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3 DE FEVEREIRO DE 2010\2 em foco 3 DE FEVEREIRO DE 2010\3 em foco Editorial E se fingíssemos que não há problema nenhum? PAULA TELO ALVES H á uns anos, em casa de uma amiga portugue- sa, conheci um imi- grante perfeitamente integra- do. Ele tinha vindo fazer uns arranjos em casa dela, num bairro central da capital luxem- burguesa, e quando veio à cozinha despedir-se, fê-lo em português. Até aqui, nada de mais, não fosse ele ser loiro e ter pinta de eslavo. Português irrepreensível, porém. Não re- sisti à curiosidade (não é impunemente que se é jornalista), e ele confirmou as minhas suspeitas: era jugoslavo. E onde tinha aprendido a falar portu- guês? "Nas obras!", naturalmente. Francês, nem uma palavra; português, fluente como um nativo da Figueira. É assim por esse país fora: a língua oficial dos "chantiers" (estaleiros de construção) é o português. Quem trabalhe nas obras acabará tarde ou cedo a falá-lo, mesmo que não tenha nascido em Portugal, porque a proporção de trabalhadores portugueses é esmagadora. E porque a necessidade faz o engenho, é natural que muitos nunca te- nham sentido a necessidade, nem tido a ocasião, de aprender outra língua. Há 20 anos, quando estes homens vieram para o Luxemburgo, não se lhes pedia mais que serem capazes de construir uma parede ou armarem estruturas de betão. Mas o mundo pula e avança e hoje é preciso certificar as competências e aprender todos os dias. E a estes homens que nunca tiveram que falar uma palavra em francês, que em muitos casos não têm mais que a quarta classe, pede-se-lhes hoje que voltem aos bancos da escola e aprendam novas competências – em francês. E façam testes – em francês, a língua estrangeira nas obras. Não sei se a solução passa por dar cursos de formação em português a estes homens, se por lhes dar aulas de francês, se por dar formação adaptada, em termos de conteú- do, às suas competências (para alguns, a dificuldade passa não só pela língua como pela matemática e pelo raciocínio abstracto – é preciso que aprendam a aprender). O que sei é que há um problema que é preciso resolver, e não é aceitável que o patronato, que aceitou anos a fio que os seus trabalha- dores falassem apenas e só português, venha agora demitir-se de encontrar solu- ções para um problema que ajudou a criar. Não vale é fingir que o problema não existe, porque atrás deste vêm outros, como o desemprego e a exclusão social. Na resolução de todos os problemas, metade do trabalho passa por identificá- lo; a outra, por encontrar respostas. Coragem, portugueses, já só falta a solu- ção! Ministros do Trabalho de Portugal e Luxemburgo encontraram-se em Barcelona Grupo de trabalho é a resposta no combate ao desemprego Helena André, ministra da Seguraça Social e do Trabalho portuguesa, encontrou-se em Barcelona com os seus homólogos luxemburgueses: Nicolas Schmit e Mars di Bartolomeo. Os responsáveis políticos trocaram impressões sobre o desemprego dos portugueses no Grão-Ducado e também sobre os sistema de reformas Foto: SIP Os ministros do Trabalho do Lu- xemburgo e de Portugal encontra- ram-se, na semana passada, em Barcelona, à margem da Cimeira Informal de ministros da UE. Na agenda, os dois ministros tinham a situação dos trabalhado- res portugueses, sobretudo os do sector da construção civil, que constituem o grosso dos desempre- gados inscritos na ADEM (Adminis- tração do Emprego). Em Barcelona, os dois ministros acordaram constituir um grupo de trabalho que vai avaliar a situação e encontrar soluções para fazer face à situação dos portugueses. Christophe Schiltz, chefe de Ga- binete do ministro do Trabalho lu- xemburguês, confirmou ao CON- TACTO que os dois ministros fala- ram sobre a possibilidade da forma- ção profissional dos portugueses ser feita em português, mas que "essa é uma questão que vai agora ser estudada no âmbito do grupo de trabalho que foi criado". Sem data marcada para o início das reuniões, o chefe de Gabinete do ministro Nicolas Schmit reco- nhece que é particularmente difícil para os trabalhadores portugueses do sector da construção civil en- contrarem um novo trabalho ou mesmo recorrer à formação profis- sional. "Os portugueses que trabalham nas obras têm baixas qualificações, só falam praticamente português e o francês é muito deficiente. Assim é muito difícil poderem aceder à formação profissional". Em Lisboa, o Gabinete da minis- tra diz que este grupo de trabalho pretende "facilitar uma mobilidade de trabalho de qualidade entre os dois países e articular as interven- ções de formação profissional, quer no combate ao desemprego, quer numa facilitação maior da integra- ção no mercado de trabalho". Recorde-se que os representantes da central sindical luxemburguesa OGB-L pediram na semana passada à ministra do Trabalho e da Solida- riedade