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54 55 NATUREZA DOS TIPOS DE ESTRUTURAS SINTÁTICAS LATINAS José Mario Botelho (FFP-UERJ e ABRAFIL) RESUMO Para este estudo da morfossintaxe da língua latina, valorizamos a relação que se estabelece entre termos das estruturas lingüísticas das odes do Líber Primus, de Horácio, considerando as estruturas de base, sob a concepção da existência de uma ordem natural. É que sendo o latim uma língua de declinações e, em conseqüência disso, não sendo obrigatória a ordem dos termos na frase, de certo, a definição de uma padronização quanto à estruturação frasal se torna difícil. Contudo, podemos conceber uma ordem natural da língua em si, principalmente na prosa, em que se iniciava a frase com o termo nominativo (sujeito) e se finalizava com o verbo, como o fizeram Marouzeau (1953) e Ernout et Thomas (1959). Corroborados por Marouzeau constatamos que há uma relativa liberdade na ordem das palavras nas estruturas frasais do latim, e que essa liberdade está sempre condicionada a um dos diversos fatores (de uso, de sentido, de estilo, de ritmo), em que certas leis ou tendências podem ser observadas. Palavras-chave: Morfossintaxe latina, padronização frasal, colocação das palavras, ordem natural Introdução Considerando a estrutura oracional do português escrito, mormente no que se refere à colocação das palavras, que se organizam em sintagmas de funções sintáticas diversas, poderíamos dizer que se trata de uma língua SVO (Sujeito- verbo-complemento), já que os seus termos se organizam preferencialmente em ordem direta 1 . Ou seja, há uma padronização estrutural prevista na língua portuguesa. Entretanto, tal padronização não caracteriza a língua latina, já que, sendo ela uma língua de declinações, em que ocorriam alterações morfossintáticas, causadas pelo acréscimo de desinências casuais, conforme a função sintática que uma dada palavra exercesse na estrutura lingüística, a ordem dos termos na frase não era especialmente direta e nem se fazia obrigatória. Sobre isso afirmam Ernout et Thomas (1959.), corroborando Marouzeau 2 , a quem faz referência em nota de rodapé: A manutenção da flexão nominal tem feito com que a ordem das palavras em latim nem sempre se prenda à significação sintática, cf. acima § 10. Constatam-se, portanto, certos hábitos ou preferências que não são precisos. (ERNOUT ET THOMAS, 1959, § 188, p. 161) (Tradução livre) Figura 3 René Magritte. La Condition Humaine. 1935. Óleo sobre tela. 100 X 81 cm. Genebra, Coleção Simon Spierer.

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    NATUREZA DOS TIPOS DE ESTRUTURAS SINTTICAS LATINASJos Mario Botelho (FFP-UERJ e ABRAFIL)

    RESUMOPara este estudo da morfossintaxe da lngua latina, valorizamos a relao que seestabelece entre termos das estruturas lingsticas das odes do Lber Primus, deHorcio, considerando as estruturas de base, sob a concepo da existncia deuma ordem natural. que sendo o latim uma lngua de declinaes e, em conseqncia disso, nosendo obrigatria a ordem dos termos na frase, de certo, a definio de umapadronizao quanto estruturao frasal se torna difcil. Contudo, podemosconceber uma ordem natural da lngua em si, principalmente na prosa, em que seiniciava a frase com o termo nominativo (sujeito) e se finalizava com o verbo, comoo fizeram Marouzeau (1953) e Ernout et Thomas (1959).Corroborados por Marouzeau constatamos que h uma relativa liberdade na ordemdas palavras nas estruturas frasais do latim, e que essa liberdade est semprecondicionada a um dos diversos fatores (de uso, de sentido, de estilo, de ritmo),em que certas leis ou tendncias podem ser observadas.Palavras-chave: Morfossintaxe latina, padronizao frasal, colocao das palavras,ordem natural

    Introduo

    Considerando a estrutura oracional do portugus escrito, mormente noque se refere colocao das palavras, que se organizam em sintagmas de funessintticas diversas, poderamos dizer que se trata de uma lngua SVO (Sujeito-verbo-complemento), j que os seus termos se organizam preferencialmente emordem direta1 . Ou seja, h uma padronizao estrutural prevista na lngua portuguesa.

    Entretanto, tal padronizao no caracteriza a lngua latina, j que, sendoela uma lngua de declinaes, em que ocorriam alteraes morfossintticas,causadas pelo acrscimo de desinncias casuais, conforme a funo sinttica queuma dada palavra exercesse na estrutura lingstica, a ordem dos termos na fraseno era especialmente direta e nem se fazia obrigatria. Sobre isso afirmam Ernoutet Thomas (1959.), corroborando Marouzeau2 , a quem faz referncia em nota derodap:

    A manuteno da flexo nominal tem feito com que a ordem daspalavras em latim nem sempre se prenda significao sinttica,cf. acima 10. Constatam-se, portanto, certos hbitos oupreferncias que no so precisos. (ERNOUT ET THOMAS, 1959, 188, p. 161) (Traduo livre)

    Figura 3

    Ren Magritte. La Condition Humaine. 1935. leo sobre tela. 100 X 81 cm.Genebra, Coleo Simon Spierer.

