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294 Estilos da Clínica, 2011, 16(2), 294-323 RESUMO Nesse trabalho, a partir da pers- pectiva da Psicanálise e Educa- ção, abordaremos as cerimônias mínimas como dispositivo acei- to para a intervenção e a pes- quisa clínico-social, operador metafórico que nos permite criar condições de possibilidade sub- jetivantes em diferentes cenários sociais, escolares, institucionais, comunitários. Descritores: psicanálise; educação; práticas socioeducati- vas. Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê Dossiê N CERIMÔNIAS MÍNIMAS 1 Mercedes Minnicelli Introdução Introdução Introdução Introdução Introdução esse trabalho abordaremos as cerimônias mí- nimas como um dispositivo adequado para a inter- venção e a investigação clínico-social, um operador metafórico que nos permite criar condições de sub- jetivação em diferentes cenários sociais, escolares, institucionais e comunitários. Consideramos esse tema em tempos turbulen- tos para pensar a socialização e a educação das no- vas gerações. Tempos em que a violência se mani- festa em toda parte de forma “pura”, sem um fim e sem sentido. Tempos em que as novas gerações re- fletem especularmente o mundo em que vivemos e tornam-se eco – e carne – dessas perspectivas, que, pretendendo ser silenciadas, operam suprimindo a subjetivação. A partir de algumas vinhetas interessa-nos ilus- trar como é possível fazer com que o dito fale, re- Psicanalista. Doutora em Psicologia. Diretora da Rede Interuniversitária Interdisciplinar INFEIES (Estudos e Pesquisas psicanalíticas e interdisciplinares em Infância e Instituição(es). Docente e pesquisadora da Faculdade de Psicologia da Universidade Nacional de Mar del Plata – Argentina.

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RESUMO

Nesse trabalho, a partir da pers-pectiva da Psicanálise e Educa-ção, abordaremos as cerimôniasmínimas como dispositivo acei-to para a intervenção e a pes-quisa clínico-social, operadormetafórico que nos permite criarcondições de possibilidade sub-jetivantes em diferentes cenáriossociais, escolares, institucionais,comunitários.Descritores: psicanálise;educação; práticas socioeducati-vas.

DossiêDossiêDossiêDossiêDossiê

N

CERIMÔNIASMÍNIMAS1

Mercedes Minnicelli

IntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntroduçãoIntrodução

esse trabalho abordaremos as cerimônias mí-nimas como um dispositivo adequado para a inter-venção e a investigação clínico-social, um operadormetafórico que nos permite criar condições de sub-jetivação em diferentes cenários sociais, escolares,institucionais e comunitários.

Consideramos esse tema em tempos turbulen-tos para pensar a socialização e a educação das no-vas gerações. Tempos em que a violência se mani-festa em toda parte de forma “pura”, sem um fim esem sentido. Tempos em que as novas gerações re-fletem especularmente o mundo em que vivemos etornam-se eco – e carne – dessas perspectivas, que,pretendendo ser silenciadas, operam suprimindo asubjetivação.

A partir de algumas vinhetas interessa-nos ilus-trar como é possível fazer com que o dito fale, re-

Psicanalista. Doutora em Psicologia. Diretora da Rede

Interuniversitária Interdisciplinar INFEIES (Estudos e Pesquisas

psicanalíticas e interdisciplinares em Infância e Instituição(es).

Docente e pesquisadora da Faculdade de Psicologia da

Universidade Nacional de Mar del Plata – Argentina.

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criando novas significações e uma mudança de posição dos adultosem e pelas “cerimônias mínimas”, frente aos ditos – e feitos – que seapresentam cotidianamente em diversos cenários (educativos, so-ciais, jurídico-institucionais).

Sabemos que as causas de certas formas de apresentação domal-estar contemporâneo são muitas e variadas, e não podem serdeterminadas pela simples relação linear de causa e efeito. É porisso que, em vez de nos debruçarmos sobre as causas, nesse traba-lho, a partir de uma perspectiva psicanalítica, interessa-nos a pro-moção de efeitos socioeducativos possíveis, especialmente nos tem-pos em que estamos imersos (e conosco, nossas crianças e jovens)em uma “festa” social, cultural e econômica, presidida por um dis-curso generalizado que promove o sem-limites-como-força-de-lei-sem-lei.

Quando operamos um recorte e nos detemos em um dito2 queenuncia um mal-estar, estamos pontuando o devir do discurso, aodelimitar um enunciado que nos permite produzir operações dis-cursivas frente ao que se repete sem cessar e sem ser registrado,nem escutado, tanto pelo desconforto que gera, como pelos efeitosde-sujetivantes que produz. A operação discursiva é possível se sefaz do dito, outros dizeres. A pergunta é a chave que habilita opera-ções de linguagem.

A expressão do mal-estar nos fala de adultos, muitas vezes per-plexos, sejam eles professores ou especialistas, também corre o ris-co de recorrer a fórmulas pseudocientíficas mercantis para silenciaro que ferve pulsionalmente de modo descontrolado, limitado ape-nas por ações. Perplexidade que inibe a possibilidade de fazer algodiferente com o que parece de abordagem duvidosa, caindo na ar-madilha de um círculo vicioso que nos interessa e podendo sofrer ainterferência de cerimônias mínimas criadoras de condições de possibilidadessubjetivantes.

Os ditos que enunciam o mal-estar expressam que ali mesmoestá o por fazer-se, que sempre parte do questionamento do estabele-cido, permitindo o jogo significante e a criação de outras alternati-vas que contam com fundamentos teóricos da psicanálise e que senutrem da contribuição de outras disciplinas sociais. As vinhetasclínicas que apresentamos nomeiam o mal-estar. Foram recortadasem nossas experiências clínico-institucionais, por meio das quaisidentificamos efeitos socioeducativos possíveis, promotores da sus-tentação do laço social.

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Nossas pesquisas e experiências dão-nos claras provas do modocom que esse possível se habilita ao oferecer alguma forma de resis-tência ao que se apresenta como inexorável. Reforçamos a ideiafreudiana sobre o impossível de educar, analisar e governar, ou seja,ainda que não possamos garantir os resultados antecipadamente,por si só e sem garantias, não podemos renunciar à tarefa de educar,analisar e governar.

Trata-se de reestabelecer o après-coup da experiência, a análiseposterior, sua reconstrução minuciosa, sua narrativa em diálogo comos outros, para encontrar pistas significantes, formas discursivasrepetidas que nos indiquem o caminho que permite a pergunta.

A partir dessa posição, consideramos o que acontece como con-tingente e não necessário, levando-nos à revisão de nossas práticascotidianas, as mais repetidas, as mais óbvias; aquelas que, por esta-rem tão incorporadas ao cotidiano, ao repetirem-se, passam quasedespercebidas. Trata-se de criar dispositivos que permitam operar so-bre as condições, em cada caso, de produção de certas respostas decrianças e adolescentes.

Cerimônias mínimas: sua qualidade de dispositivoCerimônias mínimas: sua qualidade de dispositivoCerimônias mínimas: sua qualidade de dispositivoCerimônias mínimas: sua qualidade de dispositivoCerimônias mínimas: sua qualidade de dispositivo

Lacan (1995) situa o dispositivo com relação à metáfora ao con-siderá-la um dispositivo para pensar :

Percebem, sem dúvida, que estou esquematizando, mas o desenvolvimento deuma metáfora, de um dispositivo para pensar, exige primeiro entender para o queserve. (p. 129)

Pensar em um dispositivo tal como Lacan a ele se refere nosleva a uma metáfora que nos convida a pensar no fazer a partir dodito e do feito.

Denominaremos cerimônias mínimas o dispositivo clínico-meto-dológico, sinal e chave para múltiplas intervenções possíveis. Servi-mos-nos delas mais do que como um conceito que admite umaúnica definição, mas como uma metáfora, isto é, um dispositivopara habilitar alternativas de intervenção não-convencional.

As cerimônias mínimas, como metáfora, resultam da escuta ativade uma forma discursiva que se recorta, circunscreve-se e pontuaem função do dito e dos fatos.

