1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e...

44
101 1. CAPÍTULO 6 HIDROQUÍMICA 6.1 Introdução Os fenómenos físicos de diluição, dispersão e sedimentação, conjugados com fenómenos biogeoquímicos, que envolvem reacções de oxidação-redução, associadas ou não com processos de precipitação, coprecipitação e adsorção, constituem reguladores importantes da fracção metálica dissolvida. A presença de microorganismos, bactérias aeróbicas e aneróbicas, desempenham também um papel muito relevante como reguladores da passagem, permanência e remoção de certos metais em solução (Santos Oliveira et al., 2000). A actividade mineira reflecte-se na composição química das águas de dois modos distintos: pela introdução de macro-elementos ausentes no ambiente geológico, os quais provocam alterações mais ou menos pronunciadas na estrutura iónica dos sistemas aquosos; pela inserção de uma carga metálica anómala, susceptível de tornar a água imprópria para determinados fins. Antes de tentar aplicar acções minimizadoras e/ou remediadoras das descargas problemáticas, é necessário caracterizá-las, adequadamente, ao longo de um período de tempo suficientemente longo e definir quais os locais prioritários de intervenção. Assim, o potencial sucesso de uma acção correctiva será optimizado. A realização desta tarefa consiste na identificação, caracterização e quantificação das principais fontes de contaminação de um couto mineiro de modo a que as ferramentas de decisão possam ser

Transcript of 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e...

Page 1: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

101

1. CAPÍTULO 6

HIDROQUÍMICA

6.1 Introdução

Os fenómenos físicos de diluição, dispersão e sedimentação, conjugados com

fenómenos biogeoquímicos, que envolvem reacções de oxidação-redução, associadas ou não

com processos de precipitação, coprecipitação e adsorção, constituem reguladores

importantes da fracção metálica dissolvida. A presença de microorganismos, bactérias

aeróbicas e aneróbicas, desempenham também um papel muito relevante como reguladores

da passagem, permanência e remoção de certos metais em solução (Santos Oliveira et al.,

2000).

A actividade mineira reflecte-se na composição química das águas de dois modos

distintos:

• pela introdução de macro-elementos ausentes no ambiente geológico, os quais

provocam alterações mais ou menos pronunciadas na estrutura iónica dos sistemas

aquosos;

• pela inserção de uma carga metálica anómala, susceptível de tornar a água

imprópria para determinados fins.

Antes de tentar aplicar acções minimizadoras e/ou remediadoras das descargas

problemáticas, é necessário caracterizá-las, adequadamente, ao longo de um período de

tempo suficientemente longo e definir quais os locais prioritários de intervenção. Assim, o

potencial sucesso de uma acção correctiva será optimizado. A realização desta tarefa

consiste na identificação, caracterização e quantificação das principais fontes de

contaminação de um couto mineiro de modo a que as ferramentas de decisão possam ser

Page 2: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

102

aplicadas e os meios de remediação mais apropriados sejam empregues (Younger e

Wolkersdorfer, 2004). Um trabalho de campo cuidadoso e análises químicas de laboratório

associados ao entendimento dos processos possíveis são necessários à obtenção de

conclusões para cada situação em particular.

6.2 Recolha de amostras de água e métodos analíticos

A escolha de pontos de água para recolha de amostras destinadas a análise química

obedeceu aos seguintes critérios: abranger toda a área de estudo, possibilitar a

determinação de áreas contaminadas e não contaminadas e, por último, considerar as

características geomorfológicas, geológicas e tectónicas (fracturação) da região.

As amostras dos pontos de água, escolhidos após o inventário hidrogeológico (ver

capítulo 4), foram recolhidas de furos, nascentes, locais de descarga da mina e escombreira.

Também se contabilizaram, para amostragem, 4 pontos de observação de águas superficiais

nas ribeiras e rios adjacentes. Procedeu-se à colheita da água da chuva na amostragem de

Outubro de 2003 para ajudar na interpretação dos estudos de modelação geoquímica. Todos

eles foram enviados para laboratório para análise dos elementos maiores, menores e

elementos traço (Figura 6.1 e Tabela 6.1).

Tabela 6.1 Identificação dos pontos de água de amostragem e respectiva campanha

Ponto Amostrado

Tipo Maio98 Outubro 98

Abril 03 Outubro 03

Junho 04

Outubro 04

A1 Rio A* B D E F G

A2 Rio A B D E F G A3 Rio A B D E F G A5 Rio A B D F3 Furo A B D F F G F7 Furo A B D E F G F9 Furo A B D E F G F11 Furo D E F G F13 Furo D E F G F14 Furo D E F G F18 Furo D F19 Furo D F N1 Nascente A B N8 Nascente D E F G

M1 Galeria mina

A B D E F G

M3 Galeria mina

A B D F G

E1 Escombreira A B D E F G * As letras identificam a campanha de amostragem

Page 3: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

103

Figura 6.1 Localização dos pontos de água sujeitos a análise química

Page 4: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

104

Durante a recolha, os principais parâmetros de campo – pH, temperatura (T),

condutividade eléctrica (EC), potencial de oxidação-redução (Eh) e o total de sólidos

dissolvidos (TDS) – foram medidos após a sua estabilização.

É necessário salientar que a amostragem ocorrida no ano de 1998 foi executada

dentro de um protocolo celebrado entre a Direcção Geral do Ambiente e o Instituto Geológico

e Mineiro (actual INETI), no âmbito de um estudo multidisciplinar designado “Estudo do

Impacto Ambiental em Minas Abandonadas”. Esse estudo efectuou-se na área envolvente do

Couto Mineiro do Pejão (CMP) nos sectores da Lomba (Mina do Barral), de Germunde-Arda e

de Arda-Pejão, no qual a autora esteve integrada como geóloga estagiária no Departamento

de Hidrogeologia do Instituto Geológico e Mineiro (IGM). Dentro deste projecto, resultaram

várias publicações como Santos (1998), Canto Machado (1999), Pedrosa (2000), Santos

Oliveira e Ávila (1999), Pedrosa et al. (2000), entre outros.

O planeamento diferenciado e temporal das amostragens levaram a que dois

procedimentos de recolha de águas fossem aplicados.

Durante as duas primeiras campanhas de amostragem, realizadas no ano de 1998,

procedeu-se à recolha de 500 ml de água não filtrada para análise dos elementos maiores.

Os métodos analíticos empregues foram: pH por potenciometria; condutividade eléctrica por

electrometria; alcalinidade, cálcio, hidrogeno carbonato e cloreto por volumetria; sílica,

fosfato, fluoreto, nitrato, nitrito e amónio por espectrometria VIS/UV; sulfato por

gravimetria; sódio, potássio e lítio por fotometria de chama e, por último, magnésio por

espectrometria de plasma. As amostras de água para análise química dos metais foram

filtradas "in loco", através de membrana de filtração de porosidade 0,45 µm e, de imediato,

acidificadas com ácido nítrico concentrado de qualidade suprapur (5 ml de ácido para 500 ml

de amostra). Os metais foram quantificados por Espectrometria de Emissão Óptica com

Plasma Indutivo (ICP-OES) por aspiração directa nas amostras de mineralização total

superior a 1g/L e, após uma fase de pré-concentração, nas restantes (Canto Machado,

1999). Todas as análises foram efectuadas no Núcleo de Caracterização Química do

Laboratório de São Mamede de Infesta do INETI.

Para as amostragens decorridas nos anos de 2003 e 2004, procedeu-se à recolha de

2 litros de amostra não acidificada para análise dos elementos maiores. Os métodos

analíticos utilizados foram: electrometria para o pH e condutividade eléctrica; volumetria

para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio;

Page 5: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

105

espectrometria absorção molecular para a sílica; cromatografia iónica para o fluoreto,

cloreto, sulfato e nitrato; fotometria de chama para o sódio e potássio; oxidação com KMnO4

em meio alcalino a quente para a matéria orgânica; por secagem e pesagem o resíduo seco;

magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último, o CO2 por cálculo. Todas as

amostras foram enviadas para o Laboratório Químico do Departamento de Hidrogeologia do

INETI.

Para se analisarem os metais por ICP-MS ou ICP-OES foi necessário recolher-se, para

cada ponto de amostragem, cerca de 50 ml de água, imediatamente acidificadas com ácido

nítrico suprapur, até se obter um pH inferior a 2. Seguidamente, foram enviadas para o

laboratório Activation Laboratories Ltd (Actlabs) no Canadá. A decisão da não filtragem das

amostras de água foi intencional, uma vez que se queria ter a concentração total dos

elementos (dissolvidos, colóides e partículas). De facto, alguns estudos, como o de Reimann

et al. (1999) e Banks et al. (2005), demonstraram que as diferenças entre amostras filtradas

e não filtradas para a maioria dos elementos são irrelevantes e que as amostras filtradas não

reflectem necessariamente a “verdadeira solução química de uma água”. Banks et al.

(1997b) também encontraram uma boa correlação entre as concentrações de amostras

filtradas e não filtradas para os elementos Mn, Fe, Al e Zn de descargas de águas ácidas de

minas de carvão no Reino Unido, embora, se tenha notado uma tendência relativa para uma

maior perda de Fe (devido à retenção da fracção coloidal dos hidróxidos de ferro) nas

amostras filtradas com pH alto e baixas concentrações de Fe.