Social portuguesa, Helena André, a colaboração de Portugal na formação profissional dos emi- grantes portugueses desemprega- dos no Luxemburgo. Os responsáveis do sindicato lu- xemburguês estiveram reunidos em Lisboa com a ministra do Trabalho e na altura os sindicalistas puseram o dedo na ferida: "Temos um pro- blema muito concreto: os portu- gueses falam a língua portuguesa, mas não falam as outras. Os profes- sores (da formação profissional) são todos de língua luxemburguesa, francesa ou alemã. Como é que vão comunicar?", questionou à saída do encontro Carlos Pereira, dirigente da OGB-L. Os sindicalistas do OGB-L pedi- ram ao Governo português "uma colaboração mais forte com Portu- gal", chegando mesmo a pedir que alguns técnicos portugueses se des- loquem ao Luxemburgo para que possam dar formação profissional em português – uma proposta que o sindicato vem fazendo desde 2008. Segundo o sindicato, a mi- nistra portuguesa foi receptiva à proposta da OGBL. A taxa de desemprego dos portu- gueses no Grão-Ducado é elevadíssi- ma. De acordo com Carlos Pereira, um em cada três desempregados no Luxemburgo é português. "Dos 20 mil desempregados, uma terça parte é de nacionalidade portuguesa". Dados da ADEM revelam que actualmente estão 3.700 portugue- ses desempregados no país. Em Barcelona ficou já agendado um segundo encontro entre os ministros do trabalho dos dois paí- ses. Uma reunião que, segundo informação recolhida junto do Ga- binete da ministra Helena André deverá acontecer durante a deslo- cação ao Conselho Europeu do emprego agendado para 8 de Junho. Em matéria de Segurança Social, o Ministério do Trabalho em Lisboa garante que também está prevista para Abril uma reunião, "decorrente de uma iniciativa já anterior, que deverá ser uma segunda etapa de negociações para agilização da co- ordenação dos regimes de Segu- rança Social, nomeadamente em matéria de pensões". Domingos Martins OGB-L quer que trabalhadores portugueses na construção tenham formação na língua materna "A língua que reina nos chantiers é o português" Foto: Marc Wilwert Estão há 20 anos no Lu- xemburgo mas só falam português, "a língua que reina nas obras". Antes, a experiência chegava para certificar as suas competên- cias e progredir na carreira. Hoje, pede-se-lhes que vol- tem aos bancos da escola e obtenham certificação teóri- ca, mas a língua é um pro- blema. O pouco francês que aprenderam não chega para terem formação nesse idio- ma, garante a OGB-L, que quer uma solução para os trabalhadores portugueses do sector. P edro Pedreiro (chamemos-lhe assim*) trabalha nas obras desde que chegou ao Luxemburgo, há 20 anos. Faz parte dos milhares de pedreiros e carpinteiros de cofragem ("maçons") que a convenção colectiva do sector agrupa na categoria B, e está no terceiro escalão. Na gíria da con- venção colectiva e para efeitos salari- ais, é um B3. Isto quer dizer que este carpinteiro é capaz de trabalho autó- nomo, de ler uma planta de construção e de executar as indicações de um "croquis". Já teve 23 homens a seu cargo durante três anos, e a empresa onde trabalha ficou "muito orgulhosa" com o seu trabalho. Mas para passar ao escalão seguinte (chefe de equipa) e passar a receber um salário de acordo com as funções que já desempenha, a lei luxemburguesa exige que as suas competências sejam certificadas pelo IFSB (Institut de Formation Sectoriel du Bâtiment), um instituto criado em 2002 para dar formação aos trabalha- dores da construção. No exame de aptidão, Pedro chumbou duas vezes e foi obrigado a frequentar a formação para B2, um grau abaixo do que exerce há 20 anos. Mas no exame final do curso de B2, voltou a chumbar. "Correu mal por eu não perceber o francês. Eles deviam primeiro dar uma formação em francês ou dar as aulas em português, porque senão só facili- tam a vida aos luxemburgueses, aos belgas e franceses. E não são eles que vão ensinar os portugueses a traba- lhar!", queixa-se. "O nosso problema é falarmos sempre com portugueses. Eu compreendo o francês e a falar desen- rasco-me mais ou menos, mas a escre- ver e a ler tenho dificuldades", admite. "FRANCÊS É A MAIOR DIFICULDADE" Pedro não é caso único, garante José Pinto, presidente do sindicato da cons- trução na OGB-L. "Conheço excelentes trabalhadores que chumbaram três ve- zes no exame". O sindicalista vem defendendo que o IFSB dê formação em português – uma proposta que a OGB-L lançou em 2008 (ver caixa) –, com formadores que poderiam vir do Instituto de Formação Profissional em Portugal. "Actualmente, é a língua portu- guesa que reina no 'chantier' [estaleiro de construção]. Em algumas empresas, 75 % dos trabalhadores são portugue- ses. Temos jugoslavos, franceses, bel- gas e falam todos português, e quando não falam compreendem. Na minha empresa, até um luxemburguês que lá temos fala português", explica ao CONTACTO. Se o português é língua franca nas obras, na formação profissional é um "handicap". "Há pessoas que traba- lham há 20 anos no Luxemburgo e não falam uma palavra de francês. Algu- mas são analfabetas. 