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Se nos permitimos questioná-los,qualquer dito, assim como qualquerfato, admite, por sua condensação, di-versas vias de análise e pesquisa. Ascerimônias mínimas são um marcosimbólico que é perfurado pela pergun-ta que o interroga, causando umahiância, um vazio, um ”entre” o dito eo não dito, entre o dito e o feito, entreos feitos – geralmente desalinhavados,para dizer e promover outros enlacesdiscursivos, isto é, novas formas de di-zer e de fazer que delas derivem.

O que dizem as cerimônias mí-nimas? O que dizemos com elas?Avancemos na abertura discursiva dametáfora.

CerimôniasCerimôniasCerimôniasCerimôniasCerimônias

Em primeiro lugar, devemosbuscar as definições de cerimônia para,em seguida, situar as cerimônias míni-mas como uma instância que nos per-mita operar com as situações que seapresentam como fechadas, encapsu-ladas em fórmulas discursivas queenunciam o mal-estar que se inscrevee interroga.

Desenvolver o conceito de ceri-mônia leva-nos a fazer associaçõescom o mito, o rito e o jogo (Agamben,2003), para chegar a expor as cerimô-nias mínimas, objeto de nosso interes-se, a partir de uma extensa gama depossibilidades.

O dicionário da Real AcademiaEspanhola define “cerimônia”3 como:

“Ato solene realizado de acordo com normasou ritos estabelecidos”.

As cerimônias se associam aosrituais próprios das comunidades esuas instituições, sejam elas religiosas,jurídicas, educativas ou governamen-tais. Do mesmo modo, as festas, comopor exemplo, o Carnaval, implicamem formas cerimoniais, especialmenteligadas ao rito, ao ritual, à celebração,ao ato, ao cortejo, à solenidade, à in-vestidura.

O substantivo que define a ceri-mônia é “ato”.

O que é um ato4? Continuandocom o dicionário da Real AcademiaEspañola, é um feito ou uma ação,fato público ou solene, a divisão im-portante de uma peça teatral e, emDireito, uma disposição legal.

Ritos e rituais têm circunscrito,ao longo do tempo, momentos depassagem – de diferença – entre nas-cimento e morte, metáforas de qual-quer início e finalização. Diferençasentre “estados” – da infância à juven-tude –; diferenças ”entre” estar ou nãoestar iniciado na sexualidade adulta.A partir dos Estados Modernos, asdiferenças de “estado civil” pela ceri-mônia de casamento civil, entre ou-tras – outrora exclusivamente religio-sa –; diferenças “entre” contar com apossibilidade de estar inscrito na so-ciedade pela inscrição, no registro ci-vil, de cada novo nascimento / mor-te. Ainda que à primeira vista nãoassumam a forma convencional derituais, é possível identificar restos dos

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mesmos em seus procedimentos nor-mativos; basta analisar as disposiçõesadministrativas que estabelecem deque modo devem se realizar tais pro-cedimentos. Assim, permitimo-noschamar de formas cerimoniais jurídi-co-administrativas os “circuitos deintercâmbio legitimadores” – segun-do o conceito de Bourdieu (1985) –próprios da burocracia.

As formas cerimoniais circuns-crevem um marco simbólico norma-tivo e têmporo-espacial para o desen-volvimento da cena cujo roteiro serádiferente dependendo da instituiçãoe dos objetivos da mesma.

Ou seja, uma cerimônia apresen-ta um formato, embora seus funda-mentos nem sempre sejam explícitosno roteiro normativo e no texto dodrama que aí se desenrola. Por suavez, em todos os casos se encontrampersonagens que desempenham pa-péis determinados ou criados ad hoc,os quais podem ser múltiplos e varia-dos.

Aquilo que identificamos comoinvariante é que toda forma cerimo-nial apresenta um tempo de abertura,desenvolvimento e encerramento. Dealguma forma, preservando a lógicaritual, pela cerimônia é ”criado” umtempo que se suspende para marcaroutro tempo, o do início e o do final,o das novas condições sociais inves-tidas – “criadas” – pela passagem quea mesma institui.

Em toda cerimônia se “jogam”– isto é, se atuam, se representam –diferentes papéis ou posições sociais

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encarnadas por aqueles socialmenteinvestidos para desempenhar o papelescolhido ou atribuído.

Nossa vida diária social e insti-tucional apresenta múltiplas formascerimoniais, e muitas delas tão natu-ralizadas (burocratizadas) que exigemum trabalho de desconstrução parasua identificação. Pensemos naquelasmais íntimas, as que repetimos diari-amente em nosso cotidiano, que se-rão diferentes para cada indivíduo,para cada grupo familiar. Há cerimô-nias próprias de ambientes educacio-nais quando se realiza a abertura doano escolar ou quando ocorre seuencerramento; cerimônias de celebra-ção, cerimônias de homenagem; depassagem de ano, de formatura, nosmais diferentes níveis de ensino... Alista está aberta para que cada um acontinue. Consideremos um proces-so que, para muitos, pode ser fami-liar: “obter a carta de motorista”, quetambém tem seu formato, seu rotei-ro normativo, seus representantessociais e que se finaliza com a entre-ga de um documento que identifica,frente a terceiros, que se está “habili-tado ou não” para dirigir.

Ao contrário das cerimônias eformas sociais de certos animais queforam estudados pelos etólogos, acapacidade de criar suas próprias ce-rimônias é algo que pertence à cultu-ra, sendo, portanto, inerente aos se-res humanos e implicando, em todosos casos, um ato, um marco, um ro-teiro (nas sociedades modernas espe-cificamente o sistema jurídico-insti-

tucional) e determinando uma posi-ção temporo-espacial que as sustentaaí por sua repetição.

Esse quadro temporo-espacialnão é necessariamente definido pelorelógio, mas toda vez que..., antes que...ou depois de... outros fatos. Enquanto aforma cerimonial delimita, legisla otempo, estabelece um ritmo, é possí-vel que aí mesmo esse tempo fiquesuspenso. Enquanto circunscreve umcenário, cria um marco para o desen-volvimento da cena e para a suspen-são do tempo.

O relato de um conto “antes de…ir dormir” é um claro exemplo doefeito de una cerimônia mínima quefixa o tempo e, também, que o colo-ca em suspenso pela expressão “erauma vez…”, regressando depois aotempo ordinário com “... esta históriaentrou por uma porta e saiu pela outra, quemquiser que conte outra…”5. Nesse caso apassagem que a cerimônia acompanhaé o da vigília ao sono, criando o mar-co para a cena subjetiva. As criançaspequenas e aquelas mais debilitadas,subjetivamente falando, apelam à re-petição: “conta de novo…”; elas pe-dem e exigem que a dita reiteraçãoseja fiel ao original, “não era assim...não mude…”, queixando-se das va-riações que desestabilizam a repetição.

Devemos fazer uma reserva. Fa-lar de repetição em psicanálise nosconduz a “Além do princípio do pra-zer” (Freud, 1920/1995), momentocrucial da teoria em que Freud outor-ga dois lados à repetição: de um lado,a repetição compulsiva; de outro, o

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jogo do fort-da. No primeiro caso, o sujeito é capturado de formapassiva por ”algo” que ele vive como uma obrigação, como força-de-lei-sem-lei ou que o obriga a agir, mesmo às suas custas e comprejuízo. No segundo caso, o autor pode transformar ativamenteseu sofrimento – sujeito à legalidade da linguagem, ele transformaos fatos com a mobilidade significante que o jogo torna possível.Um pai terrível pode tornar-se um leão faminto que caça suas presas,e um ratinho pequeno e travesso poderá assustá-lo e fazê-lo fugir,saindo triunfante frente ao que antes o fazia sentir-se desvalido.

No entanto, seguindo os dois lados da repetição, por uma delasas cerimônias mínimas nos indicam que tanto podem cristalizar,encapsular e naturalizar os fatos que acontecem – adquirindo for-mas ritualizadas – como deixar sem sustento algum a compulsão àrepetição. Sua outra face fala de uma outra via possível, que quere-mos enfatizar: aquela que habilita a lógica do jogo, implicando umfazer ativo simbólico-imaginário com o real da experiência.

