14. Hipnose e Dor

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CAP›TULO 13 131 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA 13 CAPÍTULO Hipnose e Dor GILDO ANGELOTTI JOÃO AUGUSTO BERTUOL FIGUEIRÓ CONSIDERAÇÕES BÁSICAS: DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO A dor, uma experiência física e emocional desagradável, sempre foi vista como parte inte- grante da nossa sobrevivência. Ela nos acompa- nha desde nossas origens, através de escritos em papiros, cavernas, pinturas ou até mesmo em fósseis. A busca pelo tratamento unia rituais religio- sos, magias, plantas medicinais, massagens e a importância que era dada em cada cultura. Civili- zações antigas como o Egito, a Índia e a China possuíam seus próprios curadores ou xamãs. O xamã mais conhecido no início do século XVII era o médico austríaco Franz Anton Mesmer, que buscava soluções para curar doenças sem explicações plausíveis nos diversos tratamentos propostos pela medicina tradicional. Ocupou-se de experiências utilizando-se do magneto, visan- do estabelecer a relação do fluido magnético com corpos celestes. Em 1784, a “Comissão da Sociedade Real de Medicina e da Academia de Ciências” demons- trou, através de estudos realizados em conjunto com os cientistas mais renomados da época, a inexistência do magnetismo. Os resultados en- contrados pela Comissão foram divulgados às classes interessadas, através do relato de que a “cura” nada mais era do que resultados das con- seqüências da imaginação do doente. Mesmo com a queda do mesmerismo, a hipnose conti- nuou sendo empregada, não somente na busca de cura, mas em espetáculos artísticos. A técnica de Mesmer foi reutilizada pelo cirur- gião escocês James Esdaile, no século seguinte, na Índia, fazendo pequenas e grandes cirurgias sob o sono mesmérico. James Braid se opôs ao fluido magnético de Mesmer, criticando os fenômenos mesméricos, caracterizando-os nada mais do que um estado decorrente de fadiga sensorial, acarretando alte- rações neurofisiológicas. Mais tarde teve seu tra- balho reconhecido como neuro-hipnotismo. Um século se passou e, por volta da década de 1950, as Associações Médicas Britânica e Norte-americana escreveram relatórios inquesti- onáveis sobre a importância da hipnose no trata- mento de doenças psicossomáticas, provando sua capacidade na remoção da sintomatologia, alteração de hábitos inadequados expressos atra- vés do pensamento e do comportamento. Na publicação da Associação Médica Britânica, a hipnose foi considerada um adjunto terapêutico valiosíssimo, nos mais variados procedimentos médicos e odontológicos. Os achados sobre o uso da hipnose em ci- rurgias, como método na produção de analge-

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    13CAPTULO

    Hipnose e Dor

    GILDO ANGELOTTI

    JOO AUGUSTO BERTUOL FIGUEIR

    CONSIDERAES BSICAS:

    DESENVOLVIMENTO HISTRICO

    A dor, uma experincia fsica e emocionaldesagradvel, sempre foi vista como parte inte-grante da nossa sobrevivncia. Ela nos acompa-nha desde nossas origens, atravs de escritosem papiros, cavernas, pinturas ou at mesmo emfsseis.

    A busca pelo tratamento unia rituais religio-sos, magias, plantas medicinais, massagens e aimportncia que era dada em cada cultura. Civili-zaes antigas como o Egito, a ndia e a Chinapossuam seus prprios curadores ou xams.

    O xam mais conhecido no incio do sculoXVII era o mdico austraco Franz Anton Mesmer,que buscava solues para curar doenas semexplicaes plausveis nos diversos tratamentospropostos pela medicina tradicional. Ocupou-sede experincias utilizando-se do magneto, visan-do estabelecer a relao do fluido magntico comcorpos celestes.

    Em 1784, a Comisso da Sociedade Realde Medicina e da Academia de Cincias demons-trou, atravs de estudos realizados em conjuntocom os cientistas mais renomados da poca, ainexistncia do magnetismo. Os resultados en-contrados pela Comisso foram divulgados sclasses interessadas, atravs do relato de que a

    cura nada mais era do que resultados das con-seqncias da imaginao do doente. Mesmocom a queda do mesmerismo, a hipnose conti-nuou sendo empregada, no somente na buscade cura, mas em espetculos artsticos.