'Oui, chef', 'non, chef', é tudo o que sabem dizer". É o caso de Fernando*. "Sei fazer o meu nome e pouco mais. Francês não falo nada", diz este operário de 56 anos. E conta a história de quando o chefe lhe veio dizer que pusesse óculos de pro- tecção. "Eu respondi-lhe 'Oui' mas não percebi nada, e ele não percebia por- que é que eu dizia que sim e não punha os óculos". Fernando é "um excelente carpin- teiro de cofragem", garante José Pinto, tal como José*, de 52 anos, que só tem a quarta classe e fala um francês rudimentar. "Mas se mandarmos estes homens fazerem a tal formação, daqui a vinte anos ainda não passaram". Riem-se os dois e concordam. "Eu já não tenho cabeça para isso", descul- pa-se José. Mas Fernando, analfabeto, não é tão pessimista: "Eu era o mais velho da família e não pude ir à escola, tive de ir trabalhar para ajudar os meus irmãos. Mas agora em Portugal há velhos de 70 anos a aprender compu- tadores. Há sempre tempo para apren- der". APRENDER A APRENDER António Ferreira da Costa chegou ao Luxemburgo em 1988 e teve de se adaptar às circunstâncias. "Nos primeiros cinco ou seis anos foi difícil, porque trabalhei com italia- nos. Aqui há uns anos, eu falava melhor o italiano que o francês. Depois comprei um dicionário e comecei a traduzir algumas palavras, e agora dá para desenrascar em qualquer parte onde vá, mas nas coisas mais compli- cadas prefiro pedir ajuda a alguém". Tem 47 anos e a quarta classe. No exame de aptidão do Instituto de Formação para o Sector da Constru- ção, um teste prévio obrigatório para ser admitido nos cursos, chumbou. Ele e mais 21 pessoas. "Éramos 27, todos portugueses. Só passaram seis". Apesar de ter a categoria profissio- nal de B2 (a meio do escalão) há 22 anos, teve de recomeçar do zero e frequentar o curso para o grau inferior, e as dificuldades que encontrou não foram só linguísticas. "[O curso] havia de estar traduzido para português. É a primeira dificul- dade para nós. Há palavras que não conhecemos e temos de perguntar ao monitor. Uma vez nem o monitor sabia o que aquela palavra queria dizer. Depois, o pessoal é especialista a tra- balhar, e eles dão muita matéria que não se aplica na realidade". O que lhe valeu foi que a formadora "falava devagarinho e traduzia algu- mas coisas para português". "E depois havia lá os que falavam bem o francês, e traduziam-nos. Ajudávamo-nos uns aos outros". "Em muitos casos, as designações técnicas não são as que os trabalhado- res conhecem", explica o presidente do sindicato de construção da OGB-L. "Às vezes chama-se a um instrumento 'um chavelho', toda a gente diz 'passa-me o chavelho' e toda a gente sabe o que é, mas as pessoas não sabem o nome técnico", observa José Pinto. O que não os impede de serem bons profissi- onais, garante. "Uma vez um formador disse-nos: 'O que é que vocês estão aqui a fazer [na formação para B1]? Vocês sabem mais que muitos B2 ou B3 que passaram por aqui, só que eles passaram o teste [de admissão] e vocês não!", conta António da Costa. "A gente sabe o que está a fazer, não é preciso ir à escola para saber o que está a fazer, mas é preciso ir à escola para ter trabalho", resume An- tónio. E não é só a língua que coloca dificuldades a estes homens, garante Filipe*, com 43 anos e o 9 o ano do liceu. Filipe chumbou no exame de aptidão para B3 e teve de fazer o curso de B1, apesar de exercer a profissão como B2. "A língua para mim foi um grande obstáculo. E a matéria, que é para engenheiros e não para trabalha- dores da construção. Para quem tem pouca escola em Portugal, que é o caso da maioria das pessoas, o curso é dificílimo", garante. Na sua turma, a maioria ficou pelo caminho. "Éramos 10, todos portu- gueses, e só passaram quatro [no exame final], uns por causa da língua, outros porque são pessoas com uma certa idade e já não entra nada na cabeça". António da Costa foi um dos que passou o exame de B1 no ano passado e está ansioso por que o chamem para o curso seguinte. "Se me chamarem para B2, vou fazê-lo", garante ao CONTACTO. E depois das dificuldades por que passou, já tem saudades da escola. "Eu no início dava-me o sono, porque não estou habituado a estar sentado. E é tudo diferente do que estamos habituados. Uma vez pediram-nos para calcular o volume de terra retirado de uma vala, dando-nos as medidas, e eu não sabia fazer isso. E os ângulos: no 'chantier' estamos ha- bituados a traçar com régua e lápis, e eles lá no IFSB trabalham com um sistema diferente. Foi difícil, ficava a estudar até à meia-noite porque havia muitos cálculos, às vezes doía-me a cabeça, mas agora já tenho saudades e quero continuar", conta