSEN, 1999a; BARBIER, 1999; DEACON, 1995; REPETTO e

    GILLIS, 1988; MUELLER, 1997).Neste sentido, Ferraz (2001) ressalta que: Weak

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    defined property right structures are known to be one of the main determinants of

    land clearing processes in tropical forests (p.9).

    Mendelsohn (1994) analisou o desflorestamento na Indonsia e

    demonstrou, utilizando um modelo de controle timo do uso da terra em florestas

    tropicais, que direitos de propriedade inseguros conduzem a padres destrutivos

    de uso de terra. Os agentes que no possuem direitos de propriedade sobre terras

    empregam um padro de super explorao dos recursos visando benefcios

    mximos no curto prazo. Somente a imposio rpida de uma estrutura de direitos

    de propriedade permite o gerenciamento sustentvel da floresta.

    O caso indonsio foi igualmente analisado por Atje e Roesad (2004) que

    no s chegaram a mesma concluso de Mendelsohn, como tambm chamaram a

    ateno para a necessidade de se permitir a comercializao de direitos de

    propriedade. Assim, os direitos de propriedade pertenceriam aos agentes que os

    valorizassem mais, aumentando a eficincia no gerenciamento dos recursos

    naturais.

    Barbier e Burgess (1996) e Deininger e Minten (1999) analisaram o caso

    das florestas no Mxico e os efeitos de direitos de propriedade inseguros. Para

    eles, atributos espacialmente especficos, como acesso aos mercados, condies

    climticas e estrutura de direitos de propriedade, representam candidatos usuais

    para explicar variaes nas taxas de desmatamento ao longo das regies. Assim,

    os efeitos econmicos positivos gerados por aglomeraes tambm podem gerar

    resultados negativos em termos de degradao ambiental.

    Chomitz e Gray (1996) aplicaram a teoria dos direitos de propriedade s

    florestas de Belize e Angelsen (1999b) s florestas da Tanznia. Segundo estes

    autores, existe forte correlao entre construo de estradas e desmatamento.

    As causas imediatas do desmatamento esto intimamente ligadas aosincentivos econmicos. Mercados imperfeitos de bens agrcolas, trabalho e terra

    induzem o processo de desmatamento. Alm desses fatores, a especulao

    imobiliria tem tambm papel fundamental.

    Quando os direitos de propriedade no so bem definidos, o horizonte de planejamentodos agentes diminui enormemente, de modo que as perdas com a minerao do capital

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    natural no se incorporam em suas decises (lucros) no curto prazo. Isto quer dizer que huma maior presso por desmatamentos. (MARGULIS, 2001, p. 12)

    Segundo Atje e Roesad (2004), o desmatamento pode se originar de duas

    falhas nos regimes de incentivos econmicos. A primeira delas ocorre quando o

    mercado trata o meio ambiente como um recurso livre. Nesse caso, os recursosda floresta so de livre acesso, sendo que os direitos de propriedade so fracos

    ou inexistentes. Esse o caso da Tragdia dos Comuns, onde no h incentivos

    para o uso eficiente das florestas, visto que haver uma super explorao dos

    recursos. Estes mesmos autores afirmam que pode ocorrer de no haver mercado

    para muitos dos produtos das florestas tropicais.

    Panayotou (1993) ressaltou que mesmo que haja mercado para os

    produtos, ele deve apenas refletir os custos de oportunidade do trabalho e capital

    empregados, sem refletir o valor real dos produtos e da rea florestada. Assim, as

    florestas so subavaliadas, pois os preos de mercado de seus produtos no

    refletem seus benefcios, muitas vezes ainda no conhecidos.

    A segunda falha no regime de incentivos econmicos que as intervenes

    do governo no mercado frequentemente alimentam o problema. De acordo com

    Atje e Roesad (2004), as intervenes governamentais aumentam os problemas

    de duas formas. Por um lado as instituies governamentais so ineficientes e

    incapazes de monitorar e impor regulamentos, incentivando o desmatamento. Por

    outro lado, a inteno do governo no era incentivar o desmatamento, como no

    caso dos subsdios pecuria e agricultura.

    Para Gray (2000) a madeira de florestas tropicais de fronteira ilegalmente

    extrada at o ponto onde a renda marginal desta atividade arriscada for positiva.

    J para Kaimowitz e Angelsen (1998):

    Forests may be cleared beyond the point where the current net benefits are zero (the

    private property solution) for at least three different reasons. (1) Forest is cleared up to thepoint where the net present value of land is zero. Even if the profit is negative the firstyears, technological progress, new roads, etc. will make it profitable in the future. (2) Forestis cleared to capture an expected profit through later sale, a situation that has similarities tophenomena in stock markets (rational bubbles). (3) In situations with few actors competingfor forest land (games), and deforestation by one agent is costly to the other, certain groupsmay have an incentive to squeeze the others by clearing more themselves. (KAIMOWITZe ANGELSEN, 1998, p. 94).

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    Atualmente, o problema do desmatamento mais preocupante em regies

    pouco desenvolvidas, que so justamente onde se encontram as florestas mais

    ricas em biodiversidade. Nesse sentido, Cropper, Griffiths e Mani (1999, p. 2)

    afirmam que tropical deforestation is considered to be one of the major

    environmental disasters of the 20th century.