Em um extremo, as cerimônias, por seus rituais, tornam-se umesteio das tradições quando a repetição protocolar as naturaliza, es-tabelecendo-as como tais, reiterando uma e outra vez o mesmo pro-tocolo sem interrogação alguma. Além disso, embora o ritual definao mesmo para sempre, o drama subjetivo se encarregará de encon-trar as diferenças e as rachaduras. Os celebrantes de tradiçõesritualizadas punem as mudanças, não toleram a estrutura flexível,pretendem que sempre o mesmo apareça e garanta a estabilidadeprocurada. As tradições, nesse sentido, buscam a estabilidade per-manente, sem variações, sem espaço para as transformações. Nessecaso, a conservação da instituição está acima dos sujeitos implica-dos.

Na mesma direção, ainda que seja seu oposto, encontra-se ocaso que se apresenta sem qualquer referencial. Abolido qualquerpadrão de referência, o sem limite adquire força de lei-sem-lei, fi-cando de tal modo entregue a seu ponto absoluto que dilui qualquerancoragem. Um exemplo do extremo dessa condição pode ser en-contrado quando, em uma luta corpo a corpo, a violência evolui demodo desenfreado até a morte de um ou de outro, único limite parao desenfreado6.

Os efeitos de ambas as posições localizadas na mesma polari-dade não deixam de ter consequências subjetivas.

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Cerimônias mínimasCerimônias mínimasCerimônias mínimasCerimônias mínimasCerimônias mínimas

O reconhecimento do que pode-mos identificar como cerimônias míni-mas resulta da escuta de um dito, umfato ou uma ação que recortamos nosdispositivos7 institucionais e sociais,seja para sua interrogação ou análise– quando o repetido se encontra na-turalizado e criptografado; ou porquequeremos criá-la, isto é, instalá-la parapromover uma interferência, uma in-terdição, um corte no estabelecido,esperando que se operem outros en-laces discursivos.

Nos casos que apresentamos, épossível observar de que modo seconservam as marcas de uma obracênica (embora não seja uma obra te-atral) e que, por sua vez, apresentam ocaráter e a eficácia simbólica de umadisposição legal que por seu intermé-dio se cumpre com força-de-lei-sem lei,embora efeito de discurso que situa alei como operador da estrutura.

O atributo “mínimas” confereum caráter diferencial ao termo ceri-mônia, afastando-a de suas definiçõesgerais, mas mantendo seus traços maissignificativos. Não se trata de grandi-loquência, nem de solenidade, mas dainstitucionalização, da escrita de pe-quenos atos que conservam as carac-terísticas próprias das grandes cerimô-nias – embora passem inadvertidas navida cotidiana, é a elas a que devemosnos referir.

Da solenidade que se confere àscerimônias em geral, ficaremos com

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o que implica dar importância, atribuirvalor, investir como ato significativoos atos cotidianos dos cenários edu-cativos, sociais, judiciais como instân-cias chave de produção de subjetivi-dade.

As cerimônias mínimas não se de-finem pelo tamanho, nem pela im-portância de um ato, mas, ao contrá-rio, trata-se de outorgar aospequenos atos o caráter de grandesações que vão se enlaçando entre si,gerando novas redes discursivas efatuais.

Em nossa metáfora fazemos re-ferência, por um lado, ao que Foucault(1989) denominou como microfísicado poder e, de modo substancial, àpsicanálise, ao considerar as ressonân-cias singulares e os efeitos do discur-so coletivo na singularidade. Nenhumdiscurso poderia ser eficaz se nãofosse pela ancoragem singular, pelosefeitos de identificação – como osda massa – que se operam pelaimersão no universo linguístico so-cial, isto é, pela imersão no discursoque veicula a linguagem. Um exem-plo claro disso é um chiste traduzi-do de outra língua. Um relato seráum chiste e nos fará rir se operar demaneira inconsciente, se “nos tocar”,se identificarmos aquilo que por elese diz.

Estabelecemos um duplo caráterdas cerimônias mínimas, que iremosanalisar e ilustrar por duas vinhetas:“Os bebês se amotinaram” e “Se eles escon-dem os cadernos de comunicações, com certe-za serão delinquentes”.

Sustentaremos que a criação eimplementação de cerimônias míni-mas estão propensas à promoção decondições de possibilidade subjetivan-tes em que o limite se apresenta comoum abismo. Conceder a ele o caráterde criador de condições subjetivan-tes implica necessariamente entenderque o poder (fazer) não se localiza ex-clusivamente nas grandes estruturas,mas que se suporta em mínimos de-talhes, na palavra, no discurso diário,na posição de cada sujeito na relaçãocom os outros.

As cerimônias mínimas comoinstância de intervenção implicam emum reposicionamento subjetivo dosadultos diante de meninos, meninase adolescentes. Nesse sentido, subli-nhamos o quanto, por meio delas, foipossível medir a distância do macros-social, que tem como efeito impotên-cia e incapacidade para lidar com acomplexidade de variáveis que atacamas condições de subjetivação, recupe-rando margens possíveis de interven-ção docente e profissional, resgatan-do as possibilidades de sujeição dohumano à cultura, fazendo do dito,outros dizeres.

As cerimônias mínimas envol-vem a possibilidade de escrita da leina trama social. Trata-se de restituir alegalidade no lugar em que uma puraforça-de-lei-sem-lei age como se fossenecessária e obrigatória. A “obrigação”que leva à ação pode se dar às custasdo sofrimento dos sujeitos envolvi-dos. Sustentamos que, mesmo no li-mite, é possível restaurar condições

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de dignidade e respeito para cada ume para os outros no laço social.

Em síntese, nossas hipótesesenunciam:

1) Institui-se um discurso em e pelas ceri-mônias mínimas;2) Desarticulam-se discursos criptografadosem e pelas cerimônias mínimas;

Passemos a ilustrá-las.

Institui-se um discurso em eInstitui-se um discurso em eInstitui-se um discurso em eInstitui-se um discurso em eInstitui-se um discurso em epelas cerimônias mínimas:pelas cerimônias mínimas:pelas cerimônias mínimas:pelas cerimônias mínimas:pelas cerimônias mínimas:

“Os bebês se amotinaram!!!”No berçário de um lar provisório de um mu-nicípio de General Pueyrredón (Província deBuenos Aires), ouvem-se os sons de choca-lhos com uma intensidade inusitada. Há dozebebês na sala que, nesse momento, estão emseus berços após acordarem de uma soneca.Confrontado com este alvoroço, o chefe daárea, que estava em outra sala, vai para o ber-çário e observa que, enquanto as enfermei-ras estavam fazendo a troca de fraldas de duascrianças, os outros bebês – de 8 a 13 mesesde idade – estavam em pé em seus berçosbatendo o chocalho firmemente contra a pa-rede. Os adultos presentes ficaram para ob-servar a cena, comentando com um tom dehumor, surpresa, ternura e um toque de es-panto: os bebês se amotinaram!

“Como os presos na cadeia” é aprimeira associação de todos aquelespara quem que relatei este evento.Esta cena, ao ser questionada e anali-sada nos dias seguintes, retornou al-gumas vezes pela pergunta: qual é o

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lugar que se outorga a essas criançaspor estarem imersas no discurso de“minoria”?

Os termos que nomeiam os la-ços sociais da minoria seguem a linhados códigos carcerários, assinalandoum destino inefável. O fato de serórfão, ou abandonado, é uma conde-nação? Um insulto? Uma marca ne-gra desde muito cedo? Ou uma con-dição filial não escolhida pelospequenos que requer do Estado, darepresentação social de maneira subs-tantiva, a criação de outras condiçõesfamiliares quando a família biológicanão é viável?

A leitura desse incipiente fenô-meno de laço social e demanda cole-tiva em uma idade demasiado preco-ce admite outras leituras além daquelaque os associa à minoria. Para essascrianças, os espelhos em que se olhamrefletem múltiplos olhares e não oretorno especular da própria imagemsustentada no olhar materno. Na fal-ta deste, é necessário que haja algumolhar no qual se refletir.