ao CONTAC- TO. É bom que continue: só tem di- ploma de B1, e se "perder o emprego e for para outro, vai ser contratado como B1" apesar de actualmente tra- balhar como B2, avisa o sindicalista da OGB-L. Descer de escalão significa baixar de salário, dos 13,7450 euros por hora que auferem os B2 para os 12,4846 que a convenção colectiva prevê para os B1 – menos 222 euros ao fim do mês. E não fazer a formação significa ficar preso no mesmo escalão, a ganhar o mesmo salário até à re- forma – ou até serem "incapazes de trabalhar por causa de problemas de saúde, quando um bom operário podia ser convertido num técnico se tivesse formação", lamenta José Pinto. Paula Telo Alves * A maioria dos entrevistados nesta reportagem pediu o anonimato. Dificuldades linguísticas dos trabalhadores do sector da construção Um problema à espera de solução Desde 2002 que a lei exige um diploma emitido pelo Institut de Formation Sectoriel du Bâtiment (IFSB) para progredir de escalão profissional e aumentar de salário. Antes, bastava a antiguidade. Para a maioria dos portugueses do sector, isso significa fazer for- mação e exames numa língua que não dominam. Na OGB-L, há muito que se discute o problema, que não se limita "aos trabalhadores que estão no activo e afecta muitos no de- semprego", frisa o presidente do sindicato da construção. E o as- sunto já chegou ao governo lu- xemburguês. "Já falámos ao ministro Biltgen [titular da pasta do Emprego na última legislatura] e agora falámos ao Nicolas Schmit [actual ministro do Emprego e da Imigração]", re- corda José Pinto. Em Novembro, o embaixador de Portugal no Luxemburgo já abor- dara o problema com Schmit: 32 % dos desempregados são portugue- ses, o que representa 10 % da população activa portuguesa. Mui- tos "são pessoas que ainda não têm idade para a reforma e que estão em situação precária", "emprega- dos pouco qualificados" a quem "a crise no sector da construção afec- tou particularmente", disse nessa altura Pessanha Viegas ao CON- TACTO. "O problema é que não domi- nam o francês escrito e nem sequer passam nos testes de admissão para poderem receber formação. A comunidade portuguesa funciona ainda muito em circuito fechado, e o português é a língua utilizada no trabalho e na família. Uma possibi- lidade que discuti com o ministro Nicolas Schmit seria fazer testes orais de admissão. A outra é dar formação em português, com a colaboração do instituto de forma- ção profissional equivalente em Portugal", avançou na altura ao CONTACTO. Uma proposta primeiro avan- çada pela OGB-L em 2008 mas a que muitos se opõem, a começar pelo Instituto de Formação para o Sector da Construção. "Os patrões são contra [a forma- ção em português], e o IFSB é financiado integralmente pelo pa- tronato", diz Luc de Matteis, secre- tário do sindicato de construção que José Pinto preside. "Falámos com a ministra do Trabalho portu- guesa para ver o que se podia fazer para ajudar estes trabalhadores, mas a discussão não é tão simples como isso. Não basta 'importar' formadores portugueses, porque depois os patrões exigem que os operários falem francês", diz Luc de Matteis José Pinto acha a exigência ir- realista. "Nas empresas as pessoas dizem: 'Ah, mas eles deviam apren- der francês'. Mas é difícil, para alguém que tem 40 ou mais anos e tem uma profissão pesada fisica- mente, ir agora aprender uma lín- gua de raiz. Estas pessoas nos últimos 20 anos foram úteis nos 'chantiers' [estaleiros de constru- ção], e agora de um momento para o outro têm de fazer formação por causa dos patrões. Em vez de enfi- armos as pessoas num buraco, por- que não dar-lhes formação em português?", insiste. Luc de Matteis hesita. "É preciso termos cuidado para não tomarmos decisões que pare- cem boas mas que depois agravam o problema", recomenda. "A ques- tão não é obrigar as pessoas a aprender francês por uma questão nacionalista, por ser uma da lín- guas do país, mas para estarem protegidas. Quem só fala portu- guês está fragilizado no trabalho, os patrões pagam-lhes menos e eles não se sabem defender". Dar formação em francês é a solução que o secretário do sindi- cato da construção prefere, mas também aí há vários problemas. É que a lei luxemburguesa não prevê licenças para aprendizagem do francês: o "congé linguistique" aprovado em 2008 só contempla o luxemburguês, e aprender uma lín- gua nova leva tempo, diz José Pinto. "É preciso encontrar uma solu- ção a curto prazo para que os trabalhadores que estão cá há 20 ou mais anos possam evoluir entre [os graus de] B1 e B3", insiste. "Os trabalhadores portugueses que agora chegam já têm mais habilita- ções, e daqui a dez anos não haverá este problema". O assunto vai ser objecto de discussão de um grupo de trabalho criado pelos ministros do Emprego dos dois países (ver artigo na pá- gina 2). Paula Telo Alves