    Os pases menos desenvolvidos tendem a sofrer mais com os problemas

    relacionados a direito de propriedade inseguro e desflorestamento. Uma das

    razes que muitas vezes a transformao de reas florestadas em plantaes

    uma forma de obter do governo a propriedade da terra. o caso da velha fronteira

    no Paran e na nova fronteira do Par, objetos de estudo desta dissertao.

    Ademais uma rea aberta mais fcil de proteger de invases do que uma rea

    com mata fechada.Deacon (1995) argumenta tambm que instabilidade poltica resulta em

    confisco peridico de terra e florestas, incentivando a super explorao dos

    recursos visando o curto prazo. O proprietrio, mesmo possuindo legtimo direito

    sobre a terra, teme perd-la em virtude de expropriao. Assim, ele busca explor-

    la ao mximo, obtendo o mximo de renda no menor tempo possvel. Ademais,

    como sua propriedade no esta completamente segura, o agente realiza poucos

    investimentos na manuteno da floresta. Bohn e Deacon (2000) demonstram

    como o risco de apreenso pelo Estado reduz os investimentos em uso

    sustentvel das florestas.

    Duas formas de incertezas relativas aos direitos de propriedade so

    apontadas por Atje e Roesad (2004): 1) as incertezas podem derivar da

    possibilidade de confisco das rendas florestais decorrentes de manejo sustentvel

    da floresta, o que faria com que a floresta seja preservada, e 2) as incertezas

    podem ser originadas tambm dos riscos associados com o corte ilegal de

    madeira em terras de qualidade pior (fronteiras de florestas nativas), o que

    possibilitaria que os cortadores de madeira analisassem as probabilidades de

    serem pegos em flagrante delito.

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    1.4.1 Direito de propriedade e desmatamento no Brasil

    Existe um considervel nmero de trabalhos que se utilizam do arcabouo

    terico dos direitos de propriedade para explicar o desmatamento e degradao

    ambiental no Brasil. O principal foco destes trabalhos a Amaznia, regio

    detentora da maior floresta tropical do mundo que considerada um verdadeiro

    patrimnio do Brasil e, por que no dizer, do mundo.

    Vrios autores, tais como Almeida e Campari (1995), Mueller e Mueller

    (2002), Claro, Zylbersztajn e Claro (2007), Schneider (1995), Alston, Libecap e

    Mueller (1999a) e Alston, Libecap e Schneider (1995), encontraram uma forte

    relao entre incentivos ao desmatamento e regimes inseguros de direito de

    propriedade na Amaznia brasileira.Em sua anlise sobre o desmatamento da Amaznia brasileira, Alston,

    Libecap e Mueller (1999a) salientaram que:

    Insecure property rights may lead landowners to clear more of their forests than they wouldotherwise, as a means to signal occupancy () At the same time it may be that landownerswill not take into consideration the fact that when they clear they are destroying biodiversity,an action that would probably harm future generations. Even if each landowner did considerthat fact, there could be severe collective action problems in preserving biodiversity, givenits public good nature. (ALSTON, LIBECAP e MUELLER, 1999a, p. 12).

    Reconhecidamente, diversas so as causas de desmatamento e em geral,este ocorre em razo de uma grande conjuno de fatores. Mesmo assim, o

    desmatamento em reas de fronteira possui como caracterstica comum a falta de

    um sistema de direito de propriedade sobre a terra bem definido. ... note that it is

    often the prevailing property rights institutions that are at the root of the problem

    (deforesting), as in cases of the common pool and externalities (MUELLER e

    MUELLER, 2002, p. 11).

    Nas dcadas de 1970 e 1980, a criao de gado era tida como a principalcausa de desmatamento na fronteira Amaznica. Para Becker (1991), a criao de

    gado bovino para corte foi a principal forma de organizao da atividade produtiva

    nas terras de fronteira. Isso ocorreu, segundo Fearnside (1992), em grande

    medida devido aos incentivos fiscais aos criadores de bovinos.

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    Os grupos que assumem a posse da terra, por terem maior poder poltico e

    econmico, frequentemente conseguem atravs de adulteraes e corrupo o

    ttulo de propriedade da terra. O processo de titulao fraudulenta da propriedade

    ocorre, portanto, em terras j demarcadas e com um maior grau de apropriao.

    Na realidade, os direitos de propriedade na fronteira s podem ser

    assegurados com a ocupao fsica da terra.

    Esta ocupao nos momentos iniciais obviamente mais importante do que qualquereventual documento de posse. A grande incerteza sobre a posse da terra e a perspectivade uma eventual titulao posterior, mesmo que decorrente de uma invaso e ocupaoviolenta, induz a existncia de exrcitos de grileiros e posseiros, agentes especializadosem ocupar terras e garantir sua posse at uma eventual legalizao, muitas vezesfinanciados por grandes madeireiros e latifundirios. Estes grileiros freqentementeincentivam as invases de terras por pequenos colonos para depois compr-lasnovamente, o que lhes garantir a futura titulao. (MARGULIS, 2001, p. 11).