Significar esse ato como “mo-tim” não deixa de ter consequênciaspara sua localização no tecido das re-lações sociais. As mamadeiras nãochegavam a tempo. Motim? Ou pro-testo expresso em um jogo de imita-ção com o prazer pelo som produzi-do? Reação especular?

Identificamos nesta cerimôniamínima o momento da criação depersonagens da Novela social de lainfancia desamparada (Minnicelli,2004).

Pierre Legendre (1996), na intro-dução de O inestimável objeto da trans-missão, convoca-nos a uma profundareflexão:

Devemos lembrar que as instituições são umfenômeno da vida. Evocar a vida seria umabanalidade se não se tratasse aqui de mani-pular a questão jurídica, que está tão malem nossos dias. Uma característica faz dohumano algo à parte no ser vivo: a palavra.Instituir o ser vivo é um fato de discurso,supõe a humanidade. A humanidade, en-tão, deve ser definida como o vivo falante.(p. 10)

E acrescenta mais adiante: “Istoé o que está em jogo na escala so-cial: esmagar a vida ou fazê-la viver”(p. 10).

Mínimas expressões inclinam abalança para o achatamento da vida,ou para fazê-la viver.

DesarDesarDesarDesarDesarticulam-se discursosticulam-se discursosticulam-se discursosticulam-se discursosticulam-se discursoscriptografados em e pelascriptografados em e pelascriptografados em e pelascriptografados em e pelascriptografados em e pelascerimônias mínimas:cerimônias mínimas:cerimônias mínimas:cerimônias mínimas:cerimônias mínimas:

Sabemos bem que nas últimasduas décadas, múltiplos e diferentesProgramas, Centros de EstimulaçãoPrecoce, Lares, Clubes, Sociedades deFomento, Fundações e ONGs, bemcomo a sanção da Lei Nacional deProteção de Direitos nº 26066 (2005)e os Centros de Proteção de Direitostêm tomado a iniciativa frente à au-sência do Estado no desenvolvimen-to de tarefas relativas à educação, so-

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cialização e tratamento dos problemas que afetam os meninos, me-ninas e os adolescentes em nosso país.

Apesar disso, ainda não se visualizam mudanças significativasem termos gerais; a sensação é que nada produz os efeitos procla-mados pelas boas intenções, o que ocorre principalmente quandoum desses cenários não se situa como elo de uma rede discursivamais ampla, mas como centro de atenção ou de ação prioritária,desconhecendo a importância dos outros, inclusive da escola.

Passemos a um caso por meio do qual podemos ilustrar de quemodo é possível identificar o que promoveu uma troca de posiçãodos adultos frente às crianças, por uma cerimônia mínima que produ-ziu efeitos socioeducativos. Esta vinheta é interessante para pensara circulação da interrogação e a palavra que permite, frente ao fato,habilitar outras alternativas que considerem o outro. Ao mesmotempo, vemo-nos diante da apressada e cômoda leitura “dessascrianças” como transgressoras geneticamente determinadas, quan-do, na realidade, estão apenas respondendo à demanda do Outro(Minnicelli, 2010).

“Se eles escondem os “Se eles escondem os “Se eles escondem os “Se eles escondem os “Se eles escondem os cadernos decadernos decadernos decadernos decadernos decomunicações,comunicações,comunicações,comunicações,comunicações, com cercom cercom cercom cercom certeza serão delinquentes”teza serão delinquentes”teza serão delinquentes”teza serão delinquentes”teza serão delinquentes”

Durante o ano de 1998, docentes de uma das escolas que davaassistência a crianças de um lar de acolhimento expressaram suaqueixa por não receberem resposta para as repetidas notificaçõesenviadas nos cadernos de comunicações sobre dificuldades que seapresentavam na escola8.

Como não recebiam do lar de “internação” – como o chama-vam – nenhuma resposta, as professoras comunicaram-se por tele-fone, furiosas com a diretora do mesmo, dizendo que não apenasnão obtinham resposta para suas reclamações, mas que as faltascometidas pelas crianças deviam ser sancionadas. A diretora dizdesconhecer as comunicações e as sucessivas reclamações a que elasse referiam.

Pediam dupla sanção para as crianças, por um lado, diante dafalta de cumprimento do requisito escolar, e, por outro, pelo fato deque os menores escondiam seus cadernos e não os entregavam aosresponsáveis do lar.

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Diante do fato e dos ditos de umae outra parte, a pergunta chave é: oque levava as crianças a esconderemos cadernos? Seria sua condição demenores morando em um lar a “cau-sa” do fato? Temeriam ser punidos e,por isso, não entregavam seus cader-nos? Quais eram as faltas que as no-tas transmitiam?

Ao serem questionadas, as crian-ças disseram não saber porque escon-diam seus cadernos, mostrando-seindiferentes ao assunto que tantoreboliço produzia entre os adultos.

Ler os cadernos de comunica-ções para atender às demandas dasprofessoras e saber quais eram as fal-tas às quais elas se referiam apresen-tou-nos uma chave interessante. Umaexpressão mínima dizia o óbvio so-bre que estava acontecendo, sem servisto, nem lido: cada uma das notasestava dirigida aos “Srs. Pais”, ou,“Papais”, ou à “Sra. Mamãe”, e fala-vam sobre a não realização de tare-fas, da presença nas aulas sem osmateriais solicitados, ou ainda sobreo fato de se apresentarem na escoladesarrumados, despenteados e sujos.

Lembremos que a falta cometi-da pelas crianças era a de esconder oscadernos de comunicações9. Convi-do-os a observar o gesto de esconderos cadernos, que nada mais fazia doque enunciar uma verdade: os “Srs.Pais”, “Papais”, ou a “Sra. Mamãe”não estavam presentes para recebe-rem o caderno diariamente, sem me-táfora, mas à letra. Eles os guardavam,indiferentes, fazendo com que as no-

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tas, literalmente, não chegassem a nin-guém. Os destinatários a quem osadultos se dirigiam não estavam pre-sentes. A questão foi abordada e abriudiversas vias de análise; tornou-se cla-ro um certo lugar atribuído a elas porserem “menores internados”, em umafalsa associacão com ”menor, filhotede delinquente”.

Diante dessa constatação, foiproposta uma reunião com todos osadultos que, de uma forma ou de ou-tra, cuidavam das crianças: os precep-tores e a direção do lar de residência(não de internação), assim como osprofessores e diretores das escolas,clubes, oficinas, o padre do bairro, osmédicos do centro de saúde formaconvocados para analisar o tema queexcedia o problema de uma supostaindisciplina em torno do fato ligadoaos cadernos de comunicações, mos-trando o lugar que as crianças tinhamno discurso generalizado sobre suacondição de menores “internados”em um lar.

Ainda que se apregoasse umprognóstico desfavorável a respeito daacolhida que teria tal convocação, osfatos disseram algo diferente. A reu-nião foi multitudinária, provocandoum impacto, dado o número de pes-soas vinculadas a eles de maneira co-tidiana.

Analisou-se o problema do quepoderia implicar o fato de as notasserem dirigidas ao ponto mais trau-mático, de maior sensibilidade e dorpara as crianças. A ausência dos paishavia promovido a decisão de inter-

venção judicial, de modo que seu lo-cal de residência – ainda que transi-tório, em muitos casos – fosse um larde acolhimento. Foi levantada a ques-tão chave de que a socialização dascrianças estava em cada ato realizadopor todos os que, de uma forma oude outra, intervinham diariamentecom eles. Novos dizeres foram surgin-do, novas alternativas, novas formasde tratar sua socialização. Por exem-plo, surgiu algo inédito – sobre o quefazer com os aniversários. Não haviaconvites, porque pensavam tratar-sede um lugar de confinamento. Então,os colegas da escola começaram a fre-quentar o lar e as crianças começa-ram a ser convidadas para os aniver-sários de seus companheiros.