O controle da qualidade dos resultados analíticos obtidos (Anexo C) envolveu o

cálculo do balanço iónico e a análise dos duplicados de amostras. Como muitos metais

apresentam concentrações muito elevadas, a fórmula de cálculo do balanço iónico (B.I.) foi

modificada de modo a estes elementos estarem presentes, uma vez que todos contribuem

para a electroneutralidade da água (Eq. 6.1):

( ) 001*)

3NO

3HCO

4SO(ClCu)NiAlZnMnFeMgCaK(Na

)3

NO3

HCO4

SO(ClCu)NiAlZnMnFeMgCaK(NaB.I.

∑ ∑ +++−+++++++++

∑ ∑ +++++++++++++=

(Eq. 6. 1)

A distribuição do erro do balanço iónico está representada na tabela 6.2. Os erros do

balanço iónico são bastante aceitáveis uma vez que 87,2% das amostras apresentam um

erro de ± 10%. Os maiores erros de balanço iónico estão associadas a águas muito pouco

Page 6: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

106

mineralizadas (como a água da chuva e do furo 9), ou seja, muito diluídas e, também, a

águas muito mineralizadas, como a descarga da mina (M3), cujo erro no balanço iónico pode

ser reflexo das determinações de cloreto, pois para altas concentrações de ferro pode haver

formação de complexos de ferro total que mascaram o ponto final da titulação (Younger,

1995).

Tabela 6.2 Distribuição dos erros do balanço iónico de todas as colheitas de água efectuadas (número de amostras total = 78). Os resultados das análises efectuadas encontram-se no Anexo C Erro balanço iónico Nº amostras dentro da classe / total

amostras % erro

< 5% 61 / 78 78,2 > 5% e < 10% 7 / 78 9,0 > 10% e < 20% 6 / 78 7,7 > 20 % 4 / 78 5,1

6.3 Caracterização Hidroquímica

6.3.1 Caracterização fácies hidroquímicas

Antes do encerramento da mina, foram realizados trabalhos de caracterização prévia

da qualidade das águas da mina (ECD, 1995). Estas análises químicas estiveram limitadas ao

estudo dos elementos maiores e dos parâmetros físico-químicos base. Todavia, uma vez que

este estudo implicou a caracterização dos vários pisos, permitiu verificar a existência de

variações de fácies hidroquímicas entre os pisos da mina, o que ajudou no estudo das fontes

de recarga de água aquando da inundação da mesma. No anexo D, apresentam-se os

resultados dos boletins de análise química que constam do arquivo técnico da mina de

Germunde.

Uma primeira abordagem dos resultados analíticos das diversas campanhas de

amostragem aos pontos seleccionados para monitorização da área foi a identificação inicial

das fácies hidroquímicas presentes obtida através da projecção das amostras no diagrama

triangular de Piper. As águas de escombreira e de descargas de mina, segundo aquela

representação gráfica, apresentam fácies sulfatadas magnesianas não se conseguindo

realizar qualquer distinção entre elas. No entanto, nos furos, nascentes e águas superficiais é

possível distinguir uma variação temporal das fácies (Figura 6.2):

Page 7: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

107

• as águas que não apresentam qualquer tipo de contaminação surgem com fácies

cloretadas sódicas ou bicarbonatadas cálcicas ao longo do tempo;

• já as águas que apresentam algum contacto com zonas contaminadas apresentam

variações de fácies ao longo das diferentes amostragens.

Figura 6.2 Diagrama de Piper das amostras de água da área de estudo (n=78). Os resultados analíticos encontram-se no Anexo C

As águas sujeitas a contaminação mineira apresentam alteração de fácies

hidroquímica. A fácies regional cloretada sódica ou bicarbonatada cálcica passa, no local da

antiga exploração mineira, a sulfatada cálcica ou magnesiana. À medida que se dá o

afastamento do foco poluidor as águas vão passando sucessivamente por várias gradações

intermédias, verificadas tanto na composição catiónica como na aniónica.

A aplicação de diagramas hidroquímicos (diagramas de Piper, Stiff, Glover, Durov,

etc.) usualmente utilizados para a classificação das características químicas das águas

tornam-se desajustados quando se quer clarificar se uma água se encontra contaminada

devido à exploração e/ou abandono de uma mina, essencialmente, por duas razões:

Page 8: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

108

• nestas águas, elementos químicos de grande importância e com concentrações

elevadas (como o Fe e o Al) não são considerados no estudo resultando, assim,

numa ideia errónea da composição;

• o facto de uma água, por exemplo, ser sulfatada magnesiana não implica que esteja

contaminada. Tudo irá depender da concentração desses elementos. Ora, este tipo

de gráficos, apenas, expressa relações entre iões e não concentrações.

Para águas de mina, o balanço entre alcalinidade total e acidez total é uma medida

reveladora das condições químicas da água. Por esse motivo, ao longo dos anos, vários

autores tentaram estabelecer um novo sistema de classificação para este tipo de águas

(Hedin, 1994; Younger, 1995; Rees et al., 2002; Younger e Wolkersdorfer, 2004). Younger e

Wolkersdorfer (2004) apresentam a modificação final do diagrama adoptado para a

classificação de águas de mina (após Rees et al. (2002) e Younger (1995)). Num dos eixos,

está representado a rede de “Net alkalinity” que é igual à alcalinidade total menos a acidez

total (ver definições cap. 2). No outro eixo, representa-se o balanço entre o sulfato

(componente que representa o grau de oxidação da pirite) e o ião cloreto (que, em elevadas

concentrações, é um indicador de águas sedimentares). A aplicação deste diagrama de

classificação aos dados analíticos obtidos aquando das campanhas de recolhas de água

efectuadas durante a elaboração deste trabalho está representada na Figura 6.3. Como se

pode verificar, obtém-se de imediato uma diferenciação do padrão químico tendo em conta

os locais de recolha. A sua aplicação permite uma abordagem primária de separação dos

tipos de águas relativamente à sua composição química.

Page 9: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

109

Figura 6.3 Classificação das águas da Mina de Germunde em termos de “Net alkalinity” e proporções de ião cloreto e sulfato, segundo o esquema de Younger (1995) e adaptado de acordo com as propostas de Rees et al. (2002) (adaptado de Younger e Wolkersdorfer, 2004). Encontram-se projectadas todas as amostras incluídas no Anexo C

Os mesmos autores consideram que este tipo de diagrama permite fazer uma

abordagem inicial para a escolha do tipo de tratamento a aplicar a uma descarga mineira.

Todavia, no caso em questão, onde se pretende estudar o comportamento hidroquímico (de

furos, nascentes, descarga de mina e escombreira) na área de um couto mineiro

abandonado, ambiciona-se obter outro tipo de respostas sendo necessário uma abordagem

diferente. Algumas das respostas que se pretende obter são: qual a proporção de cada

mineral, qual o seu contributo para o problema, quais os elementos químicos que estarão a

reagir, etc.... Com o intuito de obter respostas clarificadoras às questões anteriores várias

técnicas foram utilizadas em virtude de se pretender descobrir qual delas explica melhor as

interacções entre água, elementos químicos, minerais, rochas e ambiente mineiro.

6.3.2 Análise uni- e bivariada de dados

No total, foram analisados 12 elementos maiores em 78 amostras. O número de

elementos vestigiários ou metais pesados analisados dependeu da campanha de amostragem

(ver secção 6.2). Nas campanhas de 1998, foram analisados 20, enquanto que, nas

campanhas de 2003 e 2004, foram analisados 61 elementos vestigiários e metais pesados.

Page 10: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

110

Efectuou-se uma análise estatística univariada e bivariada dos dados, com o cálculo

dos principais parâmetros estatísticos, box-plots e matriz de correlação. No entanto, para

realização dessa análise estatística e dado que existiam elementos cujas concentrações se

encontravam abaixo dos limites analíticos de detecção dos aparelhos, consideraram-se estes

como tendo um valor igual a metade do valor do limite de detecção desse elemento.

Os elementos químicos que, para todas as campanhas efectuadas, se encontravam

abaixo do limite de detecção do aparelho foram excluídos. Estes são: ósmio, platina, ouro,

mercúrio, bismuto, tântalo, telúrio, índio, prata, paládio, ruténio e o nióbio. O molibdénio e o

estanho foram eliminados uma vez que 75% das amostras apresentavam valor nulo no

terceiro quartil.

O objectivo principal deste estudo estatístico é determinar a variabilidade ou a

dispersão da concentração dos elementos de modo a evidenciar a influência da passagem de

água em locais expostos à contaminação mineira. Desta forma, é lógico inferir que as

condições geológico-mineiras não actuam sobre um qualquer conjunto de dados de um

determinado elemento químico desde que este apresente uma variância e desvio padrão

próximo de zero, aliado a concentrações muito baixas desse elemento. Assim sendo, o

estudo estatístico descritivo univariado permitiu reduzir o grupo de variáveis a utilizar uma

vez que foram retirados o rénio, o tálio, o germânio, o césio, o háfnio, o zircónio, o gálio, o

túlio, o lutécio e o tório das análises estatísticas posteriores, dado que as concentrações

químicas presentes eram extremamente baixas (inferiores a 0.8 µg/L, excepto para as águas

recolhidas na escombreira) não tendo, por conseguinte, qualquer interesse a sua inclusão.

Optou-se pela eliminação dos elementos brometo, titânio, vanádio e volfrâmio

porque os valores de concentração apresentados no 3º quartil são iguais ou inferiores aos

definidos por Hem (1985) para as concentrações médias destes em águas de rio. Nas tabelas

6.3 e 6.4 estão expressos os resultados analíticos obtidos nos restantes elementos.