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3 DE FEVEREIRO DE 2010\2em foco 3 DE FEVEREIRO DE 2010\3 em foco

EditorialE se fingíssemos que não há problema nenhum?

PAULA TELO ALVES

H á uns anos, em casa deuma amiga portugue-sa, conheci um imi-

grante perfeitamente integra-do. Ele tinha vindo fazer unsarranjos em casa dela, numbairro central da capital luxem-burguesa, e quando veio àcozinha despedir-se, fê-lo emportuguês. Até aqui, nada demais, não fosse ele ser loiro eter pinta de eslavo. Portuguêsirrepreensível, porém. Não re-

sisti à curiosidade (não é impunemente que se éjornalista), e ele confirmou as minhas suspeitas: erajugoslavo. E onde tinha aprendido a falar portu-

guês? "Nas obras!", naturalmente. Francês,nem uma palavra; português, fluente comoum nativo da Figueira.

É assim por esse país fora: a língua oficialdos "chantiers" (estaleiros de construção) éo português. Quem trabalhe nas obrasacabará tarde ou cedo a falá-lo, mesmo quenão tenha nascido em Portugal, porque aproporção de trabalhadores portugueses éesmagadora. E porque a necessidade faz oengenho, é natural que muitos nunca te-nham sentido a necessidade, nem tido aocasião, de aprender outra língua. Há 20anos, quando estes homens vieram para oLuxemburgo, não se lhes pedia mais queserem capazes de construir uma parede ou

armarem estruturas de betão. Mas o mundopula e avança e hoje é preciso certificar ascompetências e aprender todos os dias. E aestes homens que nunca tiveram que falaruma palavra em francês, que em muitoscasos não têm mais que a quarta classe,pede-se-lhes hoje que voltem aos bancosda escola e aprendam novas competências– em francês. E façam testes – em francês, alíngua estrangeira nas obras.

Não sei se a solução passa por dar cursosde formação em português a estes homens,se por lhes dar aulas de francês, se por darformação adaptada, em termos de conteú-do, às suas competências (para alguns, adificuldade passa não só pela língua como

pela matemática e pelo raciocínio abstracto– é preciso que aprendam a aprender). Oque sei é que há um problema que é precisoresolver, e não é aceitável que o patronato,que aceitou anos a fio que os seus trabalha-dores falassem apenas e só português,venha agora demitir-se de encontrar solu-ções para um problema que ajudou a criar.Não vale é fingir que o problema não existe,porque atrás deste vêm outros, como odesemprego e a exclusão social.

Na resolução de todos os problemas,metade do trabalho passa por identificá-lo; a outra, por encontrar respostas.Coragem, portugueses, já só falta a solu-ção!

Ministros do Trabalho de Portugal e Luxemburgo encontraram-se em Barcelona

Grupo de trabalho é a respostano combate ao desemprego

Helena André, ministra da Seguraça Social e do Trabalho portuguesa, encontrou-se em Barcelona com os seus homólogosluxemburgueses: Nicolas Schmit e Mars di Bartolomeo. Os responsáveis políticos trocaram impressões sobre o desempregodos portugueses no Grão-Ducado e também sobre os sistema de reformas Foto: SIP

Os ministros do Trabalho do Lu-xemburgo e de Portugal encontra-ram-se, na semana passada, emBarcelona, à margem da CimeiraInformal de ministros da UE.

Na agenda, os dois ministrostinham a situação dos trabalhado-res portugueses, sobretudo os dosector da construção civil, queconstituem o grosso dos desempre-gados inscritos na ADEM (Adminis-tração do Emprego).

Em Barcelona, os dois ministrosacordaram constituir um grupo detrabalho que vai avaliar a situação eencontrar soluções para fazer face àsituação dos portugueses.

Christophe Schiltz, chefe de Ga-binete do ministro do Trabalho lu-xemburguês, confirmou ao CON-TACTO que os dois ministros fala-ram sobre a possibilidade da forma-ção profissional dos portuguesesser feita em português, mas que"essa é uma questão que vai agoraser estudada no âmbito do grupo detrabalho que foi criado".

Sem data marcada para o iníciodas reuniões, o chefe de Gabinetedo ministro Nicolas Schmit reco-nhece que é particularmente difícilpara os trabalhadores portuguesesdo sector da construção civil en-contrarem um novo trabalho oumesmo recorrer à formação profis-sional.

"Os portugueses que trabalhamnas obras têm baixas qualificações,só falam praticamente português eo francês é muito deficiente. Assimé muito difícil poderem aceder àformação profissional".

Em Lisboa, o Gabinete da minis-tra diz que este grupo de trabalhopretende "facilitar uma mobilidadede trabalho de qualidade entre osdois países e articular as interven-ções de formação profissional, querno combate ao desemprego, quernuma facilitação maior da integra-ção no mercado de trabalho".

Recorde-se que os representantesda central sindical luxemburguesaOGB-L pediram na semana passadaà ministra do Trabalho e da Solida-riedade Social portuguesa, HelenaAndré, a colaboração de Portugalna formação profissional dos emi-grantes portugueses desemprega-dos no Luxemburgo.