Especificamente em relação aosprofessores, e a todos aqueles que, deuma forma ou de outra, quissessemtransmitir algo por escrito aos adul-tos de quem eles dependiam, foi con-cebido um novo esquema de circula-ção das notificações. As crianças nãotardaram a mostrar em atos o impac-to desta mudança. A destinatária dasnotas seria a diretora do lar, por ser apessoa que tinha maior estabilidadehorária e a responsabilidade de admi-nistrar o material, permissões e recur-sos que pudessem ser requeridos pelaescola e outras instituições para limi-tar qualquer burocracia.

Esta pequena, mas grande mu-dança, transformou a disposição dascrianças ao encontrarem não somen-te a quem entregar os cadernos todosos dias ao retornar da escola ou de suas

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outras atividades, mas a possibilidade de terem com quem falar do assunto;facilitou-se assim o processo de levar os materiais solicitados, a avalia-ção das permissões e as questões de saúde, entre outras questõescotidianas, que antes permaneciam sob silêncio.

As anotações do caderno de comunicações continham pala-vras que refletiam, por meio de mínimas expressões, o imagináriosobre as crianças, idealizações sobre suas famílias e montagens ins-titucionais organizadas num circuito fechado de exclusão, susten-tando suposições sobre “a minoria sem possibilidades de educa-ção”.

A leitura da indisciplina do ato cerceava as possibilidades dedar espaço para outras significações. Do ponto de vista das crian-ças, não se tratava só de entregar os cadernos como um castigo,nem para serem fiscalizados, mas para ter alguém a quem contar oque aconteceu no dia, as dificuldades e os êxitos, obtendo assimuma maior disposição dos recursos como parte das pequenas coisasdo dia-a-dia institucional em conversas com o outro, disposto a ouvire a falar com eles, habilitando-se assim uma outra circulação discur-siva possível.

Dirigir as notas para quem possa recebê-las, lê-las e falar a par-tir delas, é habilitar uma via de intercâmbio, antes fechada, pois osdestinatários estavam ausentes.

Ilustramos assim de que modo uma cerimônia mínima podeser um veículo de conservação do “sempre foi assim”, e também,por sua análise, de que modo é possível abrir o jogo, gerar outrasações que permitam uma interferência sobre o dado e cristalizado.O que é disposto pelo dispositivo se dissolve a partir de uma cerimôniamínima que promove uma nova disposição para a escuta dos outros,cujas repercussões podem nos surpreender.

Cerimônias mínimas, mais uma vez…Cerimônias mínimas, mais uma vez…Cerimônias mínimas, mais uma vez…Cerimônias mínimas, mais uma vez…Cerimônias mínimas, mais uma vez…

Os ritos, rituais e cerimônias gozam de profundo desprestígioem nossos tempos, nos quais a liquidez, a fluidez e o sem limitesficam ligados, indistinguíveis e descontextualizados inclusive do ob-jeto de análise do autor.

Neste entorno argumentativo, pouco favorável à instituição demarcos simbólicos, reiteramos o lugar significativo que podem ter

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as cerimônias mínimas, consideradas tonto como unidade de análiseem nossas pesquisas, como pela sua capacidade de intervenção einterferência em uma dupla via: a) referente a ritualizações cripto-grafadas; b) no que diz respeito ao sem limite, ao indiferenciado.

Ao mesmo tempo, constatamos de que modo, por meio dascerimônias mínimas pode operar-se o estabelecimento de condiçõesde realização da interminável tarefa de fazer do dito e do feito outrosdizeres e fazeres. Este ponto é relevante, especialmente em relação àsuposição da abolição das cerimônias e rituais; na abolição da lógicado ritual em supostos tempos de fluidez e desinstitucionalização,segue-se essa tendência sem um questionamento que a detenha, e éo mercado que ritualiza e impõe suas próprias liturgias, gerandodesconcerto e uma ilusão de liberdade que só alimenta a onipotên-cia, a descrença e a voracidade humana (Minnicelli, 2010).

A propósito deste assunto, sublinhamos a citação de Lacan(1992):

Se durante muito tempo o homem acreditou que seus ritos, suas cerimônias, fos-sem indispensáveis para manter as coisas no seu lugar, o limite foi transpostoquando o homem percebeu que seus ritos, danças e invocações, na verdade, nadatinham a ver com essa ordem. (p. 440).

Os ritos, bem como os dispositivos e as instituições, são artificiosnão naturais. O que caracteriza um rito, em sua repetição, é a estabi-lidade que produz a predição de que algo acontece em uma certaordem que não pode ser alterada sem repercussões em sua esfera. Acondição de artifício, o reconhecimento de que não se trata de algonatural, mas instituído, permite-nos operar, intervir, interferir, per-guntar, falar, fazer e dizer.

Poderíamos perguntar : por que sustentar qualquer forma ceri-monial se ela representa uma ficção que sustenta uma ilusão? Porque sustentar qualquer forma cerimonial se ela representa uma fic-ção não sujeita a parâmetros científicos? Essa é a pergunta do de-sencantado subjugado por uma nova crença, uma nova ilusão, aque-la que enuncia que “o real é racional, e todo o racional é real”. (Lacan,1960, 23 de março).

Essa ilusão tem seus efeitos devastadores quando é transmitidacomo máxima contemporânea e se expressa como regra que regulao mercado de consumo, pretendendo regular também os laços so-ciais.

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Se nada é possível,Se nada é possível,Se nada é possível,Se nada é possível,Se nada é possível, tudo é tudo é tudo é tudo é tudo épossível.possível.possível.possível.possível.

Quais são os efeitos dessa ilusãoem relação ao suporte às novas gera-ções? Quais são os efeitos singularese coletivos da renúncia ao suporte dainscrição da legalidade da cultura?

A partir do desenvolvimento dalinguística e das pesquisas de Lévi-Strauss, os ritos e suas cerimôniasconstituem-se como expressões co-letivas em que se põe em jogo a lega-lidade do inconsciente, que não é ou-tra além da legalidade da linguagem.Os ritos em suas cerimônias confe-rem um marco simbólico ao real daexperiência e, a partir daí, outorgamsustentação ao desdobramento ima-ginário no qual podemos ler as trans-formações expressas pelas variaçõesde crenças em diferentes épocas, re-giões, tradições mais ou menos arrai-gadas, mais ou menos sujeitas a su-portar o movimento que as crençasprovocam.

Crenças mais ou menos cruéiscom meninos e meninas, que variamsegundo os tempos, muitas delas du-ráveis, especialmente nas práticas sa-crificiais em que os corpos infantispoderiam estar investidos de uma su-posta maldade ou serem portadoresde algum dano imaginário para a co-munidade em questão10. Hoje, o sa-crifício de uma grande quantidade demeninos e meninas tem formas maissutis, porém não menos eficazes.

Ritos e rituais dão um lugar deex-sistência ao real, entendido como

o inatingível, o intocável, garantindoa permanência da lei como um vazioestrutural. O marco simbólico dá su-porte à lei, sem-ser-a-lei, traduzindo-se em cerimônias que dão suporte àsficções que dele emanam.

Ao longo dos tempos, por meiodo cerimonial que se monta e se sus-tenta na liturgia que cria o roteiro dacena, o ser humano encontrou um li-mite; conferiu um marco simbólicoao real da experiência (o nascimento,o sexo e a morte), às forças da natu-reza, à relação com os deuses e tam-bém criou formas de compensar ascarências, o que lhe faltava, por meiodo intercâmbio de bens. Nas formascerimoniais se escrevem as regras quecada grupo humano estabelece pararegular os intercâmbios.

Ainda que certas tendências daAcademia tenham considerado esteproblema como algo que deva serabandonado, especialmente pelosefeitos de sustentação de tradiçõesque são indesejáveis, com o que con-cordamos, consideramos necessáriorecuperar sua lógica em relação aomito e ao jogo já que, além das ideo-logias, pela sua operação metafóricae metonímica, eles refletem a lógicada linguagem no coletivo.

Ritos e rituais de passagem nãoforam abolidos. Muito pelo contrário,permanecem vigentes, ainda que des-locados dos cenários socioeducativose religiosos que os validavam para oscenários comerciais e mercantis. Con-vidamos os leitores a refletir sobre aestrutura dos programas de televisão

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de maior rating como os produzidospor Tinelli, um apresentador da TVargentina, e outros, cujos formatos se-guem formas cerimoniais ritualizadasde modo excessivamente estrito.