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    Em decorrncia dessa assero, poderamos concluir que as palavraspoderiam ser colocadas em qualquer ordem e que o resultado de ordem comunicativaseria o mesmo. Contudo, essa concluso no correta ou pelo menos no conveniente, porquanto a ordenao das palavras em latim no era exatamentelivre.

    Em relao a essa possvel liberdade, Marouzeau (1953, p. ix) observa quese em latim a ordem das palavras livre, ela no indiferente, uma vez que aescolha da construo sempre determinada ou pelo uso, ou pelo sentido, ou peloestilo, ou ainda pelo ritmo, cuja sistematizao se torna difcil de se estabelecer,embora a sua efetivao se d sob certas leis ou tendncias. Embora o autor noesclarea a que modalidade da lngua ou a que gnero de texto se refere, pode-sedepreender que se refere ao texto literrio, mais provavelmente poesia, como sepode observar no seguinte fragmento:

    Explica-se, enfim, de bom grado a escolha da ordem porpreocupaes com a harmonia ou com a eufonia (boa reproduodos sons), pela tendncia a realizar certas formas estruturais(aproximaes ou oposies, paralelismos, quiasmos). Emparticular, no enunciado versificado, busca-se ou a comodidademtrica, ou um artifcio que se relacione posio inicial ou finalde um termo. (MAROUZEAU, 1953, p. x) (Traduo livre)

    Principalmente, porque o autor faz uma ressalva, afirmando que noenunciado versificado particularmente se ressalta ou a comodidade mtrica ou apreferncia de uma colocao inicial ou final de um certo termo, como se podeconstatar no fragmento supracitado.

    Na prosa, por exemplo, prevalecia uma ordem natural prpria da ndole dalngua: normalmente a frase iniciava-se com o termo nominativo (sujeito) e sefinalizava com o verbo. Na poesia, em que a liberdade de colocao se nos parecemais livre, tambm no o , pois o resultado de ordem comunicativa quase semprese altera, sugerindo interpretaes variadas, que caracterizam um uso estilstico.

    De fato, quando a linguagem est a servio da forma versificada, comoocorre no texto potico e em especial na poesia latina, um elemento especfico paraa determinao da ordem das palavras se torna fundamental: a metrificao, quefaz com que a construo da frase seja considerada em funo da estrutura mtricaem detrimento da estrutura sinttica esperada aquela que justificaria a ordemnatural da lngua.

    Pode, no obstante, haver entre um enunciado potico e um enunciadono-potico uma coincidente organizao sinttica, como tambm pode no havertal coincidncia ou ainda um verdadeiro conflito entre as divises dos enunciados,

    uma vez que as divises mtricas no se estabelecem da mesma forma que asdivises do enunciado no-potico.

    Da, a necessidade de se examinar a ordem natural das palavras nasestruturas oracionais latinas, considerando a ordem das palavras das estruturasoracionais denominadas regulares e a possibilidade de outras organizaes a servioda metrificao, para depois observar o comportamento das formas nominais dosverbos e os termos a que se relacionam nas estruturas das odes do Liber Primus,de Horcio, que sero o objeto da nossa anlise.

    1 A ordem das palavras na estrutura oracional do latimPrimeiramente, convm ressaltar que em portugus as estruturas

    oracionais se organizam em sintagmas (termos sintticos) e no exatamente empalavras3 , como comum em latim, j que nas estruturas oracionais latinas umapalavra de funo perifrica, no-raro e at mesmo em conformidade com umaregra de colocao, se apresenta distante do seu ncleo4 .

    Essa observao se faz mister em virtude de terem os sintagmas doportugus uma constituio diferente das estruturas latinas, a qual poderamosconsiderar tambm sintagmas Marouzeau (Op. cit., p. 1-31) denominou gruposnominais (Les groupe nominaux) os sintagmas nominais.

    As regras de colocao das palavras que compem os sintagmas dasreferidas lnguas no so as mesmas. Em decorrncia disso, uma colocao de umadeterminada classe de palavra, contrariando a regra preestabelecida da lnguaportuguesa, constitui uma das figuras de sintaxe (anstrofe, hiprbato, snquiseou prolepse), o que configura um uso estilstico, j que sempre causa um efeitoexpressivo.

    Certamente, a mesma anlise deve ser feita sobre uma estrutura latina emque se verifica uma colocao diferente daquela descrita pelos especialistas emsintaxe latina sob a denominao de ordem natural5 .

    Assim como o fez Marouzeau, o mtodo que adotaremos na anlise dasestruturas sintticas da lngua latina consiste em interpret-las, considerando asconstrues de base, as quais se estabelecem a partir dos grupos sintticos, queaquele autor assim identificou: adjetivosubstantivo, preposioregime,cpulaatributivo, verbosujeito e outros, sob a perspectiva do Estruturalismo.