Os responsáveis do sindicato lu-xemburguês estiveram reunidos emLisboa com a ministra do Trabalho

e na altura os sindicalistas puseramo dedo na ferida: "Temos um pro-blema muito concreto: os portu-gueses falam a língua portuguesa,mas não falam as outras. Os profes-sores (da formação profissional) sãotodos de língua luxemburguesa,francesa ou alemã. Como é que vãocomunicar?", questionou à saída doencontro Carlos Pereira, dirigenteda OGB-L.

Os sindicalistas do OGB-L pedi-ram ao Governo português "umacolaboração mais forte com Portu-gal", chegando mesmo a pedir quealguns técnicos portugueses se des-loquem ao Luxemburgo para quepossam dar formação profissional

em português – uma proposta queo sindicato vem fazendo desde2008. Segundo o sindicato, a mi-nistra portuguesa foi receptiva àproposta da OGBL.

A taxa de desemprego dos portu-gueses no Grão-Ducado é elevadíssi-ma. De acordo com Carlos Pereira,um em cada três desempregados noLuxemburgo é português. "Dos 20mil desempregados, uma terça parteé de nacionalidade portuguesa".

Dados da ADEM revelam queactualmente estão 3.700 portugue-ses desempregados no país.

Em Barcelona ficou já agendadoum segundo encontro entre osministros do trabalho dos dois paí-

ses. Uma reunião que, segundoinformação recolhida junto do Ga-binete da ministra Helena Andrédeverá acontecer durante a deslo-cação ao Conselho Europeu doemprego agendado para 8 deJunho.

Em matéria de Segurança Social,o Ministério do Trabalho em Lisboagarante que também está previstapara Abril uma reunião, "decorrentede uma iniciativa já anterior, quedeverá ser uma segunda etapa denegociações para agilização da co-ordenação dos regimes de Segu-rança Social, nomeadamente emmatéria de pensões".

■ Domingos Martins

OGB-L quer que trabalhadores portugueses na construção tenham formação na língua materna

"A língua que reina nos chantiers é o português"

Foto: Marc Wilwert

Estão há 20 anos no Lu-xemburgo mas só falamportuguês, "a língua quereina nas obras". Antes, aexperiência chegava paracertificar as suas competên-cias e progredir na carreira.Hoje, pede-se-lhes que vol-tem aos bancos da escola eobtenham certificação teóri-ca, mas a língua é um pro-blema. O pouco francês queaprenderam não chega paraterem formação nesse idio-ma, garante a OGB-L, quequer uma solução para ostrabalhadores portuguesesdo sector.

P edro Pedreiro (chamemos-lheassim*) trabalha nas obras desdeque chegou ao Luxemburgo, há

20 anos. Faz parte dos milhares depedreiros e carpinteiros de cofragem("maçons") que a convenção colectivado sector agrupa na categoria B, e estáno terceiro escalão. Na gíria da con-venção colectiva e para efeitos salari-ais, é um B3. Isto quer dizer que estecarpinteiro é capaz de trabalho autó-nomo, de ler uma planta de construçãoe de executar as indicações de um"croquis". Já teve 23 homens a seucargo durante três anos, e a empresaonde trabalha ficou "muito orgulhosa"com o seu trabalho. Mas para passar aoescalão seguinte (chefe de equipa) epassar a receber um salário de acordocom as funções que já desempenha, alei luxemburguesa exige que as suascompetências sejam certificadas peloIFSB (Institut de Formation Sectorieldu Bâtiment), um instituto criado em2002 para dar formação aos trabalha-dores da construção. No exame deaptidão, Pedro chumbou duas vezes efoi obrigado a frequentar a formaçãopara B2, um grau abaixo do que exercehá 20 anos. Mas no exame final docurso de B2, voltou a chumbar.

"Correu mal por eu não perceber ofrancês. Eles deviam primeiro dar umaformação em francês ou dar as aulasem português, porque senão só facili-tam a vida aos luxemburgueses, aosbelgas e franceses. E não são eles quevão ensinar os portugueses a traba-lhar!", queixa-se. "O nosso problema éfalarmos sempre com portugueses. Eucompreendo o francês e a falar desen-

rasco-me mais ou menos, mas a escre-ver e a ler tenho dificuldades", admite.

"FRANCÊS É A MAIORDIFICULDADE"

Pedro não é caso único, garante JoséPinto, presidente do sindicato da cons-trução na OGB-L. "Conheço excelentestrabalhadores que chumbaram três ve-zes no exame". O sindicalista vemdefendendo que o IFSB dê formaçãoem português – uma proposta que aOGB-L lançou em 2008 (ver caixa) –,com formadores que poderiam vir doInstituto de Formação Profissional emPortugal.

"Actualmente, é a língua portu-guesa que reina no 'chantier' [estaleirode construção]. Em algumas empresas,75 % dos trabalhadores são portugue-ses. Temos jugoslavos, franceses, bel-gas e falam todos português, e quandonão falam compreendem. Na minhaempresa, até um luxemburguês que látemos fala português", explica aoCONTACTO.