    Depois disso, j com a propriedade definida e a floresta completamente

    desmatada, as terras so vendidas a grandes produtores de soja (CLARO,

    ZYLBERSZTAJN e CLARO, 2007). Assim, existindo m definio dos direitos

    sobre a terra, logo aps a penetrao inicial, comea um processo de aquisio e

    consolidao de direitos de propriedade. Ao mesmo tempo h uma evoluo do

    mercado de terras na regio.

    De forma mais especfica, para que haja a explorao inicial de novas

    fronteiras, so necessrios dois fatores. O primeiro deles so os madeireiros quenecessitam da escassa mo-de-obra nas regies distantes onde a madeira

    abundante, dando origem ao segundo fator, que so os trabalhadores rurais e

    agricultores sem posses. Muitos desses trabalhadores pobres vm de outras

    regies do pas. Por essa razo, a migrao tida como uma das razes da

    degradao do meio ambiente na regio da Amaznia (FEARNSIDE, 1992;

    ALMEIDA e CAMPARI, 1995).

    A concesso fraudulenta de ttulos de propriedade e a corrupogeneralizada no mercado de terras permitem a converso de florestas em

    propriedades particulares tituladas. Esse processo conduz h uma corrida pela

    posse da terra. The open access characteristic of the Amazon forest induced a

    race for property rights, both as direct government strategy and as a market

    response to the possibility of obtaining land titles (FERRAZ, 2001, p. 9).

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    Ademais o desmatamento a principal forma de se garantir direitos de

    propriedade. Conforme Claro, Zylbersztajn e Claro (2007), a legislao brasileira

    obriga que determinado espao de terra seja convertido em rea produtiva para

    que o posseiro se torne proprietrio, mesmo que isso signifique cortar as rvores

    do terreno.

    This relationship between squatters and deforestation dates from the beginning of thetwentieth century based on a traditional land legislation that requires the transformation ofthe forest into a productive activity (meaning agriculture, and cattle raising). (CLARO,ZYLBERSZTAJN e CLARO, 2007, p.17).

    Esta necessidade de produo tambm foi requisito na dcada de 1970

    para garantir aos usurios acesso a crditos financeiros e incentivos fiscais.

    Embora a legislao ambiental deva ser respeitada, essa forma de incentivo ao

    desflorestamento atualmente ainda uma realidade.

    A violncia nas regies de fronteira tambm incentiva o desmatamento. A

    pobreza e a desigualdade nestas regies conduzem a mais conflitos, de forma que

    a remoo da floresta reduz as possibilidades de disputa por terra.

    Land owners particularly, but also squatters as well, have incentives to clear in order to firmtheir claims to Amazon lands prior to a conflict. Regarding forested lands as unused landsand therefore subject to invasion and redistribution raises problems for efforts to set asidelarge tracts of Amazon rain forest. (ALSTON, LIBECAP e MUELLER, 1999a, p. 23).

    SantAnna e Young (2000) demonstraram que existe uma relao direta

    entre desmatamento e violncia no campo. Os dois so frutos de direitos de

    propriedades mal definidos e excluso de acesso a terra. Eles estudaram o caso

    amaznico, porm, certamente, a anlise serve a outros casos brasileiros. Nas

    regies de fronteira, os direitos de propriedade sobre a terra no esto bem

    definidos. Logo, a violncia na fronteira surge, dentre outros motivos, a partir dos

    conflitos pela definio dos ttulos de posse entre posseiros, de um lado, e grileiros

    e fazendeiros de outro. Os posseiros so mais frgeis diante da possibilidade douso da violncia por parte dos latifundirios e, ainda, pela fora poltica destes.

    Dessa forma, so expulsos e obrigados a buscar novas terras para se estabelecer,

    ampliando, dessa forma, a fronteira agrcola. Ao expandir a fronteira, o posseiro

    tem, necessariamente, que preparar a terra para o cultivo, e consequentemente

    levado a desmatar para delimitar o seu espao de ocupao.

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    Da mesma forma, Alston, Libecap e Mueller (1999a) explicam como se d a

    relao entre os conflitos rurais por terras e o desmatamento na regio

    amaznica. A insegurana com relao a expropriaes ou confisco de terras

    tambm incentiva o desmatamento como forma de garantir o direito de

    propriedade. Muitas vezes, com medo de ter suas terras confiscadas, os

    proprietrios prematuramente transformam as florestas em pasto. Esta ao

    diminui os riscos de confisco ao mesmo tempo em que, mesmo que a terra seja

    confiscada, o proprietrio recebe do governo pela benfeitoria (corte das rvores)

    na propriedade alm da propriedade ser avaliada como rea agrcola e no mais

    floresta.

    Claro, Zylbersztajn e Claro (2007) descreveram o desenvolvimento das

    instituies na Floresta Amaznica brasileira. A concluso deles que devido aosaltos custos de transao, as instituies na Amaznia no foram capazes de

    evitar o desmatamento e o corte ilegal de madeira. Na Amaznia, no lugar de

    cooperao, tm-se conflitos. As principais razes disto so o tamanho e

    caractersticas geogrficas da regio, a diversidade scio-cultural, o interesse do

    Estado em outras questes e a ineficincia do Estado em monitorar aes contra

    o desmatamento. Neste sentido, os trs autores (2007) recomendaram:

    research on the role of the entrepreneurs in recent development of the region and theprivate production of rights, what is in line with the new legislation that aims to concedepublic land to private use through sustainable stewardship of natural resources. (CLARO,ZYLBERSZTAJN e CLARO, 2007, p. 21).