Page 11: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

111

Tabela 6.3 Estatística das análises a elementos maiores

Unidade N Média Mínimo q1 Mediana q3 Máximo Variância

pH 78 5,6 2,5 4,7 6,0 6,5 7,8 1,7

EC µS/cm 78 864,1 35,3 219,0 299,5 478,0 11000,0 2648843,8 Res. seco mg/L 56 751,9 19,4 152,8 217,3 311,4 5328,0 1941153,0

SO42- mg/L 78 666,2 1,6 22,0 78,7 188,9 13744,0 3674775,3

Cl- mg/L 78 24,4 5,3 16,7 22,4 33,8 50,5 118,0

HCO3- mg/L 78 49,7 0,0 2,4 30,5 70,8 195,8 2967,4

F- mg/L 78 0,7 0,0 0,1 0,2 0,4 10,8 3,4

NO3- mg/L 78 4,2 0,0 0,1 1,7 5,2 35,3 40,4

Mg2+ mg/L 78 92,0 0,7 7,0 15,9 27,5 1915,0 67598,1

Ca+ mg/L 78 44,7 0,2 7,7 16,4 35,3 345,0 4810,2

Na+ mg/L 78 16,6 3,8 11,0 14,5 22,5 32,8 48,5

K+ mg/L 78 2,3 0,2 1,0 1,6 2,5 11,1 5,9

Si mg/L 78 10,91 0,03 4,39 9,67 15,41 43,43 69,72

N – Número de amostras de água analisadas por parâmetro; L.D. – Limite de detecção do aparelho; q1 - 1º quartil ; q3 - 3º quartil O sulfato e o magnésio são os constituintes maiores maioritários que apresentam

uma maior discrepância entre a sua concentração mínima e máxima.

O cálcio apresenta uma discrepância de concentração entre o 3º quartil e o máximo.

Este aumento de concentração é verificado nas águas pertencentes às descargas mineiras.

As concentrações de cloreto apresentam variações típicas entre 5 e 50 mg/l, o que

indica que à sua origem está associada a precipitação de sais concentrados por

evapotranspiração.

O sódio apresenta maiores concentrações nas águas de furos e na descarga da mina

inundada (M1), reflectindo que a sua origem está associada a processos de interacção água /

minerais silicatados.

O nitrato encontra-se sempre com valores inferiores ao máximo recomendado pela

directiva. A maior concentração (35,3 mg/l) foi observada num furo situado numa zona

agrícola. Esta observação está de acordo com outros trabalhos (Banks et al., 1997b) que

evidenciam que as descargas de mina de carvão não contribuem com nitrato para a poluição

das águas.

Page 12: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

112

Tabela 6.4 Estatística das análises a elementos vestigiários e a metais pesados

Unidade L.D. N Média Mínimo q1 Mediana q3 Máximo Variância

Al µg/L 2 78 29350,8 1,0 20,0 95,0 1020 859000 14453621309

Fe µg/L 5 78 22896,2 2,5 194,0 734,5 5720,0 336000,0 4262119413,0

Mn µg/L 0,05 78 8665,1 5,0 74,4 670,5 1740,0 200000,0 732703456,6

Zn µg/L 50 78 1312,9 0,8 19,4 284,0 641,0 30600,0 16449715,0

Ni µg/L 0,2 78 366,8 0,3 2,0 50,3 231,0 7600,0 1056375,8

Co µg/L 0,01 78 278,9 0,003 2,0 17,6 106,0 7200,0 900310,5

Li µg/L 0,1 78 194,4 0,05 15,0 28,5 89,0 4000,0 309164,4

Y µg/L 0,003 78 58,7 0,007 0,200 0,4 8,9 1600,0 50936,7

Cu µg/L 0,1 78 52,4 0,3 2,0 9,9 31,6 1020,0 23074,6

Sr µg/L 0,04 78 164,2 1,3 47,0 143,0 251,0 713,0 18289,3

Nd µg/L 0,004 56 28,9 0,003 0,1 0,3 3,6 401,0 9387,3

Be µg/L 0,05 78 14,6 0,025 0,025 0,2 4,2 338,0 2749,7

Cd µg/L 0,01 78 9,0 0,005 0,13 0,5 1,1 352,0 1796,0

Gd µg/L 0,002 56 9,6 0,0010 0,0380 0,09 1,4 143,0 1051,6

Sm µg/L 0,002 56 9,3 0,001 0,036 0,1 1,2 131,0 983,6

I µg/L 1 56 12,3 0,5 3,0 5,0 9,5 173,0 767,0

Pr µg/L 0,001 56 7,1 0,001 0,028 0,1 0,8 118,0 585,2

Dy µg/L 0,001 56 6,1 0,001 0,0205 0,1 0,9 89,3 427,2

Ba µg/L 0,1 67 18,3 2,0 10,0 15,1 24,0 92,9 175,3

Pb µg/L 0,1 56 6,1 0,1 0,7 1,4 4,9 83,7 172,7

U µg/L 0,001 56 3,5 0,010 0,045 0,4 1,1 72,5 139,7

Er µg/L 0,001 56 2,8 0,0005 0,012 0,03 0,5 41,5 89,5

Eu µg/L 0,001 56 2,5 0,0005 0,009 0,02 0,3 37,6 75,4

Yb µg/L 0,001 56 2,5 0,001 0,010 0,03 0,3 36,6 68,5

Cr µg/L 0,5 78 2,0 0,25 0,25 0,5 2,3 47,0 29,7

Sc µg/L 1 56 4,6 0,5 0,8 3,0 6,0 24,0 26,7

Se µg/L 0,2 56 1,4 0,1 0,1 0,1 0,3 25,5 22,0

Tb µg/L 0,001 56 1,3 0,001 0,005 0,01 0,2 20,7 20,8

Rb µg/L 0,01 56 4,1 0,3 1,9 2,9 4,0 17,8 16,5

As µg/L 0,03 78 2,4 0,015 0,5 1,5 3,0 22,0 12,4

Ho µg/L 0,001 56 1,0 0,0005 0,0040 0,01 0,2 15,5 12,1 N – Número de amostras de água analisadas por parâmetro; L.D. – Limite de detecção do aparelho; q1 - 1º quartil ; q3 - 3º quartil

A variabilidade dos elementos vestigiários, dos metais pesados e lantanídeos é muito

grande chegando a existir diferenças de 6 ordens de grandeza entre o máximo e o mínimo

(Tabela 6.4). Através da comparação do 3º quartil (q3) e dos valores máximos obtidos para

vários elementos verifica-se a existência de valores anómalos bastante elevados e que

diferem 1 a 2 ordens de grandeza do 3º quartil para o valor máximo.

A carga metálica muito elevada faz-se sentir principalmente nas drenagens de mina e

escombreira estando presentes os metais Fe, Al, Mn, Zn, Cu, Cd, Co, Be, Y, com gamas de

concentração que, por vezes, atingem as dezenas de ppm. O decaímento desta componente

metálica é, no entanto, rápido.

Page 13: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

113

As águas de superfície, nos pontos amostrados, exibem características químicas

bastante diferentes. São sistemas de baixa mineralização, de pH na zona neutra, exibindo

como par iónico maioritário o hidrogeno carbonato e o cálcio. A poluição mineira faz-se sentir

nestas águas pela presença do sulfato e pelo aumento da concentração do magnésio. No

naipe metálico aparecem apenas os metais com maior mobilidade, sobretudo manganês,

alumínio e zinco.

No Rio Douro não foi detectada qualquer modificação significativa da composição

química da água após a descarga da mina M1 (ponto de amostragem A2). Tal facto deve-se

a dois factores: à precipitação de vários oxihidróxidos antes da entrada de água no rio Douro

e também à rápida mistura das duas águas com caudais significativamente diferentes. O

mesmo se passa no Rio Arda, a linha de água mais importante na envolvente estudada e

receptora das águas da escombreira que, perto da confluência, já não mostra índices

relevantes de contaminação mineira.

Já nas águas subterrâneas, constata-se que as dos furos exibem uma carga metálica

bastante significativa, assumindo estas proporções importantes em alguns deles tornando,

por tal facto, as respectivas águas impróprias para consumo humano.

O estudo da componente vestigiária é muito útil, pois ajuda a distinguir as

particularidades de cada água e apoia a despistagem de contaminação ambiental numa fase

muito incipiente. O “sinal” dado pela componente vestigiária, sendo precoce, ajuda a tomar

medidas remediadoras mais cedo do que quando o “sinal” é dado pela componente

maioritária de uma análise química.

Nas figuras 6.4 e 6.5, onde estão representados os “box-plots”, é possível visualizar

a variação e o comportamento dos elementos para cada local de amostragem. Em todos os

box-plots apresentados, distinguem-se 3 tipos de águas:

• águas superficiais (de rios e ribeiras);

• águas subterrâneas (de nascentes e furos);

• águas de mina (descargas mineiras e escombreira).

Anomalias da concentração dentro dos dois primeiros grupos (como A5, F19 e N8 no

box-plot de Al) podem ser indicadoras de provável contaminação.

É possível apurar um aumento da concentração de alguns metais e sulfato com a

diminuição do pH (Figura 6.3). Isto é devido a diversos factores:

Page 14: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

114

• metais, protões e sulfato são libertados quando há dissolução de sulfuretos;

• aumento da solubilidade e mobilidade destes iões com o pH baixo.