    A tcnica de Mesmer foi reutilizada pelo cirur-gio escocs James Esdaile, no sculo seguinte,na ndia, fazendo pequenas e grandes cirurgiassob o sono mesmrico.

    James Braid se ops ao fluido magntico deMesmer, criticando os fenmenos mesmricos,caracterizando-os nada mais do que um estadodecorrente de fadiga sensorial, acarretando alte-raes neurofisiolgicas. Mais tarde teve seu tra-balho reconhecido como neuro-hipnotismo.

    Um sculo se passou e, por volta da dcadade 1950, as Associaes Mdicas Britnica eNorte-americana escreveram relatrios inquesti-onveis sobre a importncia da hipnose no trata-mento de doenas psicossomticas, provandosua capacidade na remoo da sintomatologia,alterao de hbitos inadequados expressos atra-vs do pensamento e do comportamento. Napublicao da Associao Mdica Britnica, ahipnose foi considerada um adjunto teraputicovaliosssimo, nos mais variados procedimentosmdicos e odontolgicos.

    Os achados sobre o uso da hipnose em ci-rurgias, como mtodo na produo de analge-

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    sia/anestesia, surgem com as publicaes deCloquet, por volta de 1829, em uma amputaode mama sob sono mesmrico. H vrias alega-es quanto s primeiras aplicaes da hipnoseem cirurgias, apresentando efeitos analgsicos.

    Em 1996 Holroyd destacou-se pela amplareviso que fez entre os aspectos moduladoresda dor por meio da tcnica de hipnose. O mritonesta reviso se d na explicao sobre as alte-raes nos padres de excitao e de inibiodo crebro, demonstrando que a hipnose tantoamplifica quanto diminui a resposta cortical sub-seqente a um estmulo sensorial, dependendoda sugesto anterior conscientizao.

    Atualmente, tem-se estudado uma amplagama de procedimentos hipnticos em diversascondies lgicas, tais como: cncer, queimadu-ras, procedimentos pr e ps-cirrgicos e diver-sas condies dolorosas crnicas (neuralgia dotrigmio, neuropatias perifricas, dor talmica etc).

    Pode-se concluir que a hipnose apenas umatcnica auxiliar no tratamento da dor. Nos casosde dor aguda, provoca-se uma analgesia de for-ma rpida atravs do transe hipntico, resultan-do num alvio imediato ao paciente, diminuindoseu sofrimento. Na dor crnica, uma simples anal-gesia no colabora com o estado atual do paci-ente, tornando-se necessrio seu manejo atravsda hipnoterapia, visto que a tcnica hipntica somente uma das ferramentas necessrias noprocesso teraputico, havendo a necessidade doenvolvimento de todos os fatores estabelecidosanteriores ao tratamento para tal procedimento2.

    MECANISMOS DE AO HIPNTICA

    Existe uma gama muito ampla sobre as vriasexplicaes tericas sobre os efeitos produzidospela hipnose.

    Clasilneck e Hall (1985)5 fazem uma descri-o detalhada destas teorias. Contudo, geralmen-te as teorias podem ser divididas em dois tipos:teorias do estado versus teorias do no-estado, eteorias fisiolgicas versus teorias psicolgicas.

    As teorias do estado sobre a hipnose supemque o estado de transe qualitativamente dife-rente de outras experincias mentais humanas.Neste ponto de vista, a capacidade hipntica oucapacidade para o transe uma espcie de tra-o relativamente estvel, apresentando fortes di-ferenas individuais. O sucesso desta teoriaimplica: motivao favorvel, exatido na percep-o e aptido. Por outro lado, a teoria do no-estado sugere que os fenmenos hipnticos

    provm de caractersticas psicolgicas e sociais,tais como a motivao, as expectativas de entrarem transe, a crena e a f no hipnotizador, o de-sejo de agradar ao hipnotizador e uma experin-cia positiva com o transe inicial.

    As teorias do estado e no-estado esto ba-sicamente vinculadas suscetibilidade do paci-ente frente ao hipnotizador, aceitao e interaoda pessoa que entra em transe e deseja experien-ciar aquilo que se pede, num campo de interaoe confiana, o rapport. No devemos esquecer-nos das habilidades de um bom hipnotizador,marcado pela sua conduta tica, com objetivosclaros voltados melhora do paciente.