    Os trabalhos acima mencionados tm em comum que qualquer que seja a

    causa imediata do desmatamento, seja pecuria, agricultura, ou extrao de

    madeira, caso os direitos de propriedade estivessem bem definidos o problema do

    desmatamento na Amaznia seria bem menor.

    No Paran das dcadas de 1940 a 1960, a velha fronteira a que se refere a

    presente dissertao, a m definio de direitos de propriedade tida como uma

    das principais causas do desmatamento ocorrido nessa poca. Embora no tratem

    diretamente da relao direito de propriedade e desmatamento os trabalhos

    Wachowicz (1985; 2001), Foweraker (1971) e Gomes (1987) sinalizam nessa

    direo.

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    Alston, Libecap e Schneider (1995) e Alston, Libecap e Mueller (1999a) so

    alguns dos raros trabalhos que comparam o Paran da dcada de 1940 a 1960 e

    o Par de 1970 a 1990 em questes relacionadas a direitos de propriedade. Esses

    trabalhos tm uma anlise economtrica comparativa entre a velha fronteira e a

    nova fronteira atravs do mercado de terras. No entanto, ambos no focam na

    questo do desmatamento. As variveis utilizadas foram: valor da terra, titulao e

    investimentos especficos na terra, em ambas as regies. Os resultados so os

    esperados, ou seja, quanto mais titulao, maior valor da terra. A titulao da

    propriedade, previsivelmente, leva a mais investimentos especficos na terra,

    como a agricultura e a pecuria. Investimentos tambm contribuem para o valor da

    terra nas duas fronteiras.

    1.5 CONSIDERAES FINAIS

    A Escola dos Direitos de Propriedade est inserida na Economia Novo

    Institucionalista e tem como fundamento central a idia de que um ambiente onde

    os direitos de propriedade estejam mal definidos proporciona forte incentivo

    explorao excessiva do recurso. Os direitos de propriedade bem estabelecidos e

    garantidos permitem que a utilizao dos recursos ocorra de forma eficiente, por

    essa razo, a Economia dos Direitos de Propriedade tem sido largamente utilizada

    em questes concernentes a degradao ambiental.

    Diversos trabalhos foram realizados analisando os direitos de propriedade

    em casos concretos de problemas ambientais, como energia eltrica, irrigao de

    gua, pesca, biodiversidade e desmatamento.

    Atualmente, o problema do desmatamento mais preocupante em regiespouco desenvolvidas, que so justamente onde se encontram as florestas mais

    ricas em biodiversidade. Os pases menos desenvolvidos tendem a sofrer mais

    com os problemas relacionados a direito de propriedade inseguro e

    desflorestamento, devido fragilidade de suas instituies. o caso da velha

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    fronteira no Paran e na nova fronteira do Par, objetos de estudo dos captulos

    seguintes.

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    CAPTULO 2 - DIREITOS DE PROPRIEDADE E DESMATAMENTO NA VELHA

    FRONTEIRA:OCASODOSUDOESTEDOPARAN

    A maior parte da ocupao da regio do sudoeste do estado do Paran

    ocorreu nas dcadas de 1940 e 1950, exatamente no mesmo perodo em que uma

    das maiores reservas de araucrias do planeta foi praticamente dizimada. Nesse

    captulo sero analisadas as relaes entre a colonizao da regio, os problemas

    com os direitos de propriedade e o desmatamento ocorrido neste perodo.

    As questes relativas a formao histrica da regio sero levadas em

    conta, visto que podem explicar a origem dos problemas de m definio dedireitos de propriedade e conseqentemente a degradao do meio ambiente no

    sudoeste paranaense.

    A Legislao paranaense e a nacional, bem como as polticas pblicas

    ambientais governamentais, tambm sero objeto de estudo, visando verificar sua

    contribuio para a explorao irresponsvel ocorrida nas matas do sudoeste

    paranaense.

    2.1. ASPECTOS GEOGRFICOS E ECONMICOS DO SUDOESTE

    PARANAENSE

    A regio do sudoeste do estado do Paran a rea compreendida entre o

    Rio Iguau como limite norte, a Argentina como limite oeste, Santa Catarina no

    sul, e a regio do municpio de Palmas Leste. A mesorregio do SudoesteParanaense uma das dez mesorregies do estado do Paran. A rea total da

    regio 11.651,833 km. formada por 37 municpios agrupados em trs

    microrregies. So elas as microrregies de Capanema, Francisco Beltro e Pato

    Branco.