    1.1 Generalidades quanto colocao de palavrasConcebendo uma ordem natural, que se estabelece por conta da ndole

    da lngua, a estrutura latina se inicia com uma palavra em nominativo e se encerracom o verbo mais comumente na prosa. Apesar de uma relativa liberdade na poesia,muitos so os exemplos que comprovam essa ordem natural da lngua latina,conforme se pode observar nos exemplos abaixo, retirados das odes de Horcio:

    (01) Nil mortalibus ardui est. (III, 37) No h nada de rduo para os mortais.

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    (02) Quis Martem tunica tectum adamantina / digne scripserit? (...) (VI, 13-4) Quem cantar digamente Marte, vestido com uma tnica dura como odiamante?

    (03) (...) Teucer Salamina patremque / cum fugeret, (...) (VII, 21-2) QuandoTeucro fugia do pai em Salamina, (...)

    (04) (...) / cum tu coemptor undique nobilis / libros Panaeti Socraticam et domum/ mutare loricis Hiberis, / pollicitus metiora, tendis? (XXIX, 13-6) (...), jque tu, que prometeras coisas melhores, visas a trocar pelas trincheirasibricas a famlia socrtica e os livros do ilustre Pancio, comprados portodas as partes?

    Convm observar que, alm desses acima, foram poucos os exemplosencontrados nas trinta e oito odes do Liber Primus, em que a estrutura oracional seinicia com um nominativo e termina com o verbo. Com formas verbo-nominais,alm do transcrito em (04), que de fato se inicia com a conjuno, nenhum outroexemplo foi encontrado nas odes analisadas.

    Ao iniciar o seu quarto captulo, que trata das estruturas do enunciado,Marouzeau, observa que um dos princpios mais comumente invocados paraexplicar a construo da frase latina aquele que atribui um valor excepcional querseja da posio inicial, quer seja da posio final (Op. cit., p. 87). Tambm naopinio do autor a palavra que inicia a estrutura frasal quase sempre a maisimportante, mas no exatamente a posio inicial que lhe confere tal valor, j queum determinado termo pode desempenhar um papel muito importante na frase semque ocupe a posio inicial.

    Em relao colocao do verbo, Marouzeau (Op. cit., p. 44) afirma quea posio final a mais freqente e pode ser considerada como a posio debase. Em seguida, observa alguns casos em que o verbo, por conta de seu sentidoprprio, ocupa a posio inicial, como o caso daqueles que exprimem uma vontade,uma certeza ou uma afirmao forte. Depois faz aluso ao emprego do verbo nointerior da frase, afirmando que tal colocao parece de ordinrio subtrair-se dequalquer explicao.

    Tal considerao explicaria em latim a freqente incluso do verbonos limites da proposio, particularmente depois de uma palavrade valorao. (Id., ibid., p. 52) (Traduo livre)

    Marouzeau assevera que os fatos latinos, no que se refere posio queo verbo ocupa na estrutura oracional, se acomoda mal a qualquer explicao. Nose acomoda a uma explicao que fundamenta num uso antigo, nem a uma que serefira a uma tendncia da lngua, nem a outra que justifique o deslocamento do

    verbo por fora da atrao de uma outra palavra com a qual se relaciona.

    Por um lado, a posio interior, longe de se apresentar como umasobrevivncia, aparece antes como certa inovao, em todo casocomo um fenmeno em progresso (Cf. mais adiante 142). Emsegundo lugar, se verdade que o verbo, no interior da frase, seliga preferencialmente a uma palavra importante ou posta emdestaque. (Id., ibid., p. 52) (Traduo livre)

    Por fim, o autor assume que havia uma tendncia no latim em se colocar overbo no final da estrutura oracional e que se deve, pois, deixar de lado as diversasexplicaes sobre as outras colocaes, embora no despreze o fato de que foifreqente e crescente a colocao do verbo no interior das estruturas oracionaisno decorrer do tempo.

    Ernout et Thomas (Op. cit.), depois de afirmar que o verbo habitualmente colocado no final da estrutura oracional6 , observa que em muitas delas pode serencontrado em outras posies, comprovando tal assero com exemplos de Csar,Terncio e Petrnio. Tambm encontramos nas odes analisadas um nmero muitogrande de estruturas em que tanto o nominativo como o verbo se colocam emoutras posies; poucas so aquelas em que o verbo finaliza a estrutura, e aindaassim, sem que se iniciem com o nominativo; e da mesma forma, em um nmeromuito pequeno o nominativo inicia a estrutura oracional e, quando isso se d, overbo se encontra nas mais variadas posies.

    A segunda posio da estrutura oracional normalmente ocupada poruma palavra acessria, que pode ser uma complementao (termo circunstancial)do verbo ou um predicativo e, no-raro, uma conjuno, no caso das estruturasoracionais subordinadas ou coordenadas. Ernout et Thomas (Op. cit.) observamque tambm muito comum a ocorrncia de pronomes nessa posio.