A existência de uma simetria positiva entre o SO42- e o Mn é nítida. Ao mesmo

tempo, é evidente a simetria negativa destes “box-plots” com o pH.

O Al, o Fe e o Mn apresentam um comportamento geoquímico similar, excepto para

as concentrações de Al na descarga M1, em virtude deste metal ter comportamento diferente

dos restantes em condições de pH superiores a 4,5. Para estes valores de pH, o Al torna-se

pouco solúvel deixando de ser um componente problemático na drenagem mineira (Hedin et

al., 1994).

Page 15: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

115

Figura 6.4 “Boxplots” ilustrando a distribuição do pH, SO4

2-, Mg, Al, Mn, Fe, Ni e Ca (eixo dos YY em escala logarítmica) para cada local de amostragem. Linha a tracejado representa o valor paramétrico para a água destinada ao consumo humano definido pelo Decreto-Lei 306/07 de 27 de Agosto. Linhas a vermelho separam águas superficiais (A1, A2, A3 e A5), das águas captadas em furos e nascentes (representadas pelas letras F e N) e as águas das descargas mineiras (M1 e M3) e escombreira (E1)

Page 16: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

116

Figura 6.5 “Boxplots” ilustrando a distribuição do Li, Zn, As, Be, Sr e Rb (eixo dos YY em escala logarítmica) para cada local de amostragem. Linha a tracejado representa o valor paramétrico para a água destinada ao consumo humano definido pelo Decreto-Lei 306/07 de 27 de Agosto. Linhas a vermelho separam águas superficiais (A1, A2, A3 e A5), as águas captadas em furos e nascentes (representadas pelas letras F e N) e as águas das descargas mineiras (M1 e M3) e escombreira (E1) As altas concentrações de Li presentes podem ser justificadas através de reacções de

troca iónica entre minerais, onde o lítio é menos adsorvido que outros elementos comuns

(Figura 6.5). Por isso, é plausivel, que quando este entra em solução através de reacções de

dissolução, continue no estado dissolvido (Hem, 1985).

Segundo Younger et al. (2002), o Zn pode ser utilizado como traçador de processos

de drenagem mineira, dado que é um elemento com grande mobilidade. Observando o seu

comportamento nos diferentes “box-plots”, pode-se assumir este comportamento para as

nossas análises.

Page 17: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

117

A adsorção do As é minimizada em condições de pH alcalino uma vez que as

superfícies tendem a ficam carregadas negativamente. Provavelmente, por causa destas

características de adsorção, o As encontra-se com concentrações mais altas na descarga da

mina (M1), onde o pH apresenta valores mais elevados.

As concentrações de Pb mais elevadas foram verificadas no furo F13 e a sua origem

é independente da mina e litologias. Foi devido a contaminação antropogénica durante a sua

construção, em Fevereiro 2003.

O comportamento padrão das terras raras podem gravar processos geoquímicos

suavizados em sistemas naturais (Taylor and McLennan, 1988). Devido à natureza litófila dos

elementos terra rara a sua presença na água subterrânea estes podem ser utilizados como

traçadores naturais de misturas de águas e de interacções água-rocha (Banner et al., 1989;

Smedley, 1991; Fee et al., 1992; Johannesson et al., 1994; Banks et al., 1999). Recorreu-se

à normalização dos valores dos lantanídeos para que fosse possível a respectiva comparação

uma vez que eles ocorrem com gamas de valores bastante diferentes. Constata-se que estes

elementos apresentam sempre a mesma variabilidade no comportamento geoquímico para

os locais amostrados indicando a dissolução dos minerais durante a interacção água-rocha

(Figura 6.6).

1.E-08

1.E-07

1.E-06

1.E-05

1.E-04

1.E-03

1.E-02

1.E-01

Ce Nd Sm Eu Gd Tb Dy Er Yb Th

Terr

as ra

ras

/ NA

SC

A1A2A3A5CHUVAE1F11F13F14F18F19F3F7F9M 1M 3N8

Figura 6.6 Distribuição das terras raras normalizados segundo o NASC para os diferentes locais de amostragem (eixo dos YY em escala logarítmica). Todos os valores em µg/L.

O uso de relações entre determinados iões pode fornecer informações sobre o tipo de

reacções químicas que estão associados aos processos hidroquímicos (tabela 6.5):

Page 18: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

118

• a razão Na/Cl é indicadora de processos de troca catiónica;

• a razão Si/Na é o reflexo de que os processos de dissolução dominam;

• a razão entre Cl/SO4, indicadora da presença de reacções de oxidação e/ou redução

em determinada água, sendo a que mais se destaca neste estudo. Este dado

encontra-se em conformidade com o tipo de reacções esperadas num local afectado

por drenagem ácida;

• a razão Ca/Mg permite determinar a contribuição da calcite e da dolomite na

composição da água (Ettazarini, 2005). Se esta razão é inferior a 1, então o Mg

excede o Ca e sugere a existência de várias fontes para estes elementos. Tal

situação acontece em quase todas as amostras estudadas com excepção para as

águas colhidas no Rio Arda e Rio Douro;

• a razão Ni/Co (Bernard, 2008) distingue a origem geológica ou antropogénica do Ni

na água e a intensidade do processo de dissolução (Figura 6.7).

Tabela 6.5 Estatística das razões entre iões obtidas (meq/l)

Parâmetro N Média Mín q1 Mediana q3 Máx Variância Desvio Padrão

Cl/SO4 78 1,61 0,00 0,27 0,77 1,17 16,57 7,32 2,71

Na/Cl 78 0,73 0,25 0,60 0,70 0,79 2,38 0,08 0,29

Si/Na 78 2,12 0,02 1,10 1,94 2,49 10,22 2,73 1,65

Ca/Mg 78 0,87 0,11 0,21 0,52 1,26 2,96 0,72 0,85

Ni /Co 56 6,28 0,17 1,78 2,08 5,01 96,94 218,15 14,77

As variações entre os valores mínimos e máximos indicam imediatamente que se

está perante águas onde estão a decorrer processos hidroquímicos distintos. Este facto tem

a ver com a grande variabilidade do grupo amostral.

Page 19: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

119

0.000 1 0 .0 01 0.01 0 .1 1 1 0 100 10 00

0.01

0.1

1

10

100

1000

Co (meq/L)

Ni (m

eq/L

)

Ni/Co = 10

OrigemAntropogénica

(Ni/Co)>10

Origem Geológica

(Ni/Co <10)

Aum ento dop ro cesso de d is solução

Figura 6.7 Correlação entre níquel e cobalto para as amostras de água estudadas (gráfico adaptado de Bernard et al., 2008)

No geral, pode-se concluir que a recarga rápida dos aquíferos freáticos reflecte-se na

composição química das águas através da diminuição nas concentrações dos constituintes

dissolvidos, devido a fenómenos de diluição coadjuvados pela diminuição do tempo de

contacto água/rocha. Todavia, existem casos em que a concentração das espécies

dissolvidas aumenta com a recarga dos aquíferos o que indicia mecanismos de dissolução à

superfície, com arrastamento dos elementos remobilizados durante a infiltração e percolação

das águas pluviais no subsolo. Também, se pode afirmar que os dados reflectem a existência

de situações em que nem todos os elementos dissolvidos possuem a mesma origem, estando

alguns deles associados com remobilizações selectivas e provindo outros (como o estrôncio)

de fenómenos de interacção água/rocha.

6.4 Aplicação de técnicas estatísticas multivariadas para análise dos

processos de contaminação mineira

A utilização de técnicas de estatística multivariada está a tornar-se uma prática

comum em estudos de diferentes áreas, incluindo a hidrogeologia, em virtude de serem

ferramentas de grande versatilidade. As suas principais vantagens são permitir:

• analisar grande quantidade de dados sem perda de informação significativa;

• classificar e caracterizar estruturalmente relações entre variáveis e amostras;

Page 20: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

120

• realçar grupos de amostras e variáveis com características similares;

• estudar a contribuição de cada variável e/ou amostra na estrutura da base de dados

hidroquímicos;

• alcançar padrões espaciais e temporais da base de dados hidrogeoquímica;

Neste tipo de análise, as preocupações tidas em conta são:

• descrição dos dados: exploraram-se os dados, tanto espacial como

cronologicamente, para constatação de eventuais valores anómalos que possam

mascarar a estrutura.

• interpretação: os produtos gráficos obtidos a partir das informações numéricas são

avaliados levando em consideração tanto o conhecimento já adquirido com dados

similares como com factos científicos relacionados com as variáveis sob estudo.

A interpretação da estrutura espacial ou temporal, as associações e as relações

casuais entre variáveis devem, então, ser organizadas num modelo que se ajuste à

realidade.

6.4.1 Análise em Componentes Principais

A Análise em Componentes Principais (ACP) é um método particularmente adaptado

para extrair as características estruturais de um quadro de dados quantitativos. Permite

reduzir um conjunto de variáveis em um conjunto menor de variáveis artificiais que se

chamam componentes principais (CP) ou factores.

Em geral, as variáveis de base são muito heterogéneas, apresentando valores

médios e variâncias muito diferentes (como se pode ver nas tabelas 6.3 e 6.4). Para reduzir

este efeito, é necessário proceder à transformação da matriz de dados inicial numa outra

matriz, onde as novas variáveis serão adimensionais com média nula e variância unitária.