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    Figura 2.1 Sudoeste e Paran

    Figura 2.1 fonte IBGE (2008)

    A vegetao do sudoeste paranaense era constituda de matas densas de

    araucrias, at o seu quase total desmatamento nas dcadas de 1940, 1950 e1960. A Mata de Araucria, tambm chamada de Pinheiros-do-paran (Araucria

    angustifolia), ou, cientificamente, de Floresta Ombrfila Mista desenvolve-se em

    regies nas quais predomina o clima subtropical, que apresenta invernos rigorosos

    e veres quentes com ndices pluviomtricos relativamente elevados e bem

    distribudos durante o ano. A araucria um vegetal da famlia das conferas. As

    rvores que compem essa particular cobertura vegetal possuem altitudes que

    podem variar entre 25 e 50 metros e troncos com 2 metros de espessura. Assementes dessas rvores, conhecidas como pinho, podem ser ingeridas. Uma

    particularidade das araucrias a restrita ocorrncia de flores. Outra caracterstica

    comum nos pinheiros e que foi um dos fatores a contribuir para a quase extino

    da espcie a alelopatia, ou seja, a tendncia que essas plantas tm de inibir o

    crescimento de outras plantas prximas a elas facilitando sua extrao.

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    A ocupao territorial na Regio Sudoeste recente. A Densidade

    demogrfica na regio de 40,2 hab./km. A populao atual da regio de 470

    mil habitantes e existem apenas dois ncleos populacionais com mais de 50 mil

    habitantes, que so Francisco Beltro com cerca de 80 mil, e Pato Branco com

    cerca de 60 mil. Os demais 330 mil habitantes espalham-se pelas pequenas

    cidades e por povoaes no interior dos municpios. Todavia atualmente h um

    acelerado processo de urbanizao na regio. A parte urbana de Pato Branco por

    exemplo, tem crescido a taxas de 3% ao ano desde 1991. Em Francisco Beltro o

    crescimento urbano de 2% ao ano (IPARDES, 2006). Em todos os municpios do

    sudoeste paranaense a populao rural apresenta forte retrao. O meio rural que

    sempre foi baseado em minifundios apresenta agora um crescimento da

    concentrao fundiria. As razes para isso so principalmente as consecutivasquebras na safra e a busca por melhores condies de vida do campons. No

    entanto, o sudoeste ainda predominantemente rural. Possua em 2000 o menor

    grau de urbanizao entre as dez mesorregies do Estado, segundo o IBGE, de

    53,55%.

    Figura 2.2 Municpios que atualmente formam o Sudoeste Paranaense

    Figura 2.2 fonte IBGE (2008)

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    O sudoeste uma das mesorregies menos desenvolvidas do Paran. O

    Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econmico e Social (IPARDES) aponta

    como caracterstica especfica da regio Sudoeste, a sua baixa produtividade em

    relao s outras microrregies do Estado do Paran. Em 1999, nove dos dez

    principais produtos analisados apresentavam produtividades mdias inferiores s

    verificadas para o Estado. Com relao ao IDH mdio, o sudoeste apresenta uma

    taxa de 0,782, segundo o PNUD de 2000, pouco acima da mdia brasileira que foi

    0,764.

    2.2. FORMAO HISTRICA E DIREITOS DE PROPRIEDADE NO SUDOESTE

    PARANAENSE

    A regio atualmente conhecida como sudoeste paranaense foi alvo de

    muitos conflitos por posse e propriedade em sua histria. Desde conflitos entre

    pessoas, entre empresas, entre Estados da Federao e at entre pases. Os

    direitos de propriedade sobre a terra na regio somente foram garantidos

    definitivamente na dcada de 1970.

    No incio foi a Questo de Palmas entre Brasil e Argentina. O Tratado de

    Santo Ildefonso (1777) definia as fronteiras entre as terras portuguesas e

    espanholas no Sul do Brasil. No entanto, nesse tratado ficaram mal definidas as

    fronteiras entre estes pases por conta de uma confuso de nomes de rios. Os rios

    Uruguai e Iguau no tiveram uma fronteira definida e, por cerca de 80 anos esse

    assunto foi deixado de lado. A partir de meados do sculo XIX ambos os pases

    passaram a disputar um territrio de 30.621 km, tendo como embasamento uma

    interpretao favorvel aos seus interesses do Tratado de Santo Ildefonso. A esseconflito se denominou Questo de Palmas.

    Havia na regio, dois ncleos urbanos formados por paranaenses, Palmas

    e Clevelndia. Temendo uma possvel invaso da Argentina, o governo brasileiro

    resolveu precaver-se, instalando, prximas ao local de conflito, duas colnias

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    agromilitares: Chapec e Chopim. Mas com a guerra do Paraguai (1864-1869), a

    Questo de Palmas foi esquecida. Terminada a guerra, a situao volta a se

    complicar.

    Em 1889, antes da Proclamao da Repblica no Brasil, o governo

    argentino props a diviso do territrio contestado, atravs de uma linha de

    fronteira que fosse a mediana geogrfica das pretenses territoriais de ambos os

    pases. O Brasil rejeitou a proposta. Os dois pases ento concordaram em

    apontar um rbitro para solucionar a questo. O escolhido foi Grover S. Cleveland,

    que era presidente norte-americano na poca. Em 5 de fevereiro de 1895, o

    Presidente Cleveland apresentou sua deciso, dando razo ao Brasil, de forma

    que a regio de conflito entre a Argentina e o Brasil, que perfaz o Sudoeste do

    Paran e Oeste de Santa Catarina, passa a pertencer definitivamente ao territriobrasileiro.