    (05) Quem uirum aut heroa lyra uel acri / tibia sumis celebrare, Clio? (XII, v. 1-2) Que homem ou heri tu, Clio, escolhes para celebrar com a lira ou coma flauta aguda?

    (06) (...). Quae generosius / perire quaerens nec muliebriter / expauit ensem (...)(XXXVII, v. 20-1) Ela, desejosa de morrer mais dignamente, nem temeu, maneira das mulheres, a espada (...)

    Poucas foram as estruturas encontradas com essas caractersticas nasodes horacianas, pois o segundo termo pode ser de qualquer tipo, mesmo quandoa estrutura se inicia com nominativo. E quando se trata de estruturas oracionaissubordinadas, a conjuno que as inicia na maioria das ocorrncias.

    (07) (...), dum pudor / inbellisque lyrae Musa potens uetat / laudes egregii Caesaris

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    et tuas / culpa deterere ingeni. (VI, v. 9-12) (...), quando a timidez e a musasoberana de minha lira imprpria para a guerra se opem a diminuir, por faltade gnio, as glrias do egrgio Csar e as tuas.

    O vocativo, que uma frase nominal, ordinariamente posposto estruturaoracional. No entanto, por ser uma estrutura independente, pode ser colocado emoutras posies como ocorre no portugus; at mesmo no interior de uma estruturaoracional.

    (08) (...), neu sinas Medos equitare inultos / te duce, Caesar. (II, v. 51-52) (...)e nem permitas, sendo tu o chefe, galoparem os medos impunes, Csar.

    (09) Nos, Agrippa, neque haec dicere nec grauem / Pelidae stomachum (...)/ conamur,tenues grandia, (...) (VI, v. 5-9) Ns, Agripe, fracos, no tentamos celebrarestas grandiosidades nem a rigorosa clera do filho de Peleu, (...)

    (10) (...). O beate Sesti, / uitae summa breuis spem nos uetat inchoare longam. (IV,v. 14-5) afortunado Sstio, a breve totalidade da vida impede-nos deconceber uma longa esperana.

    1.2 Estruturas com determinante (Dte) e determinado (Ddo)Quanto relao do determinante (termo perifrico, do tipo adjetivo) com

    o determinado (termo nuclear), observa-se que natural a sua colocao anteriorao termo a que se refere o seu ncleo. Essa relao constitui um dos gruposnominais, de que trata Marouzeau (Op. cit.), definindo-o como a unio de doistermos nominais, dos quais um o determinado o ncleo de natureza substantiva e o outro, o determinante o perifrico de natureza adjetiva.

    Assim, o adjetivo precede o substantivo na maioria das vezes. Contudo,caso o adjetivo tenha valor de uma determinao atributiva, como o caso dosparticpios como em (12), ou sirva para classificar uma categoria, normalmentesucede o substantivo.

    (11) (...), / defluit saxis agitatus (Dte) umor (Ddo), / (...) (XII, v. 28) (...), a guaagitada escorre do rochedo, (...)

    (12) (...) neu populus (Ddo) frequens (Dte)/ ad arma cessantis, ad arma / concitetimperiumque frangat. (XXXV, v.15-7) (...) e que o povo numeroso noexcite s armas quem descansa, s armas e arrunem o imprio.

    Marouzeau observa que a determinao feita por um adjetivo pode ser dedois tipos: qualificativo ou discriminativo. Constitui uma qualificao quando fazreferncia s noes de grau, de beleza, ou de outros julgamentos de valor; umadiscriminao, quando exprime uma caracterstica distintiva do ser, relativa a sua

    natureza, ou funo ou constituio psquica. O autor assevera que o adjetivoqualificativo tende a preceder o ncleo substantivo a que se refere, enquanto oadjetivo discriminativo o sucede. Em seguida, faz referncias ao valor ocasional doadjetivo, uma vez que nem sempre se pode observar nitidamente a diferena entreesses dois valores. Quanto a isso, o autor ressalta o fato de certos adjetivoscomumente utilizados como discriminativos assumirem o valor qualificativo quandoprecede o seu ncleo substantivo. Sobre esse emprego intencional, afirma oseguinte:

    Para um romano, o preconceito nacional faz com que ospatronmicos Romanus e Graecus, portanto discriminativos,sejam empregados mais freqentemente, um como enaltecedor,outro como depreciativo, logo, como qualificativos. O resultado, que eles tomam muitas vezes o lugar de um qualificativo, diantede seu ncleo substantivo. (Id., ibid., p. 5)

    Como se pode constatar na afirmao supracitada, a natureza daexpressividade que direciona a escolha da colocao daquele tipo de adjetivo adjetivos tnicos por parte do usurio. Se a inteno do usurio era a pejoraoou a valorao de um desses adjetivos tnicos, que de modo geral sodiscriminativos, a ordem esperada deixava de acontecer e se estabelecia a inverso.O mesmo acontecia com os adjetivos derivados de nomes de grandes personagens(Ex.: O Socrates et Socratici uiri! Scrates e homens socrticos) e comqualquer adjetivo discriminativo que enunciasse uma caracterstica susceptvel deser interpretada como depreciativa ou valorativa (Ex.: o ferrum scriptorem! escritor duro como um ferro!). Assim, nesses casos, a ordem esperada a ordemrara, e a ordem excepcional passa a ser a ordem freqente.