Esta nova matriz chama-se matriz de inércia e consiste, portanto, numa matriz de correlação

entre variáveis. Trata-se de uma técnica de análise de dados em que as variáveis originais

(tomadas como eixos definidores de um espaço onde se posicionam as amostras) são

substituídas por outras variáveis (os factores), obtidos à custa de um novo sistema de eixos.

Cada factor, associado a um eixo, descreve uma certa quantidade de variância estatística

Page 21: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

121

dos dados analisados e a sua interpretação é efectuada de acordo com as variáveis

intercorrelacionadas.

Uma boa descrição do algoritmo aplicado nos cálculos efectuados pelo programa

(“Andad 7.12”) pode ser consultada em Pereira e Sousa (2000).

6.4.1.1 Abordagens metodológicas

A presença numa matriz de amostras contaminadas e não contaminadas pode não

permitir a detecção de todos os processos hidrogeoquímicos que estão a ocorrer nos

diferentes locais de amostragem uma vez que algumas amostras, devido aos seus valores

anómalos, podem mascarar outros processos que estejam a decorrer. Torna-se, então,

necessário aplicar a ACP a diferentes matrizes.

Numa primeira abordagem, aplica-se a ACP a todo o grupo amostral. Segue-se a

aplicação da ACP a um subgrupo amostral (sem as amostras anómalas) de modo a

determinar se existem ou não processos hidrogeoquímicos mascarados. Várias metodologias

foram experimentadas de modo a tentar encontrar o grupo de amostras que estariam

associadas à anomalia geoquímica como, por exemplo, a classificação ascendente

hierárquica, mas sem grandes resultados. Por fim, optou-se por utilizar uma adaptação da

metodologia definida por Pereira et al. (2003). O fluxograma da metodologia encontra-se na

figura 6.8.

Page 22: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

122

Figura 6.8 Fluxograma da metodologia empregue para a detecção das amostras representativas da anomalia geoquímica (adaptado de Pereira et al., 2003)

O primeiro passo consiste na aplicação de ACP a uma matriz de dados constituída por

todas as amostras. Os eixos resultantes podem, geralmente, ser interpretados nos termos da

associação das propriedades num contexto geológico e geoquímico. Os eixos também

permitem a separação das regiões, no espaço do factor, que estão provavelmente

relacionadas com a anomalia das que estão relacionadas com o fundo geoquímico. Para tal,

escolhem-se aquelas amostras cujas coordenadas em eixos significativos são mais elevadas.

Através da representação gráfica, identificam-se as amostras e variáveis que se encontram

associadas à anomalia geoquímica. Assim, obtêm-se dois subconjuntos de amostras: um

ligado ao fundo geoquímico (bloco B), e outro à anomalia geoquímica (bloco A).

Com a aplicação da ACP a esta nova matriz (61x22) associada à projecção

suplementar das amostras “anómalas” (bloco A), entra-se na segunda etapa desta

metodologia.

Page 23: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

123

Esta segunda etapa fornece a intensidade da anomalia para cada amostra, dada pela

distância, ao longo dos eixos significativos entre as posições da amostra, antes e depois da

sua projecção suplementar. Esta distância mede a desigualdade entre uma amostra vista

como a parte de um todo e da mesma amostra segregada no subconjunto anómalo e vista

na estrutura do fundo complementar. A distância pode ser vista como a contribuição da

amostra à intensidade global da anomalia, uma vez que mede a importância de cada

amostra no subconjunto anómalo.

O objectivo final desta segunda etapa é o cálculo de uma intensidade global da

anomalia obtida calculado a partir da média das distâncias acima definidas para todas as

amostras incluídas no grupo amostral da anomalia (bloco A).

A intensidade global da anomalia mede quanto do grupo amostral inteiro é

perturbado pela presença das amostras anómalas, funcionando como um critério para julgar

se a separação das amostras foi ou não a mais correcta.

Subsequentemente, numa terceira etapa, as amostras que se encontram na

vizinhança das fronteiras que definem as regiões da anomalia no espaço do factor podem ser

movidas do seu subconjunto inicial para o outro, até que a intensidade global da anomalia

seja maximizada. Neste momento, a separação óptima do subconjunto da anomalia do fundo

é alcançada.

6.4.1.2 Aplicação

Inicialmente, aplicou-se a ACP a uma matriz de dados constituída por todas as

amostras (78) e 22 variáveis activas (elementos maiores, parâmetros físico-químicos de pH

e condutividade eléctrica (EC) e alguns elementos menores). Na tabela 6.6, está

representada a matriz de correlação pxp obtida. As variáveis que se encontram destacadas

apresentam uma correlação significativa para ρ<0,01, isto é, para um intervalo de confiança

de 99%. Presencia-se uma forte correlação entre os iões maiores SO42-, Ca2+ e Mg2+ e os

metais Al, Mn, Y, Zn, Ni, Be e Li com a EC. A sua presença é um testemunho de que estão a

decorrer processos de drenagem mineira que originam a contaminação das águas. O Cl- e o

Na+ apresentam entre si uma boa correlação.

Page 24: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

124

Tabela 6.6 Matriz de correlação p x p das 78 amostras (base de dados completa)

pH EC Cl HCO3- SO4

2- NO3- F- Na+ K+ Ca2+ Mg2+ Si Li Fe Al Mn Zn Ni Co Cr Be Y

pH 1,00

EC -0,41 1,00

Cl -0,35 -0,01 1,00

HCO3- 0,52 -0,32 -0,21 1,00

SO42- -0,37 0,99 -0,08 -0,29 1,00

NO3- 0,03 0,41 -0,09 -0,21 0,42 1,00

F- -0,34 0,35 0,31 -0,24 0,30 0,21 1,00

Na+ -0,19 0,07 0,77 -0,12 -0,02 0,03 0,01 1,00

K+ 0,17 0,22 0,16 -0,22 0,12 0,23 0,05 0,43 1,00

Ca2+ -0,19 0,89 0,05 -0,23 0,83 0,34 0,37 0,20 0,57 1,00

Mg2+ -0,37 0,98 -0,08 -0,27 1,00 0,42 0,31 -0,03 0,09 0,81 1,00

Si -0,49 0,55 0,45 -0,08 0,54 0,03 0,18 0,45 -0,16 0,38 0,55 1,00

Li -0,43 0,95 -0,04 -0,28 0,97 0,43 0,40 -0,06 -0,01 0,75 0,98 0,56 1,00

Fe -0,01 0,46 0,13 -0,30 0,36 0,17 0,06 0,43 0,87 0,75 0,33 0,10 0,23 1,00

Al -0,37 0,92 -0,15 -0,22 0,96 0,39 0,25 -0,15 -0,12 0,67 0,97 0,54 0,96 0,11 1,00

Mn -0,36 0,98 -0,11 -0,28 1,00 0,42 0,25 -0,03 0,11 0,81 1,00 0,54 0,97 0,35 0,97 1,00

Zn -0,39 0,89 -0,09 -0,23 0,94 0,38 0,16 -0,04 -0,11 0,63 0,94 0,60 0,93 0,13 0,97 0,94 1,00

Ni -0,41 0,68 0,00 -0,30 0,66 0,18 0,42 -0,08 -0,01 0,56 0,63 0,37 0,63 0,17 0,66 0,63 0,59 1,00

Co -0,37 0,96 -0,16 -0,26 0,99 0,42 0,21 -0,07 0,02 0,74 0,99 0,54 0,96 0,27 0,98 0,99 0,96 0,62 1,00

Cr -0,30 0,79 -0,14 -0,22 0,84 0,48 0,18 -0,05 0,00 0,59 0,86 0,46 0,87 0,19 0,83 0,86 0,84 0,21 0,87 1,00

Be -0,39 0,92 -0,15 -0,25 0,96 0,37 0,23 -0,13 -0,09 0,68 0,95 0,54 0,94 0,15 0,98 0,95 0,95 0,76 0,97 0,75 1,00

Y -0,39 0,92 -0,14 -0,24 0,96 0,41 0,32 -0,15 -0,11 0,67 0,97 0,54 0,97 0,12 0,99 0,96 0,96 0,67 0,98 0,83 0,97 1,00

Page 25: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

125

Através da ACP, 5 factores foram extraídos, explicando 89,7% da variância total da

matriz original (Tabela 6.7).

Tabela 6.7 Valores próprios e percentagem de variância explicada por cada um dos eixos factoriais

F1 F2 F3 F4 F5

Valor Próprio

12,4 2,9 2,1 1,3 1,0

% Variância 56,4 13,2 9,7 6,0 4,4

% Variância acumulada

56,4 69,6 79,3 85,3 89,7

A projecção das variáveis no primeiro plano factorial, construído com o 1º e 2os eixos

factoriais, encontra-se representada na figura 6.9.

Figura 6.9 Projecção das variáveis activas e das variáveis suplementares no primeiro plano factorial (matriz inicial constituída por 78 amostras activas e 22 variáveis activas)

Page 26: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

126

O primeiro eixo factorial (F1) explica 56,4% da variância total. Este eixo mostra a

oposição entre a EC, SO42-, Mg2+, Al, Zn, Mn, Be, Y, Li, Co, Cr e Ni (lado negativo) e o pH

(lado positivo). Em drenagem mineira, esta correlação negativa é tipicamente observada

entre o pH e as concentrações de muitos metais e metalóides, catiões básicos e o sulfato

(Banks, 2004), uma vez que a geração e solubilidade destes elementos através de reacções

de dissolução de sulfuretos são dependentes do pH. Sendo assim, pode-se interpretar este

eixo como relacionado com a contaminação mineira – quanto mais negativo for o valor mais

contaminada se encontra a amostra.