Se o português é língua franca nasobras, na formação profissional é um"handicap". "Há pessoas que traba-lham há 20 anos no Luxemburgo e nãofalam uma palavra de francês. Algu-mas são analfabetas. 'Oui, chef', 'non,chef', é tudo o que sabem dizer". É ocaso de Fernando*. "Sei fazer o meunome e pouco mais. Francês não falonada", diz este operário de 56 anos. Econta a história de quando o chefe lheveio dizer que pusesse óculos de pro-tecção. "Eu respondi-lhe 'Oui' mas nãopercebi nada, e ele não percebia por-que é que eu dizia que sim e nãopunha os óculos".

Fernando é "um excelente carpin-teiro de cofragem", garante José Pinto,tal como José*, de 52 anos, que só tema quarta classe e fala um francês

rudimentar. "Mas se mandarmos esteshomens fazerem a tal formação, daquia vinte anos ainda não passaram".Riem-se os dois e concordam. "Eu jánão tenho cabeça para isso", descul-pa-se José. Mas Fernando, analfabeto,não é tão pessimista: "Eu era o maisvelho da família e não pude ir à escola,tive de ir trabalhar para ajudar os meus

irmãos. Mas agora em Portugal hávelhos de 70 anos a aprender compu-tadores. Há sempre tempo para apren-der".

APRENDER A APRENDERAntónio Ferreira da Costa chegou aoLuxemburgo em 1988 e teve de seadaptar às circunstâncias.

"Nos primeiros cinco ou seis anosfoi difícil, porque trabalhei com italia-nos. Aqui há uns anos, eu falavamelhor o italiano que o francês. Depoiscomprei um dicionário e comecei atraduzir algumas palavras, e agora dápara desenrascar em qualquer parteonde vá, mas nas coisas mais compli-cadas prefiro pedir ajuda a alguém".

Tem 47 anos e a quarta classe. Noexame de aptidão do Instituto deFormação para o Sector da Constru-ção, um teste prévio obrigatório paraser admitido nos cursos, chumbou. Elee mais 21 pessoas. "Éramos 27, todosportugueses. Só passaram seis".

Apesar de ter a categoria profissio-nal de B2 (a meio do escalão) há 22anos, teve de recomeçar do zero efrequentar o curso para o grau inferior,e as dificuldades que encontrou nãoforam só linguísticas.

"[O curso] havia de estar traduzidopara português. É a primeira dificul-dade para nós. Há palavras que nãoconhecemos e temos de perguntar aomonitor. Uma vez nem o monitor sabiao que aquela palavra queria dizer.Depois, o pessoal é especialista a tra-balhar, e eles dão muita matéria quenão se aplica na realidade".

O que lhe valeu foi que a formadora"falava devagarinho e traduzia algu-mas coisas para português". "E depoishavia lá os que falavam bem o francês,e traduziam-nos. Ajudávamo-nos unsaos outros".

"Em muitos casos, as designaçõestécnicas não são as que os trabalhado-res conhecem", explica o presidente dosindicato de construção da OGB-L. "Àsvezes chama-se a um instrumento 'umchavelho', toda a gente diz 'passa-meo chavelho' e toda a gente sabe o queé, mas as pessoas não sabem o nometécnico", observa José Pinto. O quenão os impede de serem bons profissi-onais, garante. "Uma vez um formadordisse-nos: 'O que é que vocês estãoaqui a fazer [na formação para B1]?Vocês sabem mais que muitos B2 ouB3 que passaram por aqui, só que elespassaram o teste [de admissão] e vocêsnão!", conta António da Costa.

"A gente sabe o que está a fazer,não é preciso ir à escola para saber oque está a fazer, mas é preciso ir àescola para ter trabalho", resume An-tónio.

E não é só a língua que colocadificuldades a estes homens, garanteFilipe*, com 43 anos e o 9o ano do

liceu. Filipe chumbou no exame deaptidão para B3 e teve de fazer o cursode B1, apesar de exercer a profissãocomo B2. "A língua para mim foi umgrande obstáculo. E a matéria, que épara engenheiros e não para trabalha-dores da construção. Para quem tempouca escola em Portugal, que é o casoda maioria das pessoas, o curso édificílimo", garante.

Na sua turma, a maioria ficou pelocaminho. "Éramos 10, todos portu-gueses, e só passaram quatro [noexame final], uns por causa da língua,outros porque são pessoas com umacerta idade e já não entra nada nacabeça".

António da Costa foi um dos quepassou o exame de B1 no ano passadoe está ansioso por que o chamem parao curso seguinte. "Se me chamarempara B2, vou fazê-lo", garante aoCONTACTO. E depois das dificuldadespor que passou, já tem saudades daescola.

"Eu no início dava-me o sono,porque não estou habituado a estarsentado. E é tudo diferente do queestamos habituados. Uma vezpediram-nos para calcular o volume deterra retirado de uma vala, dando-nosas medidas, e eu não sabia fazer isso. Eos ângulos: no 'chantier' estamos ha-bituados a traçar com régua e lápis, eeles lá no IFSB trabalham com umsistema diferente. Foi difícil, ficava aestudar até à meia-noite porque haviamuitos cálculos, às vezes doía-me acabeça, mas agora já tenho saudades equero continuar", conta ao CONTAC-TO.