    Quanto ao particpio, que normalmente funciona como determinante deum ncleo substantivo, o autor ressalta que a seu posicionamento em relao aoncleo a que se refere depende de sua natureza temporal: o particpio, por exemplo,afirma o autor, normalmente pospe o seu ncleo, uma vez que praticamentepertence categoria dos discriminativos. E como tal, pode assumir o valorqualificativo e antepor o ncleo substantivo a que se refere. Tambm pode, comodiscriminativo, assumir valores afetivos com pejorao ou valorao e serempregado como qualificativo anteposto ao ncleo com o qual se relaciona.

    Contudo, outras arrumaes, como por exemplo a interposio de um oumais elementos entre o determinante e o determinado, podem ocorrer. Nas odeshoracianas, deslocamentos de uma das palavras da estrutura oracional e at mesmode uma outra estrutura, criando disjunes, so comuns. Alm dos exemplos abaixo,em que se pode verificar uma disjuno (patrios agros e Thracio uento,respectivamente), um nmero muito grande de estruturas com o fenmeno foram

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    encontradas:

    (13) Gaudentem patrios (Dte) findere sarculo / agros (Ddo) Attalicis condicionibus/ nunquam demoueas, (...) (I, v. 11-3) Que nunca afastes, em condiesde talo, quem se alegra em abrir os campos ptrios com a enxada, (...)

    (14) (...) Thracio (Dte) bacchante magis sub inter- / lunia uento (Ddo), / (...) (XXV,v. 9-12) (...), enquanto o vento da Trcia mais se agita sob o interlnio.

    Quando o determinante se compe de mais de uma palavra (determinantedesenvolvido do tipo: (...) et praeceps Anio ac Tiburni lucus et uda / mobilibuspomaria riuis. (VII, v. 13-4) e os pomares banhados pelos mveis rios) comum serem colocados entre o seu ncleo (do determinante desenvolvido) e oncleo substantivo a que se refere os outros termos que compem o determinantedesenvolvido ou um dos termos, numa estruturao em quiasmo, como no exemplocitado.

    1.3 Colocao do adjetivo atributivoO atributivo (adjetivo em funo de predicativo do sujeito) precede o

    verbo esse (ser). Segundo Ernout et Thomas (Op. cit.), a ocorrncia de estruturaem que o atributivo pospunha o verbo caracterizava inicialmente um uso expressivo,mas que se tornou mais tarde um uso comum. De todas as odes analisadas, pormais estranho que possa parecer, foram encontradas apenas duas estruturasoracionais com atributivo e esse. Em uma delas se pode observar um atributivoposposto ao verbo.

    (15) Quamquam festinas, non est mora longa; (...) (XXVIII, v. 35) Embora tu teapresses, a demora no longa.

    Na outra estrutura, em virtude de uma certa complexidade, preferimostraduzi-la como uma estrutura de verbo impessoal de existncia (Nil mortalibusardui est (I, v. 37) No h nada de rduo para os mortais!).

    Encontramos estruturas com as expresses fixas opus est (necessrio) e est nefas ( sacrilgio) e algumas, em que o nominativo emfuno de predicativo um nome substantivo ou um pronome.

    1.4 Colocao do substantivoO complemento determinativo (Dtivo) em genitivo, que uma funo

    adjetiva, normalmente precede o ncleo substantivo (Ddo) ao qual se refere, emborano-raro aparea posposto ao substantivo; nas frmulas de filiao, como nosexemplos a seguir, o termo em genitivo sempre precede o seu ncleo substantivo,enquanto o termo em genitivo explicativo geralmente colocado aps o seu ncleo

    substantivo.Marouzeau (Op. cit.) observa que, no caso de o complemento

    determinativo ser usado com valor discriminativo (referncias a um determinadoindivduo ou a um grupo ou espcie), antecede o ncleo substantivo a que serefere. Tambm observa que h casos de expresses usuais do tipo pater famliase tribunus plebis, em que o complemento determinativo pospe o seu ncleo.

    Em caso de o ncleo se fazer acompanhado de um adjetivo (Dte), ocomplemento determinativo (Dtivo) se coloca entre o determinante e o determinado,como em (16):

    (16) audax Iapeti genus / ignem fraude mala gentibus intulit (III, v. 27-8) Oaudaz filho de Japeto (Prometeu) trouxe o fogo aos povos por um errofunesto.