Também é surpreendente a pou-ca importãncia atribuída ao que, des-de Bleger, na formação de psicólogose profissionais de outras disciplinas,considerava-se definido e sustentadocomo “enquadre de trabalho”, artifí-cio não natural, disposto ao serviçode uma tarefa. Estamos interessadosnas semelhanças e diferenças das ce-rimônias mínimas. Enquanto que umenquadramento de trabalho sinalizaum marco, delimita e estabelece dife-renças, estará na habilidade de seudesenho a flexibilidade para abrirportas e maneiras de configurar ce-nários de trabalho; nas cerimôniasmínimas, partimos de um recorte dis-cursivo, de um dito, para depois re-criar enquadres.

Nas cerimônias mínimas não setrata apenas do marco assinaladopela definição temporal e espacial,mas de que modo pode-se desenharo cenário, o roteiro, os protagonis-tas, os lugares que façam possível odesenvolvimento dramático de cenassubjetivas e coletivas, a partir das quaisos efeitos socioeducativos não resul-tem só em boas intenções.

Definir cerimônias mínimas sig-nifica delimitar um dito (valor sim-bólico); desenvolver seu cenário e suaestrutura dramática (desenvolvimen-to do imaginário). Ao fazê-lo, faremosuma operação de duplo jogo, fazer di-

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zer ao dito; interferir no devir metoní-mico conforme o caso, criando umaborda frente ao real.

De modo comum com o enqua-dre, uma cerimônia mínima não é perse natural, mas em todos os casos en-volve uma criação e uma decisão. Istoé, nós as promovemos para que umadeterminada tarefa possa se realizar.Fixar certas variáveis temporo-espa-ciais permite outorgar certa estabili-dade e previsibilidade em um conti-nuum. No entanto, nem sempre épossível começar uma tarefa apenasdelimitando a data e a hora da realiza-ção. Este é um ponto de falha repeti-da nas reivindicações dos adultosquando se trata do tratamento decrianças instáveis.

Maud Mannoni (1982) inventouum nome muito interessante para isso– ela chamou de “instituição estoura-da”, uma vez que a instituição não es-tava sustentada pela estreiteza dos ho-rários, mas pelo arcabouço simbólicodo discurso; pela presença de outros,dispostos a apoiar e veicular as míni-mas possibilidades transferenciais queas crianças podiam ter à disposição.

O enquadre de trabalho transfor-mado em cerimônias mínimas supõeo marco simbólico para o desenvol-vimento de uma tarefa e, especialmen-te, para tornar possível a leitura datransferência que se apresenta; os in-tervalos que falam nos interjogos pre-sença- ausência; as repetições e ossignificantes que aí se desenvolvem.

Sabemos o quanto as boas inten-ções rapidamente podem levar à de-

cepção e ao fracasso quando se su-põe que falar de “enquadre” ou de“instituição” se restringe à definiçãohorária e espacial. Tal é o caso do “ho-rário reduzido”, baseado na diminui-ção do tempo de permanência dascrianças na escola. Esse enquadre –que em numerosos casos é solidárioda sustentação do dispositivo disci-plinar – perde sua possível eficáciaquando está a serviço da sustentaçãoda descrença de uma decisão exclu-dente. Contudo, pode resultar daí umahiância, um espaço vazio, para criarpara uma criança condições para suasocialização e aprendizagem confor-me o que ela mesmo possa ir toleran-do na transferência com outros pelascerimônias mínimas.

Como dissemos, nada é “bom”ou “mau” em si mesmo, mas traba-lhar sobre o enquadre pode tornarpossível o que de outro modo nemsempre o foi, na medida em que eleseja analisado e esteja disponível ao ser-viço do acompanhamento de proces-sos subjetivantes, isto é, socioedu-cativos, das crianças. Esse ponto éimperioso quando se trata de crianças“soltas”, instáveis, com dificuldades deadaptação, rebeldes e desconfiadas, queestabelecem uma transferência maisviolenta, desencadeada pelos efeitosdo traumático que fala por atos sempalavras, tornando difícil seu suportepor parte dos adultos ritualizados,sem capacidade de jogo.

Analisemos um exemplo queilustra como uma cerimônia mínimapode operar efeitos socioeducativos,

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quando uma professora decide sair do ritual da violência cotidiana,para abrir o jogo significante:

Uma professora do terceiro ano do Ensino Fundamental decide começar o dia de trabalho coma leitura de um conto para um grupo francamente barulhento. Decide fazer algo diferente comseu próprio mal-estar cotidiano. Pergunta-se como fazer para se colocar como condutora daturma. Deseja ser escutada, diz que não se dedicou à docência para sofrer diariamente. Decidecomeçar a semana com uma surpresa. Chega à escola em uma segunda-feira, ingressa na saladeixando suas coisas na mesa. Não cumprimenta os alunos; as crianças entram alvoroçadas, odescontrole se aproxima. Diante dessa situação, pega um livro de sua pasta, dramatiza a cenae, em lugar do grito e da reprimenda costumeiros, dirige-se a eles em voz alta e em tom enérgico:“Era uma vez…” e começa a relatar-lhes o conto, não um qualquer, mas um mito escolhidoque lhe agradava e intrigava. Olhares de surpresa… as crianças se entreolham, vão ficandocaladas e se tranquilizam… A professora finaliza o relato, e acrescenta: a aula já começou.Diz o clássico “bom dia meninos” e, para sua surpresa, recebe um sonoro “bom dia”. Algunsfazem comentários sobre o relato, outros não dizem nada. Após vários dias repetindo esta cena,um dos meninos lhe pede, “tia, conta um conto de terror”. Ela responde que sim, que o procu-rará para o dia seguinte. Decide levar-lhes os Contos da Selva, de Horacio Quiroga. Entre aprofessora e os alunos abriu-se um espaço habilitante de circulação de ficções, relatos fantásticos,em suma, de outra cena.

Cerimônias mínimas, função do Estado?Cerimônias mínimas, função do Estado?Cerimônias mínimas, função do Estado?Cerimônias mínimas, função do Estado?Cerimônias mínimas, função do Estado?

Ainda que nos encontremos em tempos em que a legislaçãoconsidera a criança como sujeito de direito, não devemos esquecerque uma criança não existe porque a lei assim o diz e estabelece,mas que a lei, enquanto código escrito, oferece o marco simbólicode referência e inscrição social. Uma criança existe quando ela é no-meada, identificada, amada, quando se olha para ela, quando se falacom ela mesmo que, aparentemente, ela não nos entenda; quando éregistrada em cartório, recebendo um lugar nomeado na sociedade.Faz-se uma criança quando ela ingressa no desejo do Outro e ali sealoja.

A possibilidade para cada criança que chega a este mundo depoder escrever sua história e fazer parte de um coletivo social com-pete-nos inicialmente e durante os vários anos que os acolhemos.Muitas crianças são alojadas, há mais de um século, pelo circuitoinstitucional não familiar e, para elas, as possibilidades de educaçãose apresentam limitadas – para algumas, lamentavelmente excluden-tes. Muitas crianças procuram hoje a presença desse marco institu-

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cional e não o encontram, chocando-se com ideais de desinstitucionaliza-ção devastadores.

Neste sentido, as epistemes ba-seadas em “ilusões (psico) pedagógi-cas” (de Lajonquière, 2000) do dis-positivo encarregaram-se defortalecer a ideia que nos propomosquestionar por meio da seguinte in-terrogação: quais são as formas ceri-moniais necessárias para sustentar asocialização e a educação de umacriança deslocada de sua família –ausente, carente ou impotente – emdireção ao social e institucional?

A episteme que enuncia o edu-cativo como social, e o esclarece naexpressão socioeducativo, renova estapossibilidade e permite colocar noroteiro que liga o social com a educa-ção a hiância onde possam emergiros efeitos de subjetivação.