    As teorias fisiolgicas/reflexolgicas da hip-nose alegam que os fenmenos hipnticos es-to baseados e associados a certas mudanasfisiolgicas. Tal teoria advm dos trabalhos deI.P. Pavlov, que verificou em seu laboratrio de fi-siologia animal a repetio de um estmulo con-dicionado sem o adequado reforamento,determinado por um estado de sonolncia emvrios de seus animais, observando que algunschegavam a dormir. Notou que a poro cerebralafetada pelo estmulo tornara-se o centro do pro-cesso inibitrio, irradiado em funo de um est-mulo dbil, rtmico, montono, persistente e sem oreforamento adequado9.

    As teorias psicolgicas, em grande parte,esto voltadas s explicaes da teoria do no-estado, como tambm teoria da resposta con-dicionada sobre a hipnose. As teorias fisiolgicasso, em geral, mais aceitas por apresentaremmodelos explicativos mais antigos, e tm sidosubstitudas em grande parte pelas explicaespsicolgicas. Porm, h controvrsias quando sediscutem a teoria da neodissociao e a possibi-lidade da sugesto hipntica em reduzir a dor pelaativao de um sistema inibidor de dor1,11.

    evidente que h uma discrdia consider-vel com respeito natureza e origem dos fen-menos hipnticos. Desta forma, a hipnose noparece ser um estado qualitativamente de certasexperincias que ocorrem freqentemente. Em-bora a maioria das pessoas experiencia algumfenmeno hipntico, relativamente poucos po-dem experimentar a maioria dos fenmenosproporcionado pela sua aplicao6.

    HIPNOSE NO CONTROLE DA DOR

    Ao iniciar o processo de preparao da tc-nica de hipnose no controle da dor, necessrio

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    que se verifiquem alguns aspectos importantes,segundo6:1. O estabelecimento da relao teraputica.2. O esclarecimento de conceitos errneos so-

    bre a hipnose.3. A possvel explorao de sua capacidade para

    o transe. importante comprovar a capacidade para

    o transe, a fim de evitar fracassos posteriores nainduo do mesmo. Todavia, muitas pessoaspossuem capacidade hipntica, variando entregrau leve at o mais profundo. Diferenas indivi-duais significativas ocorrem, porm uma grandeparcela das pessoas capaz de experimentar,ao menos, um transe leve. Quem nunca se desli-gou dos problemas ao tomar banho cantando?Quem j no deu um telefonema e esqueceu paraquem estava ligando?

    H tambm a possibilidade de utilizao detestes especficos para medir a capacidade parao transe, tais como: Stanford Hypnotic Suscepti-bility Scale SHSS14 e Harvard Group Scale ofHypnotic Susceptibility HGSHS13.

    Provas de pr-induo tambm so muitoutilizadas:1. Levitao e peso das mos e dos braos.2. Balano da postura.3. O pndulo de Chevreul.4. Atrao e repulso das mos.

    Passos e Labate (1998)8 (ver Tabela 13.1)esclarecem que 95% da populao normal sohipnotizveis em maior ou menor grau, conformeas diferentes etapas de profundidade hipntica,

    bastante satisfatrios. Em estudos experimentais,observaram-se resultados obtidos na ltima d-cada que chegam a 60% de satisfao, quandocomparados a certos fatores: cognitivos e per-ceptivos, emocionais, comportamentais e inter-pessoais. Tais fatores so relatados pelo pacienteao ser avaliado de forma subjetiva, apresentandoresultados objetivos quanto percepo que fazde si, dos outros e do mundo, experienciandosentimentos mais agradveis aps a aplicaoda tcnica hipntica. Tais resultados so obser-vados atravs da Visual Analogue Scale VAS,que mede a intensidade do sofrimento do in-divduo atravs de uma linha imaginria oudescrita atravs de um trao na horizontal, comapenas 10 cm. Do lado esquerdo da escala,nota-se um extremo prazer e, do lado direitoda escala, uma dor considerada insuportvel1.

    Em contrapartida, Scott (1974)12 identificouque os pacientes estudados em laboratrio apre-sentaram diferenas significativas quando com-parados a indivduos com patologias dolorosas,em relao suscetibilidade para o transe hipn-tico. Os sujeitos experimentais recebem o est-mulo doloroso e, aps o transe, no relatam dor,enquanto os sujeitos que anteriormente apre-sentavam alguma condio dolorosa no mais asentem. Nota-se que as diferenas esto relacio-nadas ao estado que o sujeito se encontrava an-tes da introduo do teste de suscetibilidade, poisaqueles que j apresentavam uma condio do-lorosa anterior se mostraram mais susceptveis experincia, enquanto isso no acontecia aossujeitos experimentais.