    (17) Occidit et Pelopis genitor, (...), / et Iouis arcanis Minos admissus (...)(XXVIII, v. 7-9) Do mesmo modo morreu o pai de Plops, (...), e Minos,que foi admitido nos segredos de Jpiter, (...)

    O complemento em dativo correspondente, na maioria dos casos, aoobjeto indireto do portugus precede normalmente o complemento em acusativo correspondente, na maioria dos casos, ao objeto direto do portugus , e ambosprecedem o verbo. Nas odes analisadas, tal comportamento nada tem de regular; aincidncia de deslocamentos e inverses entre os termos efetiva, como se podeobservar em (18), em que a disjuno dos termos ingrato otio (em dativo) eceleris uentos (em acusativo) esto dispostos em forma de quiasmo, sendoseparados pela flexo verbal (abruit).

    (18) (...), ingrato celeris obruit otio / uentos ut caneret fera / Nereus fata: (...) (XV,v. 3-5) (...), cobriu Nereus os rpidos ventos de uma calma ingrata para queprofetizasse as terrveis perdies: (...)

    A complementao em ablativo geralmente precede o verbo a que serefere, sendo s vezes separada do verbo pelos seus complementos. Em Horcio,assim como ocorre com os complementos, a complementao em ablativo pode sercolocada em outras posies, como no seguinte exemplo:

    (19) (...), cur perirent / funditus inprimeretque muris / hostile aratrum exercitusinsolens. (XVI, v. 19-21) (...), porque perecessem rapidamente e uminsolente exrcito firmasse um arado inimigo alm dos muros.

    A aposio a ncleos substantivos normalmente feita com a posposiodo termo apositivo aposto ao ncleo substantivo a que se refere.

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    (20) (...) / grata detinuit compede Myrtale / libertina, fretis acrior Hadriae / curuantisCalabros sinus. (XXXIII, v. 14-6) (...), a agradvel Mirtale, uma libertina,mais violenta que as ondas do Mar Adritico, dobrando as enseadas daCalbria, me prendeu com algemas (numa paixo).

    A anteposio do aposto caracteriza um uso expressivo; foramencontrados nas odes analisadas quatro exemplos. Em (21), pode-se observar aantecipao de Maecenas em relao ao ncleo substantivo eques, para oqual funciona como aposto; em (22), ocorrem dois termos em funo de aposto:mares, em relao a uos e natalem, em relao a Delon, numa estruturacomplexa, em que se estabelece um quiasmo com disjuno.

    (21) (...), datus in theatro / cum tibi plausus, / care Maecenas eques, (...) (XX, v.3-5) (...), quando o aplauso foi dado a ti no teatro, estimado cavaleiroMecenas.

    (22) uos Tempe totidem tollite laudibus / natalemque, mares, Delon Apollinis (...)(XXI, v. 9-10) Vs, os machos, celebrai exatamente com tanto de louvoreso vale Tempe e Delos, ptria de Apolo (...)

    1.5 Colocao dos pronomesOs pronomes demonstrativos em funo adjetiva habitualmente so

    colocados antes do ncleo substantivo a que se referem, enquanto os pronomespossessivos so colocados depois do seu ncleo. A ordem inversa desseselementos pe o ncleo em evidncia e caracteriza um uso expressivo, conformeressaltam Ernout et Thomas (Op. cit.).

    Marouzeau (Op. cit., p. 17), contudo, afirma que tanto os demonstrativoscomo os possessivos, que se assemelham aos adjetivos discriminativos, ocupamquase sempre a segunda posio em relao ao seu ncleo substantivo.

    Ambas as ordens foram evidenciadas nas odes analisadas, porm oexemplo abaixo selecionado se nos parece interessante, pois no s ocorre aanteposio do pronome possessivo como tambm foi colocada a forma verbo-nominal (rumpere) entre ele e o seu ncleo substantivo (tuas nuptias), alm daposposio do adjetivo uetus ao ncleo substantivo regnum, com ainterposio de Priami. Os dois casos (de disjuno no primeiro e hiprbato nosegundo) criam um efeito expressivo.

    (23) (...): Mala ducis aui domum / quam multo repetet Graecia milite, / coniuratatuas rumpere nuptias / et regnum Priami uetus. (XV, v. 5-8) Com mauagouro, tu conduzes para casa aquela a quem, com exrcito numeroso,reclamar a Grcia, conjurada para romper tuas npcias e o velho reino dePramo.

    Quanto colocao dos demais pronomes, Marouzeau observa quenormalmente ocupam a primeira posio, como o fazem os adjetivos em geral.

    1.6 Colocao do advrbioEm princpio, assim como ocorre no portugus, o advrbio latino goza de

    uma considervel liberdade e pode, portanto, figurar em diferentes posies naestrutura oracional. Marouzeau tambm observou essa caracterstica do advrbiolatino.