O segundo eixo factorial corresponde a 13,2% da variância da matriz inicial. A

variável HCO3 – está localizada no lado positivo em oposição às variáveis Cl, Na e K, que se

encontram projectadas na parte negativa do 2º eixo. Estas variáveis estão associadas às

fácies regionais das águas.

A posição relativa do Fe, neste 1º plano factorial, é explicada pelo facto de o

relacionamento entre o pH e o Fe não ser directo dado que existe uma multiplicidade de

reacções a decorrerem ao mesmo tempo quando a água é muito agressiva (Wood et al.,

1999).

Os restantes eixos (não representados), geralmente, explicam a variância de apenas

um parâmetro ou estabelecem correlações pouco significativas entre dois parâmetros.

A figura 6.10 representa a projecção das amostras no primeiro plano factorial. É

possível separar as amostras em três grupos tendo em conta a sua posição no 1º eixo: a

descarga da escombreira (1), as descargas da mina (2) e um terceiro grupo formado pelos

furos, nascentes, rios (3). Também se nota que, com o tempo e tendo em conta o significado

do 1º eixo factorial, a escombreira da mina apresenta uma melhoria significativa de 1998 a

2004. De facto, verifica-se a aproximação das amostragens realizadas em 2003 e 2004 à

origem do eixo.

Page 27: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

127

Figura 6.10 Distribuição das diferentes amostras de água no primeiro plano factorial para a matriz inicial (78 amostras activas X 22 variáveis activas)

Tendo em conta a interpretação dada ao eixo 1 como estando associado ao grau de

contaminação (quanto mais distante se projecta uma amostra da origem, no lado negativo

do eixo 1, maior é o seu carácter anómalo), pode-se definir o subconjunto de amostras

anómalo como sendo constituído por todas as amostras da escombreira e das descargas da

mina (M1 e M3). Assim, a matriz inicial (78 amostras x 22 variáveis) foi dividida em dois

subconjuntos, um constituído pelas amostras que, provavelmente, representaram o padrão

hidroquímico natural das águas (61 x 22) e outro formado pelas amostras que poderão estar

associadas à anomalia geoquímica associada à contaminação mineira (17x22).

Com a aplicação da ACP a esta nova matriz (61x22) e a projecção suplementar das

amostras “anómalas” (17x22), entra-se na aplicação da segunda etapa da metodologia

definida na figura 6.8. A projecção das amostras activas e suplementares encontra-se na

figura 6.11. Como esperado, as amostras anómalas movem-se no sentido negativo do eixo

1, afastando-se da origem.

Page 28: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

128

Figura 6.11 Projecção das 61 amostras activas (a azul) e 17 suplementares (a vermelho) no primeiro plano factorial (após a aplicação do 2º passo da metodologia seguida)

As intensidades das anomalias das amostras podem ser medidas pela distância entre

as suas posições, ao longo do eixo 1, antes e após a projecção suplementar (Tabela 6.8).

Como se constata, a distância entre posição da amostra, ao longo do eixo 1, antes e após a

sua projecção suplementar apresenta, para algumas amostras, uma grande disparidade o

que provocava um desequilíbrio muito grande na matriz inicial. Ao retirarem-se essas

amostras da matriz, obteve-se a projecção representada na figura anterior. Aqui é visível

que as correlações entre as amostras que pertencem a este subgrupo amostral variaram

Page 29: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

129

relativamente ao grupo inicial. Há uma redistribuição das amostras ao longo do eixo 1,

dando-se a passagem de algumas delas para o lado negativo do eixo, isto é, para a região

da anomalia do espaço do factor.

Tabela 6.8 Distância entre a posição da amostra ao longo do eixo 1 antes e depois da sua projecção suplementar

Amostra Distância

E1A -59,612

E1B -100,486

E1D -29,403

E1E -17,365

E1F -27,215

E1G -28,911

M1A -13,718

M1B -11,228

M1D -7,118

M1E -6,531

M1F -5,994

M1G -6,894

M3A -6,349

M3B -1,764

M3D -2,827

M3F -1,485

M3G -2,059

A intensidade global da anomalia obtida através da média dos valores é -19,35.

Com o intuito de encontrar o melhor subconjunto de amostras anómalas, através da

interpretação dos dados representados na Figura 6.11, procedeu-se ao aperfeiçoamento do

subconjunto anómalo com integração de novas amostras que se encontravam na vizinhança

das fronteiras que definem as regiões da anomalia no espaço do factor. Assim, a aplicação

da terceira etapa da metodologia anteriormente definida permitiu alcançar a separação

óptima dos subconjuntos, onde uma anomalia global máxima foi obtida (-22,13). Conseguiu-

se, no final, uma matriz com as 22 variáveis e 57 amostras activas e outra matriz com 22

variáveis activas e 21 amostras suplementares.

A representação gráfica destes dois subconjuntos amostrais óptimos encontra-se na

figura 6.12. O primeiro eixo factorial separa a região onde as reacções da ácido-base

(neutralização) ocorrem (lado positivo) dos ambientes onde as reacções de oxidação

dominam (lado negativo). A presença das amostras do mesmo local em quadrantes

diferentes revela a mistura das águas por fracturas. O segundo eixo factorial separa as fácies

das águas regionais.

Page 30: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

130

Figura 6.12 Projecção das 57 amostras activas (a azul) e 21 suplementares (a vermelho) para a separação óptima alcançada no final da aplicação da metodologia

Na tabela 6.9 está representada a matriz de correlação p x p (57x22), revelando

existência de correlações bivariadas entre variáveis.

Page 31: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

131

Tabela 6.9 Matriz de correlação p x p para o subgrupo amostral obtido através da aplicação da metodologia seguida

pH EC Cl HCO3- SO4

2- NO3- F- Na+ K+ Ca2+ Mg2+ Si Li Fe Al Mn Zn Ni Co Cr Be Y

pH 1,00

EC -0,25 1,00

Cl -0,50 0,60 1,00

HCO3- 0,37 0,40 -0,17 1,00

SO42- -0,56 0,76 0,50 -0,14 1,00

NO3- 0,16 -0,28 0,01 -0,22 -0,36 1,00

F- -0,09 0,10 0,07 0,00 0,10 0,03 1,00

Na+ -0,36 0,66 0,95 -0,04 0,47 -0,05 0,11 1,00

K+ 0,14 -0,22 -0,01 -0,05 -0,33 0,47 0,00 -0,01 1,00

Ca2+ 0,42 0,54 -0,13 0,89 0,04 -0,17 0,00 0,04 0,01 1,00

Mg2+ -0,43 0,91 0,54 0,27 0,85 -0,37 0,11 0,54 -0,43 0,32 1,00

Si -0,46 0,61 0,71 0,09 0,48 -0,38 0,03 0,70 -0,42 0,01 0,65 1,00

Li -0,70 0,53 0,50 -0,18 0,79 -0,33 0,09 0,40 -0,29 -0,14 0,68 0,54 1,00

Fe -0,24 0,24 0,39 -0,20 0,31 -0,23 -0,13 0,31 -0,25 -0,22 0,25 0,45 0,28 1,00

Al -0,35 0,28 -0,08 -0,14 0,63 -0,03 0,13 -0,16 -0,17 -0,09 0,49 -0,06 0,41 -0,04 1,00

Mn -0,64 0,49 0,24 -0,16 0,81 -0,28 0,12 0,17 -0,36 -0,16 0,74 0,34 0,71 0,19 0,80 1,00

Zn -0,33 0,31 0,53 -0,18 0,40 -0,14 0,00 0,50 -0,10 -0,10 0,32 0,40 0,44 0,09 0,00 0,16 1,00

Ni -0,43 0,13 0,31 -0,30 0,36 -0,12 -0,02 0,18 -0,02 -0,32 0,28 0,25 0,43 0,13 0,25 0,44 0,35 1,00

Co -0,73 0,29 0,18 -0,35 0,71 -0,15 0,12 0,06 -0,22 -0,31 0,51 0,22 0,78 0,21 0,68 0,86 0,17 0,45 1,00

Cr 0,17 -0,23 -0,21 -0,24 -0,19 0,23 0,14 -0,15 0,28 -0,15 -0,30 -0,26 -0,28 -0,05 -0,03 -0,15 -0,11 -0,18 -0,11 1,00

Be -0,46 0,28 0,16 -0,35 0,63 -0,21 0,03 0,09 -0,25 -0,31 0,43 0,21 0,47 0,53 0,60 0,74 0,11 0,33 0,75 0,11 1,00

Y -0,40 0,32 0,00 -0,19 0,68 -0,10 0,11 -0,09 -0,19 -0,13 0,52 0,03 0,45 0,10 0,97 0,81 0,01 0,29 0,72 -0,04 0,70 1,00

Page 32: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

132

Pela apreciação simultânea das tabelas 6.6 e 6.9, observa-se que as correlações

entre os elementos químicos é diferente para ambos os grupos amostrais, o que revela

automaticamente a existência de diferentes processos hidroquímicos a decorrerem nos

diferentes pontos de amostragem.