    Contudo, sob o enfoque cognitivo-compor-tamental a suscetibilidade hipntica de um paci-ente no tem importncia alguma, visto que ashabilidades podem ser aprendidas e ensinadasao paciente. Desta forma, as atitudes, expectati-vas e crenas do paciente desempenham enor-me papel no resultado do tratamento3,4.

    REQUISITOS PARA A OTIMIZAO DOS

    RESULTADOS

    de extrema importncia ter-se um diag-nstico correto da sintomatologia, isto , o in-cio da condio lgica, o local do nicio e se hirradiao, tempo de durao, a freqncia comque ocorre, a intensidade, as qualidades afeti-vo-emocionais, situaes especficas em quesente o aumento e a diminuio da intensida-de, se nota o que faz piorar ou melhorar, com o

    Tabela 13.1

    Etapas Porcentagem

    No Hipnotizveis 5%

    Hipnoidal 95%

    Leve 85%

    Mdia 60%

    Profunda 15%

    Sonamblica 10%

    sendo:O emprego da tcnica de hipnose no contro-

    le da dor tem sido demonstrada com resultados

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    intuito de descobrir sua etiologia. fundamen-tal durante a histria clnica colher o mximode informaes possveis sobre como o paci-ente a percebe em sua subjetividade para quepossamos torn-la objetiva. O uso de diagramacorporal colabora para que o clnico identifique asua localizao e melhor diferenciao da dor lo-calizada, da dor referida, irradiada, superficiale profunda10.

    Antes de definir qual tcnica ser utilizada, importante verificar quais so as estratgias depensamento que facilitam o alvio da dor, e quaisas que acentuam a intensidade da dor percebi-da, para que possamos, de forma cuidadosa, ela-borar as sugestes teraputicas.

    Efeitos adversos potenciais podem ocorrerem funo de:

    1. Uso por clnicos adequadamente treinados.

    2. Uso no mbito do treinamento do profissional.

    3. Tratar somente os problemas para o qual foitreinado.

    4. Treinamento em hipnose no uma alternativapara um adequado treinamento clnico em ge-ral, visto que a seleo de uma tcnica emparticular em uma dada situao o resultadode um julgamento clnico que deve ser basea-do no que ir melhor adequar-se s necessi-dades de cada paciente.

    Antes de escolhermos a tcnica especficapara aplicao da hipnose, deve-se levar em con-ta alguns fatores importantes:

    1. Avaliao mdica padro utilizada antes dequalquer tratamento para a dor.

    2. No utilizar sem avaliao adequada da natu-reza da dor.

    3. Avaliar a motivao, os objetivos teraputi-cos e as expectativas de resultados do trata-mento.

    4. Exigir estabelecimento de um bom rapport.

    5. Discutir experincias passadas, crenas e pre-ocupaes que os deixaram precavidos como uso da hipnose.

    6. Identificao das modalidades cognitivas dopaciente.

    7. Salientar a importncia da participao ativa edo envolvimento desta participao.

    Aps a avaliao ativa do profissional queir aplicar a hipnose, procede-se escolha dastcnicas especficas a serem aplicadas a cadacaso.

    TCNICAS ESPECFICAS PARA O ALVIO

    DA DOR

    1. Alucinao de anestesia:

    a. tornar uma rea corporal insensvel dor;

    b. paciente fica incapaz de sentir dor;

    c. sente adormecimento;

    d. usa da familiaridade com esta sensao;

    e. remetemos o paciente a experincias pas-sadas com anestsicos;

    f. um fenmeno mais difcil de alcanar doque outras tcnicas.

    2. Diminuio da dor:

    a. reduo da intensidade da dor sensorial;

    b. uso de metforas:

    reduo do volume;

    reduo da intensidade da luz;

    resfriamento do calor.

    c. mais eficaz quando pareada com a feno-menologia do paciente relativa intensida-de ou qualidade de sua dor.

    3. Substituio sensorial:

    a. sensao intolervel substituda por ou-tra, no necessariamente agradvel:

    prurido, frio e formigamento.

    b. permite ao paciente saber que a dor aindaest presente;

    c. assegura a continuidade da ateno m-dica;

    d. sensao menos desagradvel maisplausvel do que a no sensao ou sen-saes agradveis;

    e. ganhos secundrios ainda podem ser obti-dos, mas sem o sofrimento secundrio;

    f. pode usar temporariamente enquanto tra-balha a diminuio dos ganhos secund-rios debilitantes.