Alienação-separação entre o So-cial e o Educativo localizam o inter-jogo possível para outras ficções alémdas dispostas pelas formas de exclu-são dos outrora bastardos, órfãos,abandonados, crianças desligadas dosocial pela condenação de “inadapta-das”, ainda que sujeitas ao consumo– inclusive de seus corpos – em suasmúltiplas formas

Aqui, os circuitos de inscriçãosocial cerimonial precisam ser espe-cialmente considerados por seu valorsimbólico e pelas ficções que os sus-tentam. Estar documentado ou nãodocumentado não é apenas uma ques-tão legal, moral ou econômica, mastrata-se de contar com um lugar mar-

cado simbolicamente em uma linha-gem familiar e social à qual cada novacriança tem o direito de pertencer emuma sociedade civilizada.

A partir do exposto, considera-mos que devemos dirigir-nos para asformas cerimoniais que sustentamose que fazem a produção de subjetivi-dade contemporânea, entendendoque, enquanto pensamos que estamosoperando na produção de subjetivi-dade das crianças, isso nos produz.Esta afirmação expõe uma invariantehistórica.

Produto das pesquisas que temosapresentado em textos anteriores(Minnicelli, 2000, 2004, 2005, 2008,2010) esta é uma hipótese que nospermite posicionar-nos em relação aoque foi afirmado antes. Por ela com-provamos que, independentementedas épocas e culturas para as quais nosorientemos para seu estudo e análise,não é possível descrever e inscreveras crianças fora do universo simbóli-co da época, veiculado pela linguagempor meio de cerimônias, discursos epráticas falantes e silenciosas, quedefinem e posicionam as novas gera-ções em relação ao Outro... e de ou-tros. Inclusive em nossa época.

Desde a Antiguidade, fundado-ra do pensamento ocidental, as no-ções de infância, de crianças, de me-ninos e meninas estão subordinadasàs controvérsias presentes em enun-ciados míticos, filosóficos, religiosos,educacionais, legislativos, médicos, eacima de tudo, aos sistemas de cren-ças (divindades, espíritos malignos ou

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benignos) com relação às ficções queuma comunidade determinada for-mule sobre as crianças . Essas cren-ças foram determinando diversas prá-ticas exercidas sobre as crianças, seuscorpos e suas “almas”, mais ou me-nos cruéis de acordo com os tempos.

Diante de certas correntes quese posicionam como se não fosse ne-cessário fazer um sujeito, e fazer-se sujei-to no campo do Outro, é preciso repetiro que já foi dito. Sabemos bem que asustentação das novas gerações porparte das precedentes não acontecepor geração espontânea, mas implicaem uma irrenunciável tarefa humana.A violência que surge nos comporta-mentos infantis é evidência da frágilresistência que se oferece à tendênciacontemporânea da mercantilizaçãodas vidas humanas.

É por isso que, sabendo dos li-mites que nos são impostos, e justa-mente por eles, é necessário renovara oferta de apoio da lei na configura-ção subjetiva. Na falta disso, fica cla-ro que, quando as crianças têm quese virar sozinhas para encontrar taismarcos de referência em outros, ge-ralmente em seus pares em condiçõessemelhantes, subtendendo-os pelaforça, sem interpelação alguma porparte dos adultos, é somente a forçapolicial que os captura quando o de-lito resulta em meio para uma novainstitucionalização, nesse caso, poli-cial e jurídico – institucional. E a rodavolta a girar em seu único sentido.

A lógica mercantil tem sido con-figurada sobre as bases do dispositi-

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vo Moderno, acarretando como con-sequência a ilusão tentadora da lei dovale tudo sobre a regulação dos laçossociais e das instituições filiativas in-tergeneracionais. É a essa lógica à qualé imperativo oferecer resistência coma institucionalização da diferença, ins-tituinte da infância.

Como consequência do expos-to, surge então, como efeito de senti-do, a noção de criança como consu-midor, subordinando-as a epistemesque assinalam as mudanças tecnoló-gicas e o mercado ou a ausência defamília ou outras coisas, e as causasda emergência de tais comportamen-tos como monstros indestrutíveis. Eali ficam abandonados, à deriva, comose não fosse possível fazer mais nada.A história e as histórias de vida nosensinam que uma vida viável é possí-vel, mesmo com um nascimento emambientes e condições desfavoráveis.

Se nos considerarmos parte desteproblema, como protagonistas, pode-mos colocar em nossa perspectiva asmargens de ação e intervenção pos-síveis, de tal maneira que, contemplan-do a singularidade do caso em rela-ção a um certo coletivo social, sejapossível operar e recriar laços ali mes-mo onde a fronteira é apresentadacomo abismo – e para isso só se ne-cessitam cerimônias mínimas.

Renovar a pergunta do caso ilus-trado pode ser uma via interessante pararetomar o fio emaranhado : a quem nosdirigimos quando falamos com umacriança / de uma criança / para umacriança / sobre uma criança?

Constatamos permanentementede que modo, pelas cerimônias míni-mas, pode-se limitar a distância como macrossocial que tem como efeitoimpotência e incapacidade para fazerfrente à complexidade de variáveisque atentam contra as condições desubjetivação, recuperando margenspossíveis de intervenção investida deum papel social, seja este docente ouprofissional.

Pode parecer ousado e irrisóriosustentar esse conceito em temposem que se espera do Estado – passi-vamente em muitos casos – a reso-lução dos grandes problemas queafetam a educação em geral, e os pro-blemas das novas gerações em parti-cular. Não se trata de uma propostaque deve ser abandonada, na medi-da em que devemos compreenderque um dispositivo “reclama” quan-do percebe que se “desarticula” decada uma das microcapilaridades dosnós que o configuram. Não há ne-nhum dispositivo que possa se sus-tentar se ao mesmo tempo não existeuma amplíssima rede de cerimôniasmínimas que lhe outorguem credi-bilidade e sustentação. Voltemos aoscasos apresentados: se os bebês nãoestão brincando, mas amotinando-se;se esconder o caderno de comuni-cações quando não estão presentesos destinatários das notificaçõestransforma-os discursivamente emdelinquentes, estamos crucificando-os a um destino sem jogo, que re-presenta, em cada caso, a voz doEstado.

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Devemos ser claros sobre isto.Quando analisamos a educação dasnovas gerações, uma das primeiraspremissas é não negar em absoluto aimportância nem o papel do Estado.Porém, a ausência ou a presença doEstado se estabelece, também, pormeio das cerimônias mínimas susten-tadas por seus representantes.

O chamado Estado se apresen-ta como um aparelho complexo quevivemos como estrangeiro a nósmesmos; como um grande Outrolongínquo que nunca cumpre nemresponde à altura as mínimas expec-tativas. Porém, se desmontamos onovelo ver-nos-emos como partedesse mesmo novelo, do tecido quenos liga, na medida em que o repre-sentamos nas funções sociais queexercemos, e nas investiduras que opróprio Estado e suas formas de re-gulação nos outorgam como docen-tes, profissionais, diretores ou fun-cionários.

Ou seja, não podemos não serparte do assunto ainda que apre-sentemos – e representemos – dife-rentes níveis de responsabilidade. Es-perar a que outro resolva podedeixar-nos paralisados ante as peque-nas – ainda que significativas – possi-bilidades de interferência na tendên-cia mortificante do sistema. Sistemaao qual também pertencemos e per-tencem nossas crianças, sejam filhos,sobrinhos ou netos, vizinhos ou ami-gos, alunos ou pacientes em todosos níveis.

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PPPPPráticas socioeducativas,ráticas socioeducativas,ráticas socioeducativas,ráticas socioeducativas,ráticas socioeducativas,sua sustentação pelassua sustentação pelassua sustentação pelassua sustentação pelassua sustentação pelascerimônias mínimascerimônias mínimascerimônias mínimascerimônias mínimascerimônias mínimas

Seguindo a rede argumentativaapresentada até aqui, chegamos à hi-pótese que nos interessa continuartrabalhando. As práticas socioeduca-tivas, através das cerimônias mínimas,constituem um ponto chave na pos-sibilidade de análise e interferênciadaquilo que se apresenta como dis-posto e inamovível.