    O autor afirma, ainda, que o advrbio pode fazer referncia a um enunciadointeiro, sem se prender a um termo em particular. Nesse caso, pode ser colocado emqualquer lugar na estrutura oracional.

    No obstante, o advrbio, que funciona como adjunto adverbial, comumente colocado imediatamente antes do termo que modifica (um adjetivo, ouum verbo, ou um outro advrbio), salvo certos advrbios como fere e potiusno sentido de somente que, de ordinrio, pospem o termo ao qual fazemreferncia. Quando modificam verbos transitivos, os complementos do verbonormalmente so colocados entre o advrbio (que aparece na primeira posio) eo verbo. No-raro, porm, a servio da mtrica ou da expressividade, so colocadosno incio ou no final da estrutura.

    (24) (...), saepe disco / saepe trans finem iaculo nobilis expedito? (VIII, v. 10-1) (ele que ) famoso muitas vezes com o disco, muitas vezes com o dardolivre para alm do alvo?

    (25) Inuicem moechos anus arrogantis / flebis in solo leuis angiportu / (...) (XXV,v. 9-10) Por sua vez, envelhecida, tu, ftil, deplorars os homens devassosnuma solitria viela, (...)

    1.7 Colocao da preposioPrimeiramente, convm ressaltar, como o faz Marouzeau, que o termo

    denominado preposio originou-se no latim da classe dos advrbios; noenunciado, tem uma funo sinttico-semntica por precisar relaes de tempo,lugar, causa, entre outras circunstncias, mais ou menos como o fazem os advrbios.

    Na poca clssica, a natureza adverbial de uma dada preposio era aindamais sentida em formas fixas. Com o passar do tempo, contudo, o termo em empregopreposicional ganha uma certa mobilidade:

    Mas, com o passar do tempo, o termo preposicional surge comoregente de uma palavra cuja funo define; da, a constituio deum grupo sinttico no interior daquele grupo se pode observarcom as variaes de ordem. (Id., ibid., p. 62) (Traduo livre)

    Normalmente a preposio inicia o grupo sinttico de que faz parte. As

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    preposies monossilbicas, por exemplo, so de modo geral seguidasimediatamente pelo seu regime. As preposies dissilbicas, no entanto, tmemprego diferente, mais autnomo: freqentemente pospem o pronome relativo(quem propter, quam circum, etc.); muito raramente pospem um substantivo;as que compem uma estrutura com o que (circumque, praeterque, ultraque,etc.), em que ocorre a intercalao de que. As dissilbicas de formao maisrecente, em que o valor adverbial amenizado, gozam de uma considervel liberdadede colocao, como o caso de circa, contra, entre outras. As preposiesdissilbicas causa e gratia raramente antepem o termo regido.

    Marouzeau observa que, de modo geral, a preposio se coloca entre oselementos de uma composio de regime complexo (estruturas em que se coordenamelementos), e que a intercalao da preposio (em um dos termos da composio) rara tanto para as monossilbicas quanto para as dissilbicas.

    Quando a preposio determina dois termos que se relacionam, como ocaso do sintagma constitudo de um nome substantivo e seu determinante oupredicativo, a preposio pode encaixar-se entre os constituintes do sintagma. Nocaso de o determinante preceder o determinado, a intercalao da preposio freqente.

    Ambos os usos so largamente encontrados nas odes horacianasanalisadas, como no exemplo abaixo em que os dois empregos ocorrem:

    (26) (...) / aut in umbrosis Heliconis oris / aut super Pindo gelidoue in Haemo?(XII, v. 6-7) () ou nas sombrias regies do Helicon ou sobre o Pindo ouno gelado Hemo?

    Apesar de essas ordens de palavras ocorrerem com mais freqncia nalngua latina, estruturas com outras ordens podem ser encontradas com uma certafacilidade, mormente na poesia, em que o poeta tem muito mais responsabilidadecom a mtrica e com a beleza e expressividade das estruturas lingsticas.

    Logo, quebras na ordem que poderamos considerar regular ou naturalpodem ser observadas na prosa e, sobretudo, na poesia. Naquela, muitas dasvezes constituem quebras aparentes, como o caso de estruturas em que ocorremseqncias fixas com um significado especfico, como o caso de opus est eest nefas; na poesia, em que tais seqncias fixas tambm ocorrem, comoconstatamos nessas odes horacianas, as quebras da ordem natural apresentamsobremaneira matizes estilsticos, j que normalmente um deslocamento ou umainverso de termos so feitos pelo artista de forma intencional e com o objetivo decriar um efeito expressivo.

    Consideraes finais

    Como se pde observar, apesar de a lngua latina apresentar uma certa

    liberdade no que se refere colocao dos termos na frase, especialmente napoesia, pode-se dizer que havia uma certa padronizao na ordem dos termos, semelhana da ordem natural da prosa, cujas estruturas sintticas se iniciavamcom o termo nominativo (sujeito) e se finalizavam com o verbo, como demonstramos.