    4. Deslocamento da dor:

    a. dores bem localizadas;

    b. deslocar de uma rea do corpo para outramenos debilitante;

    c. mobilizar geralmente mais fcil que eli-minar;

    d. tcnica temporria valiosa para ganhar aconfiana do paciente;

    e. em pacientes pessimistas quanto aos resul-tados;

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    f. aproveita de deslocamentos espont-neos da dor e amplifica-se em espiral, porexemplo.

    5. Dissociao:a. paciente continua a descrever a dor preci-

    samente;b. com sensao de distncia e sem envolvi-

    mento afetivo;c. ainda percebida, mas no sofre mais com

    ela;d. teis em pacientes relativamente imveis:

    cirurgias; procedimentos dolorosos; confinados ao leito.

    Por exemplo: Levar o paciente para outro lu-gar. O corpo pode permanecer, mas, mentalmen-te, deslocado para um local prazeroso.

    ENTENDENDO O ALVIO DA DOR

    O objetivo principal que o profissional desade tem para com seu paciente vtima de trau-ma ou leso proporcionar-lhe o alvio da dor,ativ-lo e reabilit-lo, alm do perodo do pro-cesso hipntico.

    A sugesto ps-hipntica apresentada aopaciente durante o estado hipntico, associadoa um sinal condicionado (Sinal Hipngeno) paraser realizada aps a consulta, quando j no hajamais relacionamento direto entre o hipnlogo e opaciente. Quando solicitamos ao paciente queconcentre sua ateno no que ser sugerido, viade regra, o aprendizado da sugesto ps-hipn-tica tornar mais fcil o condicionamento, isto ,a associao da sugesto com o fator sinal de-sencadeador. A sugesto dever ser transmitidano momento em que o paciente estiver se sentin-do feliz, para que, ao ser executada, possa voltarquele momento de felicidade.

    A idia central do sinal hipngeno tornar aaplicao nas prximas consultas mais rpidasna sua induo, como, por exemplo, um apertode mos, onde o hipnotizador pressiona o pulsodo paciente com o dedo polegar e o indicadorpor baixo, determinado pelo tom de voz imperati-vo, como: Joo, de hoje em diante, em nossasprximas consultas, quando eu tocar em suasmos deste modo e pronunciar seu nome, segui-do das palavras feche os olhos, relaxe e aprofun-de-se, voc estar aberto s sugestesteraputicas e imediatamente fechar os olhos,relaxar e se aprofundar, e permanecer abertos sugestes teraputicas7.

    Existem duas formas de sugesto ps-hip-ntica: a simples e a complexa. A forma simplesse d quando se sugere ao paciente que, ao sairdo transe, execute algo imediatamente. Na formacomplexa, sugere-se que ele o execute somentequando for apresentado um determinado sinal ounum momento especfico do que lhe sugeridoem transe, geralmente na etapa sonamblica8.

    Essa frase dever ser repetida vrias vezesdurante o transe hipntico, de forma que o sinalhipngeno seja condicionado e o paciente, ao sairdo transe, lembre-se a cada vez que o hipnlogocumpriment-lo da mesma forma.

    Costuma-se sempre ao final do transe trans-mitir ao paciente idias confortveis, para que, aovoltar ao seu estado de conscincia plena, en-contre-se mais feliz e relaxado.

    O Sinal Hipngeno, tambm conhecido porSigno Sinal ou Sinal Hipnognico, tem como idealcriar a sugesto hipntica e, para tal, necess-rio que se observem alguns critrios propostospor Ferreira7:a. ateno voltada ao hipnlogo;b. o paciente dever estar-se sentindo feliz no mo-

    mento da sugesto;c. motivao para aceit-la;d. lgica frente situao;e. especificidade para a situao proposta;f. focalize o objetivo;g. estabelea relao entre o signo sinal e o

    objetivo;h. imaginada pelo paciente atravs dos seus cin-

    co sentidos;i. repetida de seis a dez vezes na prpria con-

    sulta e nas consultas seguintes;j. associe metforas que aumentem a eficin-

    cia.