As cerimônias mínimas abrem aojogo diante de práticas criptografadase naturalizadas, tal como apresenta-mos apenas com fins ilustrativos: osexemplos podem se multiplicar.

As cerimônias mínimas são achave para uma hiância, uma fenda, apartir da qual “entre” o dito e o feitopossam relançar-se outros dizeres eoutras formas de fazer. Ao mesmotempo, são uma privilegiada unidadede análise na detecção dos modos decriptografia e naturalização que trans-portam algo de nefasto da história,tornando-a presente; permitindo ou-tras significações frente a um campode sentido através do qual se repete oinamovível dado e estabelecido.

Winnicott (1947/1998), psicana-lista inglês, ofereceu-nos suas inquie-tações e experiências com o que foidenominado de “crianças carentes”ou “crianças anti-sociais” nos temposde guerra e pós-guerra. Recomenda-mos a leitura e a discussão do textoDeprivación y delinqüência, especialmente

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o capítulo “Manejo residencial como tratamiento para niños difíciles”editado por Paidós.

Por sua vez, desde o início do século XX, em suas Obras escolhi-das, Vigotsky se perguntava sobre as “crianças dificilmenteeducáveis”, destacando o lugar e desafio que estas crianças repre-sentavam como sujeitos para os docentes e profissionais, desafiosesses renovados pelos questionadores das formas possíveis de fazeradvir a socialização e a educação.

Certos princípios que orientaram intervenções docentes e pro-fissionais devem ser certamente questionadas quando se pretenderenovar a possibilidade de socialização e educação. Especialmenteaqueles que estabeleceram a funcionalidade familiar como uma nor-matização moral das relações, fixando linhas divisórias estritas, queainda persistem, para nomear as diferenças com base nas disfuncio-nalidades, nas falhas, nas carências e ausências com a consequentenecessidade de “reabilitações”, sustentadas em ficções que resulta-ram extremamente eficazes ao longo de décadas – e continuam mar-cadas em cerimônias mínimas sustentadas pelos agentes de inter-venção direta.

Critérios que ainda persistem sem questionamento e se institu-em em relatórios sociais, psicológicos e psicopedagógicos, repetin-do-se uma e outra vez ao longo dos anos de uma criança que tran-sita por cenários judiciais, escolares, institucionais ou por qualquerorganização que envolva atuações com eles11. Em muitos casos, dis-farçados como texto de uma nova lei, contradizem-se imediatamentenas prescrições e/ou argumentações que formulam.

Nem toda prática intencionalmente concebida como socioeduca-tiva cumpre seu propósito, e, além disso, muitas vezes não se trata deuma prática concreta, mas de restabelecer a função socioeducativa queos adultos têm com as crianças. Essa função não se encaixa em desenhosde programas prolixos, porém é a ela que nos dirigimos e é por elaque atuamos. Nesse sentido, consideramos importante distinguir oque implica o sofrimento desnecessário gerado pelas condições defechamento trágico com referência ao mal-estar próprio do viver.

Cerimônias mínimas podem constituir a chave para encontrar adiferença, especialmente porque elas se localizarão no óbvio, sem-pre tão próximo e tornado invisível para a nossa margem deprotagonismo e ação, tal como no caso da professora que decidecriar uma passagem entre o fora e o dentro de sua classe ao iniciar odia com o “Era uma vez... e entrou por uma porta e saiu por outra e essa

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aula já começou”. Somos nós que cria-mos e recriamos as condições quefazem laço ou não.

Concluímos afirmando que ascerimônias mínimas são inventadas, istoé, não são naturais nem fazem parteda organização social e institucionalnormatizada. Por meio delas pode-mos ser protagonistas da cena que nospreocupa e ocupa, do tempo que darálugar a outras ficções, outros jogos deverdade além dos já estabelecidos;sem mais, será possível fazer do dito,outros dizeres.

Qualquer forma cerimonial mí-nima poderá ser iniciada pela renova-ção dos questionadores da própriaimplicação biográfica nas interven-ções, no instante em que se decidesituar-se como adultos frente às crian-ças, para dar lugar à palavra e à escutado sujeito, de modo substantivo e es-sencial, razão pela qual consideramosnecessária – ainda que a admitamoscomo não prescriptível – a reflexãoética.

MINIMAL CEREMONIES

ABSTRACT

In this paper, from the perspective of Psychoanalysisand Education, we will approach MinimalCeremonies as a device suitable for clinico-socialintervention and research, a metaphorical operatorwhich allows us to create subjectificating conditionsof possibility in different social, educational,institutional and community settings.

Index terms: psychoanalysis; education; device;minimal ceremonies; socio-educational practices.

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CEREMONIAS MÍNIMAS

RESUMEN

En este trabajo, desde la perspectiva de Psicoanálisis y Educación, abordaremos a las ceremoniasmínimas como dispositivo apto para la intervención y la investigación clínico-social, operadormetafórico que nos permite crear condiciones de posibilidad subjetivantes en diferentes escenariossociales, escolares, institucionales, comunitarios.

Palabras clave: psicoanálisis; educación; prácticas socio-educativas.

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NOTAS

1 Este escrito dá continuidade ao trabalho“Escrituras de la ley en la trama social. Ensayo so-bre la relación entre dispositivos, ceremonias míni-mas y prácticas profesionales” Revista Pilquen •Secção Psicopedagogia • Año X • Nº 5, 2008.

2 Seguimos neste sentido a definição deNasio (1994). “ pode também ser traduzidopor “significantes”; “significantes recalca-dos”; “cadeia de significantes reprimidos”. Odito é algo que tem valor de ato.

3 Cerimônia (latim caerimonia, -ae, caráter!sagrado, veneração, respeito, culto, cerimô-nia) s. f. Cerimônia (latim caerimonia, -ae, cará-ter! sagrado, veneração, respeito, culto, ceri-mônia) s. f .. Forma exterior e solene decelebração de um culto religioso ou profano.= RITO, SOLENIDADE. Manifestação mais oumenos solene com que se celebra um acon-tecimento da vida social. Cada uma das for-malidades rituais. Padrão convencional decomportamento que se emprega onde a fa-miliaridade não existe. = ETIQUETA, PROTOCO-LO. Mal-estar proveniente da necessidade deser cerimonioso.

4 Não desenvolveremos aqui a distinçãoque Lacan realiza entre “ato” e “acting”, dei-xando o assunto pendente porque que requeroutras distinções precisas.

5 A autora diz “colorín, colorado...”, expres-são com a que terminam os contos emcastelhano. (N. do T.).

6 Os efeitos desta tendência também po-dem ser encontrados na suspensão de qual-quer forma cerimonial em cenários sociais

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nos quais são esperadas; como o caso de citações judiciais nas quais os oficiais dejustiça, e inclusive certos profissionais, não sustentam forma cerimonial alguma,não se apresentam nem por seus nomes nem por suas funções sociais ante osimplicados pela instância que opera como marco simbólico de referência social.

7 Para ampliar este assunto ver Minnicelli, M. “Escrituras de la ley en la tramasocial. Ensayo sobre la relación entre Dispositivos, ceremonias mínimas y prácticas profesionales”Revista Pilquen • Secção Psicopedagogia • Año X • Nº 5, 2008, 2008 disponibleen http://www.revistapilquen.com.ar/NE_Psicopedagogia.pdf

8 Uma descrição mais ampla do caso se encontra em Infancia Pública. No hayderecho. (Minnicelli 2004)

9 A questão da apresentação pessoal desajeitada e o estado geral das criançassão analisados em outro lugar. (Minnicelli, 2004)

10 Mereceria um desenvolvimento à parte, ante o qual não nos deteremos, oproblema dos rituais sacrificiais, problema trabalhado pelo antropólogo RenéGirard (1997) que critica com solvência Gerez Ambertín (2008).

11 Ver Minnicelli, M. “De límites, confines y fronteras. Notas sobre el problemade los límites, de la autoridad y la responsabilidad”. Em Intersecciones entre clínica yescuela. Buenos Aires: Noveduc, 2004b (55).

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Recebido em maio/2011.Aceito em julho/2011.