    Posteriormente, veio o litgio entre o Paran e Santa Catarina. O territrio

    que compreende o atual Estado do Paran foi parte integrante da Capitania de

    So Paulo at o ano de 1853, quando obteve sua elevao categoria de

    Provncia, iniciando-se, ento, a questo de divisas com Santa Catarina. Essa m

    definio de limites culminou na Guerra do Contestado entre 1912 e 1916. Nesse

    perodo, tentou-se sem sucesso a criao do Estado das Misses, que englobaria

    todo o centro e o oeste catarinense e ainda o sudoeste paranaense.

    A Guerra do Contestado tinha vrias motivaes. Havia um forte movimento

    messinico na regio, uma competio econmica violenta pela explorao de

    riquezas naturais, uma questo de divisa entre Estados e uma disputa pela posse

    de terras. Outro motivo foi, em 1908, a construo da ferrovia So Paulo Rio

    Grande do Sul, a qual atravessava de norte a sul a regio contestada, percorrendo

    o vale do Rio do Peixe, no Meio-Oeste catarinense, o que valorizava muito as

    terras da regio. Os construtores da estrada obtiveram do governo federal uma

    concesso de terras nas laterais da estrada. A rea total assim obtida era

    demarcada, sem levar em conta sesmarias nem posses, dentro de uma zona de

    trinta quilmetros, ou seja, quinze para cada lado. Segundo Fraga (2002), os

    camponeses que viviam numa regio em liberdade, cultivando a terra e extraindo

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    as riquezas das florestas que compunham o interior catarinense, foram

    surpreendidos com novas medidas de ocupao da rea. Ressalta ainda o citado

    autor que o Contestado reuniu mais de 30 mil pessoas que habitavam a regio,

    desde fazendeiros, posseiros, fanticos por promessas messinicas e seguidores

    do monge Jos Maria, que era visto como curador e como sacerdote. Conforme

    Busato (2001), em agosto de 1912, o monge e mais alguns seguidores cruzaram

    o Rio do Peixe, saindo de Taquaruu em Santa Catarina e entrando no territrio

    administrado pelo Paran, nos Campos do Irani. O governo paranaense

    considerou essa passagem como sendo uma invaso e enviou foras policiais

    para conter o grupo. No combate morreram o monge Jos Maria e o Capito Joo

    Gualberto, chefe da expedio paranaense. Para Fraga (2002), a Guerra do

    Contestado foi a mais violenta e sangrenta guerra que j acontecera no interior doBrasil. O principal motivo foi a disputa pelo direito de terras. Em 1916, foi assinado

    um acordo de divisas entre Paran e Santa Catarina, entregando-se ao Paran

    metade do territrio do Contestado, o que hoje compreende, em sua maior parte, o

    sudoeste paranaense.

    No entanto, embora tenha havido todas estas controvrsias, a regio era

    pouco povoada. Segundo Barz (2002), o Sudoeste do Paran foi a ltima regio

    do estado a ser povoada. At 1950 s existiam na regio os municpios de

    Mangueirinha, Palmas e Clevelndia, bem como os distritos de Pato Branco e

    Chopinzinho. No incio do governo de Bento Munhoz da Rocha Neto, esses

    municpios foram desmembrados em 24 outros municpios e trs distritos.

    A partir de 1938, o governo de Getlio Vargas estabelece a poltica da

    "Marcha para Oeste", que consistia na colonizao e alargamento das fronteiras

    agrcolas do pas visando aumentar a produo de alimentos e abastecer os

    centros urbanos em rpido crescimento. Nesse contexto, um dos principais

    objetivos do Estado Novo de Getlio Vargas era o preenchimento dos grandes

    vazios demogrficos existentes na regio oeste e sudoeste do Estado do Paran.

    Segundo a Dissertao de Mestrado 1957 - A Revolta dos Posseiros de Iria

    Zanoni Gomes, com essa iniciativa, Vargas tambm promoveu a ocupao das

    regies de fronteira com a Argentina e o Paraguai, atendeu a reivindicao por

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    terras de reservistas ex-agricultores e acomodou os grupos de pequenos

    agricultores gachos que chegavam ao Paran.

    Seguindo a campanha da Marcha para Oeste, em 1943, Getlio Vargas cria

    a Colnia Agrcola Nacional General Osrio CANGO. A disponibilidade de terras

    frteis, com rica reserva florestal e obteno de domnio sem nus para o

    campons, foram fatores relevantes ao povoamento total da regio. Rapidamente

    ela foi ocupada por migrantes oriundos do Rio Grande do Sul e Santa Catarina,

    zonas de ocupao antigas e saturadas.

    A colonizao dessa regio tambm se justifica pelo fato de tratar-se das

    melhores terras do estado em regio fronteiria com a Argentina, entre os vales

    dos rios Piquiri, Iguau e Paran, que possua na poca a maior reserva de

    pinheiros do Brasil e uma das maiores do mundo, segundo Barz (2002).Segundo Alves, Lima e Piffer (2008), a criao da CANGO estava tambm

    circunscrita articulao de uma srie de fatores correlatos, dentre os quais se

    destacam: 1) a presso social estabelecida no Rio Grande do Sul pelo

    esgotamento do modelo adotado em 1850 pela lei de terras; 2) a necessidade

    apontada pelo movimento tenentista de ocupar e proteger as reas de fronteira

    com a Argentina e o Paraguai; 3) a necessidade de produo de alimentos para a

    crescente demanda de um setor urbano cada vez maior; 4) a produo de

    matrias-primas para abastecer as indstrias que se expandiam no perodo ps-

    guerra; 5) o atendimento das reivindicaes de reservistas gachos por terra para

    o plantio e, 6) a necessidade de ocupar as glebas Misses e Chopim para pr fim

    aos litgios sobre a sua posse.