    Nas odes horacianas, contudo, tal padronizao praticamente no existe,como se pde constatar nos exemplos descritos acima e em tantos outros. As odesde Horcio, portanto, se apresentam variadssimas no que se refere colocaodos termos na frase.

    Corroborados por Marouzeau (Op. cit.) constatamos que h uma relativaliberdade na ordem das palavras nas estruturas frasais do latim, e que essa liberdadeest sempre condicionada a um dos diversos fatores (de uso, de sentido, de estilo,de ritmo), em que certas leis ou tendncias podem ser observadas.

    Embora no seja a nossa pretenso esgotar o tema, conclumos que h umarelativa liberdade de colocao dos termos, em expresses do nome verbal, napoesia e que, nela, o resultado de natureza comunicativa quase sempre sugereinterpretaes variadas, que caracterizam um uso estilstico.

    Certo da complexidade do tema e da necessidade de uma anlise maisaprofundada no s da linguagem de Horcio nas suas diversas obras como tambmda linguagem nas obras de outros autores latinos, julgamos ser o presente trabalhouma contribuio para os interessados no assunto, sobre o qual muito ainda hpara se pesquisar.

    Referncias bibliogrficas

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    Notas

    1 Sobre a ordem direta da lngua portuguesa, confira Pontes (1987). 2 Ernout et Thomas nos remete aos estudos de Marouzeau, sobre a ordem das

    palavras na frase latina (MAROUZEAU, 1922; 1938; 1949). 3 Confira Perini (2001, p. 42-5 e 2006, p. 45-6) e Carone (1998, p. 46-50). 4 Confira Ernout et Thomas (1959, p. 161-3), Marouzeau (1953) e Garcia (2000, p.30-2). 5 Ernout et Thomas (Op. cit.) e Marouzeau (Op. cit) denominam ordem preferencialou habitual. 6 O autor utiliza o vocbulo phrase (frase), que foi substitudo porestrutura oracional por questes puramente didticas, uma vez queentendemos serem diferentes as noes de cada uma dessas estruturas lxicas:a frase todo enunciado de sentido completo, enquanto a estrutura oracional qualquer estrutura que contm verbo.

    O DESJARRETAMENTO DE JACProfa. Dra. Suzana Chwarts (USP - Universidade de So Paulo)

    RESUMONeste estudo analiso momentos da trajetria do patriarca Jac a partir do

    momento em este que se torna Israel. Tal precurso, que tem seu incio em Gn 34 eseu desfecho em Gn 49, marcado por um processo de fragilizao do patriarca emrelao a seus filhos e os habitantes da terra. Conhecido, em outros episdios,por sua sinuosidade e astcia, Jac emprega, em suas falas, uma terminologiaespecfica que se relaciona - semntica e tematicamente - idia de infertilidade.Desjarretar significa cortar o tendo de um animal, diminuindo sua fora vital, eindiretamente, sua potncia e fertilidade.Palavras-chaves: Bblia Hebraica, Infertilidade, Patriarcas, Filhos de Israel, Siqum.

    Episdio I : Jac ganha o nome Israel e perde sua perfeio fsicaA tradio em Gn 32, onde se l a respeito de um certo nervo na coxa de

    Jac, ferido durante a sua luta com um adversrio noturno e sobrenatural, vemexplicar o costume hebreu de proibir que se coma o nervo correspondente.

    Gaster1 comenta que tanto a tradio quanto o costume encontramparalelos entre algumas tribos de ndios norte-americanos, que decepam e jogamfora os tendes do veado. Os ndios Cherokee explicam essa prtica de duasformas, ambas condizentes com os princpios da mgica contagiosa. A primeiraexplicao baseia-se num principio de semelhana: se algum come um nervo queencolhe, o mesmo acontecer com o nervo correspondente em seu corpo. A segundaexplicao, tambm baseada em mimetismo, d um passo a mais: se o veado nopode andar por causa da destruio do nervo, aquele que o destri ser acometidopela mesma limitao.

    Gaster afirma que a narrativa do Gnesis fornece uma sano religiosapara uma regra que muito provavelmente era baseada em mgica contagiosa.

    A coxa era considerada, na Antigidade, o stio da procriao. Segundo amitologia grega, Dionsius nasceu da coxa de Zeus. De acordo com o pensamentoantigo, um homem machucado severamente na coxa no ser capaz de produzirprognie.2

    Em Gn 32:26, lemos que o ser noturno, ao dar-se conta de que no poderia vencerJac, toca na articulao de sua coxa wayigga bekhaf- yerekho. Westermannargumenta que h um toque de mgica nesse gesto, e que o tabu alimentcioprovavelmente tem sua explicao no fato de a coxa pertencer rea reprodutiva.3

    A combinao entre gid hanaseh e kaf hayarekh (Gn 32:33) ocorre apenasnesse versculo, mas o termo gid aparece outras vezes como nervo ou tendo. geralmente identificado como nervus ischiadicus, que significa tendo do nervona junta da coxa.4