O Ca2+ é dos elementos onde essa variação é mais notada. Na matriz inicial (Tabela

6.6), o Ca2+ apresenta uma correlação muito forte com o SO42-, indicando que as condições

químicas presentes são mais oxidantes e propícias à dissolução de gesso (CaSO4•2H2O). Esta

dissolução ocorre onde existem reacções redox que se encontram perfeitamente associadas

aos processos de drenagem mineira (ver capítulo 2). Já quando há separação do grupo

amostral (as amostras associadas à contaminação são retiradas), o Ca2+ correlaciona-se

fortemente com o ião HCO3-, podendo estar a indiciar a percolação da água pelas rochas e

seu sucessivo enriquecimento em Ca2+ e HCO3- (Appelo e Postma, 1996). Estes dados estão

de acordo com os mostrados na secção anterior relativamente às fácies hidroquímicas, onde

as águas que não apresentam qualquer tipo de contaminação podem surgir com fácies

bicarbonatadas cálcicas.

O novo posicionamento das variáveis no primeiro plano factorial, também, evidencia

alteração no comportamento dos elementos químicos (Figura 6.13).

Figura 6.13 Projecção das variáveis activas e suplementares da matriz no primeiro plano factorial para a separação óptima alcançada no final da metodologia

Page 33: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

133

O total da variância explicada por ambos os eixos diminui. As variáveis encontram-se

mais dispersas no plano factorial.

6.4.1.3 Síntese dos resultados

A aplicação da ACP segundo a metodologia definida no fluxograma permitiu distinguir

os principais processos hidroquímicos que estão a decorrer na área de estudo. A separação

em diferentes grupos amostrais permitiu:

• a identificação de variações hidroquímicas dentro do grupo amostral;

• a identificação de águas não contaminadas de águas contaminadas;

• a identificação dos elementos químicos associados à DMA;

• a visualização de variações temporais e espaciais das características hidroquímicas

das águas;

Através da projecção dos resultados médios obtidos para cada local no mapa da

área, antes e após a obtenção da anomalia global máxima onde se obteve a separação

óptima dos subconjuntos, é possível constatar que a aplicação desta metodologia melhorou

significativamente a interpretação dos resultados. Entre ambas as figuras (Figura 6.14 e

Figura 6.15) é possível observar um refinamento dos resultados permitindo a distinção

significativa das águas pertencentes ao subconjunto do fundo geoquímico.

Da figura 6.15 é, ainda, possível concluir que:

• Amostras de água da mesma litologia apresentam valores distintos no 1º factor, isto

é, têm diferentes composições químicas; daqui, se conclui que a litologia não é um

parâmetro que nestas condições influencie o tipo de água;

• a presença de falhas por si só também não é, uma vez que pontos de amostragem

localizados sobre falhas e na mesma litologia tem diferentes composições. Assim, as

falhas apenas são um factor determinante para a propagação de contaminação

quando existe comunicação hidráulica entre o interior da mina e o ponto de

amostragem.

Page 34: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

134

Figura 6.14 Projecção dos valores médios do 1º factor resultante da aplicação da ACP à matriz completa (78 amostras x 22 variáveis)

Figura 6.15 Projecção dos valores médios do 1º factor resultante da aplicação da ACP após a separação óptima dos subconjuntos (57 amostras x 22 variáveis)

Page 35: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

135

A projecção espacial dos valores factoriais das amostras para cada uma das

amostragens efectuadas encontram-se nas figuras 6.16 à 6.20.

Figura 6.16 Projecção dos valores do 1º factor para a amostragem de Abril de 1998 resultante da aplicação da ACP após a separação óptima dos subconjuntos

Figura 6.17 Projecção dos valores do 1º factor para a amostragem de Outubro de 1998 resultante da aplicação da ACP após a separação óptima dos subconjuntos

Page 36: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

136

Figura 6.18 Projecção dos valores do 1º factor para a amostragem de Abril de 2003 resultante da aplicação da ACP após a separação óptima dos subconjuntos

Figura 6.19 Projecção dos valores do 1º factor para a amostragem de Outubro de 2003 resultante da aplicação da ACP após a separação óptima dos subconjuntos

Page 37: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

137

Figura 6.20 Projecção dos valores do 1º factor para a amostragem de Junho de 2004 resultante da aplicação da ACP após a separação óptima dos subconjuntos

Figura 6.21 Projecção dos valores do 1º factor para a amostragem de Outubro de 2004 resultante da aplicação da ACP após a separação óptima dos subconjuntos

É possível concluir das figuras que há variações nos locais de amostragem

dependendo da época das amostragens. As variações não são maiores devido ao facto de, a

Page 38: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

138

partir de 2003, os anos hidrológicos terem sido anómalos não apresentando as variações

hidrológicas previstas para a altura da recolha das amostras.

Este trabalho desenvolvido através da aplicação da ACP e suas interpretações foram

bastante produtivas no sentido de funcionar como um sistema de alerta para situações e

pontos de amostragem. Assim, permite partir para a modelação geoquímica com uma

perspectiva completamente diferente.

Contudo, uma vez que se está a trabalhar com um grupo amostral bastante grande e

diversificado, alguns aspectos de reacções hidroquímicas podem ficar dissimulados. Tal

acontece, por exemplo, com a correlação entre o Fe e o SO42-. A fraca correlação existente

entre o Fe e o SO42- para ambas as tabelas de correlação poderia indicar que a oxidação da

pirite não é a reacção dominante nestas águas, incluindo as águas de mina. No entanto,

quando se aplicam coeficientes de correlação apenas às amostragens ocorridas em cada

local, denotamos que o coeficiente de correlação aumenta para valores superiores a 0,90

para as descargas directamente influenciadas pela mina (Tabela 6. 10).

Tabela 6. 10 Coeficientes de correlação entre o Fe e o SO42- obtidos para as descargas mineiras

Local de

amostragem Coeficiente de correlação

entre o Fe e o SO42-

M1 0,92

M3 0,99

E1 0,98

Para suprimir este problema, aos resultados obtidos através da ACP, foram aplicadas

técnicas de modelação hidrogeoquímica recorrendo ao programa PHREECQI (capítulo 7). A

conjugação de ambos os métodos permite obter duas abordagens diferentes do problema:

uma global onde é feita uma caracterização integral da área de estudo (quer a nível espacial

quer temporal) e outra específica, onde através dos dados obtidos anteriormente irá ser

realizado um estudo pormenorizado de alguns dos locais de amostragem.

Através dos dados obtidos nos diferentes tipos de captações foi possível identificar

que a contaminação mineira está a interferir nos níveis freáticos de tal modo que a utilização

actual das águas subterrâneas na envolvente deste Couto Mineiro deverá ser analisada no

contexto dos mecanismos que controlam a mobilidade dos metais, tendo em vista a

implementação de processos prévios de tratamento para rectificação da sua composição

química.

Page 39: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

139

6.5 Índice de Contaminação Mineira

A Comunidade Europeia, através das suas políticas ambientais, recomendou medidas

que visam a redução e eliminação de locais de poluição pontual e difusa. Os objectivos

destas leis foram abordados no capítulo 1.

O estudo, a caracterização e a monitorização de problemas ambientais (quer seja em

águas, solos, ar,....) exigem uma abordagem, pelos investigadores, multidisciplinar de

conhecimentos e de uma grande quantidade de dados científicos.

Um dos maiores problemas na aplicação destas leis é a transmissão do conhecimento

entre a comunidade científica, os políticos e a comunidade em geral, em especial, aos

políticos que aplicam as leis. A necessidade de criação de ferramentas, pelos investigadores,

que ajudem na transmissão dos problemas e a aplicação das leis torna-se essencial.

O uso de índices de qualidade pode ser uma das ferramentas que permite a ligação e

a comunicação entre todos. Estes índices são criados e desenvolvidos com o objectivo de,

rapidamente, associarem uma larga quantidade de informação a um único valor e, assim,

permitir uma compreensão dos dados científicos.

O objectivo principal deste capítulo é a criação de um índice de contaminação mineira

das águas que permita às pessoas, fora do domínio científico da drenagem mineira,

entenderem o problema e poderem usar este índice como um guia nos trabalhos de

monitorização que se desenvolvam em áreas afectadas por antigas minas.

6.5.1 Metodologia

As técnicas estatísticas multivariadas, Análise de Componentes Principais (ACP) e

Análise Factorial de Correspondências (AFC), podem ser utilizadas na construção de um

Índice de Contaminação Mineira da Água Subterrânea (ICMAS) (Ribeiro, 1996; Pereira e

Sousa, 2000; Stigter, 2005; Stigter et al., 2006).

A ACP já foi utilizada anteriormente neste capítulo; todavia, a metodologia empregue

na construção do ICMAS é distinta. Os passos gerais a seguir para a construção de um índice

são:

• selecção das variáveis a serem integradas no ICMAS;

• selecção de critérios e definição de duas amostras fictícias que representem a melhor

e a pior qualidade que a água pode ter;

Page 40: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

140

• extracção dos factores baseando-se apenas nestas duas amostras. As amostras reais

são tratadas como suplementares;

• cálculo do índice de contaminação através da projecção das amostras de água no 1º

eixo factorial.

O estudo de ACP efectuado precedentemente demonstrou que as variáveis que

estavam correlacionadas com a contaminação mineira eram: a conductividade eléctrica (EC),

SO42-, Mg, Al, Zn, Mn, Be, Y, Li, Co, Ni e o pH.

Contudo, para um índice ser facilmente aplicável convém ter o menor número de

variáveis para tornar a sua utilização mais acessível.