    Ainda em 1943, foi criado o Territrio Federal do Iguau por Getlio Vargas,

    que abrangia reas do Oeste e do Sudoeste do Paran e do Oeste catarinense.

    Aps apenas trs anos de sua criao, em 1946, ocorreu a extino do Territrio

    do Iguau, em decorrncia de articulaes engendradas pelos polticos

    paranaenses na Assemblia Nacional Constituinte.

    Em 1918, antes da criao da CANGO, foi criada na regio da atual Pato

    Branco, a Colnia Bom Retiro, visando receber colonos da regio do Contestado.

    No entanto, a estratgia gerou poucos resultados.

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    A CANGO possua certa preocupao ambiental. Nunca permitia que um

    colono se fixasse em regio em que havia mata fechada. Isso se deve tambm ao

    fato de as terras abertas permitirem maior produtividade. Forewaker (1971, p. 34)

    explica que only mato brancowas cleared for the planting of maize, beans, rice

    and wheat.

    Dessa forma, a Colnia Agrcola contratou um nmero significativo de

    guardas florestais, que evitavam, principalmente, que queimadas trouxessem risco

    para a mata. Mesmo tendo instalado uma serraria em Santa Rosa para construir

    as casas dos colonos, havia preocupao com a preservao da floresta.

    Enquanto a CANGO teve autoridade, a reserva florestal foi respeitada.

    Segundo Colnaghi (apud Feres, 1990), a CANGO pretendia que o territrio

    fosse ocupado por agricultores socialmente calmos, politicamente conservadorese articulados com o mercado. Esse tipo de ocupao visava implementar um

    rpido e calmo processo de desenvolvimento econmico e social na regio, com o

    objetivo de nela criar uma barreira contra as infiltraes de contrabandistas

    argentinos e paraguaios.

    Sendo assim, a CANGO incentivou a vinda de pequenos produtores rurais

    de outras regies, principalmente Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Fazia-se

    muita propaganda no interior gacho e catarinense. A CANGO tambm incorporou

    pequenos posseiros que estavam em conflito com grileiros de terra no Oeste

    paranaense.

    A CANGO oferecia terras gratuitamente (embora sem os ttulos de

    propriedade, como veremos adiante), madeira para a construo das casas,

    ferramentas agrcolas e sementes, servios de sade e distribuio da produo.

    Assim, segundo relatrio da prpria CANGO, em 1947 eram 476 famlias e esse

    nmero subiu para 2.725 em 1956.

    Essa iniciativa do governo federal trouxe ao Paran uma experincia de

    reforma agrria que deu certo e que impulsionou o desenvolvimento econmico da

    regio, ao menos nos primeiros anos.

    No final da dcada de 1940, dois grupos polticos econmicos foram criados

    na regio. Esses grupos aproveitaram-se da situao de desorganizao do final

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    do Governo Dutra para tentar lucrar na regio. O primeiro era a CITLA

    (Clevelndia Industrial e Territorial Ltda.), ligada ao Grupo Lupion e ao PSD

    (Partido Social Democrtico). A outra era a Pinho e Terras, ligada ao PTB (Partido

    Trabalhista Brasileiro) e a UDN (Unio Democrtica Nacional).

    A Pinho e Terras adquiriu da SEIPU (Superintendncia das Empresas

    Incorporadas ao Patrimnio da Unio) uma parte da gleba Misses, que era alvo

    de vrias disputas judiciais.

    Vinculada ao Grupo Lupion, a CITLA foi a principal companhia colonizadora

    na regio. Ela adquiriu da Unio parte da gleba Chopin e toda a gleba das

    Misses, da qual parte j havia sido vendida empresa Pinho e Terras.

    Moyss Willie Lupion de Troya, herdeiro poltico do ex-Interventor Manoel

    Ribas, foi eleito governador pela primeira vez em 1947, cargo que voltaria aocupar de 1956 a 1960. Moyss Lupion dominou a cena poltica paranaense por

    mais de 15 anos. o nico lder populista que o Paran teve entre o perodo

    liberal de 1946 a 1964 (BARZ, 2002).

    O Grupo Lupion era composto por mineradoras de carvo, serrarias,

    fbricas de papel e de fsforos, agricultura, pecuria e participao em grupos de

    comunicao, como a Gazeta do Povo e o jornal O Dia. Segundo Barz (2002), o

    grande negcio do grupo era a madeira. O grupo se dedicava extrao,

    beneficiamento e exportao de madeira. Em virtude disso, o Sudoeste

    paranaense se transformou em alvo de grande interesse do Grupo, uma vez que

    possua cobertura florestal muito densa e rica. nessa poca, ao final do primeiro

    mandato de Lupion, que surge a Clevelndia Industrial e Territorial Ltda. (CITLA),

    que veio explorar e comercializar as terras litigiosas da Gleba Misses e parte da

    Chopim.