    AUTO-HIPNOSE

    A auto-hipnose um estado altamente sen-svel, no qual as sugestes so dirigidas a si mes-mo. O hipnlogo deve seguir risca os critriosquanto seleo de pacientes que devem serensinados, de modo que proponha o aumentono estado de relaxamento, concentrao, auto-confiana, prolongando a sua ao no alvio dador. Porm, nunca devemos esquecer a premis-sa bsica da aplicao: Jamais remover um sin-toma sem saber para que ele serve8.

    O ensino da auto-hipnose apresenta riscospara o paciente quando a aplicao no segue

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    critrios rgidos, quando o hipnlogo inexperien-te deixa o paciente chegar a etapas profundas,onde alucinaes e fantasias levam o indivduo falta de controle da situao, ocasionando danosindesejveis.

    Informaes quanto ao trmino da auto-hip-nose devem ser fornecidas para que, assim queo paciente desejar, seja desipnotizado, acrescen-do-lhe sugestes quanto ao trmino. Poder serdito ao paciente que, quando desejar sair, relaxea ponto de entrar num sono fisiolgico, propor-cionado pelo bem-estar que estiver sentindo nomomento do transe hipntico auto-aplicvel.

    A maioria dos pacientes pode aprender adesenvolver suas habilidades para o desenvolvi-mento da analgesia de forma que se tornem pro-fissional adquirindo maior segurana no modocom que enfrenta a dor.

    PRINCIPAIS APLICAES CLNICAS

    A eficcia da aplicao depender tanto dahabilidade do terapeuta quanto da disposio emotivao do paciente. O treinamento e aperfei-oamento em hipnose clnica se do em grandesescolas mundo afora. No Brasil, no entanto, estrestrito a algumas Faculdades de Medicina e de-partamentos especficos, tais como: Departamen-to de Psicobiologia da Escola Paulista de Medicina Unifesp; Hospital do Servidor Pblico Munici-pal de So Paulo; Universidades e Faculdadesde Medicina Estaduais e Federais; alguns Institu-tos e Clnicas particulares; e pela Sociedade Bra-sileira de Hipnose e suas regionais.

    O uso deve ser restrito, no intuito de se reali-zar pesquisas e ensino, dirigidos a mdicos, psi-clogos e dentistas, segundo o Decreto no

    51.009, de 23 de julho de 1961, promulgado peloPresidente da Repblica, regulamentando o usoa mdicos; Decreto no 53.461, de 21 de janeirode 1964, regulamentando o uso aos psiclogos;e Lei no 5.081, de 24 de agosto de 1966, regula-mentando a prtica de hipnose pelos dentistas8.

    A hipnose pode ser aplicada a vrios tiposde dor, que podem ser: aguda ou crnica.

    a. Dor Aguda: ps-operatrio, queimados, pro-cedimentos mdicos de forma geral, parto eem pacientes odontolgicos.

    b. Dor Crnica: cncer, cefalia, lombalgia, do-res musculares, dor fantasma, falciforme e deorigem psicolgica.

    Em casos de dores agudas, a aplicao dahipnose indicada na ausncia de analgsicos econtra-indicada para potencializ-los. A reduopode ser significativa e produzir efeitos imediatose com durao de at um dia inteiro, produzindoefeitos analgsicos e at ansiolticos.

    J na dor crnica os resultados so mais efi-cazes, apresentando melhoras na reduo doquadro lgico, bem como na recuperao, au-mentando o apetite, cooperando com outros tra-tamentos. Seus efeitos colaterais so parecidoscom os dos narcticos e colaboram na melhorado quadro afetivo-emocional.

    CONSIDERAES FINAIS

    1. Relao entre hipnozatibilidade e analgesiaainda controversa.

    2. Qualquer paciente motivado obtm benef-cios e algum alvio.

    3. Reduo da dor pode envolver o componen-te sensrio-discriminativo ou o motivacional-afetivo.

    4. Pode ter efeito ansioltico, mas a analgesiano depende deste efeito.

    5. eficaz para uma ampla gama de condiesclnicas.

    6. Efeito ocorre no nvel mais elevado da orga-nizao neural.

    7. Natureza e localizao da dor no relevan-te para o sucesso.

    8. Tcnicas evoluem com maior compreensodo comportamento humano.

    9. nfase na participao ativa do paciente auto-hipnose.

    10. Prticas autoritrias do passado tem sidoabandonadas.

    11. Tcnicas humansticas so mais comunsatualmente.

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