Os elementos químicos podem apresentar correlações entre eles. Tendo em conta

esta observação, para a selecção das variáveis a serem integradas no índice de

contaminação, efectuou-se uma análise das dependências entre os elementos, de modo a

verificar se a sua inclusão era necessária ou não.

O pH da água na área de trabalho apresenta um valor máximo de 6,84 o que é um

valor pouco superior ao valor guia definido na lei (6,5). Águas com valores baixos de pH são

típicos destes tipos de litologias atravessadas pelas águas (ver capítulo 3), não podendo,

neste caso, ser considerado um indicador de qualidade da água. Também, o facto de se

introduzirem para o cálculo do as drenagens mineiras ácidas e neutras faz com que o seu

uso como variável seja incorrecto.

Foi reconhecido, nas secções anteriores, que as águas que apresentavam

contaminação mineira eram sulfatadas magnesianas. Assim, é possível retirar o magnésio

uma vez que o aumento deste elemento na água está estreitamente correlacionado com o

sulfato.

O manganês, que é um constituinte muito comum em drenagens mineiras de carvão,

usualmente, persiste na água mesmo a longas distâncias, só desaparecendo da solução após

um longo tempo (Hem, 1985). A permanência em solução dos constituintes que estão

ligados à drenagem mineira é muito importante pois permite a sua utilização como traçador.

Esta característica é primordial para um elemento ser integrado num índice de

contaminação.

Page 41: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

141

Um estudo das concentrações do zinco no grupo amostral leva a presumir que a

origem deste elemento nas águas seja mais do que uma. Como se pode observar no anexo C

há um decréscimo acentuado de concentração em alguns locais tais como:

• na descarga da mina M1 de 1998 até 2004 (de 1,1 para 0,182 mg/L);

• no furo F13 desde a sua construção em Fevereiro de 2003 (primeira amostragem em

Abril do mesmo ano) até Outubro de 2004 (variação entre 6,96 e 0,34 mg/L);

Presume-se que estas variações severas possam estar associadas à dissolução do

zinco presente nos tubos. As flutuações sazonais nos restantes furos podem estar ligadas à

interacção água /rocha, mas também podem estar associadas à mesma fonte de poluição

antropogénica. Por esta razão, não é aconselhável o uso do zinco na construção do índice.

Nas tentativas realizadas de obter o melhor índice possível, foi verificado que as

presenças do itrío e do berílio, no cálculo do índice são extremamente pequenas, optando-se,

assim, por retirar estes dois elementos.

O cobalto, em águas não contaminadas, tem concentrações de apenas alguns µg/L.

Nas águas analisadas, o valor de cobalto atinge valores de 1000 µg/L quando associado à

contaminação. A abundância do níquel é maior que a do cobalto na crusta terrestre. São dois

elementos que têm algumas características similares como, por exemplo, a sua tendência

para co-precipitar com óxidos de ferro e, especialmente, com óxidos de manganês (Hem,

1985). Como a correlação entre estes dois elementos não é muito forte para as águas

analisadas, optou-se por manter os dois para o cálculo do índice.

Tendo em consideração estas observações, a construção de um índice de

contaminação mineira teve por base os seguintes elementos: sulfato, ferro, alumínio,

manganês, níquel, lítio e cobalto.

A base de dados, utilizada nos capítulos anteriores, inclui quer águas subterrâneas

quer superficiais. O estabelecimento de um índice não permite a utilização de ambas ao

mesmo tempo pois os processos químicos que ocorrem são diferentes. As colheitas de águas

nos rios envolventes (A1, A2, A3 e A5) foram realizadas apenas com o objectivo de servirem

de pontos de controlo químico das descargas da escombreira (E1) e do nível 20 da mina

(M1). As diferenças químicas entre os diversos pontos são enormes o que utiliza-los para a

construção de um índice de contaminação de águas superficiais seria erróneo.

Para a definição das duas amostras fictícias (Tabela 6.11), que correspondam aos

limites superior e inferior do índice, utilizaram-se as concentrações mínimas e máximas

Page 42: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

142

encontradas para os parâmetros químicos do grupo amostral formados pelas 50 amostras de

águas subterrâneas. Na análise fictícia de concentração mínima o único valor que não

corresponde aos limites de detecção é o sulfato.

Tabela 6.11 Definição dos limites das amostras para a construção do ICMAS (todos os valores em mg/L)

SO42- Li+ Fe2+ Al Mn Ni Co

Concentração máxima

2564 0,43 336 17,8 36,8 1,4 1,1

Concentração mínima

4,3 O,008 0,0025 0,001 0,005 0,0004 0,00002

Por último, a extracção dos factores foi efectuada numa matriz de duas amostras

activas (as amostras fictícias) e 7 variáveis. O resultado é a extracção de um único factor

que explica 100% da variância dos dados. Este factor corresponde ao ICMAS e varia num

intervalo de -1 (melhor composição) e 1 (pior composição).

As amostras reais são introduzidas no programa como amostras suplementares (isto

é, a sua presença não contribui para os cálculos efectuados na extracção do factor) para

obtenção da sua localização no factor extraído. É definido, deste modo, o grau de associação

que as amostras reais tem com as amostras fictícias que definem a melhor (-1) e a pior

composição que as águas podem ter (1).

6.5.2 Aplicação ao caso de estudo

A construção do ICMAS foi efectuada de acordo com a metodologia definida na

secção anterior. No total foram utilizadas todas as amostras de águas subterrâneas

recolhidas entre 1998 e 2004. A análise química da água da chuva, correspondendo a uma

água desmineralizada, foi incluída, para servir de guia na projecção das amostras.

Na Figura 6.22 estão representados os resultados obtidos.

Figura 6.22 Índice de contaminação mineira para águas subterrâneas (ICMAS) obtido através da aplicação da ACP segundo a metodologia definida (a identificação das amostras foi sobre elevada para melhor identificação dos pontos que se encontram sobrepostos)

Page 43: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

143

A primeira ilação que se pode retirar da figura 6.22 é que a maioria dos dados se

encontram muito próximos do valor -1 (melhor composição). Isto deve-se à circunstância de

as concentrações máximas e mínimas dos elementos químicos, usados para a definição das

amostras fictícias, serem muito díspares. O facto de serem usadas as amostras da descarga

mineira M1, com concentrações muito altas (Anexo C), faz com que as restantes amostras

sejam projectadas para o lado negativo do índice.

Outra dedução é que os valores que definem a análise fictícia de pior composição não

se baseiam, exclusivamente, nas concentrações num local de amostragem. É a variável

alumínio que interfere na composição final desta análise fictícia. As características químicas

de dissolução e precipitação do alumínio estão estreitamente relacionadas com o pH da água.

A partir de pH superiores a 4,5 o alumínio tende a precipitar, enquanto para valores

inferiores tende a ficar dissolvido. Altas concentrações de alumínio são esperadas para as

drenagens mineiras ácidas como é o caso da descarga M3. A eliminação do alumínio como

variável do índice mascara os problemas de contaminação mineira em locais de pH mais

baixo, através da deslocação das amostras para o lado negativo do factor. A deslocação é

bastante marcada para a descarga de mina M3 e o furo F19 (Figura 6.23) onde o alumínio é

uma variável muito importante. Isso faz com que aumente a disparidade entre o grupo de

amostras, não sendo, por isso, uma solução a tomar.

Figura 6.23 Projecção das amostras reais após retirada da variável alumínio no cálculo do índice de contaminação (a identificação das amostras foi sobre elevada para melhor identificação dos pontos que se encontram sobrepostos)

A projecção localizada de quase todas as amostras dos furos não demonstra a

ausência de contaminação mineira mas sim uma discrepância dos valores das concentrações

encontradas na área de estudo. Assim, o ICMAS tem que ser utilizado, neste caso concreto,

com algum cuidado.

Page 44: 1. CAPÍTULO - lneg.pt · para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio; 105 ... magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último,

144

6.5.3 Considerações finais

Embora os resultados alcançados ficassem aquém do esperado uma vez que se está

perante uma área muito complexa a nível geológico, a metodologia utilizada neste índice

poderá ser utilizada noutros locais e com resultados mais satisfatórios. Para tal, basta que na

definição das amostras fictícias de água as variações entre amostras reais sejam menos

elevadas.

As variáveis utilizadas para a construção do índice revelaram-se apropriadas. As

várias experiências realizadas para diminuição do seu número demonstraram que tal

prejudicava a fiabilidade dos resultados. Um exemplo destas tentativas foi dado através do

cálculo do índice com a exclusão da variável alumínio (Figura 6.23).

As águas analisadas são águas naturais, sem qualquer tipo de tratamento, onde os

limites dos valores guia definidos na lei, para águas para consumo humano, são muitas

vezes excedidos. Tal pode não representar uma contaminação, mas apenas ser o reflexo das

litologias atravessadas. No entanto, é possível realizar uma análise, onde as características

da geoquímica de fundo são retiradas e salientar os problemas associados à contaminação

mineira. Pelas razões expostas, este índice não pode ser considerado um índice de qualidade

da água mas sim um índice de composição da água subterrânea.

De realçar que várias tentativas foram realizadas na procura de um índice que

expressasse da melhor maneira possível os problemas das águas afectadas pela

contaminação mineira. Outras metodologias foram aplicadas, como a Análise Factorial de

Correspondência, mas sem êxito. A razão principal para este insucesso, deve-se ao facto de

se estar a trabalhar com águas quimicamente muito complexas.