    Segundo os autores que trataram do tema, Barz (2002), Wachowicz (1985)

    e (2001), Foweraker (1971), Gomes (1987), a CITLA adquiriu a Gleba Misses em

    uma transao envolta em irregularidades. O caso remonta dcada de 1920,

    quando o Estado do Paran concedeu aproximadamente quinhentos mil hectares

    de terras devolutas Brazil Railway Company, na rea das Misses, como

    contrapartida pela construo de uma ferrovia entre Ponta Grossa e Guarapuava.

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    Ficava, pelo contrato, a companhia obrigada a colonizar a regio, o que no foi

    cumprido. Aps a revoluo de 1930, General Mario Tourinho, nomeado

    interventor federal no Paran, revoga a concesso South Brazilian Railway

    Company e anula os ttulos de terra dados a ela. No entanto, a empresa ingressa

    com ao na justia contra o Estado do Paran buscando reaver a posse. Foi

    nesse nterim que o governo federal criou a CANGO na regio sub judice. Ou seja,

    a CANGO, no pde conceder ttulos da terra aos colonos, visto que o caso

    estava em juzo. Devido a essa situao de litgio, nenhuma das partes poderia

    passar escritura legal aos colonos.

    Em meio a este processo litigioso pelas terras concedidas Brazilian

    Railway, surge um senhor chamado Jos Rupp. No final do sculo XIX, poca da

    controvrsia entre o Paran e Santa Catarina, a famlia Rupp adquiriu um contratode arrendamento do governo catarinense de terras consideradas devolutas para

    explorar erva mate e madeira da regio. Na ocasio da construo da estrada de

    ferro, essas mesmas terras foram tituladas pelo Paran Empresa So Paulo

    Rio Grande. Ento, em 1920, iniciou-se uma ao judicial para que a Justia

    declarasse quem teria direito sobre a terra, a qual teve como vencedor Jos Rupp

    em 1925. Jos Rupp entra novamente na justia para a fixao do quantume da

    indenizao a que teria direito pelo cancelamento do contrato de arrendamento. O

    resultado somente sai em 1945, quando no mais existia a So Paulo Rio

    Grande, tendo seu patrimnio sido transferido SEIPU (Superintendncia das

    Empresas Incorporadas ao Patrimnio da Unio).

    A Unio, perdedora no litgio, decide no pagar a indenizao Rupp, visto

    que nem havia sido citada no processo original. Em 1950, vendo a situao

    praticamente perdida, Jos Rupp aproximou-se do Grupo Lupion e vendeu seus

    direitos CITLA, empresa controlada pelo grupo. Moyss Lupion era governador

    do Paran na poca e possua muita influncia no mbito nacional. Assim, poucos

    meses depois, a CITLA requer novamente as glebas de Misses e Chopim e ainda

    as de Chopinzinho, Silva Jardim e Andrada. Consegue ento, por um preo muito

    baixo, a gleba de Misses e grande parte de Chopim, regio com inmeros

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    recursos e com a maior reserva de pinheiros do Brasil, calculada em 3 milhes de

    rvores adultas (GOMES, 1987).

    A transao foi ilegal por vrias razes: tratava-se de terras de fronteira, de

    no teve o parecer prvio do Senado da Repblica (obrigatrio nos caso de mais

    de 10.000 hectares), nem do Conselho de Segurana Nacional, tambm no foi

    ouvido o Tribunal de Contas da Unio, nem realizada concorrncia pblica.

    Ademais, havia a controvrsia judicial sobre quem seria o legtimo proprietrio da

    regio, se o Governo Federal, que j havia incorporado os direitos da South

    Brazilian Railway Company, ou o Estado do Paran. Portanto, estes quinhentos

    mil hectares foram adquiridos de modo irregular.

    Diante dessa situao, o Conselho de Segurana Nacional oficiou a todos

    os cartrios do Paran e Santa Catarina para que no lavrassem a escritura daCITLA. O Cartrio de Clevelndia se negou a registrar a escritura, conforme

    Wachowicz (2001). O Governo Lupion decidiu ento, desmembrar o cartrio de

    Clevelndia, criando o cartrio de Santo Antnio (atualmente Santo Antnio do

    Sudoeste), que prontamente lavrou a escritura.

    Nas eleies de 1950, com o apoio da conservadora UDN e de parte do

    PTB, Bento Munhoz da Rocha Neto derrotou o candidato de Lupion e ordenou que

    os cartrios imobilirios dificultassem o registro e a transferncia de terras. Bento

    Munhoz freou a colonizao e a especulao de terras, tendo como objetivo

    principal atingir seus adversrios polticos, de acordo com Barz (2002). A Unio,

    por sua vez, ingressou com uma ao judicial para o cancelamento da escritura da

    CITLA. Mas os problemas de terra se agravaram porque as empresas

    colonizadoras no pararam sua atuao. Assim, em 1955, aproximadamente 65%

    das terras da regio estavam de uma ou outra maneira sob ao das empresas

    colonizadoras, conforme Barz (2002). Segundo Luiz Antonio Andrade, advogado

    do INIC (Instituto Nacional de Imigrao e Colonizao), em depoimento CPI

    instalada pela Cmara Federal para investigar os problemas de terra no sudoeste

    paranaense em 1957, a CITLA desenv