É bom que continue: só tem di-ploma de B1, e se "perder o emprego efor para outro, vai ser contratadocomo B1" apesar de actualmente tra-balhar como B2, avisa o sindicalista daOGB-L. Descer de escalão significabaixar de salário, dos 13,7450 eurospor hora que auferem os B2 para os12,4846 que a convenção colectivaprevê para os B1 – menos 222 euros aofim do mês. E não fazer a formaçãosignifica ficar preso no mesmo escalão,a ganhar o mesmo salário até à re-forma – ou até serem "incapazes detrabalhar por causa de problemas desaúde, quando um bom operário podiaser convertido num técnico se tivesseformação", lamenta José Pinto.

■ Paula Telo Alves* A maioria dos entrevistados nesta

reportagem pediu o anonimato.

Dificuldades l inguíst icas dos trabalhadores do sector da construção

Um problema à espera de soluçãoDesde 2002 que a lei exige umdiploma emitido pelo Institut deFormation Sectoriel du Bâtiment(IFSB) para progredir de escalãoprofissional e aumentar de salário.Antes, bastava a antiguidade.

Para a maioria dos portuguesesdo sector, isso significa fazer for-mação e exames numa língua quenão dominam.

Na OGB-L, há muito que sediscute o problema, que não selimita "aos trabalhadores que estãono activo e afecta muitos no de-semprego", frisa o presidente dosindicato da construção. E o as-sunto já chegou ao governo lu-xemburguês.

"Já falámos ao ministro Biltgen[titular da pasta do Emprego naúltima legislatura] e agora falámosao Nicolas Schmit [actual ministrodo Emprego e da Imigração]", re-corda José Pinto.

Em Novembro, o embaixador dePortugal no Luxemburgo já abor-dara o problema com Schmit: 32 %dos desempregados são portugue-ses, o que representa 10 % dapopulação activa portuguesa. Mui-tos "são pessoas que ainda não têmidade para a reforma e que estãoem situação precária", "emprega-dos pouco qualificados" a quem "acrise no sector da construção afec-tou particularmente", disse nessaaltura Pessanha Viegas ao CON-TACTO.

"O problema é que não domi-nam o francês escrito e nem sequerpassam nos testes de admissãopara poderem receber formação. Acomunidade portuguesa funciona

ainda muito em circuito fechado, eo português é a língua utilizada notrabalho e na família. Uma possibi-lidade que discuti com o ministroNicolas Schmit seria fazer testesorais de admissão. A outra é darformação em português, com acolaboração do instituto de forma-ção profissional equivalente emPortugal", avançou na altura aoCONTACTO.

Uma proposta primeiro avan-çada pela OGB-L em 2008 mas aque muitos se opõem, a começarpelo Instituto de Formação para oSector da Construção.

"Os patrões são contra [a forma-ção em português], e o IFSB éfinanciado integralmente pelo pa-tronato", diz Luc de Matteis, secre-tário do sindicato de construçãoque José Pinto preside. "Falámoscom a ministra do Trabalho portu-guesa para ver o que se podia fazerpara ajudar estes trabalhadores,mas a discussão não é tão simplescomo isso. Não basta 'importar'formadores portugueses, porquedepois os patrões exigem que osoperários falem francês", diz Lucde Matteis

José Pinto acha a exigência ir-realista. "Nas empresas as pessoasdizem: 'Ah, mas eles deviam apren-der francês'. Mas é difícil, paraalguém que tem 40 ou mais anos etem uma profissão pesada fisica-mente, ir agora aprender uma lín-gua de raiz. Estas pessoas nosúltimos 20 anos foram úteis nos'chantiers' [estaleiros de constru-ção], e agora de um momento parao outro têm de fazer formação por

causa dos patrões. Em vez de enfi-armos as pessoas num buraco, por-que não dar-lhes formação emportuguês?", insiste.

Luc de Matteis hesita."É preciso termos cuidado para

não tomarmos decisões que pare-cem boas mas que depois agravamo problema", recomenda. "A ques-tão não é obrigar as pessoas aaprender francês por uma questãonacionalista, por ser uma da lín-guas do país, mas para estaremprotegidas. Quem só fala portu-guês está fragilizado no trabalho,os patrões pagam-lhes menos eeles não se sabem defender".

Dar formação em francês é asolução que o secretário do sindi-cato da construção prefere, mastambém aí há vários problemas. Éque a lei luxemburguesa não prevêlicenças para aprendizagem dofrancês: o "congé linguistique"aprovado em 2008 só contempla oluxemburguês, e aprender uma lín-gua nova leva tempo, diz JoséPinto.

"É preciso encontrar uma solu-ção a curto prazo para que ostrabalhadores que estão cá há 20ou mais anos possam evoluir entre[os graus de] B1 e B3", insiste. "Ostrabalhadores portugueses queagora chegam já têm mais habilita-ções, e daqui a dez anos não haveráeste problema".

O assunto vai ser objecto dediscussão de um grupo de trabalhocriado pelos ministros do Empregodos dois países (ver artigo na pá-gina 2).

■ Paula